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Revista produzida pelos alunos da disciplina de Produção Jornalística II - 2008/2, do curso de Comunicação Social/Jornalismo da Ulbra/Canoas; André Amaral Nottar, Andréia Oliveria Prestes, Cíntia Santana, Daniel Freitas de Freitas, Fernanda Rafaeli Gomes, Leonardo Silveira Leal, Luciano Breitsameter Demaman, Maressa Oliveira Sampaio, Marina Gabriela Meza Pinheiro, Matheus Mocelin Carvalho, Natacha Samara Teske, Raquel Gomes Carneiro, Simone Bassani e Stefano Antônio Pratti Lauria. Diretor da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas Sérgio Roberto Lima Lorenz (RPMT/RS 9250) Coordenador do curso de Jornalismo Douglas Flor (RPMT/RS 7384) Jornalista responsável Rosane Torres (RPMT/RS 5141) Projeto Gráfico Jorge Gallina (RPMT/RS 4043)
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babelRevista laboratorial do curso de Comunicação Social/Jornalismo da Ulbra/Canoas Dezembro de 2008 Ano III - Nº 5
Aqui tem históriaCruzar a porta de entrada do antigo Casarão dos Fonseca,em Gravataí, tem a dimensão de uma viagem ao passadoarquitetônico da cidade. Prédio tombado pelo município, foiconstruído há 130 anos e hoje é parte do patrimônio do Estado
CASA DOS AÇORES
Na esquina, os
filmes piratas
se proliferam
PÁGINAS 20 E 21
Na cidade,
a praça vira
campo de jogo
PÁGINAS 4 E 5
PÁGINAS 14 E 15
Os bens de todos nósBoa parte da diversidade cultura do Brasil está alicerçada
em edificações e monumentos. Embora a Constituição Fe-deral de 1988 estabeleça os deveres do Estado e da socieda-de na preservação dos bens públicos, o que se vê nem sem-pre são ações que contam com o amparo da lei. Com fre-qüências os centros urbanos se vêem diante de situaçõesaparentemente incompatíveis: abrir espaços para o cresci-mento desenfreado das cidades ou preservar seu passadohistórico, garantindo a manutenção de antigos centros?
Claro que o olhar de quem administra não pode ser ape-nas nostálgico. É preciso pensar no crescimento das comu-nidades, na abertura de estradas, enfim, na expansão, queexige a mudança de traçado e pode comprometer este ouaquele monumento ou prédio. Por outro lado, a maioria dapopulação – envolvida na sua luta diária para sobrevivernum país marcado pela miséria, que inviabiliza acesso aosprincipais canais de conhecimento – sequer tem consciên-cia de seus deveres, sabe o que é patrimônio histórico ecultural* ou o que estabelece a Carta Magna com relação àpreservação de bens coletivos.
A despeito desta ou daquela ação, existe hoje em todo omundo, uma preocupação crescente em preservar os bensda humanidade, sejam eles material, natural ou imóvel, masque tenham significado e importância artística, cultural,religiosa, documental ou estética para a sociedade. Nestesentido, a criação de leis tem amparado aqueles que traba-lham para proteger e restaurar as características originaisde muitas relíquias espalhadas pelo planeta.
A Unesco é encarregada de definir regras que garantam apreservação do acervo histórico e cultural da humanidade.No Brasil, temos o Instituto do Patrimônio Histórico e Ar-tístico Nacional (IPHAN) e o país comemora o Dia doPatrimônio Histórico em 17 de agosto, dada de nascimentodo criador do IPHAN e seu presidente por três décadas, oadvogado, jornalista e escritor Rodrigo Melo Franco deAndrade (1898-1969).
No RS, são vários os exemplos de resgate da memória his-tórica. Nesta edição, Babel aborda, entre outros temas inte-ressantes, o processo de preservação do Casarão dos Fonse-ca, patrimônio histórico, tombado pelo município deGravataí e hoje sede da Casa dos Açores do Estado (Caergs).A Caergs faz parte do Conselho Mundial de Casas dos Aço-res, que congrega 11 casas em todo o mundo e atua junto acomunidades açorianas. Boa leitura.
Reitor Ruben Eugen BeckerVice-reitor Leandro EugênioBecker Pró-reitor de Adminis-
tração Pedro Menegat Pró-
reitor de Graduação da Unidade
Canoas Nestor Luiz JoãoBeck Pró-reitor de Graduação
das Unidades Externas OsmarRufatto Pró-reitor de Pesquisa e
Pós-graduação EdmundoKanan Marques Capelão Geral
pastor Gerhard GraselOuvidoria Geral Eurilda DiasRoman Diretora de Comunica-
ção Social Sirlei Dias GomesCoordenador de Imprensa RosaIgnácio Leite Diretor da área
de Ciências Humanas e Sociais
Aplicadas Sérgio RobertoLima Lorenz (RPMT/RS 9250)
Coordenador do curso de
Jornalismo Douglas Flor(RPMT/RS 7384) Jornalista
responsável Rosane Torres(RPMT/RS 5141) Projeto
Gráfico Jorge Gallina (RPMT/
RS 4043)
Revista produzida pelos alunos
da disciplina de Produção
Jornalística II - 2008/2
André Amaral Nottar,Andréia Oliveria Prestes,Cíntia Santana, Daniel Freitasde Freitas, Fernanda RafaeliGomes, Leonardo SilveiraLeal, Luciano BreitsameterDemaman, Maressa OliveiraSampaio, Marina GabrielaMeza Pinheiro, MatheusMocelin Carvalho, NatachaSamara Teske, Raquel GomesCarneiro, Simone Bassani eStefano Antônio Pratti Lauria Fotografia: LeonardoLenskij. Revisão: CarlosNunes
2 REVISTA BABEL
ueditorial
u
*Alguns patrimônios históricos mundiais: Pirâmides de Gizé (Egito), MachuPicchu (Peru), Estátua da Liberdade (EUA), Muralha da China, Torre de Piza(Itália), Coliseu de Roma (Itália), Palácio de Versalhes e Torre Eiffel (França), eAcrópole de Atenas (Grécia).Alguns patrimônios históricos do Brasil: Cidade Histórica de Ouro Preto (MG),Centro Histórico de Olinda (PE), Pelourinho (BA), Estação da Luz (SP), Ruínasde São Miguel das Missões (RS), Cristo Redentor (RJ), Conjunto Urbanísticode Brasília e Palácio do Catetinho (Brasília).
REVISTA BABEL 3
uíndice
Fundação abriga obras de Iberê e de outros artistasPÁGINAS 8 E 9
Jornalista fala para jovenssobre violênciaPÁGINAS 10 E 11
Moradores reclamam dodescaso das autoridadesPÁGINAS 12E 13
useções EDITORIAL: Os bens de todos nósPÁGINA 2
DICAS DE MESTRE: Tempos de fluidezPÁGINA 27
QUALQUER NOTÍCIA BOA: Estilo centenário. Fanáticos por Converse All Star. Use, mas não abuse!PÁGINA 27
umuseu
upersonagem ubelém velho
André Nottar
Uma partida de futebol para atletas
amadores pode significar mais do que
um simples lazer. É uma terapia. Em
Porto Alegre e na Região Metropolita-
na, as áreas destinadas a este tipo de
lazer são escassas. São raros os campos
públicos e, nos últimos anos o cam-
pinho, onde amigos e conhecidos reu-
niam-se para uma pelada, mudou de
lugar. Hoje, os atletas de finais de se-
mana que gostam de bater uma bola são
obrigados a buscar áreas centrais, mui-
tas delas cercadas por edifícios e ruas de
intensa movimentação de veículos.
Saudoso dos velhos tempos da vár-
zea, o ex-jogador profissional do Aymoré
de São Leopoldo, onde jogava como za-
gueiro, Paulino Freitas, 56 anos, lamenta
a situação do momento atual. Olhando
para o chão do campo do antigo Força e
Luz, na zona leste de Porto Alegre, Freitas
– hoje aposentado e morando em Viamão
– diz acreditar que o “dinheiro das obras
fala mais alto” e por isto os campos estão
desaparecendo.
O estádio Timbaúva, campo do
Grêmio Esportivo Força e Luz, foi um
dos mais populares de todo o Estado.
Ali, foi disputado o primeiro jogo de
Campeonato Brasileiro de Seleções, em
1935. Desde então, o estádio recebeu
milhares de jogos e, nas últimas déca-
das, deu lugar ao futebol amador. Todo
o final de semana, dezenas de equipes
amadoras reservavam algumas horas
para jogar. Com dificuldades financei-
VárzeaSaudade da
ras, a diretoria do clube resolveu leiloar
o campo. Em 2006, o terreno passou
para uma rede de supermercados.
Além desse estádio, outros campos
foram dando lugar a prédios resi-
denciais e comerciais. Na zona sul de
Porto Alegre, a equipe de amigos do
Concórdia jogava no estádio da aveni-
da Otto Niemeyer, no entanto, o campo
foi terminado para a construção de um
prédio residencial. O edifício foi
embargado no início dos anos 90 e, des-
de então, está em ruínas.
– Nunca esqueço dos campeonatos
que joguei aqui de sol a sol – relembra
Enio Bacelos, 51 anos, ex-zagueiro do
Concórdia.
O jogador de “final de semana”, ho-
je veterano, conta que os campeonatos
amadores da capital tinham até duas di-
visões e, eram fortes porque cada bairro
tinha seu campo.
