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Schiele, 1909

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Schiele, 1914Sem título

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Schiele, 1912Auto retrato

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Em 1915, Shiele deixou Valerie e ficou noivo de Edith Harms, casando-se no dia 15 de junho desse ano. Em 1918, o artista austríaco foi convidado a participar na 49º Secessão em Viena. Teve 50 trabalhos aceitos e exibidos na sala principal. Fez também o pôster para a exposição, o qual era inspirado na Última Ceia, com um autoretrato no lugar de Cristo. Este acontecimento foi um sucesso, tendo resultado na valorização dos trabalhos deste artista. Durante o útlimo ano da sua vida, o artista participou de várias outras exposições igualmente com sucesso.

No outono de 1918, Edith, grávida de seis meses, foi uma das mais de vinte milhões de vítimas da gripe espanhola, morrendo em 28 de outubro. Três dias depois da sua morte, Schiele abandonou também a sua vida. Durante estes três dias, Egon Schiele fez alguns retratos de Edith, tendo sido estes os seus últimos trabalhos.

Egon Schiele, representante do Expressionismo na Viena fin-de-Siècle deixou trabalhos nos quais estão representados seres humanos transfigurados por gestos fortes e vigorosos, são criaturas amontoadas e desarticuladas em tecidos brancos, diversas mulheres posando para ele e auto-retratos provocantes mostrando a visão de si (provavelmente). Atualmente as suas obras encontram-se em museus de Viena e da Suíça, bem como em importantes coleções particulares.

Schiele, 1910Recém nascido

Schiele, 1911Menina sentada

Schiele, 1911Menina nua

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Os Fantoches da Meia-noite

Boêmio autêntico, Di Cavalcanti nunca escondeu seu fascínio pela vida noturna e seus personagens, manifestado, aliás, por uma visão muito particular a respeito da condição social daquelas criaturas. Com o mercado da literatura decadentista em moda, juntamente com o advento da Primeira Guerra Mundial, a crítica produzida pelos profissionais do lápis torna-se visceral.

Di Cavalcanti não perdeu a oportunidade, demonstrando, através da série Fantoches da Meia-noite, as criaturas miseráveis que perambulavam no Bairro da Lapa, no Rio de Janeiro, durante a década de 1920. Conta-nos o artista:

Trazia comigo alguns quadros e um série de desenhos, algo que intitulei Fantoches da Meia-noite. Ribeiro Couto fez o prefácio. O poeta do Jardins das Confidências acreditou na aventura de uma edição de luxo que Monteiro Lobato se incumbiria de apresentar a um público pouco efeito na época a esse gênero de publicações. (Di Cavalcanti, 1956, pp. 107-108)

A “aventura” foi lançada em novembro de 1921, em São Paulo, na Casa Editora O Livro, de Jacinto Silva, na Rua 15 de Novembro, a série compreende 16 desenhos produzidos em litografia, prefaciada pelo amigo Ribeiro Couto. O texto56 narra a amizade entre os dois e suas peregrinações pela noite carioca:

Pela fatigada praça do bairro vicioso, onde os lampiões allumiam desvãos com luz erma arrastam vultos. Numa esquina, ao fundo, há um bar. Vem das portas amplas o barulho confuso das vozes e a sacudida plangencia do piano fanhoso. Passa rápido, na direcção do caeis, um auto levando gente a cantar, numa alegria de sabbado caxeiral. E volta o sossêgo a fatigada praça, ao fundo da qual as portas fixam a sua grande mancha clara e sonora.Somnolento, o rondante olha o luar. Depois, caminha uns passos, atravessa a calçada, agarra pelo hombro uma senhora que dormia. A sombra vai sentar-se mais longe, noutra soleira de porta. E o rondante, distrahido, volta á contemplação do luar, bocejando.Mulheres, sahindo dos beccos equivocos que desembocam na praça fatigada, param perto de homens, murmurando convites.— É doloroso um convite assim, sem conhecer as pessoas.— Muito doloroso...

