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Revista do idec ed 206

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REDAÇÃO: Mônica Ramos (editora), Nicole Lima (estagiária), Paulo Roberto Rodrigues (diagramação) COLABORADORES: Bruna Okamura Kahvedjian (texto)Juliana Bernardino (preparação) CAPA: ShutterstockIMPRESSÃO: Bangraf TIRAGEM: 7.500 exemplares

EDITORIAL

Em meio à crise econômica, pululam notícias de que os bancos reduzem ritmo e projeções de crédito. Pode até ser que eles tenham diminuído a concessão de recursos, mas continuam fazendo propagandas de empréstimo pessoal com a mesma pujança e apelação de sempre.

O Idec fez uma pesquisa sobre oferta de empréstimo pessoal e descobriu que as instituições financeiras se- guem explorando a ideia de “crédito fácil”. Além da bana- lização, o que se vê são estratégias claramente irrespon- sáveis, como a oferta de empréstimo para negativados e sem avaliação do quanto da renda do consumidor já está comprometida com dívidas.

Essa prática contrasta frontalmente com o discurso de “crédito responsável” e “educação financeira” adotado pelos grandes bancos, principalmente. Mais do que mos- trar essa contradição, nosso objetivo é alertar os consumi- dores do grande risco de superendividamento a que podem se expor ao cair na armadilha do crédito fácil, ainda mais em tempos de recessão, em que os cidadãos são os ver- dadeiros afetados.

Nesta edição também falamos sobre a nossa atuação para barrar a franquia de dados na internet fixa. O Idec en- trou com uma ação judicial contra a medida, lançou a cam- panha Internet Livre e está atuando politicamente tam- bém em audiências públicas e pressionando a Agência Na- cional de Telecomunicações (Anatel).

Queremos que a Anatel discuta o assunto da forma que prevê a legislação: por meio de um processo de regula- ção amplo e aberto à participação social, que leve em conta os aspectos técnicos da questão, os impactos para os brasileiros e o futuro do país em uma sociedade cada vez mais conectada.

CRÉDITO RESPONSÁVEL PARA INGLÊS VER

MARILENA LAZZARINIPresidente do Conselho Diretor

ELICI BUENOCoordenadora Executiva

O IDEC

Criado em 1987, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) é uma associação de consumidores sem fins lucrativos e independente de governos, empresas ou partidos políticos. Sua sustentação deve-se principalmente à contribuição de associados. O Idec também recebe recursos de organismos públicos e fundações que não comprometam a sua independência. Sua missão é promover a educação, a conscientização, a defesa dos direitos do consumidor e a ética nas relações de consumo.

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REVISTA DO IDEC É UMA PUBLICAÇÃOBIMESTRAL DO INSTITUTO BRASILEIRO DEDEFESA DO CONSUMIDOR

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SIGA O IDEC

Idec

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SUMÁRIO

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4. CASO REALSamsung devolve dinheiro pago por TV que apresentou o mesmo defeito duas vezes.

5. CONSUMO & CULTURA

6. ESPAÇO DO ASSOCIADO

8. ENTREVISTAA chef e apresentadora de TV Rita Lobo defende: cozinhar ajuda a ser mais saudável.

12. DICAS & DIREITOS

14. CAPABancos e financeiras estimulam crédito de forma irresponsável, expondo consumidor a risco de superendividamento.

19. DÚVIDA LEGALLoja online ou aplicativo pode aceitar pagamento apenas com cartão de crédito?

20. PELO MUNDO

22. PESQUISA / ALIMENTOSPesquisa feita ao longo de um ano mostra que preços de orgânicos variam muito de acordo com local de compra.

25. PESQUISA / SELOS AMBIENTAISConsumidor brasileiro reconhece selos de atributos ambientais, principalmente os de eficiência energética.

28. PLANOS DE SAÚDEPretende contratar um plano? Confira as orientações do Idec sobre seus direitos.

31. FAZENDO JUSTIÇAApartamento menor do que dizia propaganda gera danos morais.

32. IDEC EM AÇÃO

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No fim do ano passado, o funcionário público e associado do Idec Jair Alberto de Araújo, de São Paulo (SP), ligou sua televisão e deparou com uma linha vertical na tela. Não se surpre-

endeu, pois o mesmo problema já tinha ocorrido antes na TV LED de 46 polegadas da Samsung, enquanto o aparelho ainda estava na garantia. Na época, o conserto foi feito sem transtornos e sem custos.

Desta vez, porém, com o aparelho já fora do prazo de garantia dado pelo fabricante, Araújo levou um susto. O conserto na oficina autorizada custaria R$ 4.500, valor próximo ao que pagara na compra e acima da média para novos aparelhos atualmente.

Desconfiado de que sua televisão fosse “descartável”, já que apresentara o mesmo defeito duas vezes, o associa-do procurou a orientação do Idec. A ONG avaliou que se tratava de vício oculto, um defeito “de fábrica” que só se manifesta depois de certo tempo de uso, mas ainda dentro do prazo de vida útil do produto (saiba mais na página 15).

O associado seguiu a orientação de entrar em contato com a Samsung por escrito, explicando a situação e o his-tórico do defeito e também exigindo que a empresa apre-sentasse uma solução para o problema em até dez dias. Deu certo: a companhia entrou em contato com ele propondo um acordo. Como o modelo do televisor já estava fora de linha, a Samsung depositaria em sua conta R$ 4.600, o mesmo valor pago na época da compra. A única exigência foi que o consumidor devolvesse o aparelho danificado.

Araújo ficou muito satisfeito com a solução proposta. Com o valor devolvido pela empresa, ele adquiriu um novo aparelho de TV até melhor que o anterior e ainda sobrou dinheiro. “Foi a orientação do Idec que deu força para a resolução do caso. Sempre que tenho um problema ou uma dúvida, procuro a ONG porque ela dá suporte aos consu-midores”, comenta o associado.

SE ACONTECER COM VOCÊ

Em caso de vício oculto, o prazo para reclamar começa a valer a partir do momento em que se constata o problema, segundo o artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Esse prazo é de 90 dias para produtos duráveis, como eletrônicos. O consumidor pode escolher a solução que mais lhe convier entre: a troca do produto por outro em perfeitas condições; a devolução do valor pago com correção monetária; ou o abatimento proporcional do preço. O modelo de carta para reclamar sobre esse tema está disponível em: bit.ly/produto-vício-qualidade.

CASO REAL

Com a orientação do Idec, associado recebe de volta valor pago em uma TV LED da

Samsung que apresentou o mesmo problema duas vezes em três anos de uso

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Jair Araújo negociou com a Samsung e teve a devolução do mesmo valor pago na TV

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CONSUMO E CULTURA

Para comemorar os 25 anos do Código de Defesa do Consumidor (CDC), foi lançado este ano o documentário Movimento Consumerista Brasileiro, realizado pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) em parceria com a Faculdade de Direito da Universidade de Passo Fundo. Com pouco mais de duas horas de duração, o filme remonta todo o processo de evolução dos direitos do consumidor no Brasil, por meio do depoimento de dezenas de pessoas que atuaram e ainda atuam em prol dessa causa. Há entrevistas com juristas, jornalistas, repre-sentantes de órgãos governamentais e de movimentos sociais – entre eles, Marilena Lazzarini, fundadora e presidente do Conselho Diretor do Idec. O documentário faz um resgate histórico muito importante para entender a construção e a luta por relações de consumo mais equilibra-das no país.

A HISTÓRIA DO CDC

DISPONÍVEL NO YOUTUBE: http://bit.ly/doc-CDC

Há cerca de 20 anos, os automóveis movidos a energia elétrica eram vistos como grande promessa para reduzir a poluição e a emissão de gases de efeito es- tufa. Substituir veículos com motor a com-bustão por modelos elétricos eficientes era questão de tempo, dizia-se. Mas o “sonho” não se concretizou. Afinal, o que aconteceu com essa ideia? Conforme mostra o docu-mentário Quem matou o carro elétrico?, um intrincado jogo de interesses está por trás da ascensão e queda desses veículos nos Estados Unidos.

O filme conta a incrível história de como, no fim dos anos 90, modelos de car-ros elétricos, embora ainda em fase experi-

mental, já contavam com certa aceitação no mercado e, de uma hora para a outra, foram literalmente retirados de seus donos e destruídos. A proposta do filme é questionar as responsabilidades de cada um dos envolvidos – indústria de petróleo, montadoras, governos e os próprios consumidores – por esse fim “trágico”.

TRISTE FIM DO CARRO ELÉTRICO

DIREÇÃO: CHRIS PAINE / DURAÇÃO: 92 MINUTOSDISPONÍVEL NA NETFLIX E NO YOUTUBE: http://bit.ly/doc-carro-eletrico

APLICATIVO

Se você quer uma horta orgânica em casa, o aplicativo Plantit pode ser uma mão na roda. Ele traz dicas sobre como cultivar cerca de 28 vegetais – de ervas, como hortelã, salsa e man-jericão, a alface, berinjela e tomate. Não estranhe: alguns nomes são gra-fados de forma diferente (brócolos, em vez de brócolis, por exemplo), pois o app é de origem portuguesa. Nele, você encontra as épocas do ano mais indicadas para plantar e colher cada vegetal; a frequência das regas; a exposição solar adequada etc. O apli-cativo gratuito também ensina truques simples para controle de pragas e receitas de biofertilizantes caseiros.

HORTA EM CASA

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ESPAÇO DO ASSOCIADO

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EU APOIO O IDEC“Eu apoio o Idec porque é um órgão que atua for- temente no sentido de educar para o consumo. Acredito que o movimento consumerista conse- guiu obter muitos avanços em relação aos direitos do consumidor até hoje. Como professora dessa disciplina e também cidadã, percebo que tais avan- ços esbarram na falta de conhecimento das pes- soas em relação a seus direitos. Nesse sentido, o Idec presta um importante serviço à sociedade ao disponibilizar informações relevantes em diferen- tes espaços de comunicação, além de oferecer orientação jurídica aos cidadãos. E isso tudo com total independência política e econômica.”

Renata Carraro é jornalista e advogada, e vive em São Paulo (SP). É associada desde 2010.

DÚVIDAS DE CONSUMO

PROBLEMAS NO CANCELAMENTO

Tive um imprevisto que me fez cancelar um curso de pós-gra-duação. Apesar de ter faltado na maioria das aulas daquele mês (abril), fiz o pagamento da mensalidade no momento do cancela-mento. Para minha surpresa, tempos depois, recebi uma cobrança de uma empresa terceirizada dizendo que eu estava devendo o mês de maio – sendo que eu já havia cancelado o curso. E agora?

MARCOS DAVI GOMES DE SOUSA, RIO DE JANEIRO (RJ)

Como a desistência já havia sido formalmente comunicada à instituição de ensino antes do início do novo mês, o Idec con-

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sidera que a cobrança é indevida, dando ao consumidor o direito de exigir a sua anulação.

Se por algum motivo o pagamento tiver sido realizado, o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê o direi- to à devolução em dobro da quantia paga indevidamente.