– Os maiores, como a Restinga, ti-
nham mais campos e mais times. Po-
rém hoje em dia, quase não tem campos
bons – reclama.
Atualmente, os estádios de várzea
da capital estão mal cuidados e pratica-
mente sem grama. A maioria deles é ad-
ministrada pela Prefeitura, que não con-
segue mantê-los em boas condições..
Outro estádio historicamente lembra-
do por quem viveu intensamente o fu-
tebol amador é o Campo do Chacrinha,
na avenida Campos Velho. A área foi
tomada por prédios residenciais.
As “arenas” de várzea também de-
ram lugar a obras de utilidade pública.
futebolu
4 REVISTA BABEL
qEm Porto Alegre, uma variação do
atleta de fim de semana abre espaço nocentro da cidade, resgatando um pouco,o saudoso futebol de várzea. Todos osdias, cerca de 30 funcionários doDepartamento Municipal de LimpezaUrbana (DMLU) praticam seu esportepreferido na Praça dos Açorianos. Elesforma quatro ou cinco times que disputamjogos entre o meio dia e às 14h.
O atleta de “horário de almoço” IvanCastro, 35 anos, acredita que, aocontrário dos campos da Prefeitura, ocampo dos garis vai melhorando a cadaano.
– Começou com um pequeno grupo
que montava as goleiras com tênis, agora
temos até rede – comemora ele.
Juntando pequenas quantias dedinheiro por atletas e, pedindo ajuda paraa empresa, os servidores criaram umverdadeiro estádio. O campo tem goleirase redes, além de o gramado ser impecável.O futebol dos garis chama a atenção daspessoas que passam pelo centro da capitaldiariamente. Muitas param e olhamdeslumbradas a criatividade e o nível deorganização dos jogos.
Variação sobreo mesmo tema
O antigo estádio do Porto, no final da
Bento Gonçalves, quase com Azenha, foi
extinto para a construção de um terminal
de ônibus, por onde passam milhares de
usuários por dia.
Em Canoas, o drama dos amadores
se assemelha muito com o cenário da ca-
pital. Alguns estádios foram vendidos e
ocupados por estabelecimentos públicos
e privados. Mauro Rocha, ex-atleta, e atu-
almente bancário, 53 anos, diz que os clás-
sicos movimentavam bairros inteiros.
– No campo do Esperança, hoje área
construída, os clássicos eram assistidos
com arquibancadas lotadas – lembra ele.
Apesar da avassaladora força do pro-
gresso ter engolido os campos de várzea,
em Canoas o campeonato municipal re-
siste e é ativo. Equipes como o Oriente,
Estância Velha, Frigosul, Harmonia e Rio
Pardo mantêm campos e sedes, mesmo
enfrentando dificuldades para admi-
nistrá-los.
REVISTA BABEL 5
Daniel Freitas
A recuperação paisagística e
arquitetônica dos grandes metrópoles
do Brasil já não faz parte somente dos
pedidos da população. A cada ano, as
três esferas da administração pública
(governos federal, estadual e munici-
pal) lançam novos projetos buscando,
principalmente na iniciativa privada,
subsídios para que a manutenção física
Vida novahistóriau
6 REVISTA BABEL
para o centro da capital
Porto Alegre mantém diversos projetos para
de prédios e o desenvolvimento susten-
tável das áreas centrais dos principais
centros urbanos do país possam reto-
mar o caminho do progresso.
Do governo federal, via Ministério
da Cultura, surge a principal iniciativa
de preservação do patrimônio histórico
e artístico urbano. É o Projeto Monu-
menta, que tem o objetivo de estabelecer
ações para a conscientização da popula-
ção sobre a importância de se preservar
o acervo existente ao ar livre nos chama-
dos “centros históricos”. O Monumenta,
que conta com ajuda de custo do Banco
Interamericano de Desenvolvimento
(BID) e apoio da Unesco, apresenta pro-
jetos de recuperação urbanística em 26
municípios de diversas regiões do país.
No Rio Grande do Sul, as cidades bene-
ficiadas são Pelotas e Porto Alegre.
A capital gaúcha, que para muitos
especialistas é considerada o pólo cul-
Biblioteca
REVISTA BABEL 7
tural do Mercosul, concentra suas ações
de preservação no centro, que é o local
onde se encontra a maior parte dos pré-
dios e recantos históricos do municí-
pio. Casa de Cultura Mário Quintana,
Chalé da Praça XV, Praça da Alfânde-
ga, Praça da Matriz, Paço Municipal,
Mercado Público, Usina do Gasômetro,
Palácio Piratini, Comando Militar do
Sul, Teatro São Pedro, Teatro de Arena,
Rua da Praia, Biblioteca Pública, Via-
duto Borges de Medeiros, Catedral Me-
tropolitana, antiga e nova Assembléia
Legislativa do Estado entre outros, são
alguns dos locais considerados de fun-
damental importância para a identifi-
cação cultural e, ao mesmo tempo, que
resguardam boa parte da memória do
porto-alegrense.
Assim como o projeto Monumenta,
o “Viva o Centro” é considerado um
programa estratégico para a cidade. Ele
tem a gestão da Secretaria do Planeja-
mento Municipal (SPM), mas atua em
todos os setores da Prefeitura. Segundo
o secretário Ricardo Gothe, as ativida-
des que valorizam o desenvolvimento
da “consciência cidadã e participativa”
no processo de construção de uma ci-
dade moderna, mas sem esquecer do seu
passado, é a premissa básica de qual-
quer administração.
No momento, um dos principais
projetos em discussão em Porto Alegre
é o do “bonde histórico”. Integrante da
lista de ações do projeto Monumenta,
capitaneado pela Secretaria Municipal
da Cultura em parceria técnica com a
Trensurb, a idéia é implementar uma
linha turística de bonde, o chamado
projeto Bonde Histórico, ligando o
Mercado Público a Usina do Gasôme-
tro. Além de reintroduzir o tradicional
veículo na cidade, que teve suas ativida-
des paralisadas em 1970, o trajeto será
turístico, passando pelas avenidas Sete
de Setembro, João Manuel e a Rua dos
Andradas. Ao longo do percurso, ga-
nham destaque o Museu de Artes do Rio
Grande do Sul (Margs), a Igreja Nossa
Senhora das Dores, a Casa de Cultura
Mário Quintana entre outros atrativos.
Segundo o arquiteto Arnaldo Knijnik,
funcionário da Trensurb, um dos res-
ponsáveis pela elaboração técnica do
Bonde Histórico
– O projeto vai beneficiar todas as
áreas em que passar, pois prevê uma total
reformulação paisagística do entorno.
Outra obra que promete dar um
charme a mais no centro o antigo cine-
ma Imperial e a transformação dele em
um cine-teatro com aproximadamente
800 lugares. A obra será bancada pela
Caixa Econômica Federal, que terá o
a manutenção de prédios e monumentos
direito de utilizar por 30 anos o prédio
de oito andares. No local, será instala-
do o Centro Cultural Caixa que
disponibilizará para a comunidade di-
versas atividades como exposições, ofi-
cinas e seminários, danças entre outras
manifestações artísticas.
Tão importante quanto criar ou re-
formar centros culturais, é tirar das ruas
o comércio irregular e apoiar o micro e
pequeno empresário. Com esse intuito,
a Prefeitura de Porto Alegre criou o
Centro Popular de Compra (CPC), ou
camelódromo.
A Praça XV de Novembro também
será totalmente reformulada.
Detalhe do interior da biblioteca e cúpula do memorial (noalto).Palácio Piratini e entrada principal do porto (acima)
q
Raquel Carneiro
O prédio branco, com chão de ma-
deira recém-instalado foi tomado por
visitantes curiosos. Era 10h30min da
manhã de uma quinta-feira. Pelo im-
ponente prédio às margens do Guaíba,
batizado de Fundação Ibera Camargo,
transitavam jovens com olhos curiosos
e falas que indagavam sobre a arte de
um dos maiores artistas brasileiros.
O prédio que encanta por dentro e
por fora foi idealizado pelo português
Álvaro Siza, um dos expoentes da ar-
quitetura contemporânea mais impor-
tante do mundo. Com traços futuristas,
a Fundação não tem semelhanças com
um museu, que para muitos é sinônimo
de prédio antigo, cheirando a naftalina,
e com perfil entediante. Partindo de
novos conceitos arquitetônicos visíveis
logo na sua entrada, não é difícil com-
preender os motivos que causam admi-
ração e satisfação em seus visitantes,
principalmente naqueles que se aven-
turam pela primeira vez no universo das
artes, como a estudante Patrícia Ribei-
ro, de 18 anos.
– Estou gostando muito, e é possí-
vel perceber as diferenças de uma pin-
tura para outra. Certamente voltarei
aqui – afirma.
A promoção do estudo sobre as
obras de Iberê, estimulando a educação
e cultura são as principais característi-
cas da Fundação, uma instituição pri-
vada sem fins lucrativos criada em 1995.
Diversos programas especiais e
museuu
8 REVISTA BABEL
às margens do Guaíbainterdisciplinares são oferecidos aos
seus visitantes, a maioria pertencente a
instituições de ensino. Com isso, a vi-
são da educação brasileira dá sinais de
que começa a transcender os muros da
escola, conforme a professora de His-
tória, Maria Zuleica Gomes:
– Proporcionar uma aula diferen-
ciada nesse ambiente contribui não só
para a aprendizagem do aluno, mas para
sua formação intelectual, e principal-
mente como cidadão, que valoriza e
conhece a arte de seu país.
