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A teoria da imprevisão diante da realidade

brasileira

SWISSCAM

14 de novembro de 2008

A teoria da imprevisão diante da realidade brasileira

Introdução: A Teoria da Imprevisão, hámuito tempo adotada no âmbito contratual pela doutrina e pela jurisprudência brasileira, por meio da aplicação da cláusula rebus sic stantibus, ganhou previsão legal expressa no Código Civil de 2002. Diante de uma realidade econômica globalizada e sujeita a variações e crises, é importante estar atento aos preceitos da Teoria da Imprevisão e, principalmente, como ela tem sido abordada

pelos tribunais brasileiros.

A teoria da imprevisão diante da realidade brasileira

Histórico:

Início

- Há 2.300 anos – babilônicos - Código de Hamurabi

Ajustes condicionados a efeitos futuros capazes de modificar o estado de fato no momento da contratação.

- Direito Romano - berço da cláusula rebus sic stantibusA obrigação condicionada à permanência das coisas no estado em que se deu a promessa.

Conteúdo da cláusula: contractus qui habent tractum sucessivum etdependentiam de futuro, rebus sic standibus intelliguntur.(Os pactos de execução continuada e dependente do futuro entendem-se permanecendo como estão.)

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Histórico:

Declínio

- Liberalismo e Revoluções Burguesas - a aplicação da rebus sic stantibus sofreu forte queda - Código de Napoleão consagrou o princípio da pacta sunt servanda - Exaltação dos burgueses àautonomia da vontade e liberdade contratual.

Ressurgimento

- Início do século XX - transformações sociais e econômicas -ressurge o rebus sic stantibus - expressão da busca pela intervenção na liberdade de contratar para garantir o bem comum, a eqüidade, a boa-fé e o equilíbrio contratual.

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Conceito:

A Teoria da Imprevisão decorre da cláusula rebus sic stantibus, que significa que, nas convenções que gerassem obrigações sucessivas ou dependentes do futuro, o seu cumprimento ficaria condicionado à permanência do estado de fato contemporâneo da formação do vínculo. É uma cláusula implícita que pugna para que certos acontecimentos imprevistos – acarretadores de impossibilidade subjetiva e de uma suma onerosidade para o devedor – tenham força bastante para exonerá-lo das obrigações assumidas. Uma convenção só vigora durante o tempo em que o estado de coisas existentes no momento onde ela se passou não sofreu modificações essenciais.

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- A Teoria da Imprevisão não foi acolhida pelo Código Civil de 1916 que, inspirado na tradição liberal e individualista do Código Civil francês, era fiel ao princípio pacta sunt servanda, só admitindo raras exceções.

- Entretanto, ela já era acolhida, desde os meados do século passado, por renomados juristas, dentre os quais Arnoldo Medeiros da Fonseca, Francisco Campos, Eduardo Espínola e Caio Mário da Silva Pereira. A primeira decisão sobre a imprevisibilidade foi proferida por Nélson Hungria, em 1930.

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“Há, porém, a considerar, na espécie, que um evento extraordinário, imprevisto e imprevisível, veio alterar profundamente o ambiente objetivo dentro do qual se operava o acordo de vontades, a voluntas contrahendum. Ora, a resolubilidade dos contratos de execução futura, em virtude de subseqüente mudança radical no estado de fato, não é contemplada expressamente em nossa lei civil, mas decorre dos princípios gerais de Direito e exprime um mandamento de eqüidade. A jurisprudência, com o apoio da doutrina, tem decidido que tais contratos devem entender-se rebus sic stantibus et in eondemstatu momentibus. É uma cláusula resolutória implícita, subentendida. Desde o momento que um fato inesperado e fora da previsão comum destrói por completo a equação entre prestação e a contra-prestação ajustadas, deixa de subsistir o que Oertmann chama a base do contrato (Geschäftsgrundlage), isto é, o pensamento das partes, manifestado no momento de celebrar-se o contrato, acerca da existência das circunstâncias determinantes. (...)É certo que quem assume uma obrigação a ser cumprida em tempo futuro sujeita-se à alta dos valores, que podem variar em seu proveito ou prejuízo; mas, no caso de uma profunda a inopinada mutação, subversiva do equilíbrio econômico das partes, a razão jurídica não pode ater-se ao rigor literal do contrato, e o juiz deve pronunciar a rescisão deste. A aplicação da cláusula rebus sic stantibus tem sido mesmo admitida como um corolário da teoria do erro contratual.”- Decisão prolatada pelo então Juiz Nélson Hungria, 5ª Vara Cível do Distrito Federal (Rio de Janeiro), em 27.10.1930, publicada na Revista de Direito 100/178.

