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8/18/2019 Quem é o brasileiro
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Sín tese N 9 42 (19 88) - Pag. 61 -7 8
QU E M É O B R A S I L E I R O?
E M B US CA D A I D E N T I D A D E N A C I O N A L *
An tôn io R ibe i ro de A lme ida
1.
Perspectivas
Colocar as questões da busca da ident idade de um povo, do cará ter
n a c i o n a l , das carac ter ís t icas nac iona is , da persona l idade bás ica e da
persona l idade m oda l é en t ra r nu m a á rea de es tudos l im í t r o fe s en t re a
F i l o s o f i a , a Ps ico log ia , a Soc io log ia e An t ropo log ia onde esses conce i
tos su rg i ram e in te ragem numa in te rdependênc ia rea l mas pouco es
c la rec ida .
( V e r , p o r e x e m p l o , M o n t e s q u i e u ( 1 9 8 5 ) , O r t e g a y G a ss et
( 1 9 6 7 ) , T o y n b e e ( 1 9 7 4 ) , F r o m m ( 1 9 4 1 ) , K l i n e b e r g ( 1 9 6 3 ) , K a r d i n e r
( 1 9 4 8 ) ,
K a r d i n e r, L i n t o n , D u B o i s e W e s t ( 1 9 4 5 ) , L é v i - S t ra u s s ( 1 9 8 1 ) ,
Er ic lcson (196 8) e M on te ro (1 96 8) .
Es ta busca pode ser desdobrada num sem número de questões . Mas
e is a lgumas que co lo qu e i pa ra um a ten ta t i va de respos ta ; Q ue m é o
Bras i le i ro? A questão da ident idade do bras i le i ro passa pe la questão
d a f o r m a ç ã o d a s ua c o n s c iê n c ia ? E x i s t e m , n a i n t e i l i g e n t s i a r e si st ên
c ias ao es tudo da ident idade nac iona l?
A ques tão Q u e m é o B ras i le i ro ? é um a ques tão rad ica l e sua o r ige m
é f i l o s ó f i c a . N a P s ic o lo g ia e la t e r i a , n o m á x i m o , a a c o l h i d a n u m a Psi
co log ia da Compreensão , como a de Spranger (1976) que admi t ia a
ex is tênc ia de t i pos idea is . Es ta l im i tação não imped iu , en t re tan to ,
q u e A d o r n o c o l o c a s s e u m a q u e s t ã o s e m e l h a n t e , e m 1 9 6 5 , n u m a r t i g o
p u b l i c a d o n a r e vi st a L i b e r a l e q u e r ec e b eu o t í t u l o de Q u e és
a le m án ? . Com o p roce dem os fen om en ó lo go s é p rec iso acerca r-se da
p e r g u n t a e e x a m i n á - la m a i s d e p e r t o . A s s i m , a p a la v r a b r a s i l e i r o
tem um a h is tó r ia m u i t o b reve em nossa l í ng ua . O ad je t i vo b ra s i le i
ro fo i d i c iona r i zado po r Mora is , segundo Cunha . (Ve r
D ic ionáio
* Conferência na XVII Reunião Anual da Socied ade de Psicologia de Ribeirão Preto SP)
em Outubro de 1987.
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Et imo lóg ico da Lígua Po r tu gue sa , 1 9 8 2 ) , s o m e n t e em t o r n o de
1 8 3 3 .
É p o s s í v e l , c o n t u d o , que ele tenha s ido usado bem an tes no
m e i o do p o v o com o u t r o s a d j e t i v o s c o n c o r r e n t e s a n t e s de se f i x a r de
f i n i t i v a m e n t e c o m o n o r m a c u l t a . C u r i o s o é reg is t ra r o s i g n i f i c a d o de
a lgumas pa lavras der ivadas de b r a s i l e i r o . M o r a is ( 1 9 5 0 ) in d i c a os
segu i n tes :
1.
Bras i le i resco
-
g r a n d i o s o , p r i n c ip e s c o . C a m i l o ,
nos
seus
Éeos Hu m orít icos ,
esc r eve : .. . era um r o m â n t i c o c h e io de ju l ie tas e
pr o j e tos b r as i l e i r escos . ' Já o s u b s t a n t i v o b r a s i l e i r i c e q u e r d i z e r
e s t a d o do que é l a n g u i d o , d e n g u i c e . A ps ico logia destas palavras
p o d e r e f l e t i r t o d a uma v isão do n o s s o c a r á t e r t r a n s m i t i d a , em P o r t u
ga l ,
p e lo s b r a s i l e i r o s , i s to é, po r tugueses que v o l t a v a m r ic o s à te r r a .
O u t r a p o s s í v e l f o n t e p o d e ser a de v i a j an tes i l us t r es , c o m o Jean Bap-
t i s te Debr e t . ( Ve j a sua
V i agem P i to r esca e H is tór ica ao Brasil,
espe
c i a l m e n t e as p a g s . 1 6 2 - 1 6 3 ) ou a in d a T h o m a s E w b a n k na sua
V i da
no Brasil. Es tes i lus t r es v i a j an tes con s i de r a m b r a s i l e i r o apenas o
h o m e m b r a n c o , e o u t r a é a descr ição que f a z e m do ca r á te r do m u l a
t o , do n e g r o e do i n d í g e n a , a l i á s , m u i t o n e g a t i v a , É, sem d ú v i d a , a
per cepção de uma e l i t e .
A p e r g u n t a q u e m é .. . se vo l ta pa r a o b ras i le i ro idea l , para a sua
' i d é i a , e não para um b r as i l e i r o pa r t i cu l a r . Ela nos i n c o r p o r a e nos
u l t rapassa num m o v i m e n t o que l e m b r a o d i a l é t i c o . É uma p e r g u n t a
h i s t ó r i c a ,
que por sua
na tu r eza soc i a l ,
tem uma
d i n â m i c a p r ó p r i a
m u i t o d i v e r s a da p e r g u n t a por o u t r o s c o n c e i t o s que, uma vez r e s p o n
d i d o s ,
fazem cessa r toda cu r i os i dade . — Se a l g u é m , por e x e m p l o , p er
g u n t a q u e m é o e s c r i t o r ? e o b t é m a resposta Eça de Q u e i r ó s não
p e r g u n t a r á m a i s . C o n c e i t o s de n a t u r e z a s o cia l c o m o b r a s i l e i r o , ju
d e u ,
t u r c o , i ta l i a n o , j a p o n ê s , r u ss o , a m e r i c a n o s u p o r t a m s e m p r e
novas perguntas e um m e s m o Ss p o d e dar respostas d i fe ren tes de
a c o r d o com d i fe ren tes fases de sua v i d a . A i d é i a que t e n h o , h o j e ,
d e - j u d e u
não é a
m e s m a
que
p o s s u í a
nos
m e u s a n o s in f a n t i s . A d o r
no a le r ta para o per igo que es ta pe r gu n ta po de h i pos tas i a r uma es
s ê n c i a c o l e t i v a
e
c o n d u z i r
a uma
c o n s c i ê n c i a c o i s i f i c a d o r a .
Se
is to
a c o n t e c e r t e m o s os e s t e r e ó t i p o s e os p r é - c o n c e i t o s . Daí a c r í t i c a de
que pesqu isas re fe ren tes a nac iona l idades, raças , sexos, re l ig iões , são
pesqu isas sobre es tereó t ipos , e, p o r t a n t o , com p o u c a ou quase nenhu
m a v a l i d a d e . P a r t i c u l a r m e n t e a c r e d i t o que pesqu isas como es ta c o n
t é m s e m p r e um k e r n e l of t r u t h e m e r e c e m ser real izadas, desde
que am par adas num m é t o d o c o n f i á v e l .
