13
CAPíTULO 10 PLANEJAMENTO A fase de planejamento é de extrema importância para o sucesso da campanha. Sua principal função é construir os "pilares" sobre os quais se assentará toda a solução de comunicação para o anunciante. Caso algum desses pilares não esteja bem edificado, toda a campanha pode desabar. Infelizmente, ainda é da cultura do brasileiro dar menor importância à fase do planejamento. Porém, é bom lembrar uma vez mais que a publicidade não é arte, e a ciência da administração tem mostrado que o fee/ing e o improviso podem ser excelentes virtudes para artistas e jogadores de futebol, mas não no mundo dos negócios. O profissional de planejamento deve ter conhecimentos sólidos de marketing, pois seu trabalho é uma extensão do planejamento mercadológico.do anunciante. Como já foi dito, a publicidade é uma das atividades utilizadas pela empresa para atingir os seus objetivos de mercado. Segundo Sant'Anna (1982), o profissional apenas deve ter o cuidado para não tomar decisões que sobreponham ao plano de marketing do anunciante ou se prender na coleta e sistematização de informações que o anunciante já saiba de antemão (daí a insistência: um briefing bem realizado evita esses inconvenientes).

Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Unique Selling Proposition SANTOS, Gilmar. Princípios da publicidade. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2005. 229p.

Citation preview

Page 1: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

CAPíTULO 10

PLANEJAMENTO

A fase de planejamento é de extrema importância para o sucesso dacampanha. Sua principal função é construir os "pilares" sobre os quais seassentará toda a solução de comunicação para o anunciante. Caso algumdesses pilares não esteja bem edificado, toda a campanha pode desabar.Infelizmente, ainda é da cultura do brasileiro dar menor importância àfase do planejamento. Porém, é bom lembrar uma vez mais que apublicidade não é arte, e a ciência da administração tem mostrado que ofee/ing e o improviso podem ser excelentes virtudes para artistas ejogadores de futebol, mas não no mundo dos negócios.

O profissional de planejamento deve ter conhecimentos sólidos demarketing, pois seu trabalho é uma extensão do planejamentomercadológico.do anunciante. Como já foi dito, a publicidade é uma dasatividades utilizadas pela empresa para atingir os seus objetivos demercado. Segundo Sant'Anna (1982), o profissional apenas deve ter ocuidado para não tomar decisões que sobreponham ao plano de marketingdo anunciante ou se prender na coleta e sistematização de informaçõesque o anunciante já saiba de antemão (daí a insistência: um briefing bemrealizado evita esses inconvenientes).

Page 2: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

981 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

Entretanto, nem todos os anunciantes possuem um planejamento demarketing sistematizado e bem definido (principalmente os pequenos emédios). Isso prejudica significativamente a execução da campanhapublicitária. Algumas agências, porém, estão se antecipando a esseproblema e estendendo os seus serviços também para o campo daconsultoria em marketing, oferecendo aos anunciantes o mix completo:planejamento de marketing, planejamento de promoção e execução dascampanhas publicitárias. O caso do Supermercado Bretas, narrado no anexoIII é um bom exemplo de como a agência pode atuar nesses moldes.

Realmente, planejar pode ser um processo enfadonho - debruçar sobreinformações, analisar alternativas, estabelecer objetivos e metas, anteciparobstáculos etc. A idéia de se partir logo para a prática é tentadora, o queaté certo ponto é justificável. Quem não gosta de ver seus projetos saindodo papel, tomando forma e ganhando existência? Mais ainda na publicidade,cujo produto final é visto por milhões de pessoas. E há ainda a premênciado prazo solicitado pelo anunciante, que muitas vezes necessita dacampanha em um curto espaço de tempo.

Mas, nunca é demais repetir que uma campanha publicitária é umproduto e, desse modo, deve ser planejado à exaustão, para que o resultadofinal cumpra com eficiência e eficácia o propósito para o qual foi criado.Alguns profissionais podem pensar que têm o dom de, ao primeiro contatocom o briefing, serem capazes de identificar qual é a melhor solução parao anunciante. Mas, essa crença muitas vezes encerra uma armadilha.

O profissional de publicidade mais afoito pode questionar: "Analisar aposição do produto no mercado? Estudar as características do público-alvo? Sistematizar uma estratégia de comunicação mercadológica? Paraque serve esse 'lixo' acadêmico, se o meu tino já indicou a melhor solução?"- lamentavelmente esta ainda é a postura de muitos profissionais. Defato, algumas campanhas bem-sucedidas tiveram como ponto de partidaa intuição de seus criadores. Mas, com toda certeza, esses trabalhos sãoa minoria. Deve-se ressaltar que o processo publicitário se dá num ambientede incertezas e, segundo Dickson (1992), a intuição e o improviso não sãoa melhor maneira de se lidar com as incertezas. Grandes campanhas quemarcaram a publicidade brasileira e foram fenômenos de resultados, comoa da Brahma ("a número 1"). do Fiat Uno ("populares são os outros"). davalisere ("o primeiro sutiã a gente nunca esquece"). da Brastemp ("não énenhuma Brasternp"), da USTop("bonita camisa Fernandinho"), entre outras,

Capítulo 1OPLANEJAMENTO 199

uxigiram intensos trabalhos de análise de mercado, avaliação de alternativas,tostes de conceito etc. Nenhuma delas partiu pura e simplesmente do/oe/ing de seus criadores.