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Requisitos:

Segundo Caio Mário da Silva Pereira:

a) vigência de um contrato de execução diferida ou sucessiva; b) alteração radial das condições econômicas objetivas no momento da execução, em confronto com o ambiente objetivo no momento da celebração; c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para o outro; d) imprevisibilidade daquela modificação.

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Requisitos:

Contratos de execução continuada: contratos que se cumprem por meio de atos reiterados e que, portanto, a prestação "tem de ser cumprida durante certo período de tempo, continuadamente", conforme lição do mestre Orlando Gomes.

Contratos de execução diferida: contratos que devem ser cumpridos em um só ato, mas em momento futuro, uma vez que a execução é postergada em virtude de cláusula que a subordina a um termo (entrega, em determinada data, do objeto alienado, p.ex.).

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Requisitos:

Acontecimentos extraordinários e imprevisíveis: acontecimentos extraordinários, incomuns, inesperados, imprevistos e imprevisíveis pelos contratantes no momento da celebração do contrato.

Segundo Sílvio de Salvo Venoza: "Em primeiro lugar, devem ocorrer acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. Como examinamos, tais acontecimentos não podem ser exclusivamente subjetivos. Devem atingir uma camada mais ou menos ampla da sociedade.Caso contrário, qualquer vicissitude na vida particular do obrigado serviria de respaldo ao não-cumprimento da avença. Um fato seráextraordinário e anormal para o contrato quando se afastar do curso ordinário das coisas. Será imprevisível quando as partes não possuírem condições de prever, por maior diligência que tiverem. Não podemos atribuir a qualidade de extraordinário ao risco assumido no contrato em que estavam cientes as partes da possibilidade de sua ocorrência"

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Requisitos:

Prestação excessivamente onerosa para uma das partes: alteração do montante da prestação - de forma grave, substancial e custosa - ao ponto de tornar o seu cumprimento um sacrifício muito além do que poderia antever o prejudicado no momento da celebração do contrato, comprometendo assim a viabilidade econômica deste.

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Requisitos:

Exagerada vantagem para a outra parte: enriquecimento indevido - lucro exorbitante aproveitado pela parte contratante que não sofre a onerosidade excessiva, e que reflete, de conseguinte, num considerável aumento patrimonial a seu favor.

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Aplicação no Brasil:

- Código Civil de 1916 não continha previsão expressa que autorizasse a adoção da Teoria da Imprevisão, mas os tribunais brasileiros já a aplicavam, por eqüidade, amenizando e limitando o princípio da pacta sunt servanda.

- Uma das grandes mudanças trazidas pelo Código Civil de 2002 foi justamente a positivação da Teoria da Imprevisão, como condição limitadora da pactasunt servanda, por meio dos artigos 317 e 478.

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Artigos 317 e 478:

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

(Ambos sem correspondência no Código Civil de 1916.)

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Aspectos legais:

- Confirmaram-se, portanto, os requisitos já adotados pela doutrina e pela jurisprudência até então.

- Conceitos abertos e subjetivos (“cláusulas gerais”) - muito presentes no Novo Código Civil - delegam ao juiz a função de interpretar e aplicar a norma a cada caso conforme seu entendimento da situação.

- Capacidade de adaptação temporal e contextual da norma, fazendo com ela possa valer por muito tempo, porém com diferentes interpretações ao longo de cada período.

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Aspectos legais:

- Segundo o artigo 478, a regra é a resolução do contrato, e não a revisão - Críticas por parte de estudiosos do Direito. Alguns doutrinadores têm proposto a utilização do artigo 317 como forma de suprir a redação do artigo 478, a fim de possibilitar a revisão dos contratos.

- Artigo 479 – A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.

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Aspectos legais:

- Os próprios magistrados já têm aceitado a aplicação do artigo 478 com vistas à revisão do contrato:

Enunciado nº 176 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: Em atenção ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, o art. 478 do Código Civil de 2002 deveráconduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos contratos e não à resolução contratual.

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Aspectos legais:

- Em relação ao requisito da imprevisibilidade, háentendimentos no seguinte sentido:

Enunciado nº 175 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: A menção àimprevisibilidade e à extraordinariedade, insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas também em relação às conseqüências que ele produz.