A s s i m p e n s a v a A d o r n o que e x a m i n a n d o a h i s t ó r i a da sua consc iênc ia
pa r t i u pa r a uma a r r o j ada i nves t i gação sob r e Que és a l e m á n ? . A sua
e x p e r i ê n c i a de v i ve r nos E s t a d o s U n i d o s a g u d i z o u , num ce r to sen t i -
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d o , a p r o b l e m á t i c a d a i d e n t i d a d e n a c i o n a l , É e s t e u m f a t o m u i t o c u
r i o s o .
E u t a m b é m e x p e r i m e n t e i i s to q u a n d o v i v i n o e x t e r i o r e n u n c a
fu i m a is b ras i le i ro do q ue naqu e la ép oca . O a r t i go de A d o rn o fo i es
c r i to l ogo após seu re t o r no à A lem an ha . E le não escapa d o que
m u i
tos podem d izer de es tereo t ipar seu pa ís . Ao descrever o p razer de
reen con t ra r sua l í ng ua ge rm ân ica , que segundo e le . . . possui um a
no tó r ia a f in id ade e le t i va c om a f i l os o f ia . . . e que se to rn a ap ta pa ra
expressar a respe i to dos fenômenos a lgo que não se esgota na sua po-
s i t iv i d a d e o u c a r á te r de d a d o . É a i n d a m u i t o s i g n i f i c a t iv a a d e s c ri çã o
q u e A d o r n o f az d a s e ri ed a de a l e m ã , s u s c it a da p e l o p a t h o s d o A b s o
l u t o e q u e e x p l i c a o a p a r e c i m e n t o d e u m A d o l f H i t i e r . J á o p a t h o s
i t a l i a n o t o m a a f o r m a , n o F a s c i s m o , d e u m a o p e r e t a b u f a . A d o r n o
não fecha a ques tão Q u e és a le m án ? e ence r ra seu a r t i go de um a
fo rm a que con s ide ro ro m ân t i ca ao escreve r . . . ap re nde m os o sen t ido
q u e ,
t o d a v i a , p o d e a f i r m a r e ste c o n c e i t o a l e m ã o : o p ass o p a ra a h u
m an ida de . Se A d o rn o fez a pe rg un ta e o fe rece um a sé rie de respos
tas porque não se pode também fazê- la para o b ras i le i ro? Para mim é
dese jável e poss íve l a fo rm u la çã o da pe rgun ta Q u e m é o B ras i le i ro ?
t a n t o a o n í v e l d a c o n s c i ê n c ia f e n o m e n o l o g i c a c o m o a o n í v e l d e u m a
c o n s u l t a a o u t r o s S s , p e s q u i s a e x p e r i m e n t a l , q u e p e r m i t a a f u n d a
me n tação de um a o b je t i v id ad e . Ressa lto apenas que a cada ge ração
cabe fo rmu la r a pe rgun ta e encon t ra r pa ra e la uma respos ta . Não há
meios de se escapar a es te t raba lho de Sís i fo .
A segunda que stão qu e co loq ue i passa pe la ide nt id ad e e sua fo rm aç ão
na consc iênc ia . Não me cabe , nos l im i te s des te a r t i g o , ex p lo ra r a
ques tão da consc iênc ia . Bas te , ta l vez , apon ta r o p rob lema da cons
c iênc ia como um dos ma is comp lexos e ex tensos da F i loso f ia e da
P s i c o l o g i a . D e s t a c o a l g u n s m o m e n t o s d e s t e p r o b l e m a . H á , p r i m e i r o ,
t o d a u m a ve rs ão m e t a f í s i c a c o m S t . A g o s t i n h o q u e m u i t o a n te s d e
Desca r tes ap resen ta o Cog i to . (V ide
D e
Trinitate, X , 1 0 - 1 4 ) c o m o
f u n d a m e n t o d a e x i s t ê n c i a . P o s t e r i o r m e n t e , e m D e s ca r te s , n o
Discur
so sob re o Méodo
c o n s c i ê n c i a f u n d a m e n t a r i a t a m b é m a e x i s t ê n c i a
n o f a m o s o p r i n c í p i o
Co g i to e rgo sum .
Na Ps ico log ia o conce i to ganhar ia nova fo rmu lação com F . Bren tano ,
que segundo Penna (1978) , de f ine a consc iênc ia pe la in tenc iona l ida -
de , is to é , pe la re fe rênc ia ou re lação a u m o b je to , seja e le m en ta l ,
i m a n e n t e o u i n t e n c i o n a l . C o m o P r a g m a t i s m o d e W i l l i a m J a m e s e o
Behav io r i smo de Watson e Sk inne r há uma negação da ex is tênc ia da
c o n s c i ê n c i a , e m b o r a , a t u a l m e n t e , o p r ó p r i o B e h a v i o r i s m o t e n h a r e v i s
to sua pos ição rad ica l e ace i te a ex is tênc ia da mesma.
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A Ps icaná lise dá ex t r e m a i m po r tâ nc i a ao es tu do da cons c i ênc i a . F r eud
ao longo de sua obra , desde o P r o j e to de um a Ps i co log i a , de 18 95 , a té
O Eg o e o Idúe 19 23 d i scu te a fu nç ão da con sc i ênc i a , seja na fo r m a
ção do cará ter , nas neuroses e na técn ica te rapêut ica . A consc iênc ia
t e m , e m F r e u d , u m p a p e l e x t r e m a m e n t e i m p o r t a n t e n o p ro c es s o d e
i d e n t i f i c a çã o , po i s é e la que t o r na poss í ve l a a l guém se r econhece r
com o pe r tencen te a um a de te r m i nada ca tego r i a de pessoas , com o,
p o r e x e m p l o , b r a s i l e i r o , p s i c ó lo g o , b u rg u ê s , e t c . U m e x e m p l o d i s to
vem de F r eu d . E r nes t Jones na sua V i dae O b ra de S . F reud escv& /e
sob r e a i den t i dade nac i ona l de F r eud :
Ele se sen t ia judeu a té o ma is p ro fundo do seu ser , e , is to ev iden temente ,
s ign i f icou m u i to para e le . T in ha um a sens ib i l idade exagerada , co m um aos
jude us, ao ma is leve in d íc io de an t isem i t ismo e teve pouc os amigos que
não fossem jud eu s. (E . Jones, vo l . I, pag . 33 )
F r e u d se c h a m a j u d e u n u m a c a r t a m u i t o l in d a q u e e s cre ve u a O s k a r
P f i s te r e na qua l pe r gu n ta :
Por que t ive ram que espera r que um judeu comple tamente a teu f izesse
estas descobertas?
Nou t r a ca r ta d i r i g i da a Ab r aham esc l a r ece com o v i a a ques tão de t r a
ba lhar com out ras pessoas:
Cre io que nós, judeus, se qu ise rmos cooperar de a lguma fo rma com ou
tras pessoas, temos que desenvolver uma pequena dose de masoquismo e
estar d ispostos a suportar certo grau de in just iça. Não existe outra maneira
de coop erar e t rab alh ar jun to s. Pode você estar certo de que se eu me
cha
masse Oberhuber, minhas novas idé ias, apesar de todos estes fa tores ter iam
en con t rad o m u i to me nos res is tên c ia . (Car ta de 23 de agosto de 1908 ,
apud Jones, vo l . ü , pag . 215)
Posso conc l u i r , des tes exem p l o , que F r eud va l o r i zava sua i den t i dade
j u d a i c a e i s t o i n f l u e n c i o u s ua o b r a c o m o t a m b é m o m a n t e v e s o l id á r i o
ao seu po vo a té o f ina l de sua v i d a . U m e s t u d o d a f o r m a ç ã o d a c o n s
c i ênc i a e da i den t i dade nac i ona l , t em , po r tan to , na Ps i caná l i se , um a
t e o r i a q u e o f e re c e i n ú m e r o s p r i n c í p i o s e i n s i g h t s q u e m e r e c e m ser
cons i de r ados .
