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  • Ementa e Acrdo

    18/04/2013 PLENRIO

    RECLAMAO 4.374 PERNAMBUCO

    RELATOR : MIN. GILMAR MENDESRECLTE.(S) : INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS ADV.(A/S) : JORGE ANDRADE DE MEDEIROS RECLDO.(A/S) :TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

    FEDERAIS DO ESTADO DE PERNAMBUCO INTDO.(A/S) : JOS SEVERINO DO NASCIMENTO ADV.(A/S) :DILMA MARIA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE

    Benefcio assistencial de prestao continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituio.

    A Lei de Organizao da Assistncia Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituio da Repblica, estabeleceu critrios para que o benefcio mensal de um salrio mnimo fosse concedido aos portadores de deficincia e aos idosos que comprovassem no possuir meios de prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia.

    2. Art. 20, 3 da Lei 8.742/1993 e a declarao de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.

    Dispe o art. 20, 3, da Lei 8.742/93 que considera-se incapaz de prover a manuteno da pessoa portadora de deficincia ou idosa a famlia cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salrio mnimo.

    O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situaes de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefcio assistencial previsto constitucionalmente.

    Ao apreciar a Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, 3, da LOAS.

    3. Reclamao como instrumento de (re)interpretao da deciso proferida em controle de constitucionalidade abstrato.

    Preliminarmente, arguido o prejuzo da reclamao, em virtude do prvio julgamento dos recursos extraordinrios 580.963 e 567.985, o

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884889.

    Supremo Tribunal FederalSupremo Tribunal FederalInteiro Teor do Acrdo - Pgina 1 de 75

  • Ementa e Acrdo

    RCL 4374 / PE

    Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamao.O STF, no exerccio da competncia geral de fiscalizar a

    compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituio, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da deciso ou do ato que impugnado na reclamao. Isso decorre da prpria competncia atribuda ao STF para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos.

    A oportunidade de reapreciao das decises tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no mbito das reclamaes. no juzo hermenutico tpico da reclamao no balanar de olhos entre objeto e parmetro da reclamao que surgir com maior nitidez a oportunidade para evoluo interpretativa no controle de constitucionalidade.

    Com base na alegao de afronta a determinada deciso do STF, o Tribunal poder reapreciar e redefinir o contedo e o alcance de sua prpria deciso. E, inclusive, poder ir alm, superando total ou parcialmente a deciso-parmetro da reclamao, se entender que, em virtude de evoluo hermenutica, tal deciso no se coaduna mais com a interpretao atual da Constituio.

    4. Decises judiciais contrrias aos critrios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalizao dos critrios definidos pela Lei 8.742/1993.

    A deciso do Supremo Tribunal Federal, entretanto, no ps termo controvrsia quanto aplicao em concreto do critrio da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.

    Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critrio objetivo e nico estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famlias com entes idosos ou deficientes.

    Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critrios mais elsticos para concesso de outros benefcios assistenciais, tais como: a Lei

    2

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    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamao.O STF, no exerccio da competncia geral de fiscalizar a

    compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituio, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da deciso ou do ato que impugnado na reclamao. Isso decorre da prpria competncia atribuda ao STF para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos.

    A oportunidade de reapreciao das decises tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no mbito das reclamaes. no juzo hermenutico tpico da reclamao no balanar de olhos entre objeto e parmetro da reclamao que surgir com maior nitidez a oportunidade para evoluo interpretativa no controle de constitucionalidade.

    Com base na alegao de afronta a determinada deciso do STF, o Tribunal poder reapreciar e redefinir o contedo e o alcance de sua prpria deciso. E, inclusive, poder ir alm, superando total ou parcialmente a deciso-parmetro da reclamao, se entender que, em virtude de evoluo hermenutica, tal deciso no se coaduna mais com a interpretao atual da Constituio.

    4. Decises judiciais contrrias aos critrios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalizao dos critrios definidos pela Lei 8.742/1993.

    A deciso do Supremo Tribunal Federal, entretanto, no ps termo controvrsia quanto aplicao em concreto do critrio da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.

    Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critrio objetivo e nico estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famlias com entes idosos ou deficientes.

    Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critrios mais elsticos para concesso de outros benefcios assistenciais, tais como: a Lei

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    RCL 4374 / PE

    10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas.

    O Supremo Tribunal Federal, em decises monocrticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critrios objetivos.

    Verificou-se a ocorrncia do processo de inconstitucionalizao decorrente de notrias mudanas fticas (polticas, econmicas e sociais) e jurdicas (sucessivas modificaes legislativas dos patamares econmicos utilizados como critrios de concesso de outros benefcios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

    5. Declarao de inconstitucionalidade parcial, sem pronncia de nulidade, do art. 20, 3, da Lei 8.742/1993.

    6. Reclamao constitucional julgada improcedente A C R D O

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sesso Plenria, sob a presidncia do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigrficas, por maioria: conhecer da reclamao, vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa; no mrito, julgar improcedente, vencido o ministro Teori Zawascki, nos termos do voto do Relator.

    Braslia, 18 de abril de 2013.

    Ministro GILMAR MENDESRelator

    Documento assinado digitalmente

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884889.

    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas.

    O Supremo Tribunal Federal, em decises monocrticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critrios objetivos.

    Verificou-se a ocorrncia do processo de inconstitucionalizao decorrente de notrias mudanas fticas (polticas, econmicas e sociais) e jurdicas (sucessivas modificaes legislativas dos patamares econmicos utilizados como critrios de concesso de outros benefcios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

    5. Declarao de inconstitucionalidade parcial, sem pronncia de nulidade, do art. 20, 3, da Lei 8.742/1993.

    6. Reclamao constitucional julgada improcedente A C R D O

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sesso Plenria, sob a presidncia do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigrficas, por maioria: conhecer da reclamao, vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa; no mrito, julgar improcedente, vencido o ministro Teori Zawascki, nos termos do voto do Relator.

    Braslia, 18 de abril de 2013.

    Ministro GILMAR MENDESRelator

    Documento assinado digitalmente

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    18/04/2013 PLENRIO

    RECLAMAO 4.374 PERNAMBUCO

    RELATOR : MIN. GILMAR MENDESRECLTE.(S) : INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS ADV.(A/S) : JORGE ANDRADE DE MEDEIROS RECLDO.(A/S) :TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

    FEDERAIS DO ESTADO DE PERNAMBUCO INTDO.(A/S) : JOS SEVERINO DO NASCIMENTO ADV.(A/S) :DILMA MARIA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE

    R E L A T R I O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES: Trata-se de reclamao ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra deciso proferida pela Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Estado de Pernambuco, nos autos do Processo 2005.83.20.009801-7, que concedeu ao interessado o benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio. Transcrevo a ementa da deciso reclamada (fls. 68-69):

    BENEFCIO ASSISTENCIAL. ANLISE DAS CONDIES SCIO-ECONMICAS DO AUTOR. REQUISITOS DO ART. 20 DA LEI 8.742/93. RENDA PER CAPITA. MEIOS DE PROVA. SMULA 11 DA TUN. LEI 9.533/97. COMPROVAO. RECURSO IMPROVIDO.

    1. O artigo 20 da Lei 8.742/93 destaca a garantia de um salrio mnimo mensal s pessoas portadoras de deficincia e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem, em ambas as hipteses, no possuir meios de prover a prpria manuteno e nem de t-la provida por sua famlia.

    2. J o 3o do mencionado artigo reza que, considera-se incapaz de prover a manuteno da pessoa portadora de deficincia ou idosa a famlia cuja renda mensal per capita seja inferior a (um quarto) do salrio mnimo.

    3. Na hiptese em exame, o laudo pericial concluiu que o

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

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    18/04/2013 PLENRIO

    RECLAMAO 4.374 PERNAMBUCO

    RELATOR : MIN. GILMAR MENDESRECLTE.(S) : INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS ADV.(A/S) : JORGE ANDRADE DE MEDEIROS RECLDO.(A/S) :TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

    FEDERAIS DO ESTADO DE PERNAMBUCO INTDO.(A/S) : JOS SEVERINO DO NASCIMENTO ADV.(A/S) :DILMA MARIA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE

    R E L A T R I O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES: Trata-se de reclamao ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra deciso proferida pela Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Estado de Pernambuco, nos autos do Processo 2005.83.20.009801-7, que concedeu ao interessado o benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio. Transcrevo a ementa da deciso reclamada (fls. 68-69):

    BENEFCIO ASSISTENCIAL. ANLISE DAS CONDIES SCIO-ECONMICAS DO AUTOR. REQUISITOS DO ART. 20 DA LEI 8.742/93. RENDA PER CAPITA. MEIOS DE PROVA. SMULA 11 DA TUN. LEI 9.533/97. COMPROVAO. RECURSO IMPROVIDO.

