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ALMADA FORMA a revista do centro de formação da associação das escolas de almada nº12 | fev | 2016

Revista AlmadaForma 12 - Liderança e Organização Escolar

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A revista do Centro de Formação da Associação de Escolas de Almada

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ALMADAFORMAa revista do centro de formação da associação das escolas de almada nº12 | fev | 2016

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ÍndiceEditorial 3

Organização e Liderança Escolar 4

Formação Contínua de Professores 9

Coreografias Pedagógicas 19

Alternativa na Reutilização de Papel 25

A Formação Contínua de Professores 29

Programa Ibero-Americano de Mobilidade Docente 35

Liderança e Organização Escolar 41

Pontes Colaborativas 43

Ser Professor… Criativo 48

Bibliotecas Escolares e Bibliotecas de Sala de Aula 50

Aprendiendo en Lisboa 52

Articulação Entre Literatura e Matemática 56

Inteligência Espiritual 69

Liderança e Práticas Colaborativas em Contexto Escolar 82

Português Língua Não Materna (PLNM) 89

Ficha Técnica

Directora: Maria Adelaide Paredes Silva

Colaboradores: Alunos do 11ºL - Curso de Design Gráfico/Escola Secundária de Cacilhas Tejo, Adelaide Silva, Ana Paula Rocha, Ana Paula Silva, Antónia Carvalho, António MoreiraDarckcélia Pereira, Dulce Gonçalves, Giovana Pires, Helena Alves, Jesus Lemos, Karine Nascimento, Manuela Dâmaso, Manuela Santos, Márcia Bezerra, Maria Paula Rodrigues, Maria Prazeres Casanova, Natália Carias, Regina Araújo, Roque Antunes, Sara Custódio (imagem da capa), Verónica Colin, Wim Simoens.

Paginação e arranjo gráfico: Domitila Cardoso, Maria da Luz Vieira

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Editorial

A 12ª edição da Revista AlmadaForma online organiza-se em função do Programa de redes de movilidad del Profesorado: Redes Académicas de Formación Docente da organização dos estados ibero-americanos - OEI com a intenção de dar visibilidade a um projeto de grande interesse e significado, no âmbito da formação e mobilidade docente realizado em 2015. Na qualidade de interveniente privilegiado, o Centro de Formação de Escolas do Concelho de Al-mada comprometeu-se a reunir o essencial de um tempo maravilhoso de encontro e descoberta, de aprendizagem e convívio, tendo merecido a subida honra de acolher e guardar para memória futura os inestimáveis contributos de todos os que se envolveram e partiram nesta profunda viagem de conhecimento de nós e dos outros, num mundo de infinita generosidade e esperança.O Programa de redes de movilidad del Profesorado: Redes Académicas de Formación Docente desenvolveu-se em Portugal, México, Brasil e Chile, no período de abril a maio de 2015. Tratou-se de um intercâmbio planificado, de acordo com um vasto programa de atividades, estruturado pe-las escolas acolhedoras do projeto e apoiado pelos Ministérios da Educação dos países visitados em conjugação com a Organização dos Estados Ibero-americanos, organização para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), com sede em Espanha. A participação portuguesa neste programa de mobilidade e intercâmbio docente concretizou-se graças ao interesse e apoio do Ministério da Educação e Ciência (MEC) de Portugal, através da DGAE – Direção Geral da Administração Escolar, apoiada pela Secretária-geral do MEC e diretores e professores dos seguintes agrupamentos: Agrupamento de Escolas Vergílio Ferreira, Agrupa-mento de Escolas de Alvalade, Agrupamento de Escolas Monte da Lua, Agrupamento de Escolas Daniel Sampaio, Agrupamento de Escolas da Caparica e o Centro de Formação da Associação de Escolas do Concelho de Almada – CFAECA. Os temas de desenvolvimento centraram-se em quatro áreas distintas: Brasil - São Paulo – Ino-vação Educativa; Brasil – Teresina - Desenvolvimento Profissional Docente; Chile - Bibliotecas Escolares e Bibliotecas de Aula e México – Currículo Educativo e Evolução das Aprendizagens. Felicitamos a Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI) e o Ministério da Educação e Ciência (MEC) de Portugal pelas pontes interpessoais e inter-culturais que se construíram, excelentes oportunidades de desenvolvimento docente e de serviço de qualidade à educação e formação de professores.Cientes de que o professor precisa de se formar e desenvolver continuamente, reconhecemos o valor de partilhar saberes e experiências, criar redes académicas, desenvolver ambientes de formação, de aprendizagem e de construção de conhecimento para o bem-estar docente em crescimento pessoal e profissional. Congratulamo-nos e celebramos neste tempo novo e inspirador o ser professor aqui e no mundo. Aceitem compartilhar a riqueza das mundividências, dos projetos e práticas pedagógicas, dos artigos científicos de interesse educacional, formativo e reflexivo. A mobilidade docente tornou-nos melhores pessoas e profissionais da educação, mais cons-cientes e críticos do mundo que habitamos e reinventamos uns com os outros, por via da ação educativa, a preciosa energia que tornará possível um mundo melhor. Acreditamos.

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EDUCAÇÃO

Organização e Liderança EscolarAportes sobre o desenvolvimento profissional docentes

Antonia Dalva França Carvalho Universidade Federal do Piauí/Brasil

Maria Adelaide Paredes Silva CFAECA

Maria Manuela Dâmaso dos Santos Presidente CAP

Agrupamento Escolas da Caparica

Resumo

Este texto discorre sobre os resultados da expe-riencia realizada no ámbito do Programa Iberoame-ricano de Mobilidade Docente, referente à Rede Li-derança Escolar e Organização em Lisboa-Portugual (18 a 25/04/2015) e no Brasil, em Teresina (11 a 15/05/2015), na Universidade Federal do Piauí, com o financiamento da CAPES. O objetivo foi promo-ver trocas de experiências educacionai entre países envolvidos e criar uma rede de colaboração e inter-câmbio profissional na área de liderança e organi-zação escolar. A rede foi ampliada, incorporando o eixo desenvolvimento profissional docente, aquí abordado tanto a perspectiva epistemológica de sua construção, como os desafíos enfrentados para sua consolidação.

Introdução

Fortalecer a profissão docente é uma das prio-ridades da ação da Organização dos Estados

Ibero- Americanos (OEI) e, portanto, tem forte presença nas “Metas Educativas 2021 do pro-jeto: a educação que queremos para a geração dos Bicentenários”. Surge então, o Programa de Mobilidade de Professores em toda a Amé-rica Latina e nos países do Mercosul a partir de 2014, no qual o Ministério de Educação de Portugual e o Ministério da Educação do Brasil/Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior(Capes), por meio de sua Dire-toria de Formação de Professores da Educação Básica, participam.

A Capes é um órgão de fomento que atualmen-te desenvolve políticas de formação de profes-sores tanto em nível de graduação, como de pós-Graduação no Brasil. No âmbito da gradu-ação desenvolve muitos programs para melho-rar a qualdiade da educação no país. Um deles, denomina-se Pibid (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à docência) cujo objetivo é formar professors, incentivar a formação de professores para a Educação Básica, elevando a qualidade da formação inicial de professores nos cursos de licenciatura, promovendo a in-tegração entre educação superior e educação básica e, assim, contribuir para a valorização do magistério. Como a Universidade Federal do Piauí, foi uma das pioneiras a implementar o Pi-bid, desde 2008, foi selecionada para integrar as instituições que participariam da mobilidade.

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Assim, em abril de, 18 a 25, a Organização dos Estados Ibero- Americanos ( OEI) , em coorde-nação com o Ministério da Educação, Governo de Portugal prepararam a agenda de atividades, cumprida por oito professores que participam no “ Programa da Rede a mobilidade dos do-centes: Liderança Escolar e Organização “. Par-ticiparam do evento, os professores Ruperto Rodrigo Pizarro e Berta Ester Castro Watson, do Chile, Antonia Dalva, Bruno Lima, Alessandra Patricia S. Pires Juliana Castelo Branco, brasi-leiros e as mexicanas Juradoy Veronica Rodri-guez Rivera Araceli Colin, no qual conheceram aprendizagem criativa focada em Liderança e organização escolar. Também participaram pro-fessoras dos agrupamento de escolas de Lisboa, que apresentaram suas boas práticas e repre-sentantes da OEI e do Ministerio da Educação de Portugual.

Para dar continuidade a esta mobilidade na semana, de 11 a 15 de maio de 2015, as pro-fessoras Maria Adelaide e Maria Manuela, de Lisboa, estiveram em no Brasil, no estado do Piauí, na cidade de Teresina, tendo como lócus de trabalho a Universiade de Federal do Piauí onde participaram do I Encontro das Equipes gestoras Parcerias do Pibid da UFPI (I EEGEPP), no qual compartilharam suas experiencias, as-sim como vivenciaram as práticas do Pibid e as práticas das escolas conveniadas.

O evento, ocorreu em dois campi da UFPI, Mi-nistro Petronio Portella, na cidade deTeresina e Ministro Reis velloso na cidade de Parnaíba, este dia 12 de maior de 2015. O evento, provocou em todos os envolvidos alunos, supervisores e coordenadores do Pibid da UFPI e diretores e coordenadores das escolas publicas convenia-das a reflexao sobre a liderança e gestão esco-lar, assim como sobre a formação inicial e no desenvolvimento profisisonal dos professores.

De modo geral a mobilidade possibilitou a troca de experiências educacionai; atender as formas políticas, organizacionais, pedagógicas e meto-dológicas e trabalhar no sentido de criar uma rede de colaboração e intercâmbio profissional

na área de liderança e organização escolar. E isso significa que estamos no caminho de articu-lar ações em torno de uma educação laica, ca-paz de formar gerações de cidadãos autônomo, cultos, que contribuam para o esenvolvimento social e econmonicos dos paises iberoamericas-nos, que, em sua grande maioria festejam du-zentos anos de sua independência.

1. Estado da situação

O intercambio realizado fortalece o Programa da Rede a mobilidade dos docentes: Liderança Escolar e Organização Escolar, que passa a ser constituido com a participação do Brasil, repre-sentandos pela Universidade Federal do Piaui e da Secretaria Municipal de Educação do Estado de São Paulo, do México, Chile e Portugual. A rede se amplia passando a incorporar, tam-bém, o eixo do desenvolvimiento profissional, a qual tratara de questões relativas à formação profissional dos atores escolares, tanto inicial como continuada. O objetivo é fomentar nos profissionais que ja estão na escolas, gestores e professores capazes se refletir e agir em rumo autodesenvolvimento profissional. Dai a rele-vancia da existencia de professores de univer-sidades nesta rede, ou seja, para coordenar o desenvolvimento de planos de formação conti-nuada nas dimensões, técnicas, éticas, estéticas e sociomemocionais dos professores que pos-sam colaborar na consecução dos objetivos da Metas do Projeto.

Neste aspecto, Lawrence Stenhouse afirma que “em linha teórica mais reflexiva as característi-cas do profissional pleno são: a capacidade para o desenvolvimento profissional autônomo me-diante uma análise sistemática, o estudo do tra-balho de outros professores e a comprovação de idéias mediante procedimento de investiga-ção” (STENHOUSE, 2004, p. 197).

Porém, pensamos como Sacristán (1999) que a ação pedagógica não pode ser analisada do ponto de vista instrumental, uma vez que o pro-fessor é humano. É gente, complementa Freire (1996), elencando outra serie de competências

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como a generosidade, a eticidade, a interven-ção, a criticidade, o comprometimento, a au-tonomia, a liberdade, a autoridade, a tomada de decisão, a consciência, o saber ouvir, o saber dialogar e o bem-querer dos estudantes que, igualmente, compõem as bases do ser educa-dor.

Como uma das metas da OEI é a promoção da cooperação orientada para a melhoria contínua da qualidade de ensino superior, estamos envi-dando esforços nos estudos acerca desta temá-tica em nosso grupo de estudos aqui na Univer-sidade. Estes esforços advém do novo cenário da formação para o trabalho docente que traz à centralidade do perfil do egresso dos cursos de formação de professores a dimensão didático-pedagógica (profissional reflexivo e competen-te), caracterizando um modelo de formação centrado nas competências.

Ora, se a ideia é fomentar nos professores o desenvolvimento de compêtencias que pos-sam direccionar o saber fazer do professor para além da racionalidade técnica, como assevera Habermas (2002), isso significa, desenvolver processos formativos que viabilizem o apren-dizado de habilidades intelectuais. Habilidades que possam movam este saber fazer, com uma finalidade situada, a partir da compreensão das realidade e de contextos, com criativida-de e inovação. A inovação não se refere aqui a uma experiência inédita, mas sim a uma expe-riência nova para o professor. Portanto, o de-senvolvimento professional docente não pode prescindir formação docente (inicial ou con-tinuada) for a deste contexto epistemológico. Assim, as ações formativas da rede ficadas no

desenvolvimeno profissional deverão ter como base a teoria critica. E da mesma forma. deverá desenvolver no professor a autonomia intellec-tual de selecionar estratégias necessárias para formatar uma prática pedagógica fundamenta-da em uma praxis criativa, orientada pela cri-ticidade e pela dialética, dimensões vitais para o aluno e para ele próprio enquanto formador de cidadãos. E assim ele estará personalizando a racionalidade pedagógica de seu trabalho, revelando uma epistemologia da prática decor-rente de uma cultura profissional, cujo ethos é construído com o outro e para o outro.

2. Desafios a enfrentar

Se tratar do desenvolvimento profissional docente no ámbito de uma única instituição constitui-se um desafio, este desafio torna-se ampliado quando a temática passa a ser coleti-va, sobremodo quando envolve muitos países, como é o caso da Rede de Mobilidade docen-tes Liderança e Organização Escolar, instituida pela OEI. Porém, não é uma tarefa impossivel, desde que a própria OEI institua as formas de execução.

Ainda embebecidos com a mobilidade e as par-cerias assumidas, estamos a construir o nossos primeiros esboços para a consolidação do eixo supracitado. A nossa ideia, ou seja, a ideia da rede é realizar cursos de formação continuada presencial e a distância, para os profesores usando a plataforma Moodle. Trata-se de um ambiente de ensino e de aprendizagem de in-ternet baseado em software livre, ja utilizado por todo o mundo, cujo dominio é fácil de ser disponibilizado. Esta formação poderá ser ofer-

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tada pelo Ministerio de Educação de Potugual, através da Almdaforma, Centro de Formação de Escolas do Concelho de Almada, coordenada pelas professoras Maria Adelaide Paredes Sil-va e Maria Manuela Dâmaso dos Santos, bem como pela Universidade Federal do Piauí, pela professora Antonia Dalva França Carvalho.

Ressalte-se que a formação deverá ser muito bem planejada e responder às demandas de cada rede e de outras redes, se for o caso, por-tanto, necesita ser contextualizada e estar rem consonancia com as Metas Educativas 2021 do projeto: a educação que queremos para a ge-ração dos Alem disso, necessitamos conhecer o professor, sujeito da formação. Quem são? Onde trabalham? Em que pais vive? Qual o seu perfil? Qual a sua formação? Que atividades realizam? Como se identificam profissional-mente? São professores investigadores? Que competências idealizam para a formação de um professor competente? Como vêem seu trabalho? Como se autodefinem? Quais as ra-zões para exercerem o ofício? Estas questões deverão, inclusive nortear as investigações no âmbito da rede.

Neste aspecto, cada curso de formação deverá ser divulgado amplamente no âmbito da OEI e cada participante deverá assinar um termo de compromisso cumprir as metas estabeleci-das com a rede. É relevante mencionar, tam-bém, a necessidade de a captação de recursos para financiamento do projeto, envolvimento e compromisso dos participantes nas ações sub-sequentes aos encontros presenciais. Neste sentido, idealizamos que cada formação deve-rá ser efetuada virtualmente, na plataforma e, também, por meio de webconferencias. Porém, deverá ter, pelo menos dois encontros presen-ciais, imprescindíveis para a troca de experiên-cias e culminância das formações.

Como forma de escoar as produções efetuadas, tanto no âmbito de programas de formação como das práticas educativas no interior de cada escolas, de cada instituição, idealizamos a a criação de uma revista eletrônica a ser cons-

truída posteriormente como meio eficaz de divulgação do conhecimento produzido cole-tivamente. Esta revista deverá, também, ins-trumento de cooperação e intercambios sobre pesquisas academicas, realizadas em outras redes.

Observe-se que materializar estas ideias cons-titui um verdadeiro desafio. Porem, não é im-possível, como dizemos anteriormente, se cada país e cada participante envolvidos se compro-meter com o desenvolvimento profissional do-cente, do ponto de vista de uma racionalidade que circunda em torno da tendência de formar o pesquisador, deixando em detrimento a for-mação do professor (FRANCO, 2001).

3. Propostas de melhoria

A rede Liderança e Organização Escolar agrega as boas práticas de gestão da escola e, com isso inclui todas as dimensões da escola, como alu-nos, professores, funcionarios, familia e a pró-pria comunidade.

Quando enfatizamos o denvolvimentoo profis-sional dos professores no interior da rede, es-tamos afirmando que as formações efetuadas atenderão a realidade de cada escola, ou de agrupamento de escolas. Isso significa que os conteudos da formação, serão definidos pelo contexto. No entanto, não se pode menospre-zar conteúdos como: currículo, avalição, ges-tão da materia e de interação em sala de aula, relações interpessoais, dentre outros, comuns a qualquer escola.

Indubitavelmente realizar esta formação depen-de, neste momento dos esforços e dos recursos que a OEI pode disponibilizar, uma vez que por ocasião da mobildiade, os foram constituidos profissionais comprometidos responsaveis por concretizar as ações.

4. Conclusões: Aprendizagens adquiridas

Como formadoras de professores, compreen-demos que através do “confronto entre os sa-

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beres produzidos pela experiência coletiva dos professores, os saberes experiencias se trans-forman em um discurso experimental capaz de informar ou formar outros docentes e fornecer uma resposta aos seus problemas. (TARDIF, 2002). E foi exatamente isso que a experiencia vivenciada em pela mobiliddade proporcionou, isto é, a confirmação de saberes inerentes a do-cência, seja na perspectiva da gestão escolar, ou da aprendizgaem, ou da formação de pro-fessores.

O programa deixou várias lições, uma delas foi compreender que, apesar das diferenças de raça e de linguagem, que quando se trata de professores, somos iguais, com os mesmos ideais e dificuldades similares. Outra lição foi entender e viver a partilha... Foi maravilhoso e gratificante estabelecermos parceira e conta-to com pessoas que compreendem a educação como fator de transformação humana de mais diversos países. Muito gratas ao Ministerio de Educçção de Portugual, a OEI e a Capes. Para-béns pela iniciativa.

Porém, uma lições que permaneceu foi a crença em nossa capacidade de poder colaborar, cada vez mais, para a formação de sujeito, no senti-do de que o mesmo possa formar professores com competências de líder e de gestor, inde-pendente da escola em que estejam inseridos ou do curso de licenciatura a que pertençam e isso, implica no fortalecimento da profissão do-cente, de modo geral.

4. ReferênciasFREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas

pedagógicas e outros escritos. E ed. São Paulo: Editora UNESP, 2000.

HABERMAS, Jürgen Racionalidade e comunicação. Trad. Paulo Rodrigues. Lisboa: Edições 70 LDA. Biblioteca de Filosofia Contemporânea. 1996.

LOIOLA, Francisco. A; THERRIEN, Jacques. Experiência e competência no âmbito do trabalho docente: um estudo exploratório. In: Anais do XVI Encontro de Pesquisa Educacional Norte Nordeste - São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe: Editora UFS, 2003.

SACRISTAN, José Gimeno. O currículo: reflexões sobre a prática. 3 ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

STENHOUSE, L. Investigación y desarrollo del currículum. Madrid: Morata, 1984.

THERRIEN, Jacques; SOUSA, Ângela. Cultura docente e gestão pedagógica: a racionalidade prática dos saberes do saber-fazer racionalidade do agir docente: elementos para uma análise da formação prática In: NOBRE, M. D & THERRIEN, J. (Org.). Artesãos de um outro ofício: múltiplos saberes e práticas no cotidiano escolar. São Paulo: Annablume; Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto do Governo do Ceará, 2000.

ZABALA, Antonio. A prática educativa: como ensinar. Tradução Ernani F. da Rosa. Porto Alegre: ARTEMD, 1998.

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INVESTIGAÇÃO

Formação Contínua de Professoresao Serviço do Desenvolvimento Profissional Docente

Maria Prazeres Casanova Professora do ensino secundário

Doutourada em Ciências da Educação

Resumo

O diagnóstico das necessidades de formação contínua dos docentes é uma das prioridades preconizadas pelo Decreto-lei 22/2014. Considerando o diagnósti-co efetuado a formação contínua visa o desenvolvi-mento pessoal e profissional, o desenvolvimento dos alunos, a melhoria organizacional e ainda o desenvol-vimento da comunidade educativa.

Apresentamos um pequeno estudo de caso relativo à avaliação realizada pelos formandos no que concerne às ações formativas em que participaram. Poderemos inferir a partir dos dados recolhidos da existência de transferência de aprendizagem por parte dos forman-dos, visando o seu desenvolvimento profissional e contribuindo para o aperfeiçoamento organizacional das escolas de pertença.

Palavras-Chave: Necessidades de Formação; Avalia-ção da Formação Continua de Professores

Introdução

A formação contínua de professores constitui um fator muito importante no contexto da es-cola e da sociedade atual. Os alunos têm aces-so a informação global e aprofundada cada vez com mais facilidade, acedendo-lhe a partir dos mais diversos meios de comunicação. Por seu lado, os professores são confrontados com a necessidade de adequação ao tempo presente e sua contextualização, dado que o saber-saber e o saber-fazer estão em permanente atualiza-ção de forma a estar em sintonia com a infor-mação acedida pelos alunos.

Definimos como objetivos deste trabalho: co-nhecer as finalidades da formação contínua

de professores; identificar as áreas/domínios e modalidades de formação e analisar a avaliação dos formandos relativa às ações frequentadas.

Decidimos organizar a presente comunicação do seguinte modo: a formação contínua de professores; o papel dos centros de formação; a avaliação dos formandos relativa às ações fre-quentadas no Centro de Formação de Associa-ção de Escolas e uma breve e conclusão.

1. Formação Contínua de Professores

A Lei de Bases do Sistema Educativo e o Decre-to-lei 22/2014 definem como finalidades da formação contínua de professores: assegurar o complemento, aprofundamento e atualização de conhecimentos e de competências profissio-nais; possibilitar a mobilidade e a progressão na carreira (cf. LBSE, art.º 38); melhoria da qualida-de de desempenho dos professores; a melhoria da qualidade do ensino e articulação da forma-ção continua com os objetivos de política edu-cativa nacional e local (cf. Decreto-lei 22/2014). São decorrentes destas finalidades alguns prin-cípios gerais que presidem a esta modalidade de formação de todos os docentes em exercício efetivo de funções:

a) promoção da melhoria da qualidade do ensino e dos resultados do sistema educativo; b) contex-tualização dos projetos de formação e da oferta formativa; c) adequação às necessidades e priori-dades de formação das escolas e dos docentes; d) valorização da dimensão científica e pedagógica; e) autonomia científico-pedagógica das entida-des formadoras; f) cooperação institucional entre estabelecimentos do ensino básico e secundário, instituições de ensino superior e associações cien-tíficas e profissionais; g) promoção de uma cultura de monitorização e avaliação orientada para a me-lhoria da qualidade do sistema de formação e da oferta formativa. (Decreto-Lei 22/2014, art.º 3º)

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2. Competências dos Centros de Formação

Os Centros de Formação Contínua de Profes-sores têm por missão o desenvolvimento da formação contínua de docentes; a satisfação das prioridades formativas em contexto esco-lar considerando os projetos educativos e cur-riculares, visando a melhoria da qualidade do ensino e dos resultados da aprendizagem dos alunos; a promoção do desenvolvimento profis-sional dos docentes, na perspetiva do seu de-sempenho, do contínuo aperfeiçoamento e do seu contributo para a melhoria dos resultados escolares; o fomento da partilha de conheci-mentos e skills, entre pares, orientados para o desenvolvimento profissional tendo como ob-jetivo consolidar a organização e autonomia da escola (cf. Decreto-Lei n.º 22/2014, artigo 4).

A organização do Plano de Formação deverá dar ênfase ao diagnóstico de necessidades for-mativas da organização educativa e também de desenvolvimento profissional dos docentes. De acordo com o Decreto-Lei anteriormente citado no seu artigo 5.º são referidas as áreas de for-mação passíveis de serem ministradas: “a) ma-térias curriculares nos vários níveis de ensino; b) prática pedagógica e didática - organização e gestão da sala de aula; c) formação educa-cional geral e das organizações educativas; d) administração escolar e educacional; e) lide-rança, coordenação e supervisão pedagógica; f) formação ética e deontológica; g) tecnolo-gias da informação e comunicação aplicadas a didáticas específicas ou à gestão escolar.” Mais acrescenta, que as ações de formação poderão assumir as seguintes modalidades: “a) cursos de formação; b) oficinas de formação; c) círcu-los de estudos; d) ações de curta duração; e) es-tágio e/ou projeto” (art.º 6). Todas as ações de formação deverão ser acreditadas e certificadas pelo Conselho Científico-Pedagógico da Forma-ção Contínua (CCPFC), à exceção das ações de curta duração, as quais são acreditadas e certi-ficadas pela Comissão Pedagógica dos Centros

de Formação de Associação de Escolas. No que concerne à Avaliação da Formação preconiza-se que seja realizada “através de dispositivos de regulação diversificados” de modo a garantir a qualidade da formação ministrada. Os Cen-tros de Formação de Associação de Escolas, de modo a regular a oferta formativa e a redefinir prioridades, deverão encetar esforços para criar instrumentos de avaliação adequados aos obje-tivos, às modalidades das ações de formação e ao contexto educativo. Deverão ainda promo-ver o tratamento, a análise e a interpretação dos dados recolhidos assim como a divulgação dos resultados junto da comunidade educativa.

O Centro de Formação de modo a dar cumpri-mento ao disposto no normativo tem desen-volvido esforços de melhoria ao aplicar dois formulários aos formandos, a fim de recolher dados para diagnosticar as suas necessidades formativas: a Ficha de Inscrição na Ação de For-mação e a Ficha de avaliação da Ação de For-mação (Modelo do DGRHE, enviado por mail ao Centro de Formação em junho de 2010 – no âmbito do PTE). Os dados recolhidos dizem res-peito às ações de formação planificadas e rea-lizadas no Centro de Formação de Associação de Escolas do Concelho de Almada (CFACA). Ire-mos apresentar dados somente relativamente às Oficinas de Formação e Cursos de Formação, uma vez que os Módulos de Formação usaram outro tipo de indicadores para avaliação.

3. Caracterização das ações de formação reali-zadas no Centro de Formação

O Centro de Formação elabora o Plano de For-mação de acordo com as necessidades de for-mação identificadas pelas escolas associadas e pelos professores que individualmente se diri-gem ao Centro e solicitam formação.

Apresentamos dados relativos às diferentes ações de formação decorridas no ano letivo de 2013-2014.

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Na Figura 1 verificamos a existência de 9 grupos de formação específica. Inserimos neste grupo a formação referente à Biblioteca Escolar, dada a sua especificidade. Observamos que o indi-cador moda se regista nas ações de formação para a educação pré-escolar e para o 1º ciclo, sendo nestas ações de formação que se regista o maior número de formandos. Observamos, ainda, que as ações de formação direcionadas para os Departamentos de Ciências Experimen-tais e para o Departamento de Humanidades

e Ciências Sociais envolvem na totalidade 163 formandos. Verificamos ainda a existência de duas Ações de Formação sobre a problemática das Bibliotecas Escolares registando uma fre-quência de 73 formandos.

Na Figura 2, constatamos que diversas ações, tais como coaching e avaliação do desempenho docente, constituem o indicador moda, logo se-guido das TIC, sendo este grupo que regista o maior número de formandos. Se agregarmos as

Figura 1: Número de Formandos de acordo com as Ações de Formação Específicas.

Figura 2: Número de Formandos de acordo com as Ações de Formação Transversais.

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ações sobre Práticas Pedagógicas e sobre Ava-liação das Aprendizagens verificamos a existên-cia de 231 formandos em oito Ações de Forma-ção. É significativo o número de formandos (75) existente na Ação de Formação: Avaliação das Aprendizagens.

Na Figura 3 constatamos que o indicador moda se regista nas ações de formação financiadas na totalidade pelos formandos. É interessante constatarmos a existência de ações de forma-ção em que os formandos somente pagam 5 euros para despesas logísticas.

No que se refere às Modalidades de Formação, observamos a existência de setenta Ações de Formação distribuídas por Cursos de Formação, Oficinas de Formação e Módulos de Formação (Artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novembro).

No presente estudo somente apresentamos da-dos relativamente a 57 ações de formação, uma vez que as restantes ações (13) usaram dois formulários diferentes do que a maioria dos usados nas outras ações, e por esse motivo não analisaremos dados relativamente aos Módulos de Formação.

Figura 3: Financiamento das ações de formação

Figura 4: Modalidades de Formação.

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Na Figura 5 verificamos que 32 Ações de For-mação tiveram 25 horas de formação, tendo os formandos obtido 1 crédito. Conferimos, ainda, a existência de 20 cursos de formação com 15 horas de formação.

Constatamos a existência de 8 oficinas de for-mação com 15 horas assim como com 25 horas. As oficinas de formação têm o dobro de horas de formação para que o formando possa reali-zar trabalho autónomo no âmbito da temática proposta.

Na Figura 6 observamos que os professores identificam mais do que um indicador. O indica-dor moda aponta para a necessidade de atuali-zação de conhecimentos com 714 ocorrências.

