20
RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO NA SERRA DE UBAJARA, PLANALTO DA IBIAPABA, CEARÁ Autora: Renata de Farias Bandeira 1. Departamento de Geografia, Universidade Federal do Ceará (UFC), [email protected] RESUMO Os domínios naturais do Estado do Ceará expõem uma grande diversidadade de formas, o que gera grande interesse para estudos do meio natural, bem como no tocante à relação sociedade x natureza. Nessa perspectiva, vem sendo realizada pesquisa que tem por objetivo o estudo da gênese e evolução geomorfológica do Planalto da Ibiapaba, com ênfase no setor de Ubajara (a NW do território cearense), bem como acerca das formas de uso e apropriação social da área. A área pesquisada é formada por rochas sedimentares e cristalinas, com predomínio de rochas sedimentares da Bacia Sedimentar do Parnaíba, que se apresentam expostas na forma de glint, formando paredão vertical de até 900m de altitude. A área tem como principais formas de uso e ocupação atividades relacionadas à agricultura, bem como ao uso turístico controlado, com sustentabilidade moderada, fato que resulta da implantação de um parque nacional na localidade nos anos 1950. A metodologia utilizada na pesquisa tem suporte no “Princípio do Uniformitarismo”, que postula que “o presente é a chave do passado”, o que permite recompor a história evolutiva pretérita da paisagem. Na análise ambiental, foi utilizada a perspectiva do Geossistema, que permite analisar a organização espacial resultante da interação dos elementos naturais juntamente com as atividades sociais. Destacamos que a evolução geomorfológica regional está relacionada a processos internos e externos em ação desde o Cretáceo. A morfologia resultante desses processos influencia a organização social da região, tendo em vista que as vertentes íngremes dificultam a fixação de moradias e atividades, restringindo-se a ocupação à depressão periférica cristalina e ao topo do planalto sedimentar. No entanto, o caráter acidentado da paisagem e a umidade resultante da elevada altitude, criam um ambiente diferenciado em relação ao semi-árido cearense, fatos que justificam a existência do Parque Nacional de Ubajara, que garante certa proteção e uso sustentado da paisagem. Palavras-Chave: Ubajara, Evolução Geomorfológica, Uso e Ocupação. ABSTRACT The natural domains of the State of the Ceará display a great diversity, what generates great interest for studies about nature and society x nature. In this perspective, the present paper analyze the genesis of the landform and the evolution of the sedimentary highland of Ibiapaba, with emphasis in the sector of Ubajara (NW of Ceará State territory), as well as concerning the forms of use and social appropriation of the area. The searched area is formed by sedimentary and crystalline rocks, with predominance of sedimentary rocks of the Basin Sedimentary of the Parnaíba, in which has been sculptured a glint, forming a vertical thick wall of until 900m of altitude. The area has as main forms of use and occupation activities related to agriculture, as well as

RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO NA SERRA DE UBAJARA, PLANALTO DA

IBIAPABA, CEARÁ

Autora: Renata de Farias Bandeira

1. Departamento de Geografia, Universidade Federal do Ceará (UFC), [email protected]

RESUMO

Os domínios naturais do Estado do Ceará expõem uma grande diversidadade de formas, o que gera grande interesse para estudos do meio natural, bem como no tocante à relação sociedade x natureza. Nessa perspectiva, vem sendo realizada pesquisa que tem por objetivo o estudo da gênese e evolução geomorfológica do Planalto da Ibiapaba, com ênfase no setor de Ubajara (a NW do território cearense), bem como acerca das formas de uso e apropriação social da área. A área pesquisada é formada por rochas sedimentares e cristalinas, com predomínio de rochas sedimentares da Bacia Sedimentar do Parnaíba, que se apresentam expostas na forma de glint, formando paredão vertical de até 900m de altitude. A área tem como principais formas de uso e ocupação atividades relacionadas à agricultura, bem como ao uso turístico controlado, com sustentabilidade moderada, fato que resulta da implantação de um parque nacional na localidade nos anos 1950. A metodologia utilizada na pesquisa tem suporte no “Princípio do Uniformitarismo”, que postula que “o presente é a chave do passado”, o que permite recompor a história evolutiva pretérita da paisagem. Na análise ambiental, foi utilizada a perspectiva do Geossistema, que permite analisar a organização espacial resultante da interação dos elementos naturais juntamente com as atividades sociais. Destacamos que a evolução geomorfológica regional está relacionada a processos internos e externos em ação desde o Cretáceo. A morfologia resultante desses processos influencia a organização social da região, tendo em vista que as vertentes íngremes dificultam a fixação de moradias e atividades, restringindo-se a ocupação à depressão periférica cristalina e ao topo do planalto sedimentar. No entanto, o caráter acidentado da paisagem e a umidade resultante da elevada altitude, criam um ambiente diferenciado em relação ao semi-árido cearense, fatos que justificam a existência do Parque Nacional de Ubajara, que garante certa proteção e uso sustentado da paisagem. Palavras-Chave: Ubajara, Evolução Geomorfológica, Uso e Ocupação. ABSTRACT The natural domains of the State of the Ceará display a great diversity, what generates great interest for studies about nature and society x nature. In this perspective, the present paper analyze the genesis of the landform and the evolution of the sedimentary highland of Ibiapaba, with emphasis in the sector of Ubajara (NW of Ceará State territory), as well as concerning the forms of use and social appropriation of the area. The searched area is formed by sedimentary and crystalline rocks, with predominance of sedimentary rocks of the Basin Sedimentary of the Parnaíba, in which has been sculptured a glint, forming a vertical thick wall of until 900m of altitude. The area has as main forms of use and occupation activities related to agriculture, as well as