O tempo ideal para se levar a cabo a fase de planejamento varia bastante.I\s duas variáveis que mais interferem nesse prazo são a complexidade dacampanha e a quantidade de informações que se deve levantar para serealizar um planejamento consistente. Obviamente, uma campanha queatinja todo o território nacional, veiculada nos principais meios decomunicação, casada com ações de relações públicas e promoção devendas e projetada para durar no mínimo um ano, demandará um tempobem maior do que uma campanha de varejo, restrita à Grande Belo Horizonte,destinada a liquidar a ponta de estoque de um pequeno estabelecimentocomercial do ramo de vestuário. Ou, então, a continuação de uma grandecampanha que teve início no ano anterior e, portanto, já possui váriaspesquisas de marketing e de avaliação, demandará um tempo bem maiscurto do que uma campanha que vá ser lançada pela primeira vez. O maissensato é fazer uma análise preliminar do porte da campanha, dasinformações disponíveis e das pesquisas complementares que deverãoser feitas e, então, comparar com a data estabelecida pelo anunciantepara que o trabalho seja terminado. Se necessário (e viável). pode-se tentaruma negociação desse prazo. O importante é planejar um cronogramapara que haja tempo suficiente para um trabalho de qualidade nas fasesseguintes (mídia, criação e produção).

O trabalho de planejamento de uma campanha se concentra em tornode três pilares principais: análise do produto, análise do mercado edefinição do conceito de comunicação. Em seguida, é mostrado comosão feitas a análise do produto e a análise do mercado e como essasetapas contribuem para a definição do conceito de comunicação.

10.1 Análise do produto

Antes de se discutir acerca de como empreender uma análise de produto,. deve-se retomar o conceito de marketing apresentado no capítulo 5. Nele,fica claro que o cerne do fenômeno mercadológico é o intercâmbio de

Page 3: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

100 \ PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

valores entre organizações e seus clientes. Esses valores, invariavelmente,tomam a forma de produtos, que visam a satisfazer às necessidades eaos desejos de indivíduos e de organizações. Uma primeira análise é aidentificação do conceito do produto, através da explicitação dasnecessidades e desejos que ele visa a satisfazer. Tanto o anunciantequanto o publicitário devem ter tal conceito bem claro, pois ele orientarátodo o plano mercadológico e de comunicação.

O conceito do produto usualmente identifica o "pacote" de valoresoferecido pelo fornecedor, as necessidades que ele visa a satisfazer e ogrupo alvo principal do produto. Todo conceito deve sofrer uma revisãoperiódica, pois sendo os mercados, os valores e os comportamentos dosindivíduos fenômenos muito dinâmicos, os produtos também têm deacompanhar essa evolução. Alguns produtos, hoje, têm um conceito bemdiferente daquele de quando foram inventados. O leite condensado, porexemplo, foi inventado como forma prática de se conservar e facilitar otransporte do leite (para ser usado como ração de soldados em guerras,por exemplo), e a indicação de uso original era ser acrescentado à água ouao café. Hoje, qualquer consumidor estranharia essa finalidade, que nemconsta nas instruções impressas no rótulo do produto. O produto atualmenteé usado para o preparo de sobremesas, coberturas ou até para serconsumido puro.

Outro exemplo de mudança de conceito foi o Novomilke, da gaúchaOlvebra. O produto foi lançado como um preparado em pó a base desoja, em diversos sabores, para substituir o leite de vaca para as pessoasque têm intolerância à lactose. Este conceito era explicitado em toda acomunicação mercadológica do produto, inclusive no rótulo, que instruíao usuário a acrescentar o pó à água. No entanto, mesmo os consumidoresque não apresentavam alergia ao leite de vaca começaram a utilizar oproduto, acrescentando-o não à água, mas ao próprio leite. O fabricante,então, entendeu que o conceito do produto como substituto ao leite devaca estaria restringindo o seu potencial e reformulou toda a estratégia.Relançou o Novomilke com o conceito de um complemento rico emnutrientes, a base de soja, em diversos sabores, para ser acrescentadoao leite de vaca ou à água. As instruções de preparo também forammudadas e a finalidade inicial, satisfazer aos alérgicos ao leite de vaca,continuou constando no rótulo, mas como um uso alternativo. Atualmenteo Novomilke contém nutrientes do leite de vaca, e um novo produto foicriado para os alérgicos à lactose: o Soymilke.

Capítulo 10PLANEJAMENTO \101

Um segundo passo para se analisar o produto do anunciante é identificarI qual dessas categorias ele pertence: bens, serviços ou idéias.

Os bens são unidades tangíveis que proporcionam algum benefícioluncionai ou psicológico ao usuário. Os bens são produzidos e depoisdistribuídos, podendo ser transportados e estocados. Ao se adquirir11m bem, o comprador detém a posse do mesmo e ele mantém valor deuoca. podendo inclusive ser revendido, se for do interesse do seuproprietário. Os bens podem ser duráveis - neste caso a utilização e aIoutilização não altera a sua integridade, ou seja "não tira pedaço" (comoiutomóveis. eletrodomésticos, livros etc.); não-duráveis - nesse caso,I cada uso uma parte é consumida e não pode ser reutilizada (comoillrnentos. material de higiene pessoal, medicamentos etc.); e deprodução - são utilizados no processo de produção de outras empresas(máquinas e equipamentos, rnatêria-prlrna etc.).

Os serviços englobam todas as tarefas e ações que se executam paraoutrem, em seu lugar, através do trabalho humano ou de máquinas. Porxemplo, os serviços bancários - em vez de o próprio indivíduo guardar e

investir o seu dinheiro, uma organização é contratada para fazê-Io. Ou umrestaurante - em vez de a pessoa preparar a sua própria comida, ela sedirige a um estabelecimento que a faz e a vende.

As pessoas utilizam os serviços por um ou mais dos seguintes motivos:por conveniência (quando não querem se ocupar de executar algumatarefa, preferindo utilizar o tempo para outras atividades. Exemplo: prepararrefeições); por incapacidade técnica (quando não têm a habilidadenecessária para executar a tarefa. Exemplo: resolver problemas mecânicosdo automóvel); por limitações físicas ou ergonômicas (quando a tarefa aser executada exige a interferência de outra pessoa ou máquina. Exemplos:transportar uma mudança etc.); por obrigação legal (quando a lei obrigaas pessoas a adquirirem um serviço, mesmo que elas não o desejem.Exemplo: seguro ob.rigatório para os proprietários de automóveis); poreconomia (quando a realização da tarefa pela própria pessoa exige odispêndio de uma soma de dinheiro maior do que se ela contratar osserviços de uma empresa. Exemplo: alugar um smoking para um eventoblack-tie); por força das contingências (quando uma situação eventualobriga a pessoa a utilizar um serviço. Exemplo: tomar um táxi em umacidade desconhecida).