Para exigir a baixa da cobrança ou a resti-tuição em dobro, acesse o modelo de carta dis- ponível em: bit.ly/ensino-cobranca-indevida.

REAJUSTE DUPLO

Tenho um plano de saúde individual da Marítima desde 1994. Fiz uma adaptação em abril do ano passado com reajuste de 20,59%. Em março deste ano, recebi o boleto de paga-mento com um aumento de 13,55%. No rodapé do boleto, a justificativa dada é que o aumento seria aplicado em renovações realizadas entre maio de 2015 e abril de 2016. Entendo que esse reajuste é indevido. Como proceder para que esse aumento seja revertido, uma vez que foi autorizado pela ANS [Agência Nacional de Saúde Suplementar]?

MARIA LUCIA VIEIRA, SÃO PAULO (SP)

É importante esclarecer que o percentual de reajuste anual e a taxa de adaptação são objetos distintos. Então, os dois podem ser cobrados, não existindo abusividade nesse sentido. Não há ilegalidade na cumulação da taxa de adaptação com o reajuste anual.

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Porém, o Idec considera que o percentu-al de 13,55% de aumento é abusivo. Apesar de aprovado pela ANS, está acima do IPCA, índice que calcula a inflação. Com base nisso, o consumidor pode questionar o valor do reajuste. O modelo de carta disponível no link bit.ly/reajuste-anual-abusivo pode ser utilizado para pedir a revisão deste aumento, citando os artigos 6o e 51 do CDC, que tratam de direitos básicos do consumidor feridos em caso de cláusulas contratuais abusivas.

Em resposta ao contato da associada, a Yasuda Marítma Saúde afirmou apenas que o valor do reajuste está dentro da legislação e se refere a custos médico-hospitalares. Diante disso, o Idec recomenda que a asso-ciada siga o passo a passo indicado no quadro ao lado.

DÍVIDA PRESCRITA

Recebi a notícia de uma inscrição de meu nome no SCPC. O emissor alega que são três cheques de valores diferentes, totalizando R$ 475, emitidos por mim em 2002. Mas só existe um documento no cadastro da dívida, um contrato emitido sem o meu conhecimento. Não deveriam estar cadastrados os três che-ques que eu supostamente teria emitido? Para o emissor protestar essa dívida, não seria neces-sário um documento com a minha assinatura? E qual é o prazo de validade de cheques?

JOSE CARLOS DE LUNA, TABOÃO DA SERRA (SP)

O cheque é um título de crédito inde-pendente. Assim, não está necessariamente vinculado a um contrato. Nesse caso, tanto os cheques quanto um eventual contrato podem ser usados na inscrição do SCPC, em caso de inadimplência.

Antes da inscrição no cadastro de pro-teção ao crédito, é necessário que se com-prove quem é o titular da dívida e também a comunicação prévia, por escrito, ao provável devedor, como indicado no artigo 43o, § 5o, do CDC, e na súmula 359 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O prazo de validade de cheques é de seis

meses. Porém, existe um tipo de ação (ação monitória) que pode ser utilizada para obter valores inscritos em cheques e que prescreve em cinco anos. De qualquer forma, no entendimento do Idec, a dívida do consumidor está prescrita, já que o prazo de cinco anos também já passou. A inclusão em birôs de crédito por dívidas prescritas é ilegal, conforme o artigo 43o, § 5o, do CDC. Depois que a dívida já prescreveu, não pode ser inscrita no cadastro de proteção ao crédito. Se ela já estava inscrita, deve ser retirada.

CONVOCAÇÃO

Solicitamos que os associados Eliseu Mellone e Therezinha Silva Araújo entrem em contato com o Idec para atualizar dados. Retificamos que a solicitação diz respeito à ação judicial IK103, e não IJ72, como divulgado na edição passada. Por favor, liguem para: (11) 3874-2150 e procurem por Cristiane Orlando.

PASSO A PASSO PARA RECLAMAR

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Com base na orientação do Idec, reclame à empresa por meio de um canal que permita comprovar o contato (e-mail, carta com aviso de recebimento, SAC ou ouvidoria – lembre-se de guardar o protocolo).

Se a empresa for cadastrada no site consumidor.gov.br, registre a queixa por lá também. Para serviços regulados (como bancos, telecom e planos de saúde), reclame ainda ao órgão responsável pela regulação do setor.

Acione a Justiça: junte as provas, os registros de contato e entre com a ação. O Juizado Especial Cível (JEC) é boa opção para causas de até 40 salários mínimos; até 20 salários, não há necessidade de advogado.

Procure o Procon de sua cidade ou estado.

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“Cozinhar é como ler e escrever: todo mundo deveria saber.” Essa defesa entusiasmada da culinária é a marca da chef Rita Lobo, idealizadora do Panelinha, um dos mais antigos e reconhecidos sites de receitas brasileiros. A afirmação de Rita não é mero corporativismo: para ela, cozinhar é fundamental para ter uma alimentação mais saudável, pois significa não depender da indústria de alimentos ultraprocessados. Além de falar sobre a importância de cozinhar, Rita Lobo também explica nesta entrevista por que ser saudável não tem a ver com ser light ou fitness, mas sim com comer comida de verdade.

JÁ PARA A COZINHA!

Na descrição do seu blog, você diz que que todo mundo deveria saber cozinhar, assim como ler e escrever. De que maneira cozinhar se relaciona com comer melhor e de forma mais saudável?

Rita Lobo: Uma boa alimentação é feita com alimentos fres-cos, in natura, minimamente processados e até alguns processa-dos. Para transformar isso em uma refeição gostosa, você precisa saber cozinhar. Se não sabe, ou depende que alguém que faça isso por você, ou depende da indústria, que não vai conseguir fazer isso. Mesmo que esteja [escrito] “caseiro” na embalagem, a gente sabe que essa comida não é caseira, é feita na fábrica. E para aguentar todo o tempo entre sair da fábrica, ficar no supermer-cado até o momento em que você for comer, esse produto preci-

ENTREVISTA

RITA LOBO é formada em gastronomia pelo Institute of Culinary Education (EUA) e idealizadora do Panelinha, site de receitas lançado no ano 2000 que hoje também é um canal no Youtube e agrega uma editora de livros e produtora de TV. É autora de seis livros sobre o tema e apresentadora do programa Cozinha Prática, do GNT

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temente do que se costuma ver por aí, ele não traz recei- tas lights ou fitness. O que vocês consideram alimenta- ção saudável?

RL: O blog é feito em parceria com o Nupens [Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde, da Universidade de São Paulo], com o objetivo de unir teoria e prática. A ideia é mostrar as arma-dilhas da indústria de alimentos e do mercado editorial. Para a indústria, é importante que se acredite que barrinha de cereal light é uma opção saudável. E as pessoas amam coisas do tipo “perca 3 kg em uma sema-na”. Só que isso não é sustentável. É uma ilusão para vender revista, para a matéria ter cliques. Então, a ideia do blog é justamente alertar e fazer as pessoas repensarem: você acha mesmo que existem “superalimen-tos”? Um único alimento pode trans-

AS PESSOAS CONFUNDEM DIETA E REGIME COM ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL, ACHAM QUE ‘SER SAUDÁVEL’ É COMER SALADA E LEGUMES NO VAPOR, E NÃO É ISSO. É SIMPLESMENTE COMER COMIDA DE VERDADE

sa ter um monte de conservante e outras coisas que já o descaracteri-zam como “comida de verdade”. Por isso, saber cozinhar é uma ferra-menta para uma vida melhor.

Em sua opinião, quais são as maiores barreiras para as pessoas cozinharem? E como superá-las?

RL: Se você perguntar para qualquer pessoa qual é a barreira, [ela vai responder que] é o tempo. Mas não acho que seja tempo, e sim uma questão de priorizar o assunto. As pessoas muitas vezes conside-ram que cozinhar é uma espécie de “dom”, ou você sabe ou não sabe. Mas cozinhar é como ler e escrever também no sentido de que é preci-so aprender. Ninguém nasce saben-do. Pode se levar mais ou menos jeito para a coisa, mas sempre se aprende. Para isso, é preciso inves-tir, não só tempo, como também pesquisar, se dedicar, colocar a mão na massa. E também se planejar, pois cozinhar vai além de grelhar um bife. Você precisa ter o bife; para ter o bife, precisa ter feito compras; para fazer compras, pre-cisa pensar antes quantas refeições você vai fazer em casa, quantas pessoas vão comer etc. Quando a comida vira uma prioridade, natu-ralmente vai se percebendo que é preciso planejar, armazenar, conhe-cer algumas técnicas culinárias, reaproveitar sobras etc., e tudo fica mais fácil.

O Panelinha lançou recente-mente um blog sobre alimen- tação saudável, mas, diferen-

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formar a sua alimentação e, consequentemente, a sua saúde? É um pouco um banho de água fria para muita gente, mas é tam-bém um alívio! Por exemplo, será mesmo que não pode comer a pele do frango assado? Pode! Pode comer comida, não pode comer o que não é comida.

O blog também é uma forma de a gente se posicionar sobre essa confusão em torno do que é alimentação saudável. As pessoas confundem dieta e regime com alimentação saudável, acham que “ser saudável” é comer salada e legumes no vapor, e não é isso. É simplesmente comer comida de verdade. Lá [no blog], você não encontra low carb [termo em inglês para baixo teor de carboidratos], porque não acreditamos nisso e leva-mos a sério a ideia de que receita é ferramenta para a pessoa aprender a cozinhar.

Dentro do conceito de alimentação saudável, você tem uma preocupação em abordar a forma como os alimen-tos são produzidos, como os produtos orgânicos?

RL: Não tratamos desse assunto no Panelinha porque a gente quer muito que as pessoas entrem na cozinha. Só de a pessoa chegar em casa depois do trabalho e preparar o jantar, já acho genial. Se ainda tiver que se preocupar se é orgânico ou não... Sim, é melhor comer alimentos orgânicos, mas não queremos que isso vire um obstáculo. Ainda estamos no pri-meiro passo de dizer: “vá para a cozinha”. A partir do momento em que cozinhar vira um hábito, as pessoas passam a ter essas preocupações sozinhas.

No Guia Alimentar para a População Brasileira, docu-mento do Ministério da Saúde elogiado mundialmen- te, a principal recomendação é substituir alimen- tos ultraprocessados por refeições caseiras. Para quem não sabe cozinhar, por onde começar a seguir essa recomendação?

RL: A primeira coisa é cortar refrigerante. Não precisa nem saber cozinhar. Se trocar refrigerante por água, você já melho-ra sua alimentação. A segunda, são os “lanchinhos”. Comer uma maçã no lugar da barrinha também já ajuda muito. Mas para começar a cozinhar, é preciso experimentar. Uma boa dica é começar a fazer receitas com legumes. À medida em que a pessoa começa a experimentar alimentos in natura nas refei-ções, vai ficando mais segura.

Em uma das temporadas do Cozinha Prática, você ensi-na a preparar refeições básicas (arroz, feijão etc.), o que também foge das expectativas de um programa de culi-

nária. Como surgiu essa ideia e qual foi a receptividade do público?

