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PROTEÇÃO DE SISTEMAS ELÉTRICOS I Módulo 1 - Capítulo 5 5 - 1 Prof. Allan Cascaes Pereira JAN/2006 1. DEFINIÇÃO DE ESTABILIDADE Estabilidade de um sistema de potência é a capacidade deste sistema de permanecer em sincronismo quando submetido a uma perturbação. 2. TIPOS Os sistemas elétricos consistem basicamente de um determinado número de geradores síncronos, que alimentam, através de linhas de transmissão, diferentes cargas, as quais podem ser formadas por motores, compensadores síncronos, aparelhos de iluminação, resistores de aquecimento, além de cargas de caráter especial, como por exemplo, retificadores para tração elétrica, fornos a arco, etc. Um sistema interligado é composto de várias áreas com agrupamentos de geradores e cargas interligados por linhas de transmissão. Como as cargas e a geração de cada área praticamente não são equilibradas entre si, as áreas com excesso de geração transmitem energia às áreas com excesso de carga. A operação normal de um sistema moderno depende, portanto, do fluxo de potência através das linhas de transmissão, que interligam áreas ou usinas. É evidente, que isto somente é possível enquanto todas as máquinas síncronas permanecem em sincronismo. Em outras palavras, a manutenção da estabilidade é essencial para a operação normal de um sistema elétrico. 3. MODELO SIMPLIFICADO DE UM SISTEMA ELÉTRICO Para uma análise preliminar do problema de estabilidade serão admitidas algumas simplificações: As máquinas síncronas serão representadas por meio de uma tensão constante, em série com uma reatância fixa. Será usada a reatância síncrona transitória ou subtransitória, para os estudos de estabilidade em regime permanente, transitório, ou durante falhas, respectivamente. A capacitância e resistência das linhas de transmissão serão desprezadas. A corrente e o valor da potência ativa serão admitidos iguais em ambas extremidades da linha de transmissão. Com estas simplificações, um sistema de duas áreas poderá ser representado como um gerador e motor síncronos equivalentes, interligados por uma reatância indutiva. O diagrama equivalente é mostrado na Figura 5.1, onde E G e E M são as tensões e X G e X M são as reatâncias do gerador e do motor, e X L a reatância da linha de transmissão, sendo X = X G + X L + X M . NOÇÕES DE ESTABILIDADE

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PROTEÇÃO DE SISTEMAS ELÉTRICOS I

Módulo 1 - Capítulo 5 5 - 1

Prof. Allan Cascaes Pereira JAN/2006

1. DEFINIÇÃO DE ESTABILIDADE

Estabilidade de um sistema de potência é a capacidade deste sistema de permanecer em sincronismo quando submetido a uma perturbação.

2. TIPOS

Os sistemas elétricos consistem basicamente de um determinado número de geradores síncronos, que alimentam, através de linhas de transmissão, diferentes cargas, as quais podem ser formadas por motores, compensadores síncronos, aparelhos de iluminação, resistores de aquecimento, além de cargas de caráter especial, como por exemplo, retificadores para tração elétrica, fornos a arco, etc. Um sistema interligado é composto de várias áreas com agrupamentos de geradores e cargas interligados por linhas de transmissão. Como as cargas e a geração de cada área praticamente não são equilibradas entre si, as áreas com excesso de geração transmitem energia às áreas com excesso de carga. A operação normal de um sistema moderno depende, portanto, do fluxo de potência através das linhas de transmissão, que interligam áreas ou usinas. É evidente, que isto somente é possível enquanto todas as máquinas síncronas permanecem em sincronismo. Em outras palavras, a manutenção da estabilidade é essencial para a operação normal de um sistema elétrico.

3. MODELO SIMPLIFICADO DE UM SISTEMA ELÉTRICO Para uma análise preliminar do problema de estabilidade serão admitidas algumas simplificações: • As máquinas síncronas serão representadas por meio de uma tensão constante, em série

com uma reatância fixa. Será usada a reatância síncrona transitória ou subtransitória, para os estudos de estabilidade em regime permanente, transitório, ou durante falhas, respectivamente.

• A capacitância e resistência das linhas de transmissão serão desprezadas. • A corrente e o valor da potência ativa serão admitidos iguais em ambas extremidades da

linha de transmissão. Com estas simplificações, um sistema de duas áreas poderá ser representado como um gerador e motor síncronos equivalentes, interligados por uma reatância indutiva. O diagrama equivalente é mostrado na Figura 5.1, onde EG e EM são as tensões e XG e XM são as reatâncias do gerador e do motor, e XL a reatância da linha de transmissão, sendo X = XG + XL + XM.

NOÇÕES DE ESTABILIDADE

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Figura 5.1 – Modelo Simplificado do Sistema Atualmente, graças aos modernos programas de computador, são usados modelos de sistemas muito mais completos, que incluem diversas linhas e barras, e levam em consideração a capacitância e a resistência (e, portanto as perdas) das linhas, bem como a ação dos reguladores de velocidade e de tensão, etc. Contudo, antes do desenvolvimento de tais programas, muitos estudos de estabilidade eram feitos com modelos simplificados, os quais ainda representam um bom subsídio para a compreensão dos fenômenos básicos referentes à estabilidade dos sistemas.