Page 4: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1021 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

As principais características dos serviços são: intangibilidade (nãopodem ser tocados nem transportados); perecibilidade (não podem serestocados); simultaneidade (são produzidos ao mesmo tempo em quesão consumidos); variabilidade (variam de uma transação para outra,por mais que se persiga a padronização). Os serviços podem serindividuais - prestados a pessoas ou famílias; ou industriais -prestados a outras organizações, neste caso também chamados B2B(business to business - de empresa para empresa).

As idéias são conceitos, imagens ou causas abraçados por algumasorganizações. A principal característica desse tipo de produto é aabstração. As transações envolvidas na produção de idéias geralmenteescapam ao arquétipo tradicional de compra e venda. Mesmo quandoenvolvem dinheiro (doações para as campanhas contra o câncer de mama,por exemplo). esse produto muitas vezes não tem um valor de utilidadepara o adquirente, como os bens e os serviços. Seu valor é mais socialou psicológico. E como são entidades abstratas, esse tipo de produtosó ganha existência a partir do momento em que atingem a mente daspessoas, o que só é possível através de um processo de comunicaçãoconstante e intenso. Portanto, pode-se afirmar que, no caso das idéias,a produção ocorre simultaneamente à promoção.

Note-se, porém, que essa primeira classificação tem propósitoessencialmente formal. Na prática não basta, simplesmente, enquadrar oproduto em uma dessas três categorias. Isso porque, quase sempre, ocorreuma coexistência dessas três categorias, ou seja, um mesmo produtopode ter características de bens, serviços e idéias ao mesmo tempo.

Um exemplo da coexistência das dimensões dos produtos pode ser aaquisição de um computador pessoal. A principal dimensão consideradana compra é, sem dúvida, o bem tangível e seu desempenho funcional.Esse é o produto núcleo. No entanto, outros atributos que fazem partedo "pacote" podem ser considerados, como a assistência técnicadiferenciada (dimensão de serviço) ou o conceito de qualidade associadoà marca (dimensão de idéia).

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1103

Figura 11 - Nesse anúncio institucional. o produtoanunciado pela Cemig (prevenção contra queimadase incêndios florestais) pertence à dimensão Idéia

Fonte - "Família Figueira", anúncio para jornal da campanhada Cemig (Contra Queimadas) - Casablanca (2002).

Levitt (1983) já atentava para a coexistência das dimensões dos produtose observa que eles não "nascem" dentro das empresas, mas, sim, deproblemas dos clientes. Etodas as teorias sobre comportamento do clienteapontam que as necessidades são multifacetadas - são compostas de

'I

Page 5: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1041 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

muitas dimensões e variam de uma pessoa para outra. Levitt. então.afirma que as pessoas compram expectativas de benefícios e não osprodutos em si. Por exemplo. uma consumidora. ao comprar um batomda Lancôme, não está adquirindo apenas um bastonete à base de cacaue pigmentos para proteger e colorir os lábios, mas principalmente apromessa de ficar bonita. Há, nesse caso, uma coexistência dasdimensões de bem e idéia, sendo a última bem mais determinante paraa decisão de compra do que a primeira.

Essas considerações são fundamentais ao se conceber o conceito doproduto e que será a base da campanha publicitária. Esse conceito é aexplicitação da necessidade que o produto visa a satisfazer. No caso dobatom da Lancôme, seria um equívoco focar a mensagem nascaracterísticas físicas do produto, pois não é esse o valor preponderanteperseguido pela consumidora. O produto deve migrar, então, da dimensãode bem para a de idéia, pois é essa a necessidade que ele visa a satisfazer.

Parase definir qual a dimensão do produto se deve enfatizar no conceitoda campanha, é apresentada na Figura 12 uma ferramenta simples quepode ser aplicada pela própria agência. O triângulo representa as trêsdimensões básicas do produto e é uma espécie de mapa perceptual,que permite visualizar como o consumidor percebe um produto, ao comprá-10 ou utilizá-Io. Os produtos plotados no triângulo são exemplos hipotéticos.Pode-se observar que a vassoura é percebida quase exclusivamente comobem, pois o que mais interessa são os seus atributos funcionais. Já o CDde música religiosa está mais para idéia - de louvor a Deus e propagaçãode dogmas religiosos. E oeletricista é primordialmente um prestador deserviços, não tendo como objetivo a venda de bens nem a divulgação deidéias. O restaurante de comida natural agrega atributos das trêsdimensões equilibradamente - engloba uma idéia (comida saudável eculto ao corpo), o serviço em si (eficiência e cordialidade no atendimento)e bem (a qualidade da comida).

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1105

IDÉIA

+Restaurante

natural

SERViÇO

Figura 12 - O modelo do triângulo e as três dimensões do produto

Figura 13a - Brinde (lápis) da campanha da Unimed-BH(lançamento do Plano Unipart) - Lápis Raro (2000)

1\111

1

Page 6: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

106/ PRINC(PIOS DA PUBLICIDADE

(-Lu-tfl• o J; 1\ tn

,AI8

Figura 13b- Brinde (sementes "Flora Box") da campanhada Cemig (Contra Queimadas) - Casablanca (2002)

Nas Figuras 13a e 13b, os serviços e as idéias são produtos intangíveis,mas, às vezes, pode-se "tanqibilizá-los", como nestes brindes da Unimed/Unipart (lápis) e na campanha da Cemig contra as queimadas (sementesde árvores)

o modelo do triângulo é muito útil para se definir a proposição devenda, ou seja, o(s) atributo(s) do produto usado(s) nos apelos publicitáriospara predispor o cliente à transação. A proposição de venda pode sermonotemática, também chamada de USP (unique se//ing proposition- proposição única de venda). quando enfatiza apenas um ponto doproduto, desprezando os demais. Por exemplo, uma determinada marcade detergente para louça pode ter vários atributos de qualidade (a fórmulaé menos agressiva para a pele, proporciona maior rendimento, ofereceopções variadas de fragrâncias, é comercializado em diferentes tamanhosde embalagem e é biodegradável). No entanto, suponha-se que ofabricante descobriu que o fato de não estragar as mãos é a característicaque mais o diferencia das marcas concorrentes e decide se concentrarnesse ponto como proposição de venda. Nesse caso, a fórmula quenão agride a pele seria a USP do produto e seria a única qualidadeenfatizada nos apelos publicitários.

