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23/9/2014 SANTA MARIA DEI FIORI http://www.freemasons-freemasonry.com/13carvalho.html 1/7 Rivista di Massoneria - Revue de Franc-Maçonnerie - Revista de Masonerìa - Revista de Maçonaria History Literature Music Art Architecture Documents Rituals Symbolism MONOGRAFIAS MAÇÔNICAS pelo Ven.Irmão WILLIAM ALMEIDA DE CARVALHO 33 SANTA MARIA DEI FIORI, Florença a Maçonaria Operativa e a Descoberta da América "O livro destrói a catedral, i.e. o alfabeto destrói a imagem" Humberto Eco “A catedral de Burgos tem trinta metros de altura E as pupilas dos meus olhos dois milímetros de abertura. Olha a catedral de Burgos com trinta metros de altura!” António Gedeão I - Introdução Estive na primavera de 2004 excursionando pela Toscana e o Vêneto. Em Florença – a Atenas da Itália, capital da região Toscana, cidade dos Guelfos e dos Guibelinos, do Renascimento, da arte italiana e da família Médici - pude sentir o impacto da Renascença italiana. Deparei-me com as figuras míticas de seus concidadãos mais ilustres como Michelangelo, Dante e Maquiavel. O ponto alto, contudo, foi a visita à Catedral de Santa Maria dei Fiori, com sua fachada de mármore verde e branco que me lembrou as cores da Escola de Samba Mangueira do Rio de Janeiro. Lá, subi os 463 degraus para atingir a sua cúpula donde se tem a vista mais monumental da cidade. A cúpula do domo de Florença é uma das obras mais fundamentais do quatrocento renascentista italiano e é obra do imortal Filipo Brunelleschi, como bem demonstra o livro de Ross King – Brunelleschi´s Dome – The Story of the Great Cathedral in Florence, Pimlico, London, 2001. O presente artigo busca dar uma visão da catedral e de sua cúpula, uma pequena biografia de Brunelleschi, a maçonaria operativa da época e a sua relação com a descoberta da América. II – Santa Maria dei Fiori A catedral ou o Duomo (Domo) de Florença é o resultado de anos de trabalho que cobrem mais de seis séculos. Sua pedra fundamental foi argamassada em 1294 e o projeto arquitetural básico foi desenhado por Arnolfo di Cambio, mas somente iniciado em 8 de setembro de 1296; a cúpula que se tornou um símbolo para toda a Toscana foi criação do gênio da Renascença, Filippo Brunelleschi, enquanto que a fachada que a completa é obra do século XIX. É a quarta maior catedral do mundo só perdendo para São Pedro em Roma, São Paulo em Londres e o

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Excelente artigo que nos ensina a maravilha da arquitetura da Maçonaria Operativa pelo mundo.

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Rivista di Massoneria - Revue de Franc-Maçonnerie - Revista de Masonerìa - Revista de MaçonariaHistory Literature Music Art Architecture Documents Rituals Symbolism

MONOGRAFIAS MAÇÔNICAS

pelo Ven.Irmão WILLIAM ALMEIDA DECARVALHO 33

SANTA MARIA DEI FIORI, Florençaa Maçonaria Operativa e a Descoberta da América

"O livro destrói a catedral, i.e. o alfabeto destrói a imagem"Humberto Eco

“A catedral de Burgos tem trinta metros de altura

E as pupilas dos meus olhos dois milímetros de abertura. Olha a catedral de Burgos com trinta metros de altura!”