A Fundação, além de acolher as
obras de Iberê, tem um acervo que con-
ta com um núcleo formado pela cole-
ção Maria Coussirat Camargo, mulher
do artista e obras que o casal Camargo
acumulou durante a vida produtiva de
Iberê, morto em 1994. São pinturas,
guaches, desenhos, estudos, documen-
tos e imagens pertencentes às três fases
artísticas mais conhecidas deste gaúcho
de Restinga Seca: Carretéis, Ciclistas e
Idiotas.
A infinidade de cores, combinação
dos mais variados traços e texturas com-
põem rostos, corpos, movimentos que
quebram o impacto da primeira impres-
são, aquela de que uma obra de arte não
pode ser compreendida, apenas admi-
rada. Ao contrário, Iberê externa com
tintas em punho seus desejos e anseios,
os mesmos que também acompanham
inúmeros expectadores que passam di-
ante de suas obras todos os dias. O sen-
timento de saudade da infância e o aban-
dono sofrido por amigos em um perío-
do de sua vida marcaram o artista de
modo especial. Morador do bairro Ci-
dade Baixa, Iberê convivia diariamente
com a Redenção, e observava, sobretu-
do, seus ciclistas: velozes e muitas vezes
sem metas, a não ser pedalar. Embora
gerada na década de 80, a concepção
dos quadros da fase Ciclistas permane-
cem com sua problemática viva hoje nas
cabeças de muitos. E o convívio com
essa arte faz com que um pequeno deta-
lhe seja visto sempre sob uma perspec-
tiva diferente, segundo a mediadora
Iliriana Fontoura Rodrigues.
– Essas manifestações artísticas são
uma surpresa cada vez que as observa-
mos, e me sinto muito bem envolvida
com este trabalho, ainda mais quando o
objetivo é formar opiniões e educar so-
bre a arte – conta.
A distância entre artista e admira-
dor torna-se inexistente dentro das pa-
redes do grandioso prédio branco, que
acorda e adormece admirando Porto
Alegre. No seu coração carrega triste-
zas, lembranças, solidão e desprezo de
um artista desta terra, que transformou
sua melancolia e saudade, em paixão
traduzida em quadros como se fossem
“últimos gestos”. Apesar dos dissabores
ao longo de sua trajetória, a arte sempre
se colocou como sua força motora. “A
arte para mim sempre foi uma obses-
são. Nunca toquei a vida com a ponta
dos dedos. Tudo o que fiz sempre foi
com paixão”. Palavra de pintor. Palavra
de poeta que aprendeu com a vida e fez
dela o seu quadro inspirador.
Arte
REVISTA BABEL 9
A Fundação IberêCamargo mostra queé possível reunir arte,novas concepções arquitetônicase aproximar o artista e suas obrasdo grande público
Raquel Carneiro
Com a tranqüilidade de quem já
percorreu uma longa estrada profissio-
nal, o jornalista Caco Barcellos, nasci-
do em Porto Alegre, sobe ao palco do
Salão de Atos da Ufrgs com uma certa
timidez e domina a cena. Ele participa
do projeto Diálogos Universitários. Os
aplausos dos estudantes que o aguardam
na platéia logo são interrompidos. O
silêncio toma conta do teatro. Todos
querem ouvi-lo.
jornalismou
10 REVISTA BABEL
Nos passosda cultura da violência
Embora com uma bagagem inesti-
mável, construída ao longo de 30 anos
de profissão, Caco confessa-se nervoso
pela responsabilidade de falar aos jo-
vens conterrâneos. Convocado para
abordar um tema polêmico, A violên-
cia faz parte da cultura do brasileiro, ele
começa o bate-papo sem fazer afirma-
ções, acusações ou questionamentos.
Mostra números com base em sua
vivência como jornalista investigativo.
– No Brasil, matamos no trânsi-
to, por ano, de 32 a 42 mil pessoas. So-
mente por arma de fogo, são 48 mil vi-
das – afirma ele.
A violência atinge o cidadão brasi-
leiro de diferentes formas e em todas as
camadas sociais. No entanto, ressaltou
o jornalista, o mundo sempre esteve
pouco preocupado com o levantamen-
to de vítimas do lado mais fraco, e esta é
uma característica fortíssima nos paí-
ses europeus. A sociedade discute pou-
co e aceita a violência que passa diante
de seus olhos passivamente. Não é à toa
que há anos o planeta assiste ao confli-
Jornalista investigativo,Caco Barcellos fala desua experiência e mostraos números alarmantesque colocam o Brasilno ranking das naçõesmais violentas do mundo
Jornalista investigativo,Caco Barcellos fala desua experiência e mostraos números alarmantesque colocam o Brasilno ranking das naçõesmais violentas do mundo
DIVULGAÇÃO/ JORNAL O GLOBO
REVISTA BABEL 11
qEx-taxista na capital gaúcha, Caco
Barcellos teve sua primeiraoportunidade no meio jornalístico emmeados de 1970, como repórter dojornal Folha da Manhã, do grupoCaldas Júnior. Sua atuação destacadarendeu grandes oportunidades comorepórter nas revistas IstoÉ e Veja.Encerrada a sua fase em veículosimpressos, tornou-se correspondenteinternacional da TV Globo. Atualmente,está à frente do programa ProfissãoRepórter, da mesma emissora. Nele,comanda uma equipe de jovensjornalistas, que correm atrás de fatosinusitados pelo Brasil e mostram osbastidores das produções.
Por onde Cacoandou...
to entre Estados Unidos e Iraque. A
notícia da troca infinda de tiros e bom-
bas entre Ocidente e Oriente faz parte
do café da manhã de muitos e já não
causa espantos.
Embora a guerra por petróleo e
maior poder na indústria bélica no he-
misfério norte tenha retirado
incontáveis vidas, ainda assim, não se
compara ao número de pessoas que
morrem vítimas da violência no Brasil.
Conforme relatório da Anistia Interna-
cional, divulgado em 2007, a China,
considerada a nação mais intolerante
do mundo, matou 600 pessoas. Outros
países como Inglaterra, Alemanha e Itá-
lia, ao todo, fizeram cerca de 100 víti-
mas da violência urbana. No mesmo
ano, somente no Rio de Janeiro, o Ba-
talhão de Operações Especiais da Polí-
cia (BOPE) executou 1,3 mil pessoas,
um número superior se somado o nú-
mero de mortos dos 24 países citados
no documento. As práticas de repreen-
são adotadas pelo BOPE nada mais são
do que lições bem aprendidas em uma
escola chamada Rota, um grupo de po-
liciais paulistanos que tem a tortura
como principal método de sua cartilha.
– Estudei sete anos a Rota. Eu
queria saber quem eram as vítimas da
polícia. Nesse período, fiquei na porta
do Instituto Médico Legal (IML) e iden-
tifiquei 4,2 mil pessoas – relata o jorna-
lista.
O fato mais surpreendente, e que
emudece a platéia que, atenta, acompa-
nhava a fala de Caco, é que desse núme-
ro de vítimas, apenas 1,5 mil eram cri-
minosos. A maioria restante: jovens,
negros e trabalhadores de baixa renda.
Além disso, grande parte das vítimas foi
morta com tiros na nuca e no coração,
dois fortes indícios de que foram exe-
cutadas. Diariamente, diversos corpos
são deixados por policiais na porta de
hospitais de favelas cariocas, a fim de
não haver comprometimento com os
casos, completou o jornalista.
Em 2007, a agência de publicidade
Nova FC resolveu traçar o perfil do bra-
sileiro sobre a violência e chegou a qua-
tro conclusões importantes: o brasilei-
ro sempre acha que a culpa é do outro,
tem tendência a gostar do que é ilícito,
a maioria dos universitários apoiaria a
tortura, se fossem policiais, até mesmo
para crimes de furto e os pobres tam-
bém pensam da mesma maneira.
– Se a pena de morte fosse boa, o Rio
de Janeiro e São Paulo seriam o paraíso.
Mas se houvesse mesmo a pena, mataría-
mos quem rouba pouco ou muito? – ques-
tiona ele, alertando que a omissão e o
silêncio “tem um significado mais radi-
cal do que qualquer atitude ou crítica”.
qqqqqqqqqqq
Rota 66 (2003,editora Record) –Após oito anos depesquisa, CacoBarcellos relata sobrea polícia que mata deSão Paulo. Com essainvestigação o autorconsegue identificar
quem são as vítimas da Polícia Militarde São Paulo. Ao finalizar a o livro,Caco passou um período fora do Brasilpor correr risco de vida. Afinal, a obrairritou principalmente coronéis dapolícia militar.
Abusado (2003,editora Record) –Através da históriade Juliano VP, esselivro-reportagemconta desde ainfância à ascensãono tráfico de drogas
na favela Santa Marta e um retratoimportantíssimo da ocupação do morropelo Comando Vermelho, principalfacção criminosa do Rio de Janeiro esuas crueldades.
Dicas de Leitura
Caco encanta platéias contando histórias que testemunhou
DIVULGAÇÃO/ SITE DIÁLOGOS UNIVERSITÁRIOS
Daniel Freitas
A organização de uma cidade se
inicia pela capacidade de gerir, de for-
ma ágil, pequenos problemas. Uma sim-
ples troca de lâmpada, o reparo de um
cano quebrado, a poda de uma árvore
entre diversos outros serviços básicos
são fundamentais para a manutenção
da qualidade de vida e, também, pro-
porciona uma boa aparência pai-
sagística.