56 Embora o texto faça parte da obra, não é objetivo neste trabalho analisá-lo.

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— Repara naquella gorda, pezada, que chegou perto do sujeito de branco.— É a que offerece creaturinhas.— Cynica!— Nada disso. Puramente instinto commercial.Oh! a fatigada praça do bairro vicioso! Os lampeões, em torno dela, são como mortuários. Às vezes, nas suas frouxas claridades cambaleiam, descompassos, vultos de bêbedos que recolhem a casa, honestamente. E no meio da praça, perdido, o rondante continua na contemplação do luar.— Meu caro poeta...— Meu caro pintor...— O bar deve estar delicioso.— Pois vamos.Cessou a voz lamentosa do piano. Agora um cego toca uma harmonia, encostado à porta. Mas o piano recomeça e ele vai-se, alisando o chão com os pés indecisos.O rumor de vozes da freguezia nos acolhe. Vamos para a ultima mesa. Ficamos a olhar o pianista, que é mechanico, habituado, indifferente. Sua figura, entretanto, é um pouco dolorosa. Suggere encargos de familia. E a musica sae mastigada dali de dentro, daquella caixa negra a rir, sob as duas mãos machinaes , a gargalhada recta do teclado.— Fantoches da meia noite... Como são infelizes, tragicos!— Infinitamente, meu caro pintor.Devemos ter o ar vagabundo dos philosophos sem importancia. Começamos a dizer baixo reflexões penosas.— Nós também somos fantoches.— Evidentemente.— São todos, somos todos fantoches... Não vês os cordeis do destino a move-los, a mover-nos? São cordeis imponderaveis...E o destino sabe articular-nos com habilidades de contra-regra cruel...— Si eu conseguisse cortar os meus cordeis!— Depois não poderias mover-te sosinho.— É verdade... Não tinha pensado.— Somos de papelão, meu caro poeta...Sahimos. Temos um ultimo olhar para o pianista doloroso. Vamos depois procurar outras coisas, pelas immediações da praça fatigada. Ha logares alegres por aqui, mas os nossos olhos desencantados vêm sempre os cordeis da fatalidade.— Nunca nos poderemos divertir. Porque será que enxergamos esses fios que movem as creaturas? Ellas não sabem de nada... E nós vemos tudo...— Será hoje, talvez, porque estamos profundos... É bastante desagradavel estar profundo.— É inutil.

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De novo na praça fatigada. O rondante, no meio della, continua lyrico e incomprehendido. Um garoto pede-nos um tostão para o café.— Pobre fantochinho!— Também já está seguro pelos cordeis, como os outros.— Também já funciona.Lentamente, vamos andando na direcçao do mar, proseguindo nas flexões penosas.— A meia-noite é o principio da vida differente. Depois da meianoite todas as creaturas têm a sua finalidade tragica marcada no rosto, ou no gesto, ou na voz. Todas se confessam, sem querer.— Todas mostram os cordeis...Seguimos pelo caes, á sombra das arvores. Cada vulto que encontramos nos dá a sensação de uma personagem inconsciente a desempenhar isolada o seu papel.— Fantoches!— Si eu fosse o contra-regra...

E o luar, como uma gambiarra excepcional, illumina do alto a farça monotona...(Couto, 1921)

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As criaturas – agora carregadas de características expressionistas – notívagas de Di Cavalcanti são identificadas nesse cenário ermo e desolador, como lemos no texto de Ribeiro Couto. Primeiro, um jogador de baralho, disposto assimetricamente do lado esquerdo de quem o observa.