A P s ic o lo g ia d o M a t e r ia l i s m o D i a l é t i c o t a m b é m c o n t r i b u i u m u i t o
para os estudos sobre as bases mater ia is e h is tór icas sobre as quais se
forma a consc iênc ia de c lasse . Nesta d i reção es tão os es tudos dos ps i -
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c ó l o g o s r u s s o s L . S . V y g o t s k y e A l e x a n d e r E . L u r i a ( 1 9 8 4 , 1 9 7 7 ) .
N ã o o b s e r v e i, c o n t u d o , n as s ua s o b r a s , p re o c u p a ç õ e s c o m o p r o b l e m a
d a id e n t id a d e n a c i o n a l . O M a r x i s m o , e n q u a n t o p r á x i s p o l í t i c a , t e m
a m pl o in teresse nos es tudo s que se v o l t e m para a co nsc iênc ia de c lasse e
a i den t idad e de c lasse . O r t i z (1 98 5) em C u l t u ra B ras i l e ira & Id en t i
d a d e N a c i o n a l e sc re ve q u e . . . o M a r x i s m o c lá s s ic o d e m o n s t r o u
p o u c o i n t e r e s s e n o e s t u d o d a p r o b l e m á t i c a q u e e s t a m o s c o n s i d e r a n
d o . A r az ã o d i s t o r e s i d a , t a l v e z , n o f a t o d e q u e c o n c e i t o s c o m o n a
ç ã o , p o v o s ão i n s u f ic i e n t e s e / o u o b s c u r e c e m , n o M a r x i s m o , o
con f l i t o de c lasses . A p rob lemát i ca nac iona l é re je i tada por Marx no
t e x t o A p r o p ô s d u S y s tè m e n a t i o n a l d ' e c o n o m i e p o l i t i q u e d e F r ie -
d e r ic h L i s t - V e r O e u v re s I I I , G a i l i m a r d , 1 9 8 2 q u a n d o d i z t e x t u a l
m e n t e :
A naciona l idade do trab alha do r não é francesa, inglesa, a lem ã, e la é o
t ra
balho, a escrav idão l iv re, o t ra ' f ico de s i mesmo. Seu governo não é francês,
inglês ou alemão, é o capital . O ar que ele respira não é o ar francês, inglês
ou alem ão, é o ar das fá br ic as . (pag. 1 435 )
S e g u n d o O r t i z ( 1 9 8 5 ) a q u e s t ã o d a i d e n t i d a d e n a c i o n a l , d e n t r o d o
M a r x i s m o , f o i v a l o r iz a d a p o r G r a m s c i n a s u a o b r a C a d e r n o s d o C á r
ce re . O u t ro pensador que ta m b é m reg is t ra es ta l acuma é G . Lukacs
n o t e x t o L a C o n s c ie n c e d e C l a s s e a o d i z e r : É u m a i n f e l i c i d a d e ,
p a ra a te o r i a c o m o p a r a a p r á x i s d o p r o l e t a r i a d o q u e a o b r a p r i n c i p a l
d e M a r x t e n h a se d e t i d o j u s t a m e n t e n o m o m e n t o q u e e le a b o r d a a
de te rminação das c lasses .
O u t r o s e ve ro c r í t i c o d e s t e v ié s n o M a r x i s m o é T o y n b e e ( 1 9 7 4 ) q u e
não cons idera as lea ldades in ternac ionais de c lasse mais poderosas do
q u e a i d e n t i d a d e n a c i o n a l . T u d o i n d i c a , p o r t a n t o , q u e a q u e s t ã o d a
i d e n t i d a d e n a c i o n a l é u m a q u e s t ã o a b e r t a d e n t r o d o M a r x i s m o q u e
t e m e x p e r i n n e n t a d o , d o p o n t o d e v i s t a h i s t ó r i c o , v á ria s d e r r o t a s d o
seu pressuposto de consc iênc ia de c lasse f rente aos nac ional ismos.
E x e m p l o s d i s t o e s t ão n a P o l ô n i a , na lu g u s i á vi a e A l e m a n h a O r i e n t a l .
Seria este u m caso em qu e a do u t r i na p o l í t i ca t e n to u se sob rep or à
P s ic o lo g ia D i a l é ti c a M a t e r i a l i s t a q u e p o d e - f o r n e c e r u m i n s t r u m e n t a l
m e t o d o l ó g i c o m a is a d e q u a d o p a r a a c o m p r e e n s ã o d o p r o b l e m a ? P o r
que a i den t idade nac iona l res is te à ex t i n çã o e é tão fo r te m esm o nos
países social is tas e parece mais for te que a consciência de c lasse?
Pergun te -se , po r exemplo , como cada pessoa cons t ró i sua i den t idade?
A expe r iênc ia m ed iada pe ta li ngu age m , pe la cu l tu ra na c io na l , pe los
s í m b o l o s p á t r i o s , a h i s t ó r i a p á t r i a , c h e g a m p r i m e i r o à c o n s c i ê n c i a pa -
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ra a fo r m aç ão da i de n t i da de nac ion a l do que os e lem ento s que v êe m ,
m a is ta r de , f o r m ar um a c ons c iênc ia de c las s e . P ar t i c u la r m ente s us pe i
to qu e e x is te m , nu m me sm o Ss, m ui ta s consc iênc ias de c lasses. E la
ser ia , n e s t e s e n t i d o , p l u r i - d i m e n s i o n a l . S o m e n t e e m a l g u n s p o u c o s
m o m e n t o s c r í t i c o s é q u e e l a s e r i a ú n i c a .
O u t r a p e r g u n t a c a b e a q u i . Q u e m c o n s t r ó i a i d e n t i d a d e n a c i o n a l ? N a
c o n s t r u ç ã o d a i d e n t i d a d e n a c i o n a l o c o r r e u m a d i s p u t a da s i n s t i t u i
ç ões que pos s uem d i fe r e n te s m od e los do h o m e m . Elas s ão a Ig r e ja , o
E s ta do , a F a m í l i a , os P ar t i dos P o l í t i c os , as c i v i l iz aç õ es , e t c . E stes m o
d e l o s t ê m e x p e r i m e n t a d o , a o l o n g o d a h i s t ó r i a d e u m a n a çã o m u i t a s
t r a n s f o r m a ç õ e s e c o n s e g u e m se i m p o r a pe n a s s e t o r i a l m e n t e . A i d e n t i
dade nac iona l s e r i a a inda o r es u l tado da c om b inaç ão des s es m ode los
a b s t r a to s q u e o p e r a m s o b r e o h o m e m c o n c r e t o . D e s ta f o r m a , u m a
pos s í ve l m a ne i r a de se c om pr ee nd er o b r as i l e i r o e s eus padr ões c o m -
p o r t a m e n t a i s p e d e , n e c e s s a r i a m e n t e , u m e s t u d o p r o f u n d o d a s ins t i
t u i ç õe s c it adas . C om o o b r as i l e i r o é o r i g iná r io da c i v i l iz aç ã o l us itana
o es tudo do Es tado Por tuguês prec isa ser fe i to . Suspei to que nossos
pais por tugueses passaram para nós , nos anos do Bras i l Co lôn ia , uma
s é r i e d e p r o b l e m a s d e i d e n t i d a d e n a c i o n a l . S c h w a r t z m a n ( 1 9 8 2 ) é u m
dos p ou c os es tud ios os nes ta d i r eç ão e m os t r a m u i t o b em as r a í zes do
au to r i t a r i s m o que s em p r e fo i um a c on s tan te na v ida de P or tuga l e na
nossa.
H á q u e e n t e n d e r o n o ss o a u t o r i t a r i s m o — t ã o d i f e r e n t e d o
am er i c a no , po r ex e m p lo - es tudando- s e a fo r m aç ão de P or tuga l e as
d i f i c u lda de s qu e t i v e r a m os l us os de fo r j a r sua i den t i dade na c ion a l .