Verificamos ainda que a frequência de ocorrên-cias é a mesma em dois indicadores: Avaliação do Desempenho Docente e formação específica para o exercício de Funções/Cargos. Este facto leva a supor que os respondentes são os mes-mos (436), uma vez que os professores para exercerem o cargo de avaliadores externos ne-cessitavam de possuir formação em avaliação do desempenho docente.

4. Análise dos dados recolhidos na Ficha de Avaliação da Formação

O inquérito aplicado aos formandos após a ação de formação apresenta quatro áreas: A.1. Ava-liação geral da ação; A.2. Avaliação dos Forma-dores; A.3. Organização da Ação pelo Centro e

Figura 5: Número de Horas de Formação.

Figura 6: Motivação para Frequência da Ação

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B. Apreciação Global. Cada uma das áreas apre-senta diversos indicadores. O inquérito está or-ganizado em escala de Likert.

Constamos a existência 1211 formandos nas di-ferentes modalidades de formação: Cursos de Formação, Oficinas de Formação e Módulos de

Formação. Verificamos que somente 945 for-mandos responderam a este inquérito de ava-liação da formação, existindo 266 formandos que responderam a outros formulários com ou-tros indicadores. Apuramos que nem todos os respondentes avaliaram todos os indicadores.

A.1 Avaliação Geral da Ação1. Os objetivos propostos foram cumpridos2. A metodologia foi adequada aos participantes3. Os trabalhos práticos propostos apresentaram coerência4. A gestão dos recursos foi adequada5. O espaço em que decorreu a ação foi adequado6. O equipamento informático foi adequado7. Relação do(s) formador(es) com o grupo de formandos 8. A ação de formação veio ao encontro das minhas necessidades de formação9.As competências adquiridas vão ter impacto na minha atividade profissional

10. Após esta formação irei utilizar mais as TIC nos processos de ensino e aprendizagem

A.2 Avaliação dos Formadores

2.1. Conhecimentos/ Conteúdos11.Os conteúdos foram adequados12.Houve aprofundamento dos temas 13.A articulação dos diferentes conteúdos temáticos foi concretizada

14.O formador demonstrou dominar os conteúdos tratados

2.2 Exposição15.A linguagem utilizada foi clara e assertiva16.A adaptação do discurso aos destinatários / finalidades foi conseguida

17.Houve capacidade para esclarecer as dúvidas surgidas

A.3 Organização da Ação pelo Centro18.A Divulgação / Informação foi oportuna19.A calendarização foi ajustada20.O atendimento aos formandos foi eficiente

21.O material entregue respondeu às necessidades

B – Apreciação Global

Fraca, Satisfatória, Boa, Muito Boa ou Excelente

Quadro I – Indicadores constantes da Ficha de Avaliação da Formação (adap. DGRHE, 2010).

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Na Figura 7 verificamos pela análise, que o indi-cador moda no nível 4, se regista no indicador 7 – relação do formador com o grupo de for-mandos (70,2%), por seu lado o indicador que regista menor frequência de ocorrências é o in-dicador nº 5 – o espaço em que decorreu a ação foi adequado. Todos os indicadores neste nível se situam acima de 52 %.

No que concerne ao nível 3, indicador moda regista-se no indicador 4 – a gestão de recur-sos foi adequada, por seu lado o indicador que regista menor frequência de ocorrências é o in-

dicador 7 – relação do formador com o grupo de formandos.

Se somarmos a frequência de ocorrências do ní-vel 3 com o nível 4 em cada um dos indicadores verificamos que apresentam uma percentagem superior a 76.

No nível 1 e 2 a frequência de ocorrências é re-sidual, em que o indicador moda no nível 2 é de 3,6%. É interessante verificar que este indicador é o que apresenta a menor frequência de ocor-rências no nível 4.

Figura 7: Avaliação Geral das Ações

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Ao analisarmos a Figura 9, Avaliação dos For-madores no que se refere ao nível 4 verificamos que o indicador moda se regista no domínio dos conteúdos pelos formadores, enquanto no ní-vel 3 constitui o indicador moda. O indicador aprofundamento dos temas regista a menor percentagem no nível 4 enquanto no nível 3 constitui o indicador moda. Se somarmos as frequências de ocorrências do nível 3 com as

do nível 4 verificamos que todas se encontram acima de 74%.

Verificamos que todos os indicadores registam frequência de ocorrências acima de 65 %, no ní-vel 4. Constamos a inexistência de registos no nível 1 e no nível 2 é residual.

O indicador moda refere que a linguagem utili-zada foi clara e assertiva.

Figura 9: Avaliação dos Formadores do Cursos de Formação no que respeita a Conhecimentos/Conteúdos.

Figura 10: Exposição

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Verificamos que a avaliação de nível 4 se situa numa percentagem igual ao superior a 55%.

Constamos a inexistência de registos no nível 1 e no nível 2 é residual.

Figura 11: Organização da Ação pelo Centro de Formação

Figura 12: Apreciação Global das Ações de Formação Realizadas.

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Globalmente a avaliação é positiva. Se somar-mos os dados do nível 3 com os dados obtidos no nível 4 verificamos que a percentagem é igual ou superior a 75%. A avaliação atribuída no nível 1 e 2 situa-se entre o 0% e o 4%.

Constatamos que o indicador moda se regista na avaliação excelente quando os formandos foram convidados a avaliarem numa escala de Fraca, Satisfatória, Boa, Muito Boa ou Excelente a Ação de Formação que frequentaram.

5. Algumas Considerações Finais

Constamos a existência 1211 formandos que frequentaram diferentes modalidades de for-mação. Assim, conferimos a existência de 50 Cursos de Formação, 18 Oficinas de Formação e 2 Módulos de Formação. As Ações de Formação versaram as seguintes áreas:

a) matérias curriculares; b) prática pedagógica e didática; c) liderança, coordenação e supervisão pedagógica; d) formação ética e deontológica e e) tecnologias da informação e comunicação aplicadas a didáticas específicas ou à gestão escolar.

Verifica-se que somente 945 formandos repon-deram a este inquérito de avaliação da forma-ção, existindo 266 formandos que responderam a outros formulários com outros indicadores. No inquérito analisado verificamos que nem todos os respondentes avaliaram todos os indi-cadores.

É interessante estabelecer a relação entre o indicador aprofundamento da temática e o nú-mero de horas de formação e compreendemos que os formandos avaliam de forma mais po-sitiva as ações que tiveram mais horas de for-mação ou seja as oficinas. Podemos inferir da existência de transferência de aprendizagem, visando o desenvolvimento profissional e or-ganizacional dada a avaliação efetuada pelos formandos às Ações de Formação ministradas

e também dado o número de formandos que frequentaram formação.

Parece-nos que neste Centro de Formação os dados recolhidos sobre a formação ministrada revelam que foram identificadas as prioridades formativas dos professores e das escolas. De-duzimos que a formação ministrada contribuiu para o desenvolvimento profissional dos pro-fessores e para a melhoria organizacional das escolas onde exercem funções e deste modo motivar e desenvolver as aprendizagens alunos em contexto (Despacho n.º 4595/2015, Artigo 3.º, ponto 2).

6. Referências bibliográficas

Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novembro (com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 60/93, de 20 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 274/94, de 28 de outubro pelo Decreto-Lei n.º 207/96, de 2 de novembro, pelo Decreto-Lei n.º 155/99, de 10 de maio e pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de janei-ro).

Decreto-Lei n.º 22/2014, de 11 de fevereiro.

Despacho n.º 4595/2015, de 6 de maio

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INVESTIGAÇÃO

Coreografias Pedagógicas em contextos inclusivos

Giovana Rodrigues Oliveira Pires Doutora em Educação

Formadora na área de Inclusão e [email protected]

“Ensinar exige ARTE, uma boa dose de intuição, uma grande dose de conhecimento, observação,

dedicação, imaginação, técnica e objetividade.”

(Barboza, 2012)

O objetivo deste artigo é apresentar uma dis-cussão conceitual sobre o tema Coreografias Pedagógicas enfatizando suas contribuições para a escola inclusiva. Este termo, inicialmen-te, foi utilizado por Oser & Baeriswyl (2001) que o denominou de Coreografias de Ensino ao con-figurar a dança didática na relação entre o en-sinar e o aprender através da lente metafórica das coreografias.

Zabalza (2004), neste interim, abordou o tema Coreografias Didáticas como uma proposta

para refletir o planeamento de ensino a partir das possibilidades de aprendizagem dos pro-fessores e alunos, auferindo-se de estratégias didáticas infinitas e previsíveis para organização da aula universitária.

Na compreensão das Coreografias Pedagógi-cas1, os professores são os coreógrafos dos contextos de aprendizagem dos bailarinos, seus alunos. Os professores organizam coreografias (estratégias pedagógicas) que ‘postas em cena’ orientam o processo de aprendizagem dos es-tudantes (Zabalza, 2006). Essas situações ocor-rem no palco que é compreendido como a sala de aula junto da plateia que retrata o grupo na construção de sua aprendizagem.

Neste contexto faz-se referência ao uso da me-táfora através das coreografias para o espaço de ensino e aprendizagem sensibilizando a escola em pensar sobre o significado da encenação e dos adereços utilizados pelo coreógrafo/profes-sor para enriquecer sua dança didática constru-ída a partir do enredo e dos movimentos (pas-sos) dos bailarinos/alunos (Pires, 2015).

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Para Oser e Baeriswy (2001), as coreografias de ensino estão estruturadas em quatro (04) níveis como a antecipação em que os profes-sores fazem o diagnóstico das aprendizagens para conhecer seus alunos com o objetivo de iniciar o planeamento das estratégias e ativida-des pedagógicas pertinentes as necessidades e interesses do grupo. No segundo nível temos a colocação em cena do professor e dos recursos utilizados bem como as condições para o pro-cesso de ensino e aprendizagem, composta pelas intervenções e dinâmicas na prática. Ou-tro nível, denominado modelo base da apren-dizagem considera a sequência de operações mentais ou atuações práticas que o educando executa para alcançar a aprendizagem que se-rão facilitadas e enriquecidas pela mediação pedagógica do professor em cena através das coreografias planeadas. E, o último nível, re-trata o produto da aprendizagem do aluno que será resultante da orquestração para estimular a sequência de operações (mentais e/ou prá-ticas) desenvolvidas pelo aprendiz. O critério

para sua realização é a presença das condições favoráveis para a construção de conceitos e prá-ticas que impliquem em tornar os alunos prota-gonistas e autónomos do seu aprendizado.

Estes níveis nos permitem apreender a aula pela vertente da metáfora das coreografias pedagó-gicas, ao procurar discutir o script da sala de aula que serve de orientação para os professo-res como uma cadeia de ações afins, composta por elementos necessários à sua encenação e, posteriormente, a uma avaliação da performan-ce do processo de ensino e aprendizagem.

Oser & Baeriswyl (2001 citado por Barboza 2012, p. 84) utilizam a metáfora das coreogra-fias procurando anunciar o rompimento com o paradigma em que os estudantes/bailarinos são submetidos a dançar conforme a música, “o que se observa ainda na sua forma de pensar a metaforização da coreografia de ensino à uma racionalidade técnica que reduz a atividade prá-tica aos meios para atingir os fins, nesse caso a performance da aprendizagem”.

Neste sentido, a estética pedagógica é um fa-tor que sensibiliza a prática do professor pois fomenta a perceção e a sensibilidade, por meio da criatividade, da autonomia na produção e fruição do conhecimento. Amplia possibilida-des cognitivas, e também afetivas e expressivas na prática por meio de uma série de elementos como as sequências didáticas, relações intera-tivas, comunicação verbal e não verbal, texto e contexto que configuram um modo de tecer as aulas.

De modo análogo, outros aspetos que são considerados na arte como relevantes para a apreciação do espetáculo são referenciados por Oser & Baeriswyl (2001) ao denominar as estru-turas visíveis e não visíveis na prática pedagógi-ca do professor que colaboram para vivenciar as aulas de maneira reflexiva, reconstruída e reelaborada.

Coreografar a aula com magia

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De um lado, os elementos visíveis compreen-dem o planeamento, os recursos materiais, os elementos organizativos da aula e as atividades didáticas que evidenciam objetivamente as for-mas de responder as necessidades individuais e do grupo na intervenção realizada pelo pro-fessor. Por outro lado, os elementos não visíveis tratam das conceções e práticas dos professo-res, dinâmica da aula, interpretações e os senti-mentos que são suscitados diante as diferentes performances que resultam na construção do conhecimento e aprendizagem do grupo.

Objetivamente estes autores referem-se a “um nível externo e visível, composto por elemen-tos materiais, organizativos, operativos e di-nâmicos que configuram um espaço de ação e pensamento; e um não visível que consiste nas operações mentais e dinâmicas afetivas que su-cedem dentro dos sujeitos” Oser & Baeriswyl, (2001 citado por Barboza 2012, p. 80).

Portanto, as coreografias pedagógicas efetivam o encontro da encenação através da linguagem verbal e não-verbal no palco/sala de aula pelo coreógrafo/professor que não só ensina, mas constrói um trabalho vinculado ao tipo, estilo e forma como os bailarinos/alunos constroem o conhecimento.

As coreografias pedagógicas consideram a per-formance através das estratégias didáticas que desvelam o novo, o imprevisto e que são essen-ciais no contexto das aulas. Suscita-se, desta forma, o conhecimento do script, do contexto de trabalho e das práticas desenvolvidas em sala.

Esta postura enriquece o trabalho pedagógico do professor no que concerne a parte livre da coreografia, a parte que está continuamente sendo readaptada pelos e para os alunos. Nesta performance coletiva desenvolve-se a ação do professor, ao criar e recriar sua ação didática para diferentes alunos, principalmente, para aqueles que apresentam Necessidades Educa-tivas Especiais (NEEs).

Interface entre Coreografias Pedagógicas e In-clusão

Neste cenário podemos considerar as coreogra-fias pedagógicas como todo o movimento que professor e alunos fazem no sentido de ensinar e aprender. Essa compreensão ressalta algumas imagens sinuosas, a exemplo da sequência de passos, movimentos, ritmos, temporalidade, expressividade, performance, dentre outras, Barboza (2012) que nos remetem à dança, ao teatro, ou à música ao simbolizar à dinâmica da sala de aula.

Nossa intenção é fazer a interface entre as co-reografias pedagógicas e à inclusão no que se refere ao enriquecimento das estratégias pe-dagógicas para todos os alunos, notadamente, para àqueles que apresentam NEEs.

Acreditamos, que coreografar nossas aulas diante a diferença corrobora para que possa-mos a partir das intenções e intervenções peda-gógicas suscitadas estimular as potencialidades dos alunos. É na encenação da aula que a gestu-alidade corporal do professor permite criar um espaço de comunicação a partir da sensibilida-O corpo fala e comunica

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de e criatividade pedagógica em sala de aula. Ultrapassa-se, desta forma, ao mero gesto me-cânico, mas se constrói um gesto expressivo por meio de um diálogo recetivo e interativo.

É sabido que no contexto escolar os professores têm suas próprias hipóteses e teorias sobre o modo como os alunos aprendem, e que são fru-to das crenças e conceções que, às vezes, são muito próximas ao próprio conceito de apren-der do professor (Zabalza, 2004). Nesse caso, constrói-se equívocos conceituais que acabam por selar situações de rejeição que podem ser visíveis ou não visíveis no contexto da sala de aula e que estigmatizam os alunos mais ´vul-neráveis` que apresentam dificuldades em res-ponder aos objetivos propostos.

Desta forma, descortinar estes roteiros previa-mente constituídos é sine qua non para que possamos criar um novo script em que a docên-cia não deve se configurar como uma prática sem fundamentos e sem reflexões. Mas dese-nhar e mapear o espaço da sala de aula com os movimentos, linguagem corporal e o feedback proposto com o ritmo de cada um e do grupo percebendo suas especificidades no que tange às individualidades do aluno, ao estilo do mes-mo (mais autônomo) e às suas necessidades mais práticas.

Esta configuração enriquecida para olhar além, colabora para a interlocução entre temporalida-de, escuta ativa, gestos, ritmos diferenciados, ou seja, o processo de ensinar a partir das core-ografias pedagógicas “os alunos” independente de suas condições cognitivas, emocionais e/ou socioculturais.

Entra-se em contato com o mundo sensível, agindo sobre ele com afeto, cognição, ação; e constroem para si um repertório percetivo de cores, texturas, sabores, gestos e sons, atri-buindo a cada coreografia executada, sentidos e organizações diferentes sem “pré-conceitos”. Professor e alunos rompem com significações já construídas e colocam o desafio de descons-truir e reconstruir outros significados.

O enriquecimento da performance dos profes-sores será regido pela coreografia mútua na sala de aula através dos movimentos individuais, da alternância do discurso e da coordenação de olhares entre professor e alunos que autoriza o erro, o imprevisto, o novo nesta dança silencio-sa que constitui as aulas na sua mais profunda singularidade.

No contexto das coreografias pedagógicas pen-sar, hipotetizar e discutir coletivamente, maior será a possibilidade de se produzirem condi-ções favoráveis para a construção do processo de aprendizagem. Tal condição pode incitar a apreciação de coreografias mais elaboradas que são definidas pelas condições do cenário (o espaço e sua exploração).

É nessa relação de ensino-aprendizagem que desvelamos as práticas encenadas configuran-do a valorização da produção criadora e espon-tânea que influencia face a face os coreógrafos e bailarinos. Sugere-se estratégias que auxiliem o aluno a superar suas dificuldades, ultrapassar a rigidez dos passos oferecendo reflexão para o tempo de construção.

O palco da sala de aula e sua diversidade

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A coreografia pedagógica é uma proposta que abre um campo fértil para entender a dança di-dática que será executada na aula, ou melhor, o conjunto de movimentos e a sequência deles que compõe a identidade do grupo que segue a sua trilha musical, ou seja, seu ritmo e identi-dade como fatores fundamentais na criação de sua história.

Nessa abordagem as variações de uma coreo-grafia seriam para o contexto inclusivo as dife-rentes formas de intervenção do professor para o aluno ou para o grupo através dos objetivos pretendidos e práticas planeadas. Ressalta-se a valorização do aluno a partir da sua iniciativa e dos seus interesses, da identificação das suas potencialidades, da forma como o aluno realiza sua tarefa, a tutoria estabelecida no grupo com o envolvimento de todos a partir das estraté-gias propostas.

Significa que as atividades criativas dos bailari-nos/alunos durante a execução da tarefa seriam mediadas pelo coreógrafo/professor e pela observação dos procedimentos didáticos que, inicialmente, dizem respeito à comunicação, a sincronia e a sintonia da coreografia baseada na interatividade na aula.

Neste caso, a dimensão performativa dos ges-tos, dos olhares, das intenções, das emoções etc. que se configuram na espacialidade da sala de aula constituiria a riqueza da própria ence-

nação (prática pedagógica) colaborando para a qualidade pedagógica e pela resposta a opção artística (interesses e necessidades) dos baila-rinos/alunos.

Algumas Considerações

Diante os desafios que são postos a educação inclusiva propomos neste artigo trazer a con-tribuição das coreografias pedagógicas para a prática do professor. A discussão sobre conce-ções e práticas encenadas na sala de aula visam colaborar para a construção de novos saberes num intenso e dinâmico dialogo a ser proposto entre as coreografias pedagógicas e o contexto inclusivo.

Referenciamos processos criativos baseados na metáfora das coreografias que suscitam no cenário da sala de aula, a sensibilidade e a criatividade do professor através de sua auto reflexão sobre aspetos que compreendem des-de sua atenção ao posicionamento do corpo à expressividade gestual que circunscrevem as interações comunicativas na sala de aula. Nessa coreografia, cabe tanto ao professor quanto ao aluno envolver-se em função de um dado pla-neamento que seja flexível e dinâmico.

Por isto, somos assertivos, que o uso de estraté-gias mais elaboradas através da analogia com as coreografias pedagógicas possibilita ao profes-sor caminhar em busca da articulação de cada passo planeado, cada atividade proposta, cada movimento estabelecido, cada feedback neces-sário, cada ação do aluno em busca da constru-ção do seu conhecimento e autonomia. Nessa relação, cria-se um grande tango interpessoal no sentido de estarmos, dançando no compas-so do outro.

Consideramos que o professor em sala de aula deve estar atento as diferentes formas de in-tervir nas aulas, na execução e modificação das tarefas e, ao mesmo tempo, na reestruturação

O movimento e sua harmonia no grupo

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de outro roteiro, junto com seus alunos. Assim, passaria a refletir sobre as diferentes estraté-gias, planeadas ou improvisadas, a partir da perspetiva pretendida ou das pistas percebidas, que dinamizam, dessa forma, suas intervenções pedagógicas.

Mas a maior virtude da compreensão da aula a partir da noção de coreografia pedagógica é poder respeitar os ritmos diferenciados dos alunos acompanhando sua performance sem descurar do uso da linguagem artística que é inerente ao trabalho do professor. Acreditamos que esta sintonia revelaria a alegria, a surpresa, a descoberta, o espanto, o envolvimento enfim, diferentes emoções que subsidiaria positiva-mente “os alunos” independente de sua forma de aprender e construir seu conhecimento.

Então, para sintetizar a performance didática no contexto que contempla a diversidade criamos uma rima para explicar de maneira criativa o que procuramos discutir através das coreogra-fias pedagógicas:

“As coreografias pedagógicas que acabamos de conhecer todos somos protagonistas para a diversidade responder; com criatividade e sen-sibilidade vamos entender o trabalho das coreo-grafias pedagógicas que defendemos acontecer. Então não esqueça o grande cenário que a es-cola pode ser com as coreografias pedagógicas e as diversas linguagens que a arte pode corres-ponder. Tudo isto é possível com intervenção e atenção ao juntarmos a performance das coreo-grafias pedagógicas e os princípios da inclusão, com criação e paixão” (Pires, 2015).

1Neste texto fazemos a analogia entre os termos coreógrafos/professores, bailarinos/alunos, script/planeamento, palco/sala de aula, plateia/grupo, ade-reços/recursos, encenação /didática na aula dentre outros termos; procura-se fazer a relação entre o con-texto utilizado das coreografias e o espaço da sala de aula do ensino Básico e Secundário.

Referencias Bibliográficas

Barboza, Maria das Graças Auxiliadora Fidelis. (2013) - A Aula Universitária: Configurações das Coreografias de Ensino. Dissertação de doutoramento em Ciências da Educação. Especialidade em Formação de Professores apresentado à Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.

Pires, Giovana Rodrigues Oliveira. (2015) – Inclusão - Coreografias Pedagógicas. In: Seminário de Vida Inclusivos – Parcerias e Respostas. Almada. Portugal. 10 e 17 de Jan. 2015. Auditório Garcia de Orta.

Oser, F. K & Baeriswyl, F. J. (2001) - Choreografiaes of teaching: bridging instruction to teaching. In: Richardson, V. (Edit). Handbook of research on teaching. (4. ed., pp.1031-1035). Washington: American Educational Research Association, 47.

Zabalza, M. A. (2006) - Innovación en la Enseñanza Universitaria: el proceso de convergencia hacia un Espacio Europeo de Educación Superior. Educação. Porto Alegre, v. 31, nº 3. Set./Dez.

Zabalza, M. A. (2004) - A didática universitária: un espazo disciplinar para o estudo e melhora da nossa docência. Discurso inaugural lido na solenidade de abertura do curso académico. Universidade de Santiago de Compostela.

“Quem não compreende a coreografia do outro tão pouco conseguirá perceber o repertório expresso”. Pense nisso!!! (Adaptação Giovana Pires)

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INVESTIGAÇÃO

Alternativa na Reutilização de Papel reciclagem como concientização ambiental, social e ecônomica

Maria Helena AlvesJesus Rodrigues Lemos

Karine de Souza NascimentoDarckcélia Barros PereiraMárcia Leocádio Bezerra

Campus Ministro Reis Velloso/ Universidade Federal do Piauí – CMRV/UFPI - Brasil

INTRODUÇÃO

A Educação Ambiental é um processo que en-volve um vigoroso esforço de recuperação de realidades e que garante um compromisso com o futuro. Uma ação entre missionária e utópi-ca destinada a reformular comportamentos humanos e recriar valores perdidos ou jamais alcançados, Ab’Saber (1993). Trata-se de um novo ideário comportamental, tanto no âmbito individual como coletivo e, tendo em vista que segundo as metas estabelecidas, na Educação Ambiental, todos os cidadãos devem primeiro ter conhecimento sobre o assunto, para depois refletir na mudança de atitudes, assim, se cons-cientizando do que têm de fazer para mudar seus hábitos e promover uma integração, não só individual, mas também coletiva, torna-se extremamente necessário executar e acompa-nhar ações intimamente relacionadas a este panorama.

Cadorin et al. (2011) destacam que a escola é o local mais apropriado para se proporcionar o esclarecimento e orientação sobre a impor-tância de se preservar e também de estimular a busca por soluções aos problemas relacionados ao meio ambiente. Estes autores alegam que quando se começa desde cedo, com alunos de

séries iniciais, vai ocorrendo de forma natural

uma maior conscientização e interesse daque-les, os quais passam, inclusive, a incentivar seus familiares a colocar em prática o que apren-deram, além de levarem o aprendizado para o resto da vida.

Guerra (2002) coloca que a educação ambien-tal, além de ser incentivada para crianças desde cedo, em casa, deve ser realizada também no ambiente escolar, assim, pode-se formar cida-dãos interessados com questões ambientais e que no futuro poderão diminuir os prejuízos causados pelo ser humano.

Biondi (2008) defende que a educação ambien-tal deve ser, teorizada e praticada a partir da sala de aula para se alcançar alguma mudança no comportamento do aluno, isto faz com que o aluno passe da posição de expectador e as-similador de conhecimentos para a posição de integrante do meio do qual ele faz parte.

Advindo da integração do aluno neste proces-so, surge também uma disseminação natural desta mentalidade para a comunidade da qual o aluno faz parte, resultando eventualmente em uma ação posterior, por parte desta comu-nidade, de uso racional de papel, por exemplo, o que, na opinião de Paiva & Gonçalves (2002), constitui um ato de cidadania e, por si só, um processo de educação ambiental.

Reginato (2006) coloca que com a grande preo-cupação atual na conservação do meio ambien-te e, com as tecnologias levando a um problema de devastação crítica, há a necessidade de de-senvolvimento de técnicas de preservação do meio ambiente, surgindo assim, processos de reciclagem de papéis já utilizados, a fim de pou-par a matéria prima original. Este autor ressalta

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que o papel reciclado, artesanal ou industrial, está prolongando a vida de papéis que seriam descartados.

Neste contexto, este trabalho visou realizar um processo continuado, ao longo de um ano es-colar, na produção de papel artesanal a partir de papel de escritório descartado no Campus Ministro Reis Velloso, Parnaíba da Universida-de Federal do Piauí – CMRV/UFPI, no intuito de despertar aos alunos de duas escolas publicas a conscientização ambiental e a importância que esse processo pode carrear ao longo de suas vidas.

MATERIAIS E MÉTODOS

As escolas parceiras do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência – PIBID, fo-ram:

1) Unidade Escolar Edson da Paz Cunha - Está localizada na rua Floriano, 829, Bairro Nova Parnaíba, Parnaíba, Piauí. Conta com uma matrícula inicial de aproximadamente 560 alunos distribuídos nos turnos manhã e tar-de em turmas de 6º, 7º, 8º e 9º ano.

2) Unidade Escolar Professora Raquel Ma-galhães, situada na Av. Armando Cajubá, 1941, Bairro Santa Luzia, Parnaíba, Piauí. Esta possui 384 alunos matriculados, distri-buídos nos turnos manha e tarde, com tur-mas do 6º, 7º, 8º e 9º ano.

Coleta de “matéria-prima” (papel usado): todo o papel artesanal foi produzido a partir de papel usado coletado nas dependências das Secreta-

rias, Coordenações de Cursos, DCE e demais dependências do Campus Ministro Reis Vello-so, Parnaíba, Universidade Federal do Piauí, as quais descartam papel em volume considerá-vel.

Para a confecção do papel artesanal usou-se os seguintes materiais: papeis, quadro e tela (tamanho oficio), balde, peneira, liquidificador, recipiente de plástico, cola branca, essência de cravo (se desejar), entretela (tecido usado para dá firmeza nas golas das blusas e camisas), pa-nos de prato ou fralda, varal e pregadores.

A figura 1A-E mostra as etapas que foram se-guida para confeccionar o papel reciclado. Na fig. 1A, o papel está picotado, foi colocado de molho em água durante uma noite. No liqui-dificador, foi acrescentando papel que ficou de molho, aos poucos e deixar bater por cerca de um minuto. A fig. 1B, a massa foi retirada e eliminado o excesso de água, em seguida foi acrescido água no vasilhame e acrescentado três copos da pasta pronta (papel batido com cola e essência de cravo). Foi agitado bem, para homogeneizar. Em seguida foi mergulhado o quadro com a tela sobreposta e retirado, bem devagar, fig. 1C. Fora da água, a folha de papel reciclado foi coberta com a entretela e retirado o excesso de água com um pano fig. 1D. Apos retirar a folha de papel reciclado foi colocada para secar fig. 1E.

Para a confecção do papel reciclado seguiu-se a metodologia proposta por Reginato (2006), com uso de material caseiro de fácil acesso e de baixo custo.

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RESULTADOS E DISCUSSAO

Analisando os resultados, pode se constatar que a reciclagem é uma das formas de fazer com que o planeta continue oferecendo, para as gerações futuras, o que hoje pode proporcio-nar a todos nós, mas, isso só se conseguirá com pessoas conscientes da importância sobre a preservação ambiental. Muitas atitudes da so-ciedade podem ser mudadas e mesmo conside-radas mínimas, beneficiarão o meio ambiente com a redução da quantidade de lixo e de seus impactos ambientais, sociais, econômicos e, ao mesmo tempo, melhora a qualidade de vida da sociedade (SILVA, 2012). Isto deve ser conside-rado, principalmente, quando se trata da reci-clagem de papel, visto que, o papel reciclado é feito a partir de papel já utilizado, poupando assim, algumas árvores e evitando a poluição.