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Análise Jurisprudencial:

- Para uma análise adequada da Teoria da Imprevisão, concluímos que não basta o estudo de seu histórico doutrinário. O que realmente importa para os operadores do Direito, nesse caso, é o estudo de como essa teoria tem sido tratada pela jurisprudência e como a sua aplicação se dá na prática.

- Iniciamos, portanto, uma análise do posicionamento da jurisprudência brasileira acerca do tema, mesmo antes de a Teoria da Imprevisão conter previsão expressa no Código Civil.

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Decisões sob a vigência do Código Civil de 1916:

Por eqüidade, mesmo sem haver previsão expressa na lei, o STJ já aceitava a Teoria da Imprevisão.

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Caso 1Recorrente: Caixa Econômica do Estado de Minas Gerais Recorrido: Almir Fernandes de Souza

- Execução fundada em cédula rural pignoratícia. O executado alegava que o mútuo visava a financiar atividades rurais que foram muitíssimo prejudicadas por enchentes que atingiram a região.

- O Tribunal de Minas Gerais havia entendido como possível a aplicação da Teoria da Imprevisão no caso. O STJ, contudo, reformou a decisão, por entender que não estavam presentes os requisitos para a adoção de tal teoria.

- O STJ, apesar de admitir a validade da Teoria da Imprevisão, entendeu que no caso específico não estavam presentes todos os requisitos para a sua aplicação. É um exemplo interessante que demonstra como uma mesma situação pode ser interpretada de maneiras diferentes pelo Judiciário.

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Caso 2Recorrente: Muanis Imobiliária Ltda. Recorridos: Augusto Valentim Filho e sua mulher

- Acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro havia mantido a sentença monocrática, indeferindo a ação revisional de contrato por parte da imobiliária.

- O Tribunal entendeu que não havia nenhum caráter imprevisível na alta da inflação que sucedeu o Plano Cruzado I.

-O STJ, contudo, reformou a decisão do Tribunal, entendendo que, no caso em questão, mesmo não havendo a previsão de correção monetária no contrato, esta deveria ser aplicada em decorrência da Teoria da Imprevisão.

- É um caso típico das alterações abruptas que a economia brasileira vinha vivenciando em decorrência de vários planos econômicos.

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-Para os contratos onde já havia a previsão de correção monetária, o STJ acabou assentando sua jurisprudência no seguinte sentido em relação à alta da inflação posterior ao Plano Cruzado:

Caso 3Agravante: Marcos José de Carvalho Fontes e cônjugeAgravado: Encol S/A Engenharia Comércio e Indústria SEGUNDO A JURISPRUDENCIA DO STJ, E INAPLICAVEL A TEORIADA IMPREVISÃO, PARA ACARRETAR REAJUSTAMENTOS DO PREÇO DE IMOVEL, QUANDO NÃO OCORRENTES CAUSAS OU ACONTECIMENTOS EXCEPCIONAIS E IMPREVISIVEIS, CAPAZES DE INVIABILIZAR O CUMPRIMENTO DA AVENÇA, SEM GRAVES PREJUIZOS PARA UMA PARTE, OU POR ENRIQUECER INDEVIDAMENTE A OUTRA.(AgRg no Ag n°51.186-3-DF; Relator Ministro Waldemar Zveiter; Julgado em 26 de setembro de 1994.)

- Nessas hipóteses, o STJ admitiu a Teoria da Imprevisão apenas até o limite da correção monetária, não aceitando a alteração de valores das prestações.

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Decisões sob a vigência do Código Civil de 2002:

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- O próximo exemplo trata da possibilidade de revisão de contrato administrativo, no âmbito da maxidesvalorização do Real em 1999.

Caso 4Recorrente: Moura Informática Ltda.Recorrido: União

Com efeito, o episódio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na súbita desvalorização da moeda nacional (real) frente ao dólar norte-americano, configura causa excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos, com vistas à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das partes. In casu, o objeto do contrato era a instalação de softwares de segurança para acesso às dependências externas do Tribunal contratante. Destaque-se que o material, objeto de aquisição pela empresa contratada era importado e, conseqüentemente, cotado em dólar; fato econômico inegável que culminou, consoante pública e notória, na quebra de empresas de médio a grande porte.

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- Os próximos casos tratam da alta no preço da soja ocorrida em 2003. Muitos produtores que haviam firmado contrato de venda de safra futura por preço certo, pleitearam a resolução por onerosidade excessiva. Para decidir essa situação, o STJ apoiou-se na natureza do negócio em questão, entendendo que a Teoria da Imprevisão não seria aplicável.

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Caso 5Recorrente: Abadia Cândida GomesRecorrido: Caramuru Alimentos Ltda.