A imagem seguinte excede esse recurso, que indica apenas as mãos e os pés de um tipo andarilho, revelado apenas pela sombra da figura projetada no plano seguinte. Na seqüência, uma mulher gorda – aparentemente cristã – traz ao pescoço um crucifixo; um seresteiro, um bambini – típico trabalhador infantil do início do século; um homem desolado, sentado num banco de praça; um cego e mutilado pedinte; algumas prostitutas; um pianista de cabaré, uma figura cadavérica, segurando um leque; uma coruja; um gato preto e um poste de luz, ambos sustentados por fios e prontos para serem manipulados. Curiosamente não observamos nenhuma representação humana de cor negra. Seriam etnicamente brancos, todos os fantoches?

Essas criaturas simbolizam o avesso da vida fácil, fútil, luxuosa, confortável trazida pelo trabalho como apregoava a elite da Belle Époque, cujo esperado progresso não conseguiu alcançar. Nos Fantoches, repete-se a metáfora da manipulação, agora exercida pelas mãos destino, inconscientes do drama em que vivem, ressalta o texto introdutório (Simioni, 2002, p. 127).

São todos, somos todos fantoches (...). Não vê os cordéis do destino a movê-los, a mover-nos? São cordéis imponderáveis (...). E o destino sabe articular-nos com habilidades de contra-regra cruel (...). (Prefácio de Os Fantoches da Meia-Noite, 1921).

Do ponto de vista estilístico, esta obra representa uma ruptura com a estética Art Nouveau muito praticada pelo artista. Ao apresentar um traço econômico e expressivo, Di distancia-se de sua principal referência, Aubrey Beardsley (1872–1898). A decomposição das formas nas figuras de Di, harmoniza-se com as representações pictóricas dos pintores expressionistas. Com relação à metáfora da manipulação – percebemos através da desarticulação das figuras no espaço – uma semelhança ao observarmos os desenhos do artista austríaco Egon Schiele.

Antes de partirmos para a análise formal e semiótica, é necessário informar ao leitor que existem duas reproduções dos Fantoches da Meia-noite, “conservadas em locais públicos”. Uma encontra-se na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e, até nosso último contato, estão trancadas no departamento de iconografia, por conta dos roubos freqüentes ocorridos naquela instituição. No entanto, há outra reprodução na Casa Guilherme de Almeida, transformada em Museu Biográfico em 13 de março de 1979. Serão estes, os Fantoches analisados.

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III - O caminho dos Fantoches

A Casa da Colina: um cenário ermo e desolador

A Casa da Colina recebeu este nome porque localiza-se em canto de morro muito alto na Rua Macapá, 187, no Bairro de Perdizes, em São Paulo. A casa foi projetada pelo arquiteto Silvio Jaguaribe Heckman, em 1945, e residência de Guilherme de Almeida, de 1946 a 1969 e transformada em Museu Biográfico em 13 de março de 1979.

Seu acervo é rico e variado de obras dos principais modernistas brasileiros: Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti, Lasar Segall, Victor Brecheret, Portinari, Antonio Gomide, Paim Vieira, Noêmia Mourão, Samson Flexor, Guignard, Poty. Além das obras plásticas, há móveis antigos, pratarias, objetos de decoração, fotografias, livros, revistas, hemeroteca, correspondência pessoal e documentos.

A consulta a esse material é facultada apenas a pesquisadores, mediante apresentação de carta de recomendação da instituição que referenda a pesquisa. Entre as obras encontradas no museu, destaca-se o álbum Fantoches da Meia-noite. Envolvidos num papel velho e amarelado, os desenhos ficam numa estante metálica. O ambiente não é climatizado, nem monitorado por sistema de segurança, o que torna a subtração dos documentos uma possibilidade bastante exeqüível.

Jurisdicionado à Secretaria Estadual da Cultura, o museu não oferece pessoal especializado para atendimento, não obedece a nenhuma normatização técnica para arquivamento das obras e preenchimento das fichas catalográficas. Resultado: a consulta aos arquivos57, quase sempre, é um ato improdutivo e tedioso. Em razão disso, o pesquisador interessado em investigar os Fantoches da Meia-noite, por exemplo, terá muitas dificuldades. As duas únicas instituições públicas encarregadas de salvaguardar os originais não conservam, nem preservam satisfatoriamente nossa memória, requisito indispensável à produção do conhecimento.

