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RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO SOBRE UM PROJETO COM ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL Área temática: Ética e Responsabilidade Social Helena Maria Gomes Queiroz [email protected] Fernanda Carolina Abreu de Faria [email protected] Resumo: Atualmente, o trabalho infantil é objeto de estudos e alvo de intensas campanhas no mundo inteiro. No Brasil, Estado, sociedade, organizações do terceiro setor e empresas socialmente responsáveis vêm colocando de maneira crescente o combate ao trabalho infantil em suas pautas e projetos. O Projeto Aprendiz possibilita que adolescentes a partir dos 14 anos se integrem ao mundo do trabalho de forma legal, sistematizada e protegida e representa ainda uma boa oportunidade de as empresas agirem com responsabilidade social. O objetivo geral desse estudo é fazer uma análise crítica do PNJ, projeto de responsabilidade social realizado por uma entidade de formação técnico-profissional, situada na cidade de Belo Horizonte. A pesquisa desse trabalho é do tipo descritiva, com abordagem qualitativa e os instrumentos de coleta de dados utilizados foram: entrevista, análise documental e observação direta participante. Foram realizadas entrevistas com 15 adolescentes que participaram do projeto no período de março a maio de 2014. Os resultados da pesquisa apontam para a necessidade de as entidades de formação técnico-profissional refletir sobre formas mais socialmente responsáveis de lidar com a demanda do seu público alvo. Palavras-chaves:. ISSN 1984-9354

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RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO

SOBRE UM PROJETO COM ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL

Área temática: Ética e Responsabilidade Social

Helena Maria Gomes Queiroz

[email protected]

Fernanda Carolina Abreu de Faria

[email protected]

Resumo: Atualmente, o trabalho infantil é objeto de estudos e alvo de intensas campanhas no mundo inteiro. No

Brasil, Estado, sociedade, organizações do terceiro setor e empresas socialmente responsáveis vêm colocando de

maneira crescente o combate ao trabalho infantil em suas pautas e projetos. O Projet o Aprendiz possibilita que

adolescentes a partir dos 14 anos se integrem ao mundo do trabalho de forma legal, sistematizada e protegida e

representa ainda uma boa oportunidade de as empresas agirem com responsabilidade social. O objetivo geral desse

estudo é fazer uma análise crítica do PNJ, projeto de responsabilidade social realizado por uma entidade de formação

técnico-profissional, situada na cidade de Belo Horizonte. A pesquisa desse trabalho é do tipo descritiva, com

abordagem qualitativa e os instrumentos de coleta de dados utilizados foram: entrevista, análise documental e

observação direta participante. Foram realizadas entrevistas com 15 adolescentes qu e participaram do projeto no

período de março a maio de 2014. Os resultados da pesquisa apontam para a necessidade de as entidades de formação

técnico-profissional refletir sobre formas mais socialmente responsáveis de lidar com a demanda do seu público alvo.

Palavras-chaves:.

ISSN 1984-9354

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XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

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1. INTRODUÇÃO

O trabalho infantil no mundo e no Brasil não é um fenômeno novo e apresenta-se através de

uma história carregada de violência e exploração. No Brasil, as crianças e os adolescentes não tiveram

durante muito tempo nenhum dos seus direitos resguardados, sendo explorados e tratados como

objetos, e a condição peculiar de sujeitos em desenvolvimento não era uma preocupação do Estado, da

sociedade e nem das famílias, que muitas vezes legitimavam a exploração.

Durante muito tempo no país não houve políticas sociais voltadas para a criança e o

adolescente. Somente a partir do Decreto-Lei 1.313 de 1891, do Código de Menores, da Constituição

da República de 1988 e, posteriormente, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e do Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA), medidas protecionistas relativas ao trabalho e à profissionalização da

criança e do adolescente foram criadas.

O trabalho infantil hoje é objeto de estudos e alvo de intensas campanhas no mundo inteiro. No

Brasil, Estado, sociedade, organizações do terceiro setor e empresas socialmente responsáveis vêm

colocando de maneira crescente o combate ao trabalho infantil em suas pautas e projetos.

Com a criação da Lei 10.097/2000 ficou determinado que os estabelecimentos de qualquer

natureza que tenham pelo menos sete empregados, são obrigados a contratar e matricular aprendizes na

faixa etária de 14 a 24 anos nos cursos de aprendizagem, no percentual mínimo de 5% e, máximo, de

15%, calculado sobre o total de empregados cujas funções demandem formação profissional.

A Lei da Aprendizagem surge como uma forma de impedir legalmente que crianças menores de

14 anos trabalhem e sejam exploradas e para facilitar a inserção de adolescentes e jovens entre 14 e 24

anos no mercado de trabalho. Entretanto, mesmo com uma legislação vigente que proíbe o trabalho

infantil, ainda se vê muitas crianças trabalhando de forma ilegal no Brasil, em condições precárias e

em atividades consideradas penosas e degradantes. Com pais ou responsáveis legais recebendo baixos

salários ou até mesmo desempregados, muitas crianças vêem-se forçadas a trabalhar, ficando

condenadas ao baixo rendimento ou evasão escolar e a outras vulnerabilidades e riscos.

Além disso, ainda que exista a Lei da Aprendizagem, que contribui para o acesso dos

adolescentes e jovens ao mundo do trabalho de forma legal, sistematizada e protegida, é um grande

desafio para o adolescente, principalmente aquele de baixa renda e em situação de vulnerabilidade ou

risco social, encontrar uma primeira oportunidade de trabalho.

É possível observar que muitas empresas concebem a contratação de um aprendiz apenas como

uma obrigação legal e não como uma forma de agir com responsabilidade social, demonstrando assim

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a falta de compreensão do programa de aprendizagem, da sua relevância social e da função educativa

do trabalho protegido na vida do adolescente. É importante ressaltar, que o conceito de

responsabilidade social é amplo e multifacetado e envolve um verdadeiro entendimento e

comprometimento ético das organizações e pessoas envolvidas.

Por outro lado, as entidades qualificadas e autorizadas a realizar essa formação técnico-

profissional, registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e

cadastradas no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), têm o grande desafio de também realizarem

verdadeiramente o papel e a função social aos quais se propuseram, cumprindo não somente com as

determinações legais para a realização dessa atividade com o seu público assistido, mas também com a

responsabilidade ética e social envolvida no combate ao trabalho infantil, no compromisso com o

futuro das crianças e na formação humana, cidadã e profissional dos aprendizes.

