Upload
duongnhi
View
218
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Projeto: “O Policiamento que a Sociedade Deseja”
Análise das Discussões em Grupo com representantesda Sociedade Civil da Zona Oeste de São Paulo
Viviane Cubas
Foram realizados três grupos focais com moradores da região Oeste da cidade de
São Paulo: o primeiro, com nove participantes, cinco homens e quatro mulheres, contou
com a participação de moradores de bairros de classe média da região do Butantã e Lapa
e de moradores de bairros populares também do Butantã como Jardim D’Abril, João XXIII
e Raposo Tavares. O segundo grupo, com sete participantes, quatro homens e três
mulheres, quase todos moradores de bairros populares da região do Butantã como
Raposo Tavares e Rio Pequeno, região do Jaraguá e Jaguaré. Já o terceiro grupo reuniu
seis moradores, entre eles cinco mulheres, de bairros nobres de São Paulo como Cidade
Jardim, Morumbi e Alto de Pinheiros. Essas diferenças entre os participantes refletiram-se
nas opiniões apresentadas na discussão de alguns temas colocados.
Nas discussões percebeu-se que, para alguns casos, havia uma concordância
quase geral, enquanto que, em outros, as diferenças entre bairros e condições
econômicas pareciam influenciar algumas opiniões.
A região Oeste tem como uma de suas características a proximidade entre bairros
nobres, de classe média, populares e favelas. Por isso, tentou-se obter uma participação
que, sendo a mais abrangente possível, garantisse uma boa representatividade dos
moradores dessa região. Os contatos com os participantes foram conseguidos através
das associações de moradores, e os participantes pertenciam a estas associações.
Para que as a associações indicassem as pessoas que participariam desta
discussão, alguns dos critérios obedecidos foram: enviar pessoas que tivessem alguma
participação nos Conselhos Comunitários de Segurança (Consegs) ou em qualquer
trabalho relacionado à segurança no bairro; ou pessoas que estavam em atividade há
mais tempo nas respectivas associações.
Dessa forma, o perfil dos participantes era o de pessoas que, de alguma maneira,
atuavam no bairro; conheciam e debatiam os problemas locais com outros moradores; e,
em alguns casos, participavam dos Consegs de suas regiões.
Durante o período de contato com as associações existentes na Zona Oeste,
muitas não puderam ser localizadas por causa das alterações dos números de telefones,
e, algumas das associações contatadas disseram que não dispunham de representantes
para participarem destas discussões.
Os grupos reuniram interesses e perspectivas diversas e, deste modo,
apresentaram contribuições que expressam tanto esta diversidade como aquilo que é
compartilhado em relação aos temas tratados.
De maneira geral, pode-se dizer que o problema da insegurança é um dos
incômodos que atingiu a todos, independente do bairro onde vivem. Neste ponto, existiu
unanimidade em relação ao medo da criminalidade e ao trabalho ineficiente prestado
pelas forças policiais. A única diferença que apareceu foi a maneira como cada um
desses moradores, de acordo com seu perfil sócio-econômico, era atingido por essa
violência. Enquanto entre os moradores de bairros populares e de classe média os
principais problemas colocados como causas de insegurança eram consumo e tráfico de
drogas, pequenos delitos, roubos e furtos, os moradores de bairros nobres apontaram
roubos às residências e os seqüestros (relâmpagos ou não) como as principais ameaças.
As preocupações em relação à polícia também foram diferenciadas para estes
dois grupos. Para moradores de bairros populares e de classe média a polícia, quando
percebida como parceira de criminosos locais, representava ameaça. Para moradores de
bairros nobres, a privatização da polícia e a perda do caráter público da segurança eram
as principais fontes de preocupações.
As discussões em grupo demonstraram também que não era a primeira vez que
esses participantes discutiam questões relacionadas à segurança e insegurança. Chamou
atenção a maneira elaborada como a discussão foi desenvolvida o que nos fez pensar
que este tema estava muito presente no dia a dia destes participantes e que, portanto, já
haviam realizado algumas reflexões. Isso ficou particularmente evidente quando foram
apontados os problemas da segurança pública e a discussão sobre a necessidade de
haver um trabalho preventivo efetivo relacionado à violência.
De modo geral, as discussões despertaram grande interesse, principalmente por
ser uma forma pela qual os participantes podiam expor as suas percepções sobre os
problemas relacionados à segurança e propor algumas alternativas. Dos temas, um dos
mais discutidos foi a pouca atenção dada pela polícia aos problemas classificados como
banais. Para vários participantes, os crimes considerados banais, muitas vezes, não eram
coibidos pela polícia. Na opinião destes participantes, era necessário que mesmo os
pequenos delitos fossem coibidos, pois, na maioria das vezes, eram estes delitos quem
contribuíam, com grande força, para o sentimento de insegurança vivido como também
estimulavam a prática de outros crimes.
Para se iniciar a discussão, foi feito um levantamento de como estes participantes
avaliavam a situação de segurança e insegurança em seus bairros. Nesta discussão, os
participantes relacionaram espontaneamente tanto a questão da segurança com o
policiamento, como também com aspectos que não estavam diretamente ligadas às
questões criminais como, por exemplo, a deterioração do espaço público e a carência de
políticas públicas voltadas para jovens. Ou seja, aspectos relacionados à qualidade de
vida da população que estão intrinsecamente relacionados à segurança.
Relatos de experiências que os participantes ou seus conhecidos tiveram com a
polícia também foram mencionados espontaneamente, adiantando o que seria a segunda
etapa de nossa discussão.
O DIAGNÓSTICO: A REGIÃO OESTE SEGUNDO OS SEUS MORADORES
Quando questionados sobre como era a segurança do bairro em que viviam, os
participantes abordaram vários tipos de delitos, concentrando-se naqueles que mais os
incomodam e que eram os principais geradores de insegurança.
Questões relacionadas ao tráfico, ao consumo de drogas e a sua estreita relação com
os jovens foram apontadas como um dos principais motivos de insegurança pelos
participantes moradores dos bairros populares. Este problema também esteve presente
nos bairros mais recentes e ainda pouco habitados.
Para alguns participantes, o uso de drogas contribuía para que os jovens se
tornassem mais agressivos, aumentando, assim, a insegurança. O participante 10,
morador do Rio Pequeno, relatou que o problema das drogas na região o preocupa muito,
pois, por ter filhas adolescentes, temia que alguma delas acabasse se envolvendo com
drogas. Para ele, aqueles que consomem drogas correm mais riscos que aqueles que as
vendem, pois, estes apenas passam pelo local para deixarem as drogas, enquanto que os
usuários eram moradores do bairro e, na sua opinião, eram estes usuários quem
causavam conflitos.
Além dos problemas causados pela presença do comércio e consumo de drogas,
os participantes afirmavam que a inexistência de canais alternativos que pudessem ser
acessados pela população os obrigava a conviver com este problema.
Participante 11 - “Porque o adolescente hoje vive junto. Vocêcoloca os seus filhos para brincar hoje e infelizmente o traficante eo usuário estão ali passando, entendeu? Então, você tem queestar sempre passando para a cabeça dos seus filhos que não éassim, que não é assim, que aquilo é errado. Você tem queprocurar passar enquanto eles são pequenos, porque depois quepassa dos 12 é meio complicado. E hoje também tem aquelenegócio de amigo, né? Amigo leva você para lá e para cá equando você vê... A gente já conheceu bastante gente que hojejá... pessoas que já morreram, que estão presas e que erampessoas de famílias decentes, mas que entraram nesse mundo enão teve volta mais. Então, hoje a gente vive com essa violênciaconstante. A gente que mora lá em 23 blocos e eu, como vice-presidente da Associação, a gente sabe dos problemas. A gentesabe tudo. Então, você não pode fazer nada, entendeu? Porquehoje em dia se falar, você é obrigado a deixar tudo para trás e sairrapidamente de onde você mora. Então, hoje em dia, você éobrigada a conviver.” (Rio Pequeno)
Como neste caso, é enorme o impacto que o consumo de drogas causa entre aqueles
que têm filhos. Quando falam de consumo, os participantes não excluem o tráfico e todas
as implicações que isso traz às famílias a ao bairro onde vivem. Salvo pequenas
exceções, tanto o usuário quanto o traficante representavam ameaça e insegurança aos
pais que se preocupam com os filhos. A drogas representavam duas fontes de
insegurança aos moradores desses bairros: a do tráfico que ameaçava segurança das
pessoas que viviam nessas áreas; e o medo de que seus filhos viessem a se envolver
tanto com a venda quanto com o consumo de drogas.
Entre os participantes moradores de bairros de classe média, o consumo e o
tráfico de drogas apareceu relacionado à prostituição, principalmente nas regiões entre o
Jóquei Clube e Cidade Universitária, nos bairros de Cidade Jardim e Butantã. Segundo
algumas participantes, há 14 anos os moradores da região tentam tirar os travestis da
área, mas não conseguiram e isso causou a desvalorização de imóveis daquela região.
Para os participantes, além dos casos de atentado ao pudor, a prostituição também atraia
o comércio de drogas, existindo inclusive uma estrutura de segurança montada pelos
travestis, com rapazes de moto e que perseguem os clientes que tentam fugir sem pagar
pelos serviços.
A participante 9, que colaborou ativamente do movimento de moradores para a
retirada dos travestis de sua região, disse já ter recebido ameaças de traficantes que
atuam na região. Além disso, disse que os moradores tinham que ficar trancados em casa
por causa dos roubos e assaltos realizados por pessoas que compravam drogas na
avenida. Esta participante relatou que já houve vários pedidos à polícia para que os
travestis fossem retirados de lá, mas, legalmente, não havia nada que permitisse esse
tipo de ação. Para ela, estas condições deixavam a polícia de “mãos atadas” por não
poder fazer nada. Suspeitava ainda que os policiais tinham medo e por isso não agiam
contra os travestis. Ao mesmo tempo uma das participantes afirmou que o problema não
dizia respeito apenas à polícia, mas que era muito difícil envolver outras pessoas na
busca de uma solução.
Além das drogas, outros crimes como roubo, assaltos e seqüestros apareceram
nas falas dos participantes como causadores de sentimento de insegurança. Os
seqüestros estiveram mais presentes, principalmente, nas falas dos moradores de bairros
de classe média e alta.
Para uma das participantes, moradora do Morumbi, os principais problemas que
geravam insegurança no bairro eram os seqüestros e o trânsito de veículos na região, que
foi visto também como um empecilho ao trabalho policial.
Entre os participantes da região do Alto de Pinheiros, o participante 21 afirmou que
a ocorrência de crimes era pequena, mas que alguns casos isolados, de homicídio,
seqüestro e roubos que aconteceram nos últimos tempos foram suficientes para que o
sentimento de insegurança se instalasse. Por isso, a associação a qual pertence está
estudando a proposta de contratar uma empresa de segurança privada para o bairro. A
participante 20, da mesma associação, afirmou que os casos de seqüestro, relâmpagos
ou não, se tornaram mais freqüentes sendo, ela própria, uma das vítimas e citou outros
casos envolvendo pessoas de sua região. A mesma queixa apareceu na fala da
participante 17, moradora do bairro vizinho, Vila Madalena, que também teve a filha vítima
de seqüestro relâmpago.
Entretanto, casos de roubo e de crimes mais graves também apareceram no relato
dos moradores de bairros populares. O participante 3, morador do Jardim D’Abril, afirmou
que na sua região aconteciam vários tipos de crime, inclusive com envolvimento de
policiais. Ainda segundo esse participante, os problemas que aconteciam no seu bairro
eram causados por um grupo pequeno e conhecido de moradores. Mais uma vez, neste
caso, ter de ficar calado para não se envolver em situações ainda mais perigosas foi a
saída encontrada:
Participante 3 - “No meu bairro, nós tivemos problemas de estuproe problemas de homicídio, que agora é moda. No meu bairro,latrocínio é moda e roubo de carro é moda. (...) A políciaarrecadando dinheiro é moda. A gente não tem confiança napolícia... Eu, por exemplo, são poucos os policiais honradosmesmos... aqueles que a gente vê que tem postura mesmo depolícia, entendeu? Então, a gente convive com muitas coisas quea gente, às vezes, tem que até ficar calado, porque se você abre aboca... Você tá ali, convivendo com o pessoal. Sobra pra vocêporque a polícia vai embora e o bandido está ali. Então, nós temosessa dificuldade aí.”