António Gedeão I - Introdução Estive na primavera de 2004 excursionando pela Toscana e o Vêneto. Em Florença – aAtenas da Itália, capital da região Toscana, cidade dos Guelfos e dos Guibelinos, doRenascimento, da arte italiana e da família Médici - pude sentir o impacto da Renascença italiana.Deparei-me com as figuras míticas de seus concidadãos mais ilustres como Michelangelo, Dantee Maquiavel. O ponto alto, contudo, foi a visita à Catedral de Santa Maria dei Fiori, com sua fachada demármore verde e branco que me lembrou as cores da Escola de Samba Mangueira do Rio deJaneiro. Lá, subi os 463 degraus para atingir a sua cúpula donde se tem a vista mais monumentalda cidade. A cúpula do domo de Florença é uma das obras mais fundamentais do quatrocentorenascentista italiano e é obra do imortal Filipo Brunelleschi, como bem demonstra o livro de RossKing – Brunelleschi´s Dome – The Story of the Great Cathedral in Florence, Pimlico, London,2001. O presente artigo busca dar uma visão da catedral e de sua cúpula, uma pequenabiografia de Brunelleschi, a maçonaria operativa da época e a sua relação com a descoberta daAmérica. II – Santa Maria dei Fiori A catedral ou o Duomo (Domo) de Florença é o resultado de anos de trabalho que cobremmais de seis séculos. Sua pedra fundamental foi argamassada em 1294 e o projeto arquiteturalbásico foi desenhado por Arnolfo di Cambio, mas somente iniciado em 8 de setembro de 1296; acúpula que se tornou um símbolo para toda a Toscana foi criação do gênio da Renascença,Filippo Brunelleschi, enquanto que a fachada que a completa é obra do século XIX. É a quartamaior catedral do mundo só perdendo para São Pedro em Roma, São Paulo em Londres e o

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Duomo de Milão.Uma série de intervenções estruturais e decorativas tanto no exterior quanto no interior queenriquecem a história do monumento foram construídas durante séculos. Essas intervenções vãodesde a construção das duas sacristias no século XVI, pavimentadas de mármore, até a execuçãodas esculturas e dos afrescos, assinados por Paolo Uccello, Andrea del Castagno, Giorgio Vasarie Federico Zuccari.A terceira e última catedral florentina (a catedral é sempre a sede do bispado) foi dado o nome deSanta Maria del Fiori (fiori, ou seja, flores em honra a Florença) em 1412 em clara alusão ao lírio,símbolo da cidade de Florença. Construída no topo da segunda catedral, que os antigos cristãosflorentinos tinham dedicado a Santa Reparata, perdurou por nove séculos até que uma ordem foidada para sua demolição em 1375. Com a morte de Arnolfo em 1310, os trabalhos ficaram paralisados durante anos. Um impulso àretomada dos trabalhos da nova catedral foi a descoberta do túmulo de São Zenóbio em 1330 nacripta de Santa Reparata e a guilda dos mercadores de lã – não esquecer que na época Florençaera o maior centro produtor de roupas finas da Europa – resolveu retomar a construção.

Em 1334, Giotto foi nomeado capomaestro – uma espécie deVenerável Mestre na maçonaria operativa – dos trabalhos, porpouco tempo visto que morreu três anos depois. Sua grandeobra, contudo, está perpetuada no campanário. Andréa Pisano– autor da Porta Sul do Batistério, outra obra de arte localizadoem frente à Catedral e onde Dante foi batizado - sucedeu-o até1348 quando a terrível peste dizimou metade da população dacidade, reduzindo-a de 90.000 para 45.000 habitantes, ou seja,o mesmo tamanho de Londres na época. Houve diversasinterrupções na construção até 1367, quando uma competiçãofoi empreendida para dar um modelo final à catedral. Finalizou-se a abóbada da nave em 1378 e os corredores colaterais em1380. Entre esse ano e 1421 as tribunas e provavelmente osuporte para a futura cúpula foram levantados. O grande problema, insolúvel no início do século XV,era a cúpula da catedral. Como construir uma cúpula que aarquitetura da época não tinha jamais enfrentado pelo tamanho,dimensão e peso? Em 1418, a Obra do Domo, dirigida pelapoderosa guilda dos Mercadores de Lã, anunciou uma