Capítulo 10PLANEJAMENTO /107

De acordo com Belch e Belch (1993), o conceito de USP foirlosenvolvido nos EUA pelo publicitário Rosser Reeves e parte de trêspressupostos:

• As mensagens publicitárias devem fazer uma proposição aoconsumidor. Não apenas palavras nem comentários vazios sobreo produto. Elas devem dizer claramente: compre este produto evocê terá tal benefício;

• A proposição deve ser aquele atributo que o concorrente nãotenha ou não esteja enfatizando. Deve ser única tanto na marcaquanto na forma como é dita;

• Deve ser forte o suficiente para predispor um número grande denovos consumidores a experimentar e adotar a marca doanunciante.

Mayer (1991) critica que, durante muito tempo, as USP não passavamde ardil publicitário para convencer os consumidores de que o produto sediferenciava das marcas concorrentes quando, na verdade, eram similares.Os anunciantes demandavam das agências imaginar algum atributo aser destacado na publicidade, mesmo que aquilo fosse uma característicade todas as marcas. Quando se era o primeiro a alardear um certo atributo,fazia parecer que somente aquela marca detinha tal diferencial. Porexemplo, dizer que o azeite de oliva da marca X não contém colesterol.quando essa é uma característica de qualquer óleo vegetal.

Atualmente, porém, tanto os anunciantes quanto os publicitários têmentendido que não se constrói uma imagem de marca se o consumidornão perceber que o diferencial anunciado é real. Belch e Belch (1993)também _çhamam a atenção para o fato de que os órgãos deregulamentação da publicidade e de defesa do consumidor nos EUAestão bastante atentos para as USP que, na verdade, não são únicas oucujo produto não oferece o benefício prometido. No Brasil, o ConselhoNacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) e o Código de Defesado Consumidor também têm agido para coibir tais práticas. Além disso,Belch e Belch (1993) observam que muitos atributos usados como USPeram imediatamente imitados pelos concorrentes, deixando de ser umdiferencial competitivo único.

I

r;11

Page 7: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1081 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

A proposição de vendas também pode ser politemática, quando oanunciante decide enumerar todos os pontos que podem levar oconsumidor a atribuir valor à sua marca. Hipoteticamente, um fabricantede microcomputador identificou um segmento de consumidores cujasexpectativas em relação a esse tipo de produto são: maior velocidade deprocessamento, maior capacidade de armazenamento, maior potênciado modem e possibilidade de gravar e reproduzir CO's e OVO's. Assim,ele desenvolve um modelo que reúne todos esses atributos, com diferencialsobre a média dos concorrentes. O seu apelo publicitário, portanto, podeenumerar todas essas características, comprovando que aquele produtofoi desenvolvido visando a preencher as expectativas daquele segmento.

A escolha entre a proposição monotemática e a politemática se baseiaem dois conceitos de marketing desenvolvidos já há algum tempo:diferenciação de produto e segmentação de mercado. Embora muitosautores ainda utilizem os dois conceitos como se fossem equivalentes,Smith (1956) os distingue, pois partem de premissas opostas.

A diferenciação parte de uma ou mais características intrínsecas aoproduto, que dão a ele uma vantagem competitiva em relação aosconcorrentes. A aplicação de uma tecnologia superior às outras marcasdisponíveis no mercado, por exemplo. Ou um processo de fabricaçãoinovador, difícil de ser copiado, que permite a comercialização do produtoa um preço mais barato. Esses diferenciais competitivos tomam a formade valor percebido pelo mercado. Quando a diferenciação do produto énotável, deve-se considerar a utilização da USP, enfatizando bem o atributosuperior e desprezando os outros menos relevantes. Nesse caso, o esforçopublicitário vai consolidando a associação da marca àquela característica,construindo assim uma imagem de marca positiva e duradoura.

A segmentação parte da divisão do mercado em grupos deconsumidores com características próprias e o desenvolvimento de produtosmoldados especificamente para atender às necessidades de cada umdesses grupos. A vantagem competitiva, nesse caso, não decorre somentedas qualidades superiores [ntrínsecas ao produto, como na diferenciação,mas é conseqüência dos esforços para atender às necessidades e desejosde um grupo peculiar identificado no mercado. Quando o anunciante adotauma estratégia clara de segmentação de mercado, recomenda-se usaruma proposição politemática. Assim, o segmento visado identificará os

Capitulo 10PLANEJAMENTO 1109

vários pontos do produto que coincidem com suas expectativas, confirmandoidéia de que aquela marca está adequada a seus desejos e necessidades.

As variáveis de segmentação serão apresentadas no item 10.2 (Análise de

mercado).O passo seguinte é a análise do ciclo de vida da categoria do produto.

Assim como as pessoas, os produtos também "nascem, crescem,nvelhecem e morrem". A identificação do estágio do ciclo de vida em que

o produto se encontra auxiliará na escolha das alternativas de promoção a

serem adotadas.Os estágios do ciclo de vida são quatro: introdução, crescimento,

maturidade e declínio (ver Figura 14). Essas fases não têm uma duraçãodefinida. Algumas categorias de produtos estão na fase de maturidade hávárias décadas (como o refrigerante sabor cola). ao passo que outrastravessam todos os estágios de ciclo de vida em um par de anos (é o

caso dos produtos "coqueluche", como alguns brinquedos eletrônicos,do tipo Tamagoshi). Os critérios para se traçar a linha do ciclo de vidasão: o nível de inovação, o grau de entrada ou saída de concorrentesnuma categoria e a curva de vendas e lucros da indústria.'