A reciclagem no âmbito social não só propor-ciona melhor qualidade de vida para as pes-soas, através das melhorias ambientais, como também pode gerar muitos postos de trabalho e rendimento para os que vivem nas camadas mais pobres, como afirmado por Calderoni (2003, p. 26), quando diz que, não reciclar sig-nifica perder milhões.

Além do papel reciclado, propriamente dito, como mostrado na figura ao lado, a construção de objetos com o mesmo, pode vir a tornar ain-da mais atrativo o sentido da reciclagem, pois

os objetos poderão ser vendidos e servir como fonte de renda.

Neste contexto, com os papeis confecciona-dos foram feitos caixas personalizadas, convite para casamentos e formaturas, álbuns para fo-tos, marcadores de livro, entre outros objetos, pelos bolsistas do PIBID e alunos envolvidos nas oficinas, como ilustra a figura 2.

Reginato (2006) defende que uma das formas de se preservar e minimizar problemas ao meio ambiente está relacionado ao reuso de papel. Segundo este autor, produzir papel reciclado é uma forma moderna de reduzir os problemas ambientais, causados pelo processo industrial de fabricação, além de reduzir o desperdício na utilização dos materiais. Este autor afirma ainda, que essa é uma nova postura na socie-dade, preocupada em reaproveitar materiais já utilizados.

Nesta linha de raciocínio, o presente trabalho teve caráter prático eminentemente educacio-nal, com a produção de papel manufaturado artesanalmente. Levando o professor a desem-penhar a função que, torna-se extremamente importante para o desenvolvimento de méto-dos de abordagens e alternativas criativas para que o aluno se integre à ideia de multiplicação e preservação.

Britto (2000) destaca que, o espaço escolar é o ambiente mais promissor para a abordagem de

Figura 1A-E: A, papel picotado; B, papel molhado e processado no liquidificador, prova deuniformidade; C, papel homogeneizado dentro do vasilhame com agua, cola branca e essência de cravo; D, tela com aparas; E, papel secando.

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Figura 2: convite, marcador de texto, diversos e álbum

temas relativos à ecologia, saúde, higiene, pre-servação do meio ambiente e cidadania. Sobre-tudo, esclarecendo e orientando sobre a impor-tância de se preservar e também de estimular a busca por soluções aos problemas relacionados ao meio ambiente na escola, necessitando co-meçar com alunos de séries iniciais, pois, vai ocorrendo de forma natural uma maior cons-cientização e interesse dos mesmos.

Vale ressaltar um fato marcante observado du-rante a realização das oficinas com os alunos, foi à curiosidade de fabricar um novo papel a partir do papel sem utilidade. Essa atitude foi bem marcada nas oficinas, pelo entusiasmo dos alunos, em relação à fabricação do pa-pel artesanal, pelas perguntas frequentes de quando seriam feitos novos papeis reciclados. Quando os envolvidos na escola veem a movi-mentação dos alunos, a curiosidade e o entu-siasmo ao aprenderem, é quase que automáti-co, os professores despertarem para trabalhar a conscientização ambiental, nas suas aulas e ao mudar as atitudes no cotidiano escolar, os alunos, passam a inserir novos hábitos no ter-ritório escolar. A Educação Ambiental é assim, um processo que envolve um vigoroso esforço de recuperação de realidades e que garante um compromisso com o futuro.

A Educação Ambiental tem sido uma das alia-das para mudar gradativamente o modo de ver e agir da sociedade, no geral, uma vez que parte da abordagem de aspectos que são fami-

liares e conhecidos das pessoas, possibilitando desta forma, uma aprendizagem significativa que apresenta um grande potencial de se con-solidar em mudanças de valores e atitudes na efetivação de uma consciência ambiental no planeta. Sem contar que os produtos confec-cionados com papel são bonitos, de bom gosto e muito valorizados, o que pode vir a propor-cionar uma boa renda mensal para a família e artesoes. Assim, atitudes simples pode mudar o contexto social de uma sociedade carente.

AGRADECIMENTOSOs autores agradecem as escolas, pela colaboração e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/CAPES, através do Programa Institu-cional de Bolsa de Iniciação a Docencia/PIBID, pela concessão de bolsas.

REFERENCIAS CITADASAB’SABER, A. A Universidade brasileira na (re) construção da

Educação ambiental.

Educação brasileira, Brasília, v.15, n.31, p. 15-16, jul./dez. 1993.

BIONDI, D. Arborização Urbana Aplicada à Educação Ambien-tal nas Escolas. Curitiba: O autor. 2012. 120p.

BRITTO, C. Educação e Gestão Ambiental. Salvador: Ministé-rio do Meio Ambiente, 2000.

CADORIN, D. A. HASSE, I.; SILVA, L. M.; BETT, C. F. Caracterís-ticas da flora arbórea de quatro escolas de Pato Branco-PR. REVSBAU, Piracicaba, São Paulo, v.6, n.2, p.104-124, 2011.

GUERRA, R. T. ; GUSMÃO, C. R. C. ; SIBRÃO, E. R. A arboriza-ção e a coleta seletiva de lixo como práticas de educação ambiental em uma escola pública de ensino fundamen-tal. 2002. Disponível em: <http://www.prac.ufpb.br/anais/Icbeu_anais/anais/meioambiente/arborizacao.pdf>. Acesso em: 26 out. 2010.

PAIVA, H.N. & GONÇALVES, W. Florestas

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REFLEXÃO

A Formação Contínua de Professoresalgumas reflexões

Regina Magna Bonifácio de AraújoProfessora da Universidade Federal de

Ouro Preto, [email protected]

A formação contínua como parte integrante da atividade dos professores tem ocupado espaço privilegiado nos estudos e pesquisas realizados nos últimos anos, no âmbito acadêmico e no das políticas públicas, sendo um dos focos de atenção dos programas internacionais como o PROGRAMA IBERO-AMERICANO DE MOBILI-DADE DOCENTE 2014|2017, promovido pela Organização dos Estados Ibero-Americanos – OEI. Essa temática tem atraido a preocupação e o envolvimento de muitos estudiosos e pesqui-sadores, em todo o mundo, revelando intenções formativas em diferentes áreas e, em especial, indicando a escola como lócus privilegiado para a formação e desenvolvimento profissional do professor.

E, por compreender que esta temática é de fundamental importância e complexidade, ten-taremos nesta seção apresentar, inicialmente, alguns conceitos e enfoques sobre a formação contínua de professores, evidenciando tanto um modelo que identificaremos como clássico, sustentado num contexto histórico, como as novas tendências na formação continuada de professores. Ainda, procuraremos evidenciar os aportes legais que sustentam as exigências de uma formação contínua para educadores e professores.

De acordo com Estrela (2015), nos tempos

atuais torna-se mais complicado falar das rea-lidades da formação contínua, “pois o discurso sobre ela tende a confundir-se com o acto de formação, como se ele fosse um acto demiúr-gico que, através dos símbolos, desse vida ao conteúdo da mensagem, inscrevendo-a no real” (Estrela, 2015,p.183). O fato é que, mesmo com inúmeras publicações que anualmente surgem em todo o mundo sobre a temática, verifica-mos que os estudos descritivos, explicativos e interpretativos sobre a formação contínua são em menor número, como afirma a autora, dei-xando evidente as limitações que gravitam em torno da temática.

Também se espera que esses estudos ultrapas-sem as discussões mais generalistas sobre a for-mação contínua, e a localizem num quadro te-órico constituído a partir de uma compreensão consistente e fundamentada sobre a temática, o que não tem ocorrido. Há uma grande lacu-na, quer em termos teóricos, quer em termos conceituais sobre o que vem a ser formação

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contínua de professores. E ainda, identificamos que os estudos, em geral, dão pouca visibilida-de para as realidades atuais desta modalidade de formação.

Tomaremos como ponto de partida a compre-ensão do que vem a ser formação contínua, resgatando o conceito apresentado pela OCDE, num relatório que data de 1984. Para este or-ganismo internacional, “A formação contínua, [é] entendida como um processo organizado de atualização em função de uma carreira docente diversificada (ensino e atividades para docente) e devidamente estruturado em termos de obje-tivos, execução e controlo” (p.173).

Neste cenário, a formação contínua, surge a partir dos princípios propostos pela concepção de que a aprendizagem ocorre ao longo da vida, e de acordo com a OCDE, deveria se apoiar nas três estratégias principais de formação. Essas estratégias, que estariam na base das políticas de formação continuada de professores, são assim apresentadas: a licença sabática, na qual o professor tem um apoio financeiro para se aperfeiçoar; a frequência a cursos que são vin-culados aos resultados das avaliações do traba-lho docente e, finalmente, aquelas formações evidenciadas pela própria escola baseadas nas necessidades dos docentes.

Dentro das discussões conceituais, diferentes autores apresentam suas formulações acerca do que compreendem ser a formação contí-nua dos professores. Nesta análise, trataremos de apontar a compreensão de Marcelo Faria (1999), Furter (1974), Rodrigues (2006) e Pi-veta (2009) acerca da formação contínua, e os estudos realizados por Estrela (2015), em que apresenta alguns níveis de discurso observados a partir das produções escritas sobre a forma-ção contínua.

Para Marcelo García (1999, p. 193) a formação contínua deve ser entendida como

um processo de aprendizagem mediante o qual alguém (professores, directores) deve aprender algo (conhecimentos, competências, disposi-ções, atitudes), num contexto concreto (escola, universidade, centro de formação) implica um projecto, desenvolvimento e avaliação curricular. O currículo, neste caso, refere-se à planificação, execução e avaliação de processos formativos, tendentes a melhorar a competência profissional dos professores.

Nesta perspectiva, o autor aponta a formação contínua como um processo e intencional, planejado dentro de um contexto específico, direcionado a um grupo pré-definido, com ca-racterísticas que se assemelham a um curso, com objetivos claros a seres perseguidos. E, por assim se caracterizar, essas ações devem ser enquadradas num esquema que implica pla-nejamento, acompanhamento e avaliação. E, é interessante destacar que para este autor, há uma necessidade que foi identificada, “alguém precisa aprender algo”, que será por um tercei-ro, ensinado.

Já para Furter (1974, p. 121) “a educação é per-manente porque o homem não acaba nunca de amadurecer, qualquer que seja a idade, o sexo e a situação sociopolítica. Nunca será comple-tamente formado”. Este autor compreende a formação contínua de professores não apenas em seu sentido formal, enquanto ações pensa-das com o propósito de atender determinadas necessidades. Furter, numa visão mais holística, percebe esta formação de maneira mais ampla, incluindo nela a atuação do próprio docente, suas expectativas, sua trajetória e suas experi-ências de vida.

Rodrigues conceitua formação contínua como aquela que

É entendida como direito e dever do professor e orienta-se por objetivos como o de promover a atualização e o aperfeiçoamento, bem como o de promover a investigação aplicada e a divul-gação da inovação educacional; o de melhorar a

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competência profissional nos vários domínios da atividade docente; o de incentivar a participação ativa na inovação educacional e na melhoria da qualidade de educação e do ensino; o de adqui-rir novas competências relativas à especialização exigida pela diferenciação e modernização do sis-tema educativo (Rodrigues, 2006, p.34).

Para esta autora as atividades que compõem uma ação de formação devem ser realizadas de forma sistemática ao longo da vida do profes-sor e articuladas com o seu trabalho e as suas necessidades. São por estas ações que os pro-fessores poderão desenvolver “conhecimentos, capacidades, atitudes e valores adequados ao exercício das tarefas profissionais em ordem à melhoria da qualidade da educação proporcio-nada aos educandos”(Rodrigues, 2006,p.34). Uma formação que, ainda segundo a autora, deve focar nos novos papéis que o professor é chamado a cumprir na escola.

O quarto conceito que aqui queremos refe-renciar é da autora Pivetta (2009) que acredi-ta numa formação contínua que é “parte do próprio sujeito, ou seja, este se forma por seus próprios meios, a partir de si mesmo”. O desta-que dado por Pivetta ao papel da experiência no processo formativo é, neste caso, encarado como uma ação contínua a ser conduzida pelo próprio sujeito. De acordo com a autora, cada professor assimila uma dada realidade e, a par-tir dela, agrega à sua prática as experiências po-sitivas e negativas que lhes foram significativas. Ainda, o professor neste contexto de aprendiza-gem é aquele capaz de “refletir sobre o que tem feito, como tem feito e, assim, buscar outras maneiras de ser e fazer”, ampliando assim “as relações intersubjetivas que [o professor] esta-belece com colegas e alunos” (2009, p. 3).

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Neste texto, daremos foco ao conceito de for-mação contínua que nos sugerem dois autores. Inicialmente, o conceito apresentado por Nasci-mento (2008), para efeitos de análise das políti-cas públicas pensadas para os professores. Este autor, define a formação contínua como

(...) toda e qualquer atividade de formação do professor que está atuando nos estabelecimen-tos de ensino, posterior à sua formação inicial, incluindo-se aí os diversos cursos de especiali-zação e extensão oferecidos pelas instituições de ensino superior e todas as atividades de for-mação propostas pelos diferentes sistemas de ensino (p.70).

O outro conceito que tomaremos em relevo considera a formação de professores enquanto um processo de vivências e sistematicamente pensado, como o define Alarcão (1998 p. 100), para quem a “formação continuada [se cons-titui] como o processo dinâmico, por meio do qual, ao longo do tempo, um profissional vai adequando sua formação às exigências de sua atividade profissional”.

Dessas duas conceituações consideradas nesta reflexão destacamos na primeira a indicação de que as ações de formação contínua são “todas” e de todas as modalidades, formas e tipos, que necessariamente só precisam se articular com as necessidades do educador e suas possibili-dades concretas de participação, bem como às condições da escola de apoiar a realização dessas ações. Na segunda conceituação desta-camos o caráter de subjetividade e individuali-zação do processo a que nos remete a autora. No centro desta ação formativa esta um sujeito, um profissional, um educador que será o autor e promotor da sua contínua formação, aquele que ao tomar consciência da sua trajetória for-mativa, o faz olhando, também, para suas ca-rências e necessidades.

A ideia que predomina não é apenas a de atu-alização constante face ao acelerado processo

de mudanças que vem ocorrendo na socieda-de, seja no domínio do conhecimento e das tec-nologias, ou mesmo no mercado de trabalho. Mas, igualmente, a de que o profissional do-cente é o protagonista deste processo e como tal, deve, com o apoio, quer da escola, quer dos sistemas nacionais de educação, gerir e condu-zir as ações que devem sustentar uma educação de qualidade social e pedagógica, à altura das demandas atuais.

O caso português

Ao tomarmos como estudo a realidade da for-mação contínua de professores em Portugal, identificamos que esta tem sido considerada como um direito dos professores e que foi le-galmente instituído pela Lei de Bases do Sis-tema Educativo, de 1986 e atualizada pela Lei nº49/2005, de 30 de agosto. Este dispositivo legal define em seu artigo 33º, que

A formação de educadores e professores assenta nos seguintes princípios: a) Formação inicial de nível superior, proporcionando aos educadores e professores de todos os níveis de educação e en-sino a informação, os métodos e as técnicas cien-tíficos e pedagógicos de base, bem como a for-mação pessoal e social adequadas ao exercício da função; b) Formação contínua que complemente e actualize a formação inicial numa perspectiva de educação permanente (destaque da autora);

Sobre a formação contínua, mais especifica-mente, a legislação declara que este direito é estendido a todos os educadores, professores e outros profissionais da educação, e que suas ações devem ser suficientemente diversificadas para que possam assegurar o “complemento, aprofundamento e actualização de conheci-mentos e de competências profissionais” (LBSE, 2005). Ainda, esta formação terá como propósi-to possibilitar aos professores a ela submetidos a mobilidade e a progressão na carreira.

Podemos observar, ao longo desses 28 anos que transcorreram após a publicação da Lei de Bases

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Decreto-Lei nº 22/2014 Estabelece o regime jurídico da formação contínua de professores e define o respectivo sistema de co-ordenação, administração e apoio. Revoga os ante-riores.

Decreto-Lei nº 15/2007, de 19 de janeiro Alterações ao Regime jurídico da Formação Contí-nua de Professores - introduzidas pelo artigo 4º do Decreto-Lei nº15/2007, de 19 de janeiro (Alteração-es introduzidas pelo artigo 4º )

Decreto-Lei 155/99 de 10 de maio Alteração do regime jurídico da formação contínua de professores

Decreto-Lei 207/96 de 2 de novembro Estabelece o regime jurídico da formação contínua de professores e define o respectivo sistema de co-ordenação

Decreto-Lei 274/94 Alteração do regime jurídico da formação contínua de professores

Lei 60/93 Alteração do decreto-lei nº 249/92, de 9 de Novem-bro

Decreto-Lei n 249/92 Aprova o regime jurídico da formação contínua de professores

Decreto-Lei 249/92, de 9 de novembro Aprova o regime jurídico de formação contínua de professores

Decreto-Lei 344/89, de 11 de outubro Estabelece o ordenamento jurídico da formação dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário.

Lei de Bases do Sistema Educativo Republica a Lei Nº 46/1986, de 14 de Outubro, com as alterações introduzidas pela Lei Nº 115/1997, de 19 de Setembro.Artigo38 – Formação Contínua.

Fonte: site do Ministério da Educação e Ciência, Portugal

do Sistema Educativo, em 1986, o aparecimen-to e a evolução de um quadro normativo para a formação contínua de professores em Portu-gal, com vistas a “enquadrá-la juridicamente e adaptá-la às reformas do sistema, especifican-do os seus objetivos e regulamentando as suas iniciativas e coordenação.

Não nos deteremos numa análise aprofundada das publicações mais antigas, importa-nos as atualizações realizadas a partir de 2004, mas faz-se necessário no contexto do presente estudo destacar que em seguida à publicação da LBSE de 1986, foi assinado o Decreto-Lei nº344/89,

que ao estabelecer o ordenamento jurídico da formação dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário, ainda configurava a formação contínua como um dever do Estado (Estrela, 2014). Com todo o capítulo III destinado à formação contínua, este Decreto-Lei a apresenta como

“um direito e um dever dos educadores de in-fância e dos professores dos ensinos básico e secundário, visando promover a actualização e aperfeiçoamento da actividade profissional, bem como a investigação aplicada e a divulgação da inovação educacional”.

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O artigo 27º, deste ordenamento legal, declara que a iniciativa da formação contínua pode ser de “instituições para tanto vocacionadas” ou de organismos locais, regionais ou nacionais do Ministério da Educação. Ainda, que podem pro-por ações de formação contínua os empregado-res, docentes e suas associações profissionais e científicas, o que amplia o leque de instituições formadoras se se considerar que a própria es-cola também pode ofertar ações formativas aos seus docentes.

E, para aqueles envolvidos nestas ações, o Es-tado prevê que lhe seja concedido períodos sa-báticos ou mesmo a dispensa de horas da sua jornada de trabalho para a formação. Mesmo com este quadro privilegiado, de uma perspec-tiva legal, o país não conseguiu obter melhores resultados à época, sendo apontado pela OCDE o “carácter não sistêmico ou mesmo desorde-nado das ações de formação no que se refere a iniciativas, tempos, espaços, modalidades e conteúdos”(Estrela, 1990). Nesta denúncia, ain-da foram destacadas a falta de participação dos formandos e a falta de consistências e credibi-lidade que os mesmos percebiam das equipes que avaliavam o processo formativo.

A partir de 1992 foi, pela primeira vez, consa-grado um sistema de formação contínua de pro-fessores, entendida esta como um direito e um dever de todos eles. Algumas ações se desta-caram, entre elas o programa FOCO, no quadro do PRODEP; a criação do Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua (CCPFC) e a organização de uma centena de Centros de Formação de Associações de Escolas (CFAE). Esses últimos têm assumido a responsabilidade na realização de um grande número de ações de formação contínua de professores do Ensino Básico e Secundário, bem como, ações destina-das à formação dos educadores da infância.

Considerando todos as demandas que hoje se

apresentam ao profissional docente, a forma-ção contínua, em serviço, como expressão do exercício dialético e “como construção que o professor faz, a partir da leitura do real”, en-volvendo “práticas de formação que visam tomar consciência do real e de si em situação real”(Estrela, 2015, p.197), deve ser considera-da como prioritária, não apenas nos discursos oficiais, mas, nas investigações e programas de formação de professores.

Referências BibliográficasAlarcão, Isabel. (1998) Formação continuada como

instrumento de profissionalização docente. In: VEIGA, Ilma Passos A. (Org.) Caminhos da profissionalização do magistério, Campinas: Papirus, .

Estrela, M. T. (2015). In Caetano, A.P.; Rodrigues, A.; Esteves, M. (Orgs.). (2015). As ciências da educação na obra de Maria Teresa Estrela. Lisboa: EDUCA/Instituto de Educação, Universidade de Lisboa.

Furter, Pierre. (1974.) Educação permanente e desenvolvimento cultural. Petrópolis: Vozes,

Portugal. Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto [segunda alteração à LBSE].

Marcelo García, Carlos. (1999) Formação de professores: para uma educação continuada. Porto: Porto Editora.

Nascimento, Maria das Graças. (2008)In: Candau, Vera Maria. (Org.) Magistério: construção cotidiana. 6 ed. Petrópolis: Rio de Janeiro, Vozes.

Pivetta, Hedioneia Maria Foletto. (2009) Reuniões pedagógicas como espaço de reflexão e construção da docência superior. 32ª Reunião Anped.

Rodrigues, A. (2006) Análise de práticas e de necessidades de formação. Lisboa: Ministério da Educação, Direção Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular

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REFLEXÃO

Programa Ibero-Americano de Mobilidade Docenteatividades desenvolvidas no país de acolhimento

Adelaide SilvaDiretora do CFAECA

Manuela DâmasoDiretora do Agrupamento de Escolas de Caparica

Atividades desenvolvidas no país de acolhi-mento

Aspetos mais significativos das atividades desenvolvi-das de acordo com os tópicos sugeridos:

a. Comunicações apresentadas

b. Perceções sobre os contextos escolares/comu-nitários (aspetos relevantes dos sistemas edu-cativos, abordagens metodológicas, organização escolar, formação contínua de professores, ino-vação educativa…)

c. Decisões tomadas/partilhadas

d. Relevância das atividades desenvolvidas para o exercício das funções dos docentes portugueses participantes no projeto

e. Outras reflexões

f. Conclusões e recomendações

a) Comunicações apresentadas

As comunicações apresentadas foram muito significativas e determinantes do sucesso da missão que nos foi confiada pelo Ministério da Educação e Ciência, na qualidade de participan-

tes privilegiadas, no âmbito do programa Ibero-Americano de mobilidade docente 2014-2017, na sua fase piloto.

Procurámos merecer a confiança delegada e, neste sentido, conscientes da grandeza da re-presentação, assumimos com determinação o discurso, de forma organizada e adequada às diferentes situações e contextos, em profícua partilha e debate de ideias, em torno do sistema educativo português e brasileiro. Abordámos com particular intencionalidade as questões relativas a processos e procedimentos, a nível da organização e liderança escolar, da gestão e avaliação da escola e dos agentes educativos, com destaque para o processo de desenvolvi-mento pessoal e profissional docente, numa dimensão reflexiva e de questionamento sobre a importância da formação inicial e contínua de professores, na valorização profissional dos docentes.

Evidenciámos uma atitude de disponibilidade que permitiu uma interação franca, amigável e enriquecedora das relações interpessoais e interculturais. Do nosso ponto de vista, esta ati-tude potenciou um clima favorável ao sucesso da mobilidade.

Como parâmetros de qualidade, importa referir que esta mobilidade se enquadrou no 1º Encon-tro das Equipes Gestoras das Escolas Parceiras do PIBID/UFPI, organizado pela coordenadora do PIBID Antónia Dalva.

De forma estratégica esta mobilidade contri-buiu para construir uma ampla reflexão sobre o programa de iniciação à docência que é de-senvolvido pela UFPI - Teresina em articulação com as escolas.

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Nesta lógica de ação foi apresentada pela Professora Manuela Dâmaso a forma como o Agrupamento de Escolas da Caparica organiza a formação de professores em articulação com o Centro de Formação de Professores Alma-daForma, bem como a organização do siste-ma educativo português, carreira docente e o modo como este agrupamento se estrutura em termos pedagógicos e organizacionais.

A Professora Adelaide Silva apresentou a forma-ção contínua de professores, na perspetiva na-cional, dos Centros de Formação de Associação de Escolas, enquanto entidades de proximida-de, parceiras do Ministério da Educação e Ciên-cia, das Escolas e dos Agrupamentos.

Apresentou o paradigma de formação contínua em Portugal, desenvolvido pelos CFAE, modelo orientado para a melhoria da qualidade de de-sempenho dos professores, com vista a centrar o sistema de formação nas prioridades identifi-cadas nas escolas e no desenvolvimento profis-sional dos docentes, de modo a que a formação contínua possibilite a melhoria da qualidade do ensino, das aprendizagens e dos resultados es-colares dos alunos, em articulação com os obje-tivos de política educativa local e nacional.

De referir que foram apresentadas duas comu-nicações no auditório da Universidade Federal do Piauí (UFPI), em Teresina e na UFPI - Cam-pus Ministro Reis Velloso, em Parnaíba, peran-te uma eloquente, experiente e empenhada

assistência. Estas comunicações marcaram, de certo modo, a positividade das intervenções e revelaram – se de grande utilidade e interesse, com visível impacto a nível da satisfação e do envolvimento dos participantes.

Nestas conferências de abertura estiveram pre-sentes, os coordenadores, supervisores, profes-sores universitários, do ensino básico e médio, ligados ao desenvolvimento do programa PIBID e alunos pibidianos estagiários nas várias esco-las que posteriormente visitámos.

Deste modo, julgamos compreender o caloro-so acolhimento das cinco escolas visitadas e onde fomos convidadas a comunicar, em varia-das situações, tal como, nas inúmeras salas de aula, com máximos de 40/45 alunos, por sala, em espaços de bibliotecas, salas polivalentes, em paradas militares, espaços de exposição, feiras de materiais pedagógicos, refeitórios de escolas, em locais de convívio e de contínua e curiosa conversa, com prioridade para o siste-ma educativo, a sua organização e o sentido de ser professor.

Alunos e professores, funcionários, pais e famí-lias, de modo formal e informal, muitos foram os momentos de partilha e de grande orgulho pela motivação evidenciada, promotora de in-teressantes diálogos e reflexões com “as portu-guesas”. Em torno de infinitos projetos, conver-sas, de âmbito individual e coletivo, foi possível estabelecer uma relação aberta e de grande empatia com vastas assistências muito diversi-ficadas em idades e funções.

Destacamos a elevada presença de jovens Pibi-dianos, alunos em formação inicial, do progra-ma PIBID, e uma vasta equipa de professores com intervenção direta, no processo formati-vo destes jovens, nomeadamente, professores universitários, que formam na universidade e supervisionam as práticas pedagógicas, no con-texto da sala de aula, das escolas protocoladas

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com o Programa PIBID; professores do ensino básico e médio, que acolhem nas salas de aula os jovens Pibidianos sob a sua responsabilidade e orientação.

Salientam-se os coordenadores de gestão de processos educacionais, atentos e observado-res, sob a coordenação institucional de Antónia Dalva, líder incondicional do Programa PIBID/ UFPI.

b. Perceções sobre os contextos escolares/co-munitários (aspetos relevantes dos sistemas educativos, abordagens metodológicas, orga-nização escolar, formação contínua de profes-sores, inovação educativa…)

Visitámos cinco escolas públicas de Teresina: Unidade Escolar Professor Joca Vieira, CETI Go-verno Freitas Neto, AMA - Associação de Ami-gos dos Autistas do Piauí, CEPTI Governo Dirceu Mendes Arcoverde, CETI Professor Darcy Araújo e U.E. Esther Couto.

Todas as escolas visitadas se organizaram para nos receber e acolher de forma ativa, tendo permitido um conhecimento profundo do seu funcionamento e realidades. Foram organiza-das atividades como por exemplo: Grupos de dança, apresentações musicais, peça de teatro-musical Os Rebeldes, rádio escolar, exposições sobre os materiais pedagógicos e atividades desenvolvidas pelos alunos das escolas e esta-giários pibidianos.

Na escola AMA – Associação de Amigos dos Autistas do Piauí pudemos contactar com vá-rias práticas pedagógicas de aprendizagem dos alunos e materiais construídos pelos professo-res para apoio ao ensino que revelam o espíri-to empreendedor destes docentes, bem como materiais artísticos construídos pelos alunos.

Fomos objeto de entrevistas para duas rádios escolares e concedemos entrevistas para o Por-tal da Secretaria da Educação e Cultura do PIAUÍ e Secretaria Municipal de Educação – SEMEC.

Nas visitas às escolas foi muito gratificante, termos tido a graça de observar e refletir, in loco, no âmbito da diversidade de contextos e situações de ensino e aprendizagem, a imple-mentação do programa PIBID, que nos pareceu ser estruturante de uma organização-escola de qualidade e de futuro.

Este programa orienta-se por valores relacio-nais, organizacionais e de questionamento das práticas pedagógicas, fundamentados em es-tudo e em processos de investigação-reflexão-ação, desenvolvendo espírito crítico, com senti-do transformador e positivo.

Este programa aposta na co-construção de conhecimento, no modo de ler e interpretar a realidade, de agir, em dinâmicas projetuais, participadas, de forma integradora, por equi-pas profissionais, disponíveis e motivadas para pensar, fazer e comunicar, de forma inovadora e empenhada. O jovem aluno pibidiano está em constante autoformação e no seio de comuni-dades aprendentes.

Confrontamo-nos com aprendizagens signifi-cativas, em áreas essencias, como as artes, as ciências, as humanidades, o ensino especial, a comunicação, construídas com muita sabedoria e muito amor à causa da educação, crentes no desafio e paixão de ensinar, aprender e experi-mentar os saberes da docência.

