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AC108156-4/188RV
APELAÇÃO CÍVEL Nº 108156-4/188 (200700552663)
COMARCA: ITUMBIARA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO
APELADA : FERTILIZANTES BRASPLANTE LTDA
RELATOR : Desembargador WALTER CARLOS LEMES
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso apelatório interposto por
Ministério Público, contra a sentença de fls. 177/179, proferida
pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Itumbiara, Dr. Altair
Guerra da Costa, que julgou parcialmente procedente o pedido
exordial, condenando a ré a não exercer a atividade de
industrialização de fertilizantes até a obtenção de renovação da
licença ambiental, sob pena de multa diária no valor de R$
500,00 (quinhentos reais), nos autos de ação civil pública que o
apelante move em desproveito de Fertilizantes Brasplante Ltda.
Sustenta, em síntese, o apelante, que foi
proposta ação civil pública, objetivando suspender as atividades
da apelada até ulterior apresentação da licença ambiental, bem
como para compelí-la a compensar os danos ambientais, sócio-
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AC108156-4/188RV
econômicos e à saúde pública provocados em razão de suas
atividades.
Diz que, embora o feito tenha sido instruído
com vasta documentação, o pedido liminar foi indeferido e,
apoiada nesta decisão, a apelada manteve suas atividades no
mesmo ritmo, causando grandes incômodos e poluição
exagerada nas imediações de suas instalações, além de
funcionar sem a necessária licença ambiental, conforme
demonstram o documento de fls. 95 e 151.
Nesse contexto, alega o apelante que o fato é
notório para toda a comunidade de Itumbiara, já tendo sido
inclusive objeto de reportagem televisiva local, consoante se
depreende da fita de vídeo acostada aos autos (certidão de fls.
62).
Argumenta ainda, que existem várias provas a
embasarem a tese do apelante, conforme os depoimentos
testemunhais colhidos na fase instrutória, inclusive dos fiscais
de postura do município que fizeram a verificação in loco.
Assevera que a decisão singular merece
reforma, por não contemplar na sua condenação, a reparação
do dano ambiental causado pela apelada, nos termos do § 1º,
IV, do art. 14, da Lei 6.938/81, pois uma vez mantida, subsistirá
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AC108156-4/188RV
o interesse particular em detrimento de toda uma coletividade de
habitantes que circundam aquela indústria.
Requer a reforma da decisão de 1º grau, para
que seja a apelada condenada a recuperar e compensar os
danos ambientais, sócio-econômicos e à saúde pública
provocados em razão de suas atividades, bem como indenizar
pelos danos extrapatrimoniais (morais), causados no complexo
ambiental atingido.
O recurso foi recebido pelo despacho de fls.
190.
Devidamente intimada, deixou a apelada de
apresentar contra-razões, conforme certificado às fls. 192.
Encaminhados os autos à este E. Tribunal,
vieram-me conclusos.
Instada, a douta Procuradoria de Justiça
emitiu parecer de fls. 198/213, manifestando pela reforma da
decisão atacada, entendendo estarem devidamente
comprovados os danos ambiental, sócio-econômico e à saúde
pública, bem como o dano moral, provocados em razão do
funcionamento da apelada em desacordo com a legislação
pertinente.
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Em seguida, foram-me os autos volvidos à
conclusão.
É o relatório que submeto à douta revisão.
Goiânia, 23 de maio de 2007.
Desembargador WALTER CARLOS LEMES
Relator
dmp/IM
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 108156-4/188 (200700552663)
COMARCA: ITUMBIARA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO
APELADA : FERTILIZANTES BRASPLANTE LTDA
RELATOR : JUIZ G. LEANDRO S. CRISPIM
VOTO
Recurso isento de preparo. Presentes os
pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da apelação.
O Ministério Público, por seu representante
legal, ajuizou ação civil pública objetivando a condenação da ré
na obrigação de não fazer, com a cessação imediata de suas
atividades, até obtenção da necessária licença ambiental
expedida pela Agência Ambiental do Estado, bem como
condená-la a recuperar e compensar os danos ambientais,
sócio-econômicos e à saúde pública, e reparação do dano
moral, consoante previsão contida no art. 1º, da Lei 7.347/85, a
ser procedido em liqüidação por arbitramento.