É importante, antes de qualquer coisa, ressaltar que a expressãocategoria de produto se refere a todos os itens similares ofertados portodas as organizações de um certo mercado, para satisfazer adeterminadas necessidades. Por exemplo, a categoria dos sabões empó inclui várias marcas: Orno. Ariel. Minerva etc. Assim, ao se identificarom que estágio do ciclo de vida o produto do anunciante se encontra,deve-se considerar toda a categoria, independentemente de quando a

marca do fabricante foi lançada.

mo indústria, utilizado neste livro se refere ao conjunto de organizações que competem num

mesmo setor (indústria do turismo, indústria dos meios de comunicação em massa, indústria do

cimento etc.). Os estabelecimentos que transformam insumos em bens são denominados fábricas.

~ -'~~~--~Q----

Page 8: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

11 O I PRINCfplOS DA PUBLICIDADE

Introdução ! Crescimento Maturidade i Declínio

i i

/r·····1·..• : + Lucros da· !.-.. indústria• +

+••••••••• •Figura 14 - Os estágios do ciclo de vida do produto

As características de cada estágio do ciclo de vida são (com baseem Dalrymple e Parsons, 1990; Seminik e Bamossy, 1995; e Pride eFerrell, 2001):

• Introdução: como a categoria acabou de ser lançada, há pouc-osconcorrentes no mercado, geralmente uma ou duas empresas,que teriam investido em pesquisa e desenvolvimento paraconseguir aquela inovação. Normalmente, a estratégia geraldessas empresas é estabelecer essa nova categoria no mercado,persuadindo os usuários (ou adotantes) iniciais (ver item 10.2 _Análise de mercado) a consumirem o produto. O fluxo de caixaainda é negativo, pois as empresas têm de investir muito emmarketing e o volume reduzido de produção onera ainda mais os.custos. Assim, os preços cobrados dos consumidores são muitoaltos (muitos se recordam que, no início dos anos 1990, o recém-lançado telefone celular custava cerca de US$ 2 mil). A distribuição

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1111

ainda é seletiva, concentrada em poucos pontos de venda e empoucas praças.

• Crescimento: nesta fase se acelera a entrada de novosconcorrentes. Como a categoria passou pelo "teste" de aceitaçãopelo mercado, muitas empresas tentam "copiar" o sucesso daspioneiras. A estratégia geral é a penetração de mercado, isto é,tentar fazer com que novos consumidores, que tenham potencialpara adotar o produto, passem a fazê-Io. É a fase mais lucrativa,pois os preços ainda estão altos, o volume produzido e aaprendizagem adquirida reduzem os custos de produção e ademanda em crescimento acelerado não exige grandesinvestimentos em marketing. Os canais de distribuição seespalham rapidamente e os fornecedores aproveitam para tirarvantagem dessa predisposição dos varejistas em vender o produto.

• Maturidade: a categoria deixa de ser atrativa para a entrada denovos concorrentes, pois o potencial de mercado (número deconsumidores aptos a comprar um produto) já está quase todoesgotado. A estratégia geral é a defesa da posição da marca ouataques cautelosos para tentar ganhar fatias de mercado dosconcorrentes. Essa competição tende a reduzir os lucros, poishá uma tendência para guerras de preços, pesquisas paraaperfeiçoar os produtos em busca de diferenciais competitivose altos investimentos em promoção. Os preços tendem a cairou são ditados pelo mercado. A distribuição se espalha aindamais e depois se consolida, com os concorrentes mais fortestentando formar alianças com os varejistas.

• Declínio: a competição acirrada provoca a retirada dosconcorrentes mais fracos. Mesmo os que continuam oferecendoa categoria se preparam para, cedo ou tarde, promover a retirada.A estratégia geral é tentar aproveitar ao máximo os ganhos queo produto ainda possa gerar. Alguns concorrentes procuramsuavizar a linha descendente, "maquiando" a sua marca comalguma inovação, desenvolvendo novos usos ou se concentrandoem um segmento mais "fiel". Um exemplo do primeiro caso é

Page 9: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

112\ PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

a indústria automobilística, em que as montadoras mudamalguns detalhes nos modelos de automóveis, antes dedescontinuar a produção e entrar na geração seguinte. Nosegundo caso, o exemplo é o amido de milho, produto emdeclínio nos anos 1990, quando a marca Maizena fez umacampanha divulgando novos usos, como fazer goma parapassar roupa ou adicionar à massa de bolo para ficar maisleve e macia. O terceiro caso pode ser ilustrado pelos discosde vinil, que ainda atendem a um segmento pequeno, masfiel. Neste estágio, os lucros vão declinando, em função domenor volume vendido e dos investimentos em marketing paramanter o produto no mercado. Os preços tendem a baixar,para permitir a liquidação dos estoques, mas também podemvoltar a aumentar em função da deseconomia de escala (casodo aparelho de fax, do videocassete e do filme fotográfico empreto-e-branco, que chegam a custar mais do que ossubstitutos de tecnologia mais avançada).

Mais uma vez, atenção: para se analisar o ciclo de vida deve-seconsiderar a categoria do produto, ou seja, todos os itens disponíveisno mercado, oferta dos por todos os concorrentes, que visem a satisfazeruma mesma necessidade. Não se deve considerar apenas a marca doanunciante. Isso porque nada impede que uma empresa lance um produtocuja categoria já esteja no estágio de maturidade - é o caso da marcade cerveja da Schincariol. Ou até mesmo de declínio - a Arisco só hápouco tempo lançou a sua marca de amido de milho para concorrer coma Maizena.

Um outro aspecto a ser observado é que o modelo do ciclo de vidanem sempre se aplica a todas as situações do marketing e da publicidade.Uma campanha institucional, por exemplo. Apesar de a imagem de umaorganização teoricamente ser considerada um produto, na prática nãocabe nesse modelo.

