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Dias tornaram-se semanas, semanas tornaram-se meses. E então, um dia, eu fui para a minha máquina de escrever , sentei- -me, e escrevi a nossa história. Uma história sobre uma época, uma história sobre um lugar , uma história sobre as pessoas. Mas, acima de tudo, uma história sobre amor. Um amor que irá viver para sempre. (Moulin Rouge)

Prólogo - static.fnac-static.com fileMartha – Meet Frank, Daniel and Laurence Prólogo FazendoMeuFilme-iMac4(PDF).indd 11 4/11/14 10:10 AM. 12 19. Os Goonies 20. Música no coração

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Dias tornaram-se semanas, semanas tornaram-se meses.

E então, um dia, eu fui para a minha máquina de escrever, sentei-

-me, e escrevi a nossa história. Uma história sobre uma época,

uma história sobre um lugar, uma história sobre as pessoas. Mas, acima de tudo, uma história sobre amor.

Um amor que irá viver para sempre.

(Moulin Rouge)

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Uma vez perguntaram-me qual era o filme da minha vida. Fiquei montes de tempo a pensar nisso, mas, em vez de responder, entreguei à pessoa a minha lista de DVD. Eu não tenho um filme preferido, cada um deles tem uma cena especial, um momento que faz com que eu deseje ser a pro-tagonista, com que eu anseie que a minha vida seja tão emo-cionante e colorida como a delas.

Lista de DVD de Fani Castelino Belluz

1. As meninas de Beverly Hills2. Cinderela3. Enquanto dormias4. O feitiço do tempo5. Alice no País das Maravilhas6. Efeito borboleta7. O fabuloso destino de Amélie8. À procura da Terra do Nunca9. Campo de sonhos10. O despertar da mente11. O diário de Bridget Jones12. O clube dos poetas mortos13. À procura de Nemo14. Papuça e Dentuça15. Um sonho de mulher16. Tudo por um sonho17. The incredibles – Os super-heróis18. Martha – Meet Frank, Daniel and Laurence

Prólogo

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19. Os Goonies20. Música no coração21. Alguém como tu22. O feiticeiro de Oz23. O rei dos gazeteiros24. Polar Express25. História de amor26. Alguém muito especial27. Moulin Rouge28. O casamento do meu melhor amigo29. Onde reside o amor30. Como perder um homem em 10 dias31. Para sempre Cinderela32. Titanic 33. Dumbo34. Peter Pan35. O labirinto36. O diário da princesa37. Ela é demais38. De repente, já nos 30!39. Sintonia de amor40. Branca de Neve e os sete anões41. The wedding planner42. Toda a verdade sobre cães e gatos43. A minha namorada tem amnésia44. Quatro casamentos e um funeral45. The thing called love46. A paixão de Shakespeare47. Você tem uma mensagem48. 10 coisas que odeio em ti49. Romeu e Julieta50. Um amor inevitável51. Sob o sol da Toscana52. Dança comigo53. O diário da nossa paixão54. Wimbledon — Encontro perfeito55. Brilhantina

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Cher: Não quero trair a minha geração, mas não entendo a moda dos miúdos de

hoje. Parece que caíram da cama, puseram calças largueironas e cobriram o cabelo

sujo com um boné ao contrário. E julgam--se irresistíveis? Eu não acho.

(As meninas de Beverly Hills)

Começou a chover outra vez. Ao menos isso. Enquanto o tempo estiver mau, eu não preciso de sair. Não sei quem aprovou essa lei de que as raparigas de dezasseis anos são obrigadas a sair todos os dias do final de semana. Se me ape-tece ficar em casa, com os meus DVD, os meus livros ou simplesmente a fazer nada, a minha família até pergunta se eu estou doente. Pior do que isso. Passam-se cinco minutos e as minhas amigas começam a aparecer ou a telefonar, como se o facto de eu ter dito que queria ficar em casa tivesse sido uma espécie de brincadeira.

Eu pergunto-me: sair para quê? Para ver sempre as mes-mas caras? Para brincar aos espelhos, já que todas as pessoas se vestem absolutamente iguais, como se fosse uma espécie de uniforme social? Engraçado é que são essas mesmas pes-

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soas que fazem abaixo-assinados na escola para que possamos ir com roupas informais... se eu fosse a diretora, concordava. Pelo menos, as raparigas não dariam cabo do uniforme cor-tando as mangas para ficarem com as «asinhas de fora» (ah, ah, ah, esta expressão é da minha mãe, tive que concordar com ela!), e os rapazes parariam de levar suspensão por apa-recerem nas aulas de chinelos.