CIVIL. CONTRATO. VENDA. SAFRA FUTURA. SOJA. COTAÇÃO. MUDANÇA. ALTERAÇÃO E RESOLUÇÃO DA AVENÇA. IMPOSSIBILIDADE.1 - A venda de safra futura, a preço certo, em curto espaço de tempo, há de ser cumprida pelas partes contratantes. Alterações previsíveis na cotação do produto (soja) não rendem ensejo à modificação da avença ou à sua resolução. Precedentes deste Tribunal.2 - Recurso especial não conhecido.

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Caso 6

Recorrente: Cargill Agrícola S/A

Recorrido: Luiz Ferreira Lima

"DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA.”

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- O próximo caso é interessante, pois, apesar de envolver a maxidesvalorização do Real em 1999 e um contrato celebrado com banco, não foi admitida a Teoria da Imprevisão, nem aplicado o Código de Defesa do Consumidor.

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Caso 7Recorrente: Frigorífico Califórnia Ltda. e outrosRecorrido: Banco Bradesco S/ACrédito documentário. Importação e exportação. Variação do dólar em decorrência da maxidesvalorização. Código de Defesa do Consumidor. Não-configuração da onerosidade excessiva nem da teoria da imprevisão relativamente ao importador e ao banco emitente da garantia.1. Embora pertinente o enquadramento da relação entre o importador e o banco emitente da garantia no Código de Defesa do Consumidor, não é possível enxergar onerosidade excessiva ou a teoria da imprevisão, porquanto o banco é apenas um garantidor da operação comercial entre o exportador e o importador, assegurando o pagamento da obrigação assumida pelo último, nos termos e valores contratados, não podendo receber menos do que pagou em razão da garantia decorrente do crédito documentário.

- Apesar de o STJ já ter admitido a revisão de contratos em razão da abrupta variação cambial, nesse caso específico, tendo em vista a natureza do contrato e a condição do banco como mero garantidor, não foi aceita a aplicação da Teoria da Imprevisão.

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Caso 8Recorrente: São Bento Mineração S/ARecorrido: Cap – Participação Ltda. e outro

CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE PAGAMENTO DE COMPRA E VENDA DE DIREITOS MINERÁRIOS. PARTE VARIÁVEL. PERCENTUAL SOBRE FATURAMENTO BRUTO PAGO TRIMESTRALMENTE ATÉ O ESGOTAMENTO DA JAZIDA. QUITAÇÃO TRIMESTRAL. INFLAÇÃO EXACERBADA. DEFASAGEM DO VALOR DA MOEDA ATÉ A DATA DO PAGAMENTO TRIMESTRAL. TEORIA DA IMPREVISÃO. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. RECONHECIMENTO DA PERDA EXCESSIVA PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA RECURSAL. RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADO. SÚMULAS N. 5 E 7-STJ.

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Decisões nas quais foi aplicado o Código de Defesa do Consumidor:

- Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que, para os casos em que é possível aplicar o Código de Defesa do Consumidor, não énecessário que o fato seja imprevisível, bastando apenas que este seja superveniente à celebração do contrato e que torne as prestações excessivamente onerosas.

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Segundo o Código de Defesa do Consumidor: Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:(...)V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; (Original sem grifos.)

- Na época da maxidesvalorização do Real, em 1999, houve uma enxurrada de ações de revisão de contratos de arrendamento mercantil de veículos (leasing). O STJ assentou seu entendimento da seguinte forma:

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Caso 9Recorrente: Finasa Leasing Arrendamento Mercantil S/ARecorrido: Benedito Tadeu Cesar

Aplicabilidade do art. 6º, inciso V, do CDC - Onerosidade excessiva caracterizada.Aplicam-se as disposições do CDC aos contratos de arrendamento mercantil.O preceito insculpido no inciso V do artigo 6º do CDC dispensa a prova do caráter imprevisível do fato superveniente, bastando a demonstração objetiva da excessiva onerosidade advinda para o consumidor.É ilegal a transferência de risco da atividade financeira, no mercado de capitais, próprio das instituições de crédito, ao consumidor, ainda mais que não observado o seu direito de informação (arts. 6°, III, 31, 51, XV, 52, 54, § 3º, do CDC).