B em s abem os q ue a P en íns u la Ibé r i c a fo i um c o r r ed or , e , po r e la des
c e r am os Godos , A lem anos e s ub i r am os Á r abes a té os P i r i neus . P or
t u g a l ,
for jada após a H ispania , logo teve que ape lar para um poder
c e n t r a l i z ad o par a m an te r s ua un id ade f r e n t e aos am b ic ios o s es pa
n h ó i s . P o r o u t r o l a d o , o se u t a r d i o a p a r e c i m e n t o na E u r o p a - f o i u m
d o s ú l t i m o s E s t a d o s a se c o n s t i t u i r - p o d e , p r o v a v e l m e n t e , e x p l i c a r
a t é u m c e r t o s e n t i m e n t o d e i n f e r i o r i d a d e d o s p o r t u g u e s e s c o m re la
ç ão a ou t r os pov os . Cam ões j á r eg i s t r ou es te s en t im en to po r v o l ta de
1 5 7 2 n o s O s L u s í a d a s :
F a z e i , Senhor, que nunca os admirados
Alemães, Gaios, í ta los e Ingleses,
possam dizer que são pera
mandados
Mais que pera mandar, os Por tugueses .
(Canto X, 152)
Eis a í u m a in teressante l inha d e pesquisa a ser des env o lv ida po r um a
P s ic o log ia da H is t ó r i a : os anos de fo r m aç ão de P or tuga l e s ua i n f l uê n-
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c ia sobre o Bras i l es tudando-se e m qu e m ed ida os por tugu eses nos
passa r am seus p r ob l em as de au to r i t a r i sm o , i n fe r i o r i dade e be l e t r i sm o .
No Br as i l t em os t i do m agn í f i cos es tudos sob r e a ques tão da i den t i da
de nac iona l por par te de soc ió logos, f i l óso fos , ensa ís tas e escr i to res .
Em a r t i go que pub l i que i em 1985 cons i de r e i que o tem a não é de ex
c l u s iv i d a d e de p s i c ó lo g o s e q u e ó t i m o s i n s i g h t s s o b r e o p r o b l e m a
aparecem nas obras des tes espec ia l i s tas . C i to o pouco conhec ido e
d i v u l g a d o l i v r o d e Á l v a r o V i e i r a P i n t o C on sc iência e R ea l ida de Nacio
na l
de 196 0 , m ar co dos es tudos i seb ianos , e que pe r m an ece um a o b r a
de l e i t u r a ob r i ga tó r i a pa r a quem quer com pr eender o b r as i l e i r o .
Macu n a ima ,
de M ár io de A n dr ad e, é o u t ra obra c láss ica nes ta á rea de
es tudos . E l a su po r ta , do m eu po n to de v i s ta , vá r ias l e i t u r a s . Um a
das possíve is le i turas ser ia a ps ico-socia l e que está para ser f e i t a . T e n
t ou M ár i o r e t r a ta r o b r as i l e i r o no seu he r ó i sem nenhum ca r á te r ? A
d iscussão sobre es ta in te rpre tação vem da época em que o escr i to r e ra
v i vo e e l e negou es te ob j e t i vo . M as naque l a r apsód i a não ten tou o
a u t o r n o s a d m o e s t a r ju s t a m e n t e c o n t r a o a n t i - h e r ó i q u e n ã o p o d e m o s
ser? Is to é , ma landro , anc ioso de se l i v ra r de sua negr i tude? Macuna i
m a te m u m f i m t r ág i c o . E l e é Ve nc i d o pe l a na tu r ez a — a saúva — e
sem saúde fo i ' banza r so l i t á r i o no cam po vas to do céu .
N o e s t u d o e x p e r i m e n t a l q u e r e a l i z e i c o m M u c c i l o , M e l l o e C a n h o s ,
nu m a am os t r a de Ss de R i be i r ão Pr e to e Ja ú , ve r i f i qu e i a ace i tação de
t r aços ps i co - soc i a i s apon tados po r au to r es com o G i l be r to F r ey r e e
Sérg io B. de Ho landa. Atua lmente , g raças às sessões técn icas que fo
ram rea l i zadas desde 1983 nas Reun iões Anua is da SPRP, a ps ico log ia
bras i le i ra d ispõe de um número grande de pesqu isas sobre o b ras i le i ro
c o n d u z i d a s p o r e s t e a u t o r , J o s é A u g u s t o D e l a C o l e t a , — A r o l d o R o
d r i g u e s , M a r i a A l i c e D ' A m o r i m , Á l v a r o T a m a y o , A n g e l a B i a g g i o e
Car l os Am ér i co Pe r e i r a .
A c r e d i t o , f i n a l m e n t e , q u e f i c o u e x a u s t i v a m e n t e d e m o n s t r a d o q u e o
es tud o da i d en t i d ad e na c i ona l é fun da m en ta l pa r a o b r as i l e i r o , sob r e
tudo nes ta época c r í t i ca da nossa H i s tó r i a . Ago r a , e l e pode se r f e i t o
s em o s r is c os q u e a c o m p a n h a v a m o N a c i o n a l is m o e o E t n o c e n t r i s m o
das décadas de 30.
A H i s tó r i a te m de m on s t r a do o pape l da i den t i dad e nac i ona l na sob r e
v i vênc i a de um Povo m esm o que e l e não d i sponha de um te r r i t ó r i o
seu. O p o v o j u d e u é u m b o m e x e m p l o d i s t o , c o m o a in d a os p ars es ,
m o l o k o n e s e a t u a l m e n t e o s p a l e s ti n o s . A bu sc a d e u m a f o r m a b r a -
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s i le i ra de ve r o mundo , t eo r i za r sobre os p rob lemas ins t i t uc iona is e
soc ia is e buscar so luções o r ig ina is é f un da m en t a l se qu ise rm os pos
su i r , c o m o escreveu Or t ega y Gasset um a nov a f o r m a de v ida que
seja d is t in ta da amer icana, da sov ié t ica , da f rancesa ou da ing lesa.
S o m e n t e a c o n q u i s t a d e s ta o r i g i n a l i d a d e é q u e n o s a s se g ur ar á, a
longo prazo, um lugar de destaque ent re os Povos. S i tuada a questão
de n t ro das vá rias pe rspec t ivas c o m que t e m se apres en t ado , cabe ,
agora ,
d iscut i r os conce i tos bás icos nesta área de estudo.
2. Conceítuações
Nesta segunda par te me detere i na d iscussão dos conce i tos de caráter
n a c i o n a l , ca rac t e r í s t icas nac iona is , pe rson a l idade bás ica , pe rsona l ida
d e m o d a l e i d e n t i d a d e n a c i o n a l .
I n i c ia lmen t e , cabe reg is t ra r que os ps icó logos modernos p re f e rem
usar o co nc e i to de ' pe rs on al id ad e ao invés de cará ter . E le ter ia um
c o m p r o m e t i m e n t o m e n o r c o m a é t ic a e s eria m a is ' c i e n t í f i c o . C a tá -
t e r é um dos conce i t os ma is an t igos das c iênc ias humanas . Já o f i l óso
f o g rego He rác i i t o de É feso (4 80 a .C) o t e r ia usado n u m f ragme n
t o cé leb re : O ca rá t e r do ho m em é o seu d e s t in o . O co nc e i t o su rge ,
p o r t a n t o , n u m e s f o r ç o d e c o n h e c e r o h o m e m s i ng u l a r e o q u e r e s p o n
d e r ia p e lo s seu s c o m p o r t a m e n t o s . D u r a n t e a A n t i g ü i d a d e e a t é h o j e
vár ias respostas foram dadas. Para a lguns ser iam os ast ros, para out ros
as gunas , a b i l i s , o sangue , o me io amb ien t e , a f am í l ia , e t c . É o de t e r
min ismo que se repete sob as mais d iversas formas. A noção de um
h o m e m q u e n ã o s e r i a u n i c a m e n t e p r é - d e t e r m i n a d o p o r a g e n t e s e x t e r
nos se r ia de f end ida apenas pe lo Cr i s t ian ismo, sem que e le desconhe
cesse as in f luênc ias des t es cond ic ionament os .