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Constatámos no entanto que a formação contí-nua é pouco estruturada ou inexistente e sem paralelo com o modelo português em vigor. Verificámos, contudo, interesse em iniciar uma parceria, de modo a promover alguma formação a distância, exploratória das potencialidades do modelo de formação contínua dos CFAE’S, com probabilidades de implementação futura, com prioridade para a formação especializada em gestão e administração escolar, dirigida a ór-gãos de gestão e direção escolar.

Na classe docente, está instalado um descon-tentamento evidente, a nível das condições salariais, da desigualdade de salários entre instituições escolares, segundo sejam estadu-ais, federais, municipais. Esta discriminação interfere na qualidade dos serviços, na organi-zação das instituições escolares, a nível das ins-talações, dos espaços, recursos, condições de trabalho, salários dos professores e de outros profissionais, como órgãos de direção e gestão escolar.

Importa acrescentar que o estado do Piauí é de grande beleza e de grande pobreza. Identificá-mos problemas de ordem socioeconómica evi-dentes, como nos referiram e constatámos, são substantivas as desigualdades.

c) Decisões tomadas/partilhadas

Das ideias e experiências partilhadas, nasceram novas ideias e vontades, novas possibilidades transformadoras, a saber:

1- Potenciar a criação e organização de redes e parcerias de excelência a desenvolver, a nível das instituições escolares, das universidades, dos professores, dos alunos;

2- Partilhar projetos de referência, práticas pe-dagógicas significativas, estudos de caso, comu-nicações científicas;

3- Promover dispositivos de formação contínua, a distância, em regime de formação e- learning, prevendo-se a organização de sessões de for-mação de curta duração nas escolas dos vários países, potenciando a partilha e discussão de políticas e práticas educativas;

4- Potenciar a mobilidade docente e discen- mobilidade docente e discen-te, através de medidas-chave de referência, a exemplo do programa europeu ERASMUS +, através de cursos internacionais de curta e/ou longa duração, e de intercâmbios escolares;

5- Conceber, organizar e editar a 1ª publica-ção da revista do Programa Ibero-Americano de mobilidade docente 2014-2017, subordina-da ao tema “Liderança e Organização Escolar – Desenvolvimento Profissional Docente”, no âmbito do referido programa, com os contri-butos de todos os intervenientes nacionais e estrangeiros, sob a coordenação de Portugal, Agrupamento de Escolas da Caparica – AEC e Centro de Formação de Associação de Escolas do Concelho de Almada – CFAECA, com data de publicação prevista para julho de 2015.

6- Construir o regulamento da revista, estrutu-rar a sua organização e apelar à comunicação, convidando todos os intervenientes no progra-ma OEI, a participar, de forma a constituir uma bolsa de colaboradores/ comunicadores ativos e produtivos da revista em apreço;

7- Dar continuidade ao projeto do diário grá-fico, uma narrativa da viagem, da estadia e da formação, partilhado pelos vários intervenien-tes, com humor e amor e que foi feito durante a mobilidade.

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8- Apresentar ao MEC, em Portugal, o mode-lo do PIBID – Formação inicial de Professores como prática de referência a conhecer, a estu-dar, a ter em consideração para eventual imple-mentação, com as devidas adequações.

d) Relevância das atividades desenvolvidas para o exercício das funções dos docentes por-tugueses participantes no projeto

As atividades desenvolvidas assentaram, es-sencialmente, em dimensões de intensa escuta ativa, substantiva comunicação estruturada em apresentações de powerpoint, vídeo, em gran-de e pequeno grupo, com situações recorren-tes de diálogo, de partilha de saberes e expe-riências, comparações e reflexões avaliativas e apreciativas.

Fortes emoções e poucas as palavras para transmitir e gerir sentimentos, em momentos inesquecíveis, como o da surpresa de ouvir can-tado à capela pela Jacinta, cantora portuguesa de jazz, professora de canto na UFPI, o hino na-cional de Portugal e por uma sua aluna, de voz arrebatadora, o hino nacional do Brasil. Fluiu maravilhosamente, o canto, em harmoniosa mensagem e musicalidade. O Brasil está todo dito na força das palavras do seu hino.

A forte experiência resultante do confronto com a nossa língua, a língua portuguesa, em modo grandioso, harmonioso, que une e traça senti-dos comuns, afetivos, históricos, criativos. É o estar longe e perto, dentro, muito por dentro, em casa. É o poder falar, compreender, questio-nar, sistemas, problemas, soluções, abordagens metodológicas, dimensões teóricas e práticas, aspetos organizacionais, avaliação da escola e do desempenho profissional docente, com inci-dência na formação contínua, promovida pelos CFAE’S.

Refletir permanentemente, receber lições de vida, de verdadeira educação, de valorização das pessoas, da diversidade dos seus contextos

de vida e de aprendizagem. Da sua abertura ao Outro, da curiosidade que sentem, da afectivi-dade que expressam, partilham. Abraços, bei-jos, fotos, promessas, registos, brilho nos olhos, sorrisos calorosos, cúmplices.

Permitiu tomar consciência, acrescentar valor e significado à profissão de professor, permitiu ler criticamente o mundo, vê-lo com um novo olhar, abordá-lo com novos sentidos.

Modos de fazer e construir conhecimento, re-lacionamento, desenvolvimento, em interação, estabelecendo pontes para um mundo novo, com melhor educação, melhores professores, alunos, ensino e aprendizagem.

e) Outras reflexões

Posicionamentos e atitudes face à vida e à pro-fissão. Valorização do poder da comunicação e da argumentação. Tomada de consciência pro-fissional.

Atitude positiva e vinculada dos participantes relativamente à educação e escolas. O acolhi-mento magnífico o interesse demonstrado por todos pela visita e a inesquecível afetividade.

O eterno dilema entre o ter e o ser. A positivi-dade, o otimismo, a relação, a afectividade, a saudade inscrita nos olhos e nos corações. A alegria, a criatividade, a frontalidade, a auten-ticidade.

O amor à educação, uma causa, uma missão, com sentido de futuro.

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f) Conclusões e recomendações

O Programa Ibero-Americano para a mobilidade docente abre portas para mundos diferentes, que nos interpelam, questionam, estimulam, motivam a pensar e a desejar fazer educação com mais dádiva e coragem. A lição que se reti-ra é de vida e para a vida.

O programa foi verdadeiramente formativo, significativo pelo seu potencial transformador, quer pela dimensão das práticas, das atitudes, das ideias, das reflexões, das relações, dos sa-beres, do conhecimento, do que é essencial e acessório, verdadeiro, do bem precioso do ato de educar. Do ser professor… eternos apren-dentes…. eternos sonhadores ao longo da vida… em permanente desenvolvimento pesso-al e profissional.

Recomendamos que devem ser valorizadas as questões da avaliação do Programa PIBID, a nível das escolas e dos seus processos de ava-liação, avaliação interna, avaliação externa, de modo a dar mais visibilidade, cientificidade, credibilidade ao programa. Avaliar os impac-tos, nas diferentes escolas, na apropriação das metodologias, na integração do programa, na vida escolar, nas dinâmicas pedagógicas, na qualidade das aprendizagens e dos resultados escolares.

O processo deve ser monitorizado, supervisio-nado e investigado, de modo a ser possível pro-

duzir conteúdos científicos, comunicações de referência, a disseminar nas escolas/universida-des brasileiras/portuguesas e dos outros países ibero-americanos.

Questão essencial – De que forma, como dar continuidade a este programa em Portugal, onde fará todo o sentido ser experimentado.

Recomendamos vivamente que o programa PI-BID – Programa Institucional de Bolsa de Inicia-ção à Docência, possa servir de referência para contribuir para uma melhor e mais consciente educação, sustentada, numa rede preciosa de recursos humanos, mais velhos e experientes, mais novos e motivados, mais sabedores e es-pecializados, para uma construção de conheci-mento e de projetos de vida Felizes, de realiza-ção pessoal, profissional e social.

Um mundo melhor, mais humanizado, mais jus-to.

Viajar é preciso! Que esta mobilidade docente continue e alcance a dimensão do Futuro com que sonhamos Viver!

Nota: No âmbito deste mesmo programa foi realizado em Almada o curso de formação “Desenvolvimento Pro-fissional Docente”, no qual foram produzidos os ma-teriais disponibilizados em:

http://almadaforma.org/index.php/materiais-produ-zidos-nas-accoes-de-formacao

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REFLEXÃO

Liderança e Organização Escolar conceitos, relações e implicações

Ana Paula Silva Investigadora colaboradora,

Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento (CeiED),

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (ULHT)

[email protected]

Muito se tem escrito nas últimas décadas sobre ‘liderança e organização escolar’, sendo claro que na era da incerteza, no mundo globalizado e na sociedade da informação e do conhecimen-to, este tema se tem tornado incontornável. Porém, não obstante se ter demonstrado, sem sombra de dúvida, que a qualidade das lideran-ças formais (topo e intermédias) tem influência na qualidade do ensino, por via do investimen-to destas no desenvolvimento profissional dos professores e, por via destes, na sala de aula e na aprendizagem dos alunos (Clímaco & Silva, 2015a e 2015b; Antunes & Silva, 2015) muitos pontos cegos carecem ainda ser visualizados no âmbito destes trânsitos.

O primeiro deles reside na naturalização dos termos. Habitualmente, os termos que ‘andam nas bocas do mundo’ tendem a adquirir uma áu-rea de significado evidente que obscurece esse mesmo significado. Assim, torna-se necessário, antes de mais, clarificar os conceitos. O que sig-nifica ‘liderança’? O que significa ‘organização escolar’? E que significa ‘liderança e organização escolar’ associados numa mesma expressão?

Liderança é um termo traduzido do inglês leadership que não significa, necessariamente, quem decide o que fazer, quem manda, mas sim, primordialmente, a ação de quem orienta,

indicando o caminho. Independentemente dos aspectos que conferem complexidade ao pro-cesso, como os fatores que diferenciam estilos e/ou os fatores contextuais e circunstanciais que influenciam a ocorrência dos fenómenos da liderança.

Por sua vez, a organização escolar é um termo que veio substituir o termo escola. Primeiro, no discurso da Administração e da Política, tendo sido, depois, apropriado por outros sectores da sociedade. Na verdade, escola existe há muito, desde a antiguidade clássica, mas ‘organização escolar’ existe, fundamentalmente, desde os anos 80 do século XX. Esta expressão inscreve-se na ‘nova ação pública’, o modelo de admin-istração dos estados, resultante da assunção da insustentabilidade do estado previdência. Este novo modelo substituiu ‘governo’ por ‘gover-nança’, o que significa, por um lado, que o es-tado passa a partilhar com a sociedade civil a responsabilidade dos serviços públicos e, por outro, que a administração pública passou a ser realizada segundo os princípios da administra-ção das empresas, nomeadamente pelo princí-pio da rentabilização dos recursos.

Este princípio veio constranger a escola democrática, massificada e alegadamente in-clusiva que passou, necessariamente, a sofrer as consequências da tensão entre rentabiliza-ção dos recursos e investimento, traduzida re-centemente em cortes na ‘despesa’ com a edu-cação. Daí que a tónica dos discursos tenha sido colocada na expressão ‘liderança e organização escolar’. Por um lado, presume-se que dada a atual incerteza dos tempos, as organizações escolares necessitam de liderança, cuja visão indicará o caminho a seguir e cuja ação deverá

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rentabilizar os recursos que tem ao seu dispor para concretizar a missão da organização esco-lar, educando todos alunos que a frequentam, tendo disso que prestar contas. Desta forma, a ‘governança’ assinala os elementos respon-sáveis nas e das organizações para suprir as insuficiências do estado e os recuos da admin-istração pública.

As consequências disso são de todos conheci-dos, uma carga de trabalho e níveis de stress nunca antes registados nos profissionais da educação, transversais em todos os níveis e de-partamentos da organização escolar. O que nos faz defender que outros pontos cegos devem ser visualizados, nomeadamente que a lideran-ça se encontra distribuída por vários níveis do sistema educativo e que as influências entre es-ses níveis são recíprocas e de forças desiguais, como a figura abaixo ilustra.

Figura 1: Liderança & Escola, in “A liderança nas esco-las para a equidade e a aprendizagem”, comunicação da autora no Seminário Internacional: Autonomia e Liderança das Escolas, Lisboa, 29-30 junho, promov-ido pelo Ministério da Educação e Ciência.

Assim, temos a liderança do sistema nas mãos dos sucessivos fazedores e executores das políticas educativas ao nível macro, abaixo a liderança das organizações escolares ao nível meso, nomeadamente as de topo, as intermé-dias e as de base (dos professores) que, por sua vez, se exerce ao nível micro (na sala de aula e sobre cada um dos alunos, individual e colecti-vamente). Todos estes níveis são perpassados,

simultaneamente, pela liderança informal. E isto, apenas, no que se refere à liderança dos profissionais docentes. Porém, no seio das or-ganizações escolares, ainda temos as lideran-ças do pessoal não-docente, dos alunos e das famílias. No ambiente em que as organizações escolares se inserem, temos ainda a liderança de outros atores da comunidade, como as au-toridades locais e os atores económicos, soci-ais e culturais. Entre todos os níveis e sujeitos envolvidos na liderança se exercem forças con-strangedoras ou facilitadoras dos processos de liderança nas organizações escolares (Clímaco & Silva, 2015c).

Em suma, apesar da vasta literatura produzida sobre ‘liderança e organização escolar’, muitos pontos cegos há a ter em consideração e a estu-dar. Portanto, caros docentes estejam atentos, reflitam criticamente e não se deixem enredar em discursos retóricos e demagógicos. Nós, por nosso lado, continuamos a trabalhar para cuidar da pessoa do docente e contribuir para o seu fortalecimento e bem-estar, quer inves-tigando e aprendendo quer dinamizando ações de formação.

Referências

Clímaco, M.C. & Silva, A.P. (2015). Nota introdutória. Liderança nas escolas para a equidade e aprendizagem – perspetivas e percursos. Revista Lusófona de Educação, 30, 9-13.

Clímaco, M.C. & Silva, A.P. (2015). A good practice in School Leadership – Portuguese case study. Revista Lusófona de Educação, 30, 191-197.

Clímaco, M.C. & Silva, A.P. (2015). Promoting collaboration toolset. The EPNoSL Toolkit. School Leadership for equity & learning. European Policy Network on School Leadership. 143-159. http://toolkit.schoolarship.eu

Antunes, R.R. & Silva, A. P. (2015). Liderança dos professores para a equidade e a aprendizagem. Revista Lusófona de Educação, 30, 73-97.

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REFLEXÃO

Pontes Colaborativas no contexto educativo europeu e internacional

Ana Paula RochaProfessora

Formadora de Formação Contínua de Professores e Investigadora na área das

Ciências da Educação [email protected]

Wim SimoensConselheiro Pedagógico para a Educação no

Ensino Secundário da Flandres, Bé[email protected]

RESUMO

Este artigo visa dar conta das vantagens do estabele-cimento de pontes colaborativas no contexto educati-vo entre parceiros transcontinentais e europeus.

No caso específico do Programa Ibero-Americano de Mobilidade Docente, o qual se propõe implementar uma rede de partilha de informação, o acesso a dados atualizados e a produção de conhecimento em dife-rentes domínios que têm implicações nas formas de vida produzidas na escola - designadamente: o desen-volvimento curricular, a formação de professores, a administração escolar, a relação educativa e informal que se vive nas escolas - as experiências ocorridas em Portugal contribuíram para o fortalecimento do co-nhecimento, a compreensão mútua, a integração e a solidariedade entre os membros envolvidos.

No tocante à colaboração entre o CFAE Almadafor-ma e o Belga Eekhoutcentrum, não esquecendo as peculiaridades e idiossincrasia dos países envolvidos,

o intercâmbio que tem vindo a ocorrer na área do conhecimento em educação, permite perceber como tem sido possível integrar códigos de modernidade revalorizando a identidade educativa e cultural dos envolvidos numa simbiose enriquecedora.

PROGRAMA IBERO-AMERICANO DE MOBILI-DADE DOCENTE, 2014-2017. REFLEXÃO SOBRE A EXPERIÊNCIA

Para aqueles que abriram as páginas desta pu-blicação e a folhearam no intuito de compreen-der as mais-valias que decorrem de experiên-cias inovadoras, no contexto de um programa de mobilidade docente, irão, seguramente, ficar elucidados quanto às atividades que de-correram em Portugal e como foram enrique-cedoras.

Nas iniciativas, constituídas pelo parceiro eu-ropeu português - o CFAE Almadaforma - foi possível identificar a importância da interação estabelecida no âmbito generalizado da educa-ção e aprendizagem de adultos. As dinâmicas geradas no encontro, em Abril e Maio de 2014, maximizaram o impacte da cooperação trans-continental, encorajando sinergias e dando re-levo a métodos de formação que se justificam pelas necessidades da educação, em benefício da melhoria das escolas.

MOBILIDADE DOCENTE PARA A MELHORIA DA LIDERANÇA E ORGANIZAÇÃO ESCOLAR

O tema agregador - liderança e organização es-colar - visou a disseminação e intercâmbio de informação, assim como experiências potencia-doras de estratégias educativas e oportunida-des de aprendizagem para formandos adultos.

Sabe-se hoje como as mudanças sociais atin-

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gem as organizações escolares e a sua cultura específica, rica em valores. A formação de líde-res, com capacidade transformadora do con-texto escolar e que possa torná-los efi cazes ge-e que possa torná-los eficazes ge-rando ambientes acolhedores, constitui um dos contributos mais relevantes para uma atuação que seja promotora do ensino qualificado. Pro-jetos, com a natureza do ibero-americano de mobilidade docente, concorrem para a profis-sionalização dos professores, designadamente aqueles com responsabilidades de liderança, permitindo promover a sua ação para que, diante da mudança, da incerteza e da instabi-lidade, as escolas, rapidamente se repensem, reajustem e recalibrem para procederem em situação (Alarcão, 2001).

Com efeito, o programa aspira a que se promova o desenvolvimento profissional dos envolvidos a fim de melhorar as aptidões e competências, no quadro de uma perspectiva educativa, social e cívica. Nos encontros formativos verificou-se a real confluência de três factores: a predispo-sição para a aprendizagem, um ambiente de aprendizagem dinâmico e diversificado e a pre-sença de agentes fomentadores das aprendiza-gens, através da intervenção dos formadores e das experiências que estes proporcionaram aos formandos.

Podemos destacar as vantagens deste projeto, para a mobilidade de docentes oriundos em sis-

temas de ensino e formação distintos, elencan-do alguns dos pontos, que são multifacetados nos seus efeitos:

• Reforçar a aprendizagem ao longo da vida através do diálogo intercultural;

• Apoiar o desenvolvimento de pedagogias e práticas inovadoras, através de conteúdos articulados com as TIC (Tecnologias de In-formação e Comunicação) para aumentar as oportunidades de intercâmbio e ne-tworking;

• Promover a criatividade e elevados níveis de desempenho educativo;

• Estimular a melhor divulgação possível de processos inovadores em educação;

• Garantir o intercâmbio de boas práticas no domínio do ensino, com o propósito de melhorar a qualidade no sector da educa-ção e da formação;

• Incentivar a aprendizagem em contextos de diversidade linguística;

• Criar um sentimento de cidadania trans-continental baseada no respeito e compre-ensão pelo Outro.

Os benefícios não se esgotam nos pontos que aqui destacamos, pois, com efeito, a rede de saberes que foi promovida, alicerçada nas va-lências de um projeto integrador de contribu-

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tos diversos e heterogéneos, estende-se muito além das parcerias estabelecidas, permitindo construir conhecimento novo com base nessa partilha.

CONSTRUIR O CONHECIMENTO NA PARTILHA E DIVULGAÇÃO

Os seminários que ocorreram em Portugal co-briram essencialmente a área do desenvolvi-mento profissional. Para este efeito foi convoca-da uma rede de especialistas no domínio, que, em muitos casos, desenvolveram workshops aprofundados e específicos. Nestes espaços partilharam-se experiências, conhecimentos e debateram-se soluções práticas para uma varie-dade de cenários. Nos workshops examinou-se, por exemplo, a relação entre formação e desen-volvimento profissional, os diferentes modos de trabalho em formação, o desenvolvimento ao longo da trajetória profissional, os fatores que o influenciam, as dificuldades e desafios da for-mação, para mencionar apenas alguns temas.

Foram, igualmente, implementadas formas inovadoras de partilha de conhecimento, como relato de histórias, representação de papéis e simulações. Para ampliar os efeitos do saber disseminado as sessões foram filmadas e fo-tografadas, com muito do conteúdo a ser dis-ponibilizado através de plataformas online. A interação entre os especialistas e os indivíduos proporcionou a partilha de ideias, experiências, documentação e a transferência do saber para as situações individuais e específicas dos for-mandos.

Os momentos formativos não se reduziram a um mero dispositivo de análise, ou de obser-vação, tendo-se constituído na produção de conhecimento contextualizado na, e para, a vida nas escolas. Os sujeitos puderam vivenciar contextos e experiências sob suportes diversos, incluindo as TIC, numa abordagem caleidoscó-pica ao conhecimento “em situação”.

INTRODUZIR A MUDANÇA NA EDUCAÇÃO EM PAÍSES PARCEIROS

Na sociedade em mudança, o sistema edu-cativo encontra-se na urgência de se adaptar e ajustar à nova realidade. Esta circunstância apresenta implicações para as políticas educati-vas e estruturas educacionais, bem como para a organização e desenvolvimento profissional dos professores.

A profissionalização carece de ser encarada, por isso, como uma oferta de um vasto espectro de iniciativas, conduzindo a uma melhor compre-ensão dos processos de ensino e aprendizagem e a uma melhoria da praxis na sala de aula.

Não deveria consubstanciar-se e limitar-se à formação contínua, ou à profissionalização em serviço, mas cumprir-se, também, através do feedback, do ensino em equipa, da avaliação que seja apreciativa e formativa interpares, de processos de tutoria, coaching, da leitura e discussão de publicações científicas e educacio-nais, de discussões em grupo, ou da construção partilhada na planificação de um projeto edu-cativo.

Na Europa a maioria dos sistemas educativos confrontam-se com a evolução e crescimento de novas realidades que representam desafios, designadamente:

• a digitalização do conhecimento;

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• a digitalização e globalização da comunica-ção;

• a diversidade nas salas de aula (de lín-guas, religiões, valores, género, etnicidade, orientação sexual, atitudes..);

• as lacunas entre o sistema socioeconómico e a pobreza;

• as exigências do ensino superior, da indús-tria, do mercado de trabalho;

• ou a introdução de competências contex-tualizadas na sociedade do conhecimento e tecnologia.

Tentando enfrentar estes desafios cada país eu-ropeu tem vindo a definir as suas estratégias de abordagem. Estas, contudo, alicerçam-se maio-ritariamente na tradição e legislação existen-tes.

E é neste âmbito que a internacionalização da escola pode ser um poderoso meio de profissio-nalização e desenvolvimento dos professores. Ao proporcionar a docentes o distanciamento do contexto que lhes é familiar, estes podem redimensionar a sua condição e distanciar-se da zona de conforto. As experiências que se en-quadram neste objetivo podem ocorrer através da frequência de cursos internacionais, estabe-lecendo parcerias em projetos internacionais, organizando visitas de estudo ao estrangeiro ou aderindo a estágios internacionais de observa-ção de práticas profissionais de outros profes-sores (job shadowing e internship). Tratam-se, portanto, de iniciativas que poderão conduzir os profissionais num caminho de descoberta que os ajude a operar e interagir fora do campo de ação familiar, realizando avanços, melho-rando o seu desempenho, no trabalho ou vida pessoal.

Vejamos as vantagens que estas ações podem representar, ao introduzirem a mudança na educação dos países parceiros que estabelecem

contacto internacional:

• Alargar a mente e visão sobre outras abor-dagens ou soluções para a própria prática;

• Partilhar novas ideias e metodologias;

• Contextualizar a própria situação num vas-to meio educativo obtendo melhor com-preensão para a mesma;

• Estabelecer contactos com grupos de pa-res e colegas, os quais podem, mais tarde, tornar-se recursos acessíveis e fornecer contributo para o desenvolvimento profis-sional e da escola;

• Adquirir melhor conhecimento de outros sistemas escolares;

• Desenvolver competências em línguas es-trangeiras;

• Melhorar o uso das TIC, não exclusiva-mente como meio de comunicação, mas, essencialmente, como instrumento com aplicação ao ensino.

PONTES COLABORATIVAS ENTRE O CENTRO DE FORMAÇÃO ALMADAFORMA (PORTUGAL) E O EEKHOUTCENTRUM (BÉLGICA)

Concluímos com algumas palavras sobre as ini-ciativas, estabelecidas pelo português CFAE Al-madaforma e o Eekhoutcentrum, um centro de formação na Flandres (Bélgica), especializado

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no apoio a professores, educadores e diretores. Este centro organiza anualmente 876 cursos na-cionais nos domínios da administração escolar, liderança e gestão de sala de aula. Encontra-se, ainda, envolvido na aprendizagem didática e pedagógica dos professores e educadores.

Completam-se, presentemente, cinco anos, ao longo dos quais o Eekhoutcentrum tem vindo a estabelecer ações internacionais e de enérgica interação com o Almadaforma.

Entre estas duas organizações instituíram-se pontes colaborativas com alcance sustentável. O envolvimento de ambas, em projetos diver-sos da União Europeia, no contexto da Aprendi-zagem ao Longo da Vida e Erasmus +, tem tido como principal objetivo responder às solicita-ções formativas das escolas e contribuir para o desenvolvimento e ampliação do conhecimen-to pedagógico dos professores.

A parceria entre os dois centros iniciou-se em 2010, com o projeto “Teach, Learn and Quality”, tendo culminado numa conferência final, ocor-rida na Costa da Caparica, com a participação de 125 profissionais oriundos em dezasseis países. O objetivo primordial deste projeto centrou-se na proposta de um método para introduzir um sistema de qualidade na escola. www.tlqpro-ject.eu/por/index_por.html

Desde então o Eekhoutcentrum e o Almadafor-ma prolongaram a sua parceria através do curso Erasmus+ “Teach, Learn and Quality”, o qual vol-tará a ocorrer, em Maio de 2016, na sua quinta edição. O curso foi, entretanto, acreditado pelo Conselho Científico e Pedagógico de Formação Contínua, passando a constituir-se como uma oferta formativa de maior interesse para os pro-fessores associados ao Almadaforma.

Recentemente, estes dois centros uniram-se a outros parceiros europeus para constituir o projeto “Keycoach”, visando melhorar a quali-

dade e inovação do ensino profissional através da formação de tutores e professores do ensino profissional em técnicas e implementação regu-lar de programas de coaching. www.keycoach-project.eu/pt

Neste momento, encontram-se numa fase pre-parativa os mais recentes cursos internacionais que serão organizados conjuntamente em terri-tório europeu e português. www.erasmusplus-ist.eu

É já possível salientar os melhores benefícios desta cooperação. Assentam no suporte mútuo e no intercâmbio de ideias e metodologias de profissionalização do corpo educativo.

Aos festejarmos os primeiros cinco anos da parceria e colaboração portuguesa e belga re-conhecemos como é cada vez mais importante que estes organismos educativos e de formação se relacionem, compartilhando recursos, expe-riências, conhecimentos, e tecnologias. Neste sentido, as parcerias são uma opção estratégica de elevado potencial, viabilizando a comple-mentaridade de serviços, numa perspectiva de obtenção de resultados comuns. Com efeito, acreditamos que será através de uma relação de confiança entre parceiros transcontinentais e europeus, numa perspectiva de “ganho-ga-nhas” (“win-win”), que se poderão desenvolver projetos de sucesso e evoluir em direcção à me-lhoria da escola e do seu corpo docente.

Referências:

ALARCÃO, I. (org.). (2001). Escola Reflexiva e Supervisão. Porto: Porto Editora.

Este artigo foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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REFLEXÃO

Ser Professor… Criativoa escrita como salvação

Dulce de Souza Gonçalves Escritora

Formadora de Escrita Criativahttp://dulcesg.wix.com/dulcesg#!/cy2g

Quando pensamos em “criatividade”, somos tentados a interrogar o seu papel no contexto escolar: para que serve? Qual a sua importân-cia? Pode ou deve ser ensinada / estimulada? Porquê? Para quê?

Apesar da rápida evolução tecnológica, da aprofundada investigação científica na área pe-dagógica, continuamos a trabalhar nas escolas segundo padrões do início do século XX. O po-tencial criativo de cada indivíduo é subjugado pela preocupação com aquisições teóricas ain-da desfasadas do mundo real e com a necessi-dade permanente de avaliar a aquisição desses conhecimentos.

Contudo, na presente sociedade de conheci-mento, urge cultivar um conjunto de capaci-dades que assegure futuros cidadãos aptos a buscar de forma autónoma soluções. A apren-dizagem cognitiva profunda, a criatividade, ou o trabalho em rede e em equipa, entre outras, são competências que têm implicações reco-nhecidas na própria economia de um país.

Precisamente por se tratar de uma competência “inata” no ser humano, é essencial potenciá-la ao invés de a inibir, como parece ser tradição no pensamento pedagógico mais clássico.

A escola é, ou deveria ser, mais do que qualquer lugar, o espaço perfeito para assegurar o seu desenvolvimento.

Contudo, apesar de a criatividade ser atual-mente reconhecida como um requisito urgente, transdisciplinar e transcultural para a gestão do nosso século (Adams, 2006; Kaufman & Stern-Adams, 2006; Kaufman & Stern-

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berg, 2006; Starko, 2010), não deixa de ser curioso que os próprios professores revelem uma conceção distorcida sobre a criatividade (Azevedo, 2007; Morais & Azevedo, 2011).

Urge, portanto, mudar, em primeiro lugar este tipo de mentalidade, o qual tem impacto na forma como se vive a criatividade no espaço escolar.