Instigado pelas denúncias de des-
caso com a manutenção de ambien-
tes públicos vinda de diversos mora-
dores e da Associação Comunitária do
Bairro Belém Velho (Asscobev), nos-
sa reportagem fez contato com a Pre-
feitura de Porto Alegre, através do site
www.portoalegre.rs.gov.br, na seção
“Solicitações de Serviços”, evidenci-
ando alguns problemas estruturais do
local. Fotos foram feitas das regiões
onde se encontra problemas, como:
placas de sinalização enferrujadas,
acúmulo de lixo, boca de lobo entu-
pido, entre outros problemas.
Tudo isso para ilustrar e dar mais
subsídios para a identificação correta
dos locais de onde partiram os pedi-
dos dos serviços. Também foram de-
nunciados pontos da iluminação pú-
blica que não estavam funcionando
devidamente, além da falta de enca-
namento e meio-fio. Os contatos fo-
ram feitos com a Secretaria Munici-
pal de Obras e Viação (Smov), Em-
presa Pública de Transporte e Circu-
lação (EPTC), Atendimento 156 e
Departamento Municipal de Limpe-
za Urbana (DMLU).
belém velhou
14 REVISTA BABEL
Descaso eburocracia
Dentro de um prazo de três dias, as
denúncias da falta de manutenção foram
respondidas pela assessora de Relações
Públicas da Smov, Bruna Dias Simoni.
– Obrigado pela mensagem. Sua
participação é fundamental para o nos-
so trabalho. Dentro do menor prazo
possível estaremos respondendo a sua
solicitação.
Logo após, o atendimento 156 (o
chamado “Portal do Cidadão”) indicou
que a colocação de meio-fio para delimi-
tar o calçamento deve ser solicitada via
Orçamento Participativo (OP) e as recla-
mações para conservação de passeios pú-
blicos com o setor de fiscalização de pas-
seios da Smov. Isso evidencia o lado bu-
rocrático do sistema administrativo pú-
blico e as poucas ou ineficazes ferramen-
tas de interação e identificação de pro-
blemas comuns espalhados pelos bairros,
mas que exigem ações eficazes e rápidas.
Segundo a moradora da rua João
do Couto, Nilva Fonseca, entrar no OP
para brigar por um meio fio de calçada
é no, mínimo, “ridículo”.
– Não tem razão para levar 900 ou
1000 metros, ou um pouco mais, de cal-
çada para o Orçamento Participativo.
Ainda mais que Belém Velho é um bair-
ro que não possui um grande número
de moradores. Nossas propostas sem-
pre vão ser vencidas.
Nilva também ressalta que, quando
a sua rua foi asfaltada, já deveria ter sido
toda encanada e calçada. Michele
Beltran, também moradora da rua João
do Couto, diz que em dias de chuva a
falta de encanamento empurra lixo e
terra para a avenida Costa Gama, e aca-
ba entupindo os bueiros.
Calçadas irregulares e inalizaçãodeficiente são ameaça constanteà segurança do pedestre
REVISTA BABEL 15
O Poder Executivo é lento eacaba desapontando apopulação, que cansa dever pedidos não atendidos
Moradores convivem com lixões a céu aberto
– Não adianta a gente reclamar. Eu
e minha mãe cansamos de fazer pedi-
dos para a troca de canos, para a poda
de árvores que atrapalham a ilumina-
ção, mas parece que só sabem que exis-
timos em dia de eleição. Aí sim, folheto
não falta, carro de som, distribuição de
bandeirinhas – comenta Michele.
Para um dos líderes comunitários
da zona Sul de Porto Alegre, Orion
Freitas, a saída seria criar núcleos ou
sub-prefeituras que tivessem o poder de
idenficar problemas mais simples e co-
muns ao dia-a-dia da população e, ao
mesmo tempo, como o poder de execu-
tar ações para sanar as necessidades.
– Com a adoção de sub-prefeituras
regionais, o poder público seria muni-
do de informações diárias de problemas
simplórios que, na maioria das vezes,
nem chegam aos ouvidos da Prefeitura.
A população também tem que ir atrás.
O Executivo é lento, mas não pode sa-
ber de tudo que ocorre numa cidade do
tamanho de Porto Alegre. Cabe a po-
pulação auxiliar – afirma.
Estamos nos aproximando do final
do mês. Trinta dias de espera já se fo-
ram para que os serviços solicitados fos-
sem atendidos. Até o momento somen-
te as luzes apagadas foram arrumadas,
sendo que estragou novamente. O re-
gistro dos protocolos das solicitações da
limpeza de boca-de-lobo (125658-08-
91), da implantação de canos (125655-
08-52) e do recolhimento de lixo
(125656-08-02), são só mais alguns
números esporádicos em meio aos di-
versos pedidos para solução de proble-
mas simples, mas de soluções compli-
cadas. Entramos em contato com a Pre-
feitura para saber o motivo da demora
para a realização dos trabalhos, mas não
houve resposta.
Em muitas áreas, as condições asruas e calçadas são péssimas, masPrefeitura não toma providências
Raquel Carneiro
O cheiro da tinta fresca e o ranger da madeira sob a pressão da cami-
nhada no assoalho novo resgatam lembranças de uma casa que esteve
prestes a perder sua história. Cruzar a porta de entrada da antiga morada
da família Fonseca, é como viajar na história arquitetônica de Gravataí. É
preciso percorrer este trajeto para entender a riqueza deixada pela cultu-
ra açoriana. Nas paredes do imóvel de estrutura imponente estão as
marcas simbólicas de grandes mudanças desde 1877, o ano em que
foram erguidas.
Construída por neto de açorianos, e sete anos depois da
independência de Gravataí, a propriedade rural de
Manoel Fonseca não era diferente da casa de
um homem de posses e ficava
quase que embrenhada
preservaçãou
12REVISTA BABEL
A C
AS
A D
OS
em um matagal. Em suas salas amplas, acomodava uma família de tamanho médio.
No pátio, galpões e até um tambo de leite. O passar dos anos abriu novas perspecti-
vas para os Fonseca em outros horizontes.
Na década de 70, a família deixou a casa. Alugada pela Prefeitura com o
objetivo de fundar o primeiro museu municipal, logo a casa abrigaria uma
clínica de Fisioterapia, nos anos 80. O casarão, que um
dia foi o retrato de um povo e sua cultura, aos
poucos foi perdendo suas impressões
digitais pela ação
Açores
Doações feitas pelogoverno da Ilha dos Açoresajudaram a Caergs arestaurar o patrimônio devalor histórico imenso
REVISTA BABEL 13
O casarão dos Fonsecarecebeu estruturas de açonas paredes. Durante trêsanos o prédio ganhou teto e
assoalho novos. Original mesmo, apenas asparedes.Depois de concluído o processo derestauração, faltava a pintura e a mobília.O grupo de dança açoriana da cidade,Rancho Folclórico, através de seu trabalhovoluntário, foi o responsável pelas cores doprédio. Parcerias com antiquários foramfirmadas para resgatar a identidade doimóvel.
– O trabalho não foi fácil, mas o resultado
não tem preço – garante a estudante e
integrante do grupo folclórico KarenMarques Gomes Pereira, 16 anos.Para o tesoureiro da CAERGS, Luiz CastilhosFlorêncio Albano, é uma emoção ver umaparte da história resgatada e se tornandoo mais novo espaço cultural da cidade.Em dezembro de 2007, o casarão dosFonseca ganhou novamente o direito decontar sua história através das suasjanelas, paredes, alicerces, do cheiro damadeira e do chão que grita de tão novo. Oespaço hoje é um reduto cultural commuseu repleto de objetos que contam umpouco da vida do povo açoriano, bibliotecae ambientes decorados tipicamente. E naúltima quinta-feira de cada mês é possívelescutar boa música ao vivo saboreandopratos da culinária de uma das ilhas maisbelas de Portugal.A morada dos Fonseca deixou para traz odescaso, o abandono e recuperou suaidentidade. Voltou a ser chamada pelonome: Casa dos Açores.
A REFORMAem um matagal. Em suas salas amplas, acomodava uma família de tamanho médio.
No pátio, galpões e até um tambo de leite. O passar dos anos abriu novas perspecti-
Na década de 70, a família deixou a casa. Alugada pela Prefeitura com o
de fundar o primeiro museu municipal, logo a casa abrigaria uma
nica de Fisioterapia, nos anos 80. O casarão, que um
dia foi o retrato de um povo e sua cultura, aos
poucos foi perdendo suas impressões
digitais pela ação trans-
formadora do
tempo. As salas foram reformadas, não havia mais galpões no pátio
e nem o tambo. Em condições precárias de conservação e pratica-
mente inabitável, a construção não despertava interesse e foi quase
abandonada. A clínica se transferiu na década de 90.
Os Fonseca decidiram, então, demolir o prédio. Pressionada pela
mobilização popular que queria manter aquela parte da história do
município, a Prefeitura assumiu em 2000 a responsabilidade de um
projeto de restauração. Até 2005, no entanto, nenhum tijolo fora
restaurado.
Neste mesmo ano, a Casa dos Açores do Estado do Rio
Grande do Sul (Caergs) procurava um lugar para a sua sede ofi-
cial e, embora quisesse ter sob sua responsabilidade a tarefa
de recuperar o casarão dos Fonseca, não ousou enca-
minhar o pedido à Prefeitura quando começou
a procurar um local para se instalar em
Gravataí. O prefeito na época, Daniel Bordignon,
no entanto, ofereceu justamente o casarão, conta
Célia Silva Jachemet, responsável pelo Departamento
Intercidades da Caergs.