Oh, oh. Tenho de atender o telefone. A minha mãe está a chamar com aquele tom dela que separa e prolonga sílaba por sílaba do meu nome: «Eeees-teee-fââââââ-niaaaaa...»

Argh. Como se não bastasse este nome esquisito que me puseram, ainda tenho de o ouvir gritado! Quantas vezes te-nho de repetir? O meu nome é FANI! F-A-N-I. E eu finjo que não é comigo quando me chamam Estefânia. Só vou atender desta vez para que o resto do mundo que ainda não ouviu o berro da minha mãe não descubra que por trás da Fani existe um nome estranho destes...

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Fada Madrinha: Mas, como nos sonhos, receio que não possa durar muito.

Dançarás até à meia-noite.Cinderela: Meia-noite? Oh, obrigada!

Fada Madrinha: Oh, não, presta atenção, minha querida: ao soar das doze, a magia

cessará e tudo o que era antes voltará.(Cinderela)

Obrigada, horário de verão! Normalmente eu não gos-to do marco inicial deste horário, já que somos obrigados a adiantar o relógio e com isso ganhamos um dia de apenas vinte e três horas. Mas, desta vez, achei pouco e bom.

Antes, ao telefone, era obviamente a Natália. Eu gosto muito da Natália, somos amigas desde crianças e tal, mas, sinceramente, de há uns tempos para cá, parece que estamos a ir em direções opostas. Claro que, como sempre, ela estava completamente cheia de vontade de sair, especialmente por causa do fim de semana prolongado, já que o nosso colégio emendou o feriado de 12 de outubro.

Não sei como ela consegue... quarta fomos ao aniversá-rio da Júlia, na quinta ao cinema ver O fiel jardineiro (dou

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três estrelas), na sexta fomos ao ensaio da banda do irmão do Rodrigo e, ontem, todas as pessoas de Belo Horizonte que não viajaram (ou seja: a Natália, o Rodrigo e a Priscila) vie-ram cá para casa ver DVD. Caramba! Será que ela não sente falta de ficar em casa sem fazer nada?

OK, eu não sou antissocial, nem tenho nenhum daque-les desvios comportamentais de que a revista Veja passa a vida a falar, mas há alturas em que sair cansa, ou não? Uma pessoa farta-se desse ritual todo de ter de se vestir (tendo o cuidado de não repetir a mesma roupa durante, pelo menos, três semanas), maquilhar-se, pedir dinheiro ao pai, ouvir o sermão sobre os perigos existentes no mundo atual, encon-trar as mesmas pessoas que vejo todos os dias, ter de fazer boa cara para não ter de aturar a todo o minuto alguém a vir perguntar o motivo da minha má disposição... Ufa. Prefiro sinceramente ficar no meu quarto, o meu castelo encantado, com os meus livros, DVD, computador...

E foi isso que eu tentei explicar pela centésima vez à Natália quando ela me tentou convencer a sair também nesta noite. O Sr. Gil é daqueles pais chatos, liga ao meu pai de cada vez que ela sai para perguntar se eu fui também. Será que ele acha que nós somos gémeas siamesas? Que uma só pode ir aonde a outra for? Deixe-me contar-lhe uma coisa, Sr. Gil, não é assim, OK? O tempo da escravidão já passou, se você quiser contratar-me para ser dama de companhia da sua filha, pode começar a abrir a carteira. Cinquenta reais por hora, porque só assim dá para ter mão na Natália!

Só que eu acho que, se eu dependesse disso para ganhar dinheiro, podia desistir. A própria Natália tem argumentos bem mais fortes. Em primeiro lugar, a voz fininha dela... à primeira vista toda a gente a acha delicada, mas, ao fim de uns dez minutos, dá vontade de carregar no «stop», já que é tão aguda que a impressão que passa é que nos vai furar os ouvidos! Como se não bastasse, a Natália é filha única. Isto significa que nunca teve um irmão que se recusasse a emprestar-lhe alguma coisa, e com isso ela não desenvolveu a capacidade de aceitar um não.

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Tal como esperado, lá veio ela com a ladainha que eu já sei de cor: – Amanhã é feriado, a gente pode dormir até tarde... – disse ela com a tal vozinha que, a cada segundo, afina mais.

Eu lembrei-lhe que o meu irmão, com certeza, iria apa-recer bem cedinho em minha casa com os meus três sobri-nhos e que a brincadeira preferida deles chama-se acordar a tia Fani.

Aí ela disse: – Mas ontem já ficaste em casa, estivemos aí contigo a ver DVD, ficar o dia inteiro dentro de casa en-velhece...

Eu nem tive tempo de responder, ela continuou: – Se não fores, eu vou ter de mentir ao meu pai, tu vais ter de pedir ao teu pai para mentir também, e tu não queres incentivar tantas mentiras, pois não?