    1. O artigo 20 da Lei 8.742/93 destaca a garantia de um salrio mnimo mensal s pessoas portadoras de deficincia e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem, em ambas as hipteses, no possuir meios de prover a prpria manuteno e nem de t-la provida por sua famlia.

    2. J o 3o do mencionado artigo reza que, considera-se incapaz de prover a manuteno da pessoa portadora de deficincia ou idosa a famlia cuja renda mensal per capita seja inferior a (um quarto) do salrio mnimo.

    3. Na hiptese em exame, o laudo pericial concluiu que o

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

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    RCL 4374 / PE

    autor incapaz para as atividades laborativas que necessitem de grandes ou mdios esforos fsicos ou que envolvam estresse emocional para a sua realizao.

    4. Em ateno ao laudo pericial e considerando que a verificao da incapacidade para o trabalho deve ser feita analisando-se as peculiaridades do caso concreto, percebe-se pelas informaes constantes nos autos que o autor alm da idade avanada, desempenha a profisso de trabalhador rural, o qual no est mais apto a exercer. Ademais, no possui instruo educacional, o que dificulta o exerccio de atividades intelectuais, de modo que resta improvvel sua absoro pelo mercado de trabalho, o que demonstra a sua incapacidade para a vida independente diante da sujeio ajuda financeira de terceiros para manter sua subsistncia.

    5. Apesar de ter sido comprovado em audincia que a renda auferida pelo recorrido inferior a um salrio mnimo, a comprovao de renda per capita inferior a do salrio mnimo dispensvel quando a situao de hipossuficincia econmica comprovada de outro modo e, no caso dos autos, ela restou demonstrada.

    6. A comprovao da renda mensal no est limitada ao disposto no art. 13 do Decreto 1.744/95, no lhe sendo possvel obstar o reconhecimento de outros meios probatrios em face do princpio da liberdade objetiva dos meios de demonstrao em juzo, desde que idneos e moralmente legtimos, alm de sujeitos ao contraditrio e persuaso racional do juiz na sua apreciao.

    7. Assim, as provas produzidas em juzo constataram que a renda familiar do autor inferior ao limite estabelecido na Lei, sendo idnea a fazer prova neste sentido. A partir dos depoimentos colhidos em audincia, constatou-se que o recorrido no trabalha, vivendo da ajuda de parentes e amigos.

    8. Diante de tais circunstncias, pode-se concluir pela veracidade de tal declarao de modo relativo, cuja contraprova caberia ao INSS, que se limitou impugnao genrica.

    9. Quanto inconstitucionalidade do limite legal de renda

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    autor incapaz para as atividades laborativas que necessitem de grandes ou mdios esforos fsicos ou que envolvam estresse emocional para a sua realizao.

    4. Em ateno ao laudo pericial e considerando que a verificao da incapacidade para o trabalho deve ser feita analisando-se as peculiaridades do caso concreto, percebe-se pelas informaes constantes nos autos que o autor alm da idade avanada, desempenha a profisso de trabalhador rural, o qual no est mais apto a exercer. Ademais, no possui instruo educacional, o que dificulta o exerccio de atividades intelectuais, de modo que resta improvvel sua absoro pelo mercado de trabalho, o que demonstra a sua incapacidade para a vida independente diante da sujeio ajuda financeira de terceiros para manter sua subsistncia.

    5. Apesar de ter sido comprovado em audincia que a renda auferida pelo recorrido inferior a um salrio mnimo, a comprovao de renda per capita inferior a do salrio mnimo dispensvel quando a situao de hipossuficincia econmica comprovada de outro modo e, no caso dos autos, ela restou demonstrada.

    6. A comprovao da renda mensal no est limitada ao disposto no art. 13 do Decreto 1.744/95, no lhe sendo possvel obstar o reconhecimento de outros meios probatrios em face do princpio da liberdade objetiva dos meios de demonstrao em juzo, desde que idneos e moralmente legtimos, alm de sujeitos ao contraditrio e persuaso racional do juiz na sua apreciao.

    7. Assim, as provas produzidas em juzo constataram que a renda familiar do autor inferior ao limite estabelecido na Lei, sendo idnea a fazer prova neste sentido. A partir dos depoimentos colhidos em audincia, constatou-se que o recorrido no trabalha, vivendo da ajuda de parentes e amigos.

    8. Diante de tais circunstncias, pode-se concluir pela veracidade de tal declarao de modo relativo, cuja contraprova caberia ao INSS, que se limitou impugnao genrica.

    9. Quanto inconstitucionalidade do limite legal de renda

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

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    RCL 4374 / PE

    per capita inferior a do salrio mnimo, a sua fixao estabelece apenas um critrio objetivo para julgamento, mas que no impede o deferimento do benefcio quando demonstrada a situao de hipossuficincia.

    10. Se a renda familiar inferior a do salrio mnimo, a presuno de miserabilidade absoluta, sem que isso afaste a possibilidade de tal circunstncia ser provada de outro modo.

    11. Ademais, a Smula 11 da TUN dispe que mesmo quando a renda per capita for superior quele limite legal, no h bices concesso do benefcio assistencial quando a miserabilidade configurada por outros meios de prova.

    12. O prprio legislador j reconheceu a hipossuficincia na hiptese de renda superior ao referido limite ao editar a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro aos Municpios que instituam programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas, estabelecendo critrio mais vantajoso para a anlise da miserabilidade, qual seja, renda familiar per capita inferior a salrio mnimo.

    13. A parte sucumbente deve arcar com o pagamento das custas e dos honorrios advocatcios, ora arbitrados razo de 10% sobre o valor da condenao.

    14. Sentena mantida. Recurso a que se nega provimento. (fls. 68-69)

    O reclamante alega que houve violao deciso proferida por esta Corte na ADI 1.232/DF (Pleno, maioria; rel. Min. Ilmar Galvo, redador do acrdo Min. Nelson Jobim; DJ de 1.6.2001). Na oportunidade, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do 3 do art. 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece critrios para concesso do benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio. A petio inicial sustenta que a deciso reclamada afastou o requisito legal expresso no mencionado dispositivo, o qual, segundo o acrdo tomado como parmetro da reclamao, representa critrio objetivo a ser observado para prestao assistencial do Estado.

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    per capita inferior a do salrio mnimo, a sua fixao estabelece apenas um critrio objetivo para julgamento, mas que no impede o deferimento do benefcio quando demonstrada a situao de hipossuficincia.

    10. Se a renda familiar inferior a do salrio mnimo, a presuno de miserabilidade absoluta, sem que isso afaste a possibilidade de tal circunstncia ser provada de outro modo.

    11. Ademais, a Smula 11 da TUN dispe que mesmo quando a renda per capita for superior quele limite legal, no h bices concesso do benefcio assistencial quando a miserabilidade configurada por outros meios de prova.

    12. O prprio legislador j reconheceu a hipossuficincia na hiptese de renda superior ao referido limite ao editar a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro aos Municpios que instituam programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas, estabelecendo critrio mais vantajoso para a anlise da miserabilidade, qual seja, renda familiar per capita inferior a salrio mnimo.

    13. A parte sucumbente deve arcar com o pagamento das custas e dos honorrios advocatcios, ora arbitrados razo de 10% sobre o valor da condenao.

    14. Sentena mantida. Recurso a que se nega provimento. (fls. 68-69)

    O reclamante alega que houve violao deciso proferida por esta Corte na ADI 1.232/DF (Pleno, maioria; rel. Min. Ilmar Galvo, redador do acrdo Min. Nelson Jobim; DJ de 1.6.2001). Na oportunidade, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do 3 do art. 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece critrios para concesso do benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio. A petio inicial sustenta que a deciso reclamada afastou o requisito legal expresso no mencionado dispositivo, o qual, segundo o acrdo tomado como parmetro da reclamao, representa critrio objetivo a ser observado para prestao assistencial do Estado.