4. ESTABILIDADE EM REGIME PERMANENTE O diagrama vetorial das tensões e correntes correspondente ao modelo da Figura 5.1, é mostrado na Figura 5.2

Figura 5.2 – Diagrama Vetorial A potência transmitida é dada pela equação:

P = θsenX

EE MG

(5.1)

E a potência máxima que pode ser transmitida ocorre, portanto, quando senθ = 1, e

Pmáx. = X

EE MG

Pmáx representa o limite de estabilidade de um sistema operando em regime permanente, ou seja, com pequenas e gradativas variações da carga. A operação de um sistema simplificado gerador-motor pode ser ilustrada graficamente por meio da curva ângulo-potência do sistema, baseada na equação (5.1) e mostrada na Figura 5.3.

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Figura 5.3 – Curva Ângulo – Potência 4.1 Exemplo Típico – Aumento Gradativo da Carga O sistema está operando inicialmente com a potência P0, correspondente ao ângulo θ 0, isto é, no ponto A, quando ocorre um pequeno aumento de carga no eixo do motor. Devido à inércia, no primeiro instante, a potência transmitida, e o ângulo θ ficam inalterados. Entretanto, como a potência no eixo do motor aumentou, a única maneira de compensar este aumento é através da energia cinética do rotor do motor, com conseqüente diminuição de sua velocidade, o que resulta num aumento do ângulo θ e, portanto, num aumento da potência elétrica transmitida, de acordo com a equação (5.1). O sistema passa a operar num novo ponto de equilíbrio, isto é, o ponto B da curva, onde P corresponde à nova potência no eixo do motor, e o ângulo θ passa ter o valor θ1. Neste exemplo, a velocidade do gerador foi mantida constante. Na realidade ela chega a diminuir ligeiramente até que o regulador de velocidade da turbina entra em ação e aumenta a sua potência, compensando o aumento de carga do motor e restabelecendo a velocidade nominal do gerador. Estes aumentos gradativos de potência transmitida e do ângulo θ podem continuar até ser atingido o ponto C da curva correspondente a θ = 90° e P = Pmáx. Qualquer aumento adicional de carga, ultrapassando o valor Pmáx, resultará num aumento do ânguloθ superior a 90° e conseqüente redução da potência transmitida. Isto resultará em desaceleração ainda maior do motor, novo aumento do ângulo θ e assim por diante, ocorrendo a perda do sincronismo entre o gerador e o motor equivalentes e colapso do sistema. Desta forma, Pmáx é o maior valor de potência que pode ser transmitido com variações gradativas da carga, e é chamada de Limite de Estabilidade dm Regime Permanente.

5. ESTABILIDADE EM REGIME TRANSITÓRIO

Estabilidade em regime transitório se refere à potência máxima que poderá ser transmitida em condições de equilíbrio, isto é, sem perda de sincronismo, quando o sistema for submetido a perturbações transitórias, tais como:

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Módulo 1 - Capítulo 5 5 - 4

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• Variações súbitas da carga; • Manobras com abertura de linhas (chaveamentos); • Curto-circuito em linhas de transmissão ou equipamentos. Podem também ocorrer combinações dessas perturbações. Por exemplo, curto-circuito seguido de isolamento de trecho defeituoso pelos disjuntores da linha e, eventualmente, o religamento automático. 5.1.1 Modelo Simplificado do Sistema Nos estudos de estabilidade transitória são analisadas ocorrências de tempo muito curto, geralmente de ordem de 1 segundo, a contar do início da perturbação. Sendo assim, os reguladores de velocidade das turbinas não terão tempo suficiente para atuar durante a perturbação e, portanto, a potência mecânica das turbinas permanece constante e igual ao valor da potência elétrica P0 antes da perturbação. Este fato é ilustrado na curva de ângulo da potência pela reta horizontal que passa por P0. A diferença entre a potência elétrica (que varia conforme a curva do ângulo θ) e a potência mecânica, que permanece igual a P0, produz um conjugado (torque) que acelera ou desacelera o rotor da máquina em relação à velocidade síncrona. Isto é, por sua vez, altera o ângulo θ.

A velocidade desta alteração, isto é, a aceleração (ou desaceleração) do ângulo θ: 2

2

dt

d θ será

diretamente proporcional à diferença entre as potências mecânica e elétrica.

P0 - Pmáx. sen θ

e inversamente proporcional à constante IM de inércia das máquinas. Isto pode ser representado pela seguinte equação ("swing equation"):

2

2

dt

d θ =

M

PmáxP θsen.0 ⋅−

,que pode ser resolvida por métodos de aproximações sucessivas. Por simplificação e com finalidade didática, pode-se representar o sistema por um diagrama equivalente, com 1 gerador único que alimenta, através da reatância equivalente X, um barramento infinito, como mostrado na Figura 5.4.