O c o n c e i t o d e c a r á t e r d o m i n o u a m p l a m e n t e a P s i c o l o g i a e u r o p é i a a t é
in íc ios do sécu lo X X na con s t an t e busca das re lações en t re co ns t i t u i
ção e ca rá t e r , no m e, a l iás , do l i v ro do ps iq u ia t ra a lem ão E . K res t ch -
mer . Esta obra Co ns t it uc ión y Ca rac te r c h e g o u na A l e m a n h a a 2 0
ed ições e f o i t raduz ida em t odas l í nguas europé ias t endo uma
i n f l u
ênc ia m u i t o g rande a t é n o B ras i l . Ma rcaram época t am bé m as esco las
con s t i t uc io na l i s t as de V io la e Pende na I t á l ia ; S igaud e M ac Au l i f e e na
F rança e as t i po lo g ias de F re ud e Ju ng . Os am er icano s t i ve r am em
Sh eld on e S tevens um a expressão desta esco la . Nestes vár ios co nte x
t o s o c o n c e i t o d e c a rá te r é s i n o n i m i z a d o p o r t i p o , t e m p e r a m e n t o .
Q u a n d o c o m e ç o u , p o r o u t r o l a d o , a a p l i c a ç ã o d o c o n c e i t o de c a r á te r
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não ma is ao t i p o s ingu la r , mas ao t i p o idea l de ho m em qu e seria fo r
m a d o n as d i f e r e n t e s n aç õe s? D a n t e M o r e i r a L e i t e ( 1 9 2 7 - 1 9 7 6 ) i n d i c a
no seu c láss ico O Cará te r Nac iona l B r as i l e i ro o f i l ó so fo a lem ão
H e r d e r ( 1 7 4 4 - 1 8 0 3 ) c o m o s e n d o o f o r m a l i z a d o r de s ta t e o r i a d o c a rá
t e r n a c i o n a l . M as H e r d e r é a p r e s e n t a d o d e u m a f o r m a s u m á r ia e s e u
s is tema,
m u i t o c o m p l e x o e r i c o , f i c a e s v a z i a d o . S o b r e H e r d e r é o p o r
tu n o reg i s tra r qu e ao con t rá r io das p rev isões de M ore i ra L e i te e le fo i
c o l o c a d o n a o r d e m d o d i a , e m F r a n ç a , n e st e a n o d e 1 9 8 7 c o m o p r o
v o c a n t e l i v r o d e A l a i n F i n k i e l k r a u t ( 1 9 8 7 ) L a D é f a i t e d e Ia p e n s é e .
N a q u e la o b r a e ste d i s c u t i d o f i l ó s o f o , e x - a l u n o d as é c o l e s d i z q u e
. . . es te c o n c e i t o d e g ê n i o n a c i o n a l ( n ã o c a r á te r , c o m o t r a d u z i u M o
re i ra L e i te) faz dob rar os s inos da c u l tu ra un ive rsa l is ta das luz es e
que e le se desdobra , a té ho je , com imp l i cações i nc r í ve i s . Se F ink ie l
k ra u t es tá co r re to em sua in te rp re taç ão te re m os , nes te f i na l de sécu
lo ,
u m r e t o r n o a o s e s t u d o s s o b r e i d e n t i d a d e n a c i o n a l .
Cabe ta m bé m reg is tra r que sem chegar a um a e laboraçã o tão p ro fu n
d a c o m o a d e H e r d e r n o s eu li v r o U m a o u t r a F i l o s o f i a d a H i s t ó r i a
e n c o n t r e i e m M o n t e s q u i e u ( V i d e E s p í r i t o s da s L e is , 1 7 4 8 ) u m t e ó r i
co d o con ce i to de ca rá te r nac io na l . (Ver L i v ro 19 , caps . 10 , 14 e 27 e
L iv ro 2 1 , caps . 12 e 14 da ob ra c i tad a) .
Mas já q ue se d i s cu t i u ta n to o co nc e i to é ho ra de esboçar um a d e f in i
ç ã o d o m e s m o . O p r o b l e m a a q u i é o n d e e n c o n t r á - l o . O c o n c e i t o o c o r
re em d i c io ná r ios de F i l os o f i a , So c io log ia e Ps i co log ia co m pou ca ou
n e n h u m a v a r i a ç ã o . T o m e - s e o d e M a r t i m N e u m e y e r :
Caráter é uma qual idade, t raço ou soma de traços, atr ibutos ou caracter ís
t icas que servem para indicar a natureza essencial de uma pessoa ou coisa
Dict ionary
o f Socio logy, pag. 37 , E d . L i t t l e f i l e d , A dam i s & Co , 1959 ) .
E o n d e e n t r a , n e s ta d e f i n i ç ã o , o c o m p l e m e n t o n a c i o n a l? N a m i n h a
pesqu isa e na l e i tu ra de Le i (1983) não encon t re i , como em ou t ros
au to res , um a de f in i çã o d e ca rá te r na c ion a l , em bo ra o co nc e i to seja
d i s c u t i d o e c r i t i c a d o . P e n s o, c o n t u d o , q u e é n e ce s sá rio c o m p r e e n d e r
o co nc e i t o na sua fo rm a t ra d i c ion a l pa ra -se avançar na sua c r í t i ca .
Q u e m m e l h or o c o m p r e e n d e u f o i A b r a h a m M o n k q u e d is c u te a re la
ção de caráter ind iv idua l com o nac ional e esc larece que o segundo se
ate m ao p rogresso da soc ia l i zação e t ransm issão de va lores d e n t r o de
u m e sp aç o g e o g r á fi c o o u g e o - c o m p o r t a m e n t a l . I st o é q u e p e r m i t i
r i a a par t i cu la r i zação de g rupos soc ia i s que denominamos de b ras i l e i
ros,
i t a l i anos , russo , e tc . Mas o p r ó p r io M o n k fo rm a l i z a uma série de
cr í t i cas ao conce i to , e que são as segu in tes :
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1. Qu ais são as re lações prec isas en t re caráter n ac iona l e o in d iv id ua l?
2 .
Pode-se de l i nn ita r f i s i cam ente o â m b i to n o qua l te m va l idade u m
caráter nac iona l?
3 . C o m o se p o d e m s ep a ra r c e rt a s m o d i f i c a ç õ e s v a ri áv e is — e c o n o m i a ,
t e c n o l o g i a , p o l í t i c a , c o m u n i c a ç õ e s c u l t u r a i s , d e s l o c a m e n t o s d e
p o p u l a ç ã o - d o q u e é e s t r i t a m e n t e n a c i o n a l n o c a r á te r n a c i o
nal?
Desc onheç o se estas c r í t i c as de M o n k fo ra m respond idas a té ho je .
Q ual a re lação qu e ex is te ent re cará ter na c ion a l e cara cter ís t i cas na
c io n a is ? O t t o K l i n e b e r g ( 1 9 5 7 , v o l . I I) j u s t i f i c a a i n t r o d u ç ã o d e ste
ú l t i m o c o n c e i t o p o r q u e e le n ã o t e m c o n o t a ç ã o m o r a l . E m a i s n e u t r o
e ma is ex ten so . E le busca não apenas um a enu m eraçã o de t raços ca
rac te r í s t i cos dos povos mas co m pre en de r co m o e les se o rgan izam e se
i n t e g r a m n u m a e s t r u t u r a u n i f i c a d a . I n f e l i z m e n t e , K l i n e b e r g n ã o
c o n
t i n u o u nesta l inh a de pesquisa e seu co nc e i to esgotou-se em poucas
p u b l i c a ç õ e s s e m c u m p r i r o q u e p r o m e t i a .