competição que Brunelleschi venceu, embora a obra só começasse dois anos depois. A cúpulaoctogonal, consistindo de duas carapaças concêntricas ligadas, foi finalizada em 1434. Os toquesfinais foram a lanterna da cúpula, terminada em 1461 e os revestimentos externos em mármorebranco de Carrara, verde de Prato e vermelho de Sena.A catedral de Florença foi consagrada pelo papa Eugênio IV em 25 de março (o Novo Anoflorentino) de 1436, 140 anos após o trabalho ter sido iniciado. A Basílica testemunhou momentos importantes da cidade. Entre eles, a abertura do Concílio deFlorença em 2 de março de 1439 que levou à união temporária entre a Igreja Ortodoxa e aCatólica e a trágica manhã da Páscoa de 26 de abril de 1478, quando Giuliano de Médici foiassassinado no “complô Pazzi” e seu irmão Lorenzo, o Magnífico, só não o foi por ter se refugiadona sacristia da basílica. Existe uma diferença notável entre as várias partes da Catedral mostrando as diferentesfases do gosto durante o longo tempo passado entre a fundação da igreja e sua finalização. Noexterior, a forma dos arcos redondos demonstra um estilo romanesco. Internamente, os seusarcos imensos, portas e janelas apresentam uma feição gótica. O domo é assim uma peça de arteda Renascença. A fachada, com seu estilo gótico, é obra do século XIX. No lado norte da catedral,a Porta da Mandorla, datada do século XV, apresenta uma influência gótica tanto no desenhoarquitetural quanto na decoração. Ainda no interior, na forma de uma cruz latina, apresenta-se anave e os corredores laterais. Maciços pilares com capitéis compósitos suportam as imensas ecurvas abóbadas góticas. Os afrescos no corredor lateral norte, representam dois “condottieri” nolombo de um cavalo, obra de Paolo Uccello e Andréa Del Castagno. Nas lunetas, acima dasentradas das duas sacristias, estão fixados trabalhos em terracota de Lucca della Robbia. Odesenho dos vitrais redondos das janelas é obra de Lorenzo Ghiberti. III – A Cúpula de Brunelleschi Poucos ícones da Renascença são tão reconhecidos como a cúpula de Brunelleschi quepaira sobre Florença. No dia 10 de agosto de 1418, uma competição foi anunciada em Florença, na qual o corpoprincipal da magnífica Catedral de Santa Maria dei Fiori estava começando a tomar forma depois