O objeto de estudo do presente trabalho é um projeto de responsabilidade social, doravante

denominado de PNJ, executado por uma entidade de formação técnico-profissional, situada na cidade

de Belo Horizonte. O Projeto PNJ prepara para o mundo do trabalho através de cursos de qualificação

profissional e de um processo de orientação profissional adolescentes com idade entre 15 anos e 10

meses e 17 anos que não conseguiram ingressar no programa de aprendizagem na idade exigida pela

entidade (de 15 anos e 8 meses a 15 anos, 9 meses e 29 dias). Entretanto, nem todos os adolescentes

que recebem esta preparação são inseridos na entidade após a conclusão do Projeto PNJ voltando a

ficarem expostos às inúmeras vulnerabilidades e riscos sociais existentes no meio em que vivem.

Este estudo é relevante, pois propõe uma reflexão sobre um assunto que está em pauta de forma

crescente no mundo de hoje - a questão do trabalho infantil e da responsabilidade social envolvida na

formação e na inserção de um adolescente no mundo do trabalho.

Nesse contexto, o objetivo geral deste artigo é fazer uma análise crítica do Projeto PNJ,

propondo uma reflexão sobre novas possibilidades de atuação com os adolescentes assistidos, a fim de

cumprir de maneira mais eficaz com o objetivo da responsabilidade social proposta.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Responsabilidade Social e Gestão de Pessoas

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Segundo Orlickas (2001), à área de Recursos Humanos, sob a designação de departamento

pessoal, como em algumas empresas era denominada (e como o é em tantas outras), coube, no

passado, a tarefa de admitir funcionários, registrá-los legalmente, controlar as normas seguidas por

eles, puni-los, apontar seus cartões de ponto e dispensá-los. Cabia-lhes, portanto, segundo a autora,

uma ação fiscalizadora e reparadora.

Com a evolução das técnicas de administração, como o advento da Escola d e Relações

Humanas e o grande aperfeiçoamento das teorias sobre comportamento organizacional, a ação

dessa foi se tornando cada vez mais orientada para seleção, cargos e salários, treinamento,

benefícios, serviço social, etc. (ORLICKAS, 2001, p.26)

Orlickas (2001) afirma que ainda que o papel da área de Recursos Humanos tenha passado por

grandes transformações, muitas empresas ainda continuam mantendo o antigo modelo de

administração de pessoal. Segundo a autora, empresas consideradas tradicionais mantêm ainda sob a

denominação de administração de pessoal o sistema burocratizado de controle dos aspectos

jurídicos/legais, com total ausência de políticas na gestão de seus Recursos Humanos, onde a palavra-

chave era produtividade, não importando a qualidade. Essa situação continua a autora, acompanhada

de uma hierarquia formal no ambiente organizacional, dificulta a comunicação, o fluxo de informações

e a participação efetiva dos envolvidos.

A existência de estruturas organizacionais incompatíveis com a criação de grupos de trabalho

flexíveis, segundo Orlickas (2001), dificulta o trabalho entre as pessoas, a troca de ideias e o

desenvolvimento do trabalho de equipe. Nesse estilo gerencial, a autora afirma que configura uma

gerência burocrática e controladora, que não busca proximidade com seus subordinados (porque é

assim que são considerados), não busca ouvi-los, discutir o seu trabalho e desenvolver sua capacitação

e, principalmente, não sabe lidar com as competências de cada um.

Colaboradores ávidos para contribuir, participar, inovar e enriquecer o trabalho da empresa são

subestimados. Esquecidos, eles acomodam-se ou buscam outro ambiente no qual sua competência seja

valorizada. (ORLICKAS, 2001).

De acordo com Orlickas (2001), o aperfeiçoamento do trabalho nas organizações modernas,

incrementado pelo impacto da inovação tecnológica e acesso rápido à informação e à globalização,

vem desenvolvendo e dimensionando uma visão especial e muito clara sobre o novo papel da área de

Recursos Humanos.

Hoje, afirma Orlickas (2001), a palavra-chave é competitividade. Em sua essência, o trabalho é

processado por pessoas e o produto de seu trabalho destina-se às pessoas. As máquinas, por mais

sofisticadas que sejam, são ferramentas do homem no trabalho. Elas não pensam, não sonham, não

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planejam, não agregam valor, não fazem diferente. Independentemente do objetivo e da estrutura

organizacional, quando se cria uma empresa, necessita-se de um componente essencial: pessoas.

(ORLICKAS, 2001).

E, à medida que a organização vai crescendo e que as situações vão se tornando cada vez mais

complexas, afirma Orlickas (2001), começam a se abrir alguns novos espaços para outras iniciativas:

melhorar o processo seletivo, desenvolver treinamentos, etc.

A essência do capitalismo, segundo Gil (2010), é o lucro e há quem admita que a

responsabilidade de uma empresa consista exclusivamente em maximizar o lucro de seus acionistas.

Verifica-se, portanto, segundo o autor, forte tendência para admitir que as empresas devem assumir

valores éticos, respeitar seus funcionários, proteger o meio ambiente e comprometer-se com as

comunidades. Funcionários, comunidades e clientes estão sendo vistos como uma nova espécie de

sócios do negócio, prontos para compartilhar resultados.

Responsabilidade social, portanto, segundo Gil (2010), passa a fazer parte da agenda das

empresas que desejam sobreviver. Segundo o autor, a norma internacional de responsabilidade social,

a Social Accountability 8000 (SA8000), atesta a qualidade ética das relações humanas envolvidas no

processo produtivo e, para recebê-la, a empresa precisa demonstrar que: não emprega trabalho infantil

ou trabalho forçado e não admite fornecedores que os empreguem; garante igualdade de salários para

homens e mulheres; não mantém nenhuma discriminação de raça, sexo religião, orientação sexual nas

contratações, promoções, acesso a treinamentos; etc.

Segundo Werlang (2003), as organizações ainda estão construindo de forma incipiente, na

maioria dos casos, seus modelos de gestão de responsabilidade social. A autora afirma que muitas das

ações relacionadas a esse tema estão sob a responsabilidade dos gestores de recursos humanos.