Page 2: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

sustainable tourist with moderate support, fact that results of the implantation of a national park in the locality in the years 1950. The methodology has support in the “Principle of Uniformitarism”, that claims that “the present is the key of the past”, what allows to the reconstitution of the prior evolution of the landscape. In the environmental perspective, the Geossystem methodology has been used, allowing to the analyze of the space organization and of the interaction of natural and social factors. The regional geomorphological evolution is related to internal and external processes in action since Cretaceous time. The resultant morphology of these processes influences the social organization of the region, considering that steep slopes make difficult the setting of housings and activities, restricting the occupation to the crystalline peripheral depression and to the top of the sedimentary plateaus. However, the high topography and the resultant humidity create an environment differentiated in relation to its semi-aride territory, fact that justify the existence of the National Park of Ubajara, a guarantee of protection and supported use of the landscape. Word-Key: Ubajara, Geomorphological evolution, Use and Occupation of land. INTRODUÇÃO

A relação do homem com a natureza implica numa antiga convivência deste com

o relevo, estabelecendo as distintas formas de uso e ocupação das terras. Ao mesmo

tempo, as sociedades têm que conviver com a dinâmica dos fatores externos e internos

de elaboração do relevo terrestre, ou seja, dos processos endógenos e exógenos, sejam

eles ativos ou passivos, em ação na atualidade ou presentes apenas como heranças na

paisagem. A ciência geográfica, com seu caráter de integração, tem na Geomorfologia,

um dos seus sub-ramos estuda os diferentes aspectos da superfície terrestre (GUERRA

E CUNHA, 2000), compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no tempo,

incluindo hoje a intervenção humana.

O estudo do relevo e seus processos geradores vêm contribuir para o avanço do

conhecimento relativo á suas origens e evolução, bem como à necessidade de

conhecimentos relativos à contribuição de fatores como geologia, clima, topografia,

solo, hidrografia, biologia para o desenvolvimento social. O processo de apropriação do

relevo seja como suporte ou como recurso, vincula-se ao comportamento da morfologia

e às condições pedológicas e climáticas, e é dentro dessa perspectiva que o presente

estudo adquire expressão. A área particular de análise definida é o Planalto da Ibiapaba,

com ênfase no setor que abrange o município de Ubajara, localizado no extremo oeste

do Estado do Ceará.

Page 3: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

MATERIAS E MÉTODOS

A metodologia utilizada para atingir os objetivos propostos tem suporte no

“Princípio do Uniformitarismo”, uma corrente do pensamento idealizada por James

Hutton (1788) e posteriormente desenvolvida por Charles Lyell (1830). Hutton

acreditava que fenômenos geológicos podem ser entendidos através de observações de

processos modernos e todos aqueles processos que operaram no passado, também

operam no presente tempo. As constâncias destes processos vieram a ser a essência do

“Princípio do Uniformitarismo”.

O Uniformitarismo teve suporte incrementado pelo grupo de geólogos

conhecidos como “plutonistas”, pois eles confiavam na importância do calor como um

fator na formação de certas rochas. O Uniformitarismo, então, teve um novo e

importante suporte que ajudou a desenvolver esta corrente. Charles " Princípios de

Geologia", com primeiro volume aparecendo em 1830, o qual reafirma a constância da

ação dos processos naturais ao longo do tempo, porém, com intensidade diferenciada.

O Princípio do Uniformitarismo postula que “O presente é a chave do passado”

Os acontecimentos do passado são resultados de forças da natureza idênticas as que se

observam hoje em dia, resultado de processos lentos e graduais. Então, propõe que o

entendimento do presente permite o entendimento do passado e assim, a compreensão

da evolução natural da paisagem.

Para a análise socioambiental da paisagem foi adotado o princípio básico do

método geossistêmico. É um conceito relativamente recente em geografia, sendo

proposto na antiga União Soviética na década de 1960, e primeiro mencionado pelo

russo Sotchava (1960), como uma forma de estudo de paisagens geográficas complexas,

envolvendo a sociedade. Segundo Sotchava apud Monteiro(2000), Geossistema é o

"potencial ecológico de determinado espaço no qual há uma exploração biológica,

podendo influir fatores sociais e econômicos na estrutura e expressão espacial". Toma-

se forma neste momento a disciplina interface entre as ciências da terra e a ciência

social. Desde então surgiram diferentes tipos de abordagem físico-geográficas,

marcadamente sistêmicas, redundando "diferentes escolas para o estudo das

paisagens". Como é habitual em tudo que é novo, tal abordagem gerou diferentes

interpretações e um bom número de controvérsias, com autores criticando, redefinindo

ou reorientando o conceito inicial de Sotchava.

Page 4: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

A teoria representa a organização espacial resultante da interação dos elementos

físicos e biológicos da natureza juntamente com as atividades sociais, ou seja, tem vista

os fenômenos sociais influenciando na configuração dos espaços e sua dinâmica física.

O Geossistema facilitou e incentivou os estudos integrados das paisagens. Desta

forma, pode-se afirmar que o método geossistêmico fomentou bastante às análises

ambientais em Geografia, pois possibilita um prático estudo do espaço geográfico com a

incorporação da ação social na interação natural com o potencial ecológico e a interação

biológica.

Associado a esses princípios, adotaram-se técnicas que permitiram o

desenvolvimento da análise socioambiental da área pesquisada, bem como o estudo da

morfoestrutura, morfodinâmica e das fases da evolução geomorfológica da bacia

Sedimentar do Parnaíba, bem como sua evolução no limite ocidental do Ceará, que é

onde está localizado o Planalto da Ibiapaba.

Foi realizada uma detalhada pesquisa bibliográfica associada à evolução

geomorfológica de relevos do Nordeste brasileiro, com destaque aos relevos do Estado

do Ceará, sempre procurando dados associados à fisiografia da região onde se encontra

o Planalto da Ibiapaba. Houve a análise de trabalhos específicos da área de estudo e

documentos contendo perfil básico do município de Ubajara com as principais

características geográficas e socioeconômicas.

Em laboratório houve a análise detalhada de cartas e mapas (escala 1:500.000)

geológicos e geomorfológicos do projeto Radambrasil (1981) e da CPRM (2003).

Houve a utilização de imagens de satélite (GOOGLE EARTH) como apoio para o

reconhecimento da área estudada.