Vejamos o relatório técnico expedido sobre o estado de conservação dos Fantoches depositados na Casa Guilherme de Almeida.

57 Os documentos dos arquivos não sobrevivem por si mesmos; é necessária uma vontade política para salvaguardar e proteger esta herança cultural.

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É lei!

“Um museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento e aberto ao público, que adquire, conserva, pesquisa, comunica e exibe para finalidades do estudo, da instrução e da apreciação, evidência material dos povos e seu ambiente”. 58

No Brasil, a Constituição Brasileira de 1988 traz artigos referentes ao patrimônio cultural brasileiro dentre os quais merecem considerações os seguintes:

Artigo 23º. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; IV- Impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de ouros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

Artigo 30º. Compete aos Municípios: (...) IX- promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. Decreto-lei nº 25 que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional cujo Capítulo I, Artigo 1º. Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. Capítulo II. Do Tombamento. Artigo 26. Os negociantes de antigüidade, de obras de arte de qualquer natureza, de manuscritos e livros antigos ou raros são obrigados a um registro especial no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, cumprindo-lhes, outrossim, apresentar semestralmente às mesmas relações completas das coisas históricas e artísticas que possuírem. (IPHAN, 2004).

Conservar X Conservar

De origem latina, conservar significa manter no lugar, no estado atual. Parece que é exatamente isso que tem sido feito desde sua inauguração. O que seus “mantenedores” não sabem, ou se esqueceram, que conservar também significa amparar, defender, guardar com cuidado, fazer durar. Neste sentido, conservar/esconder impossibilita o conservar/fazer durar. É preciso tornar público o acervo para que haja algum tipo de iniciativa voltada à preservação do mesmo. A Casa Guilherme de Almeida deve ser divulgada e aberta ao público em geral, obedecendo é claro às limitações de circulação no interior do prédio.

58 (ICOM Estatuto, artigo 2, parágrafo. 1. Esta definição foi adotada pelo ICOM Assembléia Geral em Copenhagen em 1974).

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A este respeito Cristina Freire59, em seu livro Poéticas do Processo, afirma que conservar não é somente uma questão técnica, mas é também dar inteligibilidade, na medida em que somente a produção efetiva do conhecimento a partir das coleções é capaz de preservá-las do esquecimento.

Desta forma, a pesquisa que resultou na publicação de Poéticas do Processo60 cumpriu o papel de conservar/fazer durar, pois trouxe à tona não somente um acervo que estava, assim como o da Casa Guilherme de Almeida, esquecido nos armários de aço nos corredores do MAC – Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, mas conferiu-lhe inteligibilidade, fazendo com que novos pesquisadores possam lançar outros olhares sobre este tão preciso patrimônio material e imaterial de uma sociedade em transformação. Em certo sentido, este trabalho dialoga com a pesquisa de Cristina Freire, pois, ao tentar dar visibilidade aos Fantoches da Meia-noite, descobrimos que o museu “conserva” em suas estantes uma série de outras obras desconhecidas do público e até mesmo de muitos pesquisadores.

Estes não são os únicos casos de indiferença praticados pelo Estado em relação ao patrimônio cultural. É sabido que diversos museus, bibliotecas e casas de cultura convivem com o mesmo problema. Por isso é necessário criar ações, a fim de desencadear um processo contínuo de disseminação dos acervos, começando pela digitalização dos mesmos, do contrário perderemos nosso referencial histórico.

Entendemos que esta colocação se fez necessária para esclarecer um fato determinante na análise do álbum em questão: são diferentes, como demonstraremos nas próximas páginas.

