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REESTRUTURAÇÃO ESPACIAL E DINÂMICA ECONÔMICA1 2
Angela Moulin S. Penalva Santos3
Janeiro, 1998
SUMÁRIO
I - Introdução
II - Os Impactos da Globalização na Configuração Espacial
II.1- A Configuração Espacial em Crise
II.2- A Configuração Espacial na Nova Ordem Econômica
III - Sistema Urbano Brasileiro
III.1 - Crescimento Urbano e Estruturação da Rede Urbana
III.2 - Sistema de Cidades no Brasil
III.3 - As Funções Urbanas
III.4 - A Nova Dinâmica Espacial
IV - Referências Bibliográficas
1Este ensaio é parte integrante dos relatórios de pesquisa do projeto Crescimento Econômico e
Desenvolvimento Urbano, desenvolvido na Diretoria de Pesquisas do IPEA pelo Núcleo de
Estudos e Modelos Espaciais Sistêmicos - NEMESIS - com o apoio do
MCT/FINEP/CNPQ/PRONEX.2 Trabalho em processo de publicação no periódico (Syn)Thesis. Cadernos do Centro de
Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.3Professora Adjunto da Faculdade de Ciências Econômicas - UERJ
2
I- Introdução
O economista Paul Krugman argumentou recentemente que “uma boa forma de se
entender a economia norte-americana é estudando suas cidades”(1). O mesmo poderia ser
dito em relação à economia de qualquer país, já que, não obstante a forte expansão do
comércio internacional nesta era de economia globalizada, a maior parte da produção de
qualquer país ainda é destinada ao mercado consumidor local. É necessário, pois, analisar
os determinantes da localização da produção no espaço, concedendo especial atenção à
formação do sistema de cidades, locus privilegiado da produção. Interessa-nos, em
particular, discutir o papel de um grupo de cidades, aquelas consideradas de porte médio,
como localização preferencial das atividades econômicas.
O objetivo deste texto é a elaboração de reflexões teóricas sobre a reestruturação
espacial recente, destacando como as transformações da nova ordem econômica vigente
refletem-se no espaço. As novas tecnologias no campo das comunicações, conjugadas com
uma reestruturação produtiva, traduzem-se na possibilidade de um processo de
descentralização espacial dentro do qual a localização da produção nas cidades de porte
médio assume um papel de grande relevo.
Este texto está estruturado em três partes, a primeira das quais constitui-se nesta
introdução. Na segunda parte, discute-se como as transformações na ordem econômica, a
partir dos anos 70, refletiram-se nas distintas formas como se estrutura o espaço: mais
polarizado nas décadas de 50 a 70, enquanto que os anos 80 e 90 presenciaram o início de
um processo de descentralização, ainda que regionalmente concentrado no Centro-Sul do
país. Na terceira parte, focaliza-se a organização do sistema urbano no Brasil. Analisa-se a
formação do sistema de cidades, as funções das cidades distribuidas hierarquicamente,
finalizando com uma reflexão, incipiente, sobre a nova dinâmica espacial em curso na
economia brasileira.
II - Os Impactos da Globalização na Configuração Espacial
A partir de meados dos anos 1980, surgiu um debate sobre a derrocada do modelo de
expansão econômica vigente desde o “boom” do pós-segunda guerra que, àquela altura já
atravessava pelo menos uma década de crise aberta desde a desvalorização do dólar, em
3
1971, e das crises do petróleo. A crise fiscal, a inflação e a dificuldade de retomada do
crescimento econômico eram sintomas de uma crise do padrão de desenvolvimento
estabelecido em Bretton Woods, no final da Segunda Guerra.
Os focos de tensão sobre aquela ordem foram tão intensos que muitos analistas se
questionavam se o capitalismo estaria sendo superado ou se ingressava numa nova etapa e,
neste caso, quais seriam os fatores que o distinguiria do paradigma anteriormente vigente
(4). Estaria em curso uma Terceira Revolução Industrial baseada nos avanços da
microeletrônica? Um novo padrão tecnológico estaria baseado nos processos de
“acumulação flexível”(5) ou no “toyotismo”(6), com novas perspectivas para as distintas
regiões geoeconômicas? Estariam as regiões mais comprometidas com o padrão
anteriormente vigente mais sucetíveis a enfrentar uma crise mais grave enquanto que abrir-
se-iam melhores perspectivas para as regiões que ingressariam no desenvolvimento
industrial nesta fase?
II.1- A configuração espacial em crise
A sociedade capitalista industrial desenvolveu, ao longo do século XX, um padrão de
crescimento bastante polarizado. Este foi o resultado não apenas do processo de
concentração característico do capitalismo, mas o produto da utilização de tecnologias que
viabilizavam-se economicamente se aplicadas pelas grandes empresas. Vale dizer,
tratavam-se de tecnologias que permitiam economias de escala, de tal sorte que
estimulavam a monopolização e concentração da estrutura produtiva. A verificação de que
a polarização era resultado da própria dinâmica econômica levou alguns estudiosos a
proporem a intervenção do poder público na organização espacial. Depois da II Grande
Guerra, tornou-se célebre a proposta de Fraçois Perroux de implementação de “pólos de
desenvolvimento” como instrumento de estímulo à economia das regiões deprimidas e,
assim, de superação de desequilíbrios regionais. Muitos países acolheram esta proposta e,
em particular, o Brasil, dos anos 1960 e 1970 (7).
Os principais pressupostos que estavam subjacentes às políticas regionais incluiam,
entre outras, as seguintes premissas: o desenvolvimento concebido como um processo
centrífugo partindo de alguns setores (indústrias motrizes), de alguns centros (pólos de
desenvolvimento), difundindo-se através dos mecanismos de mercado e/ou do apoio da
política de desenvolvimento regional; altas e crescentes taxas de crescimento, o que
permitiria a difusão espacial do desenvolvimento até as regiões menos desenvolvidas;
4
baixos custos de energia, transportes e mobilidade, favorecendo o processo de difusão;
idéia de que a tecnologia moderna só se aplica eficazmente no âmbito da grande empresa e
confiança na capacidade do Estado gerar o desenvolvimento através da implementação de
políticas públicas(8).
As políticas baseadas em tais premissas apresentam como principais características a
aplicação de um mesmo modelo de desenvolvimento de crescimento quantitativo
essencialmente derivado do modelo da primeira Revolução Industrial; a desconsideração
de aspectos sociais, políticos e ecológicos da região a se desenvolver e grande confiança
no sistema de grande escala, altamente consumidora de energia.
Hoje, tais características revelam uma falta de flexibilidade em função da petrificação
das instituições frequentemente centralizadas, o que constitui mais um obstáculo do que
um estímulo ao desenvolvimento das regiões. E, ao mesmo tempo, aquelas premissas sobre
as quais repousavam as políticas regionais não têm se verificado desde a eclosão da crise
econômica do início dos anos 70. Assim, esta crise do capitalismo que se desenvolve após
25 anos de expansão que se seguiram ao final da Segunda Grande Guerra gerou uma
ruptura com o padrão de organização espacial até então modelado pela grande empresa (9)
A partir de então ocorreram importantes mudanças na dinâmica econômica, a mais
importante das quais diz respeito ao processo de globalização econômica, limitando a
capacidade de intervenção do Estado via políticas macroeconômicas e de construção do
território ou mesmo tornando inócua as tradicionais políticas de pólos, já que cresceu
notavelmente as possibilidades de deslocalizações dos investimentos. Neste contexto, quais
seriam os contornos da nova configuração espacial e qual o papel do Estado nesta ordem
econômica globalizada?
II.2- A configuração espacial na nova ordem econômica
Após os anos 70, vem sendo articulada uma nova configuração espacial, resultante da
atual dinâmica econômica. Os fatores que contribuem para esta reestruturação espacial
podem ser observados de uma perspectiva macroespacial (os efeitos da “globalização”) e
de uma outra, microespacial (globalização dos mercados conjugada à urbanização da
população).