Em campo pode-se fazer o reconhecimento comparativo da região estudada com

os dados e informações coletadas em gabinete e laboratório, além da análise das formas

de relevo existentes no local. Foram feitas observações da dinâmica natural e social

atual. Também foi feito vários registros fotográficos de vários pontos do planalto da

Ibiapaba, especificamente do setor de Ubajara.

A análise ambiental foi conduzida com base no levantamento de recursos

naturais da região dentro da área da APA (área de proteção ambiental) da Ibiapaba.

Foram diagnosticados os principais problemas ambientais e analisada a potencialidade

ao desenvolvimento do turismo ecológico, dando ênfase aos atrativos naturais,

mantendo o equilíbrio ambiental e a realidade da vida das populações locais. As

Page 5: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Informações coletadas foram sistematizadas e confrontadas, dando sustentabilidade á

fundamentação teórico-metodológico, como também, auxiliar na interpretação das

idéias, possibilitando uma visão das implicações de condicionantes ambientais, como o

próprio relevo influencia no uso e ocupação do solo da área.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

1. Origem e Evolução Geomorfológica do Planalto da Ibiapaba

A área objeto desse estudo localiza-se no município de Ubajara, situado na parte

setentrional do Planalto da Ibiapaba, porção noroeste do estado do Ceará, parte

integrante da região Nordeste do Brasil.

Com efeito, ao longo da história da Terra existiram quatro megacontinentes:

Atlântida, Rodínia, Panótia e Pangea (BRITO NEVES, 1999). O primeiro deles data da

era Paleoproterozóica (2,5 G.a). Esses continentes passaram ao longo do tempo por

processos de fusão e fissão, até chegar aos seis continentes que hoje compõem o nosso

planeta. Todos os processos de aglutinação e divisão dos supercontinentes ocasionaram

vários eventos tectônicos de deformações, falhamentos, magmatismo, riftiamentos.

Esses eventos contribuíram para evolução morfotectônica do relevo terrestre,

provocando modificações radicais na paisagem geológica e geotectônica dos

continentes envolvidos neste processo (BRITO NEVES, 1999).

Mapa de localização da área de estudo – município de Ubajara

Page 6: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Dentre esses processos de aglutinação e divisão daremos foco ao

supercontinente Panótia, cuja aglunitação ocorreu em torno de 500 M.a, através da

Orogênese Brasiliana. O megacontinente formado por Laurásia e Gondwana passou por

processos extensionais por volta de 450 M.a que conduziram à sua dispersão e à

formação do oceano Lapetus – entre Gondwana ocidental e Laurásia – e o seu ramo

lateral, o mar de Tomquist – entre Gondwana e Báltica (BRITO NEVES, 1999). Esses

processos individualizaram Gondwana como supercontinente, inaugurando um

completo Ciclo de Wilson (BRITO NEVES, 1999). Juntamente com esses eventos de

divisão a um nível global, ocorreram vários processos extensionais no interior do

continente, responsáveis pela formação de vários tipos de tafrógenos (antefossas,

intrafossas, impactógenos, bacias pull apart ao longo de zonas de cisalhamento). Com a

força de dispersão do continente ocorreu o desenvolvimento de uma série de rifts

intracontinentais no seio do Gondwana, originando grandes sinéclises paleozóicas,

dentre elas uma de grande extensão situada no noroeste desse super-continente – a

sinéclise do Parnaíba. As sinéclises passaram na seqüência por estágios evolutivos

termo-mecânicos. Cinco estágios tectônicos foram diferenciados: sinéclise, pré-rift, rift,

transicional e deriva, durante o qual vários pacotes sedimentares foram sendo

depositados .

A sinéclise do Parnaíba se originou no período Ordoviciano da era Paleozóica e

desenvolveu-se essencialmente sobre a crosta continental bastante tectonizada. Para

Góes e Feijó (1994), no final do Ciclo Brasiliano, os grabens e meio-grábens instalados

ao longo das principais zonas de fraquezas crustais herdadas foram preenchidas

simultaneamente por sedimentos imaturos. A partir do final do Ordoviciano, com o

término da influência tardi-brasiliana, a subsidência ocorreu de forma mais lenta e

gradual, unicamente em resposta ao resfriamento termal. Assim, do final do período

Ordoviciano em diante, um grande sítio deposicional foi instalado sobre o

supercontinente Gondwana, na porção correspondente ao atual Nordeste brasileiro – a

denominada (Cunha, 1986) Bacia do Parnaíba.

Page 7: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Bacia do Parnaíba e localização no Brasil

A Bacia do Parnaíba está localizada na porção nordeste da plataforma sul-

americana. Ocupa em grande os estados do Piauí e do maranhão e recobre parcialmente

os estados do Pará, Ceará, Bahia, Tocantins e Goiás. Esta bacia sobrepôs um

embasamento caracterizado pelo encontro de três grandes crátons: Amazônico, Congo-

São-Franscisco e África Ocidental - São Luiz.

A Bacia do Parnaíba possui dimensões da ordem de 600.000 Km² e espessura de

até 3.500 m. Apresenta forma elipsoidal com diâmetros de 1000 km a NE-SW (maior) e

800 km a NW-SE (menor), e está posicionada sobre área de remobilização brasiliana

(JUSTO, 2006). A área original da Bacia , durante sua evolução Paleozóica, excedeu 0,7

milhões de Km², acumulando cerca de 2.500 m de sedimentos detríticos em seu

depocentro (ALMEIDA, 1969 apud JUSTO, 2006). Esta bacia sedimentar corresponde,

portanto a uma sinéclise, bacia intracratônica, ou seja, formada dentro do cráton ou

embasamento.

Góes e Feijó (1994) sintetizaram a estratigrafia da bacia em quatro grupos: Serra

Grande, Canindé, Balsas e Mearim. A evolução paleogeográfica foi reconstituída a

partir da subdivisão de cinco seqüências deposicionais de segunda ordem. Cada

seqüência deposicional corresponde a um pacote de rochas com ampla distribuição,

relacionadas a um ciclo tectônico limitado no topo e na base por discordâncias de

caráter regional.