Isso ocorre na medida em que algumas das condições essenciais para o desenvolvimento da

cidadania empresarial são a qualidade de vida, a empregabilidade e os benefícios concedidos

aos trabalhadores. (WERLANG, 2003, p.317)

Segundo Goldstein (2007), ações voltadas para a comunidade e para o meio ambiente

representam somente duas das várias possibilidades de atuação socialmente responsável de uma

organização. Para a autora, seria possível uma empresa ser considerada socialmente responsável sem

estar envolvida diretamente em nenhum projeto educacional, cultural ou de geração de renda voltado a

comunidades carentes, contanto que mantivesse, por exemplo, um excelente programa de qualidade de

vida para seus colaboradores, critérios de seleção rigorosos para seus fornecedores e um programa

eficaz de economia de eletricidade e de água em suas unidades.

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Segundo Dias (2012), a dimensão interna da responsabilidade social se refere principalmente

aos temas relacionados com os trabalhadores da empresa, bem como com o envolvimento da atividade

empresarial com o respeito ao meio ambiente. Em termos gerais, o autor afirma que as práticas

responsáveis afetam os trabalhadores e se referem a questões como o investimento em recursos

humanos, a saúde e a segurança dos trabalhadores e a gestão e adaptação à mudança.

A gestão responsável dos Recursos Humanos, segundo Dias (2012), envolve o compromisso de

promover princípios como a não discriminação e apoiar-se no mérito, bem como a compatibilização da

vida pessoal com o trabalho e a promoção de um bom ambiente de trabalho. O autor afirma que os

elementos fundamentais para a implementação de uma gestão responsável dos RH devem ser pelo

menos: desenvolver uma organização flexível; identificar e formalizar as expectativas mútuas entre a

empresa e seus trabalhadores; a obtenção de um maior equilíbrio entre trabalho, família e lazer;

investimento em programas de formação permanente de pessoal; garantia de igualdade de remuneração

e de perspectivas profissionais para as mulheres; a busca de uma maior diversidade dos recursos

humanos, com a aplicação de práticas responsáveis de contratação não discriminatórias, visando não

dificultar o acesso de pessoas pertencentes a minorias étnicas, pessoas idosas, mulheres, pessoas com

algum tipo de deficiência, etc; promover o máximo desenvolvimento das capacidades das pessoas, e

avançar na qualidade do desempenho relativo à gestão do RH.

Os indicadores de responsabilidade social apresentados pelo Instituto Ethos (2015) em sua 3ª

versão, abordam no tema Público Interno nove subtemas denominados Práticas de Trabalho, são eles:

Compromisso com a Gestão Participativa; Relação com Trabalhadores Terceirizados, Temporários ou

Parciais; Política de Remuneração, Benefícios e Carreira; Cuidados com Saúde, Segurança, Higiene e

Condições de Trabalho; Compromisso com o Desenvolvimento Profissional e a Empregabilidade;

Comportamento frente a Demissões; Preparação para a Aposentadoria; Compromisso com o Futuro

das Crianças; Compromisso com o Desenvolvimento Infantil.

Os dois últimos indicadores apresentados, Compromisso com o Futuro das Crianças e

Compromisso com o Desenvolvimento Infantil, dizem respeito diretamente ao tema desse estudo. De

acordo com Coelho (2004), espera-se de uma empresa socialmente responsável, com relação ao seu

público interno, que, além de respeitar a legislação nacional que proíbe o trabalho antes dos 16 anos,

exceto na condição de aprendiz, entre 14 e 16 anos, a empresa desenvolva também projetos internos de

integração e apoio aos filhos dos funcionários. E, tão importante quanto isso, segundo a autora, é a

empresa procurar garantir que na sua rede de fornecedores e empresas subcontratadas o trabalho

infantil também não seja praticado.

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Um comportamento organizacional ético também deve apresentar um programa que demonstre

o compromisso com o futuro dos jovens e adolescentes, que pode ser atendida a partir de programas de

aprendizes, projetos internos de integração dos filhos dos funcionários e uma sólida atuação junto à

comunidade. (ETHOS, 2015)

Kofi Annan, Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, propôs pela primeira vez a

ideia de um Pacto Mundial em seu discurso no Fórum Econômico Mundial em 31 de janeiro de 1999.

Em 26 de julho de 2000, o Secretário Geral convidou dirigentes empresariais a somar-se à iniciativa de

reunir empresas, organismos das Nações Unidas, trabalhadores e representantes da sociedade civil para

apoiar novos princípios universais em matéria de direitos humanos, trabalho e meio ambiente. O Pacto

Mundial tenta promover, mediante a força da ação coletiva, o civismo empresarial responsável, a fim

de que o mundo dos negócios passe a fazer parte da solução dos desafios que estão relacionados com a

mundialização. (COELHO, 2004)

Segundo Coelho (2004), os nove princípios universais do Pacto Mundial foram denominados

Agenda Global Compact. Aqui se destaca aquele princípio que diz respeito ao trabalho infantil:

Apoiar a erradicação efetiva do trabalho infantil. Os trabalhadores não devem usar o trabalho

infantil, seja nos seus locais de trabalho ou nas cadeias produtivas, por intermédio de subcontratações.

As crianças representam a força de trabalho do futuro. Mantê-las no mercado de trabalho, em

detrimento de sua freqüência à escola, compromete o desenvolvimento integral delas, a

competitividade futura das empresas e da economia, e também a capacidade sustentável de

desenvolvimento de um país. Em situações em que necessidades de renda familiar promovam o

trabalho infantil, é fundamental uma atuação forte e conjunta de governos, sociedade civil e empresas,

de maneira a não expor crianças a qualquer tipo de exploração ou perigo e de forma que não

comprometa seu desenvolvimento físico, educacional, moral e psicológico. Todos devemos colaborar

para melhorar essa situação, buscando maneiras de subsistir as crianças no mercado de trabalho, de

modo a preservar suas vidas, elevando o índice de desenvolvimento de capital humano de sua

sociedade.

De acordo com Silva, Neves Junior e Antunes (2002), reconhecer a necessidade imperiosa de

prevenir e erradicar o trabalho infantil é reconhecer que o problema do trabalho da criança e do

adolescente representa um tema de suma importância na agenda social.

Muitas empresas e gestores de pessoas já têm essa visão e o comprometimento ético e

socialmente responsável com a questão da erradicação do trabalho infantil, entretanto, muitos outros

ainda não se responsabilizam e não fazem a sua parte diante dessa problemática, inclusive se omitindo

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a cumprir com a Lei 10.097. A questão do trabalho infantil e suas conseqüências na vida das crianças

são abordadas no próximo tópico.