5
A globalização, isto é, o processo de mundialização atual do capitalismo, é um
processo multifacetado, compreendendo transformações nas esferas financeira, comercial,
produtiva e institucional (10). Todas estas faces correspondem a etapas da competição
entre um número cada vez mais reduzido de grandes empresas transnacionais, cerca de 300
mega empresas, segundo François Chesnay. Tais 300 empresas constituem o “mercado”,
entidade nada abstrata e que tem tentado se impor frente ao Estado, enquanto atores
estruturadores da ordem econômica mundial (11).
A globalização na esfera financeira foi o resultado da desregulamentação dos
mercados financeiros mundiais, atraindo volume crescente de recursos da esfera produtiva.
Sua enorme expansão deve ser entendida no âmbito dos avanços tecnológicos nas áreas de
transportes e comunicações. Estas inovações diminuiram o custo e os tempos de
deslocamento espacial , possibilitando a significativa ampliação dos “espaços”(12). Nestas
condições, o mercado financeiro opera em tempo real, em todo o mundo e a todo
momento, aumentando a fluidez e o volume destes capitais, muito sensível a quaisquer
modificações no desempenho econômico das economias nacionais, especialmente no que
se refere ao câmbio. Essas modificações contribuem para aumentar a volatilidade do
capital e de afirmar a sua independência frente a “localizações”, isto é, aumentando as
possibilidades de “deslocalizações”.
A globalização na esfera comercial corresponde ao fenômeno da tendência à
homogeinização das estruturas de demanda e oferta, propiciando ganhos no aumento da
escala da produção, ainda que venha diminuindo o ciclo de vida dos produtos. Constitui
uma das faces da nova ordem econômica mundial baseada, segundo a perspectiva de David
Harvey, na “acumulação flexível”, processo de produção marcado por um confronto direto
com a rigidez do fordismo. Aquela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos
mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento
de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços
financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação
comercial, tecnológica e organizacional. Na verdade, aquele autor defende a tese de que a
acumulação flexível envolve também um novo movimento de “compressão do espaço-
tempo”: os horizontes temporais da tomada de decisões pública e privada se estreitam,
enquanto a comunicação via satélite e a queda nos custos de transportes possibilitam cada
vez mais a difusão imediata dessas decisões num espaço mundializado.
6
Esse processo resulta em possibilidades múltiplas de deslocamento das atividades
produtivas, já que, com o aumento da escala de produção (dada a uniformização do
consumo a nível mundial), as empresas podem arcar com o custo (decrescente) de
estabelecer relações de interdependência produtiva em muitas partes do planeta. Neste
contexto, aumenta consideravelmente o comércio mundial realizado intracorporações ou
intersetorial, completamente distinto do comércio internacional típico até meados do
século XX, por exemplo. Este dado deve ser conjugado a outro, correspondente a
concentração dos investimentos externos diretos que, localizam-se no âmbito dos países
que compõem a “tríade” (bloco norte-americano, Comunidade Européia e Japão).
Esse movimento de concentração do intercâmbio intracorporativo e “intratriádico” tem
sido acompanhado de outro, relativo à “regionalização” do comércio internacional. Os três
pólos da tríade apresentaram crescimento, entre 1979 e 1989, nas exportações intra-
regionais no total mundial, especialmente a Ásia, enquanto que, nos demais países em
desenvolvimento, ocorreu o inverso. Na América Latina, aquela participação era de 1,1%
em 1979, mas caiu a 0,5%, dez anos depois, não obstante o aumento observado no seu
comércio intrarregional (13). Trata-se, portanto, de um intercâmbio internacional que
exclui muitos países, retirando-lhes o acesso à poupança externa para que possam financiar
o seu desenvolvimento econômico com o que contribuir para superar seus desequilíbrios
sociais e espaciais.
A globalização na esfera produtiva corresponde ao fenômeno da produção mundial de
um bem para o qual várias economias nacionais contribuiram com diferentes aportes de
insumos. Surge a possibilidade do surgimento e afirmação de uma “indústria global”. Vale
dizer, diante da uniformização dos padrões de consumo e de produção, as empresas
passariam a considerar empresas localizadas em todo o mundo como seus possíveis
abastecedores. A globalização produtiva seria, então, o resultado da competição entre as
empresas com acesso a quaisquer partes do planeta.
Uma abordagem como esta concede ao mercado todo o poder sobre a organização
econômica e, portanto, sobre a espacialização da produção. O poder público é considerado
um agente incapaz de interferir nas decisões de alocação ou na localização dos
investimentos produtivos, ou, se o faz, produz ineficiências alocativas e distributivas,
emitindo sinais equivocados para o mercado. Caso tal abordagem seja aceita, estaríamos
diante da submissão dos Estados frente ao “mercado”. Nestas condições, estaria correto
repetir K.Ohmae (14), para quem está em curso um processo de desaparecimento dos
7
Estados Nacionais e do surgimento de novas territorialidades definidas por sua inserção
estrategicamente mais competitiva na economia mundial. Estas novas territorialidades
fariam emergir as chamadas “economias regionais”, ainda utilizando a argumentação deste
autor japonês. Torná-las cada vez mais competitivas a nível mundial envolveria a aceitação
por parte dos Estados Nacionais deste designio do mercado, e a não-interferência nesta
ordem mercantilizada.
Entretanto, Chesnay (15) chama atenção para o fato de que as indústrias não estão
integradas no plano mundial, como sugere a interpretação acima. O que está integrado é o
mercado mundial e em graus sem precedentes na história. As indústrias que estão se
integrando são aquelas que localizam-se dentro da tríade Estados Unidos-Comunidade
Européia-Japão. Quanto às demais regiões, América Latina e África, em particular, vêm
sendo excluídas dos principais fluxos de comércio e de capitais. Apenas alguns pontos
destes dois continentes estariam sendo integrados nesta globalização produtiva, casos da
região sudestina brasileira e da África do Sul.
Outra importante face da globalização envolve a tendência à uniformização das
agendas explícitas de governo, envolvendo uma mesma (des)regulamentação nos distintos
âmbitos das atividades econômicas, ainda que se observem distintas estratégias nacionais
como, por exemplo, a da França frente a da Inglaterra. Esta tendência está relacionada
com a necessidade de harmonização das políticas que afetam o desempenho econômico
cuja unidade de análise relevante vai deixando de ser os Estados Nacionais e passa a ser
constituída de todo o planeta.
É importante considerar, contudo, que apesar desta tendência à uniformização do
mundo, os oligopólios têm na exploração das desigualdades nacionais uma das importantes
fontes de apropriação de lucros na rivalidade oligopolista. Aliás, uma das estratégias desta
competição envolve a capacidade das empresas de “levar a concorrência até as bases da
retaguarda de seus adversários, em particular suas bases localizadas em seus países de
origem”(16). Nestas condições cabe aos Estados Nacionais contribuirem para a
maximização da oferta de fatores locacionais capazes de atrair os investimentos
produtivos, especialmente os investimentos externos diretos - IED. Na disputa pela atração
deste IED, os atributos locacionais a serem considerados não são mais apenas o baixo
custo de fatores e disponibilidade de recursos, consideradas “vantagens comparativas
estáticas”, mas oferta de infra-estrutura, mão-de-obra qualificada e gestão
macroeconômica eficiente e estável, chamadas “vantagens competitivas dinâmicas”.
8
Apesar de Krugman (17) ter alertado que não são os os países que competem entre si,
mas, sim, as empresas sediadas nestes países, cabe aos governos nacionais um papel
importatíssimo, isto é, o de estimular vantagens locacionais, o que envolve,
necessariamente, uma política “territorialista”. Vale dizer, uma política de construção de
territorialidades adequadas às necessidades dos investidores e que possam atraí-los para as
áreas em que o mercado não se interesse. Neste contexto, infra-estrutura em transportes e
comunicações assume um papel estratégico fundamental. Se a localização destes
investimentos infra-estruturais fica a cargo da iniciativa privada, esta privilegiará,
naturalmente, algumas áreas nas quais se concentram seus interesses. As demais regiões
poderiam, nestas condições, ver sua atratividade ainda mais reduzida pela comparação com
a oferta de vantagens comparativas daquelas regiões mais dinâmicas. No entanto, todas
estas regiões fariam parte de um mesmo país, cujo governo deveria estar comprometido
com a promoção do desenvolvimento em todas as regiões. A simples observação da
localização da malha ferroviária e da rede de energia do país antes de 1930 constitui prova
cabal do pouco compromisso que o mercado tem com as regiões que estejam fora de sua
área de interesse.