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de um século de construção: “Quem desejar fazer um modelo ou desenho para a abóbada daprincipal Cúpula da Catedral sob a direção da Opera del Duomo – armação, andaime ou outracoisa, ou algum artefato de suspensão relacionado com a construção ou aperfeiçoamento da ditacúpula ou abóbada – deverá fazê-lo antes do fim do mês de setembro. Se o modelo for aprovadohaverá um premio de 200 florins de ouro”. O premio era tentador, pois um maçom operativo bem adestrado levaria, no mínimo, doisanos de árduo trabalho para juntar tal soma. Nos últimos cinqüenta anos, o corredor sul da catedral inacabada alojava um modelo emescala de 9 metros da estrutura final do que o arquiteto idealizara como obra acabada. Oproblema era que o modelo incluía uma enorme cúpula que, uma vez construída, seria a mais altae a mais extensa abóbada jamais construída. Com um diâmetro de 36 metros, excederia por 3,5metros a cúpula da mais espetacular igreja da época: a catedral de Santa Sofia emConstantinopla, que tinha sido construída 900 anos antes pelo Imperador Justiniano. E porcinqüenta anos ficou óbvio que ninguém em Florença, ou em qualquer lugar da Itália, tinha amínima idéia de como construir tal cúpula. A projetada abóbada da catedral tinha se tornado omaior desafio arquitetônico da época. Em 1366, o capomaestro Giovanni di Lapo Ghini, o venerável mestre da época, desenhouum modelo de catedral bem tradicional no seu estilo. Planejou uma típica estrutura gótica comparedes finas, janelas altas e, para suportar a cúpula, arcobotantes externos tais como os queadornavam as igrejas góticas francesas no século anterior. Como se sabe, os arcobotantes eramuma das primeiras características estruturais da arquitetura gótica: pela acomodação do empuxodas abóbadas transferidas por eles de pontos estratégicos permitiam que as paredes fossemperfuradas por inúmeras janelas que deixassem penetrar a luz de alturas espetaculares,inundando a igreja com luzes celestiais, aspiração máxima de todos os arquitetos góticos. A esse modelo do capomaestro, a guilda pediu também um contra-modelo a Neri diFioravanti que veio a prevalecer e que apresentou uma mudança radical de concepção. Neri e seugrupo rejeitaram os suportes externos propostos por Giovanni di Lapo Ghini e propuseram umanova concepção. Arcobotantes eram raros na Itália, onde os arquitetos consideravam-noshorrorosos e substitutos embrutecidos e deselegantes. Contudo, as razões da rejeição de Nerieram provavelmente tanto políticas quanto estéticas e estruturais, pois rejeitavam e repeliam aarquitetura dos tradicionais inimigos de Florença: germânicos, francos e milaneses. Co-mo osbárbaros alemães, os godos, cobriram a Europa com os deselegantes, desajeitados edesproporcionais edifícios que mais tarde tornaram-se um tema popular dos escritores da ItáliaRenascentista? Se os arcobotantes não eram para serem construídos, como a cúpula seria sustentada?Neri di Fioravanti, o principal mestre maçom de Florença, tinha vasta experiência na arte deconstrução de abóbadas, a mais perigosa e dificultosa manobra de construção da arquiteturamedieval. Acreditava ele que a cúpula poderia ser impedida de vergar sobre seu próprio peso nãopor meio de arcobotantes externos, mas pela incorporação de uma série de pedras ou correntesde madeira que poderiam circundar a circunferência, enfaixando a cúpula nos pontos de possíveisrupturas do mesmo modo que aros de ferro do barril conteriam a sua madeira. A engenhosa solução de Brunelleschi, anos depois, seria de construir duas cúpulas, umainterna à outra. Na verdade, a cúpula não seria redonda, mas sim o que os romanosdenominavam quinto acuto, ou uma abóbada octogonal composta de quatro arcosinterpenetrantes. A tacada de gênio seria a de construir a carapaça visível e externa da cúpula deforma octogonal sobre um esqueleto circular. A genialidade não estava somente na forma dasolução como também na resolução de inúmeros problemas mecânicos de guindastes, roldanas,polias para colocar toneladas de pedras na posição desejada. O princípio descoberto por Brunelleschi não era o do método convencional utilizado pelosromanos na construção da cúpula do Pantheon e sim o princípio da curva catenária, ou seja, umacurva plana que representa a forma de equilíbrio de um fio homogêneo, flexível, pesado, suspensopor suas extremidades a partir de dois pontos fixos, e submetido exclusivamente à força dagravidade. O princípio da ação mínima universal de Leibniz-Bernouilli nos do-mínios complexoscomo o das funções hiperbólicas e dos logaritmos naturais. A única limitação prática destatecnologia são os limites de elasticidade de cada material, definidos tempos depois pela Lei deHook. A curva catenária representa uma curva física, não uma curva estática, não uma curvacartesiana. Seria como pregar uma corrente pelas extremidades e verificar o contorno da curvapela lei da gravidade. IV – A Maçonaria Operativa da Época As crônicas da construção de Santa Maria dei Fiori dão-nos uma visão de como era a vidados maçons operativos da época. A vida no canteiro de obras não era fácil e digna de não se ter inveja. O pagamento erabaixo e o trabalho de longas horas era perigoso e esporádico devido ao mau tempo. Muitos