RL: Escrevo receitas há 20 anos. Com isso, sempre tive muito contato com o públi-co e com as questões das pessoas – e elas não sabem o básico. Elas podem até saber fazer um risoto para o fim de semana, já que cozinhar está na moda. Mas esse público do Panelinha e do GNT não sabe cozinhar um arroz, um feijão, não sabe como se descasca uma mandioca. As pessoas precisam saber esse básico não só porque individualmente é importante, mas também porque é importan-te para o país que a gente mantenha nossas tradições culinárias. Foi uma série de muito sucesso, tanto que tive vontade de fazer o primeiro livro do Cozinha Prática, que é um enorme sucesso editorial.

E não é só no Brasil que as pessoas não sabem o básico. Muito porque as mulheres

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ENTREVISTA

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cardápio, planejar as compras, pre-parar, reaproveitar as sobras... É uma coisa só. Tradicionalmente, a mesa do brasileiro é farta. Não é uma mesa “contadinha”, como a francesa, onde as porções são pensadas para aquela refeição. As gerações anterio-res de brasileiros que tinham habi-lidades culinárias sabiam aproveitar isso. À medida que essas habilida-des foram se perdendo, as pessoas fazem um monte [de comida] e tam-bém jogam fora um monte. Enfim, reaproveitar faz parte [de cozinhar] e pode ser tanto do que sobra, quan-to pode ser um reaproveitamento planejado, ou seja, fazer porções a mais para congelar.

A indústria de alimentos ultra-processados costuma patrocinar programas de culinária e con-tratar chefs para publicidade. Como adota um discurso de certa forma contrário a esses produtos, você tem alguma polí-tica em relação a isso?

RL: Em relação ao Cozinha Prática, é o departamento comer-cial da emissora quem comercializa [publicidade e patrocínio]. Já mer-chandising, que é algo que tem a ver diretamente comigo, eu não faço de produtos nos quais não acre-dito. Assim como no Panelinha. O anunciante natural [do site] seria a indústria de alimentos ultraproces-sados, mas não fazemos porque não utilizamos esse tipo de produto. No Youtube, os anúncios são progra-máticos, e é uma coisa sobre a qual não temos muito controle. Mas acho que a essa altura do campeonato a indústria já entendeu que não dá muito para associar minha imagem a alimentos ultraprocessados.

saíram para trabalhar e a indústria começou a contar que a gente não precisava mais cozinhar porque está tudo pronto. Temos uma geração com um gap, que não aprendeu a cozinhar e não soube passar isso para os filhos. Essa geração mais nova entendeu que precisa cozinhar, porque não dá pra comer comida pronta a longo prazo.

No lado oposto, há hoje muitos programas de sucesso de culi-nária gourmet, que são apenas para as pessoas assistirem, não para fazer em casa. Qual é a sua opinião sobre esse fenômeno? Eles podem despertar o interes-se pela cozinha ou podem afas-tar ainda mais?

TEMOS UMA GERAÇÃO QUE NÃO APRENDEU A COZINHAR E NÃO SOUBE PASSAR ISSO PARA OS FILHOS. ESSA GERAÇÃO MAIS NOVA ENTENDEU QUE PRECISA COZINHAR, PORQUE NÃO DÁ PRA COMER COMIDA PRONTA A LONGO PRAZO

RL: No fundo, são programas de entretenimento, que usam a comi- da como fator hipnotizante. As pes-soas falam que tem muito programa de culinária, mas na verdade existe mais programa em que a comida é só o assunto. O Masterchef [reality show exibido na Band], por exemplo, não tem nada de culinária. Mas acho superpositivo, porque o fato de a comida virar um assunto faz com que as pessoas se interessem por entrar na cozinha. Mesmo sendo receitas muito difíceis, elas tam- bém querem fazer jantares espe-ciais. É que o meu foco na televi- são é muito o dia-a-dia, não o público gourmet.

No seu programa de TV e site, há sempre dicas de reaprovei-tamento de “sobras” de comida e incentivo à marmita. Além de economia financeira, quais são os benefícios de adotar essas medidas no dia a dia?

RL: Penso que isso faz parte do processo. Cozinhar é isso: pensar o

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vada, bem como à inviolabilidade e sigilo do fluxo das suas comunicações pela internet. O Idec consi-dera a medida positiva porque reforça a privacidade dos consumidores.

INTERNET MÓVEL

Em abril, usuários do aplicativo WhatsApp passaram a visualizar um recado da empre-sa: “As mensagens que você enviar para esta conversa e chamadas agora são protegidas

com criptografia de ponta a ponta”. Sem mais expli-cações, o aviso despertou dúvidas. O que significa isso, afinal?

De acordo com a empresa, a criptografia de ponta a ponta garante que somente o usuário e a pessoa com quem ela está conversando podem ler as men-sagens e ninguém mais, nem o próprio WhatsApp. Dessa forma, informações pessoais, como fotografias, dados de contas bancárias etc. ficam protegidos de “intrusos”.

A mudança reforça dispositivos previstos no Marco Civil da Internet, que diz que os cidadãos têm direito à inviolabilidade da intimidade e da vida pri-

DICAS E DIREITOS

CRIPTOGRAFIA NO WHATSAPP:O QUE É ISSO?

FINANCEIRO

Termina agora em maio o prazo para as empresas enviarem aos consumidores um comprovante de quitação de débitos referente a 2015. A regra vale para serviços públicos e privados, como água e luz, internet e TV por assinatura, mensalidades escolares etc.

Previsto na Lei Federal 12.007/2009, o comprovante deve ser enviado para o endereço do cliente em um documento separado ou na própria fatura do mês de maio. Fique atento!

O objetivo do comprovante anual é substituir os recibos mensais e evitar pape-lada. Ele deve ser guardado por cinco anos, período em que uma eventual dívida pode ser cobrada.

De acordo com a lei, se o consumidor não tiver usado os serviços durante todos os meses ou mesmo não tiver pago alguma fatura do ano anterior, tem direito à declaração de quitação relativa aos meses em que houve pagamento. Caso não receba, solicite o documento ao fornecedor por escrito.

QUITAÇÃO ANUAL DEDÉBITOS: ATENÇÃO AO PRAZO

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POR DENTRO DO CDC

Otermo vício oculto diz respeito a um problema de funcionamento que não é resultado do desgaste natural pelo uso do produto. É um defeito “de fábrica”

que só aparece depois de certo tempo. Saber o que ele significa é importante para entender os prazos de garantia. O que tem a ver uma coisa com outra?

Tem tudo a ver. Segundo o artigo 26, § 3o, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), no caso de um vício oculto, o período para o consumidor reclamar ao fornecedor só começa a contar quan-do ele percebe o defeito, e não a partir da data da compra.

O prazo para reclamação definido em lei é cha-mado de garantia legal. O CDC prevê 30 dias para produtos não duráveis (alimentos, produtos de higiene etc.) e 90 dias para os produtos duráveis (eletrônicos, automóveis etc.). “Isso significa que mesmo que já tenha acabado a garantia contratual – aquela oferecida pelo fabricante, normalmente de um ano –, quando o problema de funcionamento é decorrente de um vício oculto, o consumidor ainda tem direito a reparo se o tempo estimado de vida útil do produto não tiver se esgotado”, explica Christian Printes, advogado do Idec.

VÍCIO OCULTOE GARANTIA

Executivo, Legislativo e Judiciáriosob a ótica do consumidor

DE OLHO NOS PODERES

PORTAL PRÓ CONSUMIDOR

STJ PROÍBE PUBLICIDADE INFANTIL

PÍLULA DO CÂNCER

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, lançou em abril o Portal de Defe- sa do Consumidor. Criado em parceria com a Univer- sidade de Brasília (UnB), o site traz orientações e dicas sobre direitos do consumidor e informações sobre re- calls, por exemplo. Além disso, vai reunir material téc- nico para quem trabalha na área, incluindo cursos de qualificação e formação. Confira: http://www.defesa doconsumidor.gov.br/.

Em decisão histórica, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou abusiva e proibiu propaganda dirigida ao público infantil. O julgamento, realizado em março, avaliou uma denúncia do Instituto Alana contra a cam-panha É hora do Shrek, que associava a compra do bis-coito Gulosos, da Bauducco, a brindes do personagem infantil. Além de abusiva, o tribunal considerou a prática como venda casada, prática proibida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). A decisão deve servir como parâmetro para casos semelhantes.

Mesmo com opiniões técnicas contrárias, o Congresso aprovou a toque de caixa e a presidente sancionou a lei que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética, popu-larmente conhecida como “pílula do câncer”. Apesar de prever ressalvas para seu uso, como a assinatura de um termo de consentimento e responsabilidade pelo paci-ente, a lei libera a droga sem que os estudos de eficácia e segurança tenham sido concluídos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável por autorizar o registro de medicamentos no país.

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14 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

DE SEFÁCIL

ENDIVIDAR

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Em meio à crise, bancos e financeiras exploram ofertas de crédito “sem burocracia”, inclusive para quem estácom nome sujo e sem avaliar o quanto da renda já está comprometida com dívidas

Imagine uma pessoa que está passando por apuros finan-ceiros. A conta no vermelho, a mensalidade da escola dos filhos atrasada, a parcela do carro vencida, o cartão com o limite estourado. Preocupada, no meio do dia de traba-

lho, recebe uma mensagem no celular: é do seu banco, que lhe informa que agora ela pode contratar um crédito enviando um SMS grátis para tal número. “É dinheiro na hora na sua conta com rapidez e segurança”, diz o texto.

Não seria de se estranhar que, para quem está endivida- do, uma proposta como essa soasse tentadora. Mesmo sem saber a taxa de juros cobrada, qual é o prazo de pagamento, nada, a oferta de empréstimo parece uma saída fácil para o problema das contas pendentes. E é justamente essa a prin- cipal mensagem que bancos tentam passar: que pegar di- nheiro emprestado é simples, rápido e a solução para os seus problemas, como constatou uma pesquisa realizada pelo Idec com 20 instituições – entre grandes e médios bancos, financeiras independentes e vinculadas a lojas de departa-mento (veja a lista e a metodologia no quadro Bastidores da pesquisa, na página 16).

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 15

Em comum, todas as instituições finan-ceiras adotam em suas ofertas o discurso do crédito “sem burocracia”. Nos grandes bancos, a publicidade explora muito o ima-ginário de realização de sonhos: as linhas de empréstimo pessoal são segmentadas em crédito para viagem, para pós-graduação, para reforma de imóvel etc. Já entre os ban-cos menores e as financeiras, as ofertas abordam o empréstimo como uma “ajuda” ao consumidor em dificuldade, uma maneira de sair do sufoco.

No caso das financeiras das lojas de departamento, a promessa de dinheiro fácil é ainda mais evidente. Na Marisa, por exemplo, o crédito é chamado de “Saque tá na mão”. “É uma oferta muito apelativa, pois se dá no interior da própria loja, ou seja, no ambien- te de consumo. O consumidor pega o empréstimo e gasta no próprio local”, afirma

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dades prometem que o crédito será dado “sem consulta ao SPC” e sem avaliar a margem de consignação – ou seja, quanto da renda do cliente já está comprometida com dívidas.