A identificação do ciclo de vida da categoria de produto, quandoaplicável, é muito útil para o direcionamento inicial de uma série de decisõesacerca da campanha. Dalrymple e Parsons (1990) recomendam asseguintes estratégias e táticas em cada estágio do ciclo de vida dacategoria de produto:

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1113

Introdução: a estratégia publicitária deve ter como alvo osusuários iniciais e despertar neles a necessidade latente que oproduto visa a satisfazer. O esforço publicitário nessa fase éintenso, isto é, deve-se buscar o máximo de divulgação doproduto, visando a gerar awareness (consciência de que o produtoexiste). Isso acaba predispondo mais consumidores a testaremo produto e mais varejistas a distribuí-Io. Além da publicidade,outras ações promocionais devem compor o mix de promoção,como amostras grátis, eventos, assessoria de imprensa, standsem pontos de venda etc.

• Crescimento: o foco da campanha deve ser estendido ao mercadocomo um todo, procurando sedimentar a idéia de que a satisfaçãocom o produto será real. Deve-se iniciar também um trabalho deconsolidação da marca. O esforço publicitário deve ser moderado,pois a curva de vendas já está em ascensão e a idéia é "colher" oque foi plantado na fase de introdução. Além disso, os adotantesiniciais já estarão se encarregando de realizar uma publicidade"boca a boca", ajudando a divulgar o produto junto a outrosmembros do mercado. A comunicação servirá apenas para realizaruma espécie de manutenção das mensagens na memória dosconsumidores. As promoções de vendas também devem sermoderadas, apenas para desenvolver a preferência pela marca.

• Maturidade: nesse estágio, a publicidade deixa de ter a funçãode informar sobre as necessidades que o produto visa asatisfazer, pois isso já está consolidado na mente do consumidor.A estratégia publicitária, portanto, é usar a atividade como ummeio para diferenciar a marca dos concorrentes similares. Oesforço publicitário, em geral. deve ser moderado, pois a marcajá é conhecida pelo público-alvo. As promoções de vendas setornam as "vedetes", com o foco na tentativa de atrair clientesda concorrência e aumentar o consumo e a lealdade dos usuárioshabituais. Deve-se ter cautela, entretanto, para não se investirem demasia nas promoções de vendas, em detrimento dapublicidade, pois isso poderia prejudicar o valor da marca no

longo prazo.

Page 10: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1141 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

• Declínio: a estratégia publicitária predominante nessa fase éenfatizar os baixos preços, visando a reduzir estoques. Caso seutilizem táticas de "rnaquíar" o produto para suavizar a curva dedeclínio, deve-se tomar o cuidado para esses investimentos nãoanularem o potencial de lucro residual do produto. O esforçopublicitário deve ser mínimo e as promoções de venda também,deixando que a própria marca incite as vendas.

Uma outra ferramenta de diagnóstico do produto, que pode ajudar afundamentar a estratégia publicitária, é a matriz de crescimento eparticipação de mercado, também chamada de matriz BeG, em alusãoà firma de consultoria que a desenvolveu (Boston Consulting Group,Inc.). Na matriz BCG (Figura 15), os produtos de uma mesma empresasão classificados de acordo com duas variáveis - crescimento domercado do produto e participação relativa de mercado.

oueu2(l)

Eouo.....,c(l)

E'ur/l(l)

'-u

o.....,«

* ?Estrela Criança-problema

$ XVaca Leiteira Abacaxi

o.?$rofi

AltaBaixa

Participação de mercado

Figura 15 - A matriz BCG, ferramenta para análise de potttolio deprodutos

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1115

O crescimento do mercado é a variação no número de consumidoresque têm necessidade, desejo e capacidade para adquirir o produto.Esse crescimento pode ser influenciado por fatores demográficos,conômicos, sociais e comporta mentais. No Brasil, o mercado de

cerveja, por exemplo, apresenta um crescimento baixo devidoprincipalmente a fatores demográficos. Como a nossa população vemdiminuindo drasticamente o ritmo de crescimento, cada vez menosindivíduos alcançam a idade apta a consumir o produto. Alguns produtosjá são mais sensíveis a fatores socioeconômicos, como o mercado deeletrodomésticos. Qualquer melhoria no poder aquisitivo da populaçãoleva a um consumo maior desses bens, sendo o oposto verdadeiro emperíodos de recessão. Os fatores sociais são determinantes nocrescimento de alguns mercados, como o de bens e serviços voltadospara a segurança. Mesmo com a economia em recessão, o mercadodesses produtos tem crescido muito, numa tentativa das pessoas dese proteger da violência, que está associada ao crescimento da pobreza.Os fatores comporta mentais, por sua vez, podem ser exemplificadosna mudança de valores e atitudes das pessoas. Um exemplo marcantefoi o crescimento das academias de ginástica nas décadas de 1980 e1990, decorrentes da tendência do culto ao corpo e da preocupaçãocom a saúde física.

A participação relativa de mercado é a porcentagem de indivíduos(ou organizações) de um mercado que compram determinada marcade produto. É importante fazer a distinção entre crescimento daparticipação relativa de mercado e crescimento do mercado. Umaempresa pode aumentar a sua participação relativa de mercado numdeterminado período, mas, ao mesmo tempo, pode estar vendendomenos que no período anterior. Veja o exemplo hipotético na Tabela 2.Note que houve uma redução drástica no mercado de turbinas de aviões,mas a marca da empresa X perdeu menos clientes do que a marca daempresa Y. Portanto, a sua participação relativa de mercado aumentou,mas o seu mercado foi reduzido.

Page 11: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1161 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

Tabela 2Crescimento x Participação relativa de mercado

2002 2003

Fabricantes Parto de Parto dede turbinas Vendas Vendaspara aviões mercado mercado

Empresa X 500 40% 450 60%

Empresa Y 600 48% 300 40%

Empresa Z 150 12% - -

Total 7.250 700% 750 700%

Fonte: simulaçao.