Como conciliar a promoção das vantagens comparativas dinâmicas com o “Estado
Mínimo”? Segundo o já citado K.Ohmae (18), a interferência governamental pode
comprometer o desenvolvimento de uma região que o mercado tenha eleito como
localização preferencial dos investimentos. Assim, as políticas de promoção de uma região
deprimida podem ser inócuas para atrair investidores privados e, ao mesmo tempo, criar
viéses no mercado os quais podem comprometer o desempenho das regiões mais dinâmicas
dentro de um mesmo país. E, no entanto, paradoxalmente, é a própria dinâmica econômica
subjacente à globalização que torna necessária a atuação do Estado, seja para conduzir as
políticas de desregulação, seja para estimular as “vantagens comparativas dinâmicas”.
Neste contexto, ao invés do “Estado Mínimo” estar identificado com um Estado fraco,
aquele deveria ser um Estado menor, porém, forte.
Além destes aspectos macroespaciais, há que se referir aos fatores microespaciais que
também contribuem para o processo de descentralização espacial. A globalização
econômica e a “nova rodada de compressão tempo-distância” (19) trazem ainda alguns
outros impactos na configuração espacial atual. Conforme já discutido, uma das principais
faces do fenômeno refere-se à globalização dos mercados. A homogeinização dos
padrões de oferta e, principalmente, de demanda, abre uma verdadeira “fronteira de novos
negócios” nas economias locais (20). Parte destes negócios refere-se a franquias de marcas
9
de produtos e de serviços já estabelecidos nos grandes mercados, mas uma parcela mais
significativa está relacionada à produção local de bens e serviços que antes eram oferecidos
por agentes forâneos ou mesmo nem eram consumidos localmente.
Esse fator deve ser conjugado a outro, que acaba por viabilizar esta diversificada gama
de novos negócios: a geração de deseconomias de aglomeração nos grandes centros
urbanos. Tais deseconomias acabam por contribuir para que parte da população e do
capital que migrariam para as metrópoles, se mantenham nas localidades de menor porte e,
assim, afirmem o potencial das economias locais, criando ali alternativas economicamente
viáveis de sua reprodução.
Ainda mais significativo é o movimento de deslocamento das indústrias desde as
grandes cidades até as cidades médias, onde as empresas podem contar com uma
população grande o suficiente para verem atendidas suas necessidades de mão-de-obra e
de terrenos a custos inferiores aos encontradas nas metrópoles, onde, além do mais,
enfrentavam outros custos inexistentes nas cidades médias, como o congestionamento do
trânsito e a violência urbana. A transformação das tradicionais metrópoles industriais em
centros de prestação de serviços especializados é uma tendência que tem se verificado em
grande parte do planeta (21) Cabe observar, no entanto, que essa descentralização
industrial não tem contemplado igualmente as demais regiões, contribuindo para a
superação dos desequilíbrios regionais, mas, sim, tem resultado numa “descentralização
espacialmente concentrada” como sugere a análise do padrão locacional dos investimentos
referida anteriormente.
Outros fatores devem ser acrescentados como elementos que contribuem para a
tendência à descentralização das atividades econômicas. Um deles é o dinamismo dos
empreendimentos agropecuários. A crescente capitalização destas atividades torna-as
interdependentes com aquelas desenvolvidas no espaço urbano. Além disso, mesmo os
trabalhadores que se dedicam às atividades primárias, dependem dos serviços urbanos
relativos a educação, treinamento e saúde. Nestas condições, ainda que a produção
primária se expanda, este crescimento gera impactos nas atividades urbanas e contribui
para aumentar o grau de urbanização da população. Neste caso, as cidades de menor porte
também se beneficiam, e não apenas as cidades médias, num processo que tende a afirmar
a generalização do modo de vida urbano. Acrescente-se, ainda, o fato de que, com o
aumento da taxa de urbanização e da participação política a nível local, afirma-se uma
10
tendência à descentralização na gestão do território, contribuindo para políticas de
desenvolvimento local.
A conjugação dessa gama de fatores permite sustentar que há, pelo menos
teoricamente, uma tendência à descentralização econômica. Esta seria o produto das
formas de apropriação espacial pela atual dinâmica econômica, mas também pela
descentralização na gestão do território. A nova estruturação espacial impõe,
naturalmente, novos papéis às cidades, consideradas elos da cadeia de fluxos que
caracteriza a ordem econômica. Um novo sistema urbano emerge, comandado por um
pequeno grupo de cidades de classe mundial, como Nova York, Tóquio e Londres, ao qual
se ajustam as redes urbanas nacionais. Neste contexto, cabe verificar qual o papel que
cumprem as cidades médias regionais e como podem contribuir para o melhor desempenho
econômico e social das regiões nas quais se inserem.
III- O SISTEMA URBANO BRASILEIRO
As cidades não são uma categoria histórica típica do capitalismo. Na Antiguidade, por
exemplo, existiram muitas e importantes cidades a partir das quais se estabeleceram
impérios, como é o caso notável do Império Romano. Neste caso, o papel das cidades era
eminentemente político, de centros de controle político e militar. Na Idade Média, apesar
da descentralização política e econômica, muitas cidades se destacaram como centros de
comércio, à exemplo de Brugges, na Bélgica, ou tantas outras cidades européias, cujo sítio
geográfico sempre incluia um rio, quando não se localizavam na costa marítima. Nestes
casos, as cidades eram pontos de uma rede comercial mundial que vinha se formando,
especialmente no período final da Idade Média. Sob o capitalismo, contudo, o papel das
cidades é muito distinto.
O capitalismo é um sistema econômico que tende a se expandir territorialmente e
setorialmente, movido por inovações técnicas que aumentam a produtividade do trabalho,
permitindo a geração crescente de um excedente de produção que libera trabalhadores do
serviço no campo ao mesmo tempo que consegue abastecer uma população
crescentemente urbanizada. O desenvolvimento industrial viabiliza, portanto, uma taxa
crescente urbanização da população, ao mesmo tempo que a urbanização estimula o
desenvolvimento industrial pela expansão da mercantilização da produção.
Nos países que se industrializaram no século XIX, quando a população ainda era
principalmente rural, as cidades que foram surgindo correspondiam a centros de
11
atendimento das necessidades de circulação da produção agrícola ou de atividades
industriais de pequena escala de produção. O crescimento destas atividades alimentavam a
dinâmica das economias urbanas que, à medida em que iam se tornando mais complexas,
passavam a diversificar suas atividades terciárias para atendimento de suas próprias
necessidades internas. O crescimento econômico e a expansão do número de cidades, com
algumas delas tornando-se centros mais desenvolvidos geraram um aprofundamento da
divisão social e espacial do trabalho, do que resultou na constituição de uma rede urbana
hierarquizada, que deu origem à teoria das localidades centrais.
Nos países de industrialização tardia, já no século XX, a relação entre urbanização e
industrialização foi inteiramente diferente. No Brasil, em particular, a formação de sua rede
urbana correspondeu a distintas formas de inserção da economia brasileira na ordem
econômica mundial, desde “descobrimento”, no século XVI (22). Desde então, e até a
industrialização, neste século, a rede urbana foi muito pobre, constituindo-se de uma
número reduzido de cidades localizadas ao longo da costa do país. Tais cidades estavam
articuladas com as metrópoles européias, destino da produção primária local. A relação
destas nossas cidades com o espaço de produção local era apenas como centro
intermediário até os mercados externos dos produtos de exportação. Estas cidades eram
centros de controle político, religioso e militar utilizados por portugueses para submeter a
colônia brasileira ao Pacto Colonial.