Após os trâmites legais, foi proferida a
sentença fustigada, onde o MM. Juiz julgou parcialmente
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AC108156-4/188RV
procedente o pedido exordial, somente para suspender as
atividades da apelada, até a obtenção da necessária licença
pelo órgão competente.
Inconformado com o deslinde da controvérsia,
o Ministério Público apela a este E. Tribunal salientando que os
danos pleiteados na inicial, conforme já relatados, estão
demasiadamente comprovados nos autos, merecendo pois
reforma a sentença singular, na parte que rejeitou tais pedidos.
Pois bem.
É cediço que a responsabilidade pelos atos
que desrespeitam as normas ambientais é objetiva, não
perquirindo quanto à culpa.
Desse modo, a legislação específica, Lei nº
6.938/81, adotou a sistemática da responsabilidade civil objetiva
ao teor da dicção do seu artigo 14, parágrafo primeiro, verbis:
“Art. 14. Sem obstar a
aplicação das penalidades
previstas neste artigo, é o
poluidor obrigado,
independentemente da
existência de culpa, a
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indenizar ou reparar os danos
causados ao meio ambiente e a
terceiros afetados por sua
atividade.
§ 1º. O Ministério Público da
União e dos Estados terá
legitimidade para propor ação
de responsabilidade civil e
criminal, por danos causados
ao meio ambiente”.
A adoção de tal primado significou apreciável
avanço no combate à degradação do meio ambiente, uma vez
que, sob esse sistema, não se considera, subjetivamente, a
conduta do causador do dano, mas sim a ocorrência do
resultado prejudicial ao ambiente.
Ad rem, para que se observe a
obrigatoriedade da reparação do dano ambiental, é necessário,
apenas, que se demonstre o nexo causal entre a lesão infligida
ao meio ambiente e a ação ou omissão do responsável.
Paralelamente, o inciso VII do retro
mencionado artigo 14 da Lei nº 6.938/81, prevê expressis verbis
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AC108156-4/188RV
o dever do poluidor ou predador de recuperar os danos
causados.
Coroando tais assertivas, a rigidez de
tal posicionamento explica-se pelo tratamento dado pela Lex
Mater ao meio ambiente, erigindo-o à categoria de direito
fundamental na dicção do caput do seu artigo 5º, embasando-
se, portanto, em tais premissas, a firmeza com que são tratadas
essas questões.
Como se denota, em face de cristalina
previsão legal, verificam-se prosperáveis as alegações do
apelante, no sentido de que não poderia deixar a apelada de ser
responsabilizada pelos danos, reitere-se, sobejamente
comprovados.
Adotando essa exegese, esta Egrégia Corte
vem assim pontificando:
“(...) Segundo a cristalina
redação do art. 14, parágrafo
primeiro, da Lei número
6.938/81, a responsabilidade
pelo dano ambiental é
objetiva, de forma que se
torna desnecessária a
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perqüirição acerca da culpa do
agente. Indiscutível a
presença do nexo causal entre
a conduta do agente e o dano
ocasionado, uma vez que
comprovado satisfatoriamente
nos autos, tendo, inclusive, a
empresa causadora do dano
confessado que praticara a
conduta nociva ao meio
ambiente, há que se anotar a
imprescritibilidade do dano
ambiental coletivo, em face do
seu caráter de direito
fundamental de solidariedade.
Ademais não há que se cogitar
em prescrição na medida em que
há dano continuado, como na
espécie,não cessando seus
efeitos prejudiciais com o
passar do tempo, devendo, pois
ser reparado ainda que tardia
a medida sanatória”. (Ap. Cív.
nº 99.031 de Itumbiara in DJE
nº 14.860 de 17.10.2006, Drª
Sandra Regina Teodoro Reis).
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"(...) A Lei nº 6938/81 define
como poluidor quem direta ou
indiretamente, por ação ou
omissão, cause degradação
ambiental, independentemente
da prova de culpa. Concorrem
na responsabilidade objetiva
as pessoas jurídicas de
direito público e as de
direito privado prestadoras de
serviço público, conforme
preceitos da lei ambiental-
art. 14, parágrafos 1º e 2º -
cumulados com o parágrafo 6º
do artigo 37 e art. 225 da
CF/88. A ação civil pública
visa discutir, essencialmente,
a relação jurídica inerente a
proteção ambiental, assim
entendido o nexo causal entre
a conduta do agente e a
conseqüência pela violação ao
meio ambiente” (AI nº43.359 de
Goiânia in DJE nº 14.717 de
14.03.2006, Des. Leobino
Valente Chaves).