Por outro lado, esta mudança só pode ocorrer se o próprio docente descobrir a sua própria capacidade criativa. Não esqueçamos que se tornou comum na sociedade a auto-inibição do pensamento criativo, fruto do crescimento e da preocupação com o pensamento alheio e resultado das próprias imposições da escola, que pouco ou nenhum espaço dá a esse tipo de exercício mental.

Desta forma, no contexto do Programa Ibero-Americano de mobilidade docente, convidá-mos vários professores oriundos de realidades distintas, a partilharem a única linguagem ver-dadeiramente universal – a linguagem da cria-tividade!

Tendo como ponto de partida a autodefinição

de cada formando (“Aqui, diante de mim, eu [professor], me confesso”), e um trabalho de caráter cooperativo, partiu-se para a descober-ta da escrita como fórmula para desenvolver o potencial criativo de cada indivíduo.

Ao mesmo tempo, procurou-se assegurar a auto-disciplina e o domínio do processo de es-crita, implicando a organização do pensamen-to, a sua clareza e concisão, a par do domínio acrescido da competência gramatical, essencial à produção de um discurso percetível pelos ou-tros e coerente.

Procurou-se, igualmente, abrir as portas à esco-la do futuro, utilizando o apoio tecnológico para a edição e partilha virtual de histórias. Com re-curso à plataforma Storybird, rapidamente se voou, da sala de aula para o mundo, estabe-lecendo pontes e ancorando a escrita criativa num espaço simultaneamente físico e virtual.

Afinal, a poesia acontece onde e menos se es-pera… E é, sem dúvida, desta maravilhosa se-mente que nasce a criatividade e a motivação.

Pelo menos, foi exatamente isso que os nossos formandos puderam confirmar…

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REFLEXÃO

Bibliotecas Escolares e Bibliotecas de Sala de AulaPortugal em mobilidade no Chile

Natália Carias Professora Bibliotecária

Agrupamento de Escolas Monte da Lua - Sintra

Na sociedade atual, a informação tem uma im-portância crescente e as bibliotecas assumem neste contexto de globalização, um relevante papel de disseminação e de construção do co-nhecimento.

Em Portugal, as Bibliotecas Escolares funcio-nam como centros de recursos educativos, in-tegrados no processo de ensino-aprendizagem e têm como objetivo principal desenvolver e fomentar a leitura e a informação ao nível da escola, disponibilizando um conjunto de recur-sos e equipamentos que permitem o enrique-cimento e melhoria de todo o trabalho escolar, oferecendo aos alunos, de diferentes níveis etá-rios e diversos níveis de ensino, instrumentos essenciais para o desenvolvimento curricular, assim como para a ocupação lúdica e cultural dos tempos livres.

Estas bibliotecas desempenham uma função indispensável no contexto das atividades es-pecíficas das várias disciplinas, assim como ao nível de projetos de natureza interdisciplinar ou transdisciplinar, e também na ocupação dos tempos livres, contribuindo de forma decisiva e cada vez mais reconhecida para o sucesso das medidas pedagógicas implementadas pelas es-colas.

A RBE, Rede de Bibliotecas Escolares, criada em Portugal, em 1996, tem fomentado a ins-talação e desenvolvimento de bibliotecas nas escolas públicas de todos os níveis de ensino, com o objetivo de as potenciar como espaços

agregadores de conhecimentos, disponibilizan-do diversos recursos que servem de suporte às aprendizagens e que conduzem à mudança das práticas educativas, em articulação com outras instituições nacionais e internacionais.

A criação e a difusão de inúmeros documentos informativos e orientadores têm sido funda-mentais na construção de uma dinâmica que tem passado pela estruturação de redes conce-lhias, pela formação de professores, pela dispo-nibilização de catálogos, pela promoção de pro-jetos de inovação e de excelência em diferentes áreas e pela implementação de um modelo de avaliação das bibliotecas.

Neste contexto de inovação, de globalização e de partilha, surge a proposta de mobilidade de docentes, da OEI, Organização de Estados Ibero Americanos.

Abril foi o mês da mobilidade dos docentes portugueses, no Chile. A partilha de diferentes realidades baseadas nas “Bibliotecas escolares e de sala de aula” e no seu papel relevante no contexto do processo de ensino aprendizagem foi uma constante, no Chile.

Portugal, através do Agrupamento de Escolas Monte da Lua, deu a conhecer, em Santiago, a primeira biblioteca escolar portuguesa a abra-çar também a missão de ser biblioteca públi-ca: a Biblioteca da Escola Secundária de Santa Maria, em Sintra. No grupo de trabalho em que participou, estavam presentes representantes do México, República Dominicana, Brasil- Porto Alegre e Brasil- São Paulo.

O Chile, país anfitrião, revelou na visita a sete bibliotecas (seis escolares e uma pública), uma grande diversidade baseada na gestão de cada

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escola. Existem escolas particulares, coopera-tivas, estatais, laicas, religiosas… Contudo, em todas estava patente a importância que reco-nhecem às bibliotecas.

Foram visitadas as seguintes bibliotecas:

Liceo Juana Ross de Edwards;•

Escuela Particular San José de Lampa;•

Centro Educacional Huechuraba;•

Colegio Polivalente San Luís Beltran (Pu-• dahuel);

Colegio Nuevo Diego de Almagre;•

Instituto Nacional General José Miguel Car-• rera;

Biblioteca de Santiago•

A primeira escola situa-se em Valparaíso e as restantes em Santiago. Apesar do tema englo-bar as bibliotecas de sala de aula, não tivemos contacto com essa realidade.

Desta semana de trabalho resultou a constitui-ção de uma rede de trabalho com duas verten-tes:

formação de professores utilizadores das • bibliotecas;

formação de professores das equipas das • bibliotecas.

De modo geral, apesar de, naturalmente existi-rem algumas diferenças de índole organizacio-nal, verificou-se que como universo pluridisci-plinar, a biblioteca escolar ganha dimensão e valor através do papel que desempenha. Faz parte do processo educativo da escola, sendo os seus recursos disponibilizados a toda a co-munidade educativa. Trata-se de um serviço pe-dagógico que colabora ativamente no processo de ensino-aprendizagem, facultando informa-ção e apoiando a construção do conhecimento, o que contribui para a formação do aluno. Esta realidade evidenciou-se em todas as experiên-cias reportadas quer pelo país que nos acolheu, quer pelos outros participantes.

Este programa de mobilidade permitiu pois, uma partilha de experiências assentes no pres-suposto de que a Biblioteca Escolar é um espaço integrador e facilitador do processo de ensino-aprendizagem uma vez que fornece o apoio ne-cessário à boa execução da função educativa da escola, levando à formação de cidadãos infor-mados, críticos, autónomos e interventivos na sociedade. Ficou bem patente que a exploração das potencialidades das bibliotecas incrementa a obtenção de melhores resultados escolares e fomenta o gosto pela aprendizagem e não ape-nas o gosto pela leitura.

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REFLEXÃO

Aprendiendo en Lisboa

Verónica Rodriguez Colin México

Ha sido para mí un honor haber participado como representante de México en la Red Ibero-americana de Movilidad del Profesorado: Lide-razgo y organización escolar, auspiciada por la Organización de Estados Iberoamericanos (OEI) y los Ministerios y Secretarías de Educación de los gobiernos de los países participantes, como parte del Programa de redes de movilidad del profesorado, cuyo propósito era conformar un espacio de intercambio y colaboración entre profesionales de la educación que fortalezcan los procesos de mejora educativa que se llevan a cabo en cada uno de nuestros países.

La sede para esta Red fue Lisboa, Portugal; asistimos 8 representantes de Brasil, Chile, y México; durante la semana del 20 al 24 de abril del presente año. Así que tuve la oportunidad de conocer a Bruno Lima Becheli, Alessandra Patricia Pires, Antónia D`Alva, Juliana Santos, Berta Ester Castro Watson, Ruperto Rodrigo Pi-zarro Leyton, y Araceli Rivera Jurado; además de las autoridades y directivos de Lisboa: Eulalia Alexandre, Janine Costa, Aida Castilho, Helder Jorge Ferreira, Manuela Dâmaso, Adelaide Sil-va, Sara Moura, entre otras muchas personali-dades relacionadas con esta Red de Movilidad y el quehacer educativo.

Al arribar a Lisboa, nos esperaba en el aero-puerto la maestra María Paula Neves para tras-ladarnos al Centro Caparide del Ministerio de Educación y Ciencia, donde nos hospedamos, un lugar hermoso a las orillas de la ciudad, don-de se respiraba tranquilidad, aire puro, además

de la belleza que le daban la flora de la región y los maravillosos árboles frutales. La estancia ahí fue muy placentera, contamos con excelen-te comida, instalaciones de primera, además de las finas atenciones del personal que labora ahí.

El primer día de trabajo, las autoridades del Ministerio de Educación y la representante de la Organización de Estados Iberoamericanos Belén de la Torre, nos dieron la bienvenida y nos presentaron: el Programa de Movilidad del Profesorado, el Sistema Educativo de Portugal y el de Liderazgo y Organización escolar, en las instalaciones de la Dirección General de Edu-cación, Ciencia y Cultura. Ahí conocí además, a autoridades y directivos de diversos agru-pamientos escolares de Lisboa, (en México su equivalente serían las zonas escolares). Por la tarde realizamos la presentación de cada uno de los participantes, haciendo referencia al país, sistema educativo e institución que re-presentamos.

Fue una semana muy intensa, de aprendizajes e intercambio de experiencias sobre temas como: gestión escolar, liderazgo, organización, planeación, evaluación, trabajo colaborativo, etc.; reflexiones con relación a la importancia

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del apoyo de los padres de familia en la labor educativa, y al quehacer que realizamos cada uno de los participantes en esta Red de Movi-lidad en nuestros respectivos centros de traba-jo. Fueron días cargados de emociones, ya que tuve la oportunidad de conversar con las direc-toras de Lisboa que nos abrieron las puertas de sus escuelas, las maestras coordinadoras y las profesoras de grupo, que en todo momento compartieron sus saberes y experiencias, ade-más de platicar con los alumnos de los diversos niveles educativos, sobre todo de preescolar y primaria, llegando a mi mente recuerdos y nos-talgia de mis años de maestra de primaria, la satisfacción de mi quehacer como maestra de secundaria y la responsabilidad de dirigir la ma-ravillosa escuela que es la Secundaria Anexa, sentimientos que inundaron mi corazón y mi pensamiento, pero que fortalecieron mi amor y fascinación por esta maravillosa profesión de ser maestra, por ello estoy sumamente agrade-cida con las personas que me brindaron la opor-tunidad de vivir esta maravillosa experiencia.

Las representantes de México visitamos dos días el Agrupamiento Escolar Daniel Sampaio que se encuentra en la península Setúbal, en el Consejo de Almada, y que está a cargo de la excelente Maestra Sara Moura, quien con la amabilidad que le caracteriza, el primer día, nos presentó los elementos esenciales de su organi-zación y gestión escolar, ante la presencia de su equipo de subdirectores, asesores y docentes, representantes del Ayuntamiento, de los pa-dres de familia y de los alumnos, entre ellos, una chica peruana que fungió como traductora ya que hablaba perfecto el español y así logra-mos entendernos un poco más.

Fue muy interesante escuchar e inevitable-mente ir comparando con lo que hacemos en México, y en particular en la escuela donde tra-bajo, la Secundaria Anexa a la Normal Superior de México (ESANS), encontrando coincidencias

en nuestro quehacer educativo, como: trabajar para lograr una autonomía escolar, la construc-ción de identidad y el sentido de pertenencia (no sólo entre los alumnos, sino en toda la co-munidad educativa), mejorar los resultados es-colares, combatir el abandono escolar, apostar a la formación de docentes, impulsar los apo-yos y tutorías, fortalecer el trabajo colaborati-vo, el trabajo colegiado, la formación en valores y la disciplina escolar, así como fomentar la au-toevaluación, entre otros.

Contar con coordinadores de departamento en los agrupamientos escolares de Lisboa, sería el equivalente a los coordinadores de colegio en la secundaria donde trabajo en México, ellos colaboran en la realización del diagnóstico ins-titucional, identificando las fortalezas y áreas de mejora para que a través del trabajo colegia-do, la innovación y la gestión escolar, se logre la mejora de los resultados educativos. Estos elementos conforman su Programa de Acción a Nivel Interno.

La participación de los padres de familia, de la comunidad, la vinculación con instituciones como universidades, muestras educativas, visi-tas a museos, conferencias, concursos, olimpia-das académicas, torneos deportivos, actividades artísticas, proyectos e intercambios culturales; actividades que en la Secundaria Anexa tam-bién se realizan, conforman su Programa de Acción a nivel Externo. En México estos pro-

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gramas de acción quedan integrados en la Ruta de Mejora o Proyecto Escolar que realiza cada escuela para lograr la mejora educativa. Todo ello me lleva a concluir que lo que estamos ha-ciendo en la ESANS, su organización, su modelo de trabajo, se debe seguir fortaleciendo porque eso permite ubicarla como la mejor secundaria pública del Distrito Federal y se encuentra al ni-vel de las mejores escuelas de Lisboa.

Después visitamos y recorrimos las escuelas: Daniel Sampaio (escuela sede), la escuela Pre-sidente María Emilia, en la cual, en esos mo-mentos se realizaba un concurrido torneo inter-escolar de ajedrez, fue realmente asombroso ver la cantidad de alumnos de todas las edades participando en este magno evento.

Más tarde conocimos las escuelas Marco Caba-zo del primer ciclo y de nivel preescolar. En esta escuela los alumnos de preescolar nos regala-ron un Cristo Rey que es representativo de esa parte de la península trabajado con sus huellas digitales a color.

Al siguiente día continuamos con las visitas y re-corridos a las escuelas, visitamos: Vale Figueira de primer ciclo, Vale Rosal de preescolar y Vale Rosal de básica. Algo que me impresionó es que para los alumnos de capacidades diferentes, se cuenta con apoyo especializado y se reali-zan actividades personalizadas para apoyarlos realmente, ya que cada uno requiere atención específica de acuerdo a su situación. Algo que me gustó muchísimo es que en todas las escue-las que visitamos, los alumnos sabían de qué país veníamos y tenían recuerdos elaborados por ellos mismos, como separadores de libros, flores, cuadros, etc.; detalles muy gratos y ha-lagadores.

Regresamos a la escuela Daniel Sampaio y des-pués de la comida, el maestro Carlos Sant’Ovaia, Coordinador del equipo de Evaluación en el Agrupamiento, nos explicó su sistema de eva-

luación, la cual tienen libertad de realizar y ajus-tar de acuerdo a las necesidades.

El día jueves visitamos la escuela Virgilio Fe-rreira que se encuentra en el centro de Lisboa y tiene una infraestructura impresionante, allí los docentes visitantes realizamos las presentacio-nes de los sistemas educativos de nuestros paí-ses y/o de nuestras escuelas; además tuvimos la oportunidad de disfrutar de un concierto en el cual los alumnos tocaron el violín, el piano y cantaron. Después los alumnos de artes del ni-vel secundario nos obsequiaron un cuadro que ellos habían trabajado.

Este día, pude conocer los diversos Sistemas Educativos de Brasil, Chile y Portugal, analizar e identificar sus semejanzas y diferencias con el Sistema Educativo Mexicano. Fue muy significa-tivo para mí al estar realizando la presentación del modelo educativo de la ESANS, escuchar como las maestras de Lisboa comentaban que ellas también trabajaban las certificaciones en las lenguas extranjeras, generaban activi-dades de apoyo a los alumnos y/o con padres de familia fuera de su turno, además quedaron asombradas por la cantidad de actividades co-curriculares y extracurriculares que se ofrecen a los alumnos y por el tiempo que pasan en la escuela. Pensaban que esas características eran propias de las escuelas particulares.

Pude apreciar que en Portugal y Chile los di-rectores escolares dirigen varios niveles edu-cativos, preescolar, primaria y secundaria, los que en México integran la educación básica, en estos países ya se trabaja de manera conjunta, articulada aunque algunos centros escolares ocupen diferentes inmuebles, cuando en nues-tro país se habla de la articulación de los con-tenidos curriculares, aún existe la organización separa por niveles educativos, si bien el objetivo es lograr una articulación completa y funcional, falta avanzar mucho en este aspecto.

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Compartimos diferentes problemáticas que se presentan en las escuelas y comunidades, las formas de enfrentarlas para buscar soluciones donde todos ganen; así como, la importancia de una verdadera autonomía de gestión.

El último día tuvimos una reunión de las auto-ridades educativas con todos los participantes en el Centro de Convenciones del Complejo Caparide, para realizar la evaluación de las acti-vidades y todos coincidimos que los resultados obtenidos fueron óptimos, que se trabajó to-talmente la agenda especificada y que se había logrado el objetivo, ya que con las actividades programadas conseguimos intercambiar expe-riencias, impulsar el aprendizaje entre pares, fortalecer la comunicación e identificar los ele-mentos que pudiéramos mejorar en el queha-cer diario en nuestras escuelas, comunidades y países. Además nombramos como Coordinador del grupo al Maestro Ruperto Rodrigo Pizarro Leyton de Chile.

También asumimos compromisos por países: la Coordinación de la Red, Chile; el Desarrollo profesional, Lisboa; la Gestión y Liderazgo Pe-dagógico, Brasil y la Innovación, México; inte-grando así la red de directivos. Los integrantes de esta Red de Movilidad son docentes de voca-ción y grandes seres humanos que comparten sus saberes con humildad y deseos siempre de superación, estoy segura que cumpliremos con nuestra responsabilidad para dar seguimiento a esta red de directivos.

Además de lograr los objetivos de la Red Ibe-roamericana de Movilidad del Profesorado: Liderazgo y Organización Escolar, tuvimos la oportunidad de conocer diversos lugares repre-sentativos y turísticos de Portugal como: la her-mosa y majestuosa Catedral de Nuestra Señora de Fátima, ya en Lisboa: el Monasterio de los Je-rónimos, su Claustro y su Iglesia, el Monumento de los Descubrimientos y la Torre de Belém, jo-

yas turísticas de la ciudad. También recorrimos El Puente 25 de Abril, primer puente de Lisboa, tiene el record de ser el puente colgante más largo de Europa y consta de dos niveles, en el superior permite el tránsito de automóviles y en el inferior circula el ferrocarril, el Convento dos Capuchos en la costa de Caparica, desde don-de se aprecia una inigualable vista de Lisboa, el grandioso Santuario Nacional de Cristo Rey, el cual es una copia del Cristo Redentor de Rio de Janeiro, y que permite admirar el Puente 25 de Abril y una maravillosa vista de la ciudad de Lisboa. Hicimos un recorrido por el centro de la ciudad, conocimos el Mirador de San Pedro de Alcántara y apreciamos unas vistas estupendas de Lisboa, la iglesia de San Roque que por fuera muestra una sencilla fachada pero en su inte-rior resplandece un verdadero tesoro

artístico; además tuvimos el placer de disfrutar una tarde cultural en la Casa de Mariquinhas, lugar típico de Lisboa donde nos deleitamos con su comida y música típica: bacalao y el fado, concluimos este recorrido en la Ciudad de Sin-tra, aunque no pudimos recorrer todos los luga-res que hubiésemos querido, sirvió para moti-varnos a regresar.

Terminé mi visita a Lisboa con gran satisfacción, gusto y agradecimiento para todos y cada uno de los hicieron posible esta maravillosa expe-riencia y regresé a la Ciudad de México cargada de emociones, ideas y deseos de superar los re-sultados obtenidos hasta entonces.

¡Gracias a todos! ¡Hasta pronto!

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REFLEXÃO

Articulação Entre Literatura e Matemática Desenvolvimento profissional docente (de professores e educadores)

Maria Paula Rodrigues Unidade de Investigação do Instituto de Educação

Universidade de [email protected]

Como professora-investigadora no 1.º ciclo do ensino básico e formadora de professores e educadores de infância na área da Matemática, tenho vindo a contactar com o efeito surpresa quando é discutida a ideia de articular literatu-ra e matemática, dado, tradicionalmente, estas duas áreas surgirem como distintas e sem liga-ção aparente.

Este artigo pretende promover uma nova pers-petiva sobre a articulação entre literatura e ma-temática e dar conhecimento do envolvimento e desenvolvimento profissional de professores e educadores de infância que têm frequentado cursos de formação contínua nesta área e que, a partir da utilização de histórias com matemá-tica nas suas salas, passaram a utilizar e a criar

tarefas matemáticas “poderosas”, produzidas a partir de modelos matemáticos presentes em narrativas ou ilustrações de contos para crianças. Estes alteraram o seu olhar perante o conteúdo ou ilustração de um conto infantil e desenvolveram práticas mais motivantes e envolventes que levam as crianças a elaborar raciocínios matematicamente influentes e es-tratégias individuais de resolução que promo-vem a partilha e a discussão coletiva, gerando aprendizagens significativas e duradouras.

A Literatura para Crianças: criatividade e aprendizagem

A estrutura e os conteúdos da literatura que as crianças têm vindo a consumir ao longo dos tempos, tem variado de acordo com o papel que a criança assume socialmente, nas diferen-tes épocas.

Até ao século XVII, a criança participava na vida adulta como se de um adulto se tratasse e não havia a preocupação de identificar um tipo de li-teratura específica para ela. As crianças liam ou ouviam ler o mesmo que os adultos e fizeram a eleição de um conjunto de obras que, sem terem destinatário definido, acabaram por ser “anexadas” à literatura infantil.

Esta literatura «anexada» é uma literatura cen-trada no maravilhoso e inesperado dos contos fantásticos de origem tradicional e tem uma du-pla função: a de divertir socialmente mas tam-bém a de educar para os valores. São exemplos alguns autos de teatro de Gil Vicente (sec. XVI); os relatos de viagens; os romances de cavala-ria; os catecismos; os exemplários e as fábulas de Chaucer (sec. XIV), Jean de La Fontaine (sec. XVII) e Lessing, já no século XVIII.

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Ao longo dos séculos XVIII e XIX nasceu e cres-ceu uma nova conceção do conceito de crian-ça, que deu origem a uma literatura centrada nesta e nas suas necessidades, e a literatura para crianças passou a ser facilmente identifi-cada. Durante este período, houve uma grande preocupação com a educação das crianças e a literatura infantil passou a ter um caráter pre-dominantemente pedagógico e educativo. Des-ta fase, fundamentalmente, instrutiva da litera-tura para crianças, destacamos duas das obras que foram consideradas modelos educativos, as fábulas de Esopo e O Romance da Raposa.

Contudo e, como que um alimento para o espí-rito infantil, está também presente na literatu-ra para crianças do século XVIII, a literatura do maravilhoso onde se destacam os contos de fa-das, cuja ação decorre em mundos imaginários, povoados por personagens totalmente imagi-nárias, onde os animais falam. Destes, salienta-mos os Contes de Ma Mère l’Oie, de Perrault, que contém histórias como «Gata Borralheira»,

«A Bela Adormecida», «O Chapelinho Verme-lho», «O Gato das Botas», «Barba Azul» e «Po-legarzinho», histórias, até hoje, lidas e ouvidas com prazer por crianças em idade escolar.

O século XIX, para além dos aspetos didáticos já referidos, trouxe um reencontro com os contos tradicionais, dos Grimm, Kinder-und Hausmär-chen (1812) e Andersen, Eventyr, fortalte for Born (1835), e numa outra perspetiva, surgiram as primeiras histórias de interesse pela justiça e por problemas políticos e raciais. Estas consti-tuíram uma viragem na literatura para crianças e foram assinadas por escritores como Charles Dickens, Edmundo d’ Amicis, com Cuore, e Har-riet Beecher Stowe, com Uncle Tom’s Cabin.

O século XX trouxe uma nova estrutura à lite-ratura para crianças e o livro infantil desliga-se de forma definitiva da literatura para adultos. Nesta fase, ao contrário do já referido, são os adultos que procuram na literatura infantil o prazer e divertimento, em obras como Alice no País das Maravilhas ou nos álbuns de Tintin e Astérix.

Kátia C. S. Smole; Glauce H. R. Rocha; Patrícia T. Cândido e Renata Stancanelli (1995) consideram os contos de literatura tradicional de Perrault, «O Chapelinho Vermelho» e «Polergarzinho», com potencial para desenvolver trabalho ma-temático. Ainda dentro da literatura tradicional para crianças, também Alice no País das Mara-vilhas, de Lewis Carroll, é considerado uma boa história com matemática.

Aproveitando o realismo social de algumas obras surgidas no século XIX, este século apre-senta uma literatura infantil que deixou de lado as preocupações didáticas e instrutivas, dos dois séculos anteriores, e trouxe uma nova perspeti-va dentro do fantástico e maravilhoso.

Esta nova literatura interliga realidade e fanta-sia e apresenta mundos paralelos e fantásticos,

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sem recorrer a fadas e a duendes. As suas ações e personagens enquadram-se de forma perfei-ta na vida quotidiana dos mais novos, gerando identificação e cumplicidade, e, em paralelo, permitem a evasão para mundos onde estes podem realizar a verdadeira condição de ser criança, construindo mundos encantatórios e ilusórios.

A literatura, com ou sem destinatário definido, que as crianças, ao longo dos séculos, têm vindo a consumir tem sempre uma vertente dupla: a formativa, ligada à aprendizagem e preservação de valores, e a do entretenimento, que diverte e preenche o lado criativo de cada ser humano. Uma literatura ao serviço do ser social e indivi-dual que vive em cada criança.

Literatura e matemática

Ao oferecerem desafios de natureza cognitiva e ao traduzirem sentidos que transcendem o significado de suas palavras, os textos literários valorizam a inteligência da criança, sua capaci-dade interpretativa e lhe possibilitam resolver problemas cuja natureza abstrata ela é incapaz

de alcançar, a não ser pela adesão ao universo simbólico. Consequentemente, instalam a moti-vação interna da criança para a leitura, visto que ela deseja ler porque a linguagem de narrativas e de poemas a mobiliza para a compreensão do mundo e para a autonomia daí decorrentes. (Sa-raiva, 2001, p. 19).

As histórias desempenham um importante pa-pel na formação da criança, ao funcionarem como elementos apaziguadores de situações de conflito interior, necessários à construção de modelos de ação, mas também podem integrar outras funções de aprendizagem multidiscipli-nar, desde que a mensagem e o papel principal das histórias não sejam distorcidos através da colocação de uma ênfase indevida num dado aspeto matemático. Apoiando esta ideia, Sha-piro, Anderson e Anderson (2004), referem que este emergente interesse na utilização de livros de histórias na matemática dos primeiros anos pode ser precipitado, dado estes constituírem, classicamente, na maioria das escolas, uma ferramenta utilizada única e exclusivamente para o desenvolvimento da linguagem e leitu-ra. Todavia, a leitura e utilização de histórias na aula de matemática tem merecido, nas últimas décadas, a atenção de muito educadores ma-temáticos. Por exemplo, o National Council of Teachers of Mathematics (NCTM) refere que “ … a utilização de livros de histórias constitui um óptimo veículo para comunicar ideias matemá-ticas” (2004, p. 5).

Para Loureiro (2006), a ideia de ligar a literatu-ra com a matemática não é original e não vai esgotar-se nunca, pois enquanto houver livros de histórias, existirão contextos favoráveis que permitem explorar e trabalhar ideias matemáti-cas de forma mais contextualizada e envolven-te.

Sobre esta temática existem diversos artigos publicados em diferentes línguas e, embora o alvo preferencial sejam os livros de literatura

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para crianças, há muitos outros que mostram o trabalho desenvolvido em torno de tarefas ma-temáticas nascidas a partir de modelos mate-máticos presentes em narrativas para níveis de ensino mais avançados.

Há atualmente alguns artigos muito interes-santes, de autores de diferentes países, sobre a relação da matemática com a literatura. São exemplos os artigos “Literatura e matemáticas” (2009), de José Muñoz Santonja; “Cuentos ma-temáticos” (2009), de Joaquín Collantes e Anto-nio Pérez; “Matemática y literaturas, un binó-mio perfecto” (2009), de Margarita Marín; “Era uma vez na Matemática: uma conexão com a literatura infantil” (1995), de Kátia Smole et al. (1995); “You read me a story, I will read you a pattern” (2005), de Charyl Pace, entre outros.

Perante as histórias, as crianças aprendem ma-temática com motivação e dedicação, no entan-to, um livro que fale de quadrados e triângulos não pode, apenas por esse motivo, ser conside-rado um bom recurso para trabalhar a geome-tria, tal como os livros que falam de números ou os apresentam nas suas ilustrações não podem, só por isso, constituir um bom material para propor tarefas de cálculo aos alunos. De acordo com Loureiro, Marques, Morais Oliveira e Ro-drigues (2006), uma boa história para trabalhar matemática deve enquadrar na sua narrativa, ilustração, ou ambas, um modelo matemático forte e apelativo. Este poderá aparecer sob a forma de questão, de uma situação que mo-tive a investigação matemática, ou através de uma imagem que tenha subjacente um tópico matemático definido. Perante esta ideia chave, Loureiro (2006), no artigo Os livros de histórias e a matemática – Era uma vez…, afirma que “O conhecimento que vou tendo dos livros e as experiências de utilização já realizadas levam-me a considerar que há livros privilegiados para levar as crianças a realizar boas actividades matemáticas sendo, por esse motivo, necessá-

ria uma selecção bastante criteriosa. Contudo, não basta um bom livro de histórias com ma-temática para garantir o sucesso no processo de ensino-aprendizagem dos nossos alunos. É também importante salientar aqui o papel do professor, como orientador do conhecimento matemático, pois uma boa tarefa matemática, produzida a partir de um modelo matemático presente num destes bons livros, só será uma boa tarefa se for bem explorada e bem condu-zida” (p. 2).