A matriz BCG se divide em quatro células, de acordo com as variáveisapresentadas e, dentro de cada uma, em alto ou baixo. Assim, os produtospodem ser classificados como:

• Produto "abacaxi": participação relativa de mercado baixa ecrescimento de mercado baixo. Ou é um lançamento que não"vingou" ou é um produto que pertence a categoria em estágio dedeclínio. Normalmente apresenta fluxo de caixa negativo e écandidato ao corte.

• Produto "criança-problema": participação relativa de mercadobaixa, porém com mercado em crescimento. O tempo dirá seresultará em sucesso de mercado ou se passará a "abacaxi". Ofluxo de caixa é baixo, ora negativo, ora positivo e o ideal émonitorar de perto esse produto para avaliar constantemente asua tendência.

• Produto "estrela": participação relativa de mercado alta' emercado em crescimento. Em suma, é a "criança-problema" que

Capítulo 10PLANEJAMENTO \ 117

deu certo. A ele é destinada a maior parte dos recursos daorganização. Por isso mesmo, o fluxo de caixa é alto.

• Produto "vaca leiteira": participação relativa de mercado alta emercado estagnado ou em retração. É um produto que já viveu asua fase de "estrela", mas agora já não requer mais tantosinvestimentos. O fluxo de caixa é alto e positivo. É a "vaca leiteira"que gera lucros para a organização investir no desenvolvimento

de novos produtos.

O ideal é a empresa ter um mix de produtos bem distribuídos nas trêsúltimas classificações e de preferência poucos (ou nenhum) "abacaxi". Ocenário atual indica que a inovação constante é um fator-chave de sucessopara as organizações, portanto elas devem estar sempre investindo nodesenvolvimento de novos produtos. É importante, então, ter sempre algunsprodutos na célula "criança-problema", pois apesar de eles consumiremrecursos da organização, são eles que se tornarão "estrelas" algum dia.Um número muito grande de "vacas leiteiras", por outro lado, é interessantepara gerar lucros, mas é um indicador de que a empresa não está investindoem inovação, o que pode comprometer o seu desempenho no futuro. Eumgrande número de "estrelas" pode ser tentador, pois são elas as "vacasleiteiras" de amanhã. Entretanto, como requerem altos investimentos, issopode comprometer a saúde financeira da empresa ou absorver recursosnecessários para o desenvolvimento de novos produtos.

Paraa publicidade, a matriz BCG é uma ferramenta analítica que podeorientar importantes decisões nas áreas de planejamento, criação e mídia.A classificação do produto em um desses tipos orientará algumas decisõesfundamentais para o planejamento publicitário. Algumas diretrizes são:

• Produto "abacaxl": a recomendação é que sua produção sejadescontinuada, mas muitas empresas preferem insistir em mantê-los no mercado, pois muitas vezes alguns erros iniciais demarketing podem ser corrigidos. Muitos produtos que hoje estãoconsolidados no mercado brasileiro já passaram pela fase de"abacaxi". Entre eles, o café solúvel e o absorvente femininointerno, que tiveram de receber grandes investimentos emmarketing até que fossem aceitos pelos consumidores. Caso a

Page 12: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

1181 PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

agência receba como demanda o planejamento publicitário deum produto "abacaxi", algumas recomendações devem sersequidas. A principal delas é valorizar os pontos fortes do produtoe investir em promoções de vendas que reanimem os distribuidorese levem mais consumidores a se conscientizarem dessasqualidades do produto. Um exemplo de produto que passou poressa fase foi a massa de pão-de-queijo congelada. Até a décadade 1980, várias empresas tentaram lançar esse alimento nomercado. No entanto, todas elas falharam, pois as fórmulas eramruins (se comparadas ao produto caseiro) e as pessoas nãopercebiam a necessidade de adquiri-Io. Até que surgiu uma fábricamineira, a Forno de Minas, que resolveu apostar nesse produtoque já nascia praticamente desacreditado. Detentora de umafórmula inovadora, que realmente funcionava e cujo sabor seaproximava do produto tradicional. essa empresa teve de quebrar.diversas barreiras, entre elas a dos supermercados, que no iníciotiveram enormes resistências devido a experiências anteriores.Com um planejamento consistente em todo o composto demarketing, a empresa conseguiu convencer os consumidores deque o pão-de-queijo congelado satisfazia as suas necessidadesde alimentação (lanches e coquetéis), praticidade (pronto paraassar) e conveniência (rapidez e fácil armazenamento). O produtoacabou se tornando uma estrela, depois uma vaca leiteira,rompendo as fronteiras de Minas e do Brasil. A empresa se tornoumuito cobiçada no mercado, sendo comprada em 1999 pelaamericana Pillsbury.

• Produto "criança-problema": esse tipo de produto requer umtrabalho publicitário muito intenso e diversificado, focado naconsolidação do conceito e, principalmente, na construção daimagem de marca. As ações promocionais devem realizar adifícil tarefa de fazer com que o consumidor se familiarize como produto, quebrando qualquer resistência que ainda possa existircom relação à sua utilização. Mensagens publicitárias instrutivase tão explícitas quanto possível são indicadas, de preferênciausando recursos de demonstração. Um caso recente de empresaque anunciou um produto nessa fase foi a Gol Linhas AéreasInteligentes, empresa de aviação civil pioneira no Brasil no

Capítulo 10PLANEJAMENTO \ 119

segmento de tarifas econômicas, fundada pelo empresanomineiro Nenê Constantino. No início, houve muito alarde nosmeios de comunicação acerca da companhia, ora exaltando asua entrada no mercado, ora questionando a sua viabilidade.Houve até rumores quanto à adequada manutenção dos seusequipamentos e à experiência da sua tripulação. As primeirascampanhas da Gol. então, mostravam explicitamente como seopera uma empresa aérea de tarifa econômica, detalhando comoela consegue reduzir os custos (economia no serviço de bordo,uso de aparelhos mais modernos que requerem menosinvestimentos em manutenção e consomem menos combustível.vendas pela Internet. ocupação de assentos acima da média etc.).