2.2 Trabalho Infantil

Silva, Neves Junior e Antunes (2002), apontam que infância e adolescência são etapas da vida

que devem ser dedicadas fundamentalmente à educação e à formação do indivíduo. Os autores

afirmam que o trabalho precoce pode inviabilizar a freqüência às aulas ou mesmo reduzir a qualidade

do seu aproveitamento, resultando, muitas das vezes, em evasão escolar.

No tocante à formação (desenvolvimento) do indivíduo, Silva, Neves Junior e Antunes (2002),

afirmam que o trabalho precoce pode implicar em sérios prejuízos, tais como: estresse físico, social,

responsabilidade excessiva, trabalho insalubre e penoso, entre outros.

Segundo Santos (2002), a criança que trabalha quase sempre o faz em detrimento da escola, o

que gera um adulto com baixa qualificação e que encontrará maiores dificuldades para competir no

mercado de trabalho. Com isso, continua ele, o indivíduo adulto vê escassas suas chances de ascensão

social, passa a viver sob a sombra do desemprego e, muitas vezes, termina por introduzir seus próprios

filhos precocemente no trabalho com a finalidade de ajudar a garantir o sustento da família.

Cosendey (2002), afirma que o trabalho infantil impede que a criança tenha um

desenvolvimento harmonioso, exige um amadurecimento precoce e rouba-lhe a infância. Segundo a

autora, esse período é profícuo, tudo que se ensina é rapidamente aprendido, e, portanto, se uma

criança não vai para a escola na época certa, terá dificuldades em recuperar o que não foi assimilado.

Alguns tipos de trabalho, no entanto, podem contribuir para o desenvolvimento da criança e do

adolescente possuindo uma função educativa em sua vida, como defendem alguns autores. Segundo

Cosendey (2002), historicamente, crianças e adolescentes sempre trabalharam. A autora afirma que

desde os tempos bíblicos há relatos de Jesus ajudando o pai carpinteiro, assim como os índios, mantém

em sua cultura a participação das crianças em atividades laborativas, como caça, pesca, afazeres

domésticos e artesanato.

Cosendey (2002) acredita que a educação participativa é salutar para o desenvolvimento do ser

humano e fortalece vínculos familiares, entretanto, existe outro trabalho infanto-juvenil que, segundo

ela, é explorador e rouba o tempo precioso de vivenciar uma infância e adolescência rica em

brincadeiras, com boas horas de sono e amplo tempo para estudar e aprender.

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Em 2002, de acordo com Silva, Neves Junior e Antunes (2002), mais de 8 milhões de pessoas

entre 5 e 17 anos de idade estavam engajadas em atividades inquestionavelmente reconhecidas como

as piores formas de trabalho infantil, ou seja, em prostituição, em trabalho escravo, em atividades

ilícitas (como o narcotráfico), ou na indústria pornográfica, ou mesmo até trabalhando como soldados

em guerras.

O início do século XX, segundo Cosendey (2002), passa a ser um marco nas relações

trabalhistas, pois aí está o cume do movimento abolicionista e o início da industrialização, que quebra

a relação de trabalho familiar e passa a exigir a relação de trabalho com a obrigação de produção e

cumprimento de jornada rígida de trabalho. A autora afirma que estes acontecimentos contribuíram

para o êxodo do homem do campo para a cidade.

A luta das famílias pobres, oriundas do campo, pela sobrevivência nos grandes aglomerados

urbanos foi sempre árdua, pois não estavam preparadas para exercer funções q ue lhes

rendessem boa remuneração. Ganhando salários parcos e tendo que arcar com o pagamento de

todos os serviços utilizados (saúde, transporte, alimentação, moradia, água, luz, impostos, etc),

os membros das famílias tiveram que ir à luta. (COSENDEY, 2002, p.47)

Analisando o contexto sócio-familiar das crianças envolvidas com algum tipo de trabalho,

Cosendey (2002) afirma que a exploração do trabalho infantil existe, principalmente, pela condição de

miserabilidade e desestruturação das famílias, ausência de políticas públicas e a péssima distribuição

de renda do Brasil. De acordo com o artigo 424 da CLT – “É dever dos responsáveis legais de

menores, pais, mães ou tutores, afastá-los de empregos que diminuam consideravelmente o seu tempo

de estudo, reduzam o tempo de repouso necessário à sua saúde e constituição física, ou prejudiquem a

sua educação moral”.

Santos (2004) afirma que o combate ao trabalho infantil é um dos pontos centrais em qualquer

estratégia que tenha por objetivo a melhora dos indicativos sociais e redução da pobreza. A miséria e a

necessidade de sobrevivência, segundo Cosendey (2002), levam os pais à conivência com o trabalho

precoce dos filhos e normalmente, as crianças exploradas no trabalho são filhos de pais que também

passaram por essa situação e não conseguiram interromper o círculo. Para a autora, a sociedade muitas

vezes também reforça a exploração, na medida em que consome produtos oriundos do trabalho infantil

e não denuncia aos órgãos competentes a exploração de mão de obra infanto-juvenil.

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD), realizada pelo

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2012 para 2013 houve queda de 15% no

número de crianças de 5 a 13 anos que estavam em situação de trabalho infantil. Entretanto, ainda se

vê muitas crianças e adolescentes de classes pobres, tanto nos meios urbanos quanto rurais do Brasil,

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envolvidos com trabalhos marcados pela informalidade, que prejudicam a frequência escolar e os

expõem a diversas situações de risco.

Cosendey (2002), afirma que o Decreto-Lei 1.313 de 1891, foi a primeira norma legal de

proteção ao trabalho infanto-juvenil que proibia o trabalho de pessoas com menos de 12 anos de idade,

fazia restrições a certas operações com maquinários e limitava a jornada em sete horas diárias, além de

proibir o trabalho noturno.

Em 1927, segundo Santos (2004), o Código de Menores da América Latina, vedava o trabalho

às pessoas menores de 12 anos, assim como proibia o trabalho noturno para menores de 18 anos.

Posteriormente, em 1932, segundo o autor, o Decreto nº 22.042 regulamentou o trabalho dos

adolescentes entre 14 e 18 anos no setor industrial, merecendo destaque por conter em seu texto uma

nítida preocupação com a saúde e educação desses trabalhadores.