– Foi a realização de um sonho. A casa foi cedida
por 99 anos, e foi o primeiro prédio tombado pelo
município – conta ela.
Ao receber aquela herança de valor histórico ines-
timável que ruía em ritmo acelerado, a própria Caergs
temeu pelo sucesso da restauração, pois não contava
com recursos para dar início à restauração. Porém,
através de doações feitas pelo governo da Ilha dos
Açores, em Portugal, e ações como festas e jantares,
a entidade conseguiu aos poucos devolver vida ao
casarão. Com a ajuda voluntária do curso de Arqui-
tetura da Universidade Federal do Rio Grande Sul,
o projeto de recuperação começou a tomar forma.
– Comecei a fazer parcerias e destinamos a ver-
ba que recebíamos do governo dos Açores para ati-
vidades culturais, totalmente para a reestruturação
da casa. Ao invés de gastarmos o dinheiro, nós guar-
dávamos – recorda o presidente da Caergs, Régis
Albino Marques Gomes.
es
praçasu
16 REVISTA BABEL
Adote um
espaço verdeAdote um
espaço verde
REVISTA BABEL 17
dedeCapital dosgaúchos mantémprogramade incentivoe manutençãode áreas verdes
Daniel Freitas
Porto Alegre é referência nacio-
nal pela valorização de espaços natu-
rais destinados ao lazer e a preservação
ambiental. Segundo a Secretaria Muni-
cipal do Meio Ambiente (Smam), a ci-
dade conta com cerca de 1,3 milhão de
árvores apenas em vias públicas. Além
disto, tem ambientes como: parques, sí-
tios e praças. Um dos temas que mais
interessa a população é a inclusão soci-
al dos porto-alegrenses através de espa-
ços públicos qualificados para o lazer e
o entretenimento em família.
Um dos desafios da Prefeitura é en-
contrar formas de amenizar os conflitos
gerados pelos anseios da população, que
deseja ver os espaços públicos bem cuida-
dos, em detrimento da falta de renda do
empobrecido poder público. Uma saída
encontrada pela Smam foi criar o projeto
“Adote uma Praça”. Trata-se de um pro-
grama de parcerias, entre o poder público
e privado, que visa colocar os espaços das
praças aos cuidados de pessoas interessa-
das em sua manutenção, desde que pos-
sua condições financeiras de fazê-lo.
Segundo o ex-secretário municipal
do Meio Ambiente de Porto Alegre, Beto
Moesch, Porto Alegre tem 571 praças
urbanizadas ocupando uma área superior
a 3 milhões de metros quadrados. Ao ano,
estima-se que a Smam invista cerca de R$
15 milhões na manutenção das áreas ver-
des da cidade. O atual secretário da Smam,
Miguel Wedy justifica o projeto:
– A prática da adoção de praças por
empresas é uma forma de desafogar as
contas da Prefeitura. Com isso, ela pode
voltar suas atenções para outras áreas
críticas como: saúde e educação.
Segundo a moradora do bairro
Belém Velho (na zona Sul de Porto Ale-
gre), Glede Maria Coimbra, 48, não há
melhor espaço para descansar e bater
um papo com os amigos do que a praça.
– Aqui a gente encontra todos os
amigos e amigas, falamos da família, po-
demos trazer as crianças. É um ótimo
ambiente!
Apesar aprovação da moradora, ao
visitar a Praça Nossa Senhora de
Belém, alguns problemas estruturais
são evidentes. Bancos quebrados e sem
pintura, brinquedos (balanços, escor-
regadores...) sem manutenção, tabela
da cesta de basquete da quadra espor-
tiva quebrada, entre outros. Isso por-
que, além de ser um lugar mais afasta-
do dos olhos da maioria da popula-
ção, segundo a moradora, o poder pú-
blico nunca se preocupou muito em
cuidar do local.
Segundo Wedy, o perfil de quem adota
uma praça é “geralmente” ligado ao siste-
ma empresarial, já que é um meio de alta
rotatividade financeira e possibilita que
projetos não parem no meio da im-
plementação, além de assegurar um bom
retorno no que diz respeito a “imagem e a
responsabilidade social”. Segundo a as-
sessoria de imprensa da Smam, não só
praças podem ser adotadas, mas parques,
canteiros e rótulas também. Podem parti-
cipar do projeto: empresas (indústria, co-
mércio, prestador de serviços), escolas, as-
sociações de bairro ou ONGs.
Maressah Sampaio
Ele quer provar que nem todoterror é necessariamente trash. De-pois de mais de 40 anos de carreira,José Mojica Marins, o Zé do Caixão,traz de volta o personagem que po-pularizou o gênero no Brasil e atraiumilhares de seguidores. Se antes eleera apenas um ex-coveiro que mata-va pessoas por prazer, hoje é um per-sonagem complexo, que dialoga coma política e os problemas sociais dopaís. Zé do Caixão cresceu.
cinemau
18 REVISTA BABEL
Em uma fasemais madurae contextualizadacom o Brasilatual, Zé doCaixão voltacom filme maisviolentoda saga
Trashé a mãe!
A nova fase foi inauguradacom o lançamento do filmeEncarnação do Demônio, em agos-to de 2008. Na película, Zé sai da pri-são em busca de uma mulher quepossa lhe gerar um filho perfeito.Mas quase 40 anos se passaram, eele também tem de enfrentar a SãoPaulo contemporânea e a violênciadas favelas.
– O Zé do Caixão não é nadaperto dos traficantes que dominamas cidades grandes. Não dava paratrazer o personagem de volta sematualizá-lo – afirma Mojica.
Encarnação encerra umatrilogia iniciada em 1963 com ÀMeia-Noite Levarei sua Alma,complementada em 1967, com EstaNoite Encarnarei em Seu Cadáver.Encarnação é o filme é o mais violentoque Mojica já dirigiu. Há bocas costu-radas, pessoas penduradas como car-ne no açougue e mulheres mergulhan-do a cabeça em bacias com baratas. Aparte das baratas, aliás, é uma das maispolêmicas. Foram mais de 3 mil inse-tos utilizados, e quem protagonizou o“afogamento” foi a própria mulher dodiretor, Lenny Dark.
REVISTA BABEL 19
– Eu fiquei seis anos sendo pre-parada para este filme. Seis anos conhe-cendo o cinema artesanal do Mojica. Foiisso que me deu coragem para fazer acena – explica Lenny, que conheceu o ma-rido aos 17 anos, na época em que tra-balhavam juntos nos pragramas CineTrash, da TV Bandeirantes.
Considerado marginal no Bra-sil (no sentido de permanecer à mar-gem do dito cinema nacional clássico) o personagem Zé do Caixão ganhoureconhecimento fora do país. Chama-do no exterior de Coffin Joe, Zé agoratambém faz parte da elite do cinemamundial. Bastou para que o Brasiltambém começasse a prestar atençãonele. O filme Encarnação do Demônioganhou uma exibição no último Fes-tival de Veneza. Foi aplaudido e apro-vado pela crítica.
– O Brasil tem que valorizarmais o seu folclore. Chega de ficar ven-do filme de Drácula e Frankstein – re-clama Mojica.A despeito do sucesso que tem feito, ofilme correu o risco de não sair do pa-pel. Foram três tentativas de produção,que sempre terminavam porque algum
dos produtores morria. Chegou-se a fa-lar em maldição. Foi quando Mojicaconheceu Paulo Sacramento eDennison Ramalho, que nem pensaramna tal maldição e ajudaram o cineasta aatualizar o roteiro e seguir em frente atrilogia. Sacramento e Ramalho são,antes de tudo, grandes fãs do trabalhode Mojica.É justamente Ramalho que mais refu-ta o termo “trash”, usado por muitoscríticos para definir o estilo de Zé doCaixão.
– Eu desafio qualquer uma des-sas pessoas a apresentar uma falha, umacoisa sem sentido nos filmes do Zé.Estamos falando de uma personagemque tem uma história, uma carga emo-cional e age de maneira pensada – argu-menta ele, que além de roteirista, foi di-retor assistente do filme.
– Trash é um gênero america-no, usado para filmes sem contexto,sem roteiro, em que nada tem sentido.Se o Mojica é trash, então RobertRodriguez, Quentin Tarantino, EliRoth e todos os diretores de horrorcontemporâneo também são – afirma.Zé do Caixão é cult.
A trilogia deZé do Caixão
À MEIA NOITELEVAREI SUA ALMA
O coveiro Zé do Caixão,temido pelos moradores deuma pequena cidadeinteriorana, tem como metagerar um filho perfeito,aquele que possa darcontinuidade ao seu sangue.Como sua mulher nãoconsegue engravidar, elepassa a crer que a namorada
escudeiro Bruno, rapta seismoças à procura daescolhida pra lhe dar o filhoperfeito. Uma delas, porém,jura que irá encarnar nocadáver do sádico.
ENCARNAÇÃODO DEMÔNIO
Após 40 anos divididosentre o manicômio e opresídio, Zé do Caixão é
do seu melhor amigo é amulher escolhida. Violadapor Zé, a moça planejasuicídio, para poder voltardo mundo dos mortos elevar a alma daquele que aviolou.