Segundo esta participante, a população deste bairro não só tinha conhecimento
sobre os delitos que aconteciam como não tinha a quem recorrer já que mesmo a polícia
era percebida como conivente com alguns desses delitos.
Espontaneamente, a questão de problemas urbanos associados à violência e
insegurança apareceu nas falas dos participantes. Entre aqueles que vivem em bairros
nobres, vários falaram sobre o não cumprimento das leis de zoneamento e de suas
conseqüências. Os participantes demonstraram que quando estavam pensando sobre
segurança pública, não se fixavam apenas em uma abordagem que enfocava questões
de policiamento, mas também incluíam os problemas urbanos. O desrespeito às leis de
zoneamento, calçadas impedidas, acessos obstruídos, trânsito intenso, acesso aos
túneis, entre outros fatores, influenciavam e propiciavam aumento dos crimes cometidos
nos bairros com esses problemas. Em virtude disso, os participantes colocaram que era
muito importante uma participação mais ativa dos moradores na realização do plano
diretor dos bairros e nas decisões que envolviam os problemas citados, inclusive na
criação de bolsões de ruas, o que, para alguns moradores, seria uma boa opção para
melhorar a segurança. Além disso, falaram da importância que a Companhia de
Engenharia de Tráfego teria nas decisões que envolvem o tráfego, outro fator apontado
como influente na segurança dos moradores:
Participante 21 - “O grande problema é que a CET, que tem afilosofia da tradição que existe na polícia, no funcionalismopúblico... De achar que é um fato consumado não se podereverter. Então, se começa a passar carro numa rua, numa rua“Z1”, só tem casas residenciais e tal, vai a CET e coloca ônibusali. Passa ônibus... No ponto de ônibus o cara põe um Bar...Então, acabou o bairro. E vai o mesmo acontecer pra frente...”(Alto de Pinheiros)
A presença do comércio e de uma intensa vida noturna nestas áreas residenciais
foram vistas como as causas da degradação de várias áreas o que, por sua vez,
aumentavam não só sensação de insegurança como também os casos concretos de
violência na área. Na fala da moradora da Vila Madalena estavam os problemas de
roubos e furtos que aconteciam na região, sobretudo nos finais de semana, por causa da
movimentação noturna nos bares da região. Contou que houve no bairro uma tentativa de
formar um grupo de moradores para contratar os serviços de uma empresa de segurança.
Porém, como foram poucos os que se interessaram, o valor cobrado ficou muito alto e,
hoje, somente algumas casas contam com o serviço. Além disso, falou sobre o problema
dos vigias noturnos que já atuavam há algum tempo no bairro:
“Precisa ter um número mínimo de pessoas interessadas e amaioria ali não se interessa. (A maioria) acredita que tem de serpúblico porque é um absurdo você ter de pagar, além de tudo oque você já paga numa Z1, (sem ter) nenhum benefício por serZ1, só tem despesas... Você não pode despedir aquele “guariteiro”que está lá, senão, ele mesmo, amanhã, volta para te pegar,porque ele vai estar passando fome... Aí você coloca essessistemas mais organizados e ele fica absurdamente caro. Era emtorno, mais ou menos... assim, se tivesse um número mínimo de150 casas, ia sair em torno de 180 reais por mês. Por um carro,fora toda a aparelhagem que você paga em torno de 3 ou 4 milreais por casa... Quer dizer, quem se interessou colocou, quemnão, não. Isso é pessoal de cada um, não é uma coisa que vocêseria obrigada a fazer, porque você já paga para isso.”
Além dos problemas causados pela intensa movimentação de pessoas pelo bairro,
havia os imóveis para fins residenciais que eram ocupados pelo comércio e para
realização de festas e eventos em locais também não permitidos.
Assim como o descaso da prefeitura na fiscalização do uso dos imóveis, algumas
obras públicas, relacionadas ao trânsito, também foram associadas ao aumento da
violência. Para a participante 18, moradora do bairro Cidade Jardim, a construção dos
túneis na região foram determinantes para o aumento dos crimes porque causaram a
deterioração da área:
Participante 18 “...o que acabou com o nosso bairro foram ostúneis. Os túneis foram mal projetados, eles começam em nada edão em nada e nós recebemos agora na Cidade Jardim toda afluência de tráfego que vem de toda parte lá de Vila Andrade,Giovanni Gronchi, toda aquela turma vem todas... Só tem um
lugar de escape. Se der um blecaute em São Paulo acabou,porque eles não tem saída! Eles estão presos porque não existeponte, alças, nada disso. Então, todos descem ou pela Avenidadas Begônias que vai dar no túnel ou pela Oscar Americano, nãotem outra saída no Morumbi inteiro. Então, isso trouxe para obairro, infelizmente, deterioração das casas. E as casas estãoabandonadas, as que dão o lado para a Marginal, então, ali játiveram vários seqüestros, vários assaltos, continuam ocorrendo ena Cidade Jardim, que é aquela Avenida Tajurás, em função docomércio que tem ali, tem uma banca de jornal, um Café, um nãosei o que, e eles sabem que ali é o ponto de chegada de pessoascom o poder aquisitivo alto. Então eles estão nas imediações,pegando todos os filhos que param ali, seguem um quarteirão, efazem o seqüestro relâmpago. Vários jovens já foramseqüestrados, inclusive os meus dois filhos, em épocas diferentes,também já foram seqüestrados nisso de ficar rodando. E elesficam sempre rodando do mesmo jeito, os meus dois filhos... elesentram na Marginal, vão até aonde era o antigo Paes Mendonça,lembra daquele supermercado? Agora eu acho que é o Extra...eles rodam e ficam rodando até fazer... pegar o dinheiro de caixa,depois eles largam os jovens ali, no matagal e ainda falam assim:‘corre, corre, corre, que eu vou atirar pra ver se não pega emvocê’, e eles correm, ficam traumatizadíssimos com essa história.É uma coisa horrorosa! Sempre no mesmo lugar, quer dizer, temuma maneira de você eliminar isso, tirar aquele mato da Marginal,limpar a área. São soluções fáceis, não é difícil de fazer. Só, queeu acho, que precisava de uma pessoa dentro da polícia quecompilasse esses dados: ‘Então, está acontecendo isso? Entãovamos atuar nessa área’. Porque os dados existem, as queixasexistem e as pessoas têm dado queixa. Então, eu acho que éisso, deterioração...”
Essa mesma participante ressaltou que a presença de uma favela na região não
causa problema, pois existem vários trabalhos que são realizados na comunidade. A
principal queixa é realmente o descaso das autoridades por não estarem atuando na
região.
O participante 21, morador do Alto de Pinheiros, disse que em seu bairro também
havia problemas que a polícia não podia resolver por causa da limitação da lei. Disse que
há, por exemplo, problemas com ônibus estacionados irregularmente, mas que a polícia
não podia agir porque não havia nenhuma placa no local dizendo que era proibido
estacionar.
Outro participante (4), também de classe média e morador do Jd. Adalgisa, se
queixou da ocupação realizada por integrantes dos movimentos de sem teto e sem terra
num terreno ao lado de sua residência. Queixou-se também da ausência do Estado para
controlar essa ocupação. Ao seu ver, esta ocupação trouxe problemas para os
moradores, trazendo vários casos de furto às residências do bairro. Segundo este
participante, os furtos eram praticados por jovens, e essa área acabou virando refúgio
para outras pessoas que assaltavam e se escondiam entre as casas montadas pelos
ocupantes. Sua principal queixa, na verdade, era a ausência de policiamento naquela
área apesar dos insistentes pedidos dos moradores.
Quando questionados sobre a segurança, os jovens foi o assunto que mais
marcou a fala dos participantes do segundo grupo. Como apontado anteriormente, para
muitos participantes os jovens eram os principais atores envolvidos com drogas. Além
disso, eram vistos como potencialmente perigosos por se envolverem em pequenos
delitos ou até mesmo em crimes mais graves. Também houve críticas ao Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) que, na opinião de alguns participantes, incentiva a
impunidade, pois na opinião de alguns participantes, este estatuto impedia que a polícia
pudesse atuar contra os menores infratores:
Participante 12 - “Enquanto não houver um política em relação aisso aí, para tratar desse problema a gente vai continuar vivendoda mesma forma que está hoje. Talvez pior daqui a cinco, dezanos. Enquanto a legislação brasileira proteger o menor, porque omenor hoje em dia pode matar, pode consumir droga abertamentena rua e ninguém faz nada... Mas por quê? Porque é menor. Mas,espera aí. O menor está ali. Ele pode matar, pode roubar, podeconsumir droga, pode traficar, pode estuprar e por que ele nãopode assumir responsabilidade perante a sociedade? Acho quedeveria ser revisto isso aí. Porque enquanto não for revisto isso aí,a gente vai estar sofrendo com o mesmo problema deinsegurança.” (Raposo Tavares)
Um dos participantes chegou a afirmar que a maioria dos assaltos em seu bairro
tinha o envolvimento de menores, além do uso que o tráfico fazia desses jovens. Porém,
ao mesmo tempo em que defendia mudanças na legislação para que fossem aplicadas
punições mais severas aos menores, esses mesmos participantes identificavam algumas
causas gerais relacionadas ao problema. Para eles, o envolvimento de jovens com
pequenos crimes era resultado da falta de estrutura familiar e de ausência do estado na
garantia de uma educação de qualidade. Assim, como já foi colocado, para os
participantes a relação entre jovens e drogas era direta.
Em muitos casos estes jovens eram percebidos como potencialmente perigosos
porque, além de serem defendidos pela lei, se envolviam com drogas e, a partir disso,
começavam se envolver também com outros tipos de delito. Segundo os participantes,
alguns desses jovens eram moradores do bairro e, quando estavam sob efeitos de
drogas, realizam pequenos furtos às residências. Outro problema apontado foi a falência
das instituições encarregadas pela reeducação dos menores em conflito com a lei.
Contudo, apesar dessas observações, continuavam defendendo punições mais severas
para os jovens infratores.
Teorias da violênciaAo mesmo tempo em que relatavam as causas da insegurança em seus bairros,
foi possível perceber que em suas falas também estavam presentes discursos, por vezes
bem estruturados, que buscavam explicar a violência.
Um dos principais pontos mencionados para explicar a violência foi a falta de
educação. Pode-se dizer que houve unanimidade entre os participantes em apontar a
falta de educação como uma das principais causas da violência no Brasil. Junto com a
educação, a falta de lazer, trabalho e incentivo aos jovens apareceram como as principais
causas para o ingresso dos jovens no mundo das drogas e do crime. Um dos
participantes, morador da Vila Sônia, enfatizou que os problemas vividos hoje são
resultado de uma cultura da impunidade que vem de muitos anos:
“Não existe segurança no país. Eu sou caminhoneiro, então euando no Brasil todo. Eu saio daqui com a carga, por exemplo, euvou para Recife. Eu tenho que levar, no mínimo, R$ 500,00 emnota de dez, porque cada vez que você pára, o policial te rouba e,se você não paga, você é multado. Você também tem que se livrardos outros bandidos, que são os que vão com a arma... Quandosão os próprios policiais, é falta de cultura. Acho que todas aspessoas, nós como cidadãos, temos que ver isso. É a cultura. Nóssomos da cultura do mais fácil e o mais fácil dá esse problema.Acho que a minha geração, geração 60, é que hoje desaguounessa desgraça que estamos aqui. Foi a geração 60, não era atua, não. Era a minha. Então tem que mudar. Mudar o código, asformas das leis, quando for punido tem que ser punido mesmo, seé seis meses é seis meses, não adianta ... O cara pegou 300anos, nós tivemos um coronel aí de 600, tá na rua! Tem o outroroubou não sei quanto, tá aí também. O outro, roubou e hoje éministro. Então não adianta nada.”