Os conce i tos de persona l i dade bás i ca e persona l i dade moda l fo ram
i n t r o d u z i d o s n a l i t e r a t u r a p o r K a r d i n e r e L a B a r r e . K a r d i n e r ( 1 9 4 5 ) e
Ka rd iner e Oversey (19 51 ) fo ra m p ione i ros na ap l i cação da ps i caná l i
se n a S o c i o l o g i a e n a A n t r o p o l o g i a e e l a b o r a r a m o c o n c e i t o d e p e rs o
n a l id a d e b á sic a p a r a j u s t i f i c a r c o m p o r t a m e n t o s e s e n t i m e n t o s c o m u n s
q u e c o m p a r t i l h a m p es so as q u e v i v e m n u m a m e s m a c u l t u r a . E s ta p e r
sonal idade de base responde pe la in t ro jeção de t raços espec í f i cos de
cada cu l tu ra . Ass im e le exempl i f i ca que na i l ha de A lo re , Indonés ia ,
a d e s c o n f i a n ç a é u m t r a ç o p e r m a n e n t e e c o m p õ e a p e r s o n a li d a d e b á
s i c a d o s h a b i t a n t e s s e r e f l e t i n d o , c o n t u d o , d e f o r m a s d i f e r e n t e s . D e
^acordo com Kard iner a personal idade bás ica está assentada em quat ro
' p r i n c í p i o s :
1 9 - A s p r i m e i r a s e x p e r iê n c i a s d o i n d i v í d u o e x e r c e m u m e f e i t o d u r á
ve l sobre a persona l i dade ;
2 ? - A s e x p e r i ê n c ia s s e m e l h a n t e s t e n d e m a p r o d u z i r c o n f i g u r a ç õ e s
d e p e r s o n a l i d a d e s e m e l h a n t e s n o s i n d i v í d u o s q u e e s t ã o s u b m e t i
dos às mesm as;
39 - As p rá t i cas de educação das c r i anças se con fo rmam a esquemas
cu l tu ra i s e tendem a se r seme lhan tes , a inda que e las não se jam
jamais i dên t i cas nas d i fe ren tes famí l i as no se io da soc iedade ;
49 - A manei ra de cr iar as cr ianças d i fere de uma soc iedade para ou
t r a . As exp er iênc ias são m u i t o d i fe re n te s nas soc iedades , de ma
ne i ra qu e as norm as de person a l i dade d i fe re m igua lme nte .
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F i n a l m e n t e , p a ra K a r d i n e r a f o r m a ç ã o d a p e r s o n a l i d a d e b á s ic a , t í p i c a
d e u m Ss p e r t e n c e n t e a u m a c u l t u r a , é f e i t a e m f u n ç ã o d as i n s t i t u i
ç õ e s p r i m á r i a s ( f a m í l i a , f o r m a d e a l i m e n t a ç ã o , d e s m a m e , d i s c i p l i n a s
de base, tabus sexuais , técn icas de subs is tênc ia) e ins t i tu ições secun
dár ias ( re l ig ião, fo lc lore , técn icas de pensamento, e tc . ) Dadas estas
exp l i caçõe s pode-se , ago ra , ap resen ta r -se a con ce i t uaç ão de perso na l i
dade bás ica — dada por Du f renne (1959) :
. . . é uma conf iguração ps ico lóg ica par t icu la r , p rópr ia dos membros de
uma dada sociedade e que se mani festa num certo est i lo de v ida sobre o
qua l os ind iv íd uo s cons t róem suas var ian tes s ingulares . O con jun to dos
t ra
ços que compõem es ta conf iguração, por exemplo , cer ta agress iv idade
un i
da a certas crenças, a certa desconf iança f rente ao outro, merece ser
cha-
mada
p ersona l idade básica ,
não porqu e con s t i tua exatam ente um a persona
l idade mas porqu e con st i tu a base da personal idade para os m em bro s dó
grupo, a matr iz na qual se desenvolvem os t raços do
caráer.
( D u f r e n n e ,
p.115)
D e sta f o r m a , o c o n c e i t o d e c a r á t e r r ea p ar ec e d e n t r o d o c o n s t r u c t o
de person a l idade bás ica . E é e le que ide n t i f i c a os g rupo s nac ion a is e
f az com que os b ras i le i ros se jam b ras i le i ros . Embora o conce i t o me
pareça a inda p romissor em sua base ps icana l í t i ca desconheço ou t ras
pesquisas a lém daquelas que foram rea l izadas por estes autores.
O con ce i t o de perso na l idade m od a l não t e m , na Ps ico log ia , um a h is
t ó r ia t ão express iva co m o os an t e r io re s . F u i en co n t ra r a lgumas p o u
cas re f e rênc ias em McDav id e Hara r i (1974 , pag . 137 ) que apon t am
co m o sendo seus au t o res os an t rop ó lo go s de La Bar re , em 19 46 , e
I nke les , H an f m an & Ba ie r , 1958 . Persona l idade mo da l será aque la
q u e o c o r r e c o m m a i s f r e q ü ê n c i a n u m a c u l t u r a . V e m d a e s t a t í s t i c a
m o d a . O con ce i t o é de scr i t i vo e p e r m i t i r i a apenas qu e : se um Ss é
re t i rado ao acaso da amost ra de b ras i le i ros ex is t e uma g rande p roba
b i l i d a d e d e q u e e l e c o n f i r m a r á , s o b m u i t o s a s p e c t o s d o s e u c o m p o r t a
m e n t o , u m q u a d r o d e s c r i t i v o , m o d a l o u u m m e m b r o t í p i c o d a n o s
sa soc iedad e. '
Apresen t ados es t es conce i t os , pe rgun t a -se o que de novo vem t razer o
conce i t o de iden t idade nac iona l . Será ma is van t a joso usá- lo nas pes
quisas?
Não é g rande a l i t e ra t u ra sobre ide n t ida de na c ion a l . Para ser ex a t o o
t ema f o i t raba lhado , en t re nós , na década de 50 e 60 pe lo g rupo do
I ns t i t u t o Super io r de Es t udos B ras i le i ros — I SEB — por Ro land Cor -
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b i s ie r e Á l va r o V i e i r a P i n to . A ú l t i m a pub l i cação b r as il e ir a sob r e a
m a té r i a é o l i v r o d o r i be i r ão p r e ta no R ena to O r t i z C u l tu r a Br as il e ir a
& I d e n t i d a d e N a c i o n a l ' . N a V e n e z u e l a e n c o n t r e i o e x c e l e n te t e x t o
d e M a r i t z a M o n t e r o , I d e o l o g i a , A l ie n a c i ó n e I d e n t i d a d N a c i o n a l ,
pu b l i c ad o em 19 84 . Estes au to r e s , de fo r m açõ es teó r icas d i fe r en tes ,
en focam o prob lema sob ângu los d iversos . Para Corb is ie r a busca da
i den t i dade nac i ona l é um a fa l sa ques tão j á que é m a i s i m por tan te pe r
gun ta r qu em é o a r t í f i c e desta i den t i da de e da m em ór i a que a fun da
m e n t a . A qu e g rup os socia is se v in cu la m e a que in teresses e la serve?
Para m im o p ro b le m a perm anece m esm o se respo nd idas estas ques
t ões .
Cada época h is tó r i ca reve la d i fe ren tes g rupos, in te resses, e tc .
Or t i z — duv i da a i nda da poss i b i l i dade de de f i n i r a i den t i dade nac i ona l
e co nc o r d a com Lévy - S tr auss que a i de n t i da de é um a en t i dade abs
t r a ta sem ex i s tênc i a
rea l ,
m u i to em bor a se j a i nd i spensáve l com o
p o n
t o de re fe rê nc ia . E la ser ia a lgu ma co isa c o m o as ' b ru ja s dos espa
nhó i s e m que n i ng uém c r ê , m as qu e Ias hay , ha y .
Já C orb is ie r faz um a aprec iação s im pát ic a às ten ta t i va s de se de f in i r a
i den t i dade nac i ona l em te r m os de ca r á te r do b r as i l e i r o e r em em or a as
ten ta t i vas de Sérg io B. de Ho landa com a cord ia l idade; Pau lo Prado
co m a t r i s teza e Cass iano R icard o c om a bon da de , que , para e le são
apenas buscas de 'e s t r u tu r a fás ica ' e su j e i t a , po r ta n t o , a m od i f i ca
ções. É nes ta l inha que m e co l oc o .