A Constituição Federal de 1988, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Lei

10.097/2000 trouxeram para a legislação brasileira avanços significativos com relação à proteção das

crianças e dos adolescentes brasileiros. Com o advento da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT,

segundo Santos (2004), a idade mínima para o trabalho era de 12 anos, mas com a alteração do art.403

pela Lei 10.097, de 19.12.00, estendeu-se a proibição do trabalho infantil para as pessoas menores de

16 anos, com a ressalva de que as com idade entre 14 e 16 anos poderiam ser admitidas na condição de

aprendiz.

Outro importante dispositivo legal que trata desse tema é o Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), aprovado pela Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, e que também prevê o direito à

aprendizagem. Segundo Silva, Neves Junior e Antunes (2003), o ECA busca assegurar às crianças e

aos adolescentes o pleno desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de

liberdade e dignidade. De acordo com os autores, para além dos direitos fundamentais consagrados na

Constituição Federal – o direito à convivência familiar e comunitária, o direito à educação, à cultura,

ao esporte e ao lazer, o ECA também regula o direito à profissionalização e à proteção no trabalho.

A Constituição Federal, em seu art. 7°, inciso XIII, proíbe todo e qualquer tipo de trabalho aos

menores de 16 anos, à exceção do trabalho na condição de menor aprendiz, a partir dos 14 anos, tema

abordado no próximo tópico.

2.3 Projeto Aprendiz

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A regulação do trabalho do menor aprendiz se sustenta em dois diplomas legais: a

Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, cujos dispositivos foram objeto de alteração pela Lei

10.097/2000, viabilizando a aprendizagem fora dos Serviços Nacionais de Aprendizagem e a melhor

delimitação da jornada de trabalho, dos salários e das formas de contratação. (SILVA, NEVES

JUNIOR, ANTUNES, 2003)

Desde 2000, as empresas brasileiras são obrigadas, por lei, a incluir determinado número de

aprendizes em seu quadro de funcionários. A medida procura minimizar a taxa de desemprego entre os

jovens, faixa etária que enfrenta grandes dificuldades para se inserir no mercado de trabalho em

virtude de sua falta de experiência. Além disso, a lei estabelece que as empresas que não cumprirem a

lei 10.907 ficam sujeitas à multa de um salário mínimo por mês para cada aprendiz não empregado.

(GOLDSTEIN, 2007)

O art. 429 da CLT coloca que os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a

empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes

equivalente a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada

estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. Os Sistemas Nacionais de

Aprendizagem são as entidades integrantes do Sistema “S”, nas quais se incluem o Serviço Nacional

de Aprendizagem Industrial – SENAI, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio – SENAC, o

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR, o Serviço Nacional de Aprendizagem do

Transporte – SENAT, e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo – SESCOOP.

Caso os Serviços Nacionais de Aprendizagem não ofereçam cursos ou vagas suficientes para

atender à demanda dos estabelecimentos, esta poderá ser suprida pelas Escolas Técnicas de Educação,

inclusive as agrotécnicas.

O Terceiro Setor, também possui importante papel como entidade educacional

complementando a demanda criada pelo mercado. De acordo com o art. 430, da CLT, as entidades sem

fins lucrativos, que tenham por objetivo a assistência ao adolescente e à educação profissional,

registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), estão

autorizadas a promover a formação técnico-profissional metódica, como coloca a lei. (Manual da

Aprendizagem, 2014)

As empresas privadas, portanto, podem procurar essas entidades do Terceiro Setor com o

objetivo de atender às exigências da lei e também, como em alguns casos, à responsabilidade social

envolvida na atitude de contratar um aprendiz.

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A aprendizagem é um instituto que cria oportunidades tanto para o aprendiz quanto para as

empresas, pois dá preparação ao iniciante de desempenhar atividades profissionais e de ter capacidade

de discernimento para lidar com diferentes situações no mundo do trabalho. Ao mesmo tempo, permite

às empresas formarem mão de obra qualificada, algo cada vez mais necessário em um cenário

econômico em permanente evolução tecnológica. (Manual da Aprendizagem, 2014)

A formação técnico-profissional deve ser constituída, de acordo com a Lei da Aprendizagem,

por atividades teóricas e práticas, organizadas em tarefas de complexidade progressiva, em programa

correlato às atividades desenvolvidas nas empresas contratantes. O objetivo é proporcionar ao aprendiz

uma formação profissional básica e essa formação realiza-se em programas de aprendizagem

organizados e desenvolvidos sob orientação e responsabilidade de instituições formadoras legalmente

qualificadas. (Manual da Aprendizagem, 2014)

A CLT, em seu art. 428, conceitua o contrato de aprendizagem como um:

contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o

empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 anos e menor de 24 anos inscrito em

programa de aprendizagem de formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu

desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as

tarefas necessárias a essa formação.

Segundo Goldstein (2007), formar e empregar aprendizes é uma ação de cidadania empresarial,

por permitir a formação e a inserção de jovens num mercado de trabalho cada vez mais excludente,

dando-lhes atenção integral numa fase decisiva da vida deles. A autora afirma que o ideal é ir além do

que exige a lei.

Mais do que educação para o trabalho, trata-se de buscar a educação no trabalho. Enquanto a

primeira formulação carrega uma concepção mais técnica e instrumental de educação, em que a

adequação ao mercado é a finalidade ultima, a segunda sugere que o trabalho não é uma

finalidade em si, mas uma circunstância fértil para o desenvolvimento dos jovens, de modo que

a qualidade e a abrangência da formação dos aprendizes importam tanto quanto sua

empregabilidade ao término da aprendizagem. (GOLDSTEIN, 2007, p.78)

Apesar da existência de uma legislação que protege as crianças do trabalho infantil e contribui

para a ampliação do número de vagas para os adolescentes no mercado de trabalho, obrigando as

empresas a darem espaço para esse público, os adolescentes de baixa renda ainda enfrentam muitas

dificuldades de inserção no mundo do trabalho.

Mesmo sendo alvo de políticas públicas para a juventude o que se observa é que esse público

sofre, muitas vezes, por despreparo e desinformação. Perdidos, sem saber onde buscar o primeiro

emprego, muitos adolescentes acabam por perder a idade restrita exigida pelas instituições de

formação técnico-profissional, ficando desocupados por quase toda a adolescência, ou como em

muitos casos, envolvendo-se em formas alternativas ou ilícitas de remuneração.