Além da falta de educação, a desestrutura familiar, a violência doméstica e o
consumo de drogas e álcool também foram apontados como causas da violência. A
influência da mídia no aumento da violência também foi mencionada nas discussões.
Ao mesmo tempo em que apontaram possíveis causas da violência, também
apontaram quais poderiam ser as soluções para diminuí-la. Alguns defendiam a
necessidade de mudanças nas leis penais para que sejam incluídas punições mais
severas aos bandidos que, segundo uma das participantes, “não têm medo da polícia”.
Outros discordam dizendo que a lei já existe, que não precisa ser modificada, mas apenas
aplicada de maneira efetiva. A questão dos presídios também apareceu nas discussões.
Da mesma maneira houve uma divisão de opinião entre os participantes. Enquanto alguns
pensam que os presos têm muitas regalias e deveriam ser tratados de maneira mais
rígida, outros defendem que deveria ser realizada uma reestruturação do sistema
prisional. Afirmaram que o sistema deve ter como objetivo a reeducação e a
ressocialização dos detentos e não servir como uma “escola do crime” de onde os presos
saem mais envolvidos com a criminalidade do que quando entraram. Apesar da defesa ao
aumento das penas estar presente no discurso dos participantes, o tema da pena de
morte também surgiu, mas foi colocado como um exemplo de medida que não diminui a
violência ou a criminalidade. Os mesmos participantes que afirmam que os presos
deveriam ter menos regalias também são aqueles que cobram medidas mais enérgicas
dos governantes para as questões de segurança pública, sobretudo uma polícia mais
repressiva.
Os participantes também incluíram a corrupção, em todos os níveis, como uma
das principais causas dos problemas brasileiros, entre eles o da segurança pública. Para
esses participantes a violência só pode ser reduzida depois que o governo conseguir
conter a corrupção e o tráfico de drogas. Além das medidas repressivas, os participantes
destacaram também a necessidade de haver trabalhos preventivos e investimento em
projetos sociais, que incluam principalmente os jovens da periferia para que o
envolvimento com o tráfico de drogas deixe de se apresentar como a única opção de algo
vantajoso a eles. Como afirmou uma das participantes, é necessário que se comece a
investir no ser humano, não apenas na polícia. A participante 7, moradora da Cohab
Raposo Tavares afirmou ainda que toda essa situação de violência acontece porque a
classe média nunca se preocupou em participar de movimentos sociais e em amenizar a
diferença social:
“Porque o marginal hoje está roubando a burguesia? São meusfilhos que estão indo pra assaltar, que estão indo seqüestrarporque o pessoal de classe privilegiada fingia que não acontecia,fingia que não via. O senhor (dirige-se ao participante 4, vizinho àárea ocupada no Jardim Adalgisa) só foi participar no momento
em que bateu na sua porta e é isso que nós não podemos deixarmais acontecer. Existem instituições na periferia que querem fazerum trabalho e que se tivessem 500 reais por mês poderiam fazerum trabalho com essa juventude de prevenção. Então, eu achomuito importante essa conversa aqui, mas, dessa conversa, não ésó fazer esse workshop aí. Não é só isso não. É a gente doButantã se juntar e começar a discutir o Butantã, a cidade de SãoPaulo, o Município de São Paulo, o Brasil e o Mundo... Eu acreditona transformação a partir dessa organização... “
De maneira geral, os participantes entendem que a violência tem raízes na
ineficiência do Estado em garantir os direitos básicos à população. O Estado seria
também responsável quando é conivente por não conseguir coibir a corrupção, sobretudo
entre seus agentes. Os participantes mencionam também questões mais pontuais, que
exigem intervenções sociais, voltadas para a valorização do ser humano. Apesar de
alguns defenderem a adoção de medidas mais rígidas, para a maioria o “endurecimento”
de leis e penas não seriam produtivos. Para estes, a prevenção é a maneira mais justa e
eficaz de controlar a violência.
A atuação da polícia: o seu relacionamento com a comunidade
O tema do policiamento é constantemente relacionado, pelos participantes, à
questão da segurança, principalmente entre os participantes do primeiro grupo da região
Oeste, aquele formado por moradores de bairros de classe média e populares. Quando
indagados sobre a segurança em seus bairros, os participantes falaram,
espontaneamente, sobre o policiamento que é realizado na área e expuseram um pouco a
avaliação que fazem desse serviço. Entre os participantes do último grupo, o
relacionamento entre policiamento e segurança do bairro também foi espontâneo, porém,
neste caso, envolvendo moradores de áreas mais nobres, junto à questão do policiamento
surgiu também o problema da privatização da segurança. A posição dos participantes em
relação à segurança pública é definida de acordo com a avaliação que esses moradores
fazem do trabalho desenvolvido pela polícia como a rapidez e qualidade do atendimento.
De maneira geral, com algumas exceções, os moradores avaliam que o serviço da polícia
não é eficiente porque não atende aos chamados da população, quando atende o
tratamento dispensado não é satisfatório e, por isso, trata-se de um serviço que é
procurado quase que como a última alternativa. No entanto, existem áreas onde os
moradores fazem uma boa avaliação do trabalho da polícia, inclusive relatando a
percepção de uma recente melhora na atuação dos policiais.
No caso da participante 20, moradora do bairro de Pinheiros, de acordo com seu
relato, a polícia está sempre atendendo os casos da região, mas todos sabem que o
efetivo existente não é suficiente para atender a demanda, o que agrava o sentimento de
medo e insegurança das pessoas. A participante 18, moradora do bairro Cidade Jardim
também elogiou o policiamento do bairro dizendo que, hoje os policiais estão melhor
equipados, uniformizados e bem educados. Essa mesma moradora também elogiou o
trabalho do Secretário de Segurança do governo do Estado de São Paulo. Por causa das
ações do Secretário é que ela percebe a melhora na estrutura da polícia que, na sua
opinião, está mais organizada.
Um dos moradores do Butantã, o participante 5, afirmou que o policiamento no seu
bairro também havia melhorado após o estreitamento das relações entre moradores e
polícia. Disse que o atendimento é eficiente, que sempre há viaturas fazendo a ronda na
sua região e que os policiais estão mais bem preparados. Ele diz que antes a população
tinha medo da polícia, que ela era muito corrupta mas que agora ela está melhor
preparada, apesar de dizer que o policiamento nas áreas de periferia possivelmente não
deva ser o mesmo daquele aplicado nas regiões centrais da cidade que são privilegiadas.
A ausência de policiamento em áreas em situações de maior risco de violência
também é outro problema destacado pelos participantes. Para o participante 4, morador
do Jardim Adalgisa, vizinho de um terreno invadido pelos sem teto e sem terra, a maior
dificuldade da associação da qual participava era a de conseguir um policiamento
freqüente no entorno da área de ocupação. Um grupo formado por moradores do bairro,
advogados e integrantes do movimento de ocupação esteve em reunião com
representantes da polícia e da Secretaria de Segurança mas ainda não haviam
conseguido que a reivindicação fosse atendida. O participante citou que os ocupantes do
terreno ficaram surpresos quando foram informados que a reivindicação de policiamento
serviria para garantir a segurança deles também e essa aproximação entre esse morador
e os ocupantes da área, segundo ele, garantiu uma certa proteção pois:
Participante 4: “Eles estavam a poucos metros de mim e não mefaziam mal nenhum. Até hoje, realmente, eu sou um daqueles quepodem dizer que não tive nenhuma agressão física... Em todosmeus vizinhos, pularam muro e roubaram coisas e tudo mais.”
Ainda segundo o participante, além da ameaça que os ocupantes representavam
aos moradores do bairro, havia vários crimes que aconteciam dentro da área de ocupação
e que envolviam os próprios integrantes do movimento. Por toda essa situação, foram
escritos vários textos que foram colocados na imprensa denunciando o descaso do
governo com aquela área.
Para o participante 3, morador do Jardim D’Abril os problemas em relação ao
policiamento no seu bairro acontecem por ele estar situado em uma região de divisa de
municípios. Quando há uma ocorrência, as pessoas que ligam para a polícia têm que
fazer mais de uma ligação até conseguir falar com aquela que é responsável pela área:
Participante 3: “Quando tem alguma ocorrência no bairro a gentesolicita, liga lá 190: ‘Aí, é... DP? E a DP fala: ‘eu não vou porque aíé Osasco’. Daí você fala: ‘Companheiro, eu estou na parte deSão’, ‘Ah! É parte de São Paulo? Só um minutinho’. Esseminutinho leva 10 minutinhos. ‘Ah! Senhor tudo bem, daqui apouquinho eles te ligam de novo, no seu telefone, pra confirmar oendereço’. Quer dizer, até aí a ocorrência já está andando porqueo vagabundo não espera. Ele vem com a ação pra fazer, sai e vaiembora e acabou. Já deixa a desgraça pronta ali e acabou. E nóstemos essa deficiência: a polícia de Osasco não entra em SãoPaulo e a de São Paulo não entra em Osasco mesmo estando oproblema acontecendo...”
Apesar desse problema, o participante afirma que o atendimento prestado pelo
Batalhão, da área pertencente à São Paulo, havia melhorado um pouco por causa da
presença de um coronel que era mais próximo da comunidade e que ouvia os moradores,
mas que o atual comandante é desconhecido.
Entre os participantes do primeiro grupo, um dos principais pontos levantados foi o
descrédito na polícia que realiza a segurança no bairro e a alternativa da segurança
propiciada pelos bandidos da região. Para vários participantes que vivem em bairros
populares, a presença policial é substituída pela presença dos chefes das quadrilhas que
mantêm a “ordem” na área. Os próprios bandidos é que se encarregam de garantir a
proteção no bairro enquanto os moradores temem a polícia. Na verdade, os participantes
percebem que isso representa uma proteção limitada porque os bandidos do bairro
também são temidos, mas impedem que outros bandidos atuem na região e garantem
uma certa tranqüilidade aos moradores. Para os participantes dos bairros João XXIII e da
Cohab Raposo Tavares, o processo de falta de confiança da população no policiamento
local vem ocorrendo há bastante tempo, ao mesmo tempo em que percebem que a
periferia tem problemas mais graves de segurança do que os bairros de classe média. No
bairro da participante 2, a desconfiança na polícia advém da corrupção policial,
principalmente quando ela se envolve com o tráfico de drogas porque isso faz com que os
moradores não tenham como denunciar e coibir que o tráfico atue no bairro. Já a
participante 7, moradora da Cohab Raposo Tavares, relatou de maneira mais detalhada
os problemas de insegurança do seu bairro que envolvem policiais. Os moradores não
confiam mais na polícia “de jeito nenhum” e preferem chamar os bandidos, com quem têm
muito mais proximidade, do que a polícia para solucionar algum problema. A polícia é
chamada somente em último caso, tudo para evitar que os moradores sofram alguma
agressão por parte dela. Ela mesma contou um caso em que:
“Uma amiga minha mora em Pinheiros e foi me visitar. Deixou amoto na porta de casa às onze horas da noite. Quando nóssaímos a moto não estava mais lá. O que eu fiz: chamei amolecadinha que tava ali, falei: ‘Pegou a moto, fica mal e tal, pô.Aqui a minha casa e nanana...’. Uma hora depois, veio ummolequinho empurrando a moto. Ele devolveu a moto. Isso é acoisa mais comum de acontecer na periferia. Isso não é novidadee não é privilégio. Por que? Porque a gente conhece a família, agente sabe quem é. Em casos extremos, a gente chama a polícia.A gente chama a polícia quando tem lá uma turma de dependentequímico que está quebrando orelhão, fazendo arruaça, que táquerendo fazer pedágio, daí a gente chama a polícia. Quando apolícia chega, ela maltrata tanto aquela molecada quanto você,que é morador, que está ali próximo pra receber a polícia e tal:‘Quem você é? Você é do meio?’. Enfim, não existe um respeitoda polícia para com o morador. Você é colocado, em primeirolugar, como culpado. Não tem papo. Você é culpado e acabou.Principalmente na periferia que é formada de negros e já tem acara do pobre. Então, é culpado e pronto. Como é que você vai serelacionar com uma polícia dessas?”