Como se o meu pai fosse mesmo mentir por causa dela. Quando eu recusei e rebati cada um dos argumentos, ela começou a chantagem: – Na boa, OK? Aposto que, se eu pedisse à Júlia, ela ia comigo... mas eu não quero ir com ela, prefiro ir contigo...

Eu disse-lhe que a Júlia tinha viajado para casa dos avós no interior e que era por esse motivo que ela preferia ir co-migo...

Aí ela recorreu a outra estratégia: – Fani! Eu estou com uma premonição! Tenho a certeza de que o amor da tua vida vai estar lá e tu vais perder a oportunidade de o conhecer! Depois vais passar a vida inteira solteirona e solitária, só por-que não quiseste sair comigo esta única noite!

Eu lembrei-lhe que «esta única noite» foi a mesma coisa que ela mencionou nas últimas 78 vezes que tentou conven-cer-me a sair, que esta era a 79.a vez que ela dizia que esta noite ia ser única e que, se o amor da minha vida estivesse num bar, com certeza não seria o amor da minha vida. O ver-dadeiro amor da minha vida naquele momento devia estar em casa, a ler, ou quem sabe a aproveitar a véspera do feriado

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para fazer alguma pesquisa importante na Internet ou nas enciclopédias que ele deve ter...

Quando ela percebeu que eu estava mesmo a falar a sé-rio e que não estava com vontade de sair, resolveu regatear. – Eu pago o táxi sozinha – disse ela com uma voz desespe-rada. – E pago também a tua entrada e o consumo no bar.

Disse-lhe que eu não estava à venda e pronto. Foi aí que ela lançou a cartada final. Começou a chorar e, soluçando, implorou-me, tal como deve ensaiar em frente ao espelho: – Pooor faaaavooooooor... eu não te estaria a pedir se não quisesse muuuuuitoooo ir... o Mateus vai lá estar e vai acabar por ficar com aquela horrorosa da Manuela se eu não estiver lá para impedir... buuuuu...

Este «buuu» é o toque final. Acho que ela leu muitas revistas da Mónica quando era pequena, mas, para não se denunciar, ela não diz «buá», para no «bu», prolonga o «u» e mistura tudo no choro.

Depois disso, cansei-me e resolvi ir, senão ela ia ficar na-quela choradeira a noite inteira, e, se o Mateus ficasse mesmo com a Manuela, ela ia atirar-me isso à cara para o resto da vida!

Troquei depressa de roupa, prendi o cabelo e fui para casa dela, que é na rua logo abaixo da minha.

Quando lá cheguei, a menina estava com o guarda--roupa inteiro espalhado em cima da cama, sem conseguir escolher o que vestir.

Sugeri umas três blusinhas, ela pôs defeitos nas três. En-tão disse-lhe que, se ela não se arranjasse em meio minuto, eu ia-me embora e ela podia até chorar sangue que eu não ia vol-tar atrás. Ela tratou de vestir qualquer coisa, ficou mais montes de tempo na casa de banho a aperaltar-se e, finalmente, pegou na mala. O pai dela passou por nós no corredor e avisou que queria que ela estivesse em casa pontualmente à uma hora da manhã, independentemente do facto de amanhã ser feriado.

Finalmente, conseguimos sair e chegámos à praça de tá-xis. A minha mãe não gosta muito da história de andarmos

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de táxi. Prefere ir levar-nos e buscar-nos. Só que vai levar-nos e buscar-nos a resmungar! Então, quando ela não está em casa, eu acabo por apanhar um táxi. A praça é aqui ao lado, os motoristas todos já me conhecem e, além disso, eu anoto sempre a matrícula e mando como mensagem para o telemó-vel do meu pai.

Quando chegámos ao tal bar, já eram umas dez e meia da noite. Entrámos, avistámos pessoal conhecido, comprá-mos um refrigerante, a Natália fez-me dar umas quinhentas voltas para encontrarmos o Mateus e finalmente lá demos com ele. Estava mesmo em frente às colunas de som, ou seja, o barulho estava de ensurdecer. Eu comecei a refilar, e a Natália resolveu ir lá falar com ele, depois de ensaiar imenso tempo. Eu fiquei surpresa. O Mateus até que foi bem simpá-tico, se é que dá para ser simpático quando se tem de gritar para se ser ouvido. Falou um bocado e, de repente, lembrou que hoje começaria o horário de verão.

– Ih, é agora! – disse ele, mexendo no relógio. – Meia--noite, já está na hora de adiantar uma hora!