Kátia Smole et al. (1995) consideram que a in-tegração da literatura nas aulas de matemática representa uma substancial mudança no ensino tradicional da matemática porque estabelecer esta conexão implica: a) relacionar as ideias matemáticas com a realidade; b) relacionar as ideias matemáticas com outras disciplinas; c) relacionar tópicos, representações e conceitos matemáticos; d) explorar problemas e descre-ver resultados, relacionando diversos modelos matemáticos ou não (pp. 2 e 3).

Tendo em conta alguns trabalhos já realizados com alunos portugueses, é possível afirmar que, a partir da apresentação de tarefas base-adas em modelos matemáticos fortes, apresen-tados no texto ou na ilustração de histórias, se podem desenvolver tarefas e atividades mate-máticas muito ricas e atraentes para os alunos. A sua riqueza pode ser justificada pelos podero-sos instrumentos de ação que proporcionaram ao professor e que fizeram os alunos avançar na estruturação do seu raciocínio matemático.

Segundo Charyl Pace (2005), a utilização da li-teratura na aula de matemática é uma forma simples e muito acessível de pôr em prática um currículo integrado e proporcionar aos alunos aprendizagens significativas e duradouras.

Uma das razões, apresentada por Bay-Williams (2005), é a riqueza dos contextos que a literatu-ra oferece e que os alunos são capazes de usar

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para dar sentido à matemática. Além disso, po-dem tirar prazer da literatura, integrando assim a matemática com a literatura. Esta autora refe-re também o potencial de integração de ideias matemáticas de algumas tarefas matemáticas, baseadas na literatura. Na sua opinião, “a ma-temática é aplicada em situações apropriadas e são vistas relações entre conceitos matemáticos que permitem desenvolver uma compreensão significativa da matemática”. (p.392).

Ron Zambo (2005) aponta várias razões para considerar a integração entre a matemática e as atividades linguísticas (language arts) uma estratégia efetiva de ensino da matemática. Para além das razões de riqueza e acessibilida-de contextual proporcionadas pela literatura, análogas às de Bay-Williams, há razões do foro emocional, evidenciadas pela investigação, que podem ajudar os alunos a reduzir a sua ansie-dade relativamente à matemática. Além disso, há sempre o prazer que pode ser proporciona-do numa atividade de leitura coletiva, onde “os professores podem cultivar o papel privilegiado de contadores de histórias porque os alunos adoram ouvir as histórias que os professores têm para contar”. (Zambo, p. 395).

Segundo Yunes e Ponde (1989), enquanto o ensino alimenta uma proposta distante, desar-ticulada e fragmentada da realidade do aluno, a literatura pode oferecer elementos desta mes-ma realidade como auxílio para compreender a realidade. Perante estas ideias e a minha ex-periência como professora do 1º ciclo, parece possível afirmar que uma articulação entre ma-temática e literatura, nos primeiros anos de es-colaridade, favorece a aprendizagem de noções matemáticas nas quais assentará um conheci-mento matemático consciente e consistente.

Com a introdução de histórias nas aulas de ma-temática, o ambiente de aprendizagem trans-forma-se e os alunos não aprendem primeiro

a matemática para depois a aplicar nas histó-rias, exploram matemática e narrativa ao mes-mo tempo. Através das questões trazidas pela narrativa, os alunos voltam a ela muitas vezes e, de cada vez que o fazem, constroem novo conhecimento. Desta forma, as histórias con-tribuem para que os alunos aprendam e façam matemática, explorem lugares, características e acontecimentos nas mesmas, permitindo que habilidades matemáticas e linguísticas se de-senvolvam em simultâneo. Enquanto os alunos leem, escrevem e conversam sobre as ideias matemáticas que vão aparecendo na narrativa, interagem e criam conhecimento matemático.

Assim, e de acordo com a Equipe Interdiscipli-nar da Prefeitura de Santos, no Brasil, (2004), as histórias na aula de matemática permitem:

a) relacionar as ideias matemáticas com a re-alidade, de forma a deixar clara e explícita a sua participação, presença e utilização nos vários campos da atuação humana, valori-zando, assim, o uso social e cultural da ma-temática;

b) relacionar as ideias matemáticas com as demais disciplinas ou temas de outras dis-ciplinas;

c) reconhecer a relação entre diferentes tópi-cos da matemática, relacionando várias re-presentações de conceitos ou procedimen-tos umas com as outras;

d) explorar problemas e descrever resultados, usando modelos ou representações gráficas, numéricas, físicas e verbais.

Para além de tudo isto, e de acordo com os Prin-ciples and Standards for School Mathematics (NCTM, 2000), a utilização de livros de histórias na aula de matemática representa uma ferra-menta muito útil para lidar com a diversidade, pois perante um contexto cativante que reme-ta para a realidade, os alunos são capazes de modelar mais facilmente e construir, partindo

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dessa modelação, diferentes tipos de conhe-cimento matemático. Estes podem ir do co-nhecimento mais informal para o mais formal, dependendo das vivências e do grau de desen-volvimento cognitivo de cada criança. Perante um livro de histórias as crianças desenvolvem conceitos, resolvem problemas e fazem cone-xões (Griffiths & Clyne, 1991).

Para Charyl Pace (2005), imaginação, tempo e um natural gosto pela leitura são apenas os pré-requisitos necessários para utilizar a literatura nas aulas de matemática.

Saraiva (2001) refere que os textos literários au-mentam a capacidade interpretativa da criança e ajudam-na a resolver problemas abstratos que, sem o contexto, esta seria incapaz de re-solver. Nesta perspetiva, a utilização de histó-rias nas aulas de matemática tem merecido nos últimos tempos, a atenção de muitos autores.

Histórias com matemática e aprendizagem de conceitos matemáticos

No ano letivo 2004/2005, foi iniciado na Escola Superior de Educação de Lisboa um projeto que pretendia articular a literatura com a matemá-tica. Esta ideia surgiu no âmbito do acompa-nhamento dos estágios, a partir da colaboração entre professores de Matemática e Língua Por-tuguesa, pertencentes às equipas multidiscipli-nares de apoio à Prática Pedagógica, no curso de Licenciatura de Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico.

O projeto formalizou-se e foi, ao longo de alguns anos, desenvolvido por um grupo de trabalho constituído por duas professoras de Matemáti-ca da ESE de Lisboa e por três professoras do 1º ciclo, sendo duas delas ex-alunas da ESE.

Assim, de acordo com este grupo de trabalho formado por Cristina Loureiro; Cristina Morais; Maria José Oliveira; Maria Paula Rodrigues e Raquel Marques (2006), quando elegemos um bom livro para criar tarefas matemáticas é pre-ciso saber fazer uma escolha criteriosa e ter em conta os seguintes aspetos: (1) o estudo de modelos matemáticos explorados nos livros de histórias de literatura para crianças; (2) a cons-trução de tarefas matemáticas contextualizadas em livros de histórias; (3) o estudo das ativida-des e as resoluções dos alunos, realizadas a par-tir das histórias.

Tendo em conta os aspetos previamente apre-sentados, este grupo de trabalho pensou poder construir e fundamentar uma perspetiva de utilização matemática dos livros de histórias, partindo de títulos que são familiares aos pro-fessores portugueses e que servem de suporte de investigação e reflexão, baseados na nossa realidade.

Citando Loureiro et al. (2005):

… embora a ideia que está na raiz do nosso pro-jecto não seja original pretendemos desenvolvê-la e dar-lhe novos contributos. Além de que, ao situá-la na realidade portuguesa, poderemos dar uma mais-valia a um recurso didáctico que já é muito familiar aos professores do 1º ciclo e que já existe em muitas salas de aula. Muitos livros de literatura para a infância que estudá-mos são quase universalmente conhecidos, são autênticos best-sellers das salas de aula portu-guesas (p. 3).

Uma das principais tarefas deste grupo de tra-balho consistiu na análise de livros de histórias e sua categorização, a partir dos modelos mate-máticos que apresentavam. Esta categorização

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ajudou a selecionar os livros que foram utili-zados para a criação de tarefas matemáticas. Apresento, em seguida, cada uma das catego-rias criadas e para cada uma, uma ilustração, com exemplos, da interpretação feita e a orien-tação seguida para a criação de tarefas.

Nesta classificação o grupo de trabalho assumiu uma conceção muito ampla de modelo mate-mático. Podendo este ser designado por uma estrutura, um raciocínio ou um conceito ma-temático. O pretendido era identificar a forma como os autores usam, ou não, esses modelos onde é reconhecida uma ideia matemática. Pois, segundo Lipsey e Pasternack (2002), os au-tores utilizam a matemática nas histórias tendo em conta diferentes perspetivas: tornar clara

uma teoria; criar um trabalho de arte, inspirado em tópicos matemáticos; criar motivação em tarefas matemáticas rotineiras; criar um traba-lho matemático produtivo e criativo e recontar intrigantes histórias de matemáticos famosos.

Perante esta diversidade de intenções ou mes-mo, muitas vezes, sem haver uma real intenção do autor, interessou ao grupo de trabalho com-preender em que medida o facto de haver mo-delos associados a uma história, na ilustração ou na narrativa, permitia a realização de ativi-dades matemáticas.

A organização das histórias, elaboradas na altu-ra, segundo o critério de identificação e utiliza-ção de modelos matemáticos, é apresentada no quadro seguinte.

Para ilustrar a organização deste grupo de tra-balho, apresento alguns exemplos de histórias

e tarefas matemáticas construídas a partir das mesmas, tendo em conta os critérios B e C.

Quadro 2 - Critério B

Ainda não estão contentes? em Conto Contigo, António Torrado, Civilização

“Entretanto, o tratador continua a fazer contas. ele tem mais soluções de reserva. Até, segundo parece, já foi comprar uma faca de cortar bananas, prevendo novas possibilidades …” p.27

Descobre outras soluções de reserva para ajudar o tratador?

(Nesta história o autor recorre ao modelo de decomposição do 10 em somas de números inteiros para criar situações aparentemente diferentes mas todas equivalentes)

Quadro 1 – Organização de histórias

A Toda a história é construída pelo autor, de forma intencional, em torno de um determinado mode-lo matemático, ficando a exploração limitada a esse modelo.

BToda a história é construída sobre um modelo matemático claramente explicitado, que é explora-do ao longo da história, no todo ou em parte. Na história, o autor sugere ainda ideias de continui-dade para a criação de novos problemas.

CA história, embora não havendo intencionalidade explícita por parte do autor, contém episódios em que os contextos, pelo seu valor matemático, são favoráveis à formulação de problemas ou investigações matemáticas significativos para as crianças.

D A ilustração, de uma forma autónoma, contém um modelo matemático ou sugere modelos mate-máticos a serem explorados, estando ou não na intenção do ilustrador.

E A ilustração traduz ou complementa o texto da história, estando intimamente ligados. Em conjun-to, sugerem atividades interessantes e significativas do ponto de vista matemático.

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Quadro 2 - Critério C

O Nabo Gigante, Alexis Tolstoi e Niamh Sharkey, Livros Horizonte

“Semearam ervilhas e cenouras e batatas e feijões. Por último semearam nabos.” p.6

Quantas sopas diferentes é possível fazer com os 4 legumes?

Pode ser feita sopa- só com 1 legume, só com 2, …

E agora juntando também os nabos?

A velhinha, para pôr a roupa a secar, quantas molas de roupa usou?

Desenha uma maneira de pôr a roupa a secar só com 5 molas.

Qual é o número máximo de peças de roupa que se consegue pôr a secar com 5 molas?

E com 6 molas?

E com 10?

“ O velhinho, a velhinha, ... os seis canários amarelos ...” pp. 26 e 27

Nesta altura, quantos animais já estão a ajudar os velhinhos?

Quantos tipos diferentes de animais são?

Continua a lista de animais mantendo sempre o padrão, 7 …

Procura aumentar bastante esta lista.

Quantos animais tens? Quantos tipos diferentes de animais?

Quantos tipos de animais devemos acrescentar à lista para conseguir ter mais de 200 animais?

No trabalho realizado, o grupo pretendeu esco-lher histórias com potencial matemático, base-ando-se no modelo matemático presente e na forma como a história o aproveita ou desenvol-ve, obtendo indicações úteis para os professo-res ou outros utilizadores destas histórias.

Numa apreciação do trabalho desenvolvido em sala de aula com algumas das histórias identifi-cadas pelo grupo de trabalho da Escola Superior de Educação de Lisboa, parece que a presença de um modelo matemático forte1, na narrativa ou na ilustração, permite o desenrolar de ativi-dades matemáticas muito ricas para os alunos.

Para Phyllis e David Within (2004), tal como é sugerido pelo grupo de trabalho Histórias com Matemática, da Escola Superior de Educação de Lisboa, existem critérios para selecionar os me-lhores livros para crianças, com o objetivo de desenvolver trabalho matemático.

Assim, os critérios identificados são: livros que reflitam uma matemática precisa, de utilização

funcional e de ideias acessíveis; livros que re-flitam uma dimensão estética e que despertem o sentido estético das formas e a beleza da linguagem; livros que levem à diversidade de respostas e que envolvam o leitor na narrativa, através da articulação da linguagem matemáti-ca com as ilustrações.

Ainda em relação à utilização das histórias para crianças, na criação de tarefas matemáticas, Ká-tia Smole et al. (1995) revelam, nas orientações gerais que dão para a exploração didática das histórias, a preocupação de que a “impressão fundamental da história não deve ser distorcida por uma ênfase indevida em um aspecto mate-mático”, (p. 9).

Os livros de histórias que estes autores estu-daram estão agrupados em quatro categorias: a) livros de contagem e livros de números; b) histórias variadas; c) livros conceituais; d) cha-radas. Na primeira categoria incluem livros que possibilitam a exploração de ideias e conceitos

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matemáticos e, na terceira, consideram “livros que exploram ideias matemáticas específicas mas de forma diferente da dos livros didácticos convencionais, pois são escritos de tal modo que encantam o leitor e ao mesmo tempo es-timulam uma investigação mais profunda” (pp. 10 -11).

De acordo com este quadro de classificação, este grupo de investigadores desenvolveu um trabalho com muitos exemplos de tarefas mate-máticas, construídas a partir de várias histórias, tendo sempre a preocupação de apresentar um resumo da história. Apesar da extensa lista de tarefas para cada livro, é evidenciada a preocu-pação de, na escola, não subjugar à exploração matemática o uso dos livros de literatura para crianças.

Para além dos livros explorados com diversas tarefas, estes autores apresentam ainda uma longa lista, constituída por mais de cinquenta livros, com potencialidades para desenvolver trabalho matemático. Entre estes livros estão alguns contos tradicionais como O Pequeno Polegar; O Lobo e os Sete Cabritinhos ou O Ca-puchinho Vermelho. Para cada título indicam a categoria, o nível ou idade mais adequados e o tipo de conceitos matemáticos a explorar.

Das conclusões retiradas acerca deste trabalho, parece importante destacar as seguintes preo-cupações: basear em problemas significativos a experiência matemática das crianças; utilizar a literatura para crianças como um contexto onde a matemática está presente de forma natural; escolher criteriosamente os livros a utilizar. Com esta preocupação final é destacada a prin-cipal razão de ser da utilização das histórias na criação de tarefas matemáticas: “… o desenvol-vimento de um universo mágico pessoal, capaz de despertar o prazer de ler” (p. 89).

Lê-me uma história que eu leio-te um padrão, em inglês, You read me a story, I will read you

a pattern, é um trabalho menos extenso mas que apresenta, igualmente, vários exemplos de títulos passíveis de serem explorados. Realizado por Charyl Pace (2005) com alunos do 7º ano, as explorações são organizadas segundo os ti-pos de trabalho matemático realizado: padrões visuais (visual patterns); padrões auditivos ou lexicais (auditory patterns); padrões algébricos (algebraic patterns). Nesta última categoria, no livro My Little Sister Ate One Hare, há uma re-ferência interessante a um modelo matemático muito vulgar em histórias, o da soma dos núme-ros inteiros consecutivos.

Na história, uma personagem come em cada dia o número de objetos do dia anterior bem como o número igual ao número do dia, por exemplo, no terceiro dia come 3+2+1 objetos. Esta ideia sugere ao autor que pergunte aos alunos se podem prever quantos objetos a personagem comerá no décimo dia. Um outro exemplo é o da história A Grain Rice, que tem subjacente um modelo análogo ao da história da invenção do jogo de xadrez. O modelo matemático é o de uma progressão geométrica de razão 2.

Pong Lo, uma das personagens da história, pre-tende receber no primeiro dia um grão de arroz

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e depois, em cada dia o dobro do número de grãos de arroz recebidos no dia anterior. A per-gunta evidente é: Quantos grãos receberá ao fim de 40 dias?

Este trabalho, incluído no nº 8 da revista Mathe-matics Teaching in the Middle School (NCTM, 2005), é um entre vários que descrevem traba-lhos realizados com alunos do 3º ciclo. Embora o nível de ensino seja muito diferente, parece-me importante reforçar o facto de todos estes trabalhos terem por base experiências de sala de aula e registarem as razões da inclusão de literatura na aula de matemática e o tipo de preocupações que as experiências descritas destacam.

Desta maneira, articulando literatura e mate-mática, os professores podem criar situações que encorajam os alunos a compreender e a fa-miliarizar-se com a linguagem matemática, es-tabelecendo ligação entre a linguagem natural, aspetos do quotidiano e a linguagem matemáti-ca formal. Neste ambiente de aprendizagem, os alunos desenvolvem a capacidade de comuni-car matematicamente, de formular conjeturas e novos enunciados que levam à construção e articulação de conceitos matemáticos.

A matemática possui uma linguagem própria, dada através de um conjunto de símbolos, que os alunos deverão ser capazes de transpor para a sua linguagem natural, de modo a con-seguirem construir verdadeiro conhecimento matemático. É durante este processo de des-construção, que o aluno cria imagens mentais, claras, acerca das ideias abstratas contidas na matemática e é neste processo de desconstru-ção, através da ação de um bom professor, que se pode esbater o distanciamento entre lingua-gem natural e linguagem matemática. O grau de compreensão de um conceito ou ideia está in-timamente ligado com a capacidade de criação e comunicação de raciocínios. O aluno terá que

ser capaz de interpretar símbolos matemáticos para poder comunicar matematicamente.

A utilização de histórias nas aulas de matemáti-ca permite a matematização da realidade e uma aprendizagem matemática contextualizada que ajuda na construção de um conhecimento ma-temático sólido e na utilização de uma lingua-gem matemática descodificada.

Durante as últimas décadas, as teorias constru-tivistas da aprendizagem representadas, entre outros, por Kamii e DeClarck (1985), influencia-das pelo trabalho de Piaget, têm salientado as questões ligadas à educação matemática. Estas veem a criança como um construtor do seu pró-prio saber, através da interação gerada no meio onde se movem e concebem a ideia do desen-volvimento matemático, à semelhança do que já acontecia com a linguagem e a leitura, dentro de uma perspetiva sociocultural (Cobb, 1995; Joram, Resnick, & Gabrielle, 1995). Propondo Cobb (1995) que “a actividade aritmética de uma criança é profundamente influenciada pela sua participação nas práticas culturais, ob-tendo-se com esta tantos resultados como com o trabalho feito na escola”. Perante estas ideias construtivistas do desenvolvimento do conhe-cimento matemático, a partir da interativida-de social e/ ou cultural, Anderson et al. (1997) desenvolveram um estudo um pouco diferente dos referidos até aqui, partindo da utilização de histórias no seio familiar, com o objetivo de explorar e analisar o discurso matemático daí emergente.

Este estudo consistiu na escolha de um livro que foi entregue a um conjunto de pais e fi-lhos, de quatro anos de idade, com o objetivo de, durante a hora do conto destas famílias, se analisar o conteúdo matemático decorrente da leitura da história.

Como conclusões os autores revelam que a lei-tura de histórias pode ser um meio de desen-

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volvimento do discurso matemático quando a narrativa ou as ilustrações o sugerem. É possí-vel, assim, afirmar que, tanto em casa como na escola, os conceitos matemáticos são construí-dos durante a partilha decorrente da leitura de uma história (Jenner, 1999, citado por Anderson et al., 2004).

Neste momento, existem em países como Por-tugal e Brasil, entre outros, alguns grupos de professores e investigadores, dinamizadores e divulgadores de projetos ligados à análise de modelos matemáticos existentes em histórias infantis ou de cariz tradicional, com o objeti-vo de construir e aplicar tarefas matemáticas, construídas a partir dos modelos matemáticos existentes em livros.

Desenvolvimento profissional docente

O desenvolvimento profissional do professor refere-se aos processos de aprendizagem rela-cionados com o exercício da docência, envolve múltiplas etapas e, de algum modo, está sem-pre incompleto (Day, 2001; Ponte, 1998). Este processo decorre ao longo da vida profissional do professor e pressupõe investimento e envol-vimento pessoal em questões de natureza di-versa, nomeadamente o ensino das disciplinas que leciona, os desafios e os constrangimentos que afetam o seu empenho profissional, como as políticas e contextos escolares onde desen-volvem a sua atividade, e o desenvolvimento de competências, de maneira a melhorar a edu-cação e os resultados escolares dos alunos de cujas experiências escolares e aprendizagens são responsáveis.

Marcelo (2009) refere-se ao desenvolvimento profissional do professor como “um processo individual e colectivo que se deve concretizar no local de trabalho do docente: a escola; e que contribui para o desenvolvimento das suas competências profissionais, através de experi-

ências de índole diferente, tanto formais como informais” (p. 7).

Nas experiências identificadas por Marcelo (2009), incluem-se partilhas de experiências informais, bem como experiências de formação onde a resolução, análise e discussão de tare-fas; a planificação de aulas e a antecipação de estratégias utilizadas pelos alunos; bem como a reflexão sobre a implementação de tarefas em sala de aula, são realizadas.

Com esta estrutura pretende-se a valorização do desenvolvimento profissional do professor, dado este possuir um conhecimento profissio-nal específico e multifacetado, desenvolvido ao longo do seu percurso profissional. Este conhe-cimento é dinâmico e está em constante evolu-ção, na procura de resposta às novas situações com que o professor se depara, requerendo atualização e aprofundamento permanente e sustentado. É fundamental que o professor pos-sua um conhecimento científico de qualidade, articulado com o conhecimento curricular e di-dático específico, bem como um conhecimento sobre os processos de aprendizagem dos alu-nos, sendo capaz de identificar e reconhecer as dificuldades dos alunos, respetivas origens, e de aproveitar o erro como fonte de aprendizagem.

O reconhecimento das práticas letivas dos pro-fessores, como ponto de partida nos processos de formação, gera envolvimento e motivação que conduzem ao desenvolvimento de práticas reflexivas sobre a sua ação educativa, permitin-do analisar e identificar fatores de sucesso, bem como a origem das dificuldades encontradas, tendo em conta a intencionalidade com que esta foi planificada.

É importante que cada professor conheça as suas potencialidades e fragilidades e seja capaz de diagnosticar as suas prioridades no domínio da formação. Este autoconhecimento permite a identificação de formação que vá ao encontro

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dos interesses que o professor revela de forma responsável.

O trabalho coletivo e colaborativo entre pro-fessores permite capitalizar energias, propor-cionar apoio acrescido, multiplicar perspetivas, enriquecer a reflexão e gerar um envolvimento que proporciona reconhecimento do trabalho desenvolvido e uma ação educativa que vá ao encontro das reais necessidades dos alunos.

Envolvimento e desenvolvimento profissional docente na articulação entre literatura e ma-temática

Os cursos de formação na área da articulação entre literatura e matemática têm sido, nos úl-timos anos, procurados por professores do 1º ciclo do ensino básico e educadores de infância que revelam interesse pelo trabalho com histó-rias em sala de aula e que pretendem desenvol-ver conhecimento matemático de forma menos convencional e mais motivadora.

Nestes cursos, tem-se procurado partir do co-nhecimento dos professores, de modo a gerar um envolvimento que os faça progredir em ter-mos matemáticos, didáticos e curriculares.

As atividades realizadas nas sessões de traba-lho, com estes professores e educadores, têm conduzido ao desenvolvimento de uma capa-cidade de seleção criteriosa de obras literárias a introduzir nas salas de aula e, progressiva-mente, vão levando a uma maior consciência e conhecimento matemáticos na construção ou seleção de tarefas, criadas a partir dos modelos matemáticos presentes na narrativa ou ilustra-ção das histórias selecionadas. Além disso, es-tes docentes vão reconhecendo a importância da partilha e colaboração entre pares como uma ferramenta essencial ao seu desenvolvi-mento profissional.

As reflexões coletivas sobre o trabalho reali-zado pelos alunos, desenvolvidas nas sessões

de formação após a implementação de tarefas em sala de aula, tem conduzido professores e educadores a reconhecerem que muito do en-volvimento dos alunos e de uma aprendizagem sustentada depende, em grande parte, da sua atuação, nomeadamente na escolha das tare-fas; na atenção dada aos processos de raciocí-nio dos alunos e às suas dificuldades, bem como à comunicação na sala de aula, em especial na condução de discussões coletivas.

Estas reflexões entre pares têm levado a altera-ções na dinâmica do trabalho em sala, funda-mentalmente na escolha criteriosa de tarefas a desenvolver e no reconhecimento da impor-tância do papel do professor nos momentos de discussão, pois, como afirma Loureiro (2006), “… uma boa tarefa matemática, produzida a partir de um modelo matemático presente num destes bons livros, só será uma boa tarefa se for bem explorada e bem conduzida” (p. 2).

Considerações finais

Em consequência da divulgação de trabalhos de investigação e projetos desenvolvidos na vertente da articulação entre literatura e ma-temática, tanto nacionais como internacionais, tem surgido, nos últimos anos, em Portugal, um interesse crescente por esta área. São indícios deste interesse o número considerável de rela-tórios de conclusão de Mestrados em Educação Pré-Escolar e em Ensino de 1º e 2º Ciclo do En-sino Básico que têm surgido, bem como o au-

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mento do número de formandos inscritos em cursos e oficinas de formação contínua, cujos temas se ligam à articulação entre estas duas áreas do conhecimento.

Os relatórios de conclusão de mestrados têm surgido, fundamentalmente, na sequência da realização de estágios onde os professores ou educadores cooperantes desenvolvem trabalho na perspetiva da articulação entre literatura e matemática ou emergem do trabalho desenvol-vido nos seminários de Didática da Matemática, onde o professor da Unidade Curricular se de-bruça sobre esta temática. Uma temática bas-tante apreciada, onde os estudantes sentem que podem articular transversalmente duas áreas do currículo, aprendendo a identificar e a utilizar os modelos matemáticos que conduzem à estruturação de tarefas matemáticas signifi-cativas e contextualizadas, tanto na narrativa como nas ilustrações.

Também os cursos e oficinas de formação con-tínua, ligadas à articulação entre matemática e literatura, têm contribuído para o envolvimento e desenvolvimento profissional docente nesta área e têm alterado práticas, nomeadamente no que concerne à escolha de tarefas e à con-dução de discussões coletivas geradoras de momentos de aprendizagem mais conscientes e consistentes.1Ilustrações ou excertos de texto que identifiquem uma estrutura, um raciocínio ou um conceito mate-máticos.

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REFLEXÃO

Inteligência Espiritual um bem educativo

Roque Rodrigues Antunes Escola Superior de Educação Almeida Garrett,

[email protected]

Ana Paula Silva CeiED, Universidade Lusófona, Lisboa

[email protected]

Resumo

Faz-se neste artigo um mapeamento da literatura sobre inteligência espiritual. Parte-se das primeiras teorias e percorre-se a evolução das mesmas, sinali-zando os principais marcos tais como a teoria das in-teligências múltiplas de Gardner (1995), a inteligência emocional de Goleman (1997) e a inteligência espi-ritual de Emmons (1999) e Zohar e Marshall (2004), prosseguindo-se com a análise do contributo de vá-rios autores até 2013. Procura-se ainda evidenciar a necessidade de considerar este tipo de inteligência no campo da educação, nomeadamente as suas catego-rias de transcendência e integração que se nos afigu-ram como uma base adequada para a prossecução de uma educação transformadora.

Palavras-chave: Teorias da inteligência, inteligência espiritual; educação

Introdução

Enquanto profissionais da educação, considera-mos que o educador para século XXI será aque-le que, consciente da inteligência espiritual, a mobiliza diariamente, visando desenvolvê-la em si e naqueles com quem está envolvido em processos educativos.

Antes, porém, de apresentarmos o nosso argu-mento, consideramos necessário definir os ter-mos que compõem a expressão – inteligência espiritual. O primeiro, inteligência, provém do termo latino intelligentia que é composto de

intus (dentro) e legere (ler), portanto, ler por dentro, intelegir, compreender.1

A segunda palavra, espiritual, é um adjetivo, sendo portanto um termo qualificativo da in-teligência, constituído a partir do substantivo espírito que tem a sua raiz etimológica no la-tim spiritus que significa sopro, ar, alma, vida, e ainda “coisa incognoscível que anima o ser vivo (…) conjunto das faculdades intelectuais (…) inteligência; energia,”2. Se nos ativermos às raízes etimológicas dos termos da expressão in-teligência espiritual, verificamos que esta agre-ga as ideias de capacidade de compreender, ler por dentro e sopro vital, o que anima, fonte de vida e de energia, mas que é uma “coisa incog-noscível”. O que traduz metafórica, mas subs-tancialmente, as nossas preocupações, isto é, muitos autores, como Robinson (2011, 2012), vêm alertando, para o facto de muitos sistemas educativos estarem a ser reformados, numa tentativa de se adequar a educação às exigên-cias do novo milénio, porém sem sucesso.

Defende aquele autor que os políticos têm feito, um pouco por todo o lado, as reformas erradas e que os sistemas educativos não necessitam de ser reformados, mas transformados (Robin-son, 2011). O que este autor vem preconizando é uma mudança paradigmática, uma revolução epistemológica (Kuhn, 2009), a qual se deve ini-ciar com uma compreensão mais profunda da inteligência humana (Robinson, 2011).