Além de falar sobre o descrédito em relação à polícia, a participante também
críticou à organização policial, apontando que as falhas têm origem em toda um
desarranjo estrutural e de brechas que permitem ações irregulares:
“Pra nós, a gente vê que a polícia não tem comando e que é aoDeus dará. Cada um faz o que quer e da forma que quer. Porque,como é que você coloca um carro da polícia na rua com doispoliciais e não sabe o que eles estão fazendo? Onde eles estãoindo? Que intervenção eles estão fazendo na comunidade? Nãoexiste um controle. Eu não vejo um controle disso. Segundo, nãotem respeito, formação pessoal... O policial aparece e a gente vê
o policial como se ele não tivesse família. Como se ele fosse umcarrasco. Como se fosse pior do que o malandro que tá ali que é oseu vizinho. Matador, porque ele também é um assassino, eletambém mata. Ele não quer saber. Ele não é preparado paraatender a comunidade, pra respeitar a comunidade. Aí, se a gentevai mais longe, o Governo, não existe um respeito do governopara com o contribuinte. Não existe esse respeito. Aí, a questãoda polícia, que é o que está mais próximo da gente, você acabanão tendo como intervir. Você não tem como discutir...”
Diante desse quadro de sentimento de medo, insegurança e ausência de uma
resposta efetiva por parte do Estado, a vigilância privada, realizada pelos guariteiros
pagos pelos moradores de uma rua, foi citada pelos participantes moradores de bairros de
classe média como uma alternativa de reforço da segurança. Apesar desses guariteiros
terem uma estrutura precária, não contando com equipamentos como rádio ou celulares,
essa é uma maneira que esses moradores encontraram para tentar coibir alguns tipos de
crime e para terem maior sensação de proteção.
De maneira geral, os participantes têm consciência do quanto o trabalho da polícia
contribui para o sentimento de segurança e insegurança. A boa polícia resulta na
sensação de segurança enquanto que a má polícia contribui para o sentimento de
insegurança. Esse sentimento de insegurança acontece porque o atendimento não é
satisfatório e isso ocorre por vários motivos: porque não existe policiamento na área,
porque a polícia não atende aos chamados da população, porque quando ela atende não
é eficiente ou, em casos mais graves, porque é conivente com os infratores. Na ausência
do serviço público de qualidade, uma das principais opções adotadas pela população tem
sido a adoção de esquemas privados de vigilância e policiamento.
Em seguida, quando os participantes foram questionados sobre a experiência que
têm com a polícia em seus bairros, focalizaram a discussão na avaliação do atendimento
que a polícia presta em suas regiões, fazendo um balanço sobre os resultados que
tiveram das tentativas de aproximação ou de solicitação do trabalho policial. Em vários
relatos os participantes falaram de suas experiências, mas sem identificarem a qual
polícia estavam se referindo, Militar, Civil ou Municipal. São histórias que, em sua maioria,
demonstram o mau atendimento prestado pelos policiais, o despreparo desses
profissionais e até casos de violência.
Apesar da avaliação negativa, alguns participantes tiveram boas experiências com
a polícia. A participante 17, moradora da Vila Madalena, afirma ter um bom
relacionamento com a Polícia Civil que atende a sua região. Disse que está sempre
presente na DP e, por isso, algumas pessoas pensam até que ela é funcionária, o que faz
com que tenha permissão para colocar o seu carro no estacionamento da delegacia. Já
esteve duas noites de sábado no DP por causa das casas do bairro que são alugadas
para festas e disse que foi muito bem atendida. A avaliação positiva também está
presente na fala da participante 14, moradora do Jaraguá. Ela contou que a polícia que
atende os casos em sua comunidade ainda respeita os moradores, mas que isso
acontece porque se trata de uma comunidade muito organizada.
Entre os participantes que não tiveram experiências positivas com a polícia, houve
relatos interessantes que demonstram que, muitos deles, já tentaram colaborar com a
polícia, chamando-a quando necessário e dando informações. Os relatos mostram que
quando essas pessoas agiram com essa intenção, receberam um péssimo atendimento,
foram mal tratadas ou foram vítimas da violência policial.
O participante 12 relatou suas experiências com a Polícia Civil. Num primeiro caso,
em que sua moto foi roubada, disse que foi muito bem atendido pela polícia. Porém, num
segundo caso, também de roubo de moto, ele contou que foi tratado como criminoso e
que, na delegacia, foi levantada a hipótese dele próprio ter envolvimento com os ladrões e
que estaria registrando a queixa para tentar se isentar de qualquer culpa. Depois deste
segundo episódio ele resolveu vender a sua moto e passou a tomar maiores cuidados,
evitando sair de casa à noite, deixando de freqüentar alguns lugares, preferindo apenas
locais já conhecidos. O participante também falou sobre a dificuldade que uma pessoa
enfrenta quando vai procurar a polícia, porque a vítima se expõe e não há a certeza de
que o caso será solucionado e ela ainda pode ser acusada injustamente.
No caso da participante 11, moradora do Rio Pequeno, ela afirma que em sua
comunidade é preferível que a polícia nem seja chamada para atender as ocorrências,
apenas em casos extremos em que não haja outra alternativa. Isso porque ela e seu
marido tiveram problemas por terem denunciado a presença de um veículo
aparentemente abandonado. Ela contou que havia um carro abandonado próximo a sua
residência e que seu marido resolveu fazer uma denúncia à polícia para que
averiguassem se o veículo era roubado. Alguns dias depois, os policiais foram até a
residência da participante para interrogar seu marido. Ela conta que, além do
constrangimento sofrido, outro problema foi o fato dos traficantes do local ficarem
sabendo que a polícia esteve lá e que isso poderia gerar conflitos entre sua família e as
pessoas envolvidas no tráfico.
Outra participante, 13, moradora do Jaraguá, contou um episódio que sugere um
despreparo dos policiais para lidarem com certas ocorrências. Segundo a participante, ela
e uma amiga tinham ido ao cinema quando uma delas percebeu que havia um grupo de
rapazes armado. Sua amiga resolveu contar ao policial o que tinha visto e, logo em
seguida, o policial a pegou pelo braço, a levou junto ao grupo e pediu que ela confirmasse
que a pessoa que estava armada era realmente aquela. Segundo a participante:
“Ele pegou no braço da minha colega e falou: ‘É esseaqui?’(risos), ‘É esse aqui que você estava falando?’. (...) Ela ficouvermelha... Os caras lá e ela não falou mais nada. Ficou vermelhae não falou mais nada. Aí, ela ficou sem saber o que falar. Pegou,olhou para ela e depois saiu. Ela sentou do meu lado e eu disse:‘Agora também eu vou morrer’ (risos) porque se ela sentou domeu lado. Ele vai ver que também sou amiga... Terminamos ofilme e deixamos eles saírem primeiro e a gente foi no meio damultidão. Se a multidão fosse para outro lugar, a gente ia também.Se não fosse para a casa da gente, a gente não ia. A polícia nãoestá preparada. Pegar a pessoa e mostrar ao bandido: ‘esse aqui?‘“
Isso mostra que, ao mesmo tempo em que a polícia reclama da falta de
cooperação da comunidade para a resolução dos casos, os participantes sugerem que
essa hesitação da população decorre de experiências negativas. Segundo os relatos aqui
apresentados, quando a população tenta ajudar a polícia, dando informações e indicando
os casos que deveriam ser investigados, com freqüência esta colaboração não é bem
recebida e em alguns casos, essas mesmas pessoas foram submetidas à situações
embaraçosas. Ao invés de serem vistas como colaboradoras essas pessoas é que foram
alvo da polícia ou tiveram a sua iniciativa exposta àqueles que estavam sendo
denunciados.
Além de acabarem virando vítimas do despreparo policial, os participantes
relataram casos que demonstram a frustração da população quando a polícia lhes nega
atendimento.
O participante 12, morador do bairro Raposo Tavares, contou que houve um caso
em que um homem tentou roubar o carro que estava na garagem de sua residência e,
momentos mais tarde, quando a polícia chegou, ele pediu aos policiais que fizessem uma
ronda pela área porque o ladrão tinha acabado de sair dali. Mesmo passando todos os
detalhes e dizendo que poderia reconhecer a pessoa, os policiais disseram que ele
deveria se encaminhar à delegacia. Esse caso reforçou a opinião do participante,
segundo a qual a maioria dos policiais é corrupta, podendo ser comprada com pouco
dinheiro e que a dificuldade de pessoas “mais simples” serem atendidas e respeitadas
pela polícia é ainda maior que aquela de outras condições sociais. Contou ainda que
presenciou um roubo na Avenida Sumaré no qual os assaltantes, armados, fizeram os
ocupantes de um carro saírem e levaram o veículo. Logo em frente o participante disse
que viu um policial parado em um posto de gasolina e pediu que ele fosse atrás dos
assaltantes ou que pedisse ajuda pelo rádio. O policial disse que não poderia fazer nada,
que não tinha uma viatura disponível, ignorando o pedido de ajuda.
Os participantes foram quase unânimes, principalmente os pertencentes aos dois
primeiros grupos, formados por moradores de bairros de classe média e populares, ao
afirmarem que a polícia só é procurada pela população como o último recurso. Com
sabem que não serão bem tratados, essas pessoas recorrem à polícia somente quando
são atingidas diretamente por algum problema que requer o trabalho policial. Nas
discussões realizadas, houve relatos sobre pessoas que foram vítimas da violência
policial, entre elas, um dos participantes.
Os casos de abordagem violenta feita pela polícia também são freqüentes,
principalmente na fala dos moradores de bairros populares. A moradora da Cohab
Raposo Tavares, participante 7, relatou um caso de abuso policial. Segundo ela, em seu
bairro, um casal foi abordado pela polícia, dentro de uma pizzaria. Não é possível
identificar exatamente qual força policial que praticou as agressões relatadas, somente
que a Polícia Civil recomendou que a vítima não registrasse a ocorrência:
“Chegaram os policiais e mandou todo mundo por a mão nacabeça... Toda aquela humilhação que todo mundo sabe que elesfazem mesmo... O marido da menina, que tem cabelo comprido,ele trabalha com artes plásticas e não sei o que... pelo fato delefalar pro policial que ele era trabalhador, não precisava serempurrado... Foi espancado de uma forma covarde! Covarde! Foipara a delegacia, aquela delegacia que tem perto de você... fazerum BO. A delegada falou para ele pensar se ele queria fazer. Ocara estava todo machucado. Inclusive, ele foi bater na minhacasa. Aí, a gente foi procurar uns amigos que era escrivão e quetrabalha na polícia pra saber se a gente deveria ir naCorregedoria. Ele falou: ‘Olha, você pode ir dar parte, mas fiquesabendo que você vai ser perseguido e vai ter que mudar delugar...’. Pô! Se o cara não tem nem onde morar, mora de favor oumora numa ocupação, vai enfrentar a polícia? Vai enfrentarcomo?”
Os participantes também relataram casos de violência e abuso policial envolvendo
pessoas de suas comunidades ou elas próprias. Um dos casos foi apresentado pelo
participante 2, líder comunitário no João XXIII, que foi vítima de uma abordagem violenta
realizada por policiais, durante a noite, em frente à sua casa. Disse que tentou se
identificar como o presidente da associação do bairro, fato que foi ignorado pelos policiais,
foi revistado e ameaçado com uma arma. O participante observa ainda que:
“Quer dizer: um puta desrespeito porque, pra começar, se fosseuma polícia que conhecesse a comunidade, devia conhecer aliderança da comunidade. Isso precisava? Aquele lá é fulano, aliderança da comunidade... Quando eu falar: “Não, eu sou...”, iamolhar e pensar: “Não, eu tô conhecendo”. Eles não procuram fazerisso e eu acho que eles têm muito mais amizade com abandidagem do que com as pessoas de bem do bairro...”