A “cidade colonial” e mesmo a “cidade comercial”(após a independência de Portugal)
no Brasil era estéril, do ponto de vista econômico (23). Ela somente se tornará produtiva a
partir da industrialização, quando assume novos papéis a partir da grande concentração de
população e de atividades econômicas no espaço urbano, gerando a necessidade de
socialização, e, portanto, do barateamento, do seu processo de reprodução. Cabe destacar,
entretanto, que isso se dá num contexto inteiramente distinto daquele vigente nos países já
industrializados, sem que fosse possível intensificar o processo de industrialização “pari
passu” com as transformações econômicas no campo e a urbanização. O resultado foi uma
urbanização muito mais acelerada do que o crescimento do emprego no setor industrial,
implicando um aparente “inchaço” das nossas cidades. Nestas condições, a estruturação de
nossa rede urbana apresentava algumas importantes distinções em relação a dos países já
industrializados. .
III. 1 - Crescimento Urbano e da Estruturação da Rede Urbana
As únicas teorias econômicas de crescimento urbano que receberam atenção geral, se
não aceitação, foram a análise do lugar central e a teoria da base urbana (24). De acordo
12
com a teoria da base, uma cidade cresce como resultado da especialização em exportações,
a atividade de exportação é considerada como a fonte de oferta do crescimento econômico
urbano. Nos modelos de base, a economia urbana é tratada como um sistema endógeno e o
investimento é sempre induzido. Esta teoria estabelecia que a população ativa se dividia em
primária, trabalhando nas atividades exportadoras de bens e serviços, e na secundária, que
trabalhava em função das necessidades da própria aglomeração. O crescimento urbano
sempre teria início com o desenvolvimento das atividades básicas. O aumento das
exportações envolveria um aumento dos investimentos que, sob o efeito do multiplicador
keynesiano, multiplicaria a renda urbana.
Nos modelos de lugar central, a principal fonte de crescimento da cidade é a demanda
de mercadorias e serviços em seu interior. Os bens e serviços são divididos entre
superiores e inferiores, sendo que os primeiros referem-se aqueles bens de preço unitário
mais alto, de consumo infrequente e que os consumidores estão dispostos a “viajar” para
mais longe até encontrá-los, como é o caso dos automóveis. Os bens inferiores são aqueles
de baixo preço unitário, de consumo frequente e que devem estar disponíveis próximo aos
consumidores, como pão e alimentos não diferenciados. Os bens inferiores apresentam área
de alcance de mercado muito restrita, enquanto que os bens superiores dependem de um
alcance mercantil maior. As cidades de nível hierárquico mais baixo só oferecem os bens
inferiores para atendimento apenas dos consumidores locais. As cidades vão subindo de
nível hierárquico conforme vão diversificando a oferta de bens e serviços superiores, com
alcance de mercado cada vez maior, isto é, incluindo não apenas ao seu próprio mercado,
mas também os consumidores de um conjunto crescente de cidades. No topo da pirâmede
hierárquica, está situada a cidade que oferece os bens e serviços mais especializados, cujo
mercado corresponde ao conjunto do território de todas as demais cidades.
A Escola de Jena, onde se desenvolveu esta teoria apresenta-a como uma teoria
normativa, no sentido de que, caso fosse necessário reconstruir o espaço, o sistema urbano
hierarquizado seria o mais racional, o que sugeriria que tal abordagem teórica presta-se a
modelos de planejamento, como foi o caso de sua utilização no projeto de Colonização
Dirigida da Amazônia (25). No entanto, cabe observar que, segundo suas formulações
originais, enfatiza-se o fato de as redes hierarquizadas se formam espontaneamente, via
concorrência a que se entregam os estabelecimentos por sua partipação nas áreas de
mercado, o que não foi o caso da ocupação da Amazônia.
De fato, há evidência empírica dando conta da regularidade na hierarquização da
formação da rede de apoio às atividades rurais na China (26). Na Guatemala, por outro
lado, verificou-se que outros fatores, como a infra-estrutura de transportes e a distribuição
13
da renda, alheios à concorrência dos preços ao consumidor, teriam influência decisiva na
organização de seu sistema urbano. Não é possível, portanto, deixar de considerar o papel
do poder público que, através de seus investimentos infra-estruturais e mesmo produtivos,
contribui para a redefinição da rede de cidades. Especialmente a partir do desenvolvimento
industrial, as articulações entre a economia urbana e seu entorno territorial teriam de ser
reconsideradas, especialmente em casos, como o do Brasil, onde o Estado constituiu-se
num agente fundamental do processo de transformação de uma economia de base rural e
agrícola em uma outra de base urbano-industrial.
A discussão sobre os determinantes do crescimento urbano, e da estruturação do
sistema urbano hierarquizado deveria tratar de articular as teorias da base e das localidades
centrais. Seria preciso acentuar a interdependência entre as atividades de base e de
comércio e serviços (teoria das localidades centrais) do que conceder excessivo poder
explicativo às exportações como determinantes do crescimento urbano. Uma séria
deficiência da teoria da base é o fato de não ser verdadeiramente constante a relação
atividades básicas/atividades de serviços. Nas grandes cidades, o setor terciário comanda o
processo de formação de renda urbana, com crescente especialização das metrópoles em
serviços de tipo financeiro, publicidade, jurídicos, dentre outros. Quanto maior for a
cidade, quanto maior for o seu nível hierárquico, maior a possibilidade que sua economia
produza um valor maior para o atendimento do mercado local do que para exportação.
Assim, mesmo em casos em que a economia de uma cidade dependa de suas atividades de
exportação em indústrias bens especializadas, como entretenimento, defesa e aeroespacial,
como é o caso em Los Angeles, a maior parte de sua população está alocada em atividades
voltadas para o atendimento das demandas locais (27). Isto significa que aquelas atividades
especializadas - e de exportação-, geram um dinamismo local que sustenta um conjunto
amplo e variado de atividades para o atendimento da demanda local.
Admitir que a maior parte da produção seja para atendimento do mercado doméstico, e
não externo, entretanto, implica considerar a relevância da teoria das localidades centrais
para a identificação das cadeias de fluxos de bens, serviços, informações, capitais, que
circulam através de cidades, estruturadas em redes hierarquizadas. São, portanto, não
apenas válidas, mas sobretudo, úteis as informações contidas em estudos sobre redes
urbanas, como as pesquisas do IBGE sobre regiões de influência das cidades (28). Cabe
destacar, entretanto, que parte destas redes não são formais, mas fluem através dos
mercados informais. Nem todos os bens fluem através do mesmo número de níveis
hierárquicos. A regressividade na distribuição da renda aumenta o alcance dos mercados de
produtos superiores, diminuindo o número de níveis hierárquicos, enquanto que uma renda
distribuida de forma mais igualitária aumenta o número de níveis, bem como o de cidades
14
de hierarquia mais baixa. Em suma, ainda é válido utilizar a teoria das localidades centrais
na identificação da rede urbana, mas é preciso qualificar o seu uso, incorporando as muitas
críticas a que a teoria tem sido submetida desde a sua formulação original, na Alemanha
dos anos 30.
III. 2 - Sistema de Cidades no Brasil
A estruturação da rede urbana brasileira foi identificada pelo IBGE (29) pela primeira
vez no final dos anos 60. O marco teórico utilizado nesta pesquisa foi o da teoria das
localidades centrais. Num contexto de intensificação da industrialização e em que a
população urbana brasileira ultrapassava a população rural, a pesquisa contribuiu para
indicar a configuração espacial resultante da dinâmica econômica vigente. Uma década
mais tarde, o mesmo IBGE refez o estudo, constatando um novo nível hierárquico na rede
de cidades brasileiras: tratava-se dos centros submetropolitanos, de segundo nível, com
posição intermediária entre a metrópole regional e a capital regional. Quase 20 anos
depois, o IBGE está finalizando um novo estudo, procurando identificar as transformações
ocorridas no sistema urbano em face das mudanças na dinâmica social, demográfica e
econômica nesta era de economia globalizada.