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trabalhadores provinham de famílias pobres, o chamado popolo minuto (povo miúdo). Para piorar,os menos adestrados, os homens que carregavam a cal e as pedras eram conhecidos comouomini senza nome e famiglia (homens sem nome e família). Algo em torno de 300 homenstrabalhavam nas obras da catedral, inclusive aqueles nas pedreiras. Sua jornada de trabalhosemanal era longa, pois labutavam de segunda a sábado, do nascer ao por do sol, significandoque no verão podia chegar a 14 horas por dia. Todo sábado acontecia o pagamento, quando ocontramestre distribuía os bilhetes que davam direito de serem apresentados ao pagador daOpera para que o dinheiro pudesse cair nos seus bolsos. Era um acontecimento, pois em geralpodiam ser dispensados uma ou duas horas mais cedo para poderem comprar os mantimentos noMercato Vecchio, que, como tudo mais, era fechado no domingo. Os feriados religiosos ofereciam aos maçons um refrigério ao seu duro labor. Nesses dias,marchavam em procissão através das ruas que previamente tinham sido expurgadas dosmendigos e das prostitutas ou então pagavam promessas em peregrinação em busca deindulgências vendidas em barracas da Via San Gallo. A festa mais importante era o oito denovembro, a festa de seus santos padroeiros: os Quattro Coronati (os Quatro Coroados). A lendasobre os mesmos diz que eram quatro cristãos escultores martirizados pelo Imperador Dioclecianopor recusarem a esculpir uma estátua do deus pagão Esculápio. (Convém recordar que a primeirae maior loja de pesquisa maçônica do mundo em Londres também possui o mesmo nome: aQuattro Coronati Lodge). Nesse dia, os maçons deviam assistir à missa juntos e em seguidacomer e beber. Os excessos na bebida eram perdoados, pois os estatutos da guilda dispunhamque alguns dos homens deviam se conduzir nessa solene ocasião como se fussino alla taverna(como se eles estivessem na taberna). Tirante os domingos e os feriados religiosos, um maçom operativo deveria esperartrabalhar teoricamente uns 270 dias no ano, mas se se levar em conta as condições do tempo,menos de 200 dias. Quando estava muito frio, úmido ou ventava muito para alguém trabalhar nacúpula, os nomes de todos os maçons eram colocados numa bolsa de couro onde cinco eramsorteados para trabalhar na cobertura, no revestimento e na cobertura das pedras, enquanto oresto era mandado para casa sem pagamento. Desemprego era uma condição crônica. Essas eram as condições incertas então, nas quais os maçons começavam o seu dia detrabalho. Os sinos das igrejas tocavam de manhã em cada distrito da cidade para acordá-los nosseus catres e chamá-los ao trabalho. Carregavam suas próprias ferramentas: cinzel, régua, nível,prumo, maço, desempenadeira e malhete. Ao chegar ao canteiro de obras da catedral, o maçomtinha seu nome inscrito num tabuleiro de gesso, como se fosse um relógio de ponto numa fábricamoderna, enquanto as horas transcorriam marcadas através de uma ampulheta de areia. Durantea Idade Média, o tempo estava associado com as horas litúrgicas. A palavra latina hora, era naverdade sinônimo de prece. Cada uma dessas horas tinha sido dividida em quatro partes de dezminutos de duração, enquanto cada minuto era dividido em quarenta `momentos´. A partir de1400, entretanto, começaram a dividir as horas em sessenta minutos e cada minuto em sessentasegundos. O ritmo da vida profana estava começando a pulsar fortemente. Além das ferramentas, os maçons também carregavam sua matula em bolsas de couro. Arefeição do dia – comesto – era engolida às 11 horas quando os sinos tocavam uma segunda vez.Sabe-se hoje, que o comesto era deglutido lá no alto da obra por que em 1426, na ânsia de evitaros vagabundos, a Opera decretou que nenhum maçom poderia descer da cúpula durante o dia.Isso significava que até mesmo nos dias mais quentes do verão, os maçons não poderiam gozar odolce far niente, a sesta após o almoço quando todos tiravam um cochilo para se refazer datemperatura escaldante. As crônicas de 1426 relatam que Brunelleschi mandou instalar umacozinha entre as duas paredes da cúpula para servir a refeição aos maçons. O perigo de umincêndio na cúpula era possivelmente mitigado pelo fato de os maçons serem também osbombeiros de Florença. A responsabilidade de bombeiros caia sobre os ombros dos maçons porque eles possuíam as ferramentas usadas no único modo prático de combater o fogo naquelesdias: derrubando as paredes para criar clareiras por onde se pudesse apagar o fogo. Para saciar sua sede em dias calorentos, os maçons bebiam vinho que carregavam emfrascos junto com suas ferramentas e o seu farnel. Estranho e curioso costume, pois como umtrago de vinho nessas circunstâncias, diluído ou não, poderia concorrer com a água? Não se deveesquecer que a água nessa época, carregava inúmeras bactérias e por conseqüência, as diversasdoenças. Além do mais, os florentinos acreditavam nas propriedades miraculosas do vinho. Bebercom moderação, dizia-se, apurava o sangue, estimulava a digestão, acalmava o intelecto,animava o espírito e expulsava os gases. Além do mais, proporcionava uma réstia de coragempara se trabalhar a dezenas de metros de altura numa cúpula curvada e perigosa. Consta que os maçons almoçando lá no alto, na base da cúpula, num agosto abafadiço,haviam de ter uma dose extra de coragem. Abaixo deles, podiam ver o arco recém construído datribuna sul, onde justamente há duas semanas, o maçom Donato di Valentino tinha despencadodezenas de metros para a morte. Além do mais, outro maçom também morreu na pressa determinar a tribuna para que o trabalho na cúpula pudesse começar no próximo verão. A Operapagou ambos os funerais, uma espécie de extensão da caridade que os maçons podiam esperar.