Além da violência, a negligência por parte da polícia também esteve presente na
fala dos participantes. São casos em que há a estreita observância das normas por parte
de alguns policiais, em detrimento do bem estar da população. No caso do Jd. D’ Abril, o
participante 3 disse que os moradores conhecem as pessoas que causam problemas no
bairro. Há um rapaz que a família mora há anos no bairro, todos sabem que ele está
envolvido em vários assaltos mas nada pode ser feito. Contou que, durante um assalto a
uma padaria, realizado pela “garotada” do bairro, ele telefonou para o Copom, de um
orelhão próximo ao local do assalto. Como esse telefone está localizado em Osasco, os
policiais chegaram e se recusaram a atender a ocorrência porque não poderiam atuar
foram do limite do município pois a padaria está localizada em São Paulo. Quando uma
nova viatura foi enviada, mais de uma hora depois do assalto, os policiais abordaram o
participante 3 e o dono da padaria e os revistaram. Apesar das vítimas do assalto darem
informações aos policiais, eles apenas deram algumas voltas pelo bairro e foram embora
porque o turno deles estava acabando. Ainda sobre os garotos que se envolvem em
assaltos o participante contou que:
“Nós já vimos situações que a polícia parou e enquadrou ele.Pegou ele armado, tomou a arma, deu uns tapas na cabeça delee mandou ele embora... Ele ainda sai e tirou o sarro: ‘Pô! Os carasme deram prejuízo’.”
Além da violência direta exercida pela polícia, em alguns bairros ela também
demonstra não estar preocupada em prender as pessoas que cometem os delitos em
determinadas áreas e até serem coniventes com os infratores. Por essas experiências o
participante diz que prefere a polícia da década de 80, mais repressiva, que “não trocava
muita idéia não, já mandava logo pro saco e pronto”. A participante 7 responde a essa
afirmação dizendo que essa polícia já existe, que moradores da periferia são
assassinados diariamente e que a pena de morte é aplicada.
Mesmo diante de relatos de constrangimento da população diante da polícia, os
participantes também aprofundaram os problemas que atingem a própria corporação.
Desenvolveram a idéia de que as falhas da estrutura policial impedem a eficiência da
polícia. Um dos participantes contou sua experiência na qual pode perceber a
desorganização do sistema policial e a humilhação à qual os próprios policiais são
submetidos pelo seu comando, apontando dois problemas. A estrutura da PM e a
submissão à qual os policiais estão sujeitos que, segundo este participante, impede que
eles tenham apoio de sua própria corporação para atuarem na repressão ao crime e os
sujeita ao destrato dos superiores para com os subordinados. Em segundo, destacou a
falta de comunicação entre a alta cúpula e a base da PM. Enquanto os chefes afirmam
que o trabalho ocorre de uma maneira, os executantes estão agindo de outra. O
participante chegou a essas conclusões após entrar em contato com a Secretaria de
Segurança Pública para o caso do terreno invadido:
“Ele duvidou, assim, na cara do que nós estávamos dizendo. Orepresentante da SSP dizia que recebia o relatório sobre asrondas que eram realizadas naquela região. Porém, os moradoresestavam lá para dizer que não havia policiamento algum. Só maiseste fato: houve então todo o procedimento um mês depois dadesocupação. Coisa de 500 policiais, com todo aquele aparato.500 policiais ficaram de prontidão como no exército. Assim, aquelegrupo em fila indiana, etc e tal... Eles chegaram lá 5 ou 6 horas damanhã. Ficaram lá olhando os sem terra e o que eles fizeram?Uma barreira humana com mulheres e crianças e humilharamaté... o máximo possível... Às 4 horas da tarde eles receberamuma ordem, vindo não sei de onde: Não, olha, vai pra casa. Então,eu vi a fisionomia desses homens. Policiais que chegaram às 4 ou5 da manhã, eles devem ter levantado às três para estar lá e às 4horas da tarde alguém fala: ‘Turma, vamos embora pra casa’.Foram humilhados, o pessoal jogava ovo, banana... Como é quefica a pessoa do policial sabendo que ele levantou as 3 da manhãpra fazer uma ação que já tinha a assinatura do juiz e estava tudodefinido? E, alguém, politicamente: ‘Pera aí, vamos deixar, fazsemana que vem...’ Então, temos que dividir muito bem: temosque cobrar responsabilidades das camadas superiores da polícia,dos coronéis e tal... que simplesmente fajutam os relatórios e comisso eu acho que metade dos policiais vão se tornar gente como agente...”
Para esse mesmo participante, há momentos em que os policiais ficam impedidos
de executarem seu trabalho de maneira satisfatória. Relatou que o terreno que foi
ocupado próximo a sua casa virou local para esconderijo de bandidos e, segundo ele, a
polícia não tem permissão para entrar nessa área. Contou que houve um caso de assalto
em que os policiais perseguiram um veículo que acabou entrando nessa área, os
moradores puxaram uma corda e impediram que a polícia continuasse a perseguição.
Todo esse caso foi transmitido por um canal de TV e segundo o participante:
“Então, o helicóptero desse programa filmou a corrida e filmoueles entrando lá dentro. Depois, rapidamente, eles mandaram umrepórter para falar com as pessoas. O repórter falou com opolicial: ‘Escuta seu sargento, vocês não vão entrar aí?’. ‘Não.Não, precisa ver... Estamos aguardando ordens pra entrada’.Então, o repórter começou a entrevistar os mandantes dos semterra e a resposta foi essa: ‘Nós temos um acordo com o governoe aqui é proibido vocês entrarem...’ Então, imaginem o impasse:16 policiais, um sargento ou dois, sei lá, os mandantes lá dapolícia querendo entrar na área, uma corda e um monte de gentefechando a entrada... Então, você imagina a pressão psicológicaque esses policiais passaram em não poder entrar porque osbandidos falaram: ‘Não, aqui vocês não podem entrar’. E orepórter instigando: ‘não, pera aí...’ O carro ficou filmando láhoras, a polícia também ficou por lá até que teve uma hora queeles tiveram ordem de voltar pra trás outra vez.”
Além de todas as deficiências apontadas no trabalho policial, os participantes
falaram sobre as deficiências materiais e sobre o processo de privatização pelo qual a
polícia vem passando, os quais perceberam a partir das experiências que tiveram com a
polícia de seus bairros.
A falta de condições materiais e recursos humanos foi colocada como um dos
pontos que dificultam o trabalho da PM. De maneira geral, a polícia atende as solicitações
na área da Vila Madalena, segundo a participante 17, moradora desse bairro. Porém, a
carência de viaturas e de policiais disponíveis para atenderem aos chamados faz com que
a população não tenha o serviço no momento necessário, sobretudo no período noturno
que é quando acontecem os problemas no bairro. Apesar de terem conseguido um
policiamento mais constante na área de uma escola do bairro, a participante 17 contou
que esses policiais são muito inexperientes e que quando surge um problema telefonam
para ela ou para uma outra integrante da associação de moradores.
Para a participante 22, moradora do bairro do Morumbi a relação entre população
e PM passa por um processo de privatização. Ela explica que os moradores do bairro
estão fazendo contato diretamente com o comandante da área para estabelecerem
“contratos individuais” de serviço:
“Então, eles começam a trabalhar só com a segurança privadaoficial. Dessa forma, e é isso que eu venho batendo, a segurançaprivada oficial está se instituindo cada vez mais, de forma aprejudicar uma população toda. Nós temos tido problemasincríveis. Se alguém de Paraisópolis ligar e pedir, ou mesmo lá daSuperquadra Morumbi, eles não vão. Mas, se alguém de nívelbom tiver contato com eles, tiver um telefone direto, inclusive, emalguns lugares, chegaram a comprar celular para os policiais, paraque os policiais diretamente atendessem a eles. Então, táhavendo isso, os comandantes de companhias são donos deempresas privadas, muitos!?! Alguns tomam conta... dividem aárea. Eu estou sabendo que existe comandante que toma contado Carrefour, o outro toma conta de Extra, o outro toma contadisso e eu já vi várias vezes carro de Polícia encostado dentro doExtra Morumbi, escondido. Quer dizer, está fazendo segurançaprivada. Isso, para nós, é terrível porque estão desviando afunção.”
Essa mesma participante falou sobre sua experiência, nas reuniões de Conseg e
na Comissão de Segurança da Assembléia Legislativa sobre a participação de
representantes da segurança privada, num período próximo às eleições. Por isso ela
ressaltou que a população deve estar mais atenta às políticas públicas e à legislação
porque muitas irregularidades têm início nessa esfera.
A participante 17, proprietária de uma empresa de transporte, completa que o
problema não é apenas a privatização da segurança pública ou o envolvimento de
policiais com a segurança privada. Para ela há inclusive o envolvimento de policiais com
as Seguradoras:
“Olha, nós temos empresa de transporte. Eu não preciso nem tefalar para vocês o que temos passado, nos últimos 3 anos, emrelação a roubo de cargas. (...) Nós tivemos, no ano passado só(...), 14 caminhões roubados com carga e tudo que tem direito.Inclusive, num dos casos, o motorista morreu. Então, você estáfalando que existe Delegado que diz que é babá de preso, não. Euacho que existe alguma coisa muito maior por trás, porque,infelizmente, a gente tem de conviver com isso. Não é só umaempresa de Segurança ali ou um morador que tem uma afinidademaior ou tem um celular direto com qualquer Coronel. Mesmoporque, o meu vizinho é Coronel, e a casa dele já foi assaltada 2
vezes. A coisa é um pouco... sabe? Não é bem... não sei, vocêdesculpa, eu não estou lá dentro para saber, estou falando defora, né... E a gente vê que tem Seguradora no meio.”
E a participante 22, moradora do Morumbi completa afirmando que:
“Com relação à Seguradora, é o seguinte: quando é roubado oseu carro, já tem alguém ligando e dizendo: ‘Eu sou da empresatal, se você quiser eu acho o seu carro, você me paga tanto e tal’.E ninguém sabe disso? Você só deu a notícia para a Polícia.Como é que ele está sabendo disso? Entendeu? Existe uma máfiapor de trás de tudo, é uma corrupção. A gente sempre fala nasreuniões:’“Gente, Polícia Privada, esse pessoal é perigoso. Alémde tudo não tem poder de oficial’. Então, a gente prestigia o oficial,cobra do oficial e supervisiona o trabalho dele que é melhor.Quando a sociedade organizada fizer isso vai ter...”
O ponto em comum entre os participantes é o fato de todos reconhecerem que o
trabalho prestado pela polícia é insatisfatório. O que aparece de forma menos
contundente entre alguns participantes é a percepção que a polícia trata a população de
modo diferente, melhor ou pior, de acordo com a condição econômica de cada um. Esse
ponto foi levantado pelos participantes de forma espontânea. Enquanto os moradores de
bairros nobres reclamam do serviço ineficiente da polícia, os moradores de bairros
populares não só têm a mesma queixa como também relatam que são agredidos por ela,
o que os leva a perceber diferenças no tratamento.
Para o participante 12, morador do Raposo Tavares, no Brasil, a polícia trata de
maneira diferente ricos e pobres. Segundo ele, num bairro popular a polícia age de
maneira agressiva e não respeita a individualidade dos moradores, enquanto que, num
bairro de classe média, age educadamente e pedindo licença para entrar nas residências
e isso é um dos motivos da má fama da polícia. Isso foi confirmado pela participante 22,
moradora do Morumbi, que disse que sempre sabe dos casos de maus tratos policias
contra os moradores da favela de Paraisópolis e que a polícia não age da mesma maneia
com os moradores do Morumbi. Outra participante disse que além da classe econômica, a
faixa etária também é determinante no tratamento dispensado pelos policiais e que os
jovens são alvo da violência policial. Ela contou que sua casa é muito freqüentada por
jovens de várias idades, amigos de seus filhos e que o que ela percebe é que dentro
desse grupo, as garotas não têm muitos problemas enquanto que os meninos,
independente de classe econômica são sempre mal tratados.