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Destaca-se no caso em tela, a comprovação
dos danos específicos suportados pela vizinhança local,
consoante as provas coligidas nos autos.
No Procedimento Administrativo instaurado
pelo Ministério Público (fls. 18), foram colhidos depoimentos de
05 testemunhas, restando patente a demonstração dos danos
ambientais e as irregularidades quanto ao funcionamento da
empresa apelada, como será explanado adiante.
Josina Lima dos Santos, às fls. 19, informa
que:
“a depoente e os vizinhos não
reclamam do barulho e sim do
pó branco e marrom que o
empreendimento industrial
causa”.
Às fls. 45 e 46, Ilza Pereira de Sousa Santos e
Eurípedes Rodrigues Borges, declaram, respectivamente, que:
“há mais de 03 (três) anos a
empresa referida vem causando
poluição e transtornos à saúde
e ao bem estar da vizinhança,
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principalmente pela emissão de
um pó com forte cheiro”.
O Relatório de Serviço de Fiscalização da
Empresa Fertilizantes Brasplante (fls. 51), firmado por fiscais de
postura daquela Prefeitura corroboram tais assertivas, senão
veja-se:
“(...) os Fiscais Pedro
Ferreira Neto, Luis Justino da
Silva e Maria de Lourdes Costa
Brito, foram ao local no dia
06/10/2005, a partir das 19:30
horas até as 00:00 hs, para
fazer averiguação se a Empresa
de Fertilizante Brasplante Ltda
está trabalhando, pois a
Agência Ambiental já fez uma
visita no local e constatou que
existia irregularidade no
funcionamento da Empresa,
fazendo multas e deixando dois
lacres para que o moinho não
funcionasse, embora ficou
constatado que tem dois moinhos
na Empresa e só foi feito o
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lacre em um moinho e a Empresa
não parou de funcionar nem um
dia, não houve mudanças de
funcionamento. No momento da
vistoria do dia 06/10/2005,
estavam presentes juntos com os
Fiscais, os Policiais Militares
Sargento Valdery e o Soldado
Ribeirinho. Por parte da
Empresa estava presente o
Gerente da Empresa: Jermano,
que juntos com os Policiais
mostrou os barracões. A
Poluição do Ar é constante e a
Empresa funciona todos os dias
até as 00:00 hs de todos os
dias. O Sr. Jermano disse que a
Empresa contratou uma Empresa
para fazer uma análise se o pó
é nocivo a saúde ou não”.
Ressalte-se que, é dever do tanto do Poder
Público como da coletividade defender e preservar o meio
ambiente ecologicamente equilibrado, para as presentes e
futuras gerações, pois trata-se de um bem de uso comum ao
povo e essencial à sadia qualidade de vida.
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AC108156-4/188RV
A propriedade privada não se tornou algo
intocável; desde que seu uso se desencontre de sua função
social, vale dizer do interesse público concernente à segurança
à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, à tranqüilidade pública, ao respeito às demais
propriedades, à estética urbana e aos direitos individuais e
coletivos, seja ou não matéria ou energia poluente, o Poder
Público tem o dever de limitá-la administrativamente.
Nesse contexto, tem-se que a empresa
apelada é civilmente responsável pelos eventuais danos
sofridos por terceiros em virtude de sua ação, ao exercer
atividade poluente, em desacordo com a legislação vigorante.
Na hipótese em estudo, o Ministério Público
ingressou com a presente ação civil pública, com pedido liminar,
no sentido de suspender as atividades da apelada até ulterior
apresentação da licença ambiental, bem como compelí-la a
compensar os danos causados, o que foi indeferido na instância
singela. e, de conseqüência, a apelada manteve suas
atividades.
Em decorrência disso, a apelada continuou
com suas atividades no mesmo ritmo, causando prejuízos de
ordem ambiental, sócio-econômicos e à saúde pública, mesmo
sem a possuir a necessária licença, consoante exaustivamente
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comprovado nos autos pelas provas coligidas, em especial a
Licença de Funcionamento acostada às fls. 95, vencida desde
janeiro de 2006.