Figura 5.4 – Modelo Equivalente Simplificado do Sistema Neste modelo, o gerador equivalente terá um novo valor de "M" e a mesma potência que as máquinas reais, e o ângulo θ com a tensão do barramento infinito será o mesmo que o existente entre as máquinas. 5.2 Ângulo Crítico e o Critério de Áreas Iguais

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No regime permanente, a potência máxima e o limite de estabilidade ocorrem para condições com ângulo θ = 90°. Este ângulo é o "ângulo crítico em regime permanente". No regime transitório, logo após o distúrbio, o ângulo θ sofre modificações e oscilações. No caso de um curto-circuito, a reatância equivalente do sistema sofre uma diminuição e o ângulo de potência passa a ser dado pela curva II da Figura 5.5.

Figura 5.5 – Curva Ângulo – Potência Após Uma Perturbação

O ponto de operação inicial A da curva I, no momento do distúrbio, passa para o ponto B na curva II e se desloca ao longo desta. Até o ponto C, o gerador é acelerado, pois a potência mecânica P0 é maior que a potência elétrica. Enquanto o ponto de operação estiver na porção da curva situada entre os pontos C e D, a potência elétrica será maior que a potência da turbina P0, e surgirão forças agindo sobre o rotor do gerador no sentido de diminuição do valor de θ. Se o ponto D da curva II for ultrapassado, a potência elétrica será menor que a da turbina, e o gerador tenderá a acelerar, aumentando ainda mais o ângulo θ, até ocorrer a perda do sincronismo. Por este motivo, o ângulo θ correspondente ao ponto D da Figura 5 é chamado de "ângulo crítico" da estabilidade transitória. Pode ser demonstrado que o ângulo crítico não será ultrapassado quando a área S2 for maior ou pelo menos igual à área S1. Em outras palavras, para o sistema operar com estabilidade é necessário que S1 ≤ S2.

Esta condição é conhecida como "Critério de Áreas Iguais".

6. ALGUNS EXEMPLOS 6.1 Falta seguida de desligamento numa das linhas, num sistema com 2 linhas paralelas (ver Figura 5.6):

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Figura 5.6 - Falta seguida de desligamento numa das linhas, num sistema com 2 linhas paralelas

Imediatamente após o curto-circuito, o ponto de operação passa de A para B. A potência P0 da turbina é agora maior que a potência elétrica transmitida, o gerador acelera e o ângulo θ começa a crescer. O sistema de proteção atua e a linha com defeito é isolada no ponto C, correspondendo ao ângulo θ1.

O ponto de operação passa agora para D, na curva III, e a potência elétrica passa a ser maior que a da turbina, tendendo a diminuir o ângulo θ. Entretanto, devido à inércia, o ângulo θ continua a aumentar, até atingir o valor θ2, no ponto E. Neste exemplo, θ2 é inferior ao ângulo crítico, de forma que a estabilidade é mantida. Após algumas oscilações, amortecidas pela resistência da rede, o novo ponto final de operação passa a ser G, correspondendo ao ângulo θ3. 6.2 Caso idêntico ao anterior, porém com adição de religamento automático. A Figura 5.7 mostra que o religamento no ponto E aumenta consideravelmente a área S2 para os mesmos valores de θ, o que melhora a estabilidade.

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Figura 5.7 - Caso idêntico ao anterior, porém com adição de religamento automático

Como no caso anterior, havendo uma falta em uma das linhas, o ponto de operação passa de A para B. O rotor é acelerado até o ponto D, quando os disjuntores da linha com defeito são abertos e o defeito, isolado Por efeito da inércia o ângulo θ continua a aumentar. No ponto E, os disjuntores da linha faltosa são religados, passando o ponto de operação para F, na curva I, e aumentando o torque desacelerador. Se o defeito na linha for transitório, o ponto de operação voltará a ser A, depois que cessarem as oscilações.

7. EFEITO DO DESEMPENHO DA PROTEÇÃO E DO RELIGAMENTO AUTOMÁTICO NA ESTABILIDADE

A capacidade de transmissão de potência por uma linha de transmissão dentro de um sistema elétrico depende do limite de estabilidade transitória deste sistema.

Este limite não deve ser ultrapassado, pois poderá haver perda do sincronismo em caso de uma perturbação.

Há duas modalidades do limite de estabilidade: o limite em regime permanente e o limite transitório.

Quando o sistema opera em regime permanente, a potência transmitida varia gradativamente, porém não pode ser ultrapassado um certo valor máximo, chamado limite de estabilidade (estático).

O limite transitório pode ser alcançado por uma súbita perturbação do sistema. Neste caso, ocorrem oscilações de potência devido à influência das forças de inércia das máquinas.

De acordo com o que foi apresentado acima, é evidente que, quanto mais tempo o sistema é submetido a perturbações, e especialmente aos curtos-circuitos, tanto maior será a probabilidade de perda de estabilidade.

Portanto, é importante que as falhas sejam isoladas no menor tempo possível.

Em outras palavras, os equipamentos de proteção utilizados deverão ter, além de alto grau de sensibilidade e seletividade, velocidade de operação compatível com o limite de estabilidade transitória do sistema. O religamento automático deverá ser aplicado sempre que necessário.

Além disto, cuidados especiais deverão ser tomados para prevenir atuações indevida de relés de proteção que poderão ocorrer durante oscilações temporárias no sistema.