As alterações na rede urbana brasileira correspondem a ajustes espaciais na dinâmica
econômica, refletindo suas modificações. Nos anos 40, a taxa de urbanização da população
brasileira era de apenas cerca de 30% e as atividades econômicas ainda eram basicamente
rurais. Durante os anos 60, a população urbana superou, pela primeira vez, a população
rural. Este resultado reflete o aprofundamento do processo de industrialização e da
manutenção de uma estrutura fundiária arcaica que expulsava os trabalhadores do campo,
ainda que a cidade não fosse capaz de gerar tantas oportunidades de emprego quanto as
necessárias para assimilar os migrantes oriundos do campo. Conforme observou
argutamente Francisco de Oliveira (30), a industrialização brasileira nunca dependeu das
transformações no campo, tendo se processado apesar do arcaismo vigente nas relações de
produção no campo. Assim, a taxa de urbanização não guardou relação com a
industrialização, mas a ultrapassou, dando origem a uma “crítica anti-urbana” (31).
Segundo esta crítica, as cidades cresciam como “cogumelos”, mas eram incapazes de
sustentar o dinamismo necessário para incorporar os fluxos migratórios produto da
expulsão do campo, os quais, no entanto, demandavam infra-estrutura urbana sem que
pudessem contribuir para o seu financiamento, mantendo-se à margem da economia formal
urbana.
15
O crescimento excessivo de algumas metrópoles sudestinas estava relacionado com o
desenvolvimento industrial tardio que, numa economia em que o capital era um recurso
muito escasso, buscava maximizar os benefícios oriundos da localização em áreas onde já
fosse disponível a infra-estrutura urbana e produtiva (32). Nestas condições, a
concentração industrial no sudeste brasileiro resultou num adensamento da rede urbana
onde ela já era maior, isto é, na costa e no centro-sul do país.
A constatação deste fenômeno tornou urgente o estímulo à ocupação do Centro-Oeste
e do Norte do país, em cujo processo, a urbanização seria importante instrumento (33).
Não apenas se tratava de uma questão geopolítica, de afirmação do controle político de
uma parte majoritária do território do país, mas também de incorporar à economia nacional
uma grande fonte de recursos naturais até então pouco explorados economicamente (34).
Ademais, a incorporação daquela região de fronteira de produção permitiria redirecionar
fluxos migratórios que o nordeste arcaico estava expulsando, sem que fosse preciso que o
governo central enfrentasse o projeto politicamente dificil de ser implementado de reforma
agrária. Mais ainda, poderia significar uma expansão da oferta de insumos primários e
produção alimentar que contribuiria para manter sob controle o custo de vida numa
conjuntura de exacerbamento da inflação. É dentro deste contexto que devemos situar a
ocupação da chamada “Amazônia” brasileira, isto é, as regiões Centro-Oeste e Norte ao
longo das décadas de 60 e 70.
Os anos 80 já se iniciaram com o “fechamento” da fronteira amazônica, e, portanto,
com a consolidação da ocupação do território brasileiro. A rede de cidades se adensou
significativamente, expandindo o alcance dos mercados da região mais desenvolvida do
país, o eixo São Paulo-Rio de Janeiro-Belo Horizonte. A população urbana do país já
alcançou uma taxa próxima a 80%, sendo que nas regiões mais desenvolvidas, o índice de
urbanização é ainda maior. A população rural é ainda significativa no Nordeste (39,4%),
onde está relacionada com a pobreza regional. Em alguns estados, ela já é insignificante,
como é o caso do Estado do Rio de Janeiro, com cerca de 4% de residentes rurais.
A generalização da urbanização da população tem nas migrações vigentes na economia
brasileira um componente de fundamental relevância. Se, ao longo das décadas de 40 a 70
os principais fluxos eram originários do campo para as cidades, a partir da década de 80, a
mobilidade da população passou a se constituir de fluxos de tipo urbano-urbano. Ademais,
os fluxos de grande distância, especialmente os provenientes do Nordeste em direção ao
Sudeste, foram substituídos, em importância, pelos fluxos intra-estaduais (35). Esta nova
mobilidade da população brasileira, conjugada à notável queda na taxa de fecundidade,
resultou numa nova estruturação urbana no país: as capitais estaduais nordestina viram sua
16
população explodir, enquanto que as regiões metropolitanas, apesar de polarizarem
contingente considerável da população, passaram a crescer mais em suas periferias do que
em seus núcleos.
Desde o Censo Demográfico de 1950 até o de 1991, a urbanização da população pode
ser observada através da multiplicação do número de cidades de pequeno porte (definidas
como aquelas com população inferior a 20 mil habitantes), porém com redução da
participação de sua população no total da população brasileira: os 1745 centros urbanos
contavam com 35,30% da população brasileira em 1950, mas em 1991, apesar do número
destes centros passarem a 3.736, sua participação na população brasileira caiu para o
equivalente a 19,30%. No mesmo período, o número de metrópoles com mais de 2 milhões
de habitantes dobrou de 2 para 4, porém, sua participação na população brasileira
decresceu de 31% para 17,10%. Houve, neste período, um significativo aumento do
número e do tamanho dos centros urbanos com população entre 50 e 500 mil habitantes:
os 23 centros urbanos passaram a 293, sendo que a participação de sua população no total
do país passou de 19,9% para 34,6% (36). Cabe acrescentar, no entanto, que, segundo a
contagem da população que o IBGE realizou, em 1996, observa-se uma reversão do
fenômeno, ainda tímido, da descentralização da população ocorrido nos anos 1980: as
regiões metropolitanas voltaram a aumentar sua participação na população brasileira.
A dinâmica demográfica brasileira vem apontando para um aumento da taxa de
urbanização da população, consolidação das cidades metropolitanas e crescimento mais
intensificado naquela classe intermediária de cidades, com população entre 50 e 500 mil
habitantes, ainda que grande parte de tais cidades situem-se em regiões metropolitanas. A
questão a ser considerada refere-se ao papel que cada classe de cidade cumpre no processo
de desenvolvimento econômico: existem peculiaridades que destaquem as poucas cidades
com população superior aos 2 milhões de habitantes daquelas mais numerosas, com
população entre 50 e 500 mil habitantes?
III. 3 - As Funções Urbanas
Ao longo do processo de ocupação do território brasileiro, a sua configuração espacial
e sua urbanização corresponderam ao papel que suas cidades cumpriam como elos entre
estruturas produtivas locais e os seus principais mercados. As transformações na dinâmica
econômica resultavam em mudanças também na apropriação do espaço, numa tendência à
intensificação da urbanização da população e do aumento do número e tamanho das
cidades.
17
Durante os anos 70, antes que a crise do capitalismo mundial se explicitasse em toda
sua plenitude, ainda se alimentava a expectativa de que o poder público pudesse ser o
condutor de uma política de superação dos desequilíbrios regionais que se consolidaram na
grande expansão econômica do pós-segunda grande guerra. Conforme já discutido na
sessão II, as políticas regionais se apoiavam amplamente na capacidade extrativa do Estado
e concediam importante papel à criação de pólos por via administrativa. Aqui no Brasil, a
política de pólos de crescimento foi bastante utilizada, especialmente nas regiões de
fronteira econômica (37). Mas, além dos pólos artificialmente criados, outra alternativa de
política adotada era a do estímulo às cidades médias.
A explosão das cidades do Terceiro Mundo a partir dos anos 60 fez emergir um debate
sobre a suposta “disfuncionalidade” daqueles “cogumelos” em que se transformaram
cidades como México e São Paulo. Apesar de a situação ser pior nos países que só se
industrializaram no século XX, também nos países de industrialização madura, a crítica
anti-urbana vicejava e ganhava adeptos. Na França, por exemplo, (38) a forte polarização
em torno de Paris foi considerada uma situação de desequilíbrio que deveria ser enfrentada
mediante implementação de políticas que estimulassem o redirecionamento dos recursos
produtivos para cidades médias, ditas “metrópoles de contenção”. A suposição era que a
melhor distribuição de população e atividades econômicas seria um instrumento mais eficaz
na disseminação do desenvolvimento econômico, sem incorrer nas deseconomias de
aglomeração (aumento de preço da terra, congestionamento, organização dos
trabalhadores, etc) produzidas nas maiores metrópoles.