• Produto "estrela": a principal estratégia publicitária para essetipo de produto é consolidar a imagem da marca. O mercadodeve associá-Ia a conceitos positivos, o que exige um mix demarketing bem coordenado, visando a alcançar altos índices desatisfação do consumidor. Entretanto, por estar em grandeevidência, em crescimento acelerado e abocanhando parcelasde mercado cada vez maiores, o produto estrela tende a seralvo de ataques da concorrência. É preciso estar atento a essasinvestidas dos rivais de modo que, quando aconteçam, aempresa esteja preparada para realizar a defesa. Mas, deve-setomar o cuidado, obviamente, para não desviar o foco do conceitooriginal. Um produto que já há algum tempo vem ocupando aposição de "estrela" na indústria de eletrodomésticos é o OVO.O aparelho já não é novidade e seu preço hoje é quase o mesmodo videocassete. Os principais fabricantes já não estão maispreocupados em promover a aceitação desse produto pelomercado, mas têm procurado desenvolver e divulgar diferenciaiscompetitivos 'das suas marcas, como aperfeiçoamentos,

garantia, qualidade etc.

• Produto "vaca leiteira": o foco da estratégia publicitária paraesse tipo de produto também deve recair sobre a marca. Porém,enquanto para as "crianças-problema" e as "estrelas" as ênfasessão, respectivamente, a construção e a consolidação da imagemda marca, para as "vacas leiteiras" a abordagem indicada é a

~

'I

Page 13: Princípios da Publicidade_Gilmar Santos

120 I PRINCíPIOS DA PUBLICIDADE

manutenção. Uma característica do mix de marketing e depromoção desses produtos é o baixo investimento em relação aomontante que eles faturam - daí o nome. Ações mais agressivas

/ e exposições freqüentes nos meios de comunicação em massadevem ceder lugar a inserções mais esparsas e aparições maissutis (patrocínios de eventos culturais ou esportivos são altamenterecomendados). No entanto, periodicamente, deve-se fazer umestudo sobre a necessidade de revitalização da marca, paraaproximá-Ia das novas gerações que vão entrando no mercadode consumo. Essas táticas podem incluir desde pequenasrenovações no design até a incorporação de atributos novos.

Todas essas técnicas de análise do produto são orientações bastanteúteis para se chegar a um planejamento consistente e eficaz. Todavia,devemser usadas com prudência e convicção. Um grande entrave para aplicaçãodas análises ditadas pelo marketing é a ausência de informações demercado exigidas para empregá-Ias com maior rigor. Nem todos os setorespossuem relatórios sistematizados com dados sobre a indústria. Epoucossão os anunciantes que possuem recursos suficientes para conduzir umestudo próprio. Portanto, de nada adianta tomar alguma dessas técnicasde análise do produto e utilizá-Ia com base na intuição. Um mínimo deesforço deve ser feito na busca de dados mais precisos, caso o anunciantenão os tenha. A recomendação é que o profissional de planejamentodesenvolva um tino especial para captar e organizar informações,desenvolvendo o hábito de leitura especializada em negócios e agilidadepara consultar fontes de dados secundários - o acesso à Internet temfacilitado sobremaneira essa empreitada.

10.2 Análise do mercado e do comportamento doconsumidor

A análise do mercado, ao contrário do que possa parecer,não envolveestudar apenas as pessoas e organizações que compram os produtos doanunciante. Uma investigação de todo o ambie'lte externo é fundamentalpara se traçar a estratégia publicitária. Assim, é possível ter uma visão

Capítulo 10PLANEJAMENTO 1121

clnra da posição do anunciante em relação aos concorrentes e como os'I(jUS movimentos estratégicos são influenciados pelas demais forças queIgem no ambiente - governo, tecnologia, cultura etc. O ideal é que o/Jriefing já traga essas informações, cabendo ao planejamento apenasidequar a estratégia publicitária a essas conformações do mercado.

Uma ferramenta bastante útil para se analisar o ambiente de umaorganização é a análise dos pontos fortes e fracos e das ameaças eoportunidades. Esse procedimento é chamado SWOT Ana/ysis (doinglês, strengths, weaknesses, oportunities e threatenings - forças,fraquezas, oportunidades e ameaças).

Os pontos fortes e fracos são todas aquelas características da empresaou dos seus produtos referentes ao ambiente interno. A organizaçãotem controle sobre eles. Por exemplo, um contrato vantajoso com ofornecedor de uma matéria-prima de qualidade superior é um ponto forte,pois isso pode agregar um atributo positivo ao produto. Por outro lado,uma rede de assistência técnica restrita ou mal distribuída é um pontofraco, já que esse é um fator considerado pelos consumidores de algunsbens. Note-se que esses itens (matéria-prima e serviço ao cliente) estãosob o controle da organização, pois até certo ponto depende dela escolheros fornecedores e também estabelecer a rede de assistência técnica.

As ameaças e oportunidades são variáveis do ambiente externoque escapam totalmente ao controle da organização. A entrada de umnovo concorrente na indústria pode ser uma ameaça, pois ela podeperder mercado para o rival. Já a assinatura de um acordo de uniãoaduaneira com um país vizinho pode ser uma oportunidade, pois aempresa pode competir com os seus produtos em outros mercados.Essas variáveis não estão sob o controle da organização, pois elas nãoestão sujeitas às decisões dos seus dirigentes. O máximo que ela podefazer é, no caso do surgimento de um novo concorrente, tentar intimidara sua entrada no mercado, iniciando uma guerra de preços, por exemplo.No caso da união aduaneira, o que a empresa pode fazer é montar um/obby junto ao governo para apressar a assinatura do tratado.

Para a publicidade, interessa muito a SWOT Ana/ysis. A identificaçãodos pontos fortes e fracos determinam o que deve ser enfatizado e o quedeve ser evitado no conteúdo da campanha. Por exemplo, se uma empresade serviços gráficos tem como ponto fraco o prazo de entrega dasencomendas, jamais deve ser mencionado na campanha que a pontualidade

1"11').li

If