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

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  • Relatrio

    RCL 4374 / PE

    Assim, o reclamante requer a cassao da deciso reclamada, afastando-se a exigncia do pagamento do benefcio assistencial, que estaria em descompasso com o 3 do art. 20 da Lei 8.742/1993, tendo em vista a inobservncia do requisito renda familiar per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salrio mnimo.

    Em deciso de 1 de fevereiro de 2007, modificando posicionamento anterior que acolhia pedidos idnticos ao desta reclamao, indeferi o pedido de medida liminar, acenando com a necessidade de que o tema fosse novamente levado apreciao do Plenrio.

    O parecer do Procurador-Geral da Repblica pela improcedncia da reclamao (fls. 136-140).

    o relatrio.

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884890.

    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    Assim, o reclamante requer a cassao da deciso reclamada, afastando-se a exigncia do pagamento do benefcio assistencial, que estaria em descompasso com o 3 do art. 20 da Lei 8.742/1993, tendo em vista a inobservncia do requisito renda familiar per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salrio mnimo.

    Em deciso de 1 de fevereiro de 2007, modificando posicionamento anterior que acolhia pedidos idnticos ao desta reclamao, indeferi o pedido de medida liminar, acenando com a necessidade de que o tema fosse novamente levado apreciao do Plenrio.

    O parecer do Procurador-Geral da Repblica pela improcedncia da reclamao (fls. 136-140).

    o relatrio.

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  • Voto - MIN. GILMAR MENDES

    18/04/2013 PLENRIO

    RECLAMAO 4.374 PERNAMBUCO

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator):

    1. Consideraes iniciais: o histrico da concesso judicial do benefcio assistencial e sua repercusso na jurisprudncia do STF

    Senhores Ministros, Senhoras Ministras. O caso concreto subjacente aos autos traduz um problema que de todos ns conhecido. H alguns anos temos recebido impressionante quantidade de processos, em sua maioria recursos extraordinrios e reclamaes, cujo tema principal a concesso judicial do benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio de 1988. Uma difcil questo constitucional, que vem sendo resolvida pela atuao corajosa da magistratura de primeira instncia, na tentativa de remediar um gravssimo problema social que se notabiliza como uma soma de injustias, decorrente de uma desencontrada relao entre a letra objetiva da lei e a vontade da Constituio.

    O exame dos diversos casos revela um comportamento judicial peculiar, porm muito comum. A anlise histrica dos modos de raciocnio judicirio demonstra que os juzes, quando se deparam com uma situao de incompatibilidade entre o que prescreve a lei e o que se lhes apresenta como a soluo mais justa para o caso, no tergiversam na procura das melhores tcnicas hermenuticas para reconstruir os sentidos possveis do texto legal e viabilizar a adoo da justa soluo.

    Esse o tom da recente histria da concesso judicial do benefcio assistencial, que vale a pena retomar em uma rpida anlise descritiva.

    A Lei n 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei de Organizao da Assistncia Social LOAS), ao regulamentar o art. 203, inciso V, da Constituio da Repblica, estabeleceu os critrios para que o benefcio mensal de um salrio mnimo seja concedido aos portadores de deficincia e aos idosos que comprovem no possuir meios de prover a

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    Supremo Tribunal Federal

    18/04/2013 PLENRIO

    RECLAMAO 4.374 PERNAMBUCO

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator):

    1. Consideraes iniciais: o histrico da concesso judicial do benefcio assistencial e sua repercusso na jurisprudncia do STF

    Senhores Ministros, Senhoras Ministras. O caso concreto subjacente aos autos traduz um problema que de todos ns conhecido. H alguns anos temos recebido impressionante quantidade de processos, em sua maioria recursos extraordinrios e reclamaes, cujo tema principal a concesso judicial do benefcio assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituio de 1988. Uma difcil questo constitucional, que vem sendo resolvida pela atuao corajosa da magistratura de primeira instncia, na tentativa de remediar um gravssimo problema social que se notabiliza como uma soma de injustias, decorrente de uma desencontrada relao entre a letra objetiva da lei e a vontade da Constituio.

    O exame dos diversos casos revela um comportamento judicial peculiar, porm muito comum. A anlise histrica dos modos de raciocnio judicirio demonstra que os juzes, quando se deparam com uma situao de incompatibilidade entre o que prescreve a lei e o que se lhes apresenta como a soluo mais justa para o caso, no tergiversam na procura das melhores tcnicas hermenuticas para reconstruir os sentidos possveis do texto legal e viabilizar a adoo da justa soluo.

    Esse o tom da recente histria da concesso judicial do benefcio assistencial, que vale a pena retomar em uma rpida anlise descritiva.

    A Lei n 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei de Organizao da Assistncia Social LOAS), ao regulamentar o art. 203, inciso V, da Constituio da Repblica, estabeleceu os critrios para que o benefcio mensal de um salrio mnimo seja concedido aos portadores de deficincia e aos idosos que comprovem no possuir meios de prover a

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884891.

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  • Voto - MIN. GILMAR MENDES

    RCL 4374 / PE

    prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. O primeiro critrio diz respeito aos requisitos objetivos para que a

    pessoa seja considerada idosa ou portadora de deficincia. Define a lei como idoso o indivduo com 70 (setenta) anos ou mais, e como deficiente a pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho (art. 20,

    caput e 2o

    ). Com o advento do Estatuto do Idoso, a Lei 10.741, em outubro de 2003, passou a ser considerada idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

    O segundo critrio diz respeito comprovao da incapacidade da famlia para prover a manuteno do deficiente ou idoso. Dispe o art. 20,

    3o

    , da Lei 8.742/93: considera-se incapaz de prover a manuteno da pessoa portadora de deficincia ou idosa a famlia cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salrio mnimo.

    A aplicao dos referidos critrios encontrou srios obstculos na complexidade e na heterogeneidade dos casos concretos. Se, antes da edio da Lei 8.742/93, o art. 203, inciso V, da Constituio era despido de qualquer eficcia o que a doutrina especializada costuma denominar de norma constitucional de eficcia limitada , o advento da legislao regulamentadora no foi suficiente para dot-lo de plena eficcia. Questionamentos importantes foram suscitados logo no incio da aplicao da lei. E, sem dvida, o mais importante dizia respeito ao critrio de mensurao da renda familiar per capita. O requisito financeiro estabelecido pela lei comeou a ter sua constitucionalidade contestada, pois, na prtica, permitia que situaes de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefcio assistencial previsto constitucionalmente.

    A questo chegou ao Supremo Tribunal Federal. O Procurador-Geral da Repblica, acolhendo representao do Ministrio Pblico Federal no Estado de So Paulo, ajuizou no STF ao direta de inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF) que tinha por objeto o 3 do art. 20 da Lei 8.742/93. Em parecer da ento Subprocuradora-Geral da Repblica, Dra. Anadyr de Mendona Rodrigues, o MPF manifestou-se por uma interpretao

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    RCL 4374 / PE

    prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. O primeiro critrio diz respeito aos requisitos objetivos para que a

    pessoa seja considerada idosa ou portadora de deficincia. Define a lei como idoso o indivduo com 70 (setenta) anos ou mais, e como deficiente a pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho (art. 20,

    caput e 2o

    ). Com o advento do Estatuto do Idoso, a Lei 10.741, em outubro de 2003, passou a ser considerada idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

    O segundo critrio diz respeito comprovao da incapacidade da famlia para prover a manuteno do deficiente ou idoso. Dispe o art. 20,

    3o

    , da Lei 8.742/93: considera-se incapaz de prover a manuteno da pessoa portadora de deficincia ou idosa a famlia cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salrio mnimo.

    A aplicao dos referidos critrios encontrou srios obstculos na complexidade e na heterogeneidade dos casos concretos. Se, antes da edio da Lei 8.742/93, o art. 203, inciso V, da Constituio era despido de qualquer eficcia o que a doutrina especializada costuma denominar de norma constitucional de eficcia limitada , o advento da legislao regulamentadora no foi suficiente para dot-lo de plena eficcia. Questionamentos importantes foram suscitados logo no incio da aplicao da lei. E, sem dvida, o mais importante dizia respeito ao critrio de mensurao da renda familiar per capita. O requisito financeiro estabelecido pela lei comeou a ter sua constitucionalidade contestada, pois, na prtica, permitia que situaes de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefcio assistencial previsto constitucionalmente.