Page 8: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Segundo Góes e Feijó (1994), o período de tempo no qual a maior parte da

sedimentação ocorreu nomeia uma seqüência. Assim, as cinco seqüências deposicionais

e suas unidades litoestratigráficas correspondentes são as seguintes:

Seqüência Siluriana – Grupo Serra Grande: é composto por arenitos,

folhelhos, siltitos, conglomerados e raros diamictitos. É composto pelas formações Ipú,

Tianguá e Jaicós, que corresponde à primeira incursão marinha na bacia.

Seqüência Devoniana – Grupo Canindé: é composto por folhelhos,

arenitos e siltitos, distribuídos nas formações Itaim, Pimenteiras, Cabeças, Longá e Poti,

que corresponde a segunda incursão marinha na bacia.

Seqüência Carbonífera-Permiana – Grupo Balsas: é composto por

arenitos, siltitos, folhelhos, calcários, anidritas, silexitos e restos de madeira petrificada,

distribuídas nas formações Piauí, Pedra de fogo, Motuca e Sambaíba que corresponde a

deposição em mares com circulação restrita.

Seqüência Jurássica – Grupo Mearim: é composto por arenitos, siltitos e

folhelhos das formações Pastos Bons e Corda, depositados em ambiente desértico,

flúvio-lacustre com retalhamento eólico. Atividade vulcânica foi atribuída à formação

mosquito.

Seqüência Cretácea – arenitos, argilitos, folhelhos, carbonatos e anidritas

correspondentes ás formações Itapecuru, Codó e Grajaú, depositados em ambiente

epicontinental com eventuais incursões marinhas restritas à base da seqüência. A

atividade vulcânica é atribuída á formação Sardinha. As formações Areado (siltitos e

folhelhos) e Urucuia são de pouca expressão e restritas ao sul da Bacia.

Segundo Góes e Feijó (1994) ainda haveria uma sexta seqüência, uma seqüência

terciária, que corresponde às formações Nova Iorque composta por folhelhos e siltitos

com restos de plantas e peixes, e a formação Pirabas, composta por margas e calcários.

Do Ordoviciano - 435 M.a - até o Carbonífero – 295 M.a , o preenchimento da

bacia esteve condicionado a 2 eixos deposicionais ortogonalmente dispostos e

orientados para SE-SW e NW-SE, coincidindo aproximadamente às direções dos

lineamentos transbrasiliano e Picos-Santa-Inês.

No noroeste do Ceará, o lineamento transbrasiliano recebe o nome de falha

Sobral-Pedro II. Uma suposta reativação desta falha teria soerguido a parte setentrional

da Bacia do Parnaíba, especialmente a borda oriental, onde se encontra e está sendo

esculturado o Planalto da Ibiapaba. Tal fato teria ocorrido durante as deformações que

Page 9: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

no Cretáceo levaram à divisão do megacontinente Pangea, na sua parte sul, o

Gondwana. Essa reativação, que parece ter tido caráter regional, teria soerguido o

embasamento no qual foi depositado os pacotes sedimentares do Paleozóico,

solidariamente com os maciços cristalinos e bacias sedimentares mesozóicas

(CLAUDINO SALES, 2002; PEULVAST e CLAUDINO SALES, 2004). Sendo assim,

o soerguimento do Planalto da Ibiapaba estaria associado à tectônica do período

Cretáceo e talvez ainda, no seu flanco norte, à flexura marginal que sofreu o continente

a partir do Terciário.

A partir desse soerguimento, o glint da Ibiapaba vem sendo gradativamente

erodido, através do recuo de suas vertentes, na parte sustentada pelas rochas

sedimentares, e pela exumação e destruição subsequente do segmento do embasamento

sobre a qual os pacotes sedimentares foram depositados. Após o esmorecimento da

atividade tectônica cretácea, o regime climático e seus processos exodinâmicos

assumem papel fundamental na dinâmica dos processos geomorfológicos ocorridos no

Ceará, passando assim a serem os responsáveis pela modelagem do relevo não só dessa

área, mas de todo o Nordeste na atualidade. A formação do glint está ligada tanto ao

processo de regressão da vertente como também pelo processo de exumação do material

cristalino, que é logo erodido pela dinâmica externa. O glint se caracteriza pelo fato do

material sedimentar da Ibiapaba estar em contato direto com o cristalino na depressão

periférica cearense, que na verdade representa uma superfície de aplainamento de idade

pré-deposição da Bacia do Parnaíba (pré-Siluriano), na atualidade sendo exumada e

imediatamente destruída pela ação erosiva, incorporando-a assim à Superfície Sertaneja,

que representa a superfície de piso do Estado do Ceará (CLAUDINO SALES, 2002).

2. Caracterização Física da área de Estudo

Com altitudes em torno de 900 m na porção setentrional e decrescendo em

direção ao sul, o Planalto da Ibiapaba possui direção geral Norte-Sul e extensão

aproximadamente de 400Km. Trata-se de um relevo dissimétrico, com vertente íngreme

para o Ceará e suavemente inclinado para o Piauí. Abrange uma área de 7.391 Km²,

contendo os municípios de Granja, Viçosa do Ceará, Tianguá, Ubajara, Ibiapina,

Ipueiras, Iporanga, São Benedito, Carnaubal, Guaraciaba do Norte, Croatá e Poranga.

Esse relevo está na divisa do Estado do Piauí com o Ceará.

Page 10: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Localização do Planalto da Ibiapaba

O município de Ubajara, área de estudo aqui representada, compreende uma área

de 385Km², localizada entre as coordenadas de 3º 51’ 28’’ S e 40º 55’ 39’’ W. Limita-

se com os municípios de Ibiapina, Coreaú, Mocambo, Tianguá, Frecheirinha e com e

Estado do Piauí.