A Natália olhou para mim com uma cara de susto tão grande que eu até achei que uma formiga lava-pés lhe es-tivesse a subir pela coxa! Só que então ela virou-se para o Mateus, disse que a gente ia dar uma volta e deixou o rapaz lá, sozinho no meio da pista, a olhar para nós meio sem per-ceber onde é que estava a pressa. Nem eu estava a perceber... até que a Natália, já na porta, me lembrou da imposição do pai de estar em casa à uma da manhã! Com o horário de verão, meia-noite já é à uma hora!

Como eu disse, obrigada, horário de verão! Prometo que nunca mais reclamo da tua existência! Já a Natália deve estar a chorar até agora... no momento em que estávamos a sair do bar, cruzámo-nos com a Manuela, que estava mesmo a chegar! Acho que, em vez de desperdiçar a lábia comigo, a Natália devia era desenvolver uma tática para amansar o pai. A Cinderela já saiu de moda há muito tempo...

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Lucy: Acreditas em amor à primeira vista? Não, aposto que não. Deves ser muito

sensível para isso. Ou já viste alguém e soubeste que, se aquela pessoa realmente te conhecesse, livrar-se-ia, claro, da modelo

perfeita com quem estava e dar-se-ia conta de que eras a pessoa com quem ela queria envelhecer? Alguma vez já te apaixonaste

por alguém com quem nunca conversaste?

(Enquanto dormias)

Eu nem queria acreditar que já era a hora quando acor-dei hoje cedo, aliás, quando fui acordada pela minha mãe, já que o despertador se fartou de tocar e eu nem ouvi. Para mim ainda era plena madrugada, precisava de dormir mais umas duas horas no mínimo! Lembrei-me do tal horário de verão e arrependi-me logo de o ter elogiado tanto.

Depois da saída-relâmpago de domingo à noite, fiquei bem quietinha em casa durante o dia inteiro ontem. Vi uns filmes na televisão, fiz os trabalhos de Física, conversei ao telefone com a Gabi, que ficou montes de tempo a contar--me sobre a viagem dela a Tiradentes, depois fiquei a brin-

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car no Facebook até lá para as oito horas da noite, quando a Natália e a Júlia (que tinha acabado de chegar de viagem) passaram por cá, a perguntar-me se eu não queria ir ao cine-ma com elas.

Não pensei nem meio minuto. A minha relação com o cinema é meio sistemática. Sou louca por filmes. Foi paixão à primeira vista desde a primeira vez em que a minha mãe, quando eu tinha três anos, me levou a mim e ao meu pri-mo para vermos a Branca de Neve. Enquanto o meu primo ficou a chorar com medo da Bruxa Má, eu fiquei a rir-me dele, fascinada com aquele mundo até então desconheci-do, cheio de magia, luzes, cores... e desde aquele dia fiquei viciada. Atualmente, anoto e classifico cada filme que vejo com estrelas – uma para péssimo, duas para mais ou menos, três para bom, quatro para ótimo, cinco para perfeito – e to-dos os que ganham cinco estrelas faço questão de adquirir para o meu maior amor, que é a minha coleção de DVD.

Eles estão enfileirados na minha estante, todos os 55 fil-mes que já tenho. Assisti a cada um deles tantas vezes que cheguei ao ponto de quase decorar as falas. Inclusive anoto todas as minhas frases preferidas ditas por personagens, e – na minha opinião – os melhores livros são os argumentos. A Gabi diz que isso é obsessão, mas o meu pai disse que até é um hobby saudável, que, pelo menos, estou a estimular a imaginação e a criatividade. Mas eu digo-lhe que isto não é apenas um hobby... é vocação. Juro que um dia ainda vou trabalhar em filmes. Serei realizadora ou argumentista. Atriz não, porque sou muito tímida. Mas, com certeza, a minha futura profissão está relacionada com cinema.

Há gente que entra no meu quarto e acha que eu tenho uma loja de aluguer, pedem-me logo um filme emprestado. Digo não sem sequer pestanejar. Não é egoísmo, mas tenho uma história com cada um desses DVD, e ver aquele buraco na estante faz-me ter vontade de ligar de minuto a minuto a perguntar se o filme está bem. Então, prefiro dizer logo que não, aliás, preguei um anúncio na estante:

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NÃO DOU, NÃO EMPRESTO, NÃO VENDO!Mas se quiseres assistir AQUI serás sempre bem-vindo.