Como era de se imaginar, a “bondade” de oferecer crédito para negativados tem um preço: juros altíssimos. A Crefisa, por exemplo, cobra 21,35% por mês – ou 919,9% ao ano! A média de 63 instituições do mercado, segundo dados do Banco Central, é de 8,09% ao mês (197,4% ao ano). Aliás, só mesmo pelo site do órgão regulador para saber as taxas de juros, pois na maioria dos casos a informação não consta das ofertas, e mesmo nas agências e nas lojas não é possível consultá-la sem fornecer dados e documentos pessoais.

Ione Amorim, economista do Idec responsável pela pesquisa.

Para Patrícia Cardoso, coordenado-ra do Núcelo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (Nudecon), essa publicidade acintosa estimu-la o consumidor a tomar crédito para cobrir despesas ordinárias – ou seja, que não justi-ficariam um empréstimo. “Há um incentivo à tomada de crédito muito perigoso”, diz ela a partir de suas experiências na Comissão de Superendividamento do Nudecon, que atende consumidores atolados em dívidas.

A economista do Idec ressalta que a prática dos bancos está muito distante de seu dis-curso de “crédito responsável”. Afinal, de que adianta criar cartilhas ou tutoriais de educação financeira e oferecer contratação de emprés-timo por SMS – sim, o exemplo é real! –, no caixa eletrônico ou aplicativo? “Sem informa-ção e orientação suficiente, o consumidor fica exposto a um risco muito grande de tomar um crédito que, em vez de ajudar, vai piorar ainda mais sua situação financeira”, alerta Amorim.

CRÉDITO PARA ENDIVIDADOS

Pelo menos cinco instituições ofertam abertamente empréstimos para consumidores endividados e inscritos em cadastros de restri-ção ao crédito: os bancos BMG e Daycoval, e as financeiras Agiplan, Crefisa e Facta. As publici-

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16 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

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BASTIDORES DA PESQUISAA pesquisa avaliou as ofertas de crédito no site de

20 instituições financeiras: cinco bancos de grandeporte (Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, Itaú e San-tander), que representam 80% dos ativos financeiros do mercado brasileiro; cinco bancos pequenos (BMG, BNP Paribas, Banco Pan, Daycoval e Intermedium); cin-co financeiras independentes (Crefisa, Agiplan, Facta, Sorocred e Finamax); e outras cinco financeiras vin-culadas a lojas de departamentos (Renner; C&A, Ria-chuelo, Pernambucanas e Marisa). O critério para es-colha dos bancos menores e das financeiras foi o ranking de reclamações do Banco Central no segundo semestre de 2015. O levantamento foi realizado entre 20 de março e 27 de abril.

Marisa: crédito para gastar na própria loja

Itaú oferece empréstimo pelo celular

Faltou informar os juros: 919% ao ano!

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para servidores públicos de nível municipal, estatual e federal; e também para funcio-nários de empresas privadas. Este último, porém, é menos frequente, pois depende de um convênio entre o empregador e a insti-tuição financeira. Já o consignado para bene-ficiários do INSS e para servidores públicos é amplamente explorado: 70% e 65% das instituições financeiras avaliadas ofertam essas modalidades, respectivamente. Nos dois casos, o empréstimo pode comprometer até 35% da renda do cliente. A principal diferença entre eles é que o consignado do INSS tem a taxa de juros regulada pelo órgão, atualmente limitada a 2,14%.

Segundo a norma do INSS (Instrução Normativa no 80/2015), a taxa máxima de 2,14% deve expressar o custo efetivo do empréstimo. No entanto, considerando a incidência do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), nenhuma instituição respeita a regra. Segundo dados do Banco Central relativos a abril, as taxas de juros com IOF do crédito consignado para aposentados e pensionistas de 33 instituições variam de 2,21% a 2,43%.

INADIMPLÊNCIA MASCARADA

O investimento na oferta de empréstimo consignado parece ser eficiente, pois a moda-lidade se alastra no mercado. Segundo dados do Banco Central, o consignado para servi-dores públicos representava em abril 21% de todo o crédito com recursos livres concedidos ao consumidor. Para se ter uma ideia, o índice é superior ao volume de recursos liberados para financiamento de veículos, que corres-ponde a 20%. O consignado para aposentados e pensionistas representa 11%.

Em função do desconto em folha de paga-mento, as linhas de crédito consignado apre-sentam as menores taxas de inadimplência do mercado, naturalmente. Mas, considerando o alto volume desse tipo de empréstimo, o com-prometimento de até 35% da renda e o longo prazo de pagamento (até oito anos, no caso de funcionários públicos e privados), a eco-

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 17

Cardoso, do Nudecon, avalia que há uma grande irrespon-sabilidade na falta de análise da capacidade de pagamento do consumidor. “Se ele está negativado, provavelmente é por-que já está encalacrado”, diz. A economista do Idec vai além: “Conceder empréstimo para quem já está negativado e com a margem consignável comprometida, com taxas de juros ex- cessivamente altas, expõe o consumidor a um alto risco de superendividamento e a se manter refém das instituições financeiras”, dispara Amorim.

GARANTIAS PARA OS BANCOS

A pesquisa constatou também que grande parte da oferta de empréstimo é voltada para o chamado crédito com garan-tias – operações em que o banco tem algum tipo de “caução” para o pagamento, como empréstimo consignado ou com garantia de bens – veículos e até imóveis já quitados. Imagine dar a sua casa de fiança em um empréstimo? Os bancos acham razoável. Veja no quadro da página 18 outros exemplos.

O banco Intermedium e a financeira Facta só oferecem cré-dito com garantias. As outras instituições, por sua vez, também direcionam a publicidade para esses empréstimos em que a chance de calote é muito menor. Apesar de as taxas de juros nesse tipo de empréstimo serem mais baixas, Amorim avalia que a modalidade é mais favorável para os bancos do que para o consumidor. “Os juros são proporcionalmente menores, mas relativamente altos considerando o baixíssimo risco para o cre-dor”, afirma. Segundo a economista, as taxas nessas modalida-des são equivalentes ao que se pratica no mercado internacio-nal para crédito comum.

Entre as ofertas de crédito com garantias, a do consignado é uma das mais frequentes. Há três tipos: para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS);

TAXAS DE JUROS PARA NEGATIVADOS

Instituição financeira Taxa de juros Taxa de juros ao mês (%) ao ano (%)

BANCO BMG S.A. 9,0 181,39

BANCO DAYCOVAL S.A. 9,27 189,81

AGIPLAN FINANCEIRA S.A. 19,85 778,07

FACTA S.A. 21,22 906,80

CREFISA S.A. 21,35 919,95

Taxa média do mercado* 8,09 197,40

*Considerando 63 instituições financeiras

Fonte: Banco Central – Período consultado: 01/04 a 07/04/2016

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18 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

nomista do Idec acredita que a inadimplência decorrente do consignado existe, mas é “mas-carada” e transferida para outras dívidas. “Sem poder evitar os descontos do consignado, o consumidor deixa de pagar outras contas, como água, luz, alimentação, comprometendo as condições de sobrevivência e qualidade de vida”, analisa Amorim.

Patrícia Cardoso concorda. “Se a pessoa não estava vivendo bem com 100% de seu salário, tanto que pegou o empréstimo, ima-gine com 65%. A tendência é que ela comece a atrasar outras dívidas, e então pegue outro empréstimo, normalmente também com débito em conta”, afirma. A coordenadora do Nudecon destaca ainda outra faceta cruel do crédito consignado: “O banco tem tanta garantia de que vai receber que não renegocia o consignado, impedindo o consumidor supe-rendividado de fazer um plano de pagamento de suas dívidas”.

Ao fim e ao cabo, a oferta irresponsável de

crédito (que não avalia a capacidade de pagamento, que oferece “renegociação” com dinheiro extra etc.) está diretamente rela-cionada ao endividamento excessivo do consumidor – o qual, na maioria dos casos, é bom pagador, destaca Cardoso. “O que observo é que a maioria das pessoas fica superendividada por-que não queria ficar endividada. Parece ilógico, mas é isso: ela vai pegando um empréstimo em cima do outro [para pagar as dívidas] e entra em um ciclo vicioso”, observa a defensora públi-ca. Ou seja: eles vão dando corda e, se não tomar muito cuida-do, o consumidor acaba por se enforcar.

Outras formas de crédito com garantia são as chamadas “operações com antecipação de rece- bíveis”, em que o banco adianta para o cliente o pagamento do 13º salário ou da restituição do Imposto de Renda, com cobrança de juros, claro.

Além dessas modalidades, o Itaú oferece, ain- da, um empréstimo em que o cliente dá seu in- vestimento no banco como garantia de paga- mento. Veja se tem lógica: o consumidor que tem uma poupança, por exemplo, recebe uma remuneração baixíssima, de 0,65% ao mês, en- quanto o empréstimo pessoal vai lhe custar cer- ca de 3,29% de juros ao mês.

A economista do Idec fez as contas. Toman- do como exemplo um empréstimo de R$ 9.500 parcelado em 72 vezes, o consumidor pagaria mais de R$ 23 mil. O mesmo valor aplicado na poupança pelo mesmo período de 72 meses da- ria pouco mais de R$ 15 mil – rendimento 53% inferior ao ganho do banco com juros. “Que edu-

INVESTIMENTO COMO GARANTIA? FUJA DESSA!cação financeira é essa que sugere que o cli- ente deixe seu dinheiro sendo corrigido a um percentual baixo e tome crédito pagando seis ve- zes mais?”, questiona Ione Amorim.

SEM PODER EVITAR OS DESCONTOSDO CRÉDITO CONSIGNADO, O

CONSUMIDOR DEIXA DE PAGAR OUTRAS CONTAS, COMO ÁGUA E LUZ,

COMPROMETENDO SUA QUALIDADE DE VIDA

“Ione Amorim, economista do Idec

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DÚVIDA LEGAL

Nas compras pela internet, o pagamento com cartão de crédito é quase uma unanimidade: praticamente todas as lojas virtuais o aceitam. Normalmente, há outras opções, como boleto, débito em conta ou plataformas

virtuais, a exemplo do Paypal. Mas há casos em que o cartão é a única forma de pagamento, e o consumidor que não utiliza esse serviço ou que gostaria de pagar à vista fica sem alternativa.

O pagamento exclusivo com o “dinheiro de plástico” também é cada vez mais comum na contratação de serviços via aplicativos, como o Uber. Mas, afinal, as empresas podem fazer isso?

O Idec considera que, embora seja desejável que o fornecedor ofereça alternativas de meios de pagamento, inclusive à vista, não se pode fazer essa exigência na internet, já que as modalidades disponíveis representam custos adicionais para a empresa. Em lojas físicas, diferentemente, é obrigatório aceitar dinheiro em espécie, segundo o artigo 315 do Código Civil. Na web, porém, não há um meio equivalente ao dinheiro.