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Caso 10Recorrente: Fibra Leasing S/A Arrendamento MercantilRecorrido: Odir Camargo Júnior

DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DA VALORIZAÇÃO CAMBIAL ENTRE ARRENDANTES E ARRENDATÁRIOS. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO.- Segundo assentou a jurisprudência das Turmas que integram a Segunda Seção desta Corte, os contratos de leasing submetem-se ao Código de Defesa do Consumidor.- A cláusula que atrela a correção das prestações à variação cambial não pode ser considerada nula a priori, uma vez que a legislação específica permite que, nos casos em que a captação dos recursos da operação se dê no exterior, seja avençado o repasse dessa variação ao tomador do financiamento.- No caso dos contratos de leasing atrelados à variação cambial, os arrendatários, pela própria conveniência e a despeito do risco inerente, escolheram a forma contratual que no momento da realização do negócio lhes garantia prestações mais baixas, posto que o custo financeiro dos empréstimos em dólar era bem menor do que os custos em reais. A súbita alteração na política cambial, condensada na maxidesvalorização do real, ocorrida em janeiro de 1999, entretanto, criou a circunstância da onerosidade excessiva, a justificar a revisão judicial da cláusula que a instituiu.

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Caso 10Recorrente: Fibra Leasing S/A Arrendamento MercantilRecorrido: Odir Camargo Júnior

Contendo o contrato opção entre outro indexador e a variação cambial e tendo sido consignado que os recursos a serem utilizados tinham sido captados no exterior, gerando para a arrendante a obrigação de pagamento em dólar, enseja-se a revisão da cláusula de variação cambial com base no art. 6º-V do Código de Defesa do Consumidor, para permitir a distribuição, entre arrendantes e arrendatários, dos ônus da modificação súbita da política cambial com a significativa valorização do dólar americano.

- Nesse caso do leasing, para os casos em que se ficou comprovadoque os recursos utilizados tinham sido captados no exterior, o STJ decidiu pela distribuição proporcional do ônus que tal variação cambial abrupta gerou. Adotando-se essa solução, impõe-se ao arrendatário o dever de adimplir o saldo devedor formado a partir de 19 de janeiro de 1999, reajustado pela metade das diferenças resultantes da variação cambial.

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Enquadramento no Código de Defesa do Consumidor (Lei n°8.078/90):

Art. 2°Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Art. 3°Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.(...)

§ 2°Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

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Enquadramento no Código de Defesa do Consumidor (Lei n°8.078/90):

-Todavia, há algumas situações, como no Caso 7, em que, mesmo sendo possível o enquadramento no Código de Defesa do Consumidor, não foi reconhecida nem a desproporcionalidade das prestações nem a onerosidade excessiva.

- Pela análise das decisões do STJ, conclui-se que o Judiciário enfoca a sua preocupação no equilíbrio das relações contratuais. Mesmo nos casos de leasing, por exemplo, o ônus da alta do dólar foi repartido entre os bancos e os consumidores, uma vez que os bancos também tinham que honrar as suas obrigações no exterior.

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Crise atual:

-Empresas exportadoras e a opção por contratos de derivativos.

- A crise econômica iniciada nos Estados Unidos fez com que a cotação do dólar americano se elevasse no Brasil, causando grandes prejuízos a essas empresas exportadoras que optaram por contratos de derivativos ou por outras convenções atreladas à variação cambial.

-A disputa, contudo, nesse caso específico, não deve se consolidar como um litígio “de massa”: (i) a renegociação dos contratos com os bancos tem sido a melhor saída encontrada, tendo em vista que uma disputa judicial em época de escassez de crédito é delicada para as empresas, assim como étambém para os bancos, diante do risco de não receberem o valor devido por elas; (ii) a Justiça tem extinguido alguns processos sem julgá-los porque os contratos com os bancos contêm cláusulas de arbitragem.

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Conclusões:

- No âmbito da jurisprudência de nossos tribunais, a Teoria da Imprevisão pode ser aplicada de formas diferentes por cada magistrado, sendo incerto qual será o tratamento definitivo dado a cada problemática, até que se chegue no STJ. Este, por sua vez, costuma aplicar a Teoria da Imprevisão de forma ponderada, sempre considerando a natureza de cada negócio em questão.

- As operações atuais estão cada vez mais complexas, o que requer um conhecimento profundo de seus aspectos, para que se possa decidir qual tratamento lhes deve ser dado. Justamente por essa razão, esses contratos mais recentes têm tido a arbitragem como forma de solução de controvérsias. Resta aguardar, portanto, qual tratamento será dado por esses tribunais arbitrais, que têm uma visão muito mais técnica e especializada dos negócios e operações em questão.

Obrigada!

Sonia Marques Döbler

Fabiana Nitta

Carla do Couto Longo Hellu

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