Só que ver filmes no cinema é diferente de ver na minha casa. Primeiro, porque as cadeiras – mesmo nas salas mais modernas – são muito desconfortáveis! Quando eu consigo arranjar uma maneira de me sentar em que o meu joelho não bata na cadeira da frente, é a pessoa de trás que fica a bater com o dela na minha. O ar condicionado é tão gelado que eu tenho vontade de levar um cobertorzinho na mala e de me enrolar no meio do filme. Além disso, há sempre um cabeçudo à frente a tapar metade do ecrã. E fora os engraça-dinhos que parece que vão ao cinema para ficar a rir, a fazer palhaçadas para os amigos e a atirar o papel dos rebuçados para o nosso cabelo! Então, sinceramente, se a minha curio-sidade permitisse, eu preferia esperar o filme sair em DVD três meses depois e assistir deitadinha na minha cama, a co-mer brigadeiros, feliz da vida e sem interrupções. Só que eu nunca resisto. Tenho que assistir ao filme na semana em que ele estreia no cinema, senão alguém ainda se põe a contar como é que acaba e estraga a piada toda!

Então, ontem, acabei por aceitar o convite delas (fomos ver Os irmãos Grimm – dei três estrelas), já que ficar o dia inteiro em casa também cansa. Aí, até eu voltar, arrumar o meu material escolar e esperar que o sono chegasse, fui dor-mir quando já eram umas duas da madrugada. Ou seja, fui a babar-me para o colégio hoje.

A primeira aula foi de Educação Religiosa. Eu estava lá, com a cabeça deitada na carteira, a fazer figas para que nin-guém reparasse em mim, quando alguma coisa me bateu no cabelo. Levantei o olhar um bocadinho e vi que era o Leo que me tinha atirado a borracha. A seguir, mandou-me um bilhetinho.

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Oi, Bela Adormecida! Como foi o feriado? Queres ir lanchar ao Gulagulosa? Não achas que a irmã Maria Imaculada está com cara de quem andou na boa vida no feriado? Tu também estás com cara de quem não dormiu... a festa foi boa, não é? Não posso ir viajar que vocês vão logo para a farra! Arranjaste algum namorado para eu encher de porrada?

Ao que eu respondi:

Leo, se queres mesmo saber, realmente não dormi. Mas antes fosse por causa da farra. Já ouviste falar em insónia? É o nome da minha namorada. Mas o que eu queria mesmo ver era essa história de porrada... tu não bates nem nas bolas de bás—quete! Quero saber como estava o Rio. Pelos vistos não tinha muito sol, pois não? OK, vamos ao Gula.

P. S.: Acho que a irmã teve que pagar alguma penitência esta madrugada.

As três aulas até à hora do recreio arrastaram-se. Eu e o Leo fomos os primeiros a sair da sala quando a campainha tocou. Graças à nova associação de estudantes, podemos sair do colégio durante o recreio (ups, intervalo... o Leo chateia--me porque diz que já ninguém diz «recreio» desde a quar-ta classe) e não precisamos de nos submeter àquela comida gordurosa da cantina. Aliás, a cantina anda às moscas desde que abriu um Gulagulosa aqui em frente, o melhor pronto a comer da cidade. O problema é que se perde metade do intervalo na fila e nunca se consegue sentar nas mesas, que estão sempre ocupadas pelos alunos do décimo segundo ano que se baldam às aulas.

Mas hoje, por sorte, a Natália, a Júlia, o Rodrigo e a Pris-cila – que também são do décimo primeiro ano, só que de

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outra turma – já estavam numa mesa porque um professor faltou e eles tiveram o terceiro tempo vago. O Leo, como sempre, pediu tortinha de frango com queijo e uma Coca grande. Não sei como é que ele não engorda. Eu fiquei com o meu tradicional pão de queijo com guaraná diet.

A Natália pôs toda a gente a rir com a nossa saga «táxi--horário de verão-táxi». A Júlia jurou que nunca mais ia dei-xar ninguém arrastá-la para o interior, porque lá não há nada para fazer e ela acaba por perder uns programas fixes como os que eu e a Natália fizemos (acho que puseram alguma coi-sa no refrigerante da Júlia, só pode!). O Rodrigo e a Priscila – que namoram desde os treze anos – também não viajaram e concordaram que a sessão de DVD em minha casa foi o ponto alto do feriado. O Leo foi o que mais aproveitou, ape-sar da chuva que estava no Rio de Janeiro. Contou-nos dos barzinhos, dos filmes que ainda não estão em cartaz aqui, e contou a maior vantagem por ter visto a Luana Piovani no shopping. Ah, pronto, morri de inveja, eu sempre quis ver a Luana Piovani no shopping.

Estávamos a começar a falar da Gabi, imaginando o por-quê de ela não ter aparecido no colégio hoje, quando deu o toque. Eu levantei-me a correr, porque a próxima aula era de Biologia! A Júlia, o Rodrigo e a Priscila nem ligaram, mas eu vi que o Leo e a Natália se entreolharam, como se não estivessem a perceber o motivo da minha pressa.