Esta mesma suposição esteve subjacente às políticas de concessão de financiamentos
especiais concedidos às cidades médias no Brasil. No âmbito do Banco Nacional de
Habitação foram financiados projetos, com o objetivo de viabilizar a implantação de infra-
estruturas físicas naquelas cidades, de modo a torná-las localizações mais atrativas para os
investidores (39). O êxito desta política poderá ser verificado a partir da observação do
grau de descentralização da atividade econômica dos últimos 20 anos. Isso não significa
admitir que os financiamentos governamentais nas infra-estruturas físicas sejam o principal
determinante da tendência à descentralização espacial da economia. Conforme amplamente
discutido na segunda seção deste trabalho, são muitos os fatores que têm, teoricamente,
estimulado o processo de descentralização espacial.
Entretanto, foi a tentativa de avaliar a eficácia daquela política de concessão de
financiamento às cidades médias no Brasil que moveu o interesse em investigar a dinâmica
deste conjunto de cidades. Um estudo pioneiro foi realizado no final dos anos 70, quando
se definiu o universo das cidades médias como aquelas com população urbana superior a
18
50 mil e inferior a 250 mil habitantes (40). Passados duas décadas e, diante da inexistência
de uma linha de investigação profícua em torno deste tema, voltamos a tê-lo como objeto
desta pesquisa, porém, cientes das transformações em curso na dinâmica econômica que
resultaram, inclusive, em novo conteúdo de significados o conceito de “cidades médias”.
A nova dinâmica econômica reflete-se no espaço, resultando na produção de novos
recortes espaciais que mudaram inteiramente o significado do sistema urbano. De acordo
com Santos (41), o sistema urbano brasileiro pode ser caracterizado por dois tipos de
recortes. “De um lado, recriam-se subespaços mediante nova regionalização (...) é a nova
fórmula do velho fenômeno da região. O outro é o relativo à união dos pontos de apoio
das corporações no seu processo produtivo, ligando e relacionando lugares estratégicos de
produção propriamente dita, da comercialização, da informação, do controle, da regulação.
No primeiro caso, onde o espaço é contínuo, trata-se de um recorte horizontal do espaço
total. No segundo caso, o recorte resultante é vertical. No primeiro caso, as tarefas
técnicas predominam, ligadas direta ou indiretamente, ao processo direto de produção. No
segundo caso, são tarefas políticas que predominam, base do processo de regulação da
produção (crédito, informação, ordens) que é, também um processo de regulação do
território, isto é, de seu equipamento e seu uso. Nesse sentido, diremos que a região deixa
de ser um produto da solidariedade localmente tecida, para tornar-se resultado de
solidariedade organizacional”. Ou, nos termos de Lu (42), áreas de influência econômica e
espacial deixam de ser como “as duas faces de Janus”, intensificando-se o relacionamento
mercantil entre as áreas mais dinâmicas do Centro-Sul e as regiões mais longíquas,
tornadas mais facilmente acessíveis pelos novos meios de comunicação e transportes.
Neste processo, a área de influência das economias locais torna-se mais restrita no espaço
em benefício das regiões economicamente consolidadas do sudeste, conforme evidenciou o
estudo do IBGE, Região de Influência das Cidades, realizado em 1978.
A percepção da existência desta “solidariedade organizacional” e da distinção entre
áreas de influência econômica e espacial implicam considerar a estruturação de uma nova
rede de cidades, tendo por líderes algumas cidades de classe mundial. De fato, a
combinação da dispersão espacial com integração mundial liderados por um grupo cada
vez menor de agentes tem contribuído para a assunção de um papel estratégico pelas
principais cidades do planeta. Estas cidades funcionam hoje como postos de comando na
organização da economia mundial; como lugares-chaves e praças de mercado fundamentais
para as indústrias que lideram neste período, financeiras e de serviços especializados para
empresas; e como campos para a produção de inovações nas indústrias. (43)
19
As principais funções que definem as cidades mundiais são: a) articulação da economia
nacional com outros centros nodais do sistema global de cidades; b) especialização em
atividades de gerência, de centros de decisão: c) centro financeiro; d) centros de
disseminação de informações e de transportes; e e) pólos de turismo, isto é, localização de
modernos hotéis e indústrias de entretenivmento, aeroportos, museus, centros de
convenção, etc. (44). No topo da hierarquia das cidades mundiais encontram-se Nova
York, Tóquio e Londres. Num segundo nível hierárquico, poderíamos situar São Paulo ou
a Cidade do México.
Apesar de liderar um rede de fluxos mundiais de capitais e informações, mais do que
mercadorias, as cidades de maior nível hierárquico tornaram-se, paradoxalmente, mais
vulneráveis à dinâmica econômica mundial. Willian Tabb (45), por exemplo, observa que
“talvez estejamos presenciando um fenômeno similar ao das “cidades primazes” no
Terceiro Mundo, centros gigantescos que sugam capital e servem como residência para as
elites locais voltadas para o exterior e para os pobres marginalizados”, mas que dependem
do desempenho da economia mundial, já que a reciclagem de títulos constitui uma de suas
funções mais importantes.
A interdependência crescente da economia mundial modificou inteiramente a relação
entre a cidade mundial e as demais cidades hierarquicamente inferiores num sistema urbano
nacional. Até os anos 80, as políticas públicas tendiam a se preocupar com os
desequilíbrios regionais, alocando investimentos nas regiões mais atrasadas. A partir dos
anos 80, contudo, as cidades de classe mundial vêm consumindo mais e mais recursos afim
de adaptá-las às novas condições da economia mundial, na qual as funções de centralidade
mundial demandam recurso para investimentos em infra-estrutura para uma minoria da
população, parte da qual é, inclusive, transitória, ao invés da maioria dos residentes
permanentes.
As cidades mundiais, contudo, não são caracterizadas unicamente pela concentração
das atividades dinâmicas e de controle do capital. Referindo-se a Nova York, Tabb (46)
comenta que “a multiplicação dos sem-teto é um processo social cuja origem,
evidentemente, está no mercado de trabalho e no mercado imobiliário. É a ponta mais
visível do iceberg de um processo de empobrecimento”. Vale dizer, o autor admite que a
metrópole mundial é o “locus” das novas atividades de regulação da produção mundial,
mas convive com a expansão dos excluídos, que se manifesta no número crescente dos
“sem-teto” e de desempregados ou subempregados. No Brasil, o mesmo fenômeno se
traduz no crescimento maior da cidade informal versus a cidade formal, isto é, na
população favelada em relação àquela que vive em moradias regulares.
20
É ainda William Tabb quem finaliza a discussão sobre cidades mundiais considerando
que “o discurso sobre a cidade mundial privilegia a reorganização do capital e ignora o
momento subjetivo representado pelas derrotas da coalizão urbana progressista que,
durante os anos 60, tinha logrado que as elites nacionais e locais se responsabilizassem por
grande parte dos custos sociais num grau inconcebível para a maioria dos participantes dos
debates dos anos 80 em Londres, Tóquio e Nova York” (47). Cabe observar, contudo, que
a expansão da taxa de urbanização da população e o fenômeno da “metropolização da
pobreza” (48) vêm tornando inadiável que sejam enfrentadas adequadamente as
necessidades de reprodução dos excluídos metropolitanos. Em particular que a sociedade
seja capaz de refazer aquela “coalizão urbana progressista”, nem que seja para diminuir os
custos da aglomeração metropolitana e criar condições para sua reprodução. Ademais, é
crucial que a descentralização não implique numa “dessolidariedade” entre residentes de
regiões mais ricas e mais pobres, de modo que aqueles deixem de contribuir para o
financiamento das políticas de promoção nas regiões mais pobres, como já vem ocorrendo,
por exemplo, nos Estados Unidos (49).