O planalto da Ibiapaba tem como litologia predominante as rochas do Grupo

Serra Grande. Esse grupo é formado pelas formações Ipú, Tianguá e Jaicós apresenta

espessuras variáveis, variando entre 535 metros na seção Ipú-Macambira, e 164 - 223

metros na seção entre Ibiapina e Viçosa do Ceará. Nessa secção se encontra o município

de Ubajara. Considerando que o relevo nesse segmento é da ordem de 750 -800m, o

embasamento cristalino representaria portanto parte da vertente íngreme que caracteriza

o Planalto da Ibiapaba, nas altitudes abaixo de 600m. Na região de Ubajara, o

embasamento é representado por rocha metamórfica pré-cambriana, do tipo “calcário

cristalino”, o qual forma grutas calcáreas no sopé do relevo escarpado, além de

‘monadnocks’ E inselbergs mantidos pela formação calcária.

Com efeito, o município de Ubajara apresenta um quadro geológico

relativamente complexo (CPRM, 1998). A área pesquisada é formada tanto por rochas

sedimentares como por rochas cristalinas, tendo um predomínio de rochas sedimentares

do Grupo Serra Grande, que capeia o topo da bacia sedimentar do Parnaíba. O Grupo

Serra Grande apresenta-se em bancos espessos, quase sempre diaclasados, formando

Page 11: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

paredões verticais de até 180 metros de altura na área de pesquisa. A altitude do

município varia, alcançando cotas altimétricas superiores a 750 metros de altitude.

Perfil topográfico abrangendo o município de Ubajara até a Depressão Periférica

Assim, o setor que compreende o município de Ubajara apresenta um relevo

acidentado e uma cornija bem espessa em comparação a outros setores do glint. A

cidade possui uma altitude estimada em torno de 800 m. Sua vertente é modelada em

rochas cristalinas. É bastante dissecada, com uma notável presença de festões e ravinas,

criando nichos fluviais. A vertente possui um perfil ligeiramente côncavo, devido a

dissecação feita pelos rios. A erosão regressiva que a vertente vem sofrendo está

exumando o cristalino.

A geomorfologia da área pesquisada, como exposto anteriormente, comporta

influências de vários fatores estruturais, paleoclimáticos e da dinâmica atual. Eventos

tectônicos e climáticos ocorridos a partir do período Cretáceo deram formas ao relevo

do Nordeste brasileiro, que hoje vem sendo modelado pelos fatores da dinâmica externa,

sempre associado à flexura marginal, de ação contínua e suave. Com efeito, o relevo da

região tem sido estruturado e esculpido desde a separação entre América do Sul e

África, no Cretáceo Superior (CLAUDINO SALES, 2004). Na região estudada atuam

principalmente os processos lineares de erosão do relevo, além de processos areolares

como movimentos de massa.

Em conseqüência desses processos, observamos no setor de Ubajara uma

vertente com um escarpamento contínuo, podendo apresentar em algumas ocasiões

desníveis por conta da maior resistência da rocha em alguns setores. O escarpamento é

abrupto e bastante festonado. Na depressão periférica adjacente, cristalina, o relevo é

dissecado em lombadas, cristas e colinas rasas, frequentemente na forma de

Page 12: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

monadnocks. Nas condições climáticas ali atuantes, as rochas do embasamento

apresentam menor resistência aos processos erosivos. O fato de ter cristalino na vertente

do glint indica que o embasamento cristalino esta sendo barbaramente atacado pela

erosão, por está sendo rebaixado, enquanto o topo sedimentar resiste. Então o que

ocorre é uma erosão diferencial no embasamento cristlino, com rochas mais resistentes

permancendo na forma das colinas. Com efeito, no topo do planalto destaca-se a cornija

arenítica, espessa nesse setor, indicando a maior resistência do material arenítico. Trata-

se de um relevo dissimétrico, com um front escarpado e um reverso de caimento

topográfico suave para oeste em direção ao centro da bacia, no Estado do Piauí, em

concordância com o mergulho das camadas.

Fotos do front do Planalto da Ibiapaba, mais especificamente do Setor do

Parque Nacional de Ubajara.

Na vertente e no sopé do setor de Ubajara, como já salientado, aflora um

calcário cristalino pré-cambriano, que através de ações físico-químicas vendo sendo

modelado na forma de relevos cársicos. Um processo comum é a carbonatação,

originando grutas calcárias. Nestas grutas ocorrem variadas formas de relevo, tais como

estalactites, estalagmites, colunas e cortinas, entre outras formas originadas do calcário

dissolvido e precipitação do cálcio.

Calcário cristalino aflorando na vertente do Planalto no setor de Ubajara.

Page 13: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Exemplos de estalactites, Estalagmites, colunas e cortinas.

No Planalto da Ibiapaba, as condições climáticas englobam características

diversificadas em relação ao quadro geral do resto do estado. A pluviometria média

anual é superior a 1200mm/a, sendo a distribuição de chuvas regular. As temperaturas

médias anuais variam em torno de 22º e 24º. As temperaturas mais baixas diminuem

sensivelmente a evapotranspiração, conservando a umidade local. Tais diferenças em

relação ao sertão são explicadas pela compartimentação topográfica, que condiciona o

comportamento da temperatura e da pluviosidade, índices que contrastam com o sertão

semi-árido.

No tocante ao município de Ubajara, salienta-se que ele se encontra quase que

totalmente na área úmida, tendo seu clima classificado como Tropical Quente Úmido

(SILVA E CAVALCANTE, 2000). Tem temperaturas médias entre 19ºC nos meses de

chuva, e 29ºC nos meses secos, com precipitação média anual próxima dos 1600mm/a

(CPRM, 1998) Uma pequena área do município de Ubajara está na parte sub-úmida,

que compreende o pé-de-serra da Ibiapaba. A pluviometria média anual é variável entre

900 e 1200 mm/a. As temperaturas médias anuais oscilam entre 23ºC e 28ºC. As

condições climáticas se refletem nas características ecológicas, dando características

individualizadas a certos setores.