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3. METODOLOGIA

O objeto de estudo do presente trabalho é um projeto de responsabilidade social realizado por

uma entidade do Terceiro Setor, situada na cidade de Belo Horizonte, que atua com a formação

técnico-profissional de adolescentes de baixa renda, em situação de vulnerabilidade ou risco social. A

pesquisa desse trabalho é do tipo descritiva, com abordagem qualitativa, visto que, para Gil (1988), as

pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada

população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relações entre variáveis.

Para Bertucci (2008), pesquisas descritivas não constituem tipos menores de pesquisa e,

embora transmitam inicialmente a ideia de que apenas relatam ou descrevem uma situação, elas têm

como objetivo principal estabelecer relações entre as variáveis analisadas e levantar hipóteses ou

possibilidades para explicar essas relações (não de forma definitiva, o que as transformaria em

explicativas).

Quanto aos meios de pesquisa, foram utilizados a pesquisa bibliográfica e o estudo de caso.

Pesquisa bibliográfica, segundo Vergara (2009), é o estudo sistematizado desenvolvido com base em

material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é, material acessível ao público

em geral.

Na opinião de Bertucci (2008), quando se identifica um problema específico relativo a uma

organização e esse problema é analisado em profundidade, a técnica utilizada é o estudo de caso. O

autor também afirma que estudos de caso são de natureza eminentemente qualitativa e valem-se

preferencialmente de dados coletados pelo pesquisador por meio de consulta a fontes primárias e/ou

secundárias, de entrevistas e da própria observação do fenômeno. Isso não significa, contudo, que não

se possa utilizar dados quantitativos em estudos de caso.

Os instrumentos de coleta de dados utilizados nesse trabalho foram: entrevista, análise

documental e observação direta participante. A entrevista, segundo Bertucci (2008), consiste em uma

indagação direta, realizada no mínimo entre duas pessoas, com o objetivo de conhecer a perspectiva do

entrevistado sobre um ou diversos assuntos. De natureza subjetiva, a entrevista constitui um dos mais

úteis instrumentos de coleta de dados na área de ciências sociais aplicadas, na qual se incluem as

ciências gerenciais.

Foram realizadas quinze entrevistas, no mês de fevereiro de 2015, dirigidas a adolescentes que

participaram do Projeto PNJ no primeiro semestre de 2014. A população amostral selecionada é

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residente de uma comunidade em situação de vulnerabilidade e risco social de Belo Horizonte, que foi

assistida pelo Projeto PNJ em 2014.

A análise documental foi utilizada com o objetivo de fazer o levantamento do perfil social,

econômico e familiar dos adolescentes pesquisados. Foram analisados documentos do projeto tais

como fichas de cadastro e planilhas de mapeamento de perfil. A pesquisa documental, segundo

Bertucci (2008), consiste na realização do trabalho monográfico tendo como referência a leitura, a

análise e a interpretação de documentos existentes acerca de um determinado fenômeno. Esses

materiais, de acordo com o autor, podem ser livros e artigos científicos, como também outros relatórios

de pesquisa, documentos internos disponibilizados por órgãos públicos, organizações ou famílias,

documentos de época, fotos, gravações, informações extraídas de jornais, revistas e boletins.

Outra técnica utilizada foi a observação direta participante, pois a pesquisadora é também

colaboradora do Projeto PNJ. A observação direta, segundo Bertucci (2008), para a elaboração de

TCCs, constitui uma técnica preciosa, especialmente quando o aluno trabalha na empresa onde está

realizando seu trabalho. Contudo, é necessário transformar percepções pessoais em observações

científicas. O autor afirma que a observação direta, no caso da realização de trabalhos em empresas,

possibilita ao pesquisador um lugar privilegiado para relatar e analisar situações.

O perfil dos 15 adolescentes entrevistados que participaram do Projeto PNJ no primeiro

semestre de 2014 é composto por 9 mulheres e 6 homens. Quanto a idade, 11 deles tem 16 anos e 4, 17

anos. Todos eles já haviam passado da idade de cadastro na entidade pesquisada, que seria de 15 anos

e 8 meses até 15 anos, 9 meses e 29 dias. A idade da população amostral no período da entrevista foi:

11 estavam com 17 anos e 4, com 18 anos.

A análise dos dados coletados através das entrevistas é uma análise de conteúdo, apresentada

no tópico a seguir.

4. ANÁLISE DOS DADOS

4.1 O Projeto PNJ

O Projeto PNJ é executado há onze anos e foi criado a partir de uma demanda detectada pela

entidade pesquisada em duas comunidades carentes de Belo Horizonte. Muitos adolescentes dessas

duas comunidades encontravam-se fora do mercado de trabalho formal expostos às inúmeras

vulnerabilidades e riscos existentes no meio social em que estavam inseridos. Esse cenário motivou a

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entidade a iniciar um projeto de responsabilidade social que levasse qualificação profissional aliada à

formação pessoal aos adolescentes participantes, facilitando assim o acesso deles ao mundo do

trabalho.

A idade exigida para cadastro na entidade que realiza o Projeto PNJ é de 15 anos e 8 meses até

15 anos, 9 meses e 29 dias. Caso o adolescente tenha passado dessa idade, ou seja, tenha completado

15 anos e 10 meses, ele só poderá tentar realizar o cadastro novamente na entidade após os 18 anos. A

idade para participação no Projeto PNJ, portanto, é de 15 anos e 10 meses até 17 anos, já que a

proposta do projeto é atender aqueles adolescentes que não conseguiram se inserir no programa de

aprendizagem na primeira idade exigida pela entidade.

Atualmente o projeto atende um total de três comunidades carentes, em situação de

vulnerabilidade social, tem a duração de três meses e consiste na oferta de cursos de qualificação e de

um processo de Orientação Profissional, que são realizados dentro das próprias comunidades

assistidas, através de parcerias com a rede socioassistencial que cedem as salas para a realização do

projeto.

O Projeto PNJ contempla três pilares de atuação: Pilar Profissional, Pilar Pessoal e Pilar

Ambiental. O Pilar Profissional é composto por cursos profissionalizantes de Rotinas Administrativas,

Excelência no Atendimento ao Cliente, Português, Raciocínio Lógico e Informática. Além dos cursos

os adolescentes têm acesso a um processo de Orientação Profissional que abrange um trabalho de

autoconhecimento, informações sobre o mundo do trabalho, elaboração de currículo e preparação para

entrevista de emprego.