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Qualquer um, ferido no trabalho, ou sua família enfrentaria um futuro não muito risonho, pois nema Opera nem a fraternidade ou guilda dos maçons teria feito um pecúlio para socorrer osinabilitados ou as viúvas e filhos dos mortos. A única obrigação social da fraternidade era atendertão somente ao funeral. V – Santa Maria dei Fiori e a Descoberta da América Maravilhas arquitetônicas, como a cúpula de Brunelleschi, tornavam-se locais deinvestigação científica visto que suas estruturas únicas e dimensões extraordinárias para a épocapodiam servir de locais de teste para novas teorias e tecnologias. Galileu pode jogar balas decanhão da Torre inclinada de Pisa para provar de maneira ocular que os corpos arremeçados doalto descem com igual velocidade independente de peso. Centenas de anos depois, Gustave Eiffelestudou a aerodinâmica do alto de sua torre (onde o vento irrompe a mais de 100 quilômetros porhora) e finalmente provou que a sucção sobre a superfície superior da asa de um aeroplano émais importante para seu vôo do que a pressão do ar por baixo. A cúpula de Santa Maria dei Fiori,da mesma forma, ajudou os estudos científicos, somente que nesse caso o conhecimento ganhofoi usado, não para o transporte aéreo, mas para a navegação oceânica. Paulo Toscanelli era um dos maiores matemáticos e astrônomos do século. Tudo leva acrer que teria encontrado com Brunelleschi em torno de 1425, tanto que teria escrito que essaamizade com o capomaestro seria a maior associação de sua vida. Tanto quanto Brunelleschi,Toscanelli teria sido um solteirão por toda a vida, uma criatura fisicamente não muito simpática,com lábios grossos, nariz adunco e queixo pequeno. Embora fosse um homem saudável, era umfundamentalista em termos de castidade e vivia como um monge, dormindo numa tábua demadeira junto de sua mesa de trabalho e seguindo uma rígida dieta vegetariana. Estudou físicaem Pádua, onde passou muito de seu tempo observando o firmamento e desenvolvendo cálculosmatemáticos complexos. Instruiu Brunelleschi nas sutilezas da geometria de Euclides e, maistarde o capomaestro retribuiu o favor, embora inconscientemente, assistindo-o nas suasobservações celestes. Em 1475, inspirado pela altura da cúpula, Toscanelli escalou-a até o topo e,com as bênçãos da Opera del Duomo colocou um prato de bronze na base da lanterna (a lanternaestá situada no ápice da cúpula). Assim sendo, os raios do sol puderam passar através daabertura no centro e iluminar noventa e tantos metros abaixo um medidor especial no solo daCapela da Cruz da catedral, de tal modo que esta se transformou num imenso relógio de sol. Esse instrumento se tornou vital na história da astronomia. A altura e a estabilidade dacúpula permitiram a Toscanelli obter um conhecimento superior do movimento do sol (ou melhor,da órbita da terra ao redor do sol), que lhe facultou calcular com grande acurácia, antes quequalquer um, o exato momento do solstício de verão e do equinócio vernal. Esses cálculosserviram, primeiramente, a um propósito eclesiástico em que as datas religiosas, como a Páscoa,pudessem ser reguladas cuidadosamente, contudo, proporcionaram, posteriormente, aplicaçõesde longo alcance bem mais profanas e científicas. Convém recordar que o D. Henrique, o Navegador, ao fundar a Escola de Sagres em1419, permitiu aos portugueses trafegar por “mares nunca dantes navegados” e desencadearinúmeras viagens do ciclo dos descobrimentos. No início, no Atlântico oriental, usando um novotipo de barco: as caravelas. Eram embarcações leves, ligeiras e destinadas a velejar contra ovento. Os frutos dessas viagens eram múltiplos. Os navegantes, apadrinhados pelo Príncipe,exploraram as duas remotas ilhas dos Açores (descobertas em 1427) e desembarcaram emdiversos portos da África Ocidental. O arquipélago de Cabo Verde foi alcançado em 1456 e quinzeanos depois os portugueses cruzaram o equador pela primeira vez. Prêmios maiores, contudo,ainda estavam por vir. Ilhas como Brasil, Antilhas e Cantão existiam nas lendas, mas ninguémainda tinha posto os olhos e as mãos nelas. A última delas, dizia-se, estava repleta de especiarias. Essas viagens no Atlântico não poderiam se realizar sem a ajuda da astronomia, quepermitia aos marinheiros navegar por mares não cartografados e só depois assinalá-los nosportulanos. A navegação num mar restrito como o Mediterrâneo era feita por meio de cartasmostrando a escala das distancias e um padrão de doze linhas de curso (mais tarde expandidaspara 16) que irradiavam de um ponto central conhecido como rosa dos ventos. O navegador podiasimplesmente traçar uma linha entre dois pontos e assim encontrar a correspondente linha decurso e delinear sua trajetória real com a ajuda da bússola. “Navegar é preciso, viver não épreciso.” Questões de latitude e longitude podiam certamente ser ignoradas no Mare Nostrum, masquando os portugueses se aventuraram no Atlântico Sul descobriram que o método funcional noMediterrâneo não se aplicava nesses mares. A grande era da navegação celeste estava porcomeçar. Crucial nesse tipo de navegação era o astrolábio, um instrumento náutico dos antigos, poisera usado pelos gregos desde 200 a.C., em forma esférica ou de círculo graduado, com hastemóvel, que os astrônomos usavam para calcular a posição e a altura do sol e das estrelas emrelação ao horizonte. Em meados de 1400, recomeçou a ser usado pelos pilotos para calcular sua