O planalto da Ibiapaba, no que se diz respeito ao revestimento vegetal, é

caracterizado pelo predomínio da floresta úmida. Os resquícios da mata primitiva se

restringem à área do Parque Nacional de Ubajara. A floresta úmida é uma mata

perenifólia, onde os componentes arbóreos têm prevalência com elevada densidade das

espécies. Os componentes herbáceos e arbustivos são pobres em espécies e de pequena

Page 14: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

densidade. A altitude e a alta nebulosidade dão condições para a ocorrência desse

padrão fitogeográfico (SILVA, 2005).

A região de Ubajara, como já foi citado, é o trecho mais representativo da

floresta úmida, demonstrando uma mata original, com árvores de grande porte,

esgalhamento aberto e rico em cipós. Segundo o IPLANCE (1997) e a SRH (1992), a

vegetação que envolve o município de Ubajara é o Carrasco, (vegetação xerófila densa

de caules finos), a mata úmida (floresta subperenifólia tropical plúvio-nebular) e a mata

seca (floresta subcaducifólia tropical pluvial). Na área de Ubajara, no sopé da vertente, a

floresta subcaducifólia contacta com a caatinga, por estarem em um local onde a

pluviosidade é menor, a temperatura é mais elevada e os solos são mais rasos (SILVA,

2005).

No planalto sedimentar da Ibiapaba as classes de solos que aparecem são as

seguintes: Latossolos vermelho-amarelo; Neossolos quartzarênicos; Neossolos litólicos

(PEREIRA, 2000). Os latossolos vermelho-amarelo compreendem a classe do reverso

imediato da Ibiapaba. Trata-se da faixa mais úmida do glint. A profundidade desses

solos 1,50m. Os Neossolos quartzarênicos tem ocorrência expressiva no reverso da

Ibiapaba. Os Neossolos litólicos tem espessura mínima. A maior ocorrência é observada

na depressão periférica. Mais especificamente no município de Ubajara, os tipos de

solos encontrados são Neossolos quartzarênicos, os Latossolos vermelho amarelo, os

Podzólicos vermelho amarelo e os Regossolos.

O planalto da Ibiapaba possui uma rede de drenagem densa, salientando-se a

área de imposição fluvial do rio Poti, na continuação meridional do planalto. As

classificações dos rios da região têm como referência o mergulho das camadas que

constituem o relevo. O rio que escoa de acordo com a declividade das camadas, no

reverso, é o rio cataclinal. Estes escoam em direção ao reverso do glint. Temos como

exemplo principal o rio Poti, que faz parte da bacia do rio Parnaíba (Piauí), e sulca a

parte central da Serra da Ipiapaba, na forma de percée. Ao norte, o reverso é também

sulcado por pequenos cursos d’água conseqüentes que formam estreitas planícies

fluviais. Os rios que escoam contra o mergulho das camadas são os rios anaclinais. Os

rios anaclinais são afluentes dos rios que estão drenando a depressão periférica no sopé

da Ibiapaba, que são os rios Acaraú e Coreaú. Esses rios colocam-se inclusive como rios

ortoclinais. Em adição, registra-se que ocorre razoável potencial de recursos hídricos

subterrâneos na área de pesquisa.

Page 15: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

O município de Ubajara se encontra quase que totalmente inserido na bacia

hidrográfica do Parnaíba, onde a drenagem principal é representada pelo rio Jaburu. A

exceção é uma pequena porção do município (parte leste) que se encontra inserida na

bacia hidrográfica do Coreaú. Nessa bacia destacam-se os riachos Itaipu e Ubajara. O

principal reservatório de água superficial da região é o açude Jaburu I, com capacidade

de armazenamento de ordem de 210hm³. Esse reservatório é responsável pelo

abastecimento de 100% da população urbana do município.

A depressão periféira do glint da Ibiapaba apresenta superfícies planas e

dissecadas com condições climáticas subúmidas a semi-áridas. Nesse segmento

rebaixado, as precipitações médias anuais são inferiores ao topo do planalto, estando da

ordem de entre 700-900 mm. Os cursos d’água são intermitentes, apresentando um

baixo potencial de águas subterrâneas

3. A Geomorfologia e Uso do Espaço em Ubajara

Analisando as diferentes formas de uso do solo intrinsecamente ligadas aos recursos

naturais na região do município de Ubajara, observa-se que está marcada pela elevada

densidade de ocupação agrícola e pela intensidade de uso de seu solo. O turismo

também é uma atividade que está se sobressaindo entre as atividades econômicas dessa

região. Essas diferenças são justificadas principalmente pelas condições climáticas e

pedológicas da região privilegiadas, quando consideradas em relação às áreas semi-

áridas que constitui o seu entorno.

Os fatores restritivos ao uso da terra são de natureza topográfica e edáfica face à

morfologia do terreno, que possui uma vertente íngreme, restringindo o uso do solo às

áreas mais planas como o topo do glint e á depressão periférica cristalina, e o outro fator

é a baixa fertilidade dos latossolos provenientes da alteração do arenito. Devido ao

desmatamento indiscriminado ali verificado, e o conseqüente uso intenso e continuado

dos recursos naturais através de técnicas rudimentares, os processos erosivos se

manifestaram, trazendo empobrecimento aos latossolos, sobretudo, por conta da

lixiviação (SOUZA, 2000).

Segundo LIMA (2000), quanto ao uso e à sustentabilidade, a área é favorável às

culturas de longo e curto ciclo, com adubação e com a aplicação de corretivos da acidez

dos solos. Nesse aspecto, o autor indica como necessário à sustentabilidade local os

aproveitamentos baseados na silvicultura, através do reflorestamento de áreas

Page 16: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

degradadas; a manutenção de resquícios de mata plúvio-nebular; e o uso urbano

turístico controlado, o qual hoje produz sustentabilidade moderada. Quanto às

condições ecodinâmicas e à vulnerabilidade ambiental, a região apresenta ambientes de

transição, com tendência à instabilidade e à vulnerabilidade de moderada a alta na área

escarpada com desmatamentos indisciplinados.