    A questo chegou ao Supremo Tribunal Federal. O Procurador-Geral da Repblica, acolhendo representao do Ministrio Pblico Federal no Estado de So Paulo, ajuizou no STF ao direta de inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF) que tinha por objeto o 3 do art. 20 da Lei 8.742/93. Em parecer da ento Subprocuradora-Geral da Repblica, Dra. Anadyr de Mendona Rodrigues, o MPF manifestou-se por uma interpretao

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    conforme a Constituio. A tese era a de que o 3 do art. 20 da LOAS nada mais fazia do que estabelecer uma presuno juris et de jure, a qual dispensava qualquer tipo de comprovao da necessidade assistencial para as hipteses de renda familiar per capita inferior a do salrio mnimo, mas que no exclua a possibilidade de comprovao, em concreto e caso a caso, da efetiva falta de meios para que o deficiente ou o idoso possa prover a prpria manuteno ou t-la provida por sua famlia.

    O Ministro Ilmar Galvo, ento Relator dessa ao, trouxe voto acolhendo a proposta do Ministrio Pblico. A maioria, porm, dele divergiu. A tese vencedora, proferida pelo Ministro Nelson Jobim, considerou que o 3 do art. 20 da LOAS traz um critrio objetivo que no , por si s, incompatvel com a Constituio, e que a eventual necessidade de criao de outros requisitos para a concesso do benefcio assistencial seria uma questo a ser avaliada pelo legislador. Assim, a Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF foi julgada improcedente, com a consequente declarao de constitucionalidade do art. 20, 3, da LOAS, ficando a ementa do acrdo redigida da seguinte maneira (Rel. p/ o acrdo Min. Nelson Jobim, DJ 1.6.2001):

    CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O CRITRIO PARA RECEBER O BENEFCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIO ALEGADA EM FACE AO PRPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA LEI PARA FIXAR OS CRITRIOS DE GARANTIA DO BENEFCIO DE SALRIO MNIMO PESSOA PORTADORA DE DEFICINCIA FSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPTESE OBJETIVA DE PRESTAO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AO JULGADA IMPROCEDENTE.

    A deciso do Tribunal, porm, no ps termo controvrsia quanto aplicao em concreto do critrio da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. O voto do Ministro Seplveda Pertence, que j avaliava a

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    conforme a Constituio. A tese era a de que o 3 do art. 20 da LOAS nada mais fazia do que estabelecer uma presuno juris et de jure, a qual dispensava qualquer tipo de comprovao da necessidade assistencial para as hipteses de renda familiar per capita inferior a do salrio mnimo, mas que no exclua a possibilidade de comprovao, em concreto e caso a caso, da efetiva falta de meios para que o deficiente ou o idoso possa prover a prpria manuteno ou t-la provida por sua famlia.

    O Ministro Ilmar Galvo, ento Relator dessa ao, trouxe voto acolhendo a proposta do Ministrio Pblico. A maioria, porm, dele divergiu. A tese vencedora, proferida pelo Ministro Nelson Jobim, considerou que o 3 do art. 20 da LOAS traz um critrio objetivo que no , por si s, incompatvel com a Constituio, e que a eventual necessidade de criao de outros requisitos para a concesso do benefcio assistencial seria uma questo a ser avaliada pelo legislador. Assim, a Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF foi julgada improcedente, com a consequente declarao de constitucionalidade do art. 20, 3, da LOAS, ficando a ementa do acrdo redigida da seguinte maneira (Rel. p/ o acrdo Min. Nelson Jobim, DJ 1.6.2001):

    CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O CRITRIO PARA RECEBER O BENEFCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIO ALEGADA EM FACE AO PRPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA LEI PARA FIXAR OS CRITRIOS DE GARANTIA DO BENEFCIO DE SALRIO MNIMO PESSOA PORTADORA DE DEFICINCIA FSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPTESE OBJETIVA DE PRESTAO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AO JULGADA IMPROCEDENTE.

    A deciso do Tribunal, porm, no ps termo controvrsia quanto aplicao em concreto do critrio da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. O voto do Ministro Seplveda Pertence, que j avaliava a

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    presena de uma possvel inconstitucionalidade por omisso parcial, parecia anunciar que o problema relativo aplicao da LOAS tenderia a permanecer at que o legislador se pronunciasse sobre o tema. Como a lei permaneceu inalterada, apesar do latente apelo realizado pelo Tribunal, por juzes e tribunais principalmente os ento recm-criados Juizados Especiais continuaram a elaborar maneiras de contornar o critrio objetivo e nico estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famlias com entes idosos ou deficientes. E isso passava a significar, cada vez mais, que a interpretao da LOAS pleiteada pelo Ministrio Pblico na ADI 1.232 no era apenas uma opo hermenutica, mas uma imposio que se fazia presente nas situaes reais multifacetrias apresentadas aos juzes de primeira instncia. Entre aplicar friamente o critrio objetivo da lei e adotar a soluo condizente com a realidade social da famlia brasileira, os juzes permaneceram abraando a segunda opo, mesmo que isso significasse a criao judicial de outros critrios no estabelecidos em lei e, dessa forma, uma possvel afronta deciso do STF.

    A Turma Nacional de Uniformizao de Jurisprudncia dos Juizados Especiais Federais chegou a consolidar, em smula (Smula 11, hoje cancelada), o entendimento segundo o qual a renda mensal per capita familiar, superior a (um quarto) do salrio mnimo, no impede a concesso do benefcio assistencial previsto no art. 20, 3 da Lei n. 8.742 de 1993, desde que comprovada, por outros meios, a miserabilidade do postulante.

    A situao foi extremamente propcia para que comeasse a aportar no Supremo Tribunal Federal uma verdadeira enxurrada de reclamaes movidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O Tribunal ento passou a julgar procedentes tais reclamaes para cassar decises, proferidas pelas instncias jurisdicionais inferiores, que concediam o

    benefcio assistencial entendendo que o requisito definido pelo 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 no exaustivo e que, portanto, o estado de miserabilidade poderia ser comprovado por outros meios de prova.

    A questo foi amplamente debatida no julgamento da Rcl AgR 2.303/RS, Rel. Min. Ellen Gracie (DJ 1.4.2005). Na ocasio, o Ministro

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    presena de uma possvel inconstitucionalidade por omisso parcial, parecia anunciar que o problema relativo aplicao da LOAS tenderia a permanecer at que o legislador se pronunciasse sobre o tema. Como a lei permaneceu inalterada, apesar do latente apelo realizado pelo Tribunal, por juzes e tribunais principalmente os ento recm-criados Juizados Especiais continuaram a elaborar maneiras de contornar o critrio objetivo e nico estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famlias com entes idosos ou deficientes. E isso passava a significar, cada vez mais, que a interpretao da LOAS pleiteada pelo Ministrio Pblico na ADI 1.232 no era apenas uma opo hermenutica, mas uma imposio que se fazia presente nas situaes reais multifacetrias apresentadas aos juzes de primeira instncia. Entre aplicar friamente o critrio objetivo da lei e adotar a soluo condizente com a realidade social da famlia brasileira, os juzes permaneceram abraando a segunda opo, mesmo que isso significasse a criao judicial de outros critrios no estabelecidos em lei e, dessa forma, uma possvel afronta deciso do STF.

    A Turma Nacional de Uniformizao de Jurisprudncia dos Juizados Especiais Federais chegou a consolidar, em smula (Smula 11, hoje cancelada), o entendimento segundo o qual a renda mensal per capita familiar, superior a (um quarto) do salrio mnimo, no impede a concesso do benefcio assistencial previsto no art. 20, 3 da Lei n. 8.742 de 1993, desde que comprovada, por outros meios, a miserabilidade do postulante.

    A situao foi extremamente propcia para que comeasse a aportar no Supremo Tribunal Federal uma verdadeira enxurrada de reclamaes movidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O Tribunal ento passou a julgar procedentes tais reclamaes para cassar decises, proferidas pelas instncias jurisdicionais inferiores, que concediam o

    benefcio assistencial entendendo que o requisito definido pelo 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 no exaustivo e que, portanto, o estado de miserabilidade poderia ser comprovado por outros meios de prova.