59 Profa. Dra. Cristina Freire é pesquisadora, escritora e docente da Universidade de São Paulo.60 O livro resgata um acervo que ficou guardado no Museu de Arte Contemporânea por mais de vinte anos. Nele se encontram obras de Regina Silveira, Julio Plaza, Anna Bella Geiger, Krzysztof Wodiczko entre outros artistas consagrados do Brasil e do exterior. São fotos, desenhos, cartões-postais e projetos de instalações.

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Fantoches x Fantoches

Vejamos a diferença entre as capas: o álbum acima (Casa Guilherme de Almeida)apresenta uma interferência proporcionada pelo acréscimo de tinta amarela sobre osolhos dos gato. Observemos as demais pranchas azuis, com atenção, pois, cada uma delas apresenta um tipo de interferência.

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Di desenha as mãosde seus Fantochesseguindo o estilo deEgon Schiele, ao lado.

Este desenho de George Grosz é uma síntesedos Fantoches da Meia-noite, pois, reúne namesma cena, vários dos tipos reproduzidospelo artista brasileiro.

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Os olhos da prostituta com os seiosde fora - de Di Cavalcanti - receberamtratamento semelhante.

Olhos, detalhe,Egon Schiele.

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Munch antecipou Di aoutilizar as “mãos” destaforma: invandindo a cenade fora para dentro.

A composição de Schiele, juntamente com o tratamento dado às mãos, nos remete ao desenho de Di, pois, as mas-sas composicionaissão bem parecidas.Em “Autovidentes”,de Schiele, o leque,símbolo da BelleÉpoque, não cabemais.

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Os traços marcantes praticados por Schiele no desenho do bebê nu, se assemelham com os desenhos desses dois Fantoches. Aqui o rompi-mento com o estilo Art Nouveau é explícito.

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Uma questão!

Gostaríamos de especular acerca de uma incerteza que envolve esta obra gráfica. Para isso teremos de recorrer a uma simples conta matemática.

Os Fantoches da Meia-noite depositados na Casa Guilherme de Almeida - no encarte que acompanha os desenhos, traz o número 39. Ao que nos parece, trata-se do número da tiragem. Aquele seria o conjunto 39 de?

Pois bem!

O álbum, como disse Mário de Andrade, foi reproduzido em edição de luxo pela Editora Monteiro Lobato e, portanto para que se estabelecesse uma relação de custo/benefício a definição da tiragem seria fundamental, caso contrário, não pagaria os custos de produção. Como é ainda hoje, pois, mesmo com o surgimento de novas tecnologias, a reprodução de materiais gráficos é uma empreitada cara. Vejamos o comentário de Menotti del Picchia a respeito dos custos de produção da Revista Klaxon, em 1922:

Klaxon, magrinho de papel, custa uma fortuna. (...) Mas Klaxon é orgulhoso e vende-se caro. Se ninguém o ler, paciência. Klaxon não se queixará jamais de ser incompreendido pelo Brasil. O Brasil é que se esforçará para compreender Klaxon. (Picchia apud Martins, 2001, p. 551)

Se considerarmos que o número ideal fosse de 100 conjuntos, teríamos então a seguinte conta matemática:

Item 1: 100 Capas

Item 2: 100 Encartes

Item 3: 100 X 16 pranchas = 1.600

Somando:

1.600 (pranchas) + 200 (capas e encartes) = 1.800 peças gráficas.

Atualmente, “acessível” ao público existem 36 peças gráficas, ou seja, dois conjuntos completos, aquele da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e o da Casa Guilherme de Almeida. Existiriam, então, 1.564 peças gráficas independentes ou 61 conjuntos completos.

Mas onde?