Considerando-se pois que a apelada exercia
atividade de forma irregular, sem a devida autorização,
causando danos ao meio ambiente, subsistente a pretensão de
reparatória esposada na inicial.
A pretensão do apelante encontra amparo em
vários dispositivos da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981,
que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins,
mecanismos de formulação e aplicação:
“a) O art. 3º, IV desse texto
é explícito em permitir a
responsabilização do agente
que, direta ou indiretamente,
der causa ao evento danoso:
Art 3. Para os fins previstos
nesta Lei, entende-se por:
IV - poluidor: pessoa física
ou jurídica, de direito
público ou privado,
responsável, direta ou
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AC108156-4/188RV
indiretamente, por atividade
causadora de degradação
ambiental;
(...)
c) O art. 10 dispõe sobre a
necessidade de prévia licença
estadual de órgão integrante do
SISNAMA, bem como seu poder-
dever de paralisar obras que
possam acarretar prejuízos ao
meio ambiente:
Art. 10 - A construção,
instalação, ampliação e
funcionamento de
estabelecimentos e atividades
utilizadoras de recursos
ambientais, considerados
efetiva e potencialmente
poluidores, bem como os
capazes, sob qualquer forma, de
causar degradação ambiental,
dependerão de prévio
licenciamento de órgão estadual
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competente, integrante do
Sistema Nacional do Meio
Ambiente - SISNAMA, e do
Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA, em caráter
supletivo, sem prejuízo de
outras licenças exigíveis.
(Redação dada pela Lei nº
7.804, de 1989).”
Portanto, é o poluidor obrigado,
independentemente da existência de culpa, a indenizar ou
reparar os danos patrimoniais e extrapatrimoniais (morais)
causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua
atividade.
Ademais, os autos infracionais expedidos pela
Agência Goiana do Meio Ambiente (fls. 39/41), também são
conclusivos no sentido de que a apelada causou:
“Poluição Atmosférica e do
solo através da emissão de
fosfato bicálcio em seu
empreendimento e nos lotes
vizinhos do mesmo, em
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desacordo com a legislação
vigente, sendo o local
destinado a área residencial”.
A douta Procuradoria de Justiça em seu
parecer de fls. 198/213, muito bem explanou sobre a questão,
pelo que transcrevo parte de sua manifestação incorporando-a
este voto:
“Consoante se vê nos autos, o
repertório de documentos
arregimentados pelo apelante
comprovaram os atos praticados
pela apelada, inclusive
mantendo-se as condutas que
originou a referida ação,
quais sejam, o funcionamento
sem a devida licença ambiental
e a fabricação de
fertilizantes que prejudicaram
toda a coletividade, uma vez
que exala poeira branca
causando transtornos de saúde
e qualidade de vida para a
população vizinha.
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Não há dúvidas, através das
perícias realizadas e das
provas acostadas nos autos, da
ocorrência da conduta de dano
ambiental, e que a
responsabilização da apelada é
inconteste, diante da
legislação acima elencada. E
por conseqüência, o Magistrado
da instância singela
equivocou-se ao não condenar a
recorrida pelos danos já
causados. Somente impedi-la de
praticar os atos até a
regularização da licença não a
isenta das condutas até então
praticadas.
Entendeu o Magistrado em sua
decisão que a requerida
suspendeu a produção de
fertilizantes (fls. 154) e que
não foram encontradas
irregularidades no processo
produtivo de alimentos para
animais (fls. 162), ao passo
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que não indicam a ocorrência,
até a presente data, de
qualquer dano ambiental (fls.
178).
Diferentemente do entendimento
do Julgador, observa-se que a
documentação por ele
referenciada traz informações
sobre a capacidade da empresa
em produzir os produtos ali
citados, ou seja,
fertilizantes e fosfato
bicálcio. Em relação ao
primeiro, consta da informação
técnica que existem pendências
documentais (fls. 154, último
parágrafo). Em relação ao
segundo, constada informação
técnica que não foram
encontradas irregularidades
que pudessem comprometer o
funcionamento da empresa, no
que concerne à fabricação do
produto registrado no
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Ministério da Agricultura
(fls. 162).