Ora, retomando o significado dos termos acima apresentados, o que nos propomos é contri-buir para o conhecimento, já que é uma “coi-sa incognoscível”, do sopro vital da capacidade inteligível do ser humano, um trabalho indis-cutivelmente incompleto. Assim, neste início de século, em que a educação e os educadores tanto necessitam de ânimo, procedemos a esta revisão da literatura, visando trilhar um cami-

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nho para o aprofundamento da compreensão das “múltiplas inteligências” e as suas implica-ções na transição de uma educação com educa-dores com uma visão multifacetada e ajustada à realidade dos nossos dias. Para o efeito, o artigo apresenta as várias conceções de inteligência numa perspetiva diacrónica, desde os primór-dios da Psicologia até ao presente. No primeiro ponto apresentam-se as várias conceções de in-teligência, desde as origens do conceito, no iní-cio do século XX, até Gardner que estabeleceu, cerca de 90 anos mais tarde, a existência de “in-teligências múltiplas”. No ponto dois revêm-se as várias conceções de “inteligência espiritual” propostas por diferentes estudiosos nas últimas duas décadas. Por fim, no ponto três, aponta-mos algumas implicações da “inteligência espi-ritual” na educação.

Inteligência – das origens do conceito a Gardner

O conceito de inteligência é ainda hoje algo impreciso, apesar dos esforços levados a cabo pelos investigadores datarem de há mais de um século. Na verdade, os investigadores não con-seguiram ainda ultrapassar as divergências em torno deste conceito.

Almeida, Guisande e Ferreira (2009) referem três conceitos principais que emergem das di-versas teorias sobre a inteligência: (a) a inteli-gência como fator G, uma capacidade geral de aprender significados, estabelecendo e aplican-do relações nas diferentes situações de desem-penho; (b) inteligência como propriedade do

comportamento, designadamente do compor-tamento adaptativo; (c) inteligência como um conjunto de aptidões, geralmente ligadas ao conhecimento. Neste sentido, fazem três abor-dagens das posições teóricas referentes à defi-nição de inteligência: abordagem psicométrica, desenvolvimentista e cognitivista. A primeira encontra-se centrada nas aptidões ou traços internos da mente que são inferidos com base nos resultados obtidos pelos sujeitos em testes, pressupondo uma interpretação correlacional e fatorial da inteligência. As outras duas aborda-gens concebem a inteligência como estruturas e processos inerentes à realização das tarefas, deslocando, assim, o enfoque das aptidões, concebidas na primeira perspetiva, para a aná-lise do funcionamento da inteligência enquanto competente para resolução de problemas, valo-rizando os contextos dos processos inerentes à realização cognitiva.

Perspetiva psicométrica

Esta perspetiva surgiu, em 1905, em França, com os trabalhos de Binet e Simon, que criaram a primeira escala métrica de inteligência, por encomenda do ministério da instrução pública.

Aquela escala visava a identificação das crian-ças com sérias dificuldades na aprendizagem do currículo normal e que, por isso, necessitavam de atenção especial. O teste é constituído por di-ferentes subtestes organizados por idades, sen-do a cotação feita em termos de idade mental, a qual corresponde à média dos desempenhos das crianças com as mesmas idades cronológi-cas. Este teste foi posteriormente aperfeiçoado pelo psicólogo americano Terman, em 1916 e 1937. Terman criou uma nova escala, designada de Stanford-Binet. Esta correspondia à divisão da idade mental da criança pela sua idade cro-nológica, multiplicada por 100, equação através da qual se obtinha o quociente de inteligência ou QI. Uma das críticas a este tipo de testes

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decorria do facto de fazer incidência essencial-mente em capacidades lógicas e linguísticas, no pensamento abstrato e teórico e testando apti-dão verbais (inteligência verbal ou concetual). Outra crítica relaciona-se com a sua pouca ade-quação para avaliar a capacidade inteletual de adultos (Eysenck, 1982).

Ainda baseado em testes, e subtestes que in-cidiam em competências tão diversas como a memória, a perceção, a fluência verbal, a lógica, analisados com recurso à análise fatorial, o psi-cólogo britânico Spearman verificou, em 1927, que as pessoas que tinham melhores resulta-dos num subteste obtinham também, em regra, bons resultados noutras áreas. Nesta base, co-loca a hipótese da existência de uma capacida-de de inteligência geral – o fator G – que estaria subjacente a todas as funções intelectuais, dife-rindo de pessoa para pessoa apenas em grau. Na sua teoria inclui também os fatores especí-ficos – fatores S – que corresponderiam a ap-tidões específicas e que explicariam o facto de uma pessoa ser mais dotada para certo tipo de atividades do que outras (Almeida et al., 2009).

Estudos realizados pelo norteamericano Thurs-tone, em 1937, levaram-no a concluir a falta de fundamento para a existência do fator G, afirmando, antes, o carácter multifatorial da in-teligência. Para tal, aplicou uma bateria de 56 testes de aptidão, submetendo os resultados obtidos à análise fatorial. Da análise dos resul-tados concluiu pela existência de sete aptidões mentais primárias – espaciais e visuais, numé-rica, compreensão verbal, raciocínio, rapidez percetual e memória. Propôs a substituição da escala de QI por um perfil de capacidades inte-letuais que mostrasse os níveis atingidos pelos sujeitos em cada uma dessas capacidades.

A discordância sobre a inteligência como uma capacidade unitária, expressa na aptidão verbal e no raciocínio lógico-matemático, é também

assumida por David Wechsler, psicólogo norte-americano de origem romena. Assim, nos finais da década de 1930, apresenta um teste para adultos – a Escala de Inteligência de Wechsler para Adultos (WAIS – Wechsler Adult Intelligen-ce Scale). Para elaborar este teste especifica-mente para adultos, reduziu substancialmente o peso do material verbal e concetual, incluindo outros itens que exigiam raciocínio não verbal, contemplando, desta forma, múltiplos aspetos da inteligência (Alonso & Balmori, 2004).

Os psicólogos tentaram, assim, encontrar um conceito de inteligência que abarcasse todas as capacidades que ela envolve.

Perspetiva desenvolvimentista

A perspetiva desenvolvimentista acentua as diversas formas que a inteligência vai assumin-do ao longo do desenvolvimento, tornando-se cada vez mais complexas, particularmente na infância e na adolescência. Piaget e Vygotsky são os seus principais representantes.

Piaget apresenta-nos uma conceção de inteli-gência diferente da psicométrica, consideran-do-a uma forma superior de adaptação bioló-gica. À semelhança de qualquer outra função biológica, a função de adaptação da inteligência assenta num processo de evolução estrutural, que ocorre por etapas. Para Piaget (1967), o de-senvolvimento da inteligência comporta quatro estádios; a aquisição do estádio seguinte passa pelo anterior de forma sequencial e invariante. Cada estádio corresponde à aquisição de estru-turas operatórias que se vão sucedendo, desde o estádio sensório-motor, passando pelo pré-operatório, o das operações concretas e cul-minando nas operações formais. A inteligência consiste na progressiva formação de um equi-líbrio entre um mecanismo assimilador e uma acomodação complementar. A importância de Piaget consiste em ter sido o primeiro estudioso

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a pormenorizar o desenvolvimento inteletual de crianças, e ter afirmado a universalidade e sequencialidade das estruturas mentais (Cava-lieri & Soares, 2007).

Vygotsky e Piaget partilham a noção de um su-jeito ativo que age sobre o meio e é por ele in-fluenciado. Mas Vygotsky enfatiza a influência do mundo social sobre as funções mentais su-periores. Daí que Almeida et al. (2009) conside-rem a teoria de Vygostsky como uma teoria só-cio histórica cultural. Vygostsky (2007) vincula o indivíduo ao seu meio social que lhe fornece os instrumentos e os signos para o desenvolvi-mento das atividades psicológicas mediadas, tipicamente humanas, acreditando que a cons-trução do ser humano é baseada na aprendiza-gem com a interferência do meio social e com a reconstrução individual da experiência e dos seus significados (Cavalieri & Soares, 2007).

Perspetiva cognitivista

A abordagem cognitivista centra-se “nos pro-cessos, nas estratégias ou nos elementos fun-cionais ou operativos que tornam possível o acto inteligente” (Almeida et al., 2009, p. 9). A psicologia cognitiva procura identificar os ele-mentos estruturais, esquemas lógicos e proces-sos de funcionamento da atividade mental na tentativa de criar uma visão sistémica da inteli-gência baseada em mecanismos cognitivos, na sua arquitetura e na sua dinâmica. Investiga-se como o sujeito conhece e resolve problemas, que processos mentais são utilizados na aquisi-ção do conhecimento e no desempenho cogniti-vo, enfocando-se a perceção humana, o pensa-

mento, a memória e a atenção. Esta perspetiva valoriza os aspetos fisiológicos, estabelecendo uma ligação entre o sistema nervoso e a inte-ligência dos indivíduos. Esta relação foi poten-ciada pelo desenvolvimento das neurociências que revelou a importância do córtex pré-frontal na elaboração de modelos cognitivos (Almeida et al., 2009).

Nestas abordagens, as habilidades mentais ge-ralmente são tidas como sendo reguladas por estruturas operacionais lógicas bastante disso-ciadas dos contextos socioculturais onde elas se manifestam. Ainda que a interação com o meio-ambiente seja considerada um elemento que possa vir a influenciar a aquisição e o desenvol-vimento das estruturas mentais, normalmente não se define claramente tal meio e, tampouco, o tipo de influência que ele exerce sobre as es-truturas, processos e esquemas mentais.

Perspetivas abrangentes de inteligência

Com o intuito de ultrapassar os modelos psico-métricos, que concebem a inteligência e a cog-nição de forma restritiva, surgiram abordagens mais abrangentes da inteligência que incluem e valorizam o papel das emoções, da criatividade, da flexibilidade cognitiva.

Sternberg e a teoria triárquica:

Sternberg (1985), com a sua teoria triárquica, enquadra-se nestas abordagens da inteligên-cia.

Esta teoria destaca a importância do contexto sociocultural na análise do desempenho, valo-

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rizando o papel da cultura na avaliação da in-teligência, procurando integrar aspetos como o mundo interno do indivíduo relacionando-o com o comportamento inteligente, a experi-ência envolvida na aplicação dos mecanismos mentais na realização de tarefas e a própria experiência externa, contextual, ou seja, em situações da vida diária. A inteligência aqui é entendida como uma capacidade adaptativa e de ajustamento ao meio. A teoria triárqui-ca compreende a inteligência humana no seu mundo interno (aspetos cognitivos), no mundo externo com manifestações socioculturais da inteligência e o mundo experiencial em que os conteúdos ganham relevância e familiaridade no desempenho cognitivo.

Gardner e as inteligências múltiplas:

Nesta senda, surgiu a teoria das inteligências múltiplas de Gardner (1995) que se centra na pluralidade da inteligência numa perspetiva multifacetada. Insurge-se contra uma visão uni-versalista da mente, revelando a sua insatisfação com o conceito de QI. Esta perspetiva questiona a “existência de uma inteligência singular, está-vel e representativa do leque de comportamen-tos cognitivos” (Almeida et al., 2009, p. 130), apostando aquele autor na contextualização e na resolução de problemas como forma de ava-liar a inteligência e não em testes padronizados. Gardner (1995) refere-se às inteligências múl-tiplas para enfatizar um número desconhecido de capacidades humanas diferenciadas, desde a inteligência musical até às inteligências inter e intrapessoal que permitem a compreensão de si mesmo, salientando que estas capacidades são tão importantes quanto as que os psicólo-gos tinham anteriormente identificado através do QI.

Gardner (1995) identificou um conjunto de critérios que permitiam delimitar um deter-minado tipo de inteligência que passavam por

i) estudos dos efeitos decorrentes das lesões cerebrais; ii)estudos com “idiotas sábios”, so-bredotados e outros casos excecionais; iii) existência de mecanismos básicos de proces-samento de informação; iv) existência de uma história desenvolvimental; v) existência de uma história filogenética; vi) evidência de estudos experimentais; vii) evidência de estudos psi-cométricos; viii) possibilidade de codificação num sistema simbólico. Só eram consideradas as inteligências que satisfizessem a totalidade destes critérios ou quase todos eles. Assim, por este processo, Gardner (1995) refere-se a sete inteligências: musical, linguística, espa-cial, corporal-quinestésica, lógico-matemática, intrapessoal e interpessoal, tendo encontrado para todas elas uma base neurológica, em re-giões específicas do cérebro. Este processo de identificação não ficou encerrado. Mais tarde, Gardner (2003) analisou outros três tipos de inteligência: naturalista, existencial e espiritu-al. A “inteligência naturalista” foi enquadrada dentro dos oito critérios atrás enumerados, passando assim a constituir uma “oitava inteli-gência”. Relativamente à “inteligência existen-cial”, Gardner (2003) hesita em inclui-la na sua lista, alegando que falta provar a sua localização cerebral. Gardner usa o conceito de “inteligên-cia espiritual” por vezes de forma indistinta de inteligência existencial. Esta área da inteligência existencial/espiritual, não é ainda, no entender de Gardner, consensual porque apresenta difi-culdades na aplicação dos critérios acima refe-ridos, pelo que não a considerou como um tipo de inteligência.

A inteligência emocional:

Mayer e Salovey (1993) reivindicam a paterni-dade do conceito “inteligência emocional” e definem-no como a capacidade para supervi-sionar emoções pessoais e interpessoais com o fim de regular e orientar os pensamentos e

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as ações, em quatro dimensões: (i) a perceção de emoções e a sua expressão; (ii) a assimilação de experiências emocionais; (iii) a classificação, análise e compreensão de emoções; e (iv) a mo-nitorização e regulação reflexiva de emoções.

Goleman (1997) define posteriormente o QE - quociente de inteligência emocional - como um conjunto de capacidades endógenas de cada in-divíduo que lhe permite gerir as suas emoções e explorar um potencial para estabelecer relacio-namentos positivos. Na explicitação do seu mo-delo de inteligência emocional, Goleman (1997) apresenta cinco domínios ou capacidades sobre os quais assenta a definição de um conceito de inteligência: autoconsciência, autorregulação, automotivação, empatia e aptidões sociais. As primeiras três são competências pessoais e de-terminam a forma como nos gerimos a nós pró-prios; as duas últimas são do domínio das com-petências sociais e determinam a forma como lidamos com os relacionamentos. Estes cinco domínios só se tornaram efetivos através da concretização de vinte e cinco “destrezas” en-tre as quais, autoconsciência emocional, adap-tabilidade, inovação, otimismo, compreensão dos outros e formação de vínculos. No âmbito de cada uma das dimensões da competência emocional existe um tipo de comportamentos associados que caracterizam cada uma delas. É a mobilização destes comportamentos que pos-sibilita a realização das cinco capacidades da in-teligência emocional (Almeida et al., 2009).

A inteligência espiritual – desenvolvimentos

Apesar de Gardner (1995) não assumir a inclu-são da inteligência espiritual na sua teoria das inteligências múltiplas, um conjunto de teóricos e investigadores tem vindo a defender o seu re-conhecimento como um tipo autónomo de in-teligência humana (Emmons, 1999 e 2000; Zo-har & Marshall, 2004; Nasel, 2004; King, 2008; Amram, 2009; Torralba, 2010; Albertini, 2012;

Geary III, 2013).

A inteligência espiritual surgiu recentemente como constructo académico e ainda não gerou um corpo teórico consensual de conhecimentos em parte porque a espiritualidade1 é uma área difícil de compatibilizar com os modelos expe-rimentalistas e quantificáveis da realidade que dominam a ciência contemporânea (Green & Noble, 2010).

Robert Emmons e a emergência da afirma-ção da inteligência espiritual (1999) Emmons (1999), neuropsicólogo da Universidade da Ca-lifórnia, baseia-se nos critérios de Gardner para a definição de uma inteligência e argumenta que a espiritualidade pode ser vista ou enten-dida como uma forma de inteligência, porque ela prevê o funcionamento e a adaptação, as-sim como oferece recursos que permitem às pessoas resolver problemas e atingir metas. Por outras palavras, a espiritualidade está baseada em habilidades e capacidades de grande rele-vância nas operações da mente humana que geram resultados valiosos e, segundo Emmons (2000), obedece aos oito critérios indicados por Gardner devendo, por isso, ser incluída no es-pectro das inteligências múltiplas. Na descrição do que entende por este tipo de inteligência, Emmons (1999) utiliza a expressão Ultimate Concern – preocupação suprema, referindo-se a um envolvimento existencial denso de signi-ficado e de sentido. Esta forma de inteligência possibilita ao ser humano estabelecer um con-tacto profundo consigo mesmo, com o mundo e com os factos da vida, encontrando nisto uma forma de realização cognitiva que mere-ce a adjetivação de “espiritual” (Silva, 2001). A inteligência espiritual é aquela capacidade que abarca a transcendência do homem, no qual está incluída a capacidade de se projetar no fu-turo, a busca do sentido da vida, e que poderá incluir [ou não] o sagrado e os comportamentos virtuosos. Assim, Emmons (2000) concebe este

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tipo de inteligência como o uso adaptativo que fazemos da informação espiritual para facilitar a vida quotidiana, resolver problemas e conse-guir a realização dos nossos propósitos. Sugere cinco habilidades como sendo componentes es-senciais da inteligência espiritual: (i) capacida-de de transcendência do físico e do quotidiano; (ii) capacidade para entrar em elevados estados espirituais da consciência; (iii) a capacidade de investir em atividades diárias, eventos e relacio-namentos com um sentido do sagrado, isto é, capacidade para sacralizar a experiência quo-tidiana; (iv) capacidade de utilizar recursos es-pirituais para resolver problemas da vida; e (v) capacidade de se envolver em comportamento virtuoso ou de ser virtuoso para mostrar per-dão, para expressar gratidão, para ser humilde, para mostrar compaixão e sabedoria. Defende Emmons (1999) que estas cinco habilidades es-tão em consonância com os critérios propostos por Gardner para a inclusão de uma inteligência no rol das inteligências múltiplas.

2.2. Zohar e Marshall – cunhagem do termo QEs - inteligência espiritual (2000)

O conceito de QEs, Inteligência Espiritual, se-gundo Torralba (2010), foi cunhado, no ano de

2000, por Danah Zohar, professora da Universi-dade de Oxford e por Ian Marshall, psiquiatra da Universidade de Londres, que, ao quadro geral da inteligência humana, depois do QI uti-lizado durante a primeira metade do século XX, que usamos para resolver problemas lógicos ou estratégicos, e do QE, proposto por Goleman na década de 90 do século passado, que nos dá consciência dos nossos sentimentos e também dos outros, estes investigadores revelam-nos um terceiro “Q”- a inteligência espiritual, QEs. Zohar e Marshall (2004) definem, assim, a inteli-gência espiritual, QEs, como a “inteligência com que lidamos e resolvemos problemas de senti-do e de valor, a inteligência com que podemos colocar as nossas acções e as nossas vidas num contexto gerador de um sentido mais vasto e rico” (p. 16). Segundo as suas investigações, as pessoas que cultivam esta forma de inteligência estão mais recetivas e abertas à diversidade, tendo uma grande tendência a perguntar-se pelo porquê e o para quê das coisas, buscando respostas fundamentais e sendo capazes de en-frentar as adversidades da vida. Neste sentido, as pessoas espiritualmente inteligentes procu-ram uma conceção do mundo, tendem a valori-zar as suas ações e o seu percurso bem como as suas opções de vida.

A inteligência espiritual permite, pois, aceder a significados profundos, questionando-se pelo sentido da existência e das suas mais elevadas motivações. É a inteligência do eu profundo, aquela que enfrenta as grandes questões da existência, buscando para estas respostas cre-díveis e razoáveis.

Richard Wolman e a criação do PSI – PsychoMa-trix Spirituality Inventory (2001)

O psicólogo clínico, Richard Wolman, durante muitos anos professor da Faculdade de Medi-cina de Harvard, propõe, a partir da análise dos critérios de Gardner (1995), uma conceção mais

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alargada de inteligência, inclusive de inteligên-cia espiritual que obedeça à seguinte sequên-cia: perceção, conhecimento, compreensão e satisfação emocional/ação.

Assim, a inteligência começa com a perceção que pressupõe a capacidade de experienciar, ver, ouvir, sentir, tocar, cheirar, “notando” que algo está a acontecer no mundo interior ou exterior, aplicando-se este critério também às experiências espirituais, como por exemplo, a habilidade de notar, sentir, perceber a sensação de transcendência e uma conexão a um contex-to maior de significado (Wolman, 2002). O pas-so seguinte na formulação de uma inteligência é o conhecimento de que uma experiência ocorre e se justapõe esse conhecimento a experiências passadas ou padrões internos. Segue-se a com-preensão que permite tornar as experiências e conhecimentos significativos. A componente final da inteligência à satisfação emocional de uma experiência compreendida e que conduz à ação. Assim, segundo Wolman (2002), através dos componentes referidos da inteligência, é “possível analisar o constructo de inteligência espiritual e amarrá-lo a uma sequência de de-senvolvimento ao longo do período de vida de uma pessoa” (p. 131).

Para Wolman (2002), a inteligência espiritual está relacionada principalmente com a formu-lação de questões existenciais e a compreensão do significado das experiências e dos relaciona-mentos que permite uma conexão que nos sus-tenta e fortalece nos momentos mais difíceis da existência. Este autor defende que a inteligência espiritual é muito mais do que um conjunto de habilidades de solução de problemas. Defende, antes, ser uma força vital existente em todos nós que permite um maior sentido de conexão entre as pessoas.

Um dos contributos importantes de Wolman (2002), validando um dos critérios exigidos por

Gardner (1995) para a definição de uma inteli-gência, foi a construção de uma escala de inteli-gência espiritual: o PSI, Psychomatrix Spirituali-ty Inventory, um sistema para avaliar os níveis e as áreas de espiritualidade no contexto da vida de cada um. Já Emmons (2000) tinha sugerido que a inteligência espiritual poderia ser medida mostrando os efeitos de comportamentos espi-rituais. O PSI é um inventário assento no relato das próprias pessoas, procurando captar não as crenças, mas antes a experiência consciente e real dos indivíduos em termos do que fazem, sentem ou pressentem.

Dagmar Nasel e o SIS – Spiritual Intelligence Scale (2004) Nasel (2004) defende uma ideia de inteligência espiritual que reflete as perspetivas de Emmons (2000), Zohar e Marshall (2004) e Wolman (2002), procurando também incorpo-rar os contributos dos valores do cristianismo e da espiritualidade do New Age.

A inteligência espiritual é descrita por Nasel (2004) como a aplicação de habilidades espiri-tuais em determinados contextos. A inteligên-cia espiritual representa, assim, “a capacidade para mostrar as suas habilidades espirituais e recursos para melhor identificar, encontrar um significado, e resolver problemas existenciais, espirituais e práticos” (Nasel, 2004, p. 44). A perspetiva de Nasel (2004) enfoca a aplicação da inteligência espiritual na busca do sentido, do propósito da vida e da compreensão existen-cial, sugerindo que a inteligência espiritual está

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“mais relacionada com a intuição, o insight e a sabedoria” (p. 45).

No seu estudo empírico, Nasel (2004) constroi também uma escala de inteligência espiritual (Spiritual Intelligence Scale - SIS) tendo validado 17 dos 21 itens do estudo preliminar. Os resul-tados indicam que o desenvolvimento e a ma-nifestação da inteligência espiritual, medidas pelo SIS, estão relacionados com o crescimento espiritual.

David King e o SISRI – The Spiritual Intelligence Self-Report Inventory-24 (2008)

King (2008), psicólogo nas Universidades de Trent e Vancouver, Canadá, analisando critérios estabelecidos para determinar inteligências, organiza-os desta forma: uma inteligência deve (i) incluir um conjunto de habilidades mentais inter-relacionadas (distintas de comportamen-tos, experiências); (ii) desenvolver-se ao longo da vida, (iii) facilitar a adaptação e a resolução de problemas num determinado contexto; (iv) permitir que um indivíduo possa raciocinar abstratamente e fazer juízos apropriados, e (v) evidenciar uma componente biológica ou uma base cerebral. King1 (2008; King & DeCicco, 2009) constroi um inventário de “avaliação da inteligência espiritual”, o SISRI-24 (The Spiri-tual Intelligence Self-Report Inventory-24), no qual operacionaliza aquela definição através de quatro grandes componentes ancoradas em evidências empíricas: pensamento crítico exis-tencial, produção de significado pessoal, cons-ciência transcendental e expansão do estado de consciência. A utilidade desta escala é notória, pois tem vindo a ser aplicada por diferentes in-vestigadores em diferentes partes do mundo1, (Hildebrandt, 2011, Giles, 2012; Javaheri, Safar-nia & Mollahosseini, 2013) no sentido de iden-tificação e promoção deste tipo de inteligência e em diversos contextos, como o desenvolvi-mento das lideranças, a qualidade de serviço

desempenhada, a relação entre o bemestar de alunos e professores.

Joseph Amram e a ISIS – The Integrated Spiritu-al Intelligence Scale (2009)

O psicólogo clínico Amram que, em 2009, de-fendeu no Instituto de Psicologia Transpessoal de Paolo Alto, na Califórnia, a sua tese de dou-toramento sobre o contributo das inteligências emocional e espiritual para a liderança nos negócios, construiu uma teoria ecuménica da inteligência espiritual, baseada na análise de conteúdo de 71 entrevistas realizadas a pessoas consideradas espiritualmente inteligentes pelos seus colegas, pertencendo a várias tradiçõesreli-giosas2. Este trabalho permitiu-lhe concluir que a inteligência espiritual pode ser diferenciada da experiência espiritual (v.g., estado de unidade) ou da crença religiosa (v.g., crença em Deus). Define inteligência espiritual como a capacida-de de aplicar e incorporar recursos espirituais e qualidades para melhorar a vivência quotidiana e o bem-estar. Do estudo realizado emergiram 7 temas importantes: (i) consciência; (ii) graça; (iii) sentido; (iv) transcendência; (v) verdade; (vi) serenidade (; (vii) direcionamento interno. Um estudo paralelo foi realizado por Amram e Dryer (2008) focado no desenvolvimento e na validação desta escala (ISIS, Integrated Spiritual Intelligence Scale), construída a partir dos refe-ridos temas. A ISIS constitui-se, pois, como mais um contributo para o desenvolvimento do con-ceito da inteligência espiritual.

Inteligência espiritual e educação

Uma das dimensões mais importantes da inteli-gência é a capacidade de resolver problemas.

Ora, no processo educativo é precisamente a resolução de problemas que é constante, tanto para o educador como para o educando. Com efeito, educar - proveniente de educare, orien-tar, nutrir, decidir num sentido externo, levando

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o indivíduo de um ponto onde ele se encontra para outro que se deseja alcançar; e de edu-cere, que se refere a promover o surgimento dedentro para fora das potencialidades que o indivíduo possui - é a ação que se exerce sobre alguém com vista a que essa pessoa se transfor-me, através da aquisição de um conhecimento, comportamento, ou habilidade permanente, estável e que não possuía anteriormente. E, por outro lado, que atualize o seu potencial. Então, para que essa transformação se torne possível há que mobilizar a inteligência, enquanto capa-cidade de resolução de problemas. Do ponto de vista do educador, o problema a resolver con-siste em levar o educando a fazer a aquisição transformadora preconizada; do ponto de vista do educando, o problema consiste em fazer a respetiva aquisição, integrando-a não só nos seus esquemas de ação, mas também na sua experiência e na compreensão do mundo e de si próprio. Na verdade, no processo educativo, educador e educando apenas conseguem reali-zar a tarefa da educação com o recurso à inteli-gência, e não apenas a cognitiva, mas em parti-cular a emocional e a espiritual. Como Robinson (2011) tem sublinhado, a inteligência humana tem três características fundamentais, é varia-da, dinâmica e diferenciadora.

Sendo a educação um processo voltado para o outro, para a sua transformação, para o desen-volvimento das suas potencialidades, os edu-cadores necessitam da inteligência emocional para chegar ao seu educando, para num proces-so de empatia, encontrar a forma mais adequa-da de comunicar com ele, para colocarem algo em comum. No âmbito dessa comunicação, vai necessitar da inteligência espiritual para com-preender o outro na sua diferença, na sua es-pecificidade e, para isso, o educador vai ter que transcender-se, distanciar-se de si próprio, dos seus preconceitos, interesses e valores, para poder aceitar o seu educando como ele é. Esta

aceitação só pode ser verdadeiramente feita numa atitude de respeito pela singularidade de ser humano do educando e não na forma de uma manipulação ou doutrinação. Educar é ze-lar pelo interesse do próprio educando, do bem que lhe assiste através do processo educativo, que é o do desenvolvimento do seu ser e da sua humanidade.

Do nosso ponto de vista, para este desenvolvi-mento é necessário que a inteligência espiritual seja mobilizada, nomeadamente o fator trans-cendência, isto é, o fator que permite ao ser humano compreender-se como fazendo parte de algo maior, de algo que está muito para além do seu horizonte individual e pessoal, compre-ender que faz parte de uma humanidade em construção, cuja capacidade de superação dos problemas depende da sua evolução. Evolução através do desenvolvimento do potencial criati-vo de todos e de cada ser humano em geral e, em particular, das crianças e dos jovens que no futuro enfrentarão, não apenas os problemas que lhes legamos, mas outros que nos são hoje completamente inimagináveis. Numa época de incerteza, em que nos precipitamos a uma ve-locidade cada vez mais acelerada num futuro insondável, ajuda-nos, enquanto educadores, perspetivar o nosso trabalho como um contri-buto significativo para a preparação das crian-ças e dos jovens que o vão construir esse futuro. Sabendo que nos faltam perfis claros e seguros de saída da escolarização, com vista aos quais trabalhar, ajuda-nos partir de uma perspetiva clara das potencialidades da diversidade, da di-nâmica e da capacidade criativa da inteligência humana. Portanto, nesta ausência, o melhor será trabalhar diagnosticando, valorizando e cultivando o potencial de cada aluno e de cada professor. Defendemos que estes pressupostos devem ser tanto a base da educação de crian-ças e jovens, como da formação dos professo-res. A aprendizagem ao longo da vida é hoje um

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axioma incontestável e, como Robinson (2011) defende, a escola pode não ter levado alguém a descobrir o seu potencial e a desenvolvê-lo, pode até ter feito acreditar a alguns que não têm qualquer potencial. Mas todo o ser huma-no tem o seu potencial, que pode e deve ser descoberto e promovido.