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posição no oceano. Como as determinações da longitude eram não confiáveis durante longosanos (vide a expansão portuguesa no Brasil após o Tratado de Tordesilhas), a acurada leitura dasdistâncias norte-sul, ou seja, a determinação da latitude era de grande importância, tanto nanavegação como na elaboração dos mapas. Os navegadores então computavam sua latitudeusando o astrolábio para calcular o ângulo entre a Estrela Polar e a linha do horizonte. No entanto,quanto mais se aproximassem da linha do equador, a Estrela Polar desaparecia no horizonte e ométodo se tornava impraticável. Deveriam, pois, utilizar o sol no lugar da mesma, medindo oângulo entre o astro e a linha do horizonte ao meio-dia. Essa determinação era simples o bastante para operar exceto pelo fato de que a posiçãodo sol, assim como da Estrela Polar anteriormente, não coincidia com o pólo celeste. Em outraspalavras, nenhuma dessas rotas para a navegação celeste caía diretamente na extensãoimaginária do eixo terrestre proveniente da Estrela Polar. Assim, para obter a latitude de uma áreaera necessário então aplicar a correção para suas altitudes observadas. Um número de tabelas dedeclinação devidamente compiladas por astrônomos era usado para esse propósito, sendo a maisnotável delas as Tabelas Alfonsinas, que tinham sido preparadas por astrônomos judeus naEspanha em 1252. Essas tabelas permitiam aos astrônomos e aos navegadores calcular aposição do sol e da Estrela Polar através das várias estações, assim como as eclipses lunares esolares e as coordenadas de qualquer planeta em um dado momento. Dois séculos após a suacompilação, essas tabelas ainda continham várias inexatidões e necessitavam de uma sériarevisão. A observação de Toscanelli do movimento do sol – observação feita com a ajuda do pratode bronze no topo da Santa Maria dei Fiori – permitiu que ele corrigisse e refinasse as TabelasAlfonsinas e, ao fazê-lo, colocou nas mãos do navegadores e dos elaboradores de mapas umamais acurada ferramenta para plotarem suas posições.