    A questo foi amplamente debatida no julgamento da Rcl AgR 2.303/RS, Rel. Min. Ellen Gracie (DJ 1.4.2005). Na ocasio, o Ministro

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    Ayres Britto, em voto-vista, chegou a defender a higidez constitucional e a compatibilidade com a deciso na ADI 1.232 dos comportamentos judiciais que, levando em conta as circunstncias especficas do caso concreto, encontram outros critrios para aferir o estado de miserabilidade social do indivduo. A maioria, no entanto, firmou-se no sentido de que, na deciso proferida na ADI 1.232, o Tribunal definiu que o critrio de do salrio mnimo objetivo e no pode ser conjugado com outros fatores indicativos da miserabilidade do indivduo e de seu grupo familiar, cabendo ao legislador, e no ao juiz na soluo do caso concreto, a criao de outros requisitos para a aferio do estado de pobreza daquele que pleiteia o benefcio assistencial.

    Nesse meio tempo, observou-se certa proliferao de leis que estabeleceram critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas; e o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03). Isso foi visto pelos aplicadores da LOAS como um fato revelador de que o prprio legislador estaria reinterpretando o art. 203 da Constituio da Repblica. Abria-se, com isso, mais uma porta para a concesso do benefcio assistencial fora dos parmetros objetivos fixados pelo art. 20 da LOAS. Juzes e tribunais passaram a estabelecer o valor de salrio mnimo como referncia para a aferio da renda familiar per capita, o que culminou, no mbito do Tribunal Regional Federal da 4 Regio, na aprovao da Smula 6, de 16 de novembro de 2004, cujo teor o seguinte:

    O critrio de verificao objetiva da miserabilidade correspondente a (um quarto) do salrio mnimo, previsto no art. 20, 3, da Lei n 8.742/93, restou modificado para (meio) salrio mnimo, a teor do disposto no art. 5, I, da Lei n 9.533/97, que autorizava o Poder Executivo a conceder apoio financeiro aos Municpios que institussem programas de

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    Ayres Britto, em voto-vista, chegou a defender a higidez constitucional e a compatibilidade com a deciso na ADI 1.232 dos comportamentos judiciais que, levando em conta as circunstncias especficas do caso concreto, encontram outros critrios para aferir o estado de miserabilidade social do indivduo. A maioria, no entanto, firmou-se no sentido de que, na deciso proferida na ADI 1.232, o Tribunal definiu que o critrio de do salrio mnimo objetivo e no pode ser conjugado com outros fatores indicativos da miserabilidade do indivduo e de seu grupo familiar, cabendo ao legislador, e no ao juiz na soluo do caso concreto, a criao de outros requisitos para a aferio do estado de pobreza daquele que pleiteia o benefcio assistencial.

    Nesse meio tempo, observou-se certa proliferao de leis que estabeleceram critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas; e o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03). Isso foi visto pelos aplicadores da LOAS como um fato revelador de que o prprio legislador estaria reinterpretando o art. 203 da Constituio da Repblica. Abria-se, com isso, mais uma porta para a concesso do benefcio assistencial fora dos parmetros objetivos fixados pelo art. 20 da LOAS. Juzes e tribunais passaram a estabelecer o valor de salrio mnimo como referncia para a aferio da renda familiar per capita, o que culminou, no mbito do Tribunal Regional Federal da 4 Regio, na aprovao da Smula 6, de 16 de novembro de 2004, cujo teor o seguinte:

    O critrio de verificao objetiva da miserabilidade correspondente a (um quarto) do salrio mnimo, previsto no art. 20, 3, da Lei n 8.742/93, restou modificado para (meio) salrio mnimo, a teor do disposto no art. 5, I, da Lei n 9.533/97, que autorizava o Poder Executivo a conceder apoio financeiro aos Municpios que institussem programas de

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    RCL 4374 / PE

    garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas, e art. 2, 2, da Lei n 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao PNAA.

    No obstante, o STF manteve seu entendimento, mesmo nas reclamaes ajuizadas contra decises que, procedendo a uma interpretao sistemtica das leis sobre a matria, concediam o benefcio assistencial com base em outros critrios estabelecidos por alteraes legislativas posteriores (Lei 10.836/2004 Bolsa Famlia; Lei 10.689/2003 Programa Nacional de Acesso Alimentao; Lei 9.533/97 autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas). Assim decidiu o Tribunal na Rcl 2.323/PR, Rel. Min. Eros Grau, DJ 20.5.2005.

    Mas as reiteradas decises do STF no foram suficientes para coibir as decises das instncias inferiores na soluo dos casos concretos. A inventividade hermenutica passou a ficar cada vez mais apurada, tendo em vista a necessidade de se escapar dos comandos impostos pela jurisprudncia do STF. A diversidade e a complexidade dos casos levaram a uma variedade de critrios para concesso do benefcio assistencial, tais como os descritos a seguir:

    a) O benefcio previdencirio de valor mnimo, ou outro benefcio assistencial percebido por idoso, excludo da composio da renda familiar (Smula 20 das Turmas Recursais de Santa Catarina e Precedentes da Turma Regional de Uniformizao);

    b) Indivduos maiores de 21 (vinte e um) anos so excludos do grupo familiar para o clculo da renda per capita;

    c) O benefcio assistencial percebido por qualquer outro membro da famlia no considerado para fins da apurao da renda familiar;

    d) Consideram-se componentes do grupo familiar, para fins de clculo da renda per capita, apenas os que esto arrolados expressamente no art. 16 da Lei 8.213/91;

    e) Os gastos inerentes condio do beneficirio (remdios etc.) so

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    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas, e art. 2, 2, da Lei n 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao PNAA.

    No obstante, o STF manteve seu entendimento, mesmo nas reclamaes ajuizadas contra decises que, procedendo a uma interpretao sistemtica das leis sobre a matria, concediam o benefcio assistencial com base em outros critrios estabelecidos por alteraes legislativas posteriores (Lei 10.836/2004 Bolsa Famlia; Lei 10.689/2003 Programa Nacional de Acesso Alimentao; Lei 9.533/97 autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas). Assim decidiu o Tribunal na Rcl 2.323/PR, Rel. Min. Eros Grau, DJ 20.5.2005.

    Mas as reiteradas decises do STF no foram suficientes para coibir as decises das instncias inferiores na soluo dos casos concretos. A inventividade hermenutica passou a ficar cada vez mais apurada, tendo em vista a necessidade de se escapar dos comandos impostos pela jurisprudncia do STF. A diversidade e a complexidade dos casos levaram a uma variedade de critrios para concesso do benefcio assistencial, tais como os descritos a seguir:

    a) O benefcio previdencirio de valor mnimo, ou outro benefcio assistencial percebido por idoso, excludo da composio da renda familiar (Smula 20 das Turmas Recursais de Santa Catarina e Precedentes da Turma Regional de Uniformizao);

    b) Indivduos maiores de 21 (vinte e um) anos so excludos do grupo familiar para o clculo da renda per capita;

    c) O benefcio assistencial percebido por qualquer outro membro da famlia no considerado para fins da apurao da renda familiar;

    d) Consideram-se componentes do grupo familiar, para fins de clculo da renda per capita, apenas os que esto arrolados expressamente no art. 16 da Lei 8.213/91;

    e) Os gastos inerentes condio do beneficirio (remdios etc.) so

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  • Voto - MIN. GILMAR MENDES

    RCL 4374 / PE

    excludos do clculo da renda familiar.

    E as reclamaes ajuizadas pelo INSS, alm dos milhares de recursos extraordinrios tambm interpostos pela autarquia previdenciria, continuaram aportando na Corte.

    A partir do ano de 2006, decises monocrticas de eminentes Ministros deste Tribunal passaram a rever anteriores posicionamentos. Ante a impossibilidade imediata de modificao do entendimento fixado na ADI 1.232 e nas RCL 2.303 e 2.323, acima comentadas, a soluo muitas vezes encontrada fundava-se em subterfgios processuais para o no conhecimento das reclamaes.

    Os Ministros Celso de Mello, Ayres Britto e Ricardo Lewandowski passaram a negar seguimento s reclamaes ajuizadas pelo INSS, com o fundamento de que esta via processual, como j assentado pela jurisprudncia do Tribunal, no adequada para se reexaminar o conjunto ftico-probatrio em que se baseou a deciso reclamada para atestar o estado de miserabilidade do indivduo e conceder-lhe o

    benefcio assistencial sem seguir os parmetros do 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 (Rcl 4.422/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 30.6.2006; Rcl 4.133/RS, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 30.6.2006; Rcl 4.366/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 1.6.2006).