Parcerias polícia e comunidadeQuando questionados sobre parcerias atuais ou passadas entre comunidade e
polícia, o principal trabalho lembrado e citado pelos participantes foi o Conseg –
Conselhos de Segurança. Nas falas há elogios e críticas às pessoas que atuam e à forma
de trabalho realizada pelo Conselho.
Os participantes 14, 15 e 22 fazem uma avaliação boa do trabalho desenvolvido
pelos Consegs de seus bairros. Esses casos são aqueles em que a população conseguiu
estabelecer um canal de diálogo com a polícia e onde alguns avanços na segurança já
puderam ser constatados. No bairro do Jaraguá várias melhorias foram conseguidas
depois do início do trabalho do Conseg, que atua em parceria com a Associação e possui
um posto policial móvel e policiamento comunitário. Nas duas escolas do bairro a
presença policial também é constante e, segundo a participante dessa região, o policial “é
amigo dos alunos” e não está lá para reprimi-los, mas para desenvolver um trabalho com
eles. O vínculo entre a comunidade e os policiais do Conseg nesse bairro é algo bem
estabelecido, já que nessa comunidade eles têm acesso a um telefone direto para
contatar a polícia. Por causa dessa relação mais estreita, os participantes consideram que
os casos de violência no bairro são menos freqüentes, de menor gravidade e sabem que
podem contar com a polícia no monitoramento das atividades e festas que são realizadas
na comunidade. Ao mesmo tempo que a parceria entre a comunidade e a associação tem
rendido algumas melhoras na questão da segurança, algumas pessoas da comunidade
ainda têm receio quanto a presença constante da polícia:
“Festas juninas, por exemplo, a gente liga, não pra eles irem láassustar ninguém, mas para dar uma passada. Eu ainda acreditoque ele possa vir, como eu diria, não para assustar, mas quemsabe impor um pouco de respeito, porque se eu mesma nãoacreditar que ele possa fazer isso eu vou me vestir de farda e voupara rua. O meu filho, quando tinha 4 anos, dizia: ‘olha a polícia,vai matar’, eu falei ‘polícia não é só para matar, polícia é pra isso,isso e isso’. Então, a geração já vem com essa idéia de que apolícia é para matar também. Os nossos conceitos, valores forammudando. Mas, nós temos um trabalho com o Conseg e tem dadocerto. Inclusive, essa diretoria que ganhou ontem vai estartrabalhando para trazer um posto móvel e já deixou bem claro quenão é para assustar ninguém, é só para manter a ordem para quea coisa não extrapole. Porque lá é um ponto pequeno, umacidadezinha, bairro pequeno, mas já tem droga por tudo que écanto! Você olha para cara de um e não sabe quem é drogado.Olha na cara do outro e não sabe quem é o traficante. A políciainfiltrada, quem sabe, diminui isso.”
O participante 15 também afirmou que a parceria entre associação e Conseg já
conseguiu desenvolver alguns trabalhos em seu bairro. A associação de moradores do
Jaguaré, em conjunto com os comerciantes de uma área do bairro, construiu com
recursos próprios, um local onde deveria ser instalado um posto policial. O posto
funcionou apenas no início e, atualmente, está abandonado mesmo tendo uma boa infra
estrutura. O participante contou que a polícia alega que as viaturas têm que ficar
percorrendo o bairro e não podem ficar paradas naquele posto. Apesar desse trabalho
não ter surtido efeito, o participante diz que as reuniões são realizadas periodicamente,
que o policiais são muito atuantes, participam das reuniões e conseguem desenvolver
algumas iniciativas dentro do que é possível para eles.
A participante 22 ressalta a importância de se promover uma aproximação entre
população e polícia para melhorias da segurança pública e a necessidade de se
formalizar as iniciativas de parceria já existentes para atribuir a elas o caráter institucional.
Como o funcionamento do Conseg é resultado de um decreto Lei, do ex-governador
Montoro, a participante relatou sobre a requisição que os participantes do Conseg fizeram
para que a Assembléia Legislativa regulamentasse o Conseg em lei e que não tinham
sido atendidos:
“A gente pediu nesse ano para que a Assembléia regulamentasseem Lei. Isso tem que vir do executivo, do governador. O que foifeito foi uma barbaridade. Entrou na pauta uma coisa totalmentelouca, que não dava nem para ler. Então nós tivemos de pedir queentrasse um complemento e isso não foi porque retiraram dapauta. Então, não há interesse do próprio Governo em que apopulação trabalhe melhor com a segurança. Porque nós somospopulação, nós somos representantes da população, osPresidentes de Conseg e os Consegs a representam. Mas, nãoexiste boa vontade política e, por detrás, tem uma grande massade corrupção, corrupção política também.”
Essa mesma participante falou sobre as dificuldades que os participantes do
Conseg enfrentam. Umas dessas dificuldades são os constantes pedidos de doação que
a polícia faz aos moradores do bairro. Constantemente há reclamações por parte dos
policiais de que as viaturas estão quebradas ou que não há material para trabalhar e os
moradores acabam colaborando financeiramente para contornar esses problemas mas,
às vezes, duvidam da veracidade da história. Segundo a participante, houve uma matéria
veiculada na Rede Globo mostrando que havia material disponível para as polícias e que
o problema era que os responsáveis pelas requisições não estavam enviando os pedidos
e o material ficava guardado. Isso criava um mal estar entre os participantes do Conseg
porque nas reuniões os policiais diziam uma coisa e a reportagem dizia outra. Na sua
opinião, as reuniões realizadas pelo Conseg têm se tornado o espaço para desabafo e
para as reclamações dos próprios policiais. A participante acrescentou que o governo não
dá apoio aos Consegs. Segundo ela, a estrutura é precária, são apenas três pessoas: um
PM, um PC e o próprio assessor do Secretário de Segurança que coordenam os Consegs
e, por isso, eles estão sempre inacessíveis para os presidentes dos Consegs.
Outros participantes afirmaram que não tiveram experiências muito produtivas com
o Conseg. O participante 3, morador do Jd. D’Abril, disse que em seu bairro o Conseg não
trouxe nenhuma melhoria porque as pessoas que dele participam não conhecem a
realidade do bairro e porque, na verdade, não há uma discussão entre polícia e
comunidade sobre os problemas de segurança. Outra participante, 7, moradora da Cohab
Raposo Tavares, também afirmou que não participaria do Conseg em seu bairro porque,
partindo da experiência de seus conhecidos, percebeu que não há mudanças nem
melhorias na região. O participante 2, morador do bairro João XXIII disse que o Conseg
da sua região também não funciona. A tentativa de aproximar a população da polícia não
aconteceu, segundo ele, porque a polícia tem ligação com os traficantes do bairro e, por
isso, também evitam qualquer contato com as lideranças da comunidade.
Outro trabalho de aproximação da polícia com a comunidade e que foi elogiado
pelos participantes das discussões foi o Proerd – Programa Educacional de Resistência
às Drogas e à Violência, desenvolvido pela Polícia Militar. Apesar da avaliação positiva do
conteúdo do curso e da iniciativa, houve críticas à forma como o projeto foi conduzido. Um
dos participantes, morador do Jd. D’Abril, falou sobre a experiência de sua filha que teve o
curso ministrado por PMs em sua escola e elogiou a iniciativa. Porém, outra participante,
7, moradora da Cohab Raposo Tavares, disse que esse mesmo trabalho não teve
continuidade na escola da sua comunidade e, por isso, não surtiu efeito. Ela afirmou que
esse contato se deu apenas no período do curso e depois dele os policiais não voltaram
mais. Para ela a discussão foi limitada porque não deveria envolver apenas os alunos das
escolas, mas também os pais e a comunidade porque a questão das drogas não está
restrita à escola. Esta participante mostrou sua insatisfação ao afirmar que além desse
trabalho, já havia participado de várias tentativas de aproximação entre comunidade e
polícia e que nenhuma delas tinha dado algum resultado.
Além do Conseg e Proerd, os participantes apontaram outras parcerias que têm
por objetivo a aproximação entre comunidade e polícia. Na maioria dos casos são
reuniões realizadas entre as lideranças locais e representantes da polícia. O participante
5, morador do Butantã disse que a Associação da qual participa, há seis anos, tem boas
relações com a PM e que os representantes conheciam não só os policiais que atuavam
na área mas também o comando. Isso possibilitou troca de informações e uma melhora
no relacionamento entre polícia e população. Por conta dessa proximidade ele diz que o
bairro tem um bom policiamento e que o atendimento é satisfatório. A participante 11,
moradora do Rio Pequeno, não soube afirmar com certeza mas disse que ouviu que,
como seu bairro não tem um posto fixo da polícia, alguns moradores e comerciantes da
região estão tentando trazer para o bairro um posto da polícia comunitária e que já foram
realizadas várias reuniões para discutir a viabilidade do projeto. A participante 17,
moradora da Vila Madalena disse que os moradores da região estão freqüentemente
realizando reuniões com a Polícia Militar, principalmente com os integrantes do posto que
fica localizado no Parque Villa Lobos.
Outros participantes demonstraram que têm um envolvimento mais profundo com
a polícia e participam de vários eventos. A participante 22 tem intensa participação em
trabalhos conjuntos entre a polícia e a sua comunidade. Além de ser membro de uma
associação que tem representantes de vários bairros da região oeste de São Paulo e tem
sede no mesmo espaço onde funciona o Conseg Morumbi, ela já participou de
seminários, fóruns, palestras e reuniões, participou de projetos relacionados à Polícia Civil
com a comunidade e disse estar estudando, mais profundamente, os problemas da
polícia. Foi uma das idealizadoras de um evento que teve a participação de ONGs,
entidades de bairro e departamentos das polícias Civil e Militar. O objetivo desse evento
foi o de aproximar a polícia da comunidade e apresentar a ela quais são e como
funcionam os órgãos da polícia. Desta experiência ela afirma que foi muito difícil ter o
apoio das polícias porque houve muita demora na confirmação da participação no evento
e pelo pouco interesse que demonstraram.
Outra participante, 9, também moradora do Butantã, há 13 anos participa de
trabalhos voltados para a polícia e, atualmente, faz parte de uma comissão de valorização
e motivação de policiais e da comissão de polícia comunitária da Zona Oeste. Ela
explicou que a estrutura hierárquica submete alguns policiais a situações muito
constrangedoras e que muitos deles se sentem desmoralizados em determinadas
situações, o que leva a uma falta de motivação no trabalho. A participante disse que
procurou o Instituto de Psicologia da USP para que eles fossem parceiros num projeto
para levar atendimento psicológico para as delegacias. Em uma DP e no Batalhão da PM
foi iniciado um trabalho de escuta psicológica que atende às vítimas de qualquer tipo de
violência e também aos policiais.
Em termos gerais, há alguns temas que marcam o contato que a população tem
com a polícia. Com exceção a alguns casos, o que predomina na fala dos participantes é
a ineficiência, um serviço de má qualidade, agressividade e até mesmo a perda do papel
de agente público da segurança. Tendo como fundamento as colocações dos
participantes, parece haver alguns fatores que determinam, na maioria dos casos, o
relacionamento da população com a polícia. O fator dinheiro esteve presente em várias
falas. Tanto os moradores de bairros populares quanto alguns moradores de bairros
nobres compartilham a idéia de que as pessoas de classes econômicas mais baixas
recebem, com mais freqüência, um mau tratamento da polícia. Isso inclui a falta de
atendimento ou até mesmo o uso da violência e a percepção do envolvimento de policiais
com os criminosos. Por isso, para boa parte dessas pessoas, a polícia tornou-se uma
estância à qual se recorre apenas quando não há mais nenhuma outra opção. No caso
dos moradores de bairros nobres, o mau atendimento fica restrito ao serviço ineficaz, que
não produz resultados. Faz-se exceção apenas ao tratamento diferenciado que a polícia
dá aos jovens, independente de sua condição econômica.