Tais documentos são oriundos
do Serviço de Fiscalização do
Ministério da Agricultura, que
não tem competência para
análise do dano ambiental,
emitindo informações técnicas
sobre a capacidade da empresa
em produzir este ou aquele
insumo agrícola ou alimento
para animais. Tanto é assim
que ambos os órgãos de
fiscalização do Ministério da
Agricultura juntaram aos seus
laudos cópia do Termo de
Inspeção e Fiscalização onde
consta que o estabelecimento
deve apresentar a licença no
órgão do meio ambiente –
agência ambiental (fls. 156 e
165).
A apelada não alcançou a
licença ambiental e continuou
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AC108156-4/188RV
funcionando normalmente. O
órgão competente para análise
da poluição ambiental causada
pela apelante em Goiás é a
Agência Goiana de Meio
Ambiente a qual autuou a
apelada por: 1. fazer
funcionar indústria de
fertilizantes sem a devida
licença do órgão ambiental
competente (agência ambiental)
– auto de infração nº 14395 –
fls. 40) e 2. por causar
poluição atmosférica e do solo
através de emissão de fosfato
bicálcio em seu empreendimento
e nos lotes vizinhos do mesmo
em desacordo com a legislação
vigente, sendo o local
destinado a área residencial –
auto de infração nº 14394 –
fls. 41)”.
Portanto, restou evidenciado
nos autos que, diferentemente
do entendimento do julgador
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AC108156-4/188RV
monocrático, a apelada causou
dano ao meio ambiente e deve
repará-lo.
Com efeito.
No caso em tela, o evento danoso é
incontroverso, decorrente de impacto ambiental devidamente
comprovado nos autos.
E como o meio ambiente goza de proteção
constitucional, ex-vi do art. 225, III e § 3º, da Constituição
Federal e legislação inferior, a efetividade da proteção ao meio
ambiente, de interesse da coletividade, só é alcançada
apenando-se o causador do dano.
Assim, repita-se, em sendo o evento danoso
incontroverso, decorrente de degradação ambiental consistente
em poluição atmosférica e do solo, a conseqüência é a
procedência do pedido inicial.
A efetividade da proteção ao meio ambiente,
de interesse da coletividade, só é alcançada apenando-se o
causador do dano. E, reitere-se, em se tratando de dano
ambiental, é objetiva a responsabilidade do poluidor na forma
das Leis nºs 6.938/81, 9.605/98 Constituição Federal, § 3º, art.
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AC108156-4/188RV
225. Portanto, uma vez verificado o dano ambiental, coexistem
a obrigação civil de indenizar, a responsabilidade administrativa
e a penal.
No caso aqui apresentado, claro também está
que o dano moral reclamado é proveniente da lesão à
comunidade, ou seja, a violação dos valores coletivos.
O art. 1º da Lei 7.347/85, assim dispunha:
“Art. 1º – Regem-se pelas
disposições desta Lei, sem
prejuízo da ação popular, as
ações de responsabilidade por
danos causados :
I – ao meio-ambiente;
II – ao consumidor;
III – a bens e direitos de
valor artístico, estético,
histórico, turístico e
paisagístico;
IV - (VETADO).”
Atualmente o art. 1º da referida norma, com a
novel redação dada pelo art. 88 da Lei 8884/94, prevê:
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AC108156-4/188RV
“Art. 88. O art. 1º da Lei
7.347, de 24 de julho de 1985,
passa a vigorar com a seguinte
redação e a inclusão de novo
inciso:
Regem-se pelas disposições
desta lei, sem prejuízo da
ação popular, as ações de
responsabilidade por danos
morais e patrimoniais causados:
V – por infração da ordem
econômica.”
Originariamente, o objeto da lei que disciplina
a Ação Civil Pública versava, apenas, os danos causados ao
meio-ambiente, consumidor e aos bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Contudo, a
legislação sofreu significativas mudanças, no sentido de ampliar
o objeto da ação sub examine, para abranger a
responsabilidade do infrator pelos danos morais causados a
quaisquer dos valores e direitos transindividuais amparados pela
referida legislação.