Entrei na sala e ele já estava sentado. Quando fui para a minha carteira, que fica na penúltima fila, olhei de soslaio e ele estava a olhar para mim. Dei uma risadinha e ele disse: – Olá.

Olá! Ele disse-me olá! Certo, ele podia ter dito «olá, Fani», mas um olá sozinho já é suficientemente bom!

Ele esperou que o resto dos meus colegas entrassem na sala e começou a fazer a chamada. Quando chegou ao meu nome, olhou-me daquela maneira como me olha em todas as aulas – tenho a certeza de que ele só olha assim para mim – e

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eu respondi um «presente» quase inaudível, uma vez que, como ele já me tinha visto, eu não precisava de gritar que es-tava lá. Só que o Leo – que hoje estava sentado à minha fren-te – perguntou se o pão de queijo me tinha feito mal ou coisa parecida, porque eu estava com cara de quem ia desmaiar a qualquer momento. Melga! Bem podia ter dito aquilo mais baixo. Os amigos da Vanessa ficaram todos aos cochichinhos a olhar para mim.

A aula do meu professorzinho acabou, o último tempo foi de Inglês, e o único inglês que estudei foi o da minha atual música preferida, que rabisquei umas vinte vezes na última página do caderno...

«Young teacher, the subject, of school girl fantasy

She wants him, so badly, knows what she wants to be

Inside her, there’s longing, this girl’s an open page

Book marking, she’s so close now, this girl is half his age

Don’t stand so close to me…»

(The Police – Don’t stand so close to me)

Quando eu cheguei a casa, fui a correr ligar à Gabi, para saber porque é que ela tinha faltado à aula, logo hoje. A Gabi é a única que sabe da minha paixão pelo Marquinho e tinha de me ajudar a analisar o que ele quis dizer com aquele «olá» seguido do olhar...

Às vezes acho que o Leo já se apercebeu, até tenho von-tade de lhe contar, mas, por algum motivo, perco sempre a coragem quando vou a falar. Eu sei que ele não ia atrapalhar nem contar a ninguém, fogo, o Leo é o meu melhor amigo desde que eu mudei de colégio!

Na verdade, foi a minha mãe que me mudou. Eu estava muito feliz e satisfeita no meu colégio antigo, e ela veio com

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a conversa: – Nesse teu colégio não passa ninguém nos exa-mes nacionais! Vou matricular-te no colégio da Natália por-que a mãe dela disse que as médias dele são das melhores da cidade! Como as tuas notas são boas mesmo sem pegares nos livros, com certeza é porque esse teu colégio é uma porcaria!

Porcaria é a cabeça da Natália, que passa a aula inteira a pensar no Mateus! Por causa disso depois tem de recuperar o atraso em casa. E, por esse motivo, agora eu tenho de estudar num colégio de freiras.

Não percebo isso de a Natália gostar do Mateus! Ele é tão totó e acha-se o tal só porque passa cinco horas por dia no ginásio! Claro, as pessoas não escolhem de quem gostam, mas a Natália até que podia escolher... ela é toda magrinha, lourinha, baixinha, e tem um cabelão lindo... os rapazes caem-lhe ao colo! Já eu, com este meu biótipo indefinido, até passo despercebida de tão deslavada. Ponho-me a imagi-nar o que as pessoas dizem de mim: – Sabes, a Fani? Aquela meio... assim meio... hum... que tem... ah, aquela rapariga que tem um nome esquisito, sabes?

A Gabi – que não foi à aula porque precisava de repor as forças gastas no feriado (e inventou para a mãe que estava a morrer de cólicas) – não me animou em nada quando lhe contei da cena da aula de hoje.

– Oh, Fani – disse ela –, mas será que ele não diz esse «olá» a toda a gente? E esse tal olhar que tu dizes que ele te lança na altura da chamada, eu acho que ele me lança a mim também... é para verificar se somos mesmo nós a responder e não outra pessoa por nós, caso a gente esteja a faltar à aula...

Odeio a Gabi. Tudo bem que foi ela que resolveu ser minha amiga quando – por azar (ou por sorte, não sei) – eu não fiquei na turma da Natália ao mudar de colégio. Se de-pendesse da minha timidez, até hoje eu não teria amigos ne-nhuns. Então a Gabi apareceu e ofereceu-me os cadernos dela para eu apanhar a matéria... depois contou-me sobre os grupinhos existentes na turma, e até foi ela que me apresen-

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tou ao Leo... mas não sei porque é que ela tem de ser tão realista. Realista, não! Pessimista, isso sim! Ela nem estava lá para ver o tal olhar!