Outro fator importante é a existência de um relacionamento prévio com a polícia,
que pode ocorrer de duas maneiras. Quando existem boas relações com alguém da
chefia da polícia ou quando a relação é resultado da atuação em trabalhos feitos em
parceria, entre polícia e comunidade. Conhecer pessoas que tenham alguma influência
dentro da polícia, ou simplesmente ter contato com algum policial de sua região, pode ser
o meio de se conseguir um atendimento “especial”, ou seja, um atendimento como
deveria ser o tratamento usual. Ao mesmo tempo, conhecer mais profundamente como
funciona o trabalho da polícia e ter algum envolvimento em assuntos referentes a
segurança pública permite que as pessoas desenvolvam maior confiança no trabalho da
polícia e, como mostram os depoimentos dos participantes, faz com que tenham uma
opinião mais otimista desse trabalho. Enquanto algumas pessoas já desistiram de
qualquer iniciativa, desestimulados por experiências anteriores, para pensar em melhoras
para a segurança pública, muitos dos participantes ainda tentam fazer alguma coisa para
mudar esse quadro. Dentre estes, os que conseguiram efetivar alguma parceria com a
polícia e a têm como algo mais próximo no dia a dia são os que conseguem ter uma visão
mais detalhada e mais positiva do trabalho policial.
A polícia desejadaA parte final da discussão procurou explorar o que os participantes entendem por
um policiamento ideal e que expusessem como deveria ser realizado esse policiamento.
Porém, ao invés de falarem sobre como seria esse policiamento, os participantes fizeram
o processo inverso, partiram do modelo oposto, de como o policiamento não deveria ser.
Dentro desse raciocínio, colocaram em evidência o policiamento atual e, diante das
experiências que já tiveram com essa polícia, afirmam que ela não deveria ser como é
hoje. Os participantes não expuseram qual modelo gostariam de ver implementado,
apenas expuseram as características que essa polícia desejada pela população deveria
ter e ressaltaram a certeza de que o modelo adotado atualmente não é o ideal. Ao
desenvolver as idéias sobre o policiamento desejado, os participantes acabaram expondo,
implicitamente ou explicitamente suas teorias e seus conceitos sobre a polícia.
De maneira geral, os participantes gostariam que a polícia fosse totalmente
voltada para o policiamento comunitário. O que eles entendem por policiamento
comunitário é, uma polícia que esteja presente no bairro, realizando um policiamento
preventivo e ostensivo. Para isso, ela não só conheceria as pessoas desse bairro como
contaria com a participação delas para as discussões sobre a segurança da área. Trata-
se também de uma polícia educada, eficaz e ágil, que atende a todos da mesma maneira
e é respeitada pela comunidade ao mesmo tempo em que a respeita. É também uma
polícia reconhecida por seu treinamento de qualidade e pelo uso de técnicas modernas e
seguras.
Para os participantes dos três grupos focais, a corrupção é um dos principais
problemas do Brasil porque está presente nas mais diversas esferas institucionais e em
todos os níveis. Consideram que a população brasileira aceita e participa da corrupção e
que, em determinadas situações, a corrupção é vista como a forma “natural” de
funcionamento de algumas instituições, entre elas, a polícia. Ou seja, para os
participantes a polícia é corrupta porque os brasileiros são corruptos. Essa corrupção
generalizada é que faz com que os policiais tratem de maneira diferenciada pessoa
pobres ou ricas e que participem dos negócios de tráfico e crime organizado. Isso acaba
resultando na descrença generalizada de que nada pode ser feito para solucionar os
problemas, do Brasil e da polícia. Apesar dessa grande descrença, vários participantes
sugeriram medidas que ajudariam melhorar o problema da segurança pública.
Dentro da questão do policiamento ideal, enquanto alguns participantes deram
ênfase a aspectos que dizem respeito à relação entre polícia e comunidade, dizendo
como eles gostariam que a polícia tratasse a população, outros enfatizaram aspectos da
estrutura policial, apontando como deveria ser essa estrutura ou os equipamentos
utilizados pela polícia.
O envolvimento da polícia com a comunidade na qual presta seus serviços e a
qualidade desses serviços são os pontos centrais dos relatos dos participantes. Em todos
os grupos ficou claro que a população deseja um policiamento no qual possa confiar, e à
qual possa procurar quando precisar. Essa polícia seria uma polícia de confiança da
população porque seria formada por policiais que conheceriam, não só as pessoas que
vivem no bairro, como também participariam das discussões e saberiam onde estão os
principais focos de insegurança na área onde atuam. Os comandantes da polícia também
teriam um importante papel na participação dessas discussões, ouvindo o que a
população tem a dizer e ajudando a colocar em prática as suas sugestões. Isso, segundo
os participantes, são mudanças que poderiam ser implementadas de maneira rápida.
Para alguns participantes esta participação da população deveria abranger até mesmo a
escolha dos policiais que fariam a segurança do bairro, essa atividade deveria ficar a
cargo da associação de moradores que teria a autonomia para “eleger” os policiais
comunitários que atuariam na região do bairro.
O participante 2 acrescentou que não apenas os responsáveis pela segurança
deveriam participar das discussões, mas também os secretários de várias áreas, do
Município e do Estado porque, na sua opinião, é necessário “envolver a questão social”,
caso contrário, de nada adiantará melhorar a polícia. O participante ressaltou que a
preocupação em relação à segurança não se restringe apenas à polícia, mas a todas as
medidas tomadas pelos governantes. Ainda nesse mesmo sentido, o participante 21 falou
que as forças deveriam ser sistematizadas para que vários órgãos do governo
participassem da discussão sobre segurança. Ele considera que dessa maneira, com a
participação dos guardas metropolitanos e dos “marronzinhos”, a discussão poderia ser
mais ampla e poderia apresentar propostas mais coerentes. Outro item apontado foi a
inclusão dos planos diretores da cidade na discussão sobre segurança. Os participantes
entendem que esses planos afetam pontos importantes que têm grande impacto na
segurança da cidade. Nesse sentido, para a participante 22, é necessário que o governo
se empenhe em efetivar as políticas públicas e que a população possa participar desse
processo.
Ainda no tocante ao relacionamento entre polícia e comunidade, a polícia que os
participantes desejam é aquela que trata com educação todas as pessoas que a
procuram e que desempenha sua tarefa com habilidade e agilidade. No entanto, a
experiência dos participantes aponta que isso não ocorre quando precisam procurar a
polícia. Um dos participantes afirma que o tipo de atendimento prestado pela polícia
depende de relações pessoais. Conhecer alguém da polícia, sobretudo alguém dos altos
escalões, é uma garantia de um bom atendimento. Em caso contrário, quando não há
nenhum tipo de influência, muitas pessoas nem se preocupam em registrar as ocorrências
e desistem de procurar a polícia para evitar constrangimentos. Como relatou na
discussão:
Participante 12: “Enquanto isso não mudar, o que acontece? Apopulação não tem nenhuma crença na polícia, a população nãoacredita. Acontece vários e vários casos e a população não vainem registrar porque, chega lá, é capaz de virar vítima porque sãotão, vamos dizer assim, desvalorizados como pessoa que se elefalar qualquer coisa lá, se alterar a voz, é capaz de ficar preso ládentro. Aí vem a ação da polícia. Por exemplo, o policial,infelizmente, é assim: quando ele coloca a farda, revólver na cintaele é um rei... Não é assim! Ele tem aquela farda para agir comocidadão e para defender a população e não usar aquilo comoforma de agredir as pessoas... Isso é o que a população sente. Agente sabe disso e conversa com a maioria da população. Temtanta, tem tanta gente que tem medo de falar com policial...Infelizmente é isso. E vem dizer que a polícia mudou. Não mudounada. Porque dependendo do que você vai conversar com umpolicial, ele é capaz de agredir você.”
Para quase todos os participantes, essa relação entre polícia e comunidade só
pode ser efetivada através do policiamento comunitário. Pelas definições dos
participantes, esse policiamento seria, em sua essência, realizado por policiais mais bem
treinados, que atuariam numa determinada área, que teriam conhecimento da população
dessa área e que pensaria a questão da segurança a partir da colaboração dos líderes
locais. A participante 22, moradora do Morumbi, falou sobre as dificuldades de ser
implementado esse tipo de trabalho na polícia brasileira. Segundo ela, a própria polícia já
faz um recorte daqueles que teriam o perfil adequado para trabalharem no policiamento
comunitário. Não é algo incorporado a toda a estrutura policial, porque se trata de uma
filosofia que é aplicada apenas a um grupo que é treinado para atuar especificamente na
polícia comunitária. Isso divide a polícia entre aqueles que recebem um treinamento
voltado para o policiamento comunitário e aqueles que não têm nenhuma ênfase na
questão da relação polícia e comunidade. Além disso, a mesma participante pensa que
muitos jovens que resolvem ingressar na polícia já fazem essa opção com o objetivo de
ter uma remuneração garantida sem muita cobrança e de ter a possibilidade de ganhos
extras, sem se preocuparem em terem um comprometimento com a comunidade.
Os participantes entendem que a relação estreita entre polícia e comunidade será
um meio de criar uma cumplicidade entre os dois, o que acaba tendo dupla função:
facilitar o trabalho policial e proporcionar maior sentimento de segurança à população. O
participante 1, morador da Lapa, destacou a importância do respeito mútuo entre polícia e
comunidade para que seja desenvolvido um bom trabalho. Para ele, o policial ideal é
aquele que é respeitado pela comunidade, porém, para que isso aconteça o polícia
também deve demonstrar respeito a essa mesma comunidade. Como exemplo, o
participante cita a polícia dos Estados Unidos.
“O policial é respeitado quando ele para alguém. Se ele tocar asirene, todo mundo já sabe que é pra encostar. Só que ele é umcidadão educado, te trata com respeito, com dignidade, porém éfirme. Quando você vai contra argumentar alguma coisa ele nãoaceita. Por que não aceita? Porque ele conhece a lei, ele temformação, ele é bem formado e bem informado. Então, quando eleparou você é porque ele já tem a sua multa pronta na mão, se forno caso trânsito, já tem a sua ficha na mão. Então, para ele nãoresta nenhuma dúvida. Ele é um cidadão absolutamente beminformado e quando ele te parou é porque ele já constatou suainfração, já registrou sua infração, já deixou pronto aquilo e sóparou pra notificá-lo. ‘Está aqui a sua multa, o senhor precisaassinar e depois recolher isso aqui’. Quando eu vou contraargumentar só tem duas interpretações: ou estou afrontando ouestou querendo suborná-lo. Então, quando a gente vê aquelahistorinha que a gente vê em filme: ‘O senhor tem direito de ficarcalado e tudo o que disser poderá ser usado contra sua pessoa’, éuma realidade porque ele é preparado pra isso. Esse deveria ser overdadeiro policial que nós deveríamos ter.”
Outros participantes não conseguiram definir como seria essa polícia ideal, apenas
deram sugestões de que ela deveria ser diferente da que existe. A participante 11,
moradora do Rio Pequeno, afirmou que a polícia ideal deveria ser “um sonho”. Quando
questionada para que definisse essa polícia do “sonho”, outro participante, 12,
interrompeu dizendo que essa polícia seria como a do Canadá. Uma polícia que dá um
bom tratamento às pessoas que a procuram, sobretudo quando se trata de pessoas mais
humildes e que não atua de maneira personalista, tratando a todos da mesma maneira.
Ao invés de existirem duas polícias, uma para pobres e outra para ricos, para todos os
participantes a polícia deve ser ágil e educada com todos, sem distinção. Dentro disso, foi
lembrada a importância de ser trabalhada a questão da discriminação racial entre os
policiais como forma de criar e solidificar uma conscientização entre eles. Com isso, todos
se sentiriam motivados a irem até uma delegacia para registrarem as ocorrências porque
perceberiam que essa é uma ação válida que pode trazer algum retorno, algum resultado.