Deveras, o meio ambiente ostenta na
modernidade valor inestimável para a humanidade, tendo por
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AC108156-4/188RV
isso alcançado a eminência de garantia constitucional (art. 5º, X,
CF).
Consectariamente, a preocupação precípua do
julgador, nestes casos, é em evitar o dano ao meio ambiente,
direito elevado e protegido a nível constitucional, não podendo
ser dada interpretação judicial que venha a restringir essa
proteção.
A respeito do tema, ressalta a Dra. Vera Lúcia
R. S. Jucovsky, Juíza Federal do TRF da 3ª Região, em
brilhante monografia sobre os instrumentos de defesa do meio
ambiente, publicada na Revista TRF – 3ª Região, Vol. 39, que a
Constituição Federal cuidou de preservar o ambiente, pois
requer o estudo do impacto ambiental para licença de
empreendimentos que possam ter relevantes reflexos negativos
na natureza.
Da obra citada, destaco o seguinte trecho:
“Destarte, reconhecendo o
direito à qualidade do meio
ambiente como manifestação do
direito à vida, produziu um
texto inédito em Constituições
em todo o mundo, capaz de
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AC108156-4/188RV
orientar uma política
ambiental no país e de induzir
uma mentalidade
preservacionista. Com efeito,
considerando o meio ambiente
'bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de
vida', impôs ao Poder Público,
para assegurar a efetividade
desse direito, a incumbência
de 'exigir, na forma da lei,
para instalação de obra ou
atividade potencialmente
causadora de significativa
degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto
ambiental, a que se dará
publicidade.”
Em sede pátria, a doutrina especializada
não discrepa do entendimento acima inaugurado no sentido de
indenizabilidade por danos morais em sede de danos
ambientais. Neste sentido, desta HUGO NIGRO MAZZILLI, in A
Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Saraiva, 2003, p.
131/132, litteris:
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AC108156-4/188RV
“OS DANOS MORAIS E
PATRIMONIAIS originariamente,
o objeto da LACP consistia na
disciplina da ação civil
pública de responsabilidade
por danos causados ao meio
ambiente, ao consumidor e a
bens e direitos de valor
artístico, estético,
histórico, turístico e
paisagístico. Mas, como já
anotamos a legislação
subseqüente ampliou
gradativamente o objeto da
ação civil pública. Diante,
porém, das inevitáveis
discussões doutrinárias e
jurisprudenciais sobre ação
civil pública da Lei nº
7.347/85 também alcançaria ou
não os danos morais, o
legislador resolveu explicitar
mens legis. A Lei nº 8.884/94
introduziu uma alteração na
LACP, segundo a qual passou a
ficar expresso que a ação
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AC108156-4/188RV
civil pública objetiva a
responsabilidade por danos
morais e patrimoniais causados
a quaisquer dos valores
transindividuais de que cuida
a lei. São cumuláveis as
indenizações por dano material
e moral oriundos do mesmo fato
– é o que dispõe a Súmula 37,
do Superior Tribunal de
Justiça. E, nos termos de sua
Súmula 227, a pessoa jurídica
também pode sofrer dano moral.
Omissis” (p.132-132)
No mesmo diapasão, manifestam-se
EDUARDO LIMA DE MATOS, Dano ambiental: Uma Nova
Perspectiva de Responsabilidade Civil, in Grandes Temas da
Atualidade, Forense, 2002; e RICARDO LORENZETTI, O Direito
e o Desenvolvimento Sustentável – Teoria Geral do Dano
Ambiental Moral, in Revista de Direito Ambiental nº 28, RT, p.
139/149.
O advento do novel ordenamento
constitucional - no que concerne à proteção ao dano moral –
possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo para abranger o
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AC108156-4/188RV
dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade.
No que pertine a possibilidade de reparação
por dano moral a interesses difusos como sói ser o meio
ambiente amparam-na: art. 1º da Lei da Ação Civil Pública e o
art. 6º, VI, do CDC.
Com efeito, o meio ambiente integra
inegavelmente a categoria de interesse difuso, posto
inapropriável uti singuli. Dessa forma, a sua lesão, caracterizada
pela diminuição da qualidade de vida da população, pelo
desequilíbrio ecológico, pela lesão a um determinado espaço
protegido, acarreta incômodos físicos ou lesões à saúde da
coletividade, revelando lesão ao patrimônio ambiental,
constitucionalmente protegido.