Discutindo o sistema urbano brasileiro, Milton Santos (50) sugere que o espaço total
brasileiro é atualmente preenchido por regiões agrícolas e regiões urbanas. Segundo este
autor, não se trata mais de “regiões rurais” e de “cidades”. “Hoje, as regiões agrícolas (e
não rurais) contêm cidades; as regiões urbanas contêm atividades rurais”. Isto implicaria
admitir a existência de um “Brasil Agrícola” e um “Brasil Urbano”, sendo que, no
primeiro, o campo é que comanda a vida econômica e social do sistema urbano, sobretudo
nos níveis inferiores da escala, enquanto que nas regiões urbanas são as atividades
secundárias e terciárias que têm este papel. Esta é uma consideração importante, quando
observamos o papel do chamado “agrobusiness” em regiões, como o noroeste paulista ou
o Estado do Mato Grosso do Sul. O papel que as cidades deste “Brasil Agrícola” cumprem
no cadeia de fluxos econômicas é funcionalmente distinta daquelas cidades do “Brasil
Urbano”. Nas primeiras, desenvolve-se uma maior “solidariedade localmente tecida” - uma
expansão regional movida por atividades locais - do que nas últimas, mais passíveis de
desenvolverem maior “solidariedade organizacional” - isto é, representam elos de cadeias
extra-locais de fluxos econômicos -, para nos mantermos no âmbito da abordagem de
nosso geógrafo.
III.4- A Nova Dinâmica Espacial
A caracterização das metrópoles como produtoras de serviços especializados vem
resultando num processo de desindustrialização das mesmas. Conforme indicado por
21
Tabb(51), isso está ocorrendo de forma signiticativa em Londres e em Nova York, e
menos em Tóquio. É possível, no entanto, que os investimentos externos diretos de firmas
japonesas no sudeste asiático venham acelerando, ao longo dos anos 90, a função de
controle do capital, típica das cidades de classe mundial também na capital japonesa. No
Brasil, este processo tamabém está em curso. A redistribuição do PIB industrial vem
contemplando uma certa descentralização, ainda que regionalmente concentrada (52). Na
mesma direção apontam os resultados publicados pela Revista Exame, na publicação das
500 Maiores e Melhores Empresas Brasileiras. Lê-se ali que, se entre 1973, das 500
maiores empresas listadas na primeira edição desta publicação, 63,4% tinham sua sede em
São Paulo e 20,2% no Rio de Janeiro, hoje, estes dois estados representam apenas 63,8%.
Este recuo do eixo Rio-São Paulo favoreceu uma crescente participação dos outros
estados sudestinos e sulistas, sugerindo que a descentralização vem se mantendo no âmbito
das regiões Sul-Sudeste.
Nossa principal metrópole, São Paulo, vem sendo objeto de intenso debate sobre as
tendências locacionais à descentralização dos investimentos, considerando a perspectiva de
que sua desindustrialização possa implicar num aprofundamento da crise social. Não há,
contudo, consenso de que essa metrópole esteja se desindustrializando. Segundo a
Fundação Seade, “salvo no setor têxtil, as indústrias instaladas na capital e adjacências não
fecharam, nem se mudaram para outros locais. Os novos projetos é que estão sendo
implantados em regiões alternativas, como o interior do estado” (53).O fenômeno da
descentralização, portanto, está mais relacionado com os novos investimentos e não com a
relocalização de empresas já instaladas.
Verifica-se que o processo de “descentralização regionalmente concentrada” é uma
tendência do padrão atual de desenvolvimento, dados os novos fatores locacionais
considerados mais relevantes: a infra-estrutura e a logística; a qualificação da mão-de-obra
e o mercado consumidor. Isto explica porque, segundo dados da FIESP (54), a partir de
um estudo do BNDES, dos US$ 110 bilhões em investimentos programados para o país
até o ano 2000, 21,5% ainda seriam realizados em território paulista. Cabe destacar,
contudo, que destes recursos, apenas 5% deverão se localizar na capital paulistana.
Esta baixa participação do núcleo da região metropolitana nos novos investimentos não
significa que todo o interior esteja sendo igualmente contemplado com a expansão
industrial. Na verdade, o chamado “transbordamento” da indústria paulista tem limites
espaciais bem limitados, devendo beneficiar principalmente uma região de 47 municípios,
que tem em Campinas seu centro urbano mais importante. Segundo o Balanço da Gazeta
Mercantil, em 1995, 51,79% do produto industrial do Estado de São Paulo foi realizado na
22
região metropolitana, enquanto que este índice já fora de 70%, na década de 70, caindo
para 64,01%, na de 80. O interior do estado foi o responsável por essa queda de 13% entre
1980 e 1995, tendo sido a região que absorveu os novos projetos.
Além deste vetor de transbordamento principal, outro que deveria ser mencionado
refere-se à expansão industrial que liga o oeste dos estados de São Paulo e Minas Gerais
(55). Junto com o interior paulista, este eixo apresenta as melhores perspectivas de
crescimento econômico, o que não implica necessariamente a perda de competitividade da
economia fluminense. O Estado do Rio de Janeiro sofreu um esvaziamento econômico
secular, tendo se acentuado nas décadas de 70 e 80. Entretanto, os anos 90 vêm indicando
uma reversão deste quadro de estagnação.
Dados mais recentes, elaborados no IPEA (56), apontam a retomada do crescimento
das economias fluminense e capixaba, muito provavelmente devido à abertura comercial no
país, já que tratam-se de estados que têm na função portuária importante atividade
econômica. A maior inserção no comércio internacional é particularmente relevante para a
economia capixaba, cuja estrutura portuária é considerada como a melhor, no contexto
nacional (57). Nestas condições a expansão do comércio internacional, estimulada pela
abertura econômica econômica, a partir dos anos 90, tem proporcionado perspectivas mais
dinâmicas à economia estadual no Espírito Santo, a qual apresenta um grau de abertura
(em proporção ao PIB estadual) significativamente superior ao do país, ou de qualquer
região do Brasil(58). No que respeita à economia fluminense, além da função portuária que
vem retomando a importância que teve antes do processo de industrialização brasileira,
apresenta disponibilidade daquele “tripé de competividade” - infra-estrutura e logística,
mão de obra qualificada e mercado consumidor -, considerados fatores locacionais
dinâmicos.
A Região Sul, apesar de apresentar uma economia menos dinâmica do que a sudestina,
vem sendo beneficiada com as perspectivas abertas com a formação do Mercosul, o que
que pode ser exemplicado com a forte expansão da economia paranaense que vem
implantando um pólo da indústria automobilística na região metropolitana de Curitiba (59).
O Estado de Santa Catarina também vem consolidando sua função industrial, enquanto que
o Rio Grande do Sul, após décadas de crise, vem retomando seu dinamismo (60). Nestas
condições, a redistribuição das participações estaduais no PIB industrial do país, que vinha
se processando ao longo das décadas de 70 e 80, foi revertida com a nova ordem
econômica e espera-se que o Sudeste e o Sul continuem a polarizar a concentração
industrial vigente no Brasil, ainda que de forma menos concentrada intra-regionalmente.
23
Este novo padrão locacional da indústria está claramente relacionado com os custos da
aglomeração metropolitana, os quais os empresários procuram evitar, localizando-se em
cidades menores onde o custo do trabalho é menor, há menor possibilidade de greves, os
custos de congestionamento e violência urbana quando existem, são incomparavelmente
menores do que os vigentes nas grandes metrópoles. A localização nestas cidades acaba
por consolidar um processo de expansão dos investimentos nas infra-estruturas físicas que
confirmam as cidades de porte intermediário como localizações mais atrativas para os
investimentos produtivos. Nestas condições, tais cidades atraem também uma classe de
trabalhadores especializados, mas não qualificados para os serviços típicos da função de
cidade mundial, para a qual a “qualidade de vida” pode ser desfrutada a um custo
compatível com sua renda, mas impossível de arcar com os custos crescentes das
condições de vida nas grandes metrópoles. Esta nova realidade pode ser inferida a partir da
verificação do crescimento do número e da taxa de crescimento das cidades de porte
intermediário, sugerindo uma maior complexidade de sua economia.
Conforme já se esperava, a maior parte das cidades de porte intermediário localiza-se
na região mais desenvolvida do país, isto é, nas regiões Sudeste e Sul do país. Definindo-se
as cidades médias como aquelas cuja população varia de 50 a 500 mil habitantes, verifica-
se que 259, num total de 441 cidades, situam-se naquela região (61). Este fenômeno
sugere a possibilidade de existência de uma relação entre o referido processo de
“descentralização espacialmente concentrada” e o elevado número de cidades de porte
intermediário no Centro-Sul do país, onde se concentra grande parte da produção
industrial do país.