A de f i n i çã o de M on te r o é m u i t o p r o m i sso r a . Para e la a i den t i dad e na
c ional é :
. . . um con jun to de s ign i f icações, represen tações re la t ivamente permanen
tes a t ravés do tempo que permi tem aos membros de um grupo soc ia l que
co m p a r te m u m a h is tó r ia e u m te r r i t ó r io co m u m , a ss im co m o o u t ra s e le
me ntos só c io -cu l tu ra is , ta is co m o a l inguagem, uma re l ig ião , costumes e
inst i tu ições socia is reconhecer-se como re lacionados uns com os outros
b iogra 'f icam en te . (pag . 7 6) .
Esta de f in iç ão te m sobre as an ter io res um a série de vantagens. E la é
s u f i c i e n t e m e n t e a m p l a p a r a i n c o r p o r a r o a s p e c t o h i s t ó r i c o d o h o m e m ,
a es tab i l i dade , as i ns t i t u i ções e a s i t uação . A tende tan to ao s i ngu l a r ,
eu com o b r as i l e i r o , com o o nós b r as i l e i r os .
A esta a l tu ra c re io qu e é poss íve l se real izar u m ens aio de se estud ar a
i den t i dade b r as i l e i r a , de um b r as i l e i r o m u i to espec i a l , Ca r l os Dr um
m o n d d e A n d r a d e q u e p o d e i l u s tr a r m u i t o b e m a d e f i n i ç ã o d e M o n
t e r o .
E n t r e 1 9 2 5 e 1 9 3 0 D r u m m o n d a t a c a o p r o b l e m a p e l a p r i m e i r a
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v ez e m T a m b é m j á f u i b r a s i l e i r o ; e n t r e 1 9 3 1 e 1 9 3 4 r e t o m a a q u es
t ã o e m ' H i n o N a c i o n a l , e , f i n a l m e n t e , e m 1 9 7 3 r ev e la s ua i d e n t i d a
de f ina l e m ' Ca nto B ra s i le i ro . Na década de 2 0 , época de c r ise de
i d e n t i d a d e , d a S e m a n a d a A r t e M o d e r n a ele se d i z m o r e n o c o m o
vocês e ap r ende na m esa dos ba r es que o nac i ona l i sm o é um a v i r t ude
mas sua i ron ia a r re m at a : h á um a ho ra em q ue os bares se fec ha m e
todas as v i r t udes se negam .
En t r e 31 e 34 , em p l ena época r evo l uc i oná r i a , o poe ta es tá i nqu i e to
co m o g i gan te que do r m e , que recebe im i g r an tes f r ancesas m u i t o
louras de pe le mac ia , a lemãs gordas, russas nos tá lg icas , en f im, a mo
dern ização do Bras i l , os p ro fessores es t range i ros e como que su focado
pe la in f luênc ia que vem do es t range i ro e le desabafa no f i n a l : N o s s o
Br as i l é no ou t r o m undo . Es te não é o Br as i l . Nenhum Br as i l ex i s te .
E acaso ex i s t i r ão os b r as i l e i r os ? M a i o r ex em p l o de i nsegu rança no
processo de ident i f i cação nac iona l não pode ex is t i r .
Qu ar en ta anos depo i s , no seu C a n to Br as i l e i r o pa rece que o poe ta
es tá com sua i den t i dade nac i ona l es tabe l ec i da . D i z , en tão : ' M eu pa í s ,
essa p a r t e d e m i m f o r a d e m i m c o n s t a n t e m e n t e a p r o c u r a r - m e . Se o
esqueço — c esqueço tan tas vezes — v o l ta em cô r , pa isagem , na po lp a
da go iab a, na ab er tu ra das voga is , no jogo d iv e r t id o de esses e e r res e
s i n to que sou m i ne i r o ca r i oca am azonense co l eção de m i ns en t r e l aça
dos . S o u t o d o s e l e s . P ara c o n c l u i r : B r a s i l e i r o s o u , m o r e n o i r m ã o d o
m u n d o é q u e m e e n t e n d o e l i v r e i r m ã o d o m u n d o p r e t e n d o . ( B r a s i l ,
r i m a v i r i l de l i be r da de . De fo r m as d i fe r en tes , de ac o r d o co m sua
c u l
t u r a , sens ib i l idade, cada um de nós pode te r v iv ido o p rob lema da sua
i den t i dade nac i ona l .
A c r ed i to j á have r d em on s t r a do , à sac iedade , que o p r o b l e m a da i den
t idade nac iona l é re levante , permanente e d igno de ser es tudado pe las
teor ias ps ico lóg icas . Cabe -me, ago ra , aprese ntar m inhas c onc lusõe s.
3. Conclusões
Estas conc lusões serão apresentadas co ns ide ran do t rês n ív e is ; a ) ao
n íve l dos co nc e i to s ; b ) da m et od o lo g ia de pesqu isa ; c ) das teor ias .
Ao n í ve l dos conce i tos ve r i f i ca - se que o conce i to m a i s an t i go e que
res is te a té ho je é o de cará ter nac iona l . E le tem amplo uso , no Bras i l ,
nos m e i os po l í t i cos e nas Fo r ças Ar m adas . Os conce i tos que v i e r am
pos te r i o r m en te , ca r ac te r í s t i cas nac i ona i s , pe r sona l i dades bás i ca e m o
da l não acrescentaram, em te rmos de pesqu isa , o que de les se pode-
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r i a espe ra r . Cons ide ro , po r ou t ro l ado , p romisso r o uso do conce i to
de ide n t id ad e nac iona l dev ido a sua ab rangênc ia teó r i ca . Ele i nc o rpo
ra o p r o b l e m a d a f o r m a ç ã o d a c o n s c i ê n c i a , a f u n ç ã o d a l in g u a g e m ,
os va lo res , a h is tó r ia , as ins t i tu ições, o eu e o nós . Parece-me que
pode se r de uso tan to de uma ps ico log ia de o r ien tação d ia lé t i ca como
de uma ps ico log ia cogn i t i v i s ta .
A o n iVe l do s m ét od os de pesqu isa não pr iv i leg io ma is os es tudos f u n
d a m e n t a d o s s o b r e t r a ç o s , e m b o r a e u m e s m o t e n h a r e a l i z a d o u m
es tu
do nes ta d i reção . Ho je , eu p r i v i l eg ia r ia pesqu isas que pa r t i ndo , ta l vez
dos es tudos fundamen tados em t raços , p rocu rassem uma inves t igação
cog n i t i va m a is ex tensa dos co m po ne n te s da iden t idad e . Em c r ianças
o u s o d o m é t o d o c l í n i c o c o m o o f e z P i a g e t ( 1 9 5 1 ) n u m e s t u d o e n c o
m e n d a d o p e la U N E S C O p are ce m u i t o a d e q u a d o . C o m o se f o r m a m
em nossas c r ianças , conce i tos como: pá t r i a , bande i ra , es t range i ros ,
e tc . C om o se desenvo lve a i de n t ida de c om a c ida de , o E s tado e a Na
ç ã o ,
i s to é , de o r igem a f r i ca na , j aponesa , i nd ígen a , e tc . É t o d o u m
p r o g r a m a q u e e stá e s p e ra n d o d e s e n v o l v i m e n t o .