As depressões sertanejas correspondem também às amplas superfícies de

aplainamento que foram elaboradas sobre condições climáticas semi-áridas. Nesses

lugares verificou-se um trabalho intenso de erosão, que rebaixou o relevo,

principalmente nas áreas de rochas menos resistentes. Segundo LIMA (2000), a

depressão periférica da Ibiapaba apresenta restrições quanto ao seu potencial

geoambiental e limitações de uso dos recursos naturais, com solos apresentando fortes

limitações ao uso agrícola. Apesar das limitações, a área em estudo é extremamente

utilizada para a agricultura tradicional. A agricultura tradicional é realizada, sobretudo

através de desmatamentos com queimadas, os quais deixam os solos expostos às fortes

chuvas, ocasionando a remoção constante dos seus horizontes superficiais, o que acaba

provocando uma redução da fertilidade natural e diminuição da produção agrícola.

Do ponto de vista do uso voltado para o turismo, esse tem na ocorrência do

calcário cristalino pré-cambriano, que aflora na base da vertente, um grande atrativo.

Neste setor, a vertente do glint é mantida pelo calcário, que está capeado pelo arenito da

formação Serra Grande. Este calcário sofre o processo de carbonatação, formando

grutas calcárias com as mais variadas formas de relevo.

Durante visita que fez à Gruta de Ubajara, no final da década de 1950, o então

diretor do Serviço Florestal do Ministério da Agricultura, Dr. David Azambuja, ficou

encantado com a riqueza do patrimônio de cavidades naturais e da biodiversidade

existente. A visita e a intervenção posterior do diretor possibilitou a criação do Parque

Nacional de Ubajara, no dia 30 de abril de 1959, assinada pelo presidente da República,

Juscelino Kubitschek de Oliveira, com a finalidade de garantir a integridade e o

processo de evolução do conjunto de formações geológicas existentes em Ubajara.

Page 17: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

Parque Nacional de Ubajara

Do ponto de vista geológico, geomorfológico, botânico e faunístico, o Parque

Nacional de Ubajara representa riqueza inestimável, no que tange a investigação

científica e à exploração turística. A principal atração do Parque é a Gruta de Ubajara,

encravada entre afloramentos das rochas calcárias, a aproximadamente 520m de

altitude. Existem também outras cavernas (localmente conhecidas como grutas), que

não estão abertas à visitação. Destacam-se: Gruta do Urso Fóssil, Gruta do Gruta do

Macaco Fóssil, Gruta do Morcego Branco, Gruta de Cima, Gruta do Pendurado, Gruta

dos Mocós, Gruta das Aranhas, Furna das Pipocas, Furna do Acaso e Furna da Múmia.

O desenvolvimento turístico constitui uma estratégia eficaz para atrair

investimentos privados e nacionais, e gerar receita e emprego ao continuar atraindo um

número crescente de visitantes. A região tem o ecoturismo bastante difundido. A

biodiversidade da região e seu clima agradável, que mesmo estando num domínio

morfoclimático semi-árido, caracteriza-se como um clima semi-úmido, devido a sua

topografia acidentada, faz parte de uma dinâmica mesoclimática, servindo como um

verdadeiro laboratório, para cientistas, pesquisadores, naturalistas e estudantes, além de

um refúgio para aventureiros, esportistas, religiosos, entre outros.

CONCLUSÕES

O desenvolvimento desse trabalho tem uma significativa contribuição à análise

da morfogênese do limite ocidental do Ceará, com observação das mudanças que

ocorreram e estão ocorrendo ao longo do Planalto da Ibiapaba, mais especificamente na

região de Ubajara. Com a pesquisa, foi possível identificar variações na paisagem que

estão se diversificando juntamente com o clima, vegetação e hidrografia. As

Page 18: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

identificações dos processos que lhes deram origem contribuíram para interpretar as

morfoestruturas e a morfodinâmicaátual, que até a fase atual justificam as características

fundamentais da morfologia regional. A conjunção dos elementos levantados permite

considerar que a preservação dos ecossistemas do Planalto da Ibiapaba, abrangendo a

região de Ubajara – CE permitirá a conservação de um banco genético importantíssimo

para a pesquisa científica e a manutenção da biodiversidade. Além disto, será possível

prevenir a desertificação, ao evitar-se a destruição de nascentes.

Diante da abordagem feita sobre o uso e ocupação do solo da região de Ubajara,

Planalto da Ibiapaba, observa-se, que a sua estrutura geológica e geomorfológica,

juntamente com os outros aspectos naturais já citados, foram e são, até os dias atuais,

com o desenvolvimento do setor turístico, determinantes para o avanço econômico da

região. Assim, verificamos através de um estudo sobre a evolução geomorfológica

natural do relevo no qual o glint da Ibiapaba se desenvolveu, também a forma de

evolução geral da paisagem, natural e social. Pois verificamos que o local de estudo

representa uma importante área regional, que está sendo moldada hoje tanto pelos

agentes que esculturam o relevo, desenvolvendo paisagens naturais, quanto pelas ações

sociais.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, L.B (Org). Geologia da Bacia Jaibaras Ceará, Piauí e Maranhão – Projeto Jaibaras. Brasília: série geologia, n٥ 14, seção geológica básica nº 11, 1979. BIZZI, L.A; SCHOBBENHAUS, C; VIDOTTI, R.M e GONÇALVES, J.H (eds). Bacias sedimentares paleozóicas e meso-cenozóicas interiores. Brasília: CPRM, 2003. BRASIL, Ministério das minas e energia – Projeto RADAMBRASIL – Vegetação. Rio de Janeiro: vol.3, 1981. BRITO NEVES, B.B. América do sul: Quatro fusões, quatro fissões e o processo acrescionário andino. Bahia. VII simpósio nacional de estudos tectônicos, SBG, 1999. CAMPOS, J.E.G; DARDENNE, M.A. Origem e evolução tectônica da bacia sanfranciscana. In: Revista brasileira de geociências da UNB. 27, 283-294, 1997. CARVALHO, M.J. Estruturação do grupo serra grande na região de Santana do Acaraú (CE) e a reativação do lineamento Sobral - Pedro II: Integração com dados geofísicos. Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, 2003.