ESTA NOITE ENCARNAREINO SEU CADÁVER
Zé do Caixão, com a ajuda de seu fiel
finalmente libertado.Novamente em contatocom as ruas, o coveiroestá decidido a cumprir amesma meta que o levouà prisão: encontrar amulher que possa lhe darum filho perfeito. Em seucaminho pela cidade deSão Paulo, deixa umrastro de horror,enfrentando leis ecrendices populares.
Matheus Mocelin Carvalho
Locadoras com longas e extensas
prateleiras comportam filmes dispostos à
escolha do cliente praticamente desapa-
receram. Hoje, os filmes são expostos
em saquinhos plásticos em qualquer
espaço público. Anunciados com
se fossem frutas em dia de feira,
as produções – algumas ain-
da sem nem terem estreado
nos cinemas nacionais –
disputam a atenção de pe-
destres com mínimo
tempo e interesse. Embo-
ra ainda não sejam totalmen-
te figuras do passado, as locadoras
de vídeo estão se tornando cada vez
menos relevantes para o consumidor ci-
nematográfico. Fragilizadas cada vez
mais pela ação da pirataria e da reprodu-
ção ilegal de filmes, elas passam por uma
morte lenta, não muito diferente do de-
saparecimento do studio system e dos gi-
gantes de Hollywood nos anos 60 e 70.
Depois do sucesso alcançado com a
popularização do VHS no final dos anos
80 e início dos anos 90, a locadora de
vídeo deixou de atender a um nicho de
consumidores com maior poder aquisi-
tivo e se tornou um programa familiar
para os finais de semana. Os felizes pro-
prietários de um aparelho de vídeo cas-
sete abasteciam suas necessidades de
entretenimento e cultura nas salas re-
pletas de filmes e cartazes grudados nas
paredes, onde gerações de cinéfilos cres-
ceram e se multiplicarem.
– Com o boom do VHS, as pesso-
as lotavam as lojas em busca de filmes.
filmesu
14 REVISTA BABEL
A indústria quese copiava
Isso só foi ocorrer novamente por volta
de 2003, com a popularização do DVD –
conta Julia Bertoglio, filha do dono da
maior rede de locadoras de Canoas.
Os primeiros lançamentos em DVD
no Brasil ocorreram em 1999, mas o
novo formato só ganhou a aceitação to-
tal do público três anos depois. Apresen-
tando inovações como qualidade digital
de áudio e vídeo e a possibilidade de as-
sistir ao filme acompanhado de extras, o
DVD criou uma sensação no mercado
audiovisual. A nova mídia alcançou uma
popularidade antes apenas almejada pelo
VHS, trazendo o público de volta às lo-
cadoras e estabelecendo a prática da
compra, antes apenas comum com títu-
los de apelo familiar.
A popularidade do DVD, no entan-
to, trouxe sua fatia de efeitos colaterais
que logo abalariam a relação com o con-
sumidor.
– Diversas locadoras novas começa-
ram a aparecer. Os donos das lojas com-
pravam seus títulos no mercado de vare-
jo por um preço muito abaixo do cobra-
do pelas distribuidoras e por isso conse-
guiam lucro – conta Tânia Zoldan, dona
de uma tradicional locadora em Canoas
há 11 anos.
O valor de um filme lançamento para
o mercado de locação costuma estar na
casa dos R$110,00 – valor que irá dimi-
nuir por mais da metade quando o mes-
mo produto for distribuído para o mer-
cado de venda ao consumidor cerca de
três meses depois.
REVISTA BABEL 21
Locadoras terão de sereinventar para enfrentar afebre do download
– Como eles tinham dificuldade em
repor os títulos, logo começaram a fe-
char – relata Tânia, que calcula que é
necessário cerca de 30 locações com o
valor médio de R$4,00 cada para um
DVD se pagar.
O que os donos das locadoras não
contavam é que, muito maior do que a
competição, o principal perigo se en-
contrava ao lado – nas esquinas, nos
centros de venda populares e dentro das
próprias casas. Com a quebra do código
anti-cópia criado pela Microvision, o
DVD pirata foi adotado por vendedo-
res ambulantes como um modo de ge-
rar lucro fácil. Comercializados em
mídia de baixa qualidade e embalados
em saquinhos plásticos ou em papel, os
discos copiados logo ganharam espaço
entre o público de baixa renda como
um modo barato de ter acesso ao entre-
tenimento. Podendo ser reproduzidos
por qualquer pessoa com acesso a com-
putador, os filmes logo se propagaram
online através de programas de
download de vídeos como eMule e
µTorrent. A situação começou a cha-
mar a atenção dos grandes estúdios
quando produções que ainda nem ha-
viam estreado nos cinemas começaram
a vazar na Internet.
O golpe foi sentido pelas locadoras
de forma quase instantânea.
– Aqui no bairro, metade das pesso-
as que costumava alugar filmes não alu-
ga mais. Um colega me disse que atual-
mente aluga apenas 10% do que era acos-
tumado a fazer – diz Tânia.
O baque em grande escala, no en-
tanto, ocorreu quando as 127 lojas da
rede Blockbuster foram vendidas para as
Lojas Americanas. Agora, as prateleiras
de DVD dividem espaço com comida e
produtos de conveniência. Enquanto
diversas outras locadoras menores segui-
ram o mesmo caminho, algumas ainda
se mostram resistentes em adotar tais
artifícios para resgatar o público.
– Eu não vejo nenhuma vantagem –
admite Julia, que prefere manter o foco
no seu produto de origem.
DVD original comparado aDVD pirata de camelô
Já Carlos Carvalho decidiu que o
caminho estava na variedade quando
abriu sua locadora há dois anos.
– Sempre tivemos isso em mente,
mas na época não era por causa do re-
torno do mercado de locação – diz ele,
se referindo aos serviços de lanches e
lan house que agregou à locadora.
É inegável, no entanto, confessa
ele, que as locações tenham diminuído
consideravelmente nos últimos tempos,
forçando-o a vender alguns de seus tí-
tulos com menos retorno.
As táticas das locadoras de contra-
atacar variam de acordo com o tama-
nho e com sua localização.
– Algumas locadoras menores em
bairros pobres compram um título e fa-
zem cópias do mesmo – reporta Tânia,
que também acredita que baixar os pre-
ços não compensa devido aos gastos
com a aquisição de filmes. Uma das al-
ternativas para conter os custos tem sido
deixar de comprar certos títulos no mês
de lançamento para adquiri-los mais
tarde por um preço reduzido.
Apesar da drástica queda em locações,
o consumo de filmes se mantém mais alto
do que nunca.
– Hoje praticamente todos têm uma
coleção de DVDs, por menor que seja.
Mas colecionadores sérios mesmo são
aqueles que possuem um gosto especial
pelo conteúdo dos discos, seja música ou
cinema – relata Flávio Brun, dono de uma
coleção com mais de 600 títulos origi-
nais.
E é este público que as distribuidoras
visam atingir com o lançamento do blu-
ray, o novo formato de vídeo em alta defi-
nição. Com qualidade superior de áudio e
vídeo e formas inovadoras de interação,
os grandes estúdios o vêem como uma
alternativa de revitalizar o mercado e ti-
rar proveito da recente febre dos televiso-
res de plasma e LCD. Embora algumas
locadoras já estejam adquirindo títulos
em blu-ray, outras ainda se encontram
relutantes em ter que substituir todo seu
catálogo por uma segunda vez.
Quanto ao futuro da locação em si,
as previsões tendem ao lado apocalíptico.
– Já terminou. O futuro é o
download. Ainda existe o público que
gosta de pesquisar os títulos ou então
que não tem condições de ter um bom
computador em casa. Talvez as locado-
ras agradem mais os bairros pobres –
prevê Tânia.
Enquanto a indústria continua a se
copiar a um nível que escandalizaria até
Walter Benjamin, resta ao mercado de
locação encontrar novos modos de se
reinventar. Se o cinema conseguiu se er-
guer em frente à ameaça televisiva, ainda
existe uma chance de o velho hábito de
locação não partir para o movie heaven.
qMaressah Sampaio
Você ouve a voz deles todos os dias,
mas provavelmente nunca vai conhe-
cer seus rostos. Os dubladores vivem
como seres sem imagem própria, sem-
pre à espera de um outro eu – o novo
personagem. O trabalho é o de atuar
sobre a atuação, capturar a personali-
dade de alguém que não existe no mun-
do real, mas que já existe na ficção. Tal-
vez não seja mais difícil do que ser um
ator tradicional. Porém, com toda a cer-
teza, é mais ingrato.
Miriam Ficher faz dublagens desde
os 13 anos. Já emprestou sua voz para
alguns dos personagens
mais conhecidos do públi-
co brasileiro, como a
Princesa Sara, do desenho
Cavalo de Fogo, a Char-
lene, de A Família Dinos-
sauro e a Piggy, de Mup-
pet Babies. Também du-
bla as atrizes hollywoo-
dianas como Meg Ryan,
Angelina Jolie e Nicole
u
22 REVISTA BABEL
Voz de um, focinho do outro
Os dubladores, contudo, concordamque há dublagens e dublagens. Elespreferem assistir filmes dublados, desdeque sejam versões bem-feitas, o que nemsempre acontece.
– Eu prefiro ver filme bem dublado. Se
não for assim, é melhor legendar mesmo, oque é uma pena, pois assim perdemos
muitos detalhes – entende Miriam.
– No caso do cinema, se eu leio, perco
os detalhes das cenas, já que não consigoprestar atenção em tudo ao mesmo tempo.Já os desenhos eu não suporto mesmoassistir legendados, já que é um costume
desde criança assistir em português –conta o promoter Émerson Vasconcellos,que sempre leva os dubladores paraconversar com o público em seus eventos.