Toscanelli tinha um particular interesse em mapas e explorações. Em 1459, entrevistouvários marinheiros portugueses familiarizados com a Índia e a costa ocidental da África para quepudesse criar um novo e mais acurado mapa do mundo. O mapa, a seguir, é uma demonstraçãode sua visão da época, com o paredão americano desconhecido em cor diferenciada: Este mapa então parece ter dado vazão, na mente arguta de Toscanelli, a uma nova,original e fulminante idéia. Quinze anos mais tarde, quando tinha 77 anos, escreveu a um amigoem Lisboa – Fernão Martines – um cônego da corte do Rei Afonso de Portugal. PressionavaMartines para interessar Afonso numa nova rota para a Índia, assegurando que o OceanoAtlântico era o caminho mais curto para a região das especiarias do oriente, caminha bem maiscurto do que a rota terrestre monopolizada pelos árabes. Essa nova rota marítima era mais do quenecessária, pois várias partes do caminho terrestre para a Índia tinham sido bloqueadas aoseuropeus após a tomada de Constantinopla pelos turcos em 1453. Toscanelli parece ter sido aprimeira pessoa na história a acalentar a idéia de que navegar para o ocidente daria com oscostados na Índia. O rei Afonso pode não ter sido persuadido a adotar as revolucionárias idéias de Toscanelli,pois embora sobrinho D. Henrique, o Navegador, estava mais interessado em lutar contra osmouros do que em descobrir novas ilhas no meio do oceano. Contudo, sete anos mais tarde, oastrônomo foi contatado por um parente de Fernão de Martines: um ambicioso capitão genovêschamado Cristóvão Colombo. Navegador experiente, Colombo tinha velejado sobre todo o mundo

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conhecido da época: da Grécia à Groenlândia à Costa Dourada da África. Na sua viagem para acosta ocidental da África, detectou destroços de madeiras como pinheiros, caniços e outras peçasboiando nas margens oceânicas que lhe convenceram da existência em direção ao oeste deterras ainda desconhecidas. Quando retornou a Portugal, teria visto a carta de Toscanelli aMartines, fato que lhe causou um profundo impacto tanto que a copiou numa folha em branco deum de seus livros, um tratado de geografia que posteriormente o acompanhou em todas as suasquatro viagens ao Novo Mundo. Toscanelli escreveu a Colombo repetindo suas convicções sobre a nova rota marítima paraas Índias. Enviou até mesmo a Colombo um mapa no qual a distância para a China eraotimisticamente calculada como sendo de apenas 6.500 milhas, uma séria subestimação dadistância, mas que calou profundamente na alma do navegador genovês na qual o mapa e a cartatinha encontrado terreno fértil. Apesar de Colombo não ter encontrado melhor acolhida do queToscanelli em persuadir e elite portuguesa em empreender a aventura para o ocidente, e só em1486 peticionou por uma audiência com os representantes dos reis católicos de Espanha. O restoé história por demais sabida. Seis anos depois, em 3 de agosto de 1492, após o levantamento dosfundos necessários e promessas de honras e títulos a Colombo, a flotilha de três navios levantouâncora do porto de Palos, perto de Cartagena. Embora, Colombo pudesse mais tarde afirmar, comtípica arrogância, que nenhum mapa ou cálculo matemático tivesse tido a mínima utilidade paraele, seria de admirar-se que algum europeu pudesse aportar no Novo Mundo tão cedo e tão“facilmente” sem a ajuda dos mapas e das tabelas de Toscanelli, tão arduamente compiladas coma ajuda de suas observações na cúpula de Santa Maria dei Fiori.

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