Tenho a certeza de que ele demora o olhar em mim uns dois segundos a mais do que o suficiente para verificar se sou eu que estou a responder à chamada! E tenho a certeza também de que ele só não olha mais para não dar nas vistas... E um dia ainda vou provar isso à Gabi!

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Phil : Alguém me perguntou hoje: «Se pudesse estar em qualquer lugar do mundo,

onde gostaria de estar?» Eu respondi: «Provavelmente aqui mesmo.»

(O feitiço do tempo)

Horários de Fani Castelino Belluz para o segundo semestre:

HORA SEGUNDA TERÇA QUARTA QUINTA SEXTA

6:30 Acordar!! Acordar!! Acordar!! Acordar!! Acordar!!

7:30 Português Ed. Religiosa -- Vago -- Português Informática

8:20 Português Física Matemática Português Matemática

9:10 História Matemática Literatura História Matemática

10:00 Recreio!! Recreio!! Recreio!! Recreio!! Recreio!!

10:20 Química Biologia Geografia Química Geografia

11:10 Inglês Inglês Física Ed. Física Biologia

12:30 Almoço!! Almoço!! Almoço!! Almoço!! Almoço!!

14:00

15:00 A. P. Física A. P. Física

16:00 INGLÊS INGLÊS

17:00 GINÁSIO GINÁSIO GINÁSIO

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A minha mãe estava a levar-me para a aula de Inglês ontem quando veio com uma novidade: – Fani, ontem fui ao aniversário da minha amiga Lourdinha, e o marido dela perguntou-me por ti.

Ela começou a contar o caso e eu nem liguei, já que as pessoas mais velhas têm sempre essa mania de perguntar pelos filhos dos outros. Aumentei o volume do rádio e tentei encontrar uma estação melhor do que a que ela ouve sempre no carro dela.

– Ele quis saber em que nível está o teu inglês, o que pretendes fazer depois dos exames e como vão as tuas notas.

Eu resolvi prestar um pouco mais de atenção, já que es-tava a começar a achar um bocado estranho aquele interesse todo na minha vida.

– Contei-lhe que és uma ótima aluna, nem mencionei a aula particular de Física que resolveste fazer porque sei que isso ainda é consequência do processo de adaptação ao novo colégio. Então ele contou-me que agora é o novo responsá-vel pelo programa de intercâmbio cultural SWEP – Small World Exchange Program e perguntou-me se nunca pensas-te em estudar um ano no estrangeiro. Eu disse-lhe que tu, neste momento, estás muito concentrada nos exames para Direito que vais fazer no próximo ano, mas aí ele disse que o intercâmbio é uma experiência única e que te ajudaria in-clusive na tua futura profissão, já que, além de aprimorares o inglês, adquiririas à-vontade social e capacidade de lidar com o desconhecido. Então eu conversei com o teu pai e...

Já nem ouvi mais nada do que ela disse. Nem discuti pela milésima vez o facto de que eu não vou tentar entrar para Direito como ela quer, mas sim para Cinema. No mo-mento em que ela disse aquelas palavras, tudo parou na mi-nha cabeça. Intercâmbio cultural.

Eu já tive uns colegas que fizeram intercâmbio. Volta-ram com roupas esquisitas e piercings espalhados pelo corpo. Mas contaram que a gente não tem noção de como o mun-

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do é grande, olhando apenas pela janela da nossa casa. Que tudo o que queriam era acabar a escola depressa para tenta-rem voltar para o estrangeiro. E falaram da neve, das folhas secas, de como as cores podem ter nuances que a gente não conhece. Mas lembro-me que aqueles piercings me chama-ram mais a atenção do que as histórias que eles contavam. Será que todos os estudantes de intercâmbio são obrigados a furar-se? Eu morro de medo de agulhas!

Voltei do meu devaneio a tempo de ouvir a minha mãe dizer: – ... então ele marcou a tua entrevista para a próxima quarta-feira, às dezassete horas. Eu sei que tens ginásio a essa hora, mas Estefânia, filha, tens de pensar no teu futuro!

– Eu vou, mãe! – disse eu tão rápido que ela até se as-sustou por termos concordado pelo menos uma vez na vida. Fez aquela expressão que faz sempre quando tem a última palavra numa discussão e deixou-me à porta da minha escola de Inglês.

Antes de descer do carro, para lhe diminuir um pouco o sorrisinho irritante, disse: – Eu concordei em ir à entrevista. Mas, se pensas que estou interessada em largar os meus ami-gos, o meu quarto, a minha vida inteira aqui, ficas a saber que estás completamente enganada. – Eu fechei a porta e ela arrancou, sem sequer esperar que eu entrasse na escola.