Diante de tais considerações, entendo que
no caso em tela também é cabível a reparação pelo dano moral
ambiental causado a coletividade, ou seja, os moradores
daquela comunidade.
Ao teor do exposto, e acolhendo o parecer
da douta Procuradoria de Justiça, conheço do apelo e dou-lhe
provimento para reformar a decisão vergastada, condenando a
requerida/apelada a recuperar e compensar os danos
ambientais, sócio-econômicos e à saúde pública, mediante as
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AC108156-4/188RV
providências necessárias, fixando o prazo de 60 (sessenta) dias
para início de tais medidas, condenando-a também ao dano
moral provocado em razão de seu funcionamento em
desconformidade com a legislação ambiental pertinente, que
arbitro no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser revertido
em prol do Fundo Estadual do Meio Ambiente, nos termos da
Lei 7.347/85, mantendo, quanto ao mais, a decisão objurgada.
É o voto.
Goiânia, 28 de junho de 2007.
JUIZ G. LEANDRO S. CRISPIM
Relator Substituto
dmp/IM
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AC108156-4/188RV
APELAÇÃO CÍVEL Nº 108156-4/188 (200700552663)
COMARCA: ITUMBIARA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO
APELADA : FERTILIZANTES BRASPLANTE LTDA
RELATOR : JUIZ G. LEANDRO S. CRISPIM
EMENTA. Ação Civil Pública. Meio
Ambiente. Dano Patrimonial e Dano
Moral Coletivo. Reparação. Procedência.
1. A responsabilidade pelos atos que
desrespeitam as normas ambientais é
objetiva, não perquirindo quanto à culpa
(Lei nº 6.938/81). Portanto, é o poluidor
obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou
reparar os danos patrimoniais e
extrapatrimoniais (morais) causados ao
meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade. 2. O meio ambiente goza
de proteção constitucional, ex-vi do art.
225, III e § 3º, da Constituição Federal e
legislação inferior, a efetividade da
proteção ao meio ambiente, de interesse
da coletividade, só é alcançada
apenando-se o causador do dano.
Assim, em sendo o evento danoso
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AC108156-4/188RV
incontroverso, decorrente de degradação
ambiental consistente em poluição
atmosférica e do solo, como no caso dos
autos, a conseqüência é a procedência
do pedido. 3. O advento do novel
ordenamento constitucional - no que
concerne à proteção ao dano moral –
possibilitou ultrapassar a barreira do
indivíduo para abranger o dano
extrapatrimonial à pessoa jurídica e à
coletividade. O meio ambiente integra
inegavelmente a categoria de interesse
difuso, posto inapropriável uti singuli.
Dessa forma, a sua lesão, caracterizada
pela diminuição da qualidade de vida da
população, pelo desequilíbrio ecológico,
pela lesão a um determinado espaço
protegido, acarreta incômodos físicos ou
lesões à saúde da coletividade, revelando
lesão ao patrimônio ambiental,
constitucionalmente protegido, ensejando
a reparação moral ambiental causada a
coletividade, ou seja, os moradores
daquela comunidade. 4. Sentença
reformada. Condenação da
requerida/apelada a recuperar e
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AC108156-4/188RV
compensar os danos ambientais, sócio-
econômicos e à saúde pública, bem como
em dano moral coletivo. Apelo
conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de
Apelação Cível nº 108156-4/188 (200700552663) da Comarca
de Itumbiara, sendo Apelante, Ministério Público e Apelado,
Fertilizantes Brasplante Ltda.
O Tribunal, por sua Quinta Turma Julgadora
da Terceira Câmara Cível, à unanimidade de Votos, conheceu
do Recurso, dando-lhe provimento, nos termos do Voto do
Relator. Custas de Lei.
Votaram com o Relator os
Desembargadores Felipe Batista Cordeiro e Rogério Arédio
Ferreira.
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Presente o ilustre representante da
Procuradoria Geral de Justiça, Dr. Wellington de Oliveira Costa.
Goiânia, 28 de junho de 2007.
DESA. NELMA BRANCO FERREIRA PERILO
Presidente
JUIZ G. LEANDRO S. CRISPIM
Relator Substituto
Dmp/IM
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