Entretanto, cabe destacar a emergência desta categoria de cidade em todas as demais
regiões, em particular, destacar a existência de 18 destas cidades na recém ocupada região
Centro-Oeste. O notável crescimento econômico desta região está sustentado em
atividades de base primária (62). A constituição de “regiões agrícolas”, conforme a já
referida formulação de Santos (63), envolve a necessidade de estabelecimento de cidades
de porte compatível com as atividades terciárias, relativas à circulação daquela produção,
bem como a prestação de serviços que viabilizem tal produção. O elevado número - 18- de
cidades médias na Região Centro-Oeste, considerada fronteira econômica até a década de
70 (64), sugere que suas funções estejam relacionadas com atividades primárias,
responsáveis pela dinamização da economia regional, ao contrário do que ocorre com o
Centro-Sul, área de ocupação consolidada e que tem na indústria suas atividades “básicas”,
responsáveis pelo crescimento do sertor terciário.
24
Verifica-se, assim, que se trata de um fenômeno que vem se generalizando por todo o
país. Contudo, cabe discutir se apenas o tamanho da população urbana, e, em particular, os
limites definidores que estamos utilizando, constituem o melhor instrumento para
classificar as cidades como sendo ou não médias, generalizando os resultados obtidos
como típicos daquela classe de cidade. Uma análise mais apurada deveria incluir outras
classificações que envolvessem a distribuição das cidades de um dado tamanho por níveis
hierárquicos definidos nos estudos que o IBGE realiza sobre o sistema urbano brasileiro;
segundo as cidades sejam ou não capitais de unidades da federação; segundo estejam
dentro ou não de uma região metropolitana; segundo façam ou não parte de uma “região
agrícola”; e, finalmente, se localizam-se nas regiões mais industrializadas e, portanto,
possam se beneficiar do “transbordamento” industrial acima mencionado. No estudo
dentro do qual se insere este artigo, pretendemos analisar o desempenho das cidades
médias, tentando incluir o maior número de elementos que contribuam para definir a sua
dinâmica econômica e a sua inserção na rede de cidades brasileiras, consideradas como a
configuração espacial da da nova ordem econômica na qual se insere o país.
25
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(9) Adaylot, P. - op. cit.
Santos, A.M.S.P. - op. cit
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nova ordem econômica. In: (Syn)Thesis. Cadernos do Centro de Ciências Sociais, vol.II,
n.1, UERJ, 1997
(12) Harvey, David - op. cit
(13) Chesnay, F. - op. cit., pg. 231
(14) Ohmae, K. - O Fim dos Estado-Nação. Rio de Janeiro: Campus, 1996
(15) Chesnay, F. - op. cit
(16) Chesnay, F. - op. cit, p.117
(17) Krugman, K. - op. cit.
(18) Ohmae, K. - op. cit
(19) Harvey, D. - op. cit
26
(20) Santos, A.M.S.P. - Comércio: Fronteira de Negócios na Colonização da Amazônia.
Rio de Janeiro: IPEA/RJ, TDI n.309, Julho de 1993.
(21) Tabb, W. - As cidades mundiais e a problemática urbana: os casos de Nova York e
Tóquio. In: São Paulo: Nobel - Reestruturação Urbana. Tendências e Desafios,
organizado por Lícia P. Valladares e Edmond Preteceille, 1990.
(22) Singer, Paul - Economia Política da Urbanização. São Paulo: Brasiliense, 1977.
(23) Singer, Paul - op. cit.
(24) Richardson, H.W. - Economia Regional. Teoria da Localização, Estrutura Urbana e
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(25) Santos, A.M.S.P. - “Urbanização na Fronteira: Um subproduto da política de
colonização?”. Relatório de Pesquisa. Rio de Janeiro: IPEA, 1985
(26) Plattner, S. - Rural Markets Network. Mimeo.
(27) Krugman, P. - op. cit.
(28) IBGE - Regiões de Influência das Cidades. Rio de Janeiro: IBGE, 1966 e 1978.
(29) IBGE - op. cit, 1966.
(30) Oliveira, F. de - “O Estado e o Urbano no Brasil”. In: Revista Espaço e Debates, n.6,
1982.
(31) Singer, Paul - op. cit.
(32) Singer, Paul - op. cit
Oliveira, F. de - op. cit.
(33) Santos, A.M.S.P. - op. cit, 1993
(34) Almeida, A.L.O. - Colonização Dirigida da Amazônia. Rio de Janeiro: IPEA/INPES,
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(35) Martine, George - “A Evolução Espacial da População Brasileira”. In: Federalismo
no Brasil. Desigualdades Regionais e Desenvolvimento, organizado por Rui de Britto A.
Affonso e Pedro Luiz Barros Silva. São Paulo: UNESP, 1995
(36) Andrade, T.A. e Serra, R.V. - “O Recente Desempenho das Cidades Médias no
Crescimento Populacional Urbano Brasileiro”. Relatório preliminar de pesquisa do projeto
Crescimento Econômico e Desenvolvimento Urbano. IPEA/MCT/FINEP -
CNPQ/PRONEX, 1998.
(37) Becker, B. e Egler, C. - op. cit.
(38) Moseley, M. - op. cit.
(39) Schmidt, B.V. - O Estado e a Política Urbana no Brasil. Porto Alegre: Editora da
UFRS, 1983
(40) Andrade, T.A. e Lodder,C.A. - op. cit.
(41) Santos, Milton - op. cit., p.115
(42) Lu, Martin - “Os Grandes Projetos da Amazônia: Integração Nacional e
(Sub)Desenvolvimento Regional?” Mimeo, 1984
27
(43) Sassen, Saskia - A Cidade Global. In: Lavinas, L. e Nabuco, M.R. (org) -
Reestruturação do Espaço Urbano e Regional no Brasil. São Paulo: ANPUR/Editora
HUCITEC, 1993
(44) Tolosa, H.C. - “Rio de Janeiro: As A World City”. Rio de Janeiro: Conjunto
Universitário Cândido Mendes. Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas do Rio de
Janeiro. Texto Para Discussão n.3, 1995.
(45) Tabb, W. - op. cit., p. 194
(46) Tabb, W. - op. cit., p. 212
(47) Tabb, W. - op. cit., p.218
(48) Tolosa, H.C. - Pobreza no Brasil: uma avaliação dos anos 80. In: Velloso, J.P.R.(org)
- A Questão Social No Brasil. São Paulo: Nobel, 1991.
(49) Reich, Robert - O Trabalho das Nações. São Paulo: Educator, 1994
(50) Santos, Milton - op. cit., p. 65
(51) Tabb, W. - op. cit.
(52) Diniz, C.C. - “Sudeste: Heterogeneidade Estrutural e Perspectivas”. In Rui B.A.
Affonso e Pedro L.B. Silva, op. cit.
Considera, C. et alli - Produto Interno Bruto por Unidade da Federação. Rio de
Janeiro, IPEA/Texto Para Discussão N.424, maio de 1996.
(53)Citado no Balanço da Fazeta Mercantil, relativo ao Estado de São Paulo, setembro de
1977, Ano II, n.2
(54) Citados no Balanço da Gazeta Mercantil, SP, op. cit.
(55) Diniz, C.C. - op. cit.
(56) Considera, C. et alli - op. cit.
(57) Revista Exame, n.650 - Espírito Santo em Exame. São Paulo: Editora Abril, 1997.
(58) Revista Exame, n.650 - op. cit.
(59) Gazeta Mercantil - Paraná - Balanço Anual 1997 Gazeta Mercantil. Agosto de 1997,
Ano IV, n.4
(60) Bandeira, P.S. - “A Economia da Região Sul”. In: Federalismo no Brasil, op. cit.
Gazeta Mercantil - Balanço Anual 96/97. Rio Grande do Sul. Julho de 1996. Ano III.
n.3
Gazeta Mercantil - Balanço Anual 96/97. Santa Catarina. Julho de 1996. Ano
III.n.3
(61) - Andrade, T.A. e Serra, R.V. - op. cit.
(62) Banceira, P.S.- op. cit.
(63) Santos, Milton - op. cit.
(64) Almeida, A.L.O. - op. cit.