No Pilar Ambiental, o Projeto PNJ oferece aos adolescentes um curso teórico e prático de

Preservação Ambiental e Cidadania com a finalidade de promover uma educação ambiental

comprometida com a cidadania e introduzir mudanças de paradigmas que levem os adolescentes a se

inserirem em processos democráticos de transformação, resgatando o sentimento de pertencimento ao

ambiente natural.

O projeto tem o compromisso de trabalhar com o público assistido não somente conteúdos, mas

também valores essenciais à vida pessoal e profissional. No Pilar Pessoal, atividades, dinâmicas de

grupo e rodas de conversa são realizadas com o objetivo de trabalhar com os adolescentes valores,

como respeito ao próximo e honestidade, além do desenvolvimento e do reforço da autoestima, da

postura crítica diante do mundo, do relacionamento interpessoal, da capacidade de auto e

heteroavaliação, do trabalho em equipe, entre outros.

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É realizado no Projeto PNJ um trabalho com as famílias dos adolescentes, através de reuniões,

palestras e encontros de famílias, buscando fortalecer a função protetiva da família, prevenir a ruptura

de seus vínculos e contribuir para a melhoria de sua qualidade de vida. Prevê o desenvolvimento de

potencialidades e aquisições das famílias e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, por

meio de ações de caráter preventivo e proativo.

O Projeto PNJ utiliza-se também de ações nas áreas culturais para o cumprimento de seus

objetivos, de modo a ampliar o universo informacional e proporcionar novas vivências aos

adolescentes usuários. Suas ações visam promover espaços para troca de experiências, expressão de

dificuldades e reconhecimento de possibilidades.

Por ser realizado por uma entidade sem fins lucrativos e de assistência social e por ser um

projeto de responsabilidade social o PNJ tem como princípio norteador a gratuidade de atendimento.

Ao término os adolescentes realizam uma avaliação na qual são convocados a expressar o que

aprenderam durante o projeto. Através dessas avaliações é possível para a entidade perceber a

dimensão e a relevância do trabalho feito com os adolescentes participantes. O Quadro 1, a seguir,

apresenta algumas dessas avaliações.

QUADRO 1: Avaliações dos adolescentes do primeiro semestre de 2014

“O Projeto PNJ coloca uma nova visão do mundo do trabalho para o jovem que faz o curso. No curso você

faz novas amizades, perde a timidez e desenvolve novas habilidades.”

“No processo de orientação profissional eu pude me conhecer melhor. Eu não sabia que eu era tão capaz de

realizar tais tarefas. Com o curso eu descobri o que é trabalho. Para mim trabalho era uma coisa chata,

cansativa e estressante. Mas agora eu sei que se eu me 'especializar' em fazer o que eu gosto, o trabalho pode

ser algo excepcional.”

“Aprendi a trabalhar em grupo, como me comportar nas entrevistas de emprego, a postura certa na empresa

e várias outras coisas. Perdi um pouco da minha timidez e aprendi a ficar mais atento.”

“Com Projeto PNJ tive oportunidade de conhecer mais sobre o mundo do trabalho. Descobri novas

profissões e isso abriu minha mente. Eu aprendi que é importante cuidar do futuro desde sempre.”

“Aprendi a lidar com certas coisas, como por exemplo, dar conta não só de mim mesmo, pois todos temos

dificuldades. No projeto tive a possibilidade de decidir o que eu quero fazer no meu futuro.”

“Agora estou com uma visão melhor para o mercado de trabalho. Eu vi várias coisas e lugares que nunca

tinha ouvido falar e que eu nem pensava.”

“Quando entrei no projeto, eu ainda não sabia qual profissão seguir ou qual faculdade fazer. Eu estava

“meio” perdida, agora eu já tenho várias ideias, porque eu sei mais sobre mim, sei o que gosto e o que eu

não gosto.”

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“Conheci mais sobre a área que pretendo da trabalhar. Gostei muito do projeto.”

“O projeto me mostrou vários caminhos, abrindo minha mente nas aulas.”

“As etapas da orientação profissional me ajudaram a ter mais conhecimentos e a decidir minha profissão. Eu

aprendi como funciona o mercado de trabalho, a postura que devemos ter dentro da empresa e diante de uma

entrevista. Estou preparada para enfrentar o mundo do trabalho.”

Fonte: adaptado pela autora a partir de documentos do Projeto PNJ

É realizada uma formatura na própria entidade, na qual os adolescentes podem confraternizar

com seus familiares, amigos e colaboradores da entidade a conquista alcançada. Nesse momento eles

recebem o certificado de conclusão de curso que pode ajudá-los na busca por um emprego formal no

mercado de trabalho. Porém, o que se tem observado é que a realidade não é bem assim para a maioria

dos adolescentes. A seguir, são analisadas as entrevistas feitas com alguns dos adolescentes que

participaram do Projeto PNJ no primeiro semestre de 2014.

4.2 Análise das Entrevistas

A entrevista contou com quatro perguntas abertas e teve como objetivo analisar as percepções

da população amostral pesquisada sobre o Projeto PNJ, oferecido pela entidade. Eles foram

questionados sobre como avaliam o projeto, se conseguiram emprego após a conclusão do projeto, se

encontraram dificuldades e/ou obstáculos na integração ao mundo do trabalho e as expectativas com

relação à contratação na própria entidade.

Com relação a como avaliam o Projeto PNJ, todos os 15 adolescentes avaliaram positivamente

afirmando que o projeto foi muito importante e positivo na vida deles. Os adolescentes relataram que o

aprendizado sobre o mundo do trabalho foi muito grande e que desenvolveram questões importantes

tanto para a vida pessoal quanto profissional. Uma das adolescentes entrevistada afirmou que foi o

projeto que a ajudou a perder a timidez. Alguns disseram que irão levar essa experiência para toda a

vida.

Dos adolescentes entrevistados, 11 encontram-se desempregados um ano após o término do

Projeto PNJ e 4 estão trabalhando, sendo que esses já completaram 18 anos. Os adolescentes que estão

desempregados afirmaram que estão encontrando muitas dificuldades de integração ao mundo do

trabalho. Um deles relatou ter conseguido alguns “bicos”, sem carteira assinada.