Independente dos gostos, todo mundojá viu centenas de filmes dublados ecresceu assistindo a desenhos na língua-mãe. Se na infância, é por necessidade,depois, é por comodidade – ou por falta deopção, no caso da TV aberta. Mas, mesmoquem prefere os legendados, reconheceque Chaves e The Simpsons não são Chavese The Simpsons sem dublagem. É fato.
Dublado x legendadoKidman. São personagens muito diferen-
tes, unidos pela voz de uma mulher que
acha graça da imaginação do público.
– Nunca vão pensar que eu, baixi-
nha, 1,50m de altura, sou a Angelina Jolie
– diverte-se Miriam.
No Brasil, a unanimidade é que a pro-
fissão não tem o reconhecimento devido.
– Só os fãs valorizam – afirma Élcio
Sodré, foto abaixo, o Shiryu, de Cavaleiros
dos Zodíacos e o Pateta, em A Turma do
Pateta.
– Em termos financeiros, é uma car-
reira muito instável – completa Miriam.
Situação injusta para um país que fala uma
língua bem menos popular que o inglês e
o francês, por exemplo –
uma nação em que a maio-
ria convive com a dubla-
gem desde a infância. O
início das atividades da du-
blagem brasileira data de
1938, quando, no Rio de
Janeiro, nos estúdios da
CineLab, o filme Branca de
Neve e os Sete Anões ga-
nhou sua versão nacional.
Miriam Sodré,dubladora de
Angelina Jolie,diverte-se com asdiferenças físicas
entre ela e aspersonagens
filmes
O jeito indie de serMaressah Sampaio
Seus cabelos são “bagunçados”, ves-tem roupas de brechó com bottons,calçam apenas tênis All Star e estãosempre baixando alguma música daúltima banda que surgiu em Lon-dres. Enfrentam qualquer tem-peratura com um cachecolem volta do pescoço,compram vinis sem tertoca-discos em casa emantêm palavras eminglês e francês no voca-bulário do dia a dia, ainda quenão dominem esses idiomas. Oque para alguns soa como umacontradição, para eles é moda.Eles são os indies, uma tribo ain-da em processo de interpretação.
Abreviado do inglês inde-pendent (independente em por-tuguês), o termo indie expandiu-se e invadiu o cenário pop, alcan-çando a moda e tornando-se
ucomportamento
para muitos um estilo de vida. Seus representantes estão ligados àmúsica, por causa das bandas de rock. Ainda assim, são poucos osassumidamente indies.
– Se o indie vem de independente, eu poderia me incluir no‘rótulo’, mas a partir do momento que vira um rótulo, passa a serum conjunto delimitado de atitudes e eu não me sinto limitada
nesse sentido – argumenta a jornalista Ana Bazerque que, apesarde gostar de bandas como Interpol, The Strokes, The Hives e Yeahyeah yeahs, símbolos do movimento, não se considera indie.
O indie transforma o alternativo em moda. Os terninhos à laBeatles para os meninos e as blusas xadrez aliadas a saias curtas ebotas pretas para as meninas são o mínimo que se pode esperarde alguém que serve à tribo. Na rua eles são cada vez maiscomuns, mesmo que isso signifique um contra-senso para ummovimento que se orgulha de servir ao underground.
– Alternativo quer dizer diferente. Mas deixou de ser
diferente há muito tempo – opina a estudante de rela-ções públicas Deisy Piaia, apreciadora da moda indie.Então, a solução, diz ela, “é encontrar maneiras não-con-vencionais para compor o próprio estilo”.Assumidos ou não, os indies estão aí, sem se importar
com o anacronismo de vestir roupas retrô, ao mesmo tem-po em que correm para o mundo cibernético para baixaro mais novo lançamento daquela banda que ninguémconhece ainda. Eles não estão preocupados se são con-traditórios ou não – e talvez resida neste ponto todo o
charme do jeito indie de viver.
REVISTA BABEL 23
ACESSÓRIOSPPPPPCachecol ou lençoPPPPP Tênis All StarPPPPPÓculos escuros de aro grosso
BANDASPPPPPThe StrokesPPPPPLast Shadow PuppetsPPPPPYeah yeah yeahs
MANIASPPPPPComprar vinisPPPPPNão gostar de solPPPPPOuvir bandas que ninguémconhece3
Fernanda Rafaeli Gomes
Aqueles momentos de brincadeiras, pu-
los e mordidas agora são apenas lembran-
ças. O cachorro arteiro e o gato serelepe –
que são a maioria dos animais de estima-
ção nos lares brasileiros – também ficam
velhos. Para os proprietários, esta fase da
vida dos animais chega carregada de dúvi-
das para seus donos, e uma delas diz res-
peito a alimentação adequada.
Quase não há literatura específica so-
bre o assunto. Por isto, a solução é opi-
nião de pessoas que criam animais há
muito tempo e também de veterinários,
que tenham acompanhado o desenvol-
vimento e o amadurecimento saudável
de cães e gatos.
Muitos animais vivem saudáveis por
muitos anos, mas é preciso que o dono
fique atento
– Cães de grande porte, por exemplo,
envelhecem mais precocemente que os
vida de bichou
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Ficar atento ao comportamento e oferecer mais amor e atenção é fundamental
Elestambém ficam velhos
qCaracterísticas alteradas
Os animais idosos já nãocuidam tanto do pêlo, têmmovimentos lentos e sua rotinaé pacata. As capacidadesauditivas, olfativas e visuaisdiminuem.
Mudanças nocomportamento
Em geral, os animais idososnão costumam gostar de
brincadeiras com o mesmovigor de antes. Essa situaçãoacontece, porque o envelheci-mento dos pets é parecido como dos humanos e, devido àidade, perdem a destreza e amobilidade. Mas os animais quesão acostumados a brincardesde pequenos respondemmelhor aos estímulos mesmoquando velhos.
O convívio comoutros animais
Deve-se levar um animalnovo para a casa onde vive umidoso aos poucos. No convívio
com animais mais vigorosos,o mais velho pode ficaragressivo, isolar-se, recusarcarinho, comida e brigarcom os demais pets da casa.
Alerta coma alimentação
A idéia principal é mantera saúde e evitar a obesidadedo animal idoso, a fim dediminuir o risco do desenvol-vimento de doenças crôni-cas, como a renal e acardíaca. Para isso sãonecessários os seguintescuidados:
– A obesidade pode e deve
ser controlada com o uso deuma ração light/diet (aalimentação caseira não é aideal), com exercícios leves eum aumento leve da ingestãode água;
– A alimentação deve ser
oferecida, se possível, cincovezes por dia ao invés de umaúnica porção. Assim, o animalcome menos quantidade, maisvezes, controlando melhor oapetite;
– Preferir rações do tipo
sênior para um animal idoso é omais indicado porque apresen-
Cuidados comos bichos
A veterinária Luísa Machado Moreira, de Uruguaiana
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tam teores ideais dos nutrien-tes adequados à idade.
Gravidez, um risco àsaúde
Na idade avançada, agravidez é muito arriscada,porque o organismo do animaljá passou por muitas transfor-mações.
Sem que o dono perceba,algumas doenças assintomá-ticas já podem estar afetandoo pet. A amamentaçãosobrecarrega a fêmea, expõea sua própria saúde e tambémdos filhotes. Além disso, a
qualidade dos óvulos tambémnão é mais a mesma, o quepode provocar uma má-formação das crias. Mas omais provável, se ocorrer agravidez, é que a fêmea nãoconsiga parar. A idade fértilideal não deve passar doscinco ou seis anos nas cadelasde grande porte, sete naspequenas e médias e de seisanos nas gatas.
O melhor momentopara castrar
A idade ideal para castraras fêmeas de grande porte é
em torno de seis anos, poisevita que o animal maisvelho corra riscos dereproduzir. No caso dosmachos, dá para castrarmais ou menos com oito ounove anos, se for um cão depequeno porte. Isto farácom que os animais tenhamuma expectativa de vidamaior e com mais conforto.A castração de animais quenão tem funçãoreprodutiva preserva a suasaúde, evita doençasvenéreas e o surgimento detumores de mama.
Conforto e tranqüilida-de são obrigatórios
Nesse ciclo da vida dospets, manter um ambienteseguro, tranqüilo e confor-tável é o ideal. O convíviocom ruídos altos ou comcrianças barulhentastambém deve ser evitado,pois isso pode estressar oanimal e até mesmo desenca-dear doenças.
Check-upsAs visitas ao veterinário
devem ocorrer pelo menosduas vezes ao ano.
cães menores. Aqueles que pesam entre
30 e 40 quilos começam a ser considera-
dos senis por volta dos seis ou sete anos,
enquanto um de pequeno porte começa
esse processo aos oito ou nove. Os felinos
apresentam sintomas da idade avançada
a partir dos seis ou sete anos, como os
cães de grande porte – explica o médico
veterinário Walter Francisco Guedes da
Silveira, proprietário de um consultório
veterinário no centro de Esteio.
Por outro lado, para Jair Bitencourt,
dono de um canil de pequineses e de
um gatil de persas e himalaias em Porto
Alegre, as fêmeas atingem a idade avan-
çada após os cinco anos de idade.
– Depois do quinto ano de vida, elas
estão velhas para dar cria, então não faço
mais cruzamento, pois receio que os fi-
lhotes comecem a ficar fracos e não re-
sistam – afirma o criador. Além disso,
Bitencourt conta que após essa idade,
oferece os animais já castrados para ado-
ção. Os gatos são castrados por volta dos
sete anos e as gatas, com cinco.