Fornecedores podem oferecer somente o cartão como forma de pagamento na internet, desde que a

informação esteja clara e visível para os consumidores

PAGAMENTO SÓ COM CARTÃO DE CRÉDITO?

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 19

Assim, considerando o objetivo de se equilibrar as relações de consumo, a loja online pode aceitar apenas cartão de crédito se a oferta de outros meios de pagamento for operacionalmente inviável para o negócio. O mesmo raciocínio vale para aplicativos de celular.

É importante destacar que a informação sobre as formas de pagamentos aceitas no site ou app deve ser exibida de forma clara, em local de fácil visualização, de modo que o con-sumidor conheça essa condição antes de fazer o cadastro para compra.

Além disso, caso a loja ou aplicativo opte por variadas formas de pagamento, não pode cobrar taxas ou mudar o preço em função da modalidade escolhida pelo consumidor. A cobrança pela emissão de boleto, por exem-plo, é ilegal. “Se o fornecedor escolhe oferecer esse ou outros meios de pagamento, não pode repassar os custos para o consumidor”, desta-ca Christian Printes, advogado do Idec.

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A cidade de São Francisco, na Califórnia, é a primeira dos Estados Unidos a proibir a venda de garra-fas descartáveis para uso individual. A partir de outubro deste ano, só poderão ser comercializadas gar- rafas que comportem mais de 600 ml. A nova regra foi acatada pelas autoridades locais após pro-testos de ativistas. A medida pre-tende reduzir os impactos ambien-

tais gerados pela fabricação e descarte inapropriado de garrafas pet. A Universidade de Seattle, de Washington, também proibiu o comércio de água engarrafada no campus. O primeiro local do mundo a banir o comércio de garrafinhas foi a comunidade de Bindanoon, na Austrália.

ESTADOS UNIDOS

PELO MUNDO

GARRAFINHA PROIBIDA

Um estudo norte-americano publicado na revista científica Jama, da Associação Médica Americana, constatou que aplicativos de saúde vazam informações pessoais dos usuários sem consentimento. De 75 apps de saúde sobre diabetes escolhidos aleatoriamente, 81% sequer tinham polí-ticas de privacidade estabelecidas. Os 19% restantes tinham políticas de privacidade pouco claras, de modo que informações pessoais como nível de glicose no sangue e até a geolocalização do usuário poderiam ser repassadas a terceiros, como clínicas de saúde. Nos EUA não há legisla-ção específica sobre uso de dados pessoais, assim como no Brasil.

TECNOLOGIA

APPS DE SAÚDE VAZAMDADOS DE USUÁRIOS

ECONOMIA DO COMPARTILHAMENTO

Um estudo da Consumers Voice, federação de organiza-ções de defesa do consumi-dor europeias, fez uma ampla avaliação sobre a chamada “economia do compartilha-mento” – plataformas colabo-rativas que conectam presta-dores de serviços e consumi-dores, como Uber, Airbnb e outros. O levantamento ouviu a opinião de mais de 8.500 consumidores de 70 platafor-mas online e de aplicativos e analisou o fenômeno do ponto de vista legal e social. Entre as melhorias sugeridas, o estudo identifica a neces-sidade de regulações que esti- mulem a competitividade do mercado. A Consumers Voice também propôs a criação de “regras gerais” europeias pa- ra serviços que ultrapassem as fronteiras.

POR REGRAS COMUNS NA EUROPA

20 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

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Por Michael Geist, professor de Direito da Universidade de Ottawa, Canadá. Pesquisador sobre internet e comércio eletrônico

A NETFLIX E A REGULAÇÃONO CANADÁO governo britânico aprovou

a aplicação de um imposto extra sobre bebidas açucaradas, como refrigerantes. A partir de 2018, as empresas terão de pagar a taxa para bebidas que contenham mais de 5 gramas de açúcar a cada 100 ml de bebida, com exceção daquelas à base de leite ou de frutas. O dinhei-ro extra arrecadado deve ser usado para investimento em atividades físicas para crianças, com o objetivo de reduzir os altos índices de obesi-dade infantil. Além do Reino Unido, outros países já adotaram a taxação de bebidas açucaradas a fim de combater a epidemia de obesidade, como México e França.

REINO UNIDO

BEBIDAS AÇUCARADAS MAIS CARAS

360o

Sete anos atrás, o órgão regulador de radiodifusão do Canadá (CCRT) realizou duas grandes audiências sobre novos meios de comunicação e internet. As audiências de 2009, que contaram com contribuições das principais empresas de

telecomunicações e de radiodifusão do país, abriram caminho para a renovação de uma isenção de regulação para novos serviços do setor, como os de vídeo on-line.

Na época, a Netflix foi mencionada apenas duas vezes durante as audiências, em referências esparsas. Se a empresa não era top-of-mind em 2009, hoje é aparentemente a única coisa de que a indústria quer falar, dado seu crescimento rápido, preço menor para os con-sumidores e efeito perturbador no mercado.

As emissoras de radiodifusão canadenses passaram a ver a Netflix como ameaça diante da preferência dos mais jovens por serviços de vídeo via internet, em detrimento da televisão. Em resposta, querem mudar as regras em nome de uma “equidade” regulatória.

O objetivo é exigir dos provedores de vídeo on-line o pagamento de contribuições a um fundo para financiar produções de televisão canadenses. O argumento é que a Netflix estaria drenando as receitas do sistema de televisão, anteriormente destinadas à criação de con-teúdo nacional.

Contudo, a realidade é que o sistema de vídeo on-line ofe- rece aos criadores canadenses acesso sem precedentes a um mer-cado global, juntamente com mecanismos de distribuição bara- tos. Para os consumidores, os serviços oferecem comodidade e preços melhores.

Embora o desejo de manter o status quo não surpreenda – as emis-soras geraram enormes lucros no Canadá –, a CRTC tem, até agora, com razão, rejeitado os esforços para utilizar o sistema de regulação para prejudicar novos concorrentes.

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A Agência Reguladora de Comunicações dos Estados Unidos (FCC, na sigla em inglês) apresen-tou uma proposta de novo padrão de informações sobre serviços de banda larga, parecido com a tabela nutricional disposta na embalagem de alimentos. O objetivo é facilitar a compreensão dos consumidores sobre os planos de internet, deta-lhando preços, velocidade, latência (tempo que leva para o dado ser transmitido), custo do modem, fran-quia de dados e taxas contratuais, por exemplo. O “rótulo” ficará dis-ponível nas lojas e no site das ope-radoras que aderirem à proposta, que não é obrigatória.

INTERNET

“RÓTULO” PARA BANDA LARGA

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Pesquisa realizada ao longo de um ano reforça que o preço dos orgânicos varia muito conforme o canal de venda. Grupos de Consumo Responsável despontam como opção mais barata, inclusive em relação a alguns alimentos convencionais

Quando o assunto é alimentos orgânicos, a questão do preço ainda é indissociável. Senso comum, o custo elevado desses pro-dutos é tido como principal fator que impe-

de sua popularização e consumo por grande parcela dos consumidores. Para desmistificar a questão, o Instituto Kairós, em parceria com a Rede Brasileira de Grupos de Consumo Responsável, realizou uma pesquisa comparan-do os preços de frutas e hortaliças convencionais e orgâ-nicas em diferentes canais de comercialização – super-mercado; feira convencional e orgânica; e Grupos de Consumo Responsável (GCR) – grupos organizados por consumidores para realizar compras coletivas de orgâni-cos direto dos produtores. O levantamento foi realizado durante um ano, em cinco cidades do país, e contou com o apoio do Idec.

A principal conclusão da pesquisa é que o local de compra influencia – e muito – no preço dos orgâni- cos. “Verificamos uma diferença significativa entre os canais [de venda], entre os quais destacam-se os supermercados pelos valores mais altos e os Grupos de Consumo pelos menores preços”, comenta a coor- denadora da pesquisa, Morgane Retiere.

O resultado não é exatamente inédito – ele reforça o que foi constatado pelo Idec em 2010, quando uma pesquisa identificou diferença de até 463% nos preços de produtos na feira orgânica e no supermercado. “Em

22 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

ONDE É MAIS

BARATO?

PESQUISA ALIMENTOS

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mais baixos do que os supermercados. Em três quartos dos produtos analisados, a diferença se situa entre 50% e 100% (ou seja, itens que custavam R$ 1 na feira orgâni-ca saíam entre R$ 1,50 e R$ 2 no supermercado).

A diferença oscilou de 10% – caso da banana prata, cujo preço médio era R$ 5 na feira orgânica e R$ 5,50 no mercado –, até 116%, variação constatada no preço do quiabo – R$ 8 na feira e R$ 17,30 no supermercado.

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 23

O levantamento foi realizado entre julho de 2014 e junho de 2015, de forma voluntá- ria por cinco Grupos de Consumo Responsável (CGR) nas cidades de Alta Floresta (MT); Pi- racicaba (SP); Rio de Janeiro (RJ); Salvador (BA) e São Paulo (SP). A pesquisa foi idealiza- da pela Rede Brasileira de Grupos de Consu- mo Responsável e coordenada pelo Instituto Kai- rós com o apoio do Idec.

Durante o período de pesquisa, foram cole- tados uma vez por mês os preços de 22 tipos de frutas, hortaliças e ovos em quatro tipos de ca- nais de comercialização: supermercado (produtos orgânicos e convencionais); feira convencional (produtos convencionais); feira orgânica (produ- tos orgânicos) e grupos de consumo responsável (produtos orgânicos).

COMO FOI FEITA A PESQUISA

partes, a pesquisa atualiza o estudo pioneiro feito pelo Idec há seis anos, com mais dados e uma abrangência maior”, observa Ana Paula Bortoletto, nutricionista e pesquisadora do Idec.

A pesquisa do Kairós avançou ao comparar os preços dos orgânicos também com os alimentos convencionais. Essa análise trouxe um resultado interessante: conside-rando o preço médio no GCR, o orgânico pode até sair mais em conta do que alimentos produzidos com agro-tóxicos à venda no supermercado, principalmente. Mais um mito que cai por terra. Veja, a seguir, outros detalhes do levantamento.

ORGÂNICOS: O LOCAL IMPORTA

A primeira parte do levantamento analisou a varia-ção de preços somente entre os produtos orgânicos de acordo com o canal de vendas. Como era de se esperar, os supermercados foram responsáveis pelos maiores preços, tanto em comparação ao GCR quanto às feiras orgânicas.

Para Morgane Retiere, a diferença é decorrente da estrutura de venda e dos gastos com logística dos super-mercados, que acabam sendo revertidos para os preços. Além disso, acrescenta Bortoletto, o custo mais elevado envolve o marketing que os supermercados criam em torno dos orgânicos, explorando-os como “gourmet”.

• GCR x Supermercado

No supermercado, os preços dos orgânicos são de duas a quatro vezes maiores do que nos GCRs em mais da metade dos itens pesquisados. À época do levanta-mento, o preço médio do quilo do chuchu orgânico, por exemplo, era de R$ 7,57 no supermercado, e de R$ 2,43, nos GCR – mais de 200% de diferença.