C o m o j á s u g er i a n t e r i o r m e n t e p r o b l e m a s e s p e c í f ic o s d a n os sa i d e n t i
d a d e n a c i o n a l , c o m o o p a t e r n a l i s m o , a u t o r i t a r i s m o p o d e m s e r e s t u d a
d o s p o r u m a P s i c o l o g i a H i s t ó r i c a f u n d a m e n t a n d o - s e t a n t o e m d o c u
m e n t o s h i s t ó r ic o s q u e c o m p r e e n d a m a f o r m a ç ã o d o E s ta d o P o r t u
guês e da Co lôn ia Bras i le i ra . Para a inves t igação da iden t idade nac io
n a l e m a d u l t o s o a r t i g o d e A d o r n o o f e r e c e p i s t a s m u i t o i nt er e ss a n
tes , .se ja num mergu lho na l íngua por tuguesa; na mús ica b ras i le i ra ou
nas obras dos nossos grandes escr i to res . Es tudos dos t ipos c r iados por
M a c h a d o d e A s sis , A f o n f o A r i n o s , M o n t e i r o L o b a t o , J o rg e A m a d o ,
Ér i co V e r í ss im o e M ar io de An d ra de m u i t o nos reve lam da nossa iden -
t j dade nac iona l .
F i n a l m e n t e , e m n o s s o m e i o c o n s i d e r o c o m o p r o m i s s o r e s o s e s t u d o s
su rg idos em to rno das Reun iões Anua is da Soc iedade de Ps ico log ia de
R ibe i rão Pre to co m o os rea l izados po r u m g rup o da PUC-SP, ond e
ressa lto o t ra ba lho de Car los By in g to n , na l i nha jung u ia na . É ho ra ,
ago ra ,
de se encon t ra r pa ra os es tudos r i be i rãop re tanos sob re o B ras i
le i ro uma teor ia que possa in tegrar as dezenas de achados. Não des
c a r t o , e m b o r a n ã o s e j a m i n h a e s p e c i a l i d a d e , a c o n t r i b u i ç ã o q u e u m a
Ps ico log ia M arx i s ta possa faze r nes ta á rea , c o m o a Ep is tem o log ia G e
nét ica de Jean Piaget.
S o u , p o r t a n t o , u m o t i m i s t a c o m r e la ç ã o a o f u t u r o d as p es qu is as s o
b r e i d e n t i d a d e n a c i o n a l . C o m o m e u o b j e t i v o m a i o r f o i a q u i a p re s e n-
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ta r o ' es tado da q u e s t ã o , c o m o d i z i a m os e sco lás t icos , sou o b r i g a d o
a regis trar que o f i l ó s o f o f r a n c ê s F i n k i e l k r a u t a s s i m não c o n s i d e r a .
Para ele, uma n o v a f o r m a de iden t idade su rge no h o r i z o n t e da h u m a
n i d a d e e que supe ra rá as i d e n t i d a d e s n a c i o n a i s , de c lasse, rac ia is , re l i
giosas, sexuais e p o l í t i c a s . A i d e n t i d a d e que E d g a r M o r i n c h a m a de
b i o - c l a s s e ' . N u m a c i v i l i z a ç ã o que não que r enve lhece r , que t e i m a
m a em ser ado lescen te o que i d e n t i f i c a r á m e s m o s e r á a p e r t i n ê n c i a à
j u v e n t u d e . S erá p r o f é t i c o o c a n t o de M i c h a e l J a c k s o n que um dia nos
e n s i n o u :
We are the w o r i d . We are the ch i ld rens? Não t e n h o r e s p o s t a
a es te desa f io , po rq ue m inh a ge ração ac e i to u enve lhece r .
«
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Raíes do Brasil e C a sa G r a n d e & Senzala são obra s c lássica s ond e as
carac
t e rí t i cas ps icossoc ia is
do
b ras i le i ro
são descritas,
c om o
por exemplo,
co rd ia l ida
de , ind iv idua l i smo ,
animismo,
aven tu re i ro , sensual, sad i smo nos g r u p o s
dominan
te s e ma so qu i smo nos g r u po s
dominados.
Es t e s ensa i o s têm s ido c r i ti cados pe los
au to res marxistas. E les en fa t izam a c on sc iênc ia de c lasse e co loca ram na inteili
gentsia a lgun s obs tácu los p ara os e s t u dos sob re a iden t idade nacional.
Ma s es te au to r con s ide ra m u i t o re levan te es tuda r o p r o b l ema da iden t idade na
c i o na l po r que ele ém ais básico do que o p r o b l ema da c on sc iênc ia de classe. Ele
acred i t a que cad a gera ção dev e d esc obr i r os t raços ess enc ia is da iden t idade do
brasileiro. Se a
iden t idade nac iona l t rans fo rm a-se
ao
longo
dos
a nos
existe, con
tudo, a l g uma es t ab il id ade pa ra ser cons ide rada .
Em do i s a r t i g o s
o
p r o b l ema
da
iden t idade
éestudado. Primeiro, o
au to r
conside
ra
os
asp ec tos teór icos
do
p r o b l ema .
Ele
e x am ina cu i d adosamen t e d i fe r en te s
p e rspe c t ivas , conce i tos básicos nes ta áea de es tudo e c om o o p r o b lema p o d e ser
estudado. No segun do a r t igo - a ser p ub l ic ado num dos p ró x imos núme ro s de
SÍN TE SE - écomun i cado um e s t u do e x p e r imen t a l com am os t ra s de b ras i le i ros
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8/18/2019 Quem é o brasileiro
18/18
das ada des de Ribe i rão Preto, Jaú e Fran ca, Es tado de São Paulo, o nde a ima
gem ' do b ras i le i ro émui to
negativa
p a r a e l e mesm o . Mas se es t a imagem
'real
énega t i va a imagem ideal que o b ras i le i ro faz de le me sm o pa ra o fu tu ro é
posi
t iva e cons t ru ti va e mo s t ra um novo t ipo de b ras i le i ro .
S U M M A R Y
Q ues t ions eòou t na t iona l identity, na t iona l character, na t iona l cha racte r is t ics ,
mo da l pe rsona l i t y and bas ic pe rsona l it y a re co r re la ted and ve ry pe r tinen t to Ph i -
losophy, Sociology, An th ropo logy and Psych o logy . In Braz i l the re a re au tho rs as
Álvaro Vie i ra Pinto, Ségio B. de Ho landa and Gi lbe r to Frey re tha t have theo-
r ized abo ut nat iona l chara cte r o f braz i l ian people. Cons c iênc ia e Rea l idade N a
cional ,
Raíes do Bra s il and Casa Grande & Senza l a a re c la ss i c wo r ks whe re
a re desc r ibed the ps ycho -soc ia l cha rac te r is t ics o f b raz i li an as , fo r exem p le , co r -
diality, ind iv idua l i sm , adventurer, a n im i sm , sensual, sad ism in the e l it es and
masoch i sm in t he people. Th ese essays havebee n cr i ti c ized by ma rx is t s authors.
Th ey ap p ra ise theo re ti ca l s tud ies on c lass consc iouness and have pu t in the
in te i ligen ts ia som e obstac les for stud ies on nat iona l identity.
Th is au tho r es t ima te , however, mu ch m ore re levan t to s tudy the p rob lem o f na
t iona l iden t it y because i t is m ore bas ic tha t c lass consc iouness . He be l ieves tha t
each gen era t ion m ust d iscov er the esse nt ia l t ra i ts o f braz i l ian
identity.
I f the
na t iona l iden t it y is chang ing a long the yea rs the re a re som e s tab i li ty to be
consi-
dered.
In two ar t ic les the p rob lem of braz i l ian ident i t y is
studied.
First, the theore t ica l
asp ec t s o f p rob lem , bas ic cons t ruc t s and me thodo logy o f resea rch a re demons-
t ra ted by the au tho r in the p resen t article. I n the second a r t ic le ( to ap pea r in
one o f the nex t issues o f 'SÍN TE SE ) is com m un ica ted an exp e r imen ta l s tudy
wi th s am p les of braz i l ians of Ribe i rão Preto, Fran ca and Jaú - São Pa u lo Sta te
—wh ere the
image
rea l and idea l a re ana lysed by s ta ti ti sca l
tests.
I f the rea l
image
of braz i l ian is very negative there are , in the future, g rea t exp ec ta t ions
o f a new m ode l o f ma n in the idea l image .
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