Expectativa de vida
A expectativa de vida para um ani-
mal de grande porte que vive dentro de
casa é de 15 a 16 anos.
– Há casos de cães da raça Fila que
mora dentro de casa, embora não seja
comum – declara a veterinária Luísa
Machado Moreira, que atende em
Uruguaiana.
Já para aqueles que vivem dentro e
fora de casa, se forem grandes, cerca de
oito ou nove anos; se forem pequenos
ou médios, 12 anos.
Os sinais de avanço da idade muitas
vezes passam despercebidos porque o
animal começa lentamente a parar de
comer, de brincar, de passear com a
mesma vontade de antes. Pode aconte-
cer de o dono não ser muito atento e
não se dar conta que qualquer alteração
física ou de comportamento, pode ser
um sinal do envelhecimento. Além dis-
so, a pelagem fica mais áspera e, se o
proprietário não tem o hábito de
escová-lo, não percebe nenhuma alte-
ração visual.
– Ainda que os animais de estimação
estejam vivendo muito próximos dos seus
donos, os sinais da idade avançada po-
dem passar despercebidos, pois quase
sempre eles não apresentam nenhuma
alteração ou mudança visível, à exceção
de uma maior lentidão e maior predis-
posição às doenças, portanto o proprie-
tário deve ficar atento – orienta Silveira.
Cães saudáveis gostam de brincadeira em qualquer idade
Maressah Sampaio
Homens nem sempre se dão bem com
relacionamentos amorosos. O senso co-
mum diz que indivíduos do sexo mascu-
lino têm certa dificuldade em assumir
relações sérias. Por outro lado, existem
os que sofrem o efeito reverso, aqueles
que não conseguem terminar o relacio-
namento. Seja por medo de ficar sozi-
nho, seja por não querer magoar a outra
pessoa, ou por qualquer motivo
indecifrável, fato é que eles adiam muito
mais do que elas a hora de dizer adeus.
Segundo o psicólogo Edson Knob, a
razão é social:
– Até o início do século passado, o ho-
mem tinha duas, três mulheres, sem pre-
cisar terminar o casamento ou o namo-
ro. Mas, com o advento do feminismo,
de uma maior liberdade para o antigo
sexo frágil, essa situação mudou. Agora
ele tem que dar um fim em uma relação
para começar outra. Como ainda está se
acostumando com a nova realidade, não
sabe como agir.
O jornalista Rafael Terra é um exem-
plo de homem que não consegue colo-
car ponto final em uma relação. Mas, ao
contrário do
psicólogo, ele
acredita que a
razão de não
conseguir ter-
minar é senti-
mental.
–Alguém
entrou na tua
vida, se tornou
importante
para você,
conquistou o
seu amor...
Não dá para
um dia simplesmente eliminá-la da sua
vida. Mesmo que não haja mais amor,
ainda existe a consideração pelo outro, a
comportamentou
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Não aprendi a dizer
adeus...
lembrança dos bons momentos – argu-
menta.
Mais do que o amor, as pessoas dividi-
ram horas, dias, espaço e uma vida.
– Existe uma relação de dependência
estabelecida. Estas relações podem ser
baseadas em questões financeiras,
afetivas ou mesmo em uma necessidade
de ter a companhia de outra pessoa –ex-
plica Knob.
Ainda assim, existem os que não têm
trava na hora de terminar. O estudante
de Direito Vinicius de Oliveira é um
deles.
– Sentimento é uma coisa única. Não
tenho culpa se alguém se apaixona por
mim ou se eu me apaixono por alguém.
Tampouco tenho culpa se eu me de-
sapaixono. É incontrolável – diz ele, que
não sente a mínima culpa em terminar
uma relação.
– Mas vejo amigos há meses tentando
encontrar uma forma de desfazer o na-
moro e não fazem por medo – observa.
Os homens, primeiros a fugir de re-
lacionamentos sérios, são também os
últimos a abrir mão deles, mesmo
quando não está mais tudo bem. Tal-
vez até uma coisa esteja relacionada
com a outra e eles digam não antes
para não ter que dizer adeus depois.
Vai ver tudo é um problema de conse-
guir escolher as palavras que não ma-
goem. Certo é que também devem exis-
tir muitas mulheres por aí sem cora-
gem, apenas esperando que eles ‘cum-
pram seu papel’. Se um não faz, o ou-
tro não paga para ver.
O psicólogo EdsonKnob entende que os
homens nãoconseguem terminarporque no passado
eles podiam viver comduas ou três mulheres,
sem ter que sepreocupar com isso
dica demestre
Uma boa dica, ou melhor, boas dicas de leitura para osestudantes e profissionais da área de Comunicação Social
são os livros do sociólogo polonês Zygmunt Bauman.
Dos livros lançados no Brasil, indico dois: TemposLíquidos (Jorge Zahar Editora, 2007) e Identidade (Jorge
Zahar Editora, 2005). Existem 12 outras obras do mesmo
autor que também foram lançadas aqui no país, mas paracomeçar estes dois títulos resumem bem o pensamento do
sociólogo.
Como mencionado, Bauman é um e professor eméritode sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia e recebeu
os prêmios Amalfi (em 1989 pelo livro Modernidade e
Holocausto) e Adorno (pelo conjunto de sua obra).O interessante destes dois livros indicados está na clareza
de texto e de idéias apresentadas em relação às condições
sociológicas na qual nos encontramos hoje.O termo líquido é sistematicamente empregado por
Bauman nas suas obras e não é para menos. Através de suaexposição, ficam evidentes as condições de fluidez vividas
por nós hoje, principalmente na sociedade ocidental. No caso
de Tempos Líquidos, o autor se concentra na insegurança(principalmente nas grandes cidades) vivida hoje por todos
nós diante de um mundo que muda rapidamente e no qual a
perda de referência e segurança ajuda a constituir umaperspectiva não-sólida.
Já em Identidade, Bauman mostra como esta fluidez irá
atingir todos nós em uma sistematização do transitório quese torna uma constante. Assim, a liquidez da vida, da
sociedade, da política, da economia e de todas as perspectivas
sociais passam a ser a ordem do dia onde se torna necessáriorepensar e refletir sobre o que acontece na sociedade.
Embora não sejam obras pontuais do ponto de vista do
estudo da comunicação social, estes dois livros ajudam, emuito, para a compreensão do que acontece na sociedade na
qual estamos inseridos, contribuindo com uma apreciação
crítica de como pensamos, agimos e vivemos.Contrapondo com o pensar moderno onde a tendência
para o maniqueísmo ainda tem hoje as suas raízes fincadas, a
convergência para o pensamento líquido traz uma análiselúcida e explicativa para que se possa compreender como se
estabelece o homem pós-moderno hoje nas suas angústias,
anseios, medos, prazeres e vivências.
Tempos de fluidez
Alberto Raguenet é formado em jornalismo com mestrado em
Comunicação Social, trabalha na área publicitária há 20 anos e é
professor da Ulbra e da PUCRS.
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livrou
ALBERTO RAGUENET
QUALQUER
NOTÍCIABOAç
Novos ou velhos, limpos ou sujos e de qualquer cor, elesempre estará em todos os ambientes que se possafreqüentar. Em 2008 ele completa 100 anos. Tão famosoquanto a Coca-Cola, o Converse All Star virou maniamundial. É difícil encontrar quem não tem ou nunca teveum. Em ruas, shoppings, escolas e festas, ou em qualquerlugar: sempre se acha pelo menos uma pessoa com ele no pé.O All Star nunca passa despercebido. São várias cores,modelitos, cano alto ou baixo ou o tradicional “botinha”.Ninguém sabe explicar como um tênis criado em 1908especialmente para a prática do basquete tomou conta domundo. Crianças, jovens e adultos – todos podem calçá-lo.
Quem tem, gosta, e sempre quer ter mais. (Natacha Teske)
Estilo centenário
Você acorda de madrugada para checar seu correioeletrônico? Sonha com linguagem HTML? Entra em crisequando não consegue acessar a Web? Se você respondeu“sim” a qualquer uma dessas perguntas, considere-se umviciado em internet. O uso exagerado, ou obsessivo, dainternet, pode provocar problemas psicológicos sérios aosusuários, além dos físicos já conhecidos, como tendinite(inflamação de um ou mais tendões), dores de cabeça, braçose pernas e de problemas oculares. Os efeitos colateraisresultantes do uso excessivo de computadores demoram aaparecer, e alguns afetam diretamente a saúde, comodepressão, ou transtorno obsessivo-compulsivo. (Fernanda
Rafaeli Gomes)
Use, mas não abuse!
Fanáticos por Converse All StarCom quase 160 mil membros, a
comunidade virtual noOrkut “Converse AllStar” abre espaço paraque os fanáticos (ousimples donos de All Star)discutam sobre suas preferências decores, estilos e formatos. Paramuitos, ele não é apenasum tênis, e sim uma idéiaou estilo de vida. Omodelo All Star ChuckTaylor surgiu em 1923,através de parceria com umjogador de basquete dos Estados Unidos,Charles “Chuck” Taylor. Hoje, ele já évendido em 144 países. Com seus 100anos de história, ele coloca nospés de pessoas de todo omundo originalidade,beleza e um cartão deidentificação em quem osusa: eu sou Converse All
Star. (Natacha Teske)