Consideramos ainda que o conceito de inteli-gência espiritual acrescenta também às outras conceções de inteligência o fator integração, pois para além da compreensão do que nos transcende, torna-se igualmente necessário integrar a diferença e a mudança, mas manten-do a identidade, a singularidade e o equilíbrio. O fator integração, enquanto potenciador da construção de um projeto de vida, possibilita a incorporação de novos elementos nas estrutu-ras já desenvolvidas, e sempre as redefinindo de modo a que elas façam parte da história quer do educador quer do educando, quer ainda da história da sua convivência. Os acontecimentos vividos e compreendidos são integrados pelo indivíduo no seu projeto de vida, atribuindo-lhes primeiramente um sentido, que é deter-minado pelas experiências de vida anteriores e dos significados previamente construídos, para depois de integrado o novo sentido, permitir a construção de novos sentidos que irão ser utili-zados em novas leituras tanto retrospetivas, re-definindo sentidos anteriormente construídos, quanto prospetivos, permitindo traçar novos projetos de vida, enquadrados numa nova visão do futuro, e estabelecendo uma nova direção para a vida. Desta forma, consegue-se ultrapas-sar o entorpecimento dos sentidos, que, geral-mente conduzem às várias formas de alienação. Com efeito, encontrar um sentido para o seu projeto de vida leva a que os indivíduos encon-trem uma direção, um caminho, um significado que tem de ser um significado útil, abrangen-te, integrador que permita orientarmo-nos no todo que é a nossa existência.

Num mundo cada vez mais global, que inclui e exclui, e paradoxal também porque permite o acesso ao exótico, ao excêntrico, mas pressiona ao mesmo tempo à homogeneização, os seres humanos, quer individualmente, quer em gru-po e comunidade, sujeitam-se à errância e, por isso, necessitam dos recursos que lhes permi-tem ancorar a identidade e aceder ao equilí-brio.

Processo possível através da mobilização e de-senvolvimento da inteligência espiritual em ge-ral e destes dois fatores em particular. É este o entendimento que condensamos de inteligên-cia espiritual, trabalhada já pelos investigado-res que revimos e que, como todas as outras formas de inteligência, se promove e deve fazer parte integrante do processo educativo com o objetivo de uma educação verdadeiramente transformadora. Para que tal possa acontecer, torna-se urgente que os educadores, na sua re-lação educativa, assumam uma efetiva lideran-ça pedagógica. Pois como Lück (2010) faz notar “todo o trabalho em educação, dada a sua na-tureza formadora, implica acção de liderança, que se constitui na capacidade de influenciar positivamente pessoas, para que, em conjun-to, aprendam, construam conhecimento, de-senvolvam competências, realizem projectos, promovam melhoria em alguma condição, e até mesmo divirtam-se juntas de modo cons-trutivo, desenvolvendo as inteligências social e emocional” (p. 17), e espiritual. Pois, como Zo-har (2005) salienta a liderança espiritualmente inteligente, com os seus 12 princípios - auto-perceção, espontaneidade, visão e valores, ho-lismo, compaixão, celebração da diversidade, independência do campo, tendência a pergun-tar porquê?, humildade [categorias que subsu-mimos ao fator transcendência], capacidade de reestruturar, sentido de vocação e uso positivo da adversidade [que subsumimos ao fator inte-gração]– que a inteligência espiritual usa para

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ultrapassar antigas motivações e criar novas - é igualmente importante porque possibilita uma atmosfera de cooperação e aprendizagem em qualquer sistema/contexto educativo, promo-vendo as qualidades e potencialidades de todos os aprendentes, independentemente das suas idades.

Considerações finais

Neste artigo pretendeu-se introduzir o con-ceito de inteligência espiritual no âmbito da educação, entendendo esta como um processo de transformação de um indivíduo em desen-volvimento. A inteligência espiritual encarada, particularmente, nas categorias anteriormente definidas, de transcendência e integração, será a base para uma educação transformadora na qual as potencialidades do educando são iden-tificadas e cultivadas; educação essa que possi-bilite que cada indivíduo se torne pessoa, mais realizada e mais feliz, tomando nas suas mãos as rédeas da sua própria existência, mas que passa incontornavelmente por uma (con)vivên-cia com o outro. Este tipo de educação, em que o indivíduo se desenvolve nas suas potenciali-dades de pessoa, segundo Robinson (2011), é a própria possibilidade de nos levar para o fu-turo, evitando de “afundar-nos no passado” (p. 237). Por outro lado, a relação com os outros, baseada nestes pressupostos, promove aqui-lo que Popper (1974) refere como sociedade aberta, implicando disponibilidade, solidarie-dade, acolhimento, generosidade, alicerces da convivência e da possibilidade de democracias plenas (Woods, 2011) e sociedades mais justas. Em tempos de crise, existe ora uma tendência para discursos catastrofistas, ora para sair em busca do Santo Graal em territórios desconhe-cidos, raramente observamos a tendência para olhar à nossa roda ou para dentro de nós pró-prios para encontrar soluções. O que cremos é que a possibilidade da mudança, nomeada-

mente a resolução dos problemas educativos contemporâneos, está em nós, nas capacidades humanas que possuímos, mas que desconhe-cemos ou que conhecemos mal, ou ainda que negligenciamos, muitas vezes por preconceito e falta de sentido crítico. A nossa perspetiva é que a inteligência espiritual é uma capacidade humana a ser explorada, quer na prática edu-cativa quer na investigação em educação, com fortes potencialidades para nos ajudar a en-frentar e a resolver os problemas educativos do século XXI.

1Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa. Lisboa: Verbo.2 Recuperado em 23 de março de 2015 de http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=esp%C3%ADrito

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REFLEXÃO

Liderança e Práticas Colaborativas em Contexto Escolar Um estudo de caso

Maria Manuela Ventura Santos Professora da

Escola Secundária de Cacilhas-Tejo

Este artigo visa traçar a importância das práticas colaborativas/partilha de saberes e evidenciar a relação entre uma perspetiva de liderança par-ticipada e a existência de práticas colaborativas entre profissionais, processos de colaboração em articulação com a gestão escolar (Freire, 2001).

Apresenta-se um estudo de caso realizado com um Conselho de Professores, centrado nos pro-cessos colaborativos que aí se desenvolvem entre pares. Este estudo resulta da aplicação de um questionário validado para a população portuguesa (versão adaptada do questionário Desenvolvimento Profissional dos Professores, no âmbito de um estudo internacional).

I - INTRODUÇÃO

I.1. A Formação Contínua de Professores – a importância das dinâmicas colaborativas em contexto escolar

Atualmente, perante os desafios que a socie-dade está a exigir, “num mundo dominado pela mudança, pela incerteza e por uma complexi-dade crescente” (Day, 2003, 151) a escola terá de funcionar como um “lugar de aperfeiçoa-mento onde se discuta e reflita sobre a cons-trução do conhecimento, onde se aposte no desenvolvimento de saberes partilhados (...) e na prática reflexiva” (Perrenoud, 2002, 77). Esta linha de pensamento vem ao encontro das ideias expressas por Paulo Freire (1995) que,

ao longo da sua obra, apelou a uma educação que se torne um processo de formação comum e permanente, no qual os educadores se preo-cupem com a formação global dos alunos. Esta conceção de educador pressupõe uma forma-ção contínua e continuada baseada na reflexão crítica, na partilha da prática, num continuum que se estenda por toda a carreira dos profes-sores (Tardif, 2002), que contribua para uma mudança pessoal e profissional significativa.

A Formação Contínua de Professores assume, assim, um papel muito importante. Alguns auto-res (Imbernón, 1997; Pimenta e Libâneo, 2002) defendem a importância de uma conceção ecológica da formação docente, que tenha em conta o indivíduo, a instituição, a comunidade - uma formação que tenha a prática educativa como objeto de análise, que permita aos pro-fessores compreender as relações entre a so-ciedade e os conhecimentos produzidos, e que os ajude a desenvolver a atitude de pesquisar como forma de aprender; que os professores deixem de ser meros consumidores de conhe-cimento e passem a produzi-lo, numa perspe-tiva colaborativa.

Acentua-se, pois, a necessidade dos professores se formarem num processo colaborativo que possibilite o desenvolvimento da capacidade de reflexão sobre a prática profissional (Elbaz, 1983; Schön, 1983). A capacidade de um pro-fessor construir a sua prática ou de a modificar reside na sua capacidade para a analisar (Altet, 2000). Como afirma Day (2005, 39): “os profes-sores que refletem na, sobre e em relação com a ação participam numa investigação que não só contribui para uma melhor compreensão de si mesmos como docentes, como também

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melhora o seu exercício profissional”. Assim, os professores ao refletirem sobre a prática peda-gógica, potenciam uma reconstrução continu-ada do seu modo de agir e de pensar; e, por outro lado, essa postura reflexiva pode ser o ponto de partida e de chegada de um processo promotor do diálogo, no quadro da vivência de momentos de partilha e de criação de espaços de troca de experiências.

Embora, a troca de experiências e de perspeti-vas acerca das mesmas, com carácter informal, tenha um forte potencial formativo e a sua presença esteja associada a organizações es-colares dinâmicas e com melhores resultados, a existência de oportunidades de colaboração estruturadas pode constituir um meio para pro-porcionar oportunidades de reflexão, de análise sobre a própria prática. Short. et al (citados por Freire, 2001) propõem um processo estrutura-do de colaboração, entre professores, direção, técnicos de apoio e pais que em conjunto po-dem formar equipas de resolução de proble-mas. Na verdade, um dos grandes desafios que hoje se colocam aos professores e às escolas é o da prevenção e resolução de situações proble-máticas, o que exige uma abordagem dinâmica, criativa, participativa, colaborativa e complexa a esses problemas. Aprender a lidar com estas situações requer uma aprendizagem contextu-alizada.

Através da literatura podemos verificar as po-tencialidades dos processos colaborativos. Co-hen (1981) sublinha os benefícios da colabo-ração entre os professores, afirmando que “a essência de um controlo profissional e de um crescimento intelectual contínuos reside no

contacto estimulante com pares que desafiam constantemente as ideias existentes acerca das crianças, do currículo, da gestão da sala de aula e de problemas mais vastos ligados à relação entre a escola e a comunidade” (p.165). Estes processos constituem oportunidades forma-tivas que se refletem em múltiplas dimensões do desempenho dos docentes. Caetano (2003) assinala as dimensões mais ligadas aos proces-sos de articulação entre o pensamento e a ação, designadamente: (i) desenvolvimento da ação, (ii) maior capacidade de reflexão, (iii) capacida-de de negociação, (iv) criatividade (…).

A implementação de ambientes de colabo-ração nas escolas, exige não somente novas formas de organização, como condições para que elas se desenvolvam, como alguns autores têm vindo a realçar. Na perspetiva de Hargrea-ves (1998), existem alguns requisitos para que a colaboração aconteça: (i) criar condições para o trabalho em equipa, (ii) reconhecer a existência de múltiplos caminhos a percorrer (iii) aceitar a diferença (…). A organização dos espaços e do tempo para a colaboração são aspetos bá-sicos, mas muito relevantes. Para Fullan e Har-greaves (2001) um dos principais desafios que as escolas enfrentarão neste século será o de conseguirem desenvolver um profissionalismo interativo entre os docentes.

Estamos, pois, perante novos desafios para a formação dos professores, que exigem coe-rência entre princípios educativos dominantes nas sociedades democráticas (que sublinham a importância das atividades de colaboração/co-operação no desenvolvimento dos alunos) e as conceções acerca da formação. Conceções es-sas que remetem para uma formação ao longo da vida e não circunscrita a um período deter-minado, o que altera o conceito de escola - uma organização dinâmica portadora de sentido – e o conceito de ser professor-hoje – aprendente ao longo da vida.

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I.2. A perspetiva de liderança participada – processos de colaboração em articulação com a gestão escolar

O conceito de colaboração não é novo mas ga-nhou ênfase no ensino – colaborar é o modo ideal para “assegurar o desenvolvimento pro-fissional dos docentes ao longo da carreira, a aprendizagem de excelência para os alunos e a transformação das escolas em autênticas co-munidades de aprendizagem” (Lima, 2002, 7).

A escola como contexto formativo, como es-paço de formação, assim como os professores, enquanto protagonistas principais, poderão desempenhar um importante papel no sentido de criar condições, operacionalizar estratégias e práticas necessárias a uma nova abordagem à formação contínua de professores, mais con-sentânea com as exigências do mundo atual, mais coerente com os princípios educativos hoje defendidos, mais adequada aos múltiplos desafios que se colocam aos professores.

Já em 1991, Nóvoa apontava para a pertinência destas dimensões da formação ao apelar para a criação de redes de autoformação participa-da, para a troca de experiências e a partilha de saberes que permitam constituir e consolidar espaços de formação mútua no interior dos es-tabelecimentos de ensino portugueses.

A colaboração é um processo dinâmico que pode assumir as mais diversas formas, desde a entreajuda, o mentorato, ou a tutoria até às formas mais implicadas de cooperação, que pode ocorrer no interior de efetivas parcerias pedagógicas, até à implicação em projetos de investigação-ação. Estes processos de colabo-ração podem ter um carácter mais ou menos informal. A colaboração formal assenta muitas vezes em processos de colegialidade ou em di-nâmicas planeadas e estruturadas em articula-ção com as instâncias de gestão escolar, que co-locam particulares dificuldades de organização.

Muitos autores têm abordado o tema de uma li-derança partilhada (Halsall, 1998; Fullan, 1993) que encoraje a formação de equipas para definir princípios e fins, construir projetos, planificar a ação, refletir sobre a ação com vista à mudan-ça. As escolas constituem, pois, organizações, cujo desenvolvimento está relacionado com os processos de gestão e de liderança internos e com o nível de participação dos diferentes protagonistas na sua dinâmica. É fundamental enquadrar os diversos domínios do quotidiano escolar, por uma liderança que, não se demi-tindo do seu papel coordenador e estimulador, saiba ao mesmo tempo promover a participa-ção empenhada de todos - comunidades de aprendizagem que envolvam os elementos da escola e a comunidade (Caetano, 2003) -, fo-mentar a participação ativa dos professores, o alargamento da atividade pedagógica a todos os espaços da escola. Neste sentido, promover a troca de saberes entre grupos de turmas dife-rentes, o encontro de professores para refletir e planificar, já que é através da abertura perma-nente para aprender, refletindo sobre a expe-riência, que as pessoas se desenvolvem, assim como as organizações e a sociedade.

Consideramos, assim, que a criação nas escolas de um clima de criatividade e mudança e de uma cultura de inovação encontra precisamen-te numa liderança alargada - desenvolvendo es-

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truturas facilitadoras da comunicação e da inte-ração - oportunidades para que os professores inovem, implicando-os num processo reflexivo e autocrítico sobre as suas práticas, fomentan-do a iniciativa de todos os que integram a co-munidade escolar. Segundo Hargreaves (2003) os líderes eficazes promovem a colaboração in-formal (para além da formal) entre os docentes, “integrando esforços profissionais conjuntos numa rede de relações duradouras e caracteri-zadas pela confiança mútua” (p. 220).

A criação e o desenvolvimento de dinâmicas de colaboração são, por sua vez, motores e vias de desenvolvimento das próprias escolas (Fullan, 1993; Garcia, 1995). Neste sentido, são uma verdadeira necessidade das escolas na con-juntura atual, de resposta à complexidade e às múltiplas exigências do mundo contemporâneo (Green, 1998; Johnston, 1994). Mas, cada esco-la possui as suas especificidades e, por isso, os processos conducentes a esse desenvolvimen-to deverão ser flexíveis, abertos, participados, eles próprios colaborativos e encarados como um conjunto de princípios de orientação para análise e desenvolvimento das escolas (Caeta-no, 2003, 23-24), em função das idiossincrasias que lhe são próprias.

Efetivamente, é necessário implementar pro-cessos investigativos e participativos de forma-ção na mudança da escola e dos professores (Estrela, 2001) - processos de formação que agreguem e estimulem o desenvolvimento de processos de mudança, criando hábitos e ne-cessidade de trabalho em equipa - processos colaborativos de formação. A proposta de for-mação do professor pela pesquisa não sobre o ensino e sobre os professores, mas para o en-sino e com os professores (Tardif, 2002) pode contribuir para a compreensão dos diferentes e complexos fenómenos que têm lugar na sala de aula, na escola e na sua ligação com a comuni-dade.

II - ESTUDO EMPÍRICO

II.1. Campo de estudo

A escola onde incidiu o estudo está situada na zona da Grande Lisboa, margem sul do Tejo. É uma escola pública de 2º e 3º Ciclos do Ensi-no Básico, sede de Agrupamento de escolas. A escola tem uma população heterogénea sob o ponto de vista sócio-cultural: crianças/jovens com idades compreendidas entre os 9 e os 16 anos. No ano a que se reporta o estudo aqui apresentado, uma das turmas da escola estava integrada no PIEF (Programa Integrado de Edu-cação e Formação1).

A seleção desta escola prendeu-se com o fac-to de existir alguma proximidade de uma das investigadoras relativamente a alguns sujeitos a envolver no estudo, pois, desde o primeiro momento se disponibilizaram para colaborar no trabalho de campo, o que permitiu criar ex-pectativas positivas, facilitando, assim, o início do trabalho empírico.

II. 2. Metodologia

Neste estudo, que assenta num processo de investigação que usa metodologias de natureza qualitativa e quantitativa, o grupo dos profes-sores e técnicos que têm a responsabilidade de trabalhar com a turma PIEF são o foco principal, dado que o seu trabalho tem uma forte compo-nente colaborativa.

Uma vez que um dos membros da equipa de in-vestigação se situa num quadro de proximidade em relação ao grupo de profissionais que cons-tituem o grupo PIEF (sete professores e dois técnicos), nesse contexto utiliza meios de inves-tigação como a observação naturalista e parti-cipante ou a entrevista. Por outro lado, dado existir um interesse na compreensão da pers-petiva dos outros professores acerca dos seus contextos de trabalho, utilizou-se um questio-nário2 de respostas fechadas (escalas de Likert

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de 1 a 5), que foi aplicado a toda a população docente da escola. Nesta parte do estudo, de que aqui se dá conta, foram analisados apenas os dados de duas escalas – liderança e relações de trabalho entre os professores. Os dados do questionário foram analisados estatisticamen-te, primeiro numa análise descritiva (cálculo de mediana, quartis e intervalo interquartis) e também através da aplicação de testes estatís-ticos de natureza não paramétrica (coeficiente de correlação de Spearman e teste de Wilco-xon-Mann-Whitney). Com estas análises pre-tendemos perceber se as opiniões dos profes-sores da escola em estudo indiciam a existência de uma relação entre a liderança da escola e as relações de trabalho, particularmente aquelas que exigem colaboração. Pretendemos ainda percecionar se existem diferenças entre as opi-niões dos professores que fazem parte do gru-po PIEF3 e os restantes professores da escola. O questionário foi aplicado a toda a população docente (N=110) e obtivemos 70 respostas. To-dos os professores do grupo PIEF responderam ao questionário (N=7).

II.3. Os resultados

A análise estatística descritiva dos dados em análise do questionário, para o conjunto da amostra (N=70), permite-nos inferir que, ape-sar das respostas, na grande maioria dos itens das duas escalas, se distribuírem entre os valo-res 1 e 5 (liderança e relações de trabalho), exis-te uma tendência para as respostas ao centro (mediana 3), reforçada pelos valores do 1º e 3º quartis, que também são genericamente muito próximos dos valores 2 da escala (1º quartil) e do valor 3 (3º quartil), o que se reflete nos bai-xos valores da dispersão interquartis (a grande maioria dos itens apresenta valores de zero e um). Estes resultados mostram a existência de uma cultura de escola pouco consolidada no que diz respeito aos aspetos estudados, uma vez que a tendência para as respostas no ponto

três da escala (“às vezes concordo, às vezes dis-cordo”) poder ser decorrente da existência de muitas diferenças entre o modo de atuar dos di-ferentes membros da população docente, e da gestão também, ou de uma certa incoerência no modo de agir de cada pessoa.

Sendo reduzida a dimensão da amostra, para uma análise de dados de carácter paramétri-co, tivemos que recorrer ao teste de Spearman para estudar a relação entre as variáveis ligadas à liderança e as variáveis ligadas aos contextos de trabalho dos professores, pelo que os resul-tados das análises devem ser lidos como mera-mente indicativos.

II.3.1. Relação entre liderança e relações de trabalho entre professores. A leitura dos resul-tados da aplicação do teste de Spearman indi-ca que os dois tipos de variáveis se apresentam muito relacionados, sendo grande parte das relações encontradas altamente significativas (p ≤0.01).

Observámos, assim, no que diz respeito às ca-racterísticas do líder da escola:

“ser encorajador”• e “comunicar abertamen-te com os outros” estão significativamente relacionadas com as dimensões quer da par-ticipação dos professores (em cargos de ges-tão intermédia e no quotidiano da escola), quer com as práticas de colaboração efetiva entre professores (“planificação em conjun-to”, “partilha de ideias e de materiais”, “pro-jetos de natureza interdisciplinar”), sendo o encorajamento a qualidade do líder que apresenta uma relação associada a uma maior diversidade de aspetos da colabora-ção. Estas características do líder estão ainda fortemente relacionadas com a construção da identidade da escola (“a existência de um propósito comum no sentido de um desem-penho de qualidade”, por exemplo);

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“• líder que apoia/ajuda” apresenta-se como uma característica intimamente relacionada com alguns aspetos da participação (parti-cularmente no que diz respeito às decisões mais ligadas à gestão do quotidiano pedagó-gico), mas não apresenta nenhuma relação com as práticas de colaboração entre pro-fessores. Esta qualidade do líder apresenta-se, todavia, com uma forte relação com os aspetos ligados à identidade da escola (“a existência de um propósito comum no sen-tido de um desempenho de qualidade”, por exemplo);

a imagem de • eficácia da liderança é um ou-tro aspeto que revela uma relação positiva muito significativa, quer com a participação, quer com a colaboração dos professores e também com a construção da identidade da escola;

também o facto da liderança se perspeti-• var como uma “liderança participada”, no sentido em que apela à participação em cargos de gestão, por um lado, e, por outro, se pauta pela aceitação dos pontos de vista dos outros, parece estar relacionado com a comunicação entre os docentes, o encoraja-mento, as tomadas de decisão pedagógicas e o trabalho de carácter interdisciplinar, bem como, com a existência de um “propósito co-mum de desempenho com qualidade”.

a dimensão da • colaboração através de pro-jetos de natureza interdisciplinar parece ser aquela que está mais associada às caracte-rísticas do líder, visto que, além de estar re-lacionada com as qualidades anteriormente referidas, apresenta também uma relação positiva significativa com a existência de uma liderança centrada nas pessoas.

II.3.2. As perspetivas dos professores PIEF e dos outros professores. A aplicação do teste de Wilcoxon-Mann-Whitney, bilateral e unilateral,

aponta não só para a existência de uma diferen-ça significativa no modo como os dois grupos de professores veem a liderança e as relações de trabalho na escola, mas também para a ten-dência dos professores do grupo PIEF terem uma visão mais positiva destes aspetos da sua vida profissional do que os restantes professo-res (a grande maioria dos itens apresenta dife-renças significativas para p≤0.01 e quase todos os restantes para p≤0.05). Apenas os itens que dizem respeito às condições para o desenvolvi-mento de um trabalho mais colaborativo não apresentam diferenças significativas (“na minha escola, os professores têm tempo e condições para discutir as suas práticas curriculares”, por exemplo).

Os dados recolhidos e analisados vêm ao en-contro da nossa hipótese de trabalho de que as oportunidades de trabalho colaborativo entre docentes constituem um fator de desenvolvi-mento profissional, na medida em que os con-textos e processos colaborativos proporcionam o desenvolvimento da competência técnico-profissional, ao mesmo tempo que as represen-tações sobre os contextos de trabalho, sobre si próprio e os outros, também sofrem mudan-ças. Essas mudanças traduzem-se numa maior valorização das oportunidades profissionais e numa maior confiança para enfrentar novas si-tuações.

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1 Programa criado por determinação do Ministério da Educação e do Ministérios do Trabalho e da Solidarie-dade Social (Despacho Conjunto nº 882/99).2Uma versão adaptada do questionário “Desenvolvi-mento Profissional dos Professores” de Maria Assun-ção Flores, Universidade do Minho e de Ana Marga-rida Veiga Simão, Universidade de Lisboa, construído no âmbito de um estudo internacional - Portugal, Fin-lândia e Sérvia e Montenegro.

3Estes professores ao participarem neste Programa estão a viver uma experiência de colaboração com os seus pares, que transforma as suas rotinas diárias.

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NOTÍCIA

Português Língua Não Materna (PLNM) Avaliação de Impacto e Medidas Prospetivas para a Oferta do PLNM

A Direcção geral da Educação publicou no seu sitio da internet o estudo “Avaliação de impacto e medidas prospetivas para a oferta do Português Língua Não Materna (PLNM) no Sistema Educativo Português”.

Este estudo caracteriza e avalia o impacto da aplicação do Português Língua Não Materna (PLNM) no ensino básico (1.º, 2.º e 3.º ciclos) e no ensino secundário.

Na introdução, os autores, Ana Madeira, Joana Teixeira, Fernanda Botelho, João Costa, Sofia Deus, Alexandra Fiéis, Ana Sousa Martins, Tiago Machete, Paulo Militão e Isabel Pessoa definem o âmbito finalidade e metodologia deste trabalho de investigação:

“Na sequência das políticas de integração linguística que têm sido implementadas no âmbito do sistema educativo nacional ao longo da última década, torna-se fundamental proceder a uma ava-liação do impacto do português língua não materna (PLNM) no ensino básico (1º, 2º e 3º ciclos) e no ensino secundário, relativamente à aprendizagem da língua portuguesa e ao aproveitamento dos alunos inseridos nesta área curricular.

Pretendendo contribuir para esta avaliação, o estudo que aqui se apresenta é constituído por duas componentes autónomas, embora complementares, que correspondem às duas principais tarefas realizadas no seu âmbito, designadamente (i) a aplicação de um inquérito (por questionário) de caracterização e avaliação do ensino do PLNM no sistema educativo nacional e do impacto das me-didas educativas neste domínio; e (ii) a realização de sete estudos de caso junto de Agrupamentos de Escolas (AE)/escolas não agrupadas que acolhem alunos de PLNM.”

Pode consultar este estudo em:

http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/Curriculo/EBasico/PLNM/estudo_plnm.pdf

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O homem, as viagensO homem, bicho da Terra tão pequenochateia-se na Terralugar de muita miséria e pouca diversão,faz um foguete, uma cápsula, um módulotoca para a Luadesce cauteloso na Luapisa na Luaplanta bandeirola na Luaexperimenta a Luacoloniza a Luaciviliza a Luahumaniza a Lua.

Lua humanizada: tão igual à Terra.O homem chateia-se na Lua.Vamos para Marte — ordena a suas máquinas.Elas obedecem, o homem desce em Martepisa em Marteexperimentacolonizacivilizahumaniza Marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.Vamos a outra parte?Claro — diz o engenhosofisticado e dócil.Vamos a Vênus.O homem põe o pé em Vênus,vê o visto — é isto?idemidemidem.

O homem funde a cuca se não for a Júpiterproclamar justiça junto com injustiçarepetir a fossarepetir o inquietorepetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.O espaço todo vira Terra-a-terra.O homem chega ao Sol ou dá uma voltasó para tever?Não-vê que ele inventaroupa insiderável de viver no Sol.Põe o pé e:mas que chato é o Sol, falso touroespanhol domado.

Restam outros sistemas forado solar a colonizar.Ao acabarem todossó resta ao homem

(estará equipado?)a dificílima dangerosíssima viagemde si a si mesmo:pôr o pé no chãodo seu coraçãoexperimentarcolonizarcivilizarhumanizaro homemdescobrindo em suas próprias inexploradas entranhasa perene, insuspeitada alegriade con-viver.

Carlos Drummond de Andrade

Mar

ia d

a lu

z Vie

ira

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Viagem É o vento que me leva. O vento lusitano. É este sopro humano Universal Que enfuna a inquietação de Portugal. É esta fúria de loucura mansa Que tudo alcança Sem alcançar. Que vai de céu em céu, De mar em mar, Até nunca chegar. E esta tentação de me encontrar Mais rico de amargura Nas pausas da ventura De me procurar... Miguel Torga

Entre Irse y QuedarseEntre irse y quedarse duda el día,enamorado de su transparencia.

La tarde circular es ya bahía:en su quieto vaivén se mece el mundo.

Todo es visible y todo es elusivo,todo está cerca y todo es intocable.

Los papeles, el libro, el vaso, el lápizreposan a la sombra de sus nombres.

Latir del tiempo que en mi sien repitela misma terca sílaba de sangre.

La luz hace del muro indiferenteun espectral teatro de reflejos.

En el centro de un ojo me descubro;no me mira, me miro en su mirada.

Se disipa el instante. Sin moverme,yo me quedo y me voy: soy una pausa.

Octavio Paz

Caminante No Hay CaminoCaminante, son tus huellasel camino y nada más;Caminante, no hay camino,se hace camino al andar.Al andar se hace el camino,y al volver la vista atrásse ve la senda que nuncase ha de volver a pisar.Caminante no hay caminosino estelas en la mar.

Antonio Machado

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