    O Ministro Seplveda Pertence enfatizava, em anlise de decises que concederam o benefcio com base em legislao superveniente Lei 8.742/93, que as decises reclamadas no declararam a

    inconstitucionalidade do 3o

    do art. 20 dessa lei, mas apenas interpretaram tal dispositivo em conjunto com a legislao posterior, a qual no foi objeto da ADI 1.232 (Rcl 4.280/RS, Rel. Min. Seplveda Pertence, DJ 30.6.2006).

    Somem-se a essas as decises do Ministro Marco Aurlio, que sempre deixou claro seu posicionamento no sentido da insuficincia dos

    critrios definidos pelo 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 para fiel cumprimento do art. 203, inciso V, da Constituio (Rcl 4.164/RS, Rel.

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    excludos do clculo da renda familiar.

    E as reclamaes ajuizadas pelo INSS, alm dos milhares de recursos extraordinrios tambm interpostos pela autarquia previdenciria, continuaram aportando na Corte.

    A partir do ano de 2006, decises monocrticas de eminentes Ministros deste Tribunal passaram a rever anteriores posicionamentos. Ante a impossibilidade imediata de modificao do entendimento fixado na ADI 1.232 e nas RCL 2.303 e 2.323, acima comentadas, a soluo muitas vezes encontrada fundava-se em subterfgios processuais para o no conhecimento das reclamaes.

    Os Ministros Celso de Mello, Ayres Britto e Ricardo Lewandowski passaram a negar seguimento s reclamaes ajuizadas pelo INSS, com o fundamento de que esta via processual, como j assentado pela jurisprudncia do Tribunal, no adequada para se reexaminar o conjunto ftico-probatrio em que se baseou a deciso reclamada para atestar o estado de miserabilidade do indivduo e conceder-lhe o

    benefcio assistencial sem seguir os parmetros do 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 (Rcl 4.422/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 30.6.2006; Rcl 4.133/RS, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 30.6.2006; Rcl 4.366/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 1.6.2006).

    O Ministro Seplveda Pertence enfatizava, em anlise de decises que concederam o benefcio com base em legislao superveniente Lei 8.742/93, que as decises reclamadas no declararam a

    inconstitucionalidade do 3o

    do art. 20 dessa lei, mas apenas interpretaram tal dispositivo em conjunto com a legislao posterior, a qual no foi objeto da ADI 1.232 (Rcl 4.280/RS, Rel. Min. Seplveda Pertence, DJ 30.6.2006).

    Somem-se a essas as decises do Ministro Marco Aurlio, que sempre deixou claro seu posicionamento no sentido da insuficincia dos

    critrios definidos pelo 3o

    do art. 20 da Lei 8.742/93 para fiel cumprimento do art. 203, inciso V, da Constituio (Rcl 4.164/RS, Rel.

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    RCL 4374 / PE

    Min. Marco Aurlio). A Ministra Crmen Lcia tambm se posicionou sobre o assunto, em

    deciso permeada por trechos dignos de nota (Rcl 3.805/SP, DJ 18.10.2006), como transcrito a seguir:

    (...) O que se pe em foco nesta Reclamao se seria possvel valer-se o Reclamante deste instituto para questionar a autoridade de deciso do Supremo Tribunal, que, ao menos em princpio, no teria sido observada pelo Reclamado. A nica fundamentao da Reclamao esta: nos termos do art. 102, inc. I, alnea l, da Constituio da Repblica, haver de conhecer este Tribunal da reclamao para a preservao de sua competncia e garantia da autoridade de suas decises. Na presente Reclamao, expe-se que teria havido afronta autoridade da deciso que se pe no acrdo proferido na Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232, na qual afirmou este Tribunal Supremo que "inexiste a restrio alegada em face do prprio dispositivo constitucional (art. 203, inc. V, da Constituio da Repblica) que reporta lei para fixar os critrios de garantia do benefcio de salrio mnimo pessoa portadora de deficincia fsica e ao idoso. Esta lei traz hiptese objetiva de prestao assistencial do Estado." (Rel. Ministro Ilmar Galvo, DJ 1.6.2001). O exame dos votos proferidos no julgamento revela que o Supremo Tribunal apenas declarou que a norma do art. 20 e seu 3 da Lei n. 8.742/93 no apresentava inconstitucionalidade ao definir limites gerais para o pagamento do benefcio a ser assumido pelo INSS, ora Reclamante. Mas no afirmou que, no exame do caso concreto, o juiz no poderia fixar o que se fizesse mister para que a norma constitucional do art. 203, inc. V, e demais direitos fundamentais e princpios constitucionais se cumprissem rigorosa, prioritria e inescusavelmente. Como afirmado pelo Ministro Seplveda Pertence no voto proferido naquele julgamento, considero perfeita a inteligncia dada ao dispositivo constitucional ... no sentido de que o legislador deve estabelecer outras situaes caracterizadoras da absoluta

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    Min. Marco Aurlio). A Ministra Crmen Lcia tambm se posicionou sobre o assunto, em

    deciso permeada por trechos dignos de nota (Rcl 3.805/SP, DJ 18.10.2006), como transcrito a seguir:

    (...) O que se pe em foco nesta Reclamao se seria possvel valer-se o Reclamante deste instituto para questionar a autoridade de deciso do Supremo Tribunal, que, ao menos em princpio, no teria sido observada pelo Reclamado. A nica fundamentao da Reclamao esta: nos termos do art. 102, inc. I, alnea l, da Constituio da Repblica, haver de conhecer este Tribunal da reclamao para a preservao de sua competncia e garantia da autoridade de suas decises. Na presente Reclamao, expe-se que teria havido afronta autoridade da deciso que se pe no acrdo proferido na Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232, na qual afirmou este Tribunal Supremo que "inexiste a restrio alegada em face do prprio dispositivo constitucional (art. 203, inc. V, da Constituio da Repblica) que reporta lei para fixar os critrios de garantia do benefcio de salrio mnimo pessoa portadora de deficincia fsica e ao idoso. Esta lei traz hiptese objetiva de prestao assistencial do Estado." (Rel. Ministro Ilmar Galvo, DJ 1.6.2001). O exame dos votos proferidos no julgamento revela que o Supremo Tribunal apenas declarou que a norma do art. 20 e seu 3 da Lei n. 8.742/93 no apresentava inconstitucionalidade ao definir limites gerais para o pagamento do benefcio a ser assumido pelo INSS, ora Reclamante. Mas no afirmou que, no exame do caso concreto, o juiz no poderia fixar o que se fizesse mister para que a norma constitucional do art. 203, inc. V, e demais direitos fundamentais e princpios constitucionais se cumprissem rigorosa, prioritria e inescusavelmente. Como afirmado pelo Ministro Seplveda Pertence no voto proferido naquele julgamento, considero perfeita a inteligncia dada ao dispositivo constitucional ... no sentido de que o legislador deve estabelecer outras situaes caracterizadoras da absoluta

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    RCL 4374 / PE

    incapacidade de manter-se o idoso ou o deficiente fsico, a fim de completar a efetivao do programa normativo de assistncia contido no art. 203 da Constituio. A meu ver, isso no a faz inconstitucional. ... Haver a inconstitucionalidade por omisso de outras hipteses? A meu ver, certamente sim, mas isso no encontrar remdio nesta ao direta. De se concluir, portanto, que o Supremo Tribunal teve por constitucional, em tese (cuidava-se de controle abstrato), a norma do art. 20 da Lei n. 8.742/93, mas no afirmou inexistirem outras situaes concretas que impusessem atendimento constitucional e no subsuno quela norma. Taxativa, nesse sentido, a inteligncia do acrdo nos termos clareados no voto do Ministro Seplveda Pertence, transcrito parcialmente acima. A constitucionalidade da norma legal, assim, no significa a inconstitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, Constituio, garantidora do princpio da dignidade humana e do direito sade, e obrigao estatal de prestar a assistncia social a quem dela necessitar, independentemente da contribuio seguridade social, tenham de definir aquele pagamento diante da constatao da necessidade da pessoa portadora de deficincia ou do idoso que no possa prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. No caso que ora se apresenta, no parece ter havido qualquer afronta, portanto, ao julgado. Como afirma o Reclamado em suas informaes (e, alis, j se contm na deciso proferida), foram ...analisadas as condies fticas demonstradas durante a instruo probatria... (fl. 48). Na sentena proferida nos autos daquela ao, o juzo reclamado esclareceu que: No caso vertente, o estudo social realizado pela equipe tcnica desta Comarca constatou (...) [que] a autora faz uso contnuo de medicamentos, e quando estes no se encontram, por qualquer motivo, disponveis na rede pblica, tem que adquiri-los... Alm disso, comprovou-se (...) que a me da autora, com que recebe da penso de 1 salrio mnimo deixada pelo marido, tambm tem que ajudar um dos filhos