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Durante esta pesquisa entramos em contato com a Biblioteca Mário de Andarade, com o IEB – Instituto de Estudos Brasileiros, com o MAC – Museu de Arte Contemporânea, mas que na verdade é um “templo” modernista. Consultamos o MAM – Museu de Arte Moderna de São Paulo, que mantém um acervo predominantemente contemporâneo, e o MASP – Museu de Arte de São Paulo, além do acervo do estimado José Mindlin e não encontramos nenhum fragmento da obra em questão. Por tratar-se de um conjunto de peças avulsas esta possibilidade exisitiria. Consultamos ainda a filha do autor, mas não encontramos nada. A propósito nem ela sabia da existência do conjunto depositado na Casa Guilherme de Almeida.

Estariam as 1.564 peças gráficas em acervos particulares? Mas se a tiragem final for de 39, o que é estranho, ainda estamos falando de 702 peças. Yan de Almeida, Prado em entrevista a Folha de São Paulo, em 13 de fevereiro de 1982, recorda-se dos primeiros tempos de Di Cavalcanti em São Paulo:

Naquela época as ilustrações eram importantes, porque a fotografia jornalística apenas começava. Di Cavalcanti ficou conhecendo Paulo Prado, que comprou seus “Fantoches da Meia-Noite”, obra de muito boa qualidade, e pagou regiamente. Antes, o depois o pintor fizera uma exposição e não vendera coisa alguma. Mais tarde, Di Cavalcanti voltou para o Rio, de onde, ajudado pelo “Correio da Manhã”, foi para Paris.

O depoimento de Yan revela-nos que, de fato, as vendas não foram das melhores, portanto este material – supostamente – fora cordialmente distribuído entre os amigos de Di Cavalcanti e Monteiro Lobato, o patrocinador da obra. Se admitirmos esta possibilidade, os presenteados da época já teriam se movimentado no sentido de restaurar as mesmas, pois, como observamos no Relatório Técnico emitido pelo Atelier contratado pela Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, após 86 anos de sua produção, este tipo de material, se não for conservado adequadamente, deteriora-se rapidamente.

Será que os supostos presenteados não acreditavam no desenvolvimento do futuro do artista e acabaram se livrando daquele excesso de papel depositado em suas estantes? Estariam as criaturas notivagas representadas pelo artista, condenadas a ficarem às margens da história da arte “brasileira”?

Infelizmente não conseguimos responder tais questões, mas tentaremos retomá-las numa próxima oportunidade.

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Aspectos formais

Quantos de nós vêem?

A força cultural e universal do cinema, da fotografia e da televisão, na configuração da auto-imagem do homem, dá a medida da urgência do ensino de alfabetismo visual, tanto para os comunicadores quanto para aqueles aos quais a comunicação se dirige. Em 1935, Moholy-Nagy, professor da Bauhaus, disse: Os iletrados do futuro vão ignorar tanto o uso da caneta quanto o da câmera (Moholy-Nagy apud Dondis, 2003, p.4).

A pergunta feita por Donis A. Dondis, em seu livro Sintaxe da Linguagem Visual, parte de uma demanda: a necessidade de se alfabetizar visualmente todos os tipos de pessoas, aperfeiçoando ao máximo sua capacidade. Não só de criadores, mas também de receptores de mensagens visuais, pois somente os visualmente sofisticados podem elevar-se acima dos modismos e fazer seus próprios juízos de valor sobre o que consideram apropriadamente agradáveis.

Entendemos que o livro em questão oferece a metodologia necessária para realizarmos as análises dos três desenhos escolhidos, portanto, este será nosso referencial teórico para resolver tais questões. Ao falar sobre o Expressionismo, Dondis reforça a idéia da representacionalidade, uma tentativa sincera de fazer com que as coisas pareçam mais reais: tentativa que fracassa pela falta de técnica. Para ela, o Expressionismo sempre dominou a obra de artistas individuais ou de escolas inteiras, cuja produção pode ser caracterizada por sentimentos intensos e por grande espiritualidade

(Dondis, 2003, p. 171).

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Acrescentamos ainda que as características expressionistas citadas por Dondis, como: exagero, espontaneidade, atividade, complexidade, ousadia, variação, irregularidade, justaposição, distorção e verticalidade serão procuradas nas três imagens dispostas abaixo.