• Feira orgânica x SupermercadoAs feiras orgânicas também apresentaram preços

ORGÂNICOS: VARIAÇÃO DEPREÇOS EM CANAIS DE VENDA

Supermercado GCR Feira orgânica

Méd

ia d

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eços

(em

R$/

kg o

u un

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Abacate

Abobrinha

brasileira

Abobrinha

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Alface

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Banana

nanicaBanana

prata

Berinjela

11

8,25

5,5

2,75

0

CESTA DE ORGÂNICOS

Abacate - abobrinha brasileira - abobrinha italiana alface americana - alface crespa - banana nanica banana prata - berinjela - brócolis ninja - brócolis ramoso - cenoura - chuchu - limão tahiti - ovo quiabo - tomate italiano - tomate salada

Preço médio de uma cesta de 17 produtos

l Supermercado

l Feira

l GCR

R$ 144

R$ 98

R$ 69

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24 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

• GCR x Feira orgânicaEmbora ambos apresentem preços sensivelmente

inferiores aos do supermercado, o Grupo de Consumo se mostrou mais competitivo do que a feira orgânica. Todos os preços médios na feira foram maiores do que no GCR, exceto em três casos: o do brócolis, cujo preço da feira orgânica era menor do que nos Grupos, e do ovo e da cenoura, com valores equivalentes.

A nutricionista do Idec lembra que tanto os grupos de consumo quanto as feiras orgânicas são alternativas de compra direta com o produtor, o que influencia nos preços mais baixos.

No caso do GCR, uma vantagem maior é obtida pelo fato de que todo o processo de aquisição e distribuição dos produtos é gerenciado de forma voluntária pelos participantes, enquanto o feirante é remunerado por sua atividade. A “desvantagem” do GCR é que ele exige um engajamento muito maior dos consumidores. Saiba mais no quadro ao lado.

SEMPRE MAIS CARO?

Na segunda parte da pesquisa, o intuito foi verificar se os orgânicos são mesmo sempre mais caros do que os alimentos convencionais – produzidos com agrotóxi-cos, fertilizantes artificiais e até sementes transgênicas. Nessa etapa, o recorte considerou os preços dos or- gânicos no GCR – onde eles são mais baratos – e os dos produtos convencionais no supermercado e na feira.

Embora o preço seja, sim, um fator importante, Ana Paula Bortoletto defende que é preciso olhar para além dele. “É preciso considerar todos os fatores que envol-vem a produção dos orgânicos, principalmente em rela-ção aos riscos à saúde e ao meio ambiente associados à aplicação e ao consumo de agrotóxicos”, diz. “O custo

mais elevado pode ser visto como um investimento: você vai economizar depois lá frente, com a sua saúde”, conclui a nutricionista do Idec.

• Orgânicos (GCR) x Convencionais no supermerca-do: aproximadamente dois terços dos produtos apre-sentaram preços equivalentes ou menores no GCR. Mas houve casos em que o orgânico apresentou preço sensi-velmente superior, como o do brócolis ninja, cujo valor médio no GCR era de R$ 5,20 a unidade, e no supermer-cado de R$ 2,75 (88% de variação).

• Orgânicos (GCR) x Convencionais na feira: frente aos alimentos convencionais comercializados na feira, os orgânicos eram mais caros em cerca de dois terços dos casos. Mas houve exceções: os preços médios da abobrinha brasileira, alface crespa e americana, abacate e brócolis ninja, eram mais baixos no GCR.

Os Grupos de Consumo Responsável (GCR) são formados e organizados por consumido- res para compras diretamente de produto- res agroecológicos (que não utilizam agrotó- xicos e fertilizantes artificiais no cultivo dos alimentos) e solidários (forma de produção, comercialização e consumo que beneficia todos envolvidos igualmente).

Nos GCR, os membros gerenciam toda a dinâmica das compras, assumindo o papel de realizar e enviar os pedidos, além de viabilizar a data e o horário da entrega dos produtos. Co- mo o trabalho é feito de forma voluntária, os custos tendem a ser diluídos, e o preço final acaba ficando mais barato do que nos locais de venda de orgânicos tradicionais.

O site Mapa de Feiras Orgânicas, idealizado pelo Idec, localiza grupos também, além das feiras. Para saber se existe um perto de você, acesse: http://feirasorganicas.idec.org.br/.

GCR: UNIDOS PELACOMPRA RESPONSÁVEL

SAIBA MAISRelembre a pesquisa feita pelo Idec em 2010 sobre o preço dos orgâni-cos, publicada na edição no 142. Acesse: bit.ly/pesquisa-orgânicos2010

PESQUISA ALIMENTOS

ORGÂNICOS X CONVENCIONAIS

Supermercado GCR Feira convencional

Méd

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R$/

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SELOÉ ESSE?

Pesquisa da MarketAnalysis em parceria como Idec constata que oitoem cada dez brasileirosidentificam selosambientais, mas a maiorparte dos consumidoresnão confia na mensagemsocioambiental dasempresas trazida por eles

Você já deve ter notado na embalagem de alguns pro-dutos pequenos símbolos que “atestam” atributos

ambientais, sejam eles relacionados à sua origem, à eficiência no consumo de energia etc. Muitos desses selos são reconhecidos pelos brasileiros, como mostra um levantamento da Market Analysis, instituto de pesquisa de opinião pública, em parceria com o Idec.

A pesquisa constatou que oito em cada dez consumidores (81%) conhe-cem pelo menos um dos 27 símbo-los ambientais apresentados. Entre eles, há selos emitidos pelo governo, empresas e outras organizações.

Realizado entre 25 de janeiro e 14

de fevereiro, o levantamento ouviu 906 adultos de 11 capitais das cinco regiões do país: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Curitiba, Porto Alegre, Manaus, Belém, Brasília e Goiânia.

OS MAIS CONHECIDOS

Segundo a pesquisa, o selo mais popular entre os consumidores é o Procel, do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica. Selo oficial emitido pela Eletrobrás, ele identifica o eletrodoméstico mais eficiente dentro de uma categoria em relação ao uso de energia elétrica. A eleição se baseia no selo de efici-ência energética dado pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) aos apare-lhos. Três em cada quatro brasileiros (75%) o reconhecem, proporção muito acima dos demais selos avaliados.

Outro selo governamental foi o segundo mais citado: o Conpet, reco-nhecido por 22% das pessoas entre-vistadas. Ele também premia o pro-duto mais eficiente de uma categoria em relação ao uso de petróleo e gás natural. Tal como o Procel, também se baseia na etiquetagem do Inmetro.

Na terceira posição está a certifi-cação oficial Produto Orgânico Brasil (14% afirmam conhecer), que garante o cultivo de alimentos sem agrotóxi-

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PESQUISA SELOS AMBIENTAIS

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26 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

cos ou fertilizantes artificiais. A seguir, aparece mais um selo de eficiência energética, o Energy Star (13%); e o símbolo da ISO 14.001 (12%), que certifica empresas com boas práticas de gestão ambiental e sustentabilidade.

“O ranking de reconhecimento dos selos sugere que o consumidor brasileiro associa a eficiência energética como uma virtude da proteção ambiental”, avalia Fabián Echegaray, diretor da Market Analysis. O gerente técni-co do Idec, Carlos Thadeu de Oliveira, lembra que esse resultado reforça o que já foi identificado na pesqui-sa semelhante, realizada em 2013 em parceria com o mesmo instituto. “As mensagens que atestam segu- rança e economia de recurso nos produtos parecem gozar de alguma estabilidade na confiança do consu-midor”, ressalta.

BAIXA CREDIBILIDADE

Echegaray ressalta que os selos mais populares são os emitidos por entidades normalizadoras isentas e criados para públicos específicos. “A maior força está com selos governamentais e os ligados a ONGs e grupos de produtores, e não aqueles ligados a empre-sas”, destaca.

Tal resultado é coerente e faz ainda mais sentido quando comparado a outro dado da pesquisa: a maioria das pessoas não confia que as empresas comuniquem com honestidade o que fazem em matéria social e ambiental. Somente 37% dos entrevistados acreditam que as empresas estão falando a verdade quanto à sua contribuição socioambiental indicada pelos selos.

Para Oliveira, os resultados da pesquisa dão um recado claro: “A lição que o consumidor tem deixado para empresas e governo é a de que trabalhos contínu-os e com método merecem sua confiança, o que pode explicar porque os selos Procel e Conpet estão bem à frente dos outros”.Fonte: Market Analysis

PESQUISA SELOS AMBIENTAIS

Reconhecimentodos selos ambientais

Fundamentalincompleto

A

Sul

18-24

25-34

35-44

45-54

55-64

65-69

Ensino fundamental

B

Centro-Oeste

Ensino médio

C

Norte

Ensino superior

DE

Nordeste

Sudeste

72%

87%

50%

91%

78%

85%

85%

83%

82%

81%

45%

83%

63%

97%

72%

40%

31%

79%

50%

Por escolaridade

Por classe social

Por região

Por idade

RANKING: SELOS MAIS RECONHECIDOS

1o 2o 3o 4o 5o 6o 7o 8o 9o 10o

75% 22% 14% 13% 12% 9% 8% 7% 6% 6%

Confiança na mensagem socioambiental das empresas

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REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 27

ENTENDA OS SELOSExistem mais de 30 selos ambientais no mer-

cado. Diante de tanta diversidade, fica difícil saber o que significam ou se, de fato, são confiáveis. Por isso, o Idec recomenda que os consumidores prestem atenção no tipo e na origem desses selos,

pois muitos deles são “autodeclaratórios”, ou seja, não contam com avaliação certificadora. Confira, a seguir, o que significam o principais selos avaliados pela pesquisa da Market Analysis e onde eles costu-mam aparecer.

Fonte: Market Analysis

O que é Quem certifica O que avalia Onde se vêSelo

Certificação de Conformidade Orgânica

Certificação de Conformidade Orgânica, obrigatória por lei

Associação de Agricultores Biológicos – ABIO

Certificadoras acreditadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); ou Sistema Participativo de Garantia

Se o produto respeita oscritérios de produção orgânica

Se o produto respeita os critérios de produção orgânica

Alimentos e orgânicos deorigem vegetal e animal,insumos para produção orgânica

Alimentos orgânicos. Quando o produto orgânicos tem o selo, pode ser vendido em lojas e supermercados, ou a granel. Quanto não tem, só pode ser vendido em feiras livres ou diretamente para o consumidor

Selo de eficiência energética

Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA)

Eficiência no consumo de energia elétrica

Equipamentos de escritório, eletrodomésticos, construções residenciais, comerciais e outros

Certificação de produto

Braskem (empresa petroquímica)

Identifica as resinas (plásticos e embalagens) feitas a partir de fontes renováveis, como etanol

Embalagens plásticas, como garrafas d’água, sacolas, embalagens de alimentos etc.