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    incapacidade de manter-se o idoso ou o deficiente fsico, a fim de completar a efetivao do programa normativo de assistncia contido no art. 203 da Constituio. A meu ver, isso no a faz inconstitucional. ... Haver a inconstitucionalidade por omisso de outras hipteses? A meu ver, certamente sim, mas isso no encontrar remdio nesta ao direta. De se concluir, portanto, que o Supremo Tribunal teve por constitucional, em tese (cuidava-se de controle abstrato), a norma do art. 20 da Lei n. 8.742/93, mas no afirmou inexistirem outras situaes concretas que impusessem atendimento constitucional e no subsuno quela norma. Taxativa, nesse sentido, a inteligncia do acrdo nos termos clareados no voto do Ministro Seplveda Pertence, transcrito parcialmente acima. A constitucionalidade da norma legal, assim, no significa a inconstitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, Constituio, garantidora do princpio da dignidade humana e do direito sade, e obrigao estatal de prestar a assistncia social a quem dela necessitar, independentemente da contribuio seguridade social, tenham de definir aquele pagamento diante da constatao da necessidade da pessoa portadora de deficincia ou do idoso que no possa prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. No caso que ora se apresenta, no parece ter havido qualquer afronta, portanto, ao julgado. Como afirma o Reclamado em suas informaes (e, alis, j se contm na deciso proferida), foram ...analisadas as condies fticas demonstradas durante a instruo probatria... (fl. 48). Na sentena proferida nos autos daquela ao, o juzo reclamado esclareceu que: No caso vertente, o estudo social realizado pela equipe tcnica desta Comarca constatou (...) [que] a autora faz uso contnuo de medicamentos, e quando estes no se encontram, por qualquer motivo, disponveis na rede pblica, tem que adquiri-los... Alm disso, comprovou-se (...) que a me da autora, com que recebe da penso de 1 salrio mnimo deixada pelo marido, tambm tem que ajudar um dos filhos

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    que tambm no tem boa sade mental (...) (fl. 82). Explica, ainda, aquela autoridade que: Diante deste quadro, v-se que os rendimentos da famlia, face aos encargos decorrentes de medicamentos que devem ser constantemente adquiridos para o tratamento da autora, so insuficientes para esta viver condignamente. (fl. 82). A pobreza extrema vem sendo definida, juridicamente, como la marque d'une infriorit par rapport um tat considr comme normal et d'une dpendance par rapport aux autres. Elle est um tat d'exclusion qui implique l'aide d'autrui pour s'en sortir. Elle est surtout relative et faite d'humiliation et de privation. (TOURETTE, Florence. Extrme pauvret et droits de l'homme. Paris: LGDJ, 2001, p. 4). Quer o INSS, ora Reclamante, se considere ser a definio do benefcio concedido pela sentena reclamada incompatvel com o quanto decidido na Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232. No o que se tem no caso. Tambm afirma que haveria incompatibilidade entre aquela deciso e a norma do 3 do art. 20 da Lei n. 8.742/93. Afirmo: e a misria constatada pelo juiz incompatvel com a dignidade da pessoa humana, princpio garantido no art. 1, inc. III, da Constituio da Repblica; e a poltica definida a ignorar a miserabilidade de brasileiros incompatvel com os princpios postos no art. 3 e seus incisos da Constituio; e a negativa do Poder Judicirio em reconhecer, no caso concreto, a situao comprovada e as alternativas que a Constituio oferece para no deixar morrer mingua algum brasileiro incompatvel com a garantia da jurisdio, a todos assegurada como direito fundamental (art. 5, inc. XXXV, da Constituio da Repblica). Portanto, no apenas no se comprova afronta autoridade de deciso do Supremo Tribunal na sentena proferida, como, ainda, foi exatamente para dar cumprimento Constituio da Repblica, de que guarda este Tribunal, que se exarou a sentena na forma que se pode verificar at aqui. Ademais, a Reclamao no espcie adequada para se questionar sentena na forma indicada na petio, o que haver de ser feito, se assim entender conveniente ou necessrio o Reclamante, pelas vias

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    que tambm no tem boa sade mental (...) (fl. 82). Explica, ainda, aquela autoridade que: Diante deste quadro, v-se que os rendimentos da famlia, face aos encargos decorrentes de medicamentos que devem ser constantemente adquiridos para o tratamento da autora, so insuficientes para esta viver condignamente. (fl. 82). A pobreza extrema vem sendo definida, juridicamente, como la marque d'une infriorit par rapport um tat considr comme normal et d'une dpendance par rapport aux autres. Elle est um tat d'exclusion qui implique l'aide d'autrui pour s'en sortir. Elle est surtout relative et faite d'humiliation et de privation. (TOURETTE, Florence. Extrme pauvret et droits de l'homme. Paris: LGDJ, 2001, p. 4). Quer o INSS, ora Reclamante, se considere ser a definio do benefcio concedido pela sentena reclamada incompatvel com o quanto decidido na Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.232. No o que se tem no caso. Tambm afirma que haveria incompatibilidade entre aquela deciso e a norma do 3 do art. 20 da Lei n. 8.742/93. Afirmo: e a misria constatada pelo juiz incompatvel com a dignidade da pessoa humana, princpio garantido no art. 1, inc. III, da Constituio da Repblica; e a poltica definida a ignorar a miserabilidade de brasileiros incompatvel com os princpios postos no art. 3 e seus incisos da Constituio; e a negativa do Poder Judicirio em reconhecer, no caso concreto, a situao comprovada e as alternativas que a Constituio oferece para no deixar morrer mingua algum brasileiro incompatvel com a garantia da jurisdio, a todos assegurada como direito fundamental (art. 5, inc. XXXV, da Constituio da Repblica). Portanto, no apenas no se comprova afronta autoridade de deciso do Supremo Tribunal na sentena proferida, como, ainda, foi exatamente para dar cumprimento Constituio da Repblica, de que guarda este Tribunal, que se exarou a sentena na forma que se pode verificar at aqui. Ademais, a Reclamao no espcie adequada para se questionar sentena na forma indicada na petio, o que haver de ser feito, se assim entender conveniente ou necessrio o Reclamante, pelas vias

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    RCL 4374 / PE

    recursais ordinrias e no se valendo desta via excepcional para pr em questo o que haver de ser suprido, judicialmente, pelas instncias recursais regularmente chamadas, se for o caso. 9. Por essas razes, casso a liminar deferida anteriormente, em sede de exame prvio, e nego seguimento Reclamao por inexistir, na espcie, a alegada afronta autoridade de julgado deste Supremo Tribunal Federal que pudesse ser questionada e decidida por esta via especial e acanhada, como a da espcie eleita pelo Reclamante. (...).

    O exame atento de todo esse contexto me levou a muito refletir sobre o tema, o que culminou em deciso proferida nesta Reclamao, em 1 de fevereiro de 2007, na qual revi muitos posicionamentos antes adotados e passei a indeferir as pretenses cautelares do INSS, mantendo as decises de primeira instncia que concediam o benefcio assistencial em situaes de patente miserabilidade social. Eis alguns trechos elucidativos da referida deciso:

    A anlise dessas decises me leva a crer que, paulatinamente, a interpretao da Lei n 8.742/93 em face da Constituio vem sofrendo cmbios substanciais neste Tribunal.

    De fato, no se pode negar que a supervenincia de legislao que estabeleceu novos critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais como a Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei n. 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei n. 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei n. 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas; assim como o Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03) est a revelar que o prprio legislador tem reinterpretado o art. 203 da Constituio da Repblica.

    Os inmeros casos concretos que so objeto do conhecimento dos juzes e tribunais por todo o pas, e chegam a este Tribunal pela via da reclamao ou do recurso

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    recursais ordinrias e no se valendo desta via excepcional para pr em questo o que haver de ser suprido, judicialmente, pelas instncias recursais regularmente chamadas, se for o caso. 9. Por essas razes, casso a liminar deferida anteriormente, em sede de exame prvio, e nego seguimento Reclamao por inexistir, na espcie, a alegada afronta autoridade de julgado deste Supremo Tribunal Federal que pudesse ser questionada e decidida por esta via especial e acanhada, como a da espcie eleita pelo Reclamante. (...).