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Cláudio César Gonçalves alerta sobre a utilização de métodos e sistemas de análise, vale ressaltar que o pesquisador criou seu próprio método para analisar as capas de livros modernistas e a capas de discos produzidas no período da Tropicália.

Qualquer sistema de análise, normalmente desenvolve um grande número de ferramentas para a fragmentação investigativa e por decorrência acaba identificando elementos e idéias que talvez o próprio autor nem se dê conta de ter usado. O fato é que o sistema olha através da formação e das referências do autor/criador e vê suas influências, seus sentimentos talvez não explicitados, mas certamente participantes da construção do objeto. Em outras palavras ainda, tudo aquilo que o autor/criador conhece, gosta, prefere, crê, imagina, intui, odeia, renega, respeita, faz parte do resultado do projeto enquanto este tenta satisfazer um necessidade, que poder ser estética, comercial, técnica ou expressiva. Estes são os aspectos que podem ser ‘identificáveis’ e analisados. (Gonçalves, 2000, pg. 86)

Dondis afirma que o expressionismo sempre dominou a obra de artistas individuais ou de escolas inteiras, cuja produção pode ser caracterizada por sentimentos intensos e por grande espiritualidade e acrescenta:

A Idade Média, por exemplo, produziu um dos maiores exemplos desse estilo, o gótico. Foi um período histórico cheio de erros, simbolizado pelas Cruzadas, um exercício de dois séculos de futilidade. Através de tudo isso, porém, num gesto contínuo de devoção a Deus e de procura da salvação eterna no céu, as pessoas juntaram seus esforços para construir suas igrejas como uma oferenda as cidades...O movimento para cima, atenuado pelo uso intenso das linhas verticais, dava a quem se encontrasse em seu interior uma sensação de estar levitando e sendo alçado aos céus...El Greco e Kokoschka, cujas obras podem ser fortemente associadas aos mosaicos do Império Bizantino. Seja no gótico ou no bizantino, ou ainda na obra de artistas individuais, o estilo expressionista está presente sempre que o artista ou designer procura evocar a máxima resposta emocional no obervador. (Dondis, 2003, p.173)

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Aspectos semióticos

Se no século XIX, Baudelaire via a cidade como uma floresta de símbolos, hoje é o planeta e suas cercanias, nossas moradas e nosso próprio corpo que se tornaram densas florestas das mais variadas espécies de signos, imagens, sinais e símbolos. A semiodiversidade, a diversidade semiórica do mundo está se tornando cada vez mais vasta e profunda. (Santaella, 2004, s.p.)

Diferentemente da lingüística, que se restringe ao estudo dos signos lingüísticos, ou seja, do sistema sígnico da linguagem verbal, a Semiótica têm por objeto qualquer sistema sígnico – artes visuais, música, fotografia, cinema, culinária, vestuário, gestos, religião, ciência, etc. As discussões concernentes a esta ciência podem retroceder a pensadores como Platão e Santo Agostinho, por exemplo. Entretanto, somente no início do século XX, com os trabalhos paralelos de Ferdinand de Saussure e Charles Sander Peirce (1839-1914), começou a adquirir autonomia e o status de ciência.

No Brasil, Lucia Santaella, semioticista, há anos, dedica-se à difícil tarefa de dar visibilidade à vastíssima obra de Peirce, em sua maioria, inédita. A teoria da percepção peirceana não foi construída de um só golpe. Ao contrário, foram muitos os impasses que Peirce enfrentou por conta dos aspectos conflitantes que a percepção apresenta. Esses conflitos foram sendo trabalhados ao longo de muitos anos, de modo que só é possível se ter uma visão mais clara da gradual superação dos impasses quando se chega a um conhecimento mais global da obra (Santaella, 2004, p. 48). Pierce concluiu que tudo o que parece a consciência, assim o faz numa gradação de três propriedades que correspondem aos três elementos formais de toda e qualquer experiência. Essas categorias foram denominadas: 1) Qualidade; 2) Relação e 3) Representação. Algum tempo depois, o termo Relação foi substituído por Reação e o termo Representação recebeu a denominação mais ampla de Mediação. Para fins científicos, Pierce preferiu fixar-se na terminologia de Primeiridade, Segundidade e Terceiridade:

Primeiridade: É o que é. A qualidade da consciência imediata é uma impressão (sentimento) in totum, invisível, não analisável, frágil. Tudo que está imediatamente presente à consciência de alguém. É a impressão não analisável. É o presente no presente. A primeiridade não ocupa nem espaço nem tempo. Não se articula porque não tem partes ou unidades. É aquilo que ainda é imperceptível. Nessa medida, o primeiro (primeiridade) é presente e imediato, ele é inicialmente, original, espontâneo e livre, ele precede toda síntese e toda diferenciação. É o azul sem o céu, só o azul...

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Secundidade: É a existência real e reativa, independente do pensamento. É o mundo dos fenômenos, dos fatos, das coisas externas. É a consciência em relação ao mundo, é a ação. A secundidade ocupa tempo e espaço, é a qualidade encarnada numa matéria. É o existir, é corporificação material, é a tensão material. A secundidade é a relação diática = qualidade + efeito, que se apresenta aos nossos sentidos. É estarmos vivo e reagir em relação ao mundo. Onde quer que haja um fenômeno, há uma qualidade, isto é, sua primeiridade. São as imagens, tanto as reais como a mentais, é a experiência, é o curso da vida. É o eu não eu de uma consciência dupla. É o caráter factual, ação e reação sem mediação. Só o céu...

Terceiridade: Aproxima a Primeiridade e a Secundidade numa síntese intelectual triádica. É o que dá inteligibilidade (inteligência que advém da experiência), é o pensamento em signos para signos, é quando através da linguagem representamos e interpretamos o mundo. O azul no céu ou o azul do céu... Terceiridade corresponde à camada de inteligibilidade, ou pensamento em signos, através da qual representamos e interpretamos o mundo. Por exemplo: o azul, simples e positivo azul, é o primeiro. O céu, como lugar e tempo, aqui e agora, onde se encarna o azul é um segundo. A síntese intelectual, elaboração cognitiva – o azul no céu, ou o azul do céu – é um terceiro. A terceiridade, vai além deste especto de estrutura verbal da oração, ou seja, o indivíduo conecta a frase à sua experiência de vida, fornece à oração, um contexto pessoal.

Para Peirce, há três tipos de signos:

O Ícone, que mantém uma relação de proximidade sensorial ou emotiva entre o signo, representação do objeto, e o objeto dinâmico em si – exemplo: pintura, fotografia, o desenho de um boneco. É importante ressaltar que um ícone não só pode exercer esta função como é o caso do desenho de um boneco de homem e mulher que ficam anexados à porta do banheiro, indicando se é masculino ou feminino, a priori é ícone, mas também é simbolo, pois ao olhar para ele reconhecemos que ali há um banheiro e que é do gênero que o boneco representa, isto porque foi convencionado que assim seria, então ele é ícone e símbolo.

O Índice, ou parte representada de um todo anteriormente adquirido pela experiência subjetiva ou pela herança cultural – exemplo: onde há fumaça, logo há fogo. Isso quer dizer que através de um indício (causa) tiramos conclusões. Ainda sobre o que nos diz este autor, é importante referir que um signo, ou representamen, é qualquer coisa que está em vez de (stands for) outra coisa, em determinado aspecto ou a qualquer título (e que é considerado representante ou representação da coisa, do objecto – a matéria física) e, por último, o “interpretante” – a interpretação do objecto. Por exemplo, se estivéssemos falando de “cadeira”, o representante seria o conceito