Os participantes deram sugestões não só sobre o tratamento que os policiais
devem dar à população como também sobre a estratégia do policiamento. Nesse aspecto,
o destaque fica para uma estrutura que privilegie o policiamento na rua. Para tanto, a
polícia deveria disponibilizar mais homens para o policiamento de rua porque é muito
mais barato agir de forma preventiva do que ter que deslocar um grande efetivo para
atender uma ocorrência. Ao mesmo tempo, isso também é importante, segundo os
participantes, porque se o policial estiver na rua, conhecerá as pessoas da comunidade
onde vai estar atuando e isso permite que ele desenvolva um trabalho de melhor
qualidade. O policiamento ideal é aquele realizado pelos policiais que conhecem a região,
que fazem o policiamento a pé e conhecem todos os moradores e comerciantes da
região. Sugerem ainda os participantes que esse policiamento seja realizado por uma
dupla desarmada, responsável por um determinado setor do bairro, portando apenas
rádio para comunicação e cassetete.
A participante 9 também concorda com esse tipo de policiamento. Reafirma que o
policiamento tem que ser preventivo e ostensivo e que para o policiamento comunitário
poder ser implementado é necessário que sejam realizadas algumas mudanças na
legislação, no entanto, a participante não especificou quais seriam essas mudanças.
O policiamento ideal, pensando na realidade brasileira segundo os participantes
seria o policiamento realmente ostensivo, com policiais presentes nas ruas e respeitados
pelas pessoas. A participante 18 afirmou que essa polícia deveria ser mais agressiva, não
no sentido da violência física, mas de uma presença mais incisiva. Nesse momento o
participante 21 fez uma brincadeira, dizendo que a participante estava querendo a Rota
na rua, ao que ela reagiu dizendo:
“Não. Rota, não. Mas eu quero o policial na rua.”
Outro empecilho para a efetivação de um bom policiamento no Brasil, segundo o
relato dos participantes, é a separação das polícias. A unificação é vista como algo
indispensável para melhorar a comunicação dentro da própria polícia, acabar com o “jogo
de empurra – empurra” e com a competição entre os policiais.
A formação dos policiais também foi apresentada pelos participantes como um
ponto importante a ser melhorado. Destacaram a necessidade da polícia propiciar
treinamento mais moderno e adequado às funções que os policiais exercem e a
importância de um acompanhamento psicológico para os policiais. O treinamento que os
policiais recebem foi colocado como algo que não se encaixa nos moldes dessa polícia
desejada. Esse seria um fator fundamental, pois os participantes pensam que muitos
policiais não agem corretamente porque não foram suficientemente treinados. Ao mesmo
tempo ressaltaram outras questões referentes à estrutura física das delegacias que não
têm instalações adequadas para atender o público.
Novamente, nessa discussão, voltou à tona a necessidade do policial conhecer o
bairro no qual presta serviço, conhecer a comunidade e as famílias que ali vivem e
participar das atividades promovidas pelas instituições locais para que possa discutir com
a população os problemas do bairro. Nesse novo formato de policiamento, nos moldes do
policiamento comunitário, uma das participantes sugere que até mesmo a farda deva ser
modificada para representar que se trata de uma nova polícia. De maneira geral, melhorar
a instrução e a formação dos policiais é peça chave, segundo os participantes, para a
efetivação do policiamento de qualidade, além da introdução de equipamentos modernos
que permitam às delegacias sistematizar as informações trabalhadas.
As polícias estrangeiras também foram colocadas como aquelas que deveriam
servir como exemplo de bom policiamento para a polícia brasileira. A polícia inglesa foi
citada pelos participantes porque é uma polícia que anda desarmada e, ao mesmo tempo,
tem o respeito da população. Na discussão do terceiro grupo focal, vários participantes
começaram a falar da polícia de países da Europa e da polícia norte americana, até que a
discussão foi interrompida quando uma das participantes colocou que não é possível
fazer comparação entre as polícias de países diferentes porque as realidades são
diferentes. Um dos pontos ressaltados foi o fato de a polícia estrangeira não usar armas.
Entretanto, os participantes perceberam que isso seria impossível no Brasil por causa do
uso se armas, muitas vezes pesadas, pelos infratores.
Para os participantes, a polícia deve ser democrática e séria, mas para que isso
aconteça é necessário que os maus policiais sejam afastados e que fiquem apenas
aqueles que cumprem as leis. Afirmaram que, ao que parece, não existe um código de
ética rígido nas polícias, o que permite que seus agentes ajam de maneira arbitrária com
a população que, por sua vez, não conhece seus direitos e se deixa desrespeitar. Por
isso, foi colocado a necessidade de serem adotadas regras mais rígidas para os policiais
que cometem algum delito como forma de coibir que as regras sejam desrespeitadas
pelos próprios policiais.
“Mas a nossa polícia, acredito que para funcionar melhor deveriater um código de ética e alguém para fiscalizar isso: ‘Olha tem quefazer isso, isso e isso. Você tem que atender a população assim,assim, assado. Não atendeu? Você está exonerado, está fora dacorporação, não é assim que a gente quer um policial’, ‘Ah, maseu ganho pouco’, ‘Você acha que você pode ganhar mais? Vaitrabalhar numa outra profissão qualquer. Vai ganhar mais lá fora.Aqui você tem que respeitar a população, está aqui para darproteção.’ Agora, a partir do momento que a população não sesente protegida, como em alguns casos aqui citados,principalmente em bairros de periferia, a população se sente maissegura com a proteção de um criminoso, de um traficante,bandido, do que com a própria polícia. Por quê? Porque a polícianão dá exemplo.”
A isso, acrescentaram que o problema da polícia não ser satisfatória está
relacionado a um fator mais amplo. A falta de educação e de um ensino de qualidade
estaria na base da formação desses maus policiais. Essa é uma questão que os
participantes percebem como muito prejudicial no Brasil, a baixa instrução e a falta de
informação das pessoas, inclusive das polícias. Nesse sentido, o investimento na
educação dos policiais foi algo que apareceu como necessário mas aplicável apenas a
longo prazo.
A escolha dos governantes também foi apontada como algo fundamental para que
haja a melhoria no policiamento. Os participantes fazem relação direta entre o governador
e a segurança pública e como o voto pode mudar a direção das políticas públicas
referentes à segurança. Para que as mudanças se concretizem, os participantes afirmam
que as mudanças têm que começar de cima para baixo, dos governantes, dos mais altos
escalões da polícia para baixo.
Além da unificação das polícias, a desmilitarização surgiu, também de forma
espontânea, nas discussões. O participante 15, morador do Jaguaré, falou que é
fundamental que seja realizada a desmilitarização da polícia brasileira para que o policial
não veja o cidadão como um inimigo de guerra. Também foram feitas críticas à estrutura
policial e à sua hierarquia o que incluiu a discrepância entre os salários de praças e
oficiais. Num momento de saudosismo, este participante disse que gostaria que voltasse
a existir uma polícia civil, como a do início dos anos 60, “amiga do povo” a qual, segundo
o participante 16, “era uma beleza”. Para alguns participantes, a efetivação de mudanças
na forma do policiamento só é possível com a alteração dessas estruturas.
De maneira geral, os participantes apontam que as falhas estruturais da polícia e
as políticas públicas de segurança deficientes é que impedem a existência de um bom
policiamento. Está claro para os participantes que o problema não é algo isolado, mas
causado por uma estrutura que não inova na formação de seus policiais, que não os
motiva e que marca profundas desigualdades entre seus próprios membros. Essa mesma
estrutura também não é eficaz em inibir a má conduta dos policiais.
A participante 7, moradora da Cohab Raposo Tavares, afirma que há muito tempo
participa dos movimentos e de reuniões com a intenção de fazer com que algumas
mudanças sejam concretizadas. No entanto, para ela, a falência do funcionalismo público
e falta de perspectivas das pessoas prejudica essa concretização. Ao mesmo tempo em
que ela critica essa estrutura, inclusive os baixos salários, percebe que isso não é motivo
suficiente que justifique o trabalho ruim prestado pela polícia.
“Tem essa coisa do funcionário público, instituição falida, e não vaimudar nada mesmo, não adianta nada mesmo... Agora, eutambém penso assim quando você é um profissional e fala assim:‘Você é a faxineira?’ Você fala: ‘Eu sou faxineira e vou trabalharna faxina na casa do Fulano...’ Pô, eu tenho que ir lá e fazer umexcelente trabalho... mas o Fulano paga 10 reais e a diária é 50?Mais eu estou indo pra ganhar 10 reais e isso não impede que eufaça um excelente trabalho porque eu tenho responsabilidade noque eu estou fazendo. É o que eu não sinto... Então, tudo bemque o policial ganha pouco, mora não sei aonde, mas nada paramim justifica a partir do momento que você escolhe uma profissãopara tocar aí a sua vida.”
A questão salarial dos policiais proporcionou uma discussão intensa entre os
participantes. Mesmo sabendo dos baixos salários pagos aos policiais, os participantes
têm consciência de que, antes de tudo, está a responsabilidade e o comprometimento de
pessoas que se propuseram a desenvolver um trabalho. Ao mesmo tempo, compararam a
média do salário dos policiais com o salário de qualquer outro trabalhador com a mesma
qualificação e perceberam que não é tão baixo assim e que mesmo em outros países o
policial tem um salário proporcional à média da população. No caso do Brasil, segundo o
participante 12, todos ganham mal, não apenas os policiais. Segundo a participante 22,
uma pessoa, com o ensino médio concluído, pode entrar na Polícia Militar ganhando R$
1.200,00 por mês, entretanto o salário não seria o mesmo se essa pessoa tentasse um
emprego em uma empresa privada. Ao final da discussão os participantes concluíram que
a relação entre tempo de estudo e salário, nesse caso, mostra que a polícia não é tão mal
remunerada quanto se pensa.
Os participantes do grupo focal com moradores de bairros de classe média alta
foram os únicos que elogiaram e fizeram uma avaliação positiva do atual governador do
Estado de São Paulo em relação à segurança pública. Para eles, o governador tem feito
um bom trabalho e isso se evidencia nos elogios aos equipamentos como veículos,
coletes e armas que a polícia tem recebido. Isso significa, para os participantes, que o
governo está investindo dinheiro na segurança e dando uma boa estrutura de trabalho
para a polícia. No entanto, a participante 17 ressaltou que, apesar de ter feito grandes
investimento na polícia, o governo Covas teria tirado a “autoridade” do policial por que
estaria obrigando os policiais a adotarem regras de conduta nas ações.
“O Covas colocou bastante dinheiro na Polícia, mas ele, de umacerta maneira, tirou a autoridade do policial. Eu não sei se estoufalando bobagem, mas estou falando o que eu enxerguei. Mas é ahistória que o policial tem de chegar no bandido: ‘oh, meuqueridinho, entra direitinho no carro. Abaixe a cabeça para nãobater... Cuidado, filhinho, vai bater a cabecinha...’ Era mais oumenos assim. Eu acho que ele tirou muito a autoridade do policial.O Alckmin segue a mesma linha do Covas, só que já é uma coisamuito melhorada. Uma coisa que já vem dando essa autoridadepara o policial. É claro que tem de ser uma autoridade semexcesso, ninguém está falando aqui em violência.”
De forma resumida, pode-se dizer que a população reclama por um policiamento
público e de qualidade. Para isso, percebem como necessário a aproximação entre polícia
e comunidade, o envolvimento de outros setores do governo e não apenas daqueles que
estão diretamente relacionados à questão da segurança, a melhora das condições de
trabalho e formação dos policiais e a promoção da unificação das polícias. De maneira
muito clara, os participantes demonstraram que têm consciência de que as mudanças
dependem de vontade política. Ao mesmo tempo, sabem que a opinião da população é
fundamental e, por isso, não apenas esperam pela efetivação de um novo modelo, mas
aguardam a oportunidade de poderem participar da construção do policiamento que
desejam.