Page 19: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

CLAUDINO - SALES, V; PEULVAST, J.P. Aplainamento e geodinâmica: revisitando um problema clássico em geomorfologia. In: Revista de geografia da UFC. 01, 113-150, 2002. CLAUDINO - SALES, V; PEULVAST, J.P. Evolução morfoestrutural do relevo da margem continental do Estado do Ceará, nordeste do Brasil. In: Caminhos de Geografia – revista on-line. Uberlândia: v.7, n.20, p. 1-27, 2007. CPRM, Programa de Recenseamento de fontes de abastecimento de água subterrânea no Estado do Ceará, diagnóstico do município de Ubajara. Fortaleza, 1998. CHRSTOFOLETTI, A. Geomorfologia Fluvial. V. 1 – São Paulo: Edgard Blücher : 1981. CRUZ, N.M.S.M; DE SOUSA, M.A. Aspectos da evolução termo-mecânica da Bacia do Parnaíba. In: IX Congresso Internacional da Sociedade Brasileira der Geofísica, Salvador. Anais em CD-ROM, 2005. DELGADO, I.M. Paleontologia da Bacia do Parnaíba, Grajaú e São Luiz. CPRM, 1996. DE SOUSA, M.A. Estruturas grabenformes sob a Bacia do Parnaíba. Bahia. VII Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos, SBG, 1999. FIGUEIREDO, M.A. Vegetação. In: Atlas do Ceara. Fortaleza: IPLANCE, 1989. GÓES, A.M.O; FEIJÓ, F.J. Bacia do Parnaíba. B. Geoci. PETROBRÁS, Rio de Janeiro: v.8, n.1, p.57-67, jan/mar. 1994. GUERRA, A.T. Dicionário Geológico-Geomorfológico. Rio de Janeiro: série A, 1969. GUERRA, Antonio José Teixeira. Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos. Organização: Antonio José Teixeira Guerra e Sandra Baptista da Cunha – 7° Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. IPLANCE. Atlas do Ceará. Fortaleza, 1989. JUSTO, A.P. Sistemas orbitais e aéreos aplicados à análise multi-escala de lineamentos na borda sudeste da Bacia do Parnaíba. Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, 2006. LIMA, J.P.R; FONTES, S.L. Caracterização geoelétrica das principais feições tectono-estruturais da parte sudeste da Bacia do Parnaíba. VII Simpósio Nacional de Estudos tectônicos, SBG, 1999. LIMA, L.C (org). Área de Proteção Ambiental – APA da serra da Ibiapaba – Plano de Gestão e diagnóstico geoambiental e sócio-econômico. Fortaleza: IEPS, 1998.

Page 20: RELAÇÃO DOS ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS E O USO DO ESPAÇO ... · relação sociedade x natureza. ... compreender a evolução do relevo da terra no espaço e no ... pois possibilita

LIMA, M.I.C; COSTA, J.B.S. Radargeologia na sinéclise do Parnaíba e em seu embasamento. In: Anais do VII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto. Salvador, Brasil, INPE, 1996. MAIA, R.P. Baixo Jaguaribe – Ceará: Origem e evolução natural. In: SILVA, J.B; DANTAS, E.W.C; ZANELLA, M.E; MEIRELES, A.J.A. (orgs). Litoral e Sertão, Natureza e Sociedade no Nordeste brasileiro. Fortaleza: expressão gráfica, 2006. MEIRELES, A.J. As unidades morfoestruturais do Ceará. In: SILVA, J.B; CAVALCANTE, T.C; DANTAS, E.W.C etal (orgs). Ceará: um novo olhar geográfico. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2005. MONTEIRO, C.A.F. Geossistemas: a história de uma procura. São Paulo: Contexto/GeoUSP. (Novas abordagens 3). 2000. 127p. PEULVAST, J.P; CLAUDINO - SALES, V. Reconstituindo a evolução de uma margem continental passiva: um estudo morfogenético do nordeste brasileiro. In: SILVA, J.B; LIMA, L.C; ELIAS, D. (orgs). Panorama da Geografia Brasileira. São Paulo: Annablume, 2006. PONTE, F.C; ASMUS, H.E. Clássicos da geologia do petróleo brasileiro, As bacias marginais brasileiras: Estágio atual de conhecimento. B. Geoci: Petrobrás, Rio de Janeiro, v.12, n.2, p. 385-420, maio/nov. 2004. POPP, J.H. Introdução ao estudo da estratigrafia e da interpretação de ambientes de sedimentação. Curitiba: Scient et labor, 1987. SANTOS, V.H; FILHO, M.F.L; NEUMANN, V.H. Estudo Faciológico em afloramentos e analogia de depósitos fluviais na Bacia do Parnaíba, NE do Brasil. In: Estudos Geológicos. Pernambuco, v.14, 62-79, 2004. SILVA, E.V. Formações vegetais representativas do Ceará. In: SILVA, J.B; CAVALCANTE, T.C; DANTAS, E.W.C etal (org). Ceará: um novo olhar geográfico. Fortaleza: edições Demócrito Rocha, 2005. SILVA, J.B; CAVALCANTE, T.C. (coord). Atlas Escolar, Ceará: Espaço Geohistórico e Cultural. João Pessoa: Grafiset, 2004. SOUZA, M.J.N. A Ibiapaba e a depressão periférica ocidental do Ceará. III Encontro Nacional de Geógrafos. Fortaleza, AGB/UFC, 1978. SOUZA, M.J.N. Contribuição ao estudo das unidades morfoestruturais do Estado do Ceará. In: Revista de Geologia, 1,1.Fortaleza: UFC, 1988. SOUZA, Elivan Arantes de. Mata da Amem, Cabedelo/PB: Possibilidades de Co- Gestão.Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa. 2000.