Todos os adolescentes que ainda estão desempregados disseram que chegaram a realizar

cadastro em outras instituições que também contratam aprendizes em Belo Horizonte, mas nenhuma

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delas os convocou para o programa de aprendizagem. A dificuldade devido à idade ser incompatível

com a exigida por algumas instituições também foi relatada por esses adolescentes como um grande

dificultador. Um deles chegou a dizer que desistiu de tentar emprego, pois, segundo ele, dificilmente

um adolescente menor de 18 anos consegue emprego e afirmou ainda ter muitos amigos na mesma

situação.

Todos os 15 adolescentes, entrevistados, incluindo os que hoje estão empregados em outras

entidades, afirmaram que tiveram grande desejo e expectativa de terem sido convocados para o

programa de aprendizagem da entidade pesquisada após o término do projeto, pois estavam precisando

muito trabalhar e haviam passado por qualificação profissional na própria entidade, o que os instigou

ainda mais na busca pelo primeiro emprego. Uma das adolescentes relatou que sonhava todas as noites

que havia conseguido emprego como aprendiz na entidade pesquisada.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir desse trabalho foi percebida a necessidade e a relevância da área de Gestão de Pessoas

dentro de qualquer organização, seja ela privada ou do Terceiro Setor. A entidade pesquisada não

possui uma área de Gestão de Pessoas, prevalecendo ainda o antigo departamento de pessoal, que tem

a função, como apontado no tópico Responsabilidade Social e Gestão de Pessoas, apenas de admitir

funcionários, registrá-los legalmente, controlar as normas seguidas por eles, puni-los, apontar seus

cartões de ponto e dispensá-los.

Com esse modelo de RH, obsoleto e restrito, a comunicação interna é falha e desarmônica, os

funcionários não possuem clareza das estratégias, dificultando com que eles possam caminhar junto

com a organização. Nesse cenário os funcionários não são reconhecidos como importantes parceiros

estratégicos, não existindo gestão participativa, compromisso da organização com treinamento e

desenvolvimento dos funcionários, espaços para discussão e reflexão sobre as práticas e projetos, entre

outras ações que poderiam contribuir para maximizar os resultados alcançados pela entidade.

Com funcionários mais satisfeitos e motivados e uma área de Gestão de Pessoas estratégica, a

entidade poderia entregar ao seu público-alvo – os adolescentes e suas famílias em situação de

vulnerabilidade social – um produto final mais socialmente responsável e de qualidade.

O objetivo geral deste estudo foi fazer uma análise crítica do Projeto PNJ, propondo uma

reflexão sobre novas possibilidades de atuação com os adolescentes assistidos, a fim de cumprir de

maneira mais eficaz com o objetivo da responsabilidade social proposta.

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O PNJ é um projeto de Responsabilidade Social realizado pela entidade pesquisada, pois

cumpre uma função social muito relevante na medida em que oferece qualificação profissional, além

de um programa de desenvolvimento humano, ético e cidadão, de forma gratuita, a adolescentes de

baixa renda, em situação de vulnerabilidade social, que não conseguiram se inserir no programa de

aprendizagem da entidade na idade exigida. Essa é uma forma que a entidade pesquisada encontrou de

oferecer um apoio a uma parcela dos adolescentes que estão à margem, ou seja, que vem de uma

trajetória de exclusão.

As falas dos próprios adolescentes como demonstra o Quadro I: Avaliações dos adolescentes

do primeiro semestre de 2014 possibilita que a entidade faça uma avaliação qualitativa da dimensão

dos resultados alcançados pelo projeto e a sua relevância na vida do público assistido. Contudo, os

dados das entrevistas, que, dentre outras, avaliam o índice de integração ao mundo do trabalho após a

conclusão do Projeto PNJ, não são satisfatórios se for feita uma reflexão a partir da lógica da

responsabilidade social.

O que se pode observar é que mesmo com uma proposta de trabalho tão ampla e consistente,

que oferece um importante apoio e novas perspectivas de vida para os adolescentes participantes do

Projeto PNJ, somente a oferta de qualificação profissional não atende à verdadeira demanda de grande

parte desse público.

A maioria dos adolescentes demanda com certa urgência, emprego, ou seja, necessita de

remuneração, necessidade essa justificável tendo em vista a realidade social, econômica e familiar

desses meninos e meninas. Por ser um público de baixa renda, que vive em comunidades carentes, em

situação de vulnerabilidade e risco social, onde imperam a pobreza, a precariedade no sistema

educacional, o tráfico de drogas, a criminalidade, a violência, entre outros, essa realidade não pode

deixar de ser levada em consideração no momento do planejamento das ações e propostas do projeto.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei da Aprendizagem e as políticas públicas voltadas

para juventude são temas abordados com os adolescentes, porém, mesmo que eles se tornem mais

informados e preparados a partir da participação no projeto, essa pesquisa mostra que o público

assistido continua enfrentando situações de exclusão e dificuldades de integração ao mundo do

trabalho.

O principal fator para tal dificuldade se dá devido à idade para cadastro nas instituições de

formação técnico-profissional ser extremamente restritiva. A legislação brasileira permite ao

adolescente, a partir dos 14 anos, ingressar no mundo do trabalho como aprendiz, contudo,

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pouquíssimas ou quase nenhuma entidade, autorizadas a realizarem o programa de aprendizagem,

recebem adolescentes com essa idade.

Frustrados com a falta de emprego, desmotivados, encontrando muitas dificuldades e restrições

no caminho profissional e se sentindo excluídos do mercado de trabalho o que se observa é que esses

adolescentes acabam ficando desocupados por um longo período da adolescência e expostos aos riscos

do meio em que vivem. Alguns acabam se vendo obrigados a aceitar trabalhos que os explorem e não

ofereçam os direitos aos quais a legislação garante à criança e ao adolescente.

O curto tempo para a realização da pesquisa acabou fazendo com que não fosse possível

trabalhar com uma população amostral maior, o que teria sido bastante enriquecedor para a análise dos

dados e resultados da pesquisa. Sugere-se para futuras pesquisas que o tema da inserção de

adolescentes no mercado de trabalho na lógica da responsabilidade social seja explorado em maior

profundidade, discutindo sobre formas de atuação mais socialmente responsáveis por parte das

organizações envolvidas com a questão do trabalho infanto-juvenil, como as empresas que contratam

aprendizes e as entidades de formação técnico-profissional.

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