Certificado de Sistema de Gestão Ambiental Auditoria particular

Diretrizes básicas parasistema de gestão ambiental, a fim de identificar e gerenciar riscos ambientais naspráticas empresariais

Qualquer empresa que deseje comprovar que tem processos e boas práticas de gestão ambiental e sustentabilidade

Programa Brasileiro de Certificação Florestal

Órgãos de certificação autorizados pelo Inmetro

Certificação da cadeiaprodutiva (ou seja, a origeme a rastreabilidade dosprodutos de madeira); e manejo florestal sustentável (ou seja, mecanismos de sustentaçãodo ecossistema florestal)

Serrarias, fábricas de móveis, de embalagens, lojas de construção civil, carvoarias, siderúrgicas etc.

Selo de maior eficiência energética

PetrobrasProduto mais eficiente, dentro de uma determinada categoria, no consumo de derivados de petróleo e gás natural

Automóveis, fogões, fornos a gás e aquecedores de água a gás, por exemplo

Selo de maior eficiência energética

Emitido pela Eletrobrás após avaliação de órgãos certificados pelo Inmetro

Produto mais eficiente, dentro de uma determinada categoria, no consumo de energia elétrica

Equipamentos eletroeletrônicos e eletrodomésticos

Page 28: Revista do idec ed 206

Antes de fechar negócio com uma operadora, é preciso levar emconsideração vários quesitos, como a modalidade do plano, a rede deatendimento, o valor inicial e os reajustes previstos. Veja as dicas do Idec

Embora pareça simples, contratar um plano de saúde requer alguns cuidados para não passar apuros quando for necessário utilizar o

serviço. “É preciso levar em consideração vários aspectos, como a modalidade do plano, a segmentação, a abrangência e a rede de atendimento”, elenca a advogada do Idec Joana Cruz.

Se no passado informações sobre as características dos planos não eram de fácil acesso e a escolha dependia, muitas vezes, de um corretor, hoje, muitos dados podem ser consultados no site das operadoras. “Com isso, o consumidor tem a liberdade de com-parar e interpretar as informações e, assim, contratar o que realmente é de seu interesse”, destaca Cruz.

E então, está pensando em contratar um plano de saúde? Veja a seguir quais critérios levar em conta antes de assinar o contrato.

PLANOS DE SAÚDE

28 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

DO PLANO DE SAÚDEA ESCOLHA

l Quem entra e orçamento disponívelAntes de começar a busca, liste a quantidade e a faixa etária das pessoas

que farão parte do plano, além da quantia que será possível comprometer do orçamento familiar para pagar o serviço.

l Pare e compareCompare as condições oferecidas pelas operadoras (valores, rede de

atendimento etc.). A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regula o setor, tem uma ferramenta que pode ajudar nessa etapa. Acesse: bit.ly/guia-contratacao.

l Bem ou mal faladaProcure saber a reputação da operadora. Consulte o ranking divulgado

pela ANS com base nas reclamações de consumidores à agência nos últimos três meses. Acesse: bit.ly/ranking-ANS. Pesquise também em outros sites de reclamações e na base do Sindec, que reúne dados dos Procons do país: http://www.mj.gov.br/SindecNacional/

l Modalidade do plano– Individual/familiar: é contratado por uma pessoa física diretamente com a operadora ou por meio de um corretor. O reajuste anual da mensalidade

O QUE LEVAR EM CONTA

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1Cópia do contrato: exija a sua via, principalmente nos

planos coletivos por adesão.

2Manual de contratação: “dicionário” que explica as

modalidades de planos, cober- turas, carências, diferenças en- tre planos individuais/familia- res e coletivos e outros pon- tos importantes do plano.

3Carta de orientação ao be- neficiário: auxilia na ho-

ra de preencher a declaração de saúde.

4Guia de leitura contratual: índice do contrato, “tra-

duzido” para uma linguagem mais palatável, que ajuda o consumidor a encontrar as in- formações mais importantes do documento.

NA ASSINATURA DO CONTRATO, VOCÊ DEVE RECEBER:

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30 MAI-JUN 2015 l REVISTA DO IDEC

Ao contratar um novo plano de saúde, há um tempo de espera para começar a utilizá-lo. Esse período é chamado de “carência”. De acordo com as regras da ANS, os prazos são:

l 24 horas para atendimentos de urgência (acidentes pessoais e/ou complicações no processo gestacional) e emergência (risco de lesão irreparável ou de vida);

l seis meses para consultas, exames e demais procedimentos (exceto parto);

l dez meses para parto.

Cobertura parcial temporária: uma espécie de carência, de até dois anos, específica para doenças e lesões preexistentes – aquelas que o consumidor já sabia portar, informadas na declaração de saúde. Durante esse período, o usuário não tem direito a procedimentos de alta complexidade, cirurgias e leitos de alta tecnolo- gia ligados à doença em questão.

A TAL CARÊNCIAdo plano individual é limitado pela ANS e as regras para o cancelamento desse plano pelas operadoras são rígidas. A oferta desse tipo de contrato, porém, é cada vez mais rara.

– Coletivo: a adesão é feita por intermediação de empresas, associações ou sindicatos. O plano coletivo tem regras mais “flexíveis” para as operadoras do que os individuais: os reajustes não são limitados e o plano pode ser cancelado pela operadora a qualquer momento. Atualmente, representam quase 80% dos planos de saúde no país.

l PreçoOs planos coletivos podem parecer mais baratos à primeira

vista, mas como não são regulados, os reajustes costumam ser exorbitantes. A saída, muitas vezes, é questionar o aumento na Justiça. Já os planos individuais em geral têm valor inicial mais alto, mas podem compensar a longo prazo.

Existem, ainda, os planos com coparticipação. Nesse tipo, além da mensalidade (geralmente de valor reduzido), o consumidor paga por cada procedimento que utilizar (consulta, exame, internação). Pode ser vantajoso para quem usa pouco o plano, mas, claro, quando for necessário utilizar muito, a conta pode vir salgada.

l SegmentaçãoUma característica importante do plano é a sua segmentação

de assistência. As principais são: ambulatorial (para consultas e exames); hospitalar (com ou sem obstetrícia); odontológico; e de referência (assistência ambulatorial e hospitalar).

Em geral, o valor da mensalidade varia de acordo com a segmentação – quanto mais completa, mais caro. Leve em conta o uso que pretende fazer do plano: nem sempre o mais barato compensa, e nem sempre o mais caro é necessariamente melhor.

l Rede de atendimentoOutro ponto importante a ser observado é a rede de

atendimento (própria e credenciada) do plano de saúde. Considere a quantidade e a localização dos hospitais, consultórios, laboratórios e profissionais de saúde disponíveis. Avalie se há prestadores suficientes próximos à sua residência ou local de trabalho, por exemplo.

As informações sobre a rede de atendimento podem ser con- sultadas no site da operadora (ela é obrigada a disponibilizar esses dados a todos os interessados, clientes ou não). Os dados devem ser atualizados em tempo real e indicados por meio de mapas.

l AbrangênciaO atendimento do plano pode ser municipal, regional, nacional

e até internacional. A escolha vai depender da necessidade – e do bolso – do consumidor. “A abrangência nacional ou internacional é ideal para quem for passar muito tempo fora de casa e em diversos locais”, recomenda Joana Cruz. Ela lembra que casos de urgência ou emergência devem ser atendidos em qualquer lugar do Brasil.

PLANOS DE SAÚDE

l Atenção à declaração de saúdeA declaração de saúde é um questionário feito pela

operadora no qual o consumidor deve indicar as lesões e doenças preexistentes, ou seja, aquelas que já sabe que tem.

Ao declarar uma doença preexistente, o consumidor fica sujeito à cobertura parcial temporária (saiba o que é no quadro acima). Ser honesto em relação ao seu histórico de saúde é fundamental, mas é preciso atenção ao modo como as perguntas são feitas: elas não podem questionar hábitos de vida (se o interessado é fumante, se faz exercícios físicos etc.) uso de medicamentos, nem exigir avaliação médica. “A operadora pode tentar enquadrar um hábito como uma doença preexistente, o que é proibido”, alerta Joana Cruz.

Caso haja perguntas desse tipo, o consumidor pode se recusar a respondê-las, indicando no formulário o descumprimento das disposições previstas no artigo 10o, parágrafo único, da Resolução Normativa no 162/2007 da ANS.

l Sem recusaAs operadoras não podem recusar a contratação de planos

para idosos, pessoas com deficiência ou com doenças. O direito é garantido triplamente pela Constituição Federal, pelo Código de Defesa do Consumidor e pela Lei de Planos de Saúde.

OUTROS ASPECTOS IMPORTANTES

Page 31: Revista do idec ed 206

FAZENDO JUSTIÇA

Acasa própria ainda é o sonho de muitos brasileiros. Mas, com os preços nas alturas,

comprar um imóvel exige sacrifí-cios financeiros para boa parte das pessoas. Imagine, então, descobrir, depois de pagar várias parcelas, que a sua casa é menor do que dizia a propaganda? Foi o que aconte-ceu com um casal que adquiriu um imóvel em Curitiba (PR) em janeiro de 2009.

Os consumidores compraram um apartamento vendido pela Incons Empreendimentos Imobiliários, atraído pelo encarte publicitário que

STJ determina que casal que comprou imóvel com

metragem inferior à anunciada seja indenizado por danos morais, mas não concede abatimento do valor pago

dizia que o imóvel teria 134 m² de área total. Porém, notaram tem-pos depois que, na realidade, o apartamento tinha só 118 m² – 16 m² a menos. Sentindo-se enganados, decidiram entrar com uma ação para exigir o abatimento proporcional do preço do imóvel e indenização por danos morais.

Em primeira instância, a Justiça deu sentença parcialmente favorá- vel: determinou que a empresa reduzisse proporcionalmente o preço correspondente aos 16 m² a menos do apartamento, com cor-reção monetária. Mas não consi- derou justificável a condenação por danos morais.

A Incons recorreu, alegando que o direito do casal teria caducado, uma vez que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê até 90 dias a partir da compra para reclamar de defeito em um produto durável, como é o caso de um imóvel. Mas

sem sucesso: o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) manteve o enten-dimento fixado na decisão anterior.

A empresa não aceitou a decisão novamente e levou o caso para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio de um recurso. No julga-mento realizado em março deste ano, o STJ reformou a decisão. O relator do processo, ministro Villas Bôas Cueva, acatou o argumento da Incons de que o prazo para a re- clamação do defeito tinha acabado, pois considerou que era fácil consta-tar que o apartamento era menor do que o anunciado.

Porém, considerou justa a conde-nação da empresa por danos morais e ressaltou que, nesse caso, o prazo para reclamar era de cinco anos, como previsto pelo Código Civil, e que este fora respeitado pelos consumidores. Assim, a Corte deter-minou o pagamento de R$ 12 mil de indenização ao casal lesado.

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 31

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MENOR DO QUEMENOR DO QUENA PROPAGANDA

Page 32: Revista do idec ed 206

IDEC EM AÇÃO

32 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

INTERNET FIXA

Em abril, o Idec concentrou esforços para barrar a imple-

mentação da franquia de dados e a consequente limitação

do acesso à banda larga fixa. No dia 14, entrou com uma

ação civil pública contra a Claro/NET, a Oi e a Vivo, a fim de anu-

lar as cláusulas contratuais que impõem franquias de dados em

todo o país. Na mesma semana, foi lançada a campanha Internet Livre, para reunir informações e mobilizar os consumidores.