Passei o resto do dia a pensar naquilo. Como seria morar noutro país? Como poderia viver em casa de pessoas que não conheço e que não falam a mesma língua que eu? Será que eu conseguiria fazer amigos lá? E os meus amigos daqui, será que me iriam esquecer? E se a minha mãe não se lembrar de dar comida à Josefina, a minha tartaruga? Será que, na cida-de onde eu vier a morar, há cinemas? E se o meu inglês não for suficientemente bom? E o mais importante: será que o Marquinho arranjaria outra aluna para quem olhar daquela maneira como olha para mim?????

Fiquei tão entretida com os meus pensamentos que, quando olhei para o relógio, já era quase hora de jantar e eu

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nem ao menos tinha começado a fazer o trabalho de Infor-mática, que era inventar uns quadros no Excel de vários ta-manhos diferentes. Fiz logo uns três (aproveitei e fiz um com os meus horários para ver se consigo parar de chegar atrasa-da) e aproveitei que já estava no computador para pesquisar na Internet sobre intercâmbio cultural. Encontrei muitos depoimentos interessantes, o que me deixou um bocadinho ansiosa para a tal entrevista de quarta-feira que vem.

Hoje de manhã, no colégio, contei a novidade ao pes-soal. Cada um reagiu de maneira diferente. A Júlia disse que a prima da vizinha dela fez intercâmbio numa cidade no interior da Austrália e odiou! As pessoas da família que a hospedou comiam carne de canguru e feijão doce, e ela só não morreu de fome porque tinha guardado dentro da mala um pacote de bombons e duas garrafas de guaraná que tinha levado para oferecer.

O Rodrigo, pelo contrário, disse que o irmão dele foi para o Canadá e adorou tudo, voltou cheio de equipamentos novos para a banda.

A Priscila comentou que também pensou em fazer inter-câmbio, mas, como no ano que vem vamos estar no décimo segundo ano, o pai dela não deixou por causa dos exames. Eu contei-lhe tudo aquilo que o diretor do SWEP disse à minha mãe, da socialização e aprendizagem do inglês, mas ela disse que o pai dela argumentou que a prioridade da vida dela agora é passar nos exames, que viagens ela pode fazer o resto da vida. Será? Eu acho que exames a gente pode fazer o resto da vida, já viajar de intercâmbio...

Não sei, mas acho que a Natália e a Gabi ficaram com um bocado de inveja. Disseram que têm a certeza de que eu não vou gostar porque sou toda tímida e o mundo é dos desinibidos.

Eu ia começar a replicar, quando o Leo – que estava muito calado, só a ouvir a discussão – perguntou: – Sabes quanto custa uma ligação telefónica para lá?

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Eu respondi-lhe que ainda nem sabia para onde ia, nem se ia.

– Então avisa-me assim que souberes – disse ele, todo sério. – Tenho de começar a poupar.

E, depois disso, entrou na sala sem dizer mais nada.Este Leo é meio maluco. Até parece que ele me vai li-

gar quando eu estiver lá! Ele nunca me telefona aqui... na verdade, sou sempre eu a ligar-lhe para perguntar sobre tra-balhos de grupo, se bem que nem precisava, já que passamos a vida juntos no colégio, tipo, ele senta-se praticamente ao meu lado, e ao fim de semana vamos sempre aos mesmos sítios, e todos os dias recebo um e-mail dele com cada piada mais sem graça do que a outra, e ele é quase tão viciado em filmes como eu, então passa sempre lá por casa sem avisar para pedir um DVD emprestado da minha coleção (e acaba por ficar a vê-lo lá mesmo, já que eu nunca empresto), mas telefonar, acho que ele nunca me telefonou. Diz ele que não gosta muito de falar ao telefone porque não dá para ver a expressão facial da outra pessoa.

O resto da aula passou bem depressa, acho que por causa deste assunto todo do intercâmbio. Eu estava tão concentrada a lembrar-me do que o pessoal disse (Canadá, sim – interior da Austrália, não!) que nem vi o Marquinho entrar na sala. Quando dei por mim, ele já estava a chamar o meu nome, e desta vez eu gritei «presente!» bem alto, mais pelo susto do que para que me ouvisse.

Mas foi quando olhei para ele que esqueci tudo o que tinha na cabeça... ele estava vestido com uma camisa branca, estilo bata, para fora das calças de ganga. O cabelo, como sempre, meio comprido na parte de trás e com aquela franja que lhe cai sempre em cima do olho quando ele faz uma anotação... e a voz... que voz! Como é que eu podia não gos-tar de Biologia antes? Uma matéria tão interessante!

Eu acho que a minha boca ia adorar fazer um intercâm-bio na boca do Marquinho...

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