    O exame atento de todo esse contexto me levou a muito refletir sobre o tema, o que culminou em deciso proferida nesta Reclamao, em 1 de fevereiro de 2007, na qual revi muitos posicionamentos antes adotados e passei a indeferir as pretenses cautelares do INSS, mantendo as decises de primeira instncia que concediam o benefcio assistencial em situaes de patente miserabilidade social. Eis alguns trechos elucidativos da referida deciso:

    A anlise dessas decises me leva a crer que, paulatinamente, a interpretao da Lei n 8.742/93 em face da Constituio vem sofrendo cmbios substanciais neste Tribunal.

    De fato, no se pode negar que a supervenincia de legislao que estabeleceu novos critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais como a Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Famlia; a Lei n. 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso Alimentao; a Lei n. 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei n. 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municpios que institurem programas de garantia de renda mnima associados a aes socioeducativas; assim como o Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03) est a revelar que o prprio legislador tem reinterpretado o art. 203 da Constituio da Repblica.

    Os inmeros casos concretos que so objeto do conhecimento dos juzes e tribunais por todo o pas, e chegam a este Tribunal pela via da reclamao ou do recurso

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    RCL 4374 / PE

    extraordinrio, tm demonstrado que os critrios objetivos estabelecidos pela Lei n 8.742/93 so insuficientes para atestar que o idoso ou o deficiente no possuem meios de prover prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. Constatada tal insuficincia, os juzes e tribunais nada mais tm feito do que comprovar a condio de miserabilidade do indivduo que pleiteia o benefcio por outros meios de prova.

    No se declara a inconstitucionalidade do art. 20, 3o, da Lei n 8.742/93, mas apenas se reconhece a possibilidade de que esse parmetro objetivo seja conjugado, no caso concreto, com outros fatores indicativos do estado de penria do cidado. Em alguns casos, procede-se interpretao sistemtica da legislao superveniente que estabelece critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais.

    Tudo indica que como parecem ter anunciado as recentes decises proferidas neste Tribunal (acima citadas) tais julgados poderiam perfeitamente se compatibilizar com o contedo decisrio da ADI n. 1.232.

    Em verdade, como ressaltou a Ministra Crmen Lcia, a constitucionalidade da norma legal, assim, no significa a inconstitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, Constituio, garantidora do princpio da dignidade humana e do direito sade, e obrigao estatal de prestar a assistncia social a quem dela necessitar, independentemente da contribuio seguridade social, tenham de definir aquele pagamento diante da constatao da necessidade da pessoa portadora de deficincia ou do idoso que no possa prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. (Rcl n. 3.805/SP, DJ 18.10.2006).

    Portanto, mantendo-se firme o posicionamento do

    Tribunal em relao constitucionalidade do 3o do art. 20 da Lei n 8.742/93, tal como esposado no julgamento da ADI 1.232, o mesmo no se poderia afirmar em relao ao que decidido na Rcl AgR 2.303/RS, Rel. Min. Ellen Gracie (DJ 1.4.2005).

    O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critrio de 1/4 do salrio mnimo pode ser conjugado com

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    RCL 4374 / PE

    extraordinrio, tm demonstrado que os critrios objetivos estabelecidos pela Lei n 8.742/93 so insuficientes para atestar que o idoso ou o deficiente no possuem meios de prover prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. Constatada tal insuficincia, os juzes e tribunais nada mais tm feito do que comprovar a condio de miserabilidade do indivduo que pleiteia o benefcio por outros meios de prova.

    No se declara a inconstitucionalidade do art. 20, 3o, da Lei n 8.742/93, mas apenas se reconhece a possibilidade de que esse parmetro objetivo seja conjugado, no caso concreto, com outros fatores indicativos do estado de penria do cidado. Em alguns casos, procede-se interpretao sistemtica da legislao superveniente que estabelece critrios mais elsticos para a concesso de outros benefcios assistenciais.

    Tudo indica que como parecem ter anunciado as recentes decises proferidas neste Tribunal (acima citadas) tais julgados poderiam perfeitamente se compatibilizar com o contedo decisrio da ADI n. 1.232.

    Em verdade, como ressaltou a Ministra Crmen Lcia, a constitucionalidade da norma legal, assim, no significa a inconstitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, Constituio, garantidora do princpio da dignidade humana e do direito sade, e obrigao estatal de prestar a assistncia social a quem dela necessitar, independentemente da contribuio seguridade social, tenham de definir aquele pagamento diante da constatao da necessidade da pessoa portadora de deficincia ou do idoso que no possa prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia. (Rcl n. 3.805/SP, DJ 18.10.2006).

    Portanto, mantendo-se firme o posicionamento do

    Tribunal em relao constitucionalidade do 3o do art. 20 da Lei n 8.742/93, tal como esposado no julgamento da ADI 1.232, o mesmo no se poderia afirmar em relao ao que decidido na Rcl AgR 2.303/RS, Rel. Min. Ellen Gracie (DJ 1.4.2005).

    O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critrio de 1/4 do salrio mnimo pode ser conjugado com

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884891.

    Inteiro Teor do Acrdo - Pgina 19 de 75

  • Voto - MIN. GILMAR MENDES

    RCL 4374 / PE

    outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivduo e de sua famlia para concesso do benefcio assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituio.

    Entendimento contrrio, ou seja, no sentido da manuteno da deciso proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao

    menos a inconstitucionalidade por omisso do 3o do art. 20 da Lei n. 8.742/93, diante da insuficincia de critrios para se aferir se o deficiente ou o idoso no possuem meios de prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia, como exige o art. 203, inciso V, da Constituio.

    A meu ver, toda essa reinterpretao do art. 203 da Constituio, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de

    inconstitucionalizao do 3o do art. 20 da Lei n. 8.742/93.Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, certo

    que o Plenrio do Tribunal ter que enfrent-lo novamente. Ademais, o prprio carter alimentar do benefcio em

    referncia torna injustificada a alegada urgncia da pretenso cautelar em casos como este.

    Ante o exposto, indefiro o pedido de medida liminar.

    Aps essa deciso, o nmero de reclamaes ajuizadas pelo INSS no STF caiu abruptamente, chegando a observar-se, tempos depois, a quase inexistncia de novos pedidos no protocolo do Tribunal. Mas o trnsito dos recursos extraordinrios permaneceu inalterado.

    Em 9 de fevereiro de 2008, o Tribunal reconheceu, no mbito do RE 567.985 (Rel. Min. Marco Aurlio), a existncia de repercusso geral da questo constitucional relativa concesso do benefcio assistencial previsto no art. 203, V, da Constituio, deciso cuja ementa possui o seguinte teor (DJe 10.4.2008):

    REPERCUSSO GERAL BENEFCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAO CONTINUADA - IDOSO RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALRIO MNIMO ARTIGO 203, INCISO V, DA CONSTITUIO FEDERAL.

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 3884891.

    Supremo Tribunal Federal

    RCL 4374 / PE

    outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivduo e de sua famlia para concesso do benefcio assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituio.

    Entendimento contrrio, ou seja, no sentido da manuteno da deciso proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao

    menos a inconstitucionalidade por omisso do 3o do art. 20 da Lei n. 8.742/93, diante da insuficincia de critrios para se aferir se o deficiente ou o idoso no possuem meios de prover a prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia, como exige o art. 203, inciso V, da Constituio.

    A meu ver, toda essa reinterpretao do art. 203 da Constituio, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de

    inconstitucionalizao do 3o do art. 20 da Lei n. 8.742/93.Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, certo

    que o Plenrio do Tribunal ter que enfrent-lo novamente. Ademais, o prprio carter alimentar do benefcio em

    referncia torna injustificada a alegada urgncia da pretenso cautelar em casos como este.

    Ante o exposto, indefiro o pedido de medida liminar.

    Aps essa deciso, o nmero de reclamaes ajuizadas pelo INSS no STF caiu abruptamente, chegando a observar-se, tempos depois, a quase inexistncia de novos pedidos no protocolo do Tribunal. Mas o trnsito dos recursos extraordinrios permaneceu inalterado.

    Em 9 de fevereiro de 2008, o Tribunal reconheceu, no mbito do RE 567.985 (Rel. Min. Marco Aurlio), a existncia de repercusso geral da questo constitucional re