Até o fechamento desta edição, a ação judicial não havia sido

julgada, mas as franquias estavam suspensas por decisão da

Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) após forte pres-

são popular contra a limitação da internet.

A medida, porém, foi vista com cautela pelo Idec: ela poderia

significar um recuo estratégico e não um interesse em rever a

questão de forma criteriosa, já que a agência não cobrou das ope-

radoras explicações sobre o que justificaria a adoção de franquias

– ponto central da discussão e que não fora respondido pelas

empresas ao Ministério da Justiça. “Os provedores não apre-

sentaram dados ou estudos técnicos que comprovem a alegada

sobrecarga de dados”, destaca Rafael Zanatta, advogado do Idec.

PRESSÃO SOBRE A ANATEL

Entre o fim de abril e o início de maio, o Idec passou a pres-

sionar a Anatel a recomeçar a discussão sobre a franquia de

dados por meio de um processo regulatório amplo e participativo,

que avalie os impactos da medida para os 100 milhões de brasilei-

ros que usam internet fixa.

O Instituto enviou um relatório com essa proposta ao Comitê

de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomunicações

(CDUST) – órgão da Anatel do qual é parte e responsável por

assessorar o Conselho Diretor da agência, que ficou com o papel

de deliberar sobre a franquia. O CDUST não havia se posicionado

sobre o tema até o fechamento desta edição, e a questão conti-

nuava sendo discutida em várias instâncias – como na audiência

no Senado da qual o Idec participou no dia 3 de maio. Para ver os

desdobramentos dessa história, acompanhe a página da campa-

nha Internet Livre: www.idec.org.br/internetlivre

IDEC LUTA CONTRA FRANQUIA DE DADOS

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Em fevereiro, as maiores operadoras de in- ternet começaram a vender pacotes de ban- da larga fixa com franquia de dados para novos clientes. Ao atingir o limite previsto na franquia, a velocidade seria reduzida ou o acesso bloqueado, assim como já acontece na internet móvel. A estratégia das empre- sas, especula-se, é forçar os usuários a redu- zir o uso de serviços de streaming, como Netflix e Youtube, que consomem muitos dados.

Para o Idec, a limitação é abusiva, pois vai contra a essencialidade da internet prevista no Marco Civil e viola também o Código de Defesa do Consumidor, ao colocar o usuário em desvantagem excessiva. Além disso, a me- dida caracteriza um abuso de poder econômi- co, uma vez que, com as franquias, as empre- sas que já detêm 90% do mercado aumenta- riam ainda mais os seus lucros.

ENTENDA O PROBLEMA

Page 33: Revista do idec ed 206

TRANSPORTE AÉREO

PLANOS DE SAÚDE

No início de maio, o Idec lançou uma pesquisa

online para saber a experiência dos consumidores

com cancelamentos de plano de saúde e suas opi-

niões sobre o assunto. A consulta fica aberta até 5

de junho.

É fácil e rápido participar. Se o plano cance-

lado era individual ou familiar, acesse: bit.ly/ cancel-plano-individual. Já se o plano era

coletivo, o link da pesquisa é: bit.ly/cancel -plano-coletivo.

IDEC LANÇA PESQUISA SOBRECANCELAMENTO DE CONTRATO. PARTICIPE!

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 33

O objetivo do Idec é mapear os principais pro-

blemas vividos pelo consumidores e identificar

condutas abusivas das operadoras, em desacordo

com o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Os resultados da pesquisa vão servir de base para

propor possíveis soluções para o tema.

A pesquisa é voltada para consumidores que

já passaram por um cancelamento de plano de

saúde, independentemente do motivo: por vonta-

de própria ou por decisão da operadora.

SAIBA MAIS

Veja mais detalhes sobre os problemas da proposta da Anac em: bit.ly/reforma-transporte-aereo

fortuitos ou de força maior, como fatores climáticos (tempestades, nevascas, erupções vulcânicas etc.) ou acidentes (como um aten- tado terrorista, por exemplo). O Idec defen- deu a exclusão dessa previsão.

Outra proposta contra a qual o Idec se manifestou foi a de que as companhias aé- reas tenham liberdade para aplicar a multas, desde que estas não ultrapassem 100% do valor pago no bilhete.

MUDANÇAS PROPOSTASPELA ANAC SÃO RETROCESSO

Em abril, o Idec participou de uma au- diência pública e enviou contribuições à con- sulta pública realizada pela Agência Na- cional de Aviação Civil (Anac) para discu- tir mudanças nas condições gerais de trans- porte aéreo, que envolvem regras sobre des- pacho, perda e extravio de bagagens; emis- são de bilhetes; e assistência material aos passageiros.

Nas duas ocasiões, o Instituto apresen- tou fortes críticas a alguns pontos das altera- ções propostas pela Anac, pois apresentam irregularidades que ferem o Código de De- fesa do Consumidor e retiram importantes garantias de reparação ao passageiro.

Um desses pontos problemáticos é que a Anac pretende excluir a responsabilidade das companhias aéreas em prestar assistên- cia ao passageiro em caso de atraso ou cancelamento do voo decorrente de casos

Page 34: Revista do idec ed 206

IDEC EM AÇÃO

34 MAI-JUN 2016 l REVISTA DO IDEC

ALIMENTOS

Uma pesquisa online feita pelo Idec com 1.624 consumi-

dores aponta que 95% dos participantes concordam com a

proibição da gordura trans, considerando os riscos que o seu

consumo traz à saúde.

O levantamento inédito sobre o tema no país também mos-

tra que uma considerável fatia das pessoas (89,2%) busca se

informar sobre a presença da substância nos alimentos indus-

trializados por meio da tabela nutricional, lista de ingredientes

e a parte frontal dos rótulos.

Apesar disso, 34% acreditam que os fabricantes omitem

ou manipulam as informações nutricionais, e 30% acham que

falta clareza nos rótulos. Atualmente, é difícil saber se o ali-

mento é livre de gordura trans, já que a legislação permite que

um produto declare ter “zero” gordura trans se ele tiver até

0,2 g por porção.

CONSUMIDOR CONCORDA COM FIM DA GORDURA TRANS

CRISE HÍDRICA

Em abril, a Agência Reguladora de Saneamento e Energia

do Estado de São Paulo (Arsesp) atendeu ao pedido da Sabesp

e cancelou o programa que dava bônus no valor da conta de

água para quem economizasse, e multa para quem gastasse

acima da média na Grande São Paulo. O fim do desconto pas-

sou a vigorar já em 1º de maio.

O Idec considerou a atitude muito preocupante, pois o

nível de água nas principais represas e mananciais paulistas

ainda está longe de um patamar seguro. A Aliança pela Água,

rede de organizações da qual o Idec é parte, enviou uma carta

ao governador Geraldo Alckimin e lançou uma campanha para

revogar o cancelamento do bônus. Até o fechamento desta

edição, porém, a medida estava mantida.

O Idec e as demais organizações da Aliança defendem que

o bônus é um incentivo fundamental para manter a economia

de água. “A decisão parece apenas ir ao encon-

tro da necessidade econômico-financeira da

Sabesp de aumentar sua arrecadação. A com-

panhia já afirmou ter deixado de arrecadar

R$ 1,4 bilhão desde início do sistema de bônus

e multa”, destaca Carlos Thadeu de Oliveira,

gerente técnico do Idec.

IDEC CRITICA FIM DO BÔNUS NA CONTA DE ÁGUA EM SP

No fim de março, os resultados da pes-

quisa foram apresentados na audiência

pública realizada pela Agência Nacional de

Vigilância Sanitária (Anvisa), em Brasília (DF).

Na audiência, o Idec defendeu a proibição

do uso da gordura trans no Brasil com

base nos impactos negativos ela traz para

a saúde, levando em consideração as doenças

crônicas comuns em ascensão no país, como

a obesidade.

SAIBA MAIS

Confira os resultados completos da pesquisa: bit.ly/conhecimento-gordura-trans

Page 35: Revista do idec ed 206

REVISTA DO IDEC l MAI-JUN 2016 35

CONSELHO DIRETOR: Amauri Martins de Oliva, Helio Silva, Marijane Vieira Lisboa, Marilena Lazzarini (presidente), Marcelo G. Sodré, Marcos Vinicius Pó, Mário César

Scheffer e Ricardo Morishita CONSELHO FISCAL: Carlota Aquino Costa, Luiz Nakamura e Sérgio Neves da Rocha SUPLENTES: Ivete Agabiti Ceccon, Jorgina de Freitas

Monteiro e Kelly Góis Almeida CONSELHO CONSULTIVO: Ada Pellegrini Grinover, Adriana Borghi Fernandes Monteiro, Cláudia Lima Marques, José Rodolpho Perazollo,

Laura Valente Macedo, Luciana Stocco Betiol, Mariângela Sarrubo Fragata, Paulo Afonso Leme Machado, Renato Janine Ribeiro, Rosana Grinberg, Rosangela L. Cavallazzi,

Sérgio Mendonça, Sérgio Seigi Shimura, Silvio Valle, Sueli Carneiro, Sueli Dallari, Vera Vieira e Walter Barelli COORDENADORA EXECUTIVA: Elici Checchin Bueno GERENTE

TÉCNICO E DE COMUNICAÇÃO: Carlos Thadeu C. de Oliveira GERENTE ORGANIZACIONAL: Carla Hanli Cavalcanti Yue ASSESSORA DE PROJETOS: Teresa D. Liporace

ASSESSORIA DE IMPRENSA: Juliana Cristina Fernandes ASSESSOR DE TI: Julio Chiari WEBMASTER: Luive Osiano ASSESSORIA DE MARKETING: Andressa Oliveira de

Souza Carvalho e Felipe V. Shinzato PORTAL: Mônica Ramos EQUIPE JURÍDICA: Claudia Pontes Almeida e Christian T. Printes EQUIPE TÉCNICA: Ana Paula B. Martins,

Ione A. Amorim, Joana Cruz, Rafael Gandara Calabria e Rafael Ferreira Zanatta EQUIPE DE RELACIONAMENTO: Alexandre Frigério (Assessor), Eneida M. Souza (Assessora),

Fabiana Borges e Igor Lodi EQUIPE ADMINISTRATIVA: Cristiani Orlando, Fátima Santos (Supervisora), Maria das Graças Silva, Marli C. de Oliveira, Sandra Garoli, Sandra

Matos e Sidineide Elisangela M. Andrade COLABORADORES DO MÊS: Raphael Augusto Ramos Gonçalves e Walter Faiad CONSULTORIA: Lucas Malaspina, Marcia Kodama,

Tatiana Bonumá e Telma Duarte ESTAGIÁRIOS: Ana Carolina Leite de Moraes, Giovana Marson Ferreira de Brito, Jayane da Silva, Karine Batista da Silva Palermo, Nathalya

Victoria Lima dos Santos, Nicole Lima da Silva, Nina Ramalho Pinheiro, Rodrigo Berel Caropreso e Thayanne Cabral de Melo

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