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Éumahonraestarcomvocêsho-  jenasuacerimôniadeormatura em uma das melhores universi- dadesdomundo.Nuncameor- mei na aculdade. Este discurso é o mais perto que já ch eguei de umaormatura.Hojequerocon- tar a vocês três histórias da mi- nha vida. Só isso. Nada de mais.  Apenastrêshistórias. 1.  A primeira história é a respeito de ligar os pontos. Desisti de cursar a Universi- dadeReeddepois dos primeiros seis meses de aula, mas conti- nuei a requentar o câmpus como ouvin- tepormais18 meses antes de desistir de vez. Porqueeulargueiaacul- dade?Tudocomeçouantesdeeu nascer.Minhamãebiológicaera umamulherjovemesolteiraque tinha se ormado na aculdade e decidiu me entregar à adoção. Ela azia questão que eu osse adotado por um casal ormado no ensino superior e, por isso, tudo oi arranjado para que eu osseadotadologoaonascerpor umadvogadoeamulherdele. Mas,quandonasci,ocasalde- cidiu que na verdade o que que- riam era uma flha. Assim, meus pais, que estavam na lista de es- pera,receberamumteleonema no meio da madrugada pergun- tando: “Temos um inesperado  bebê menino; vocês o querem?” Elesresponderam:“Éclaro”. Posteriormente, minha mãe  biológica descobriu que minha mãe nunca tinha se ormado na aculdade e que meu pai não concluiu o ensino médio. Ela se recusou a assinar os documen- tos fnais da adoção e só mudou de ideia alguns meses depois, quando meus pais prometeram queumdiaeuiriaàuniversidade. Bem,17anosmaistarde,euui CONTINUEM BOBOS Steve Jobs rememberingsteve  [email protected]      h     t     t    p    :      /      /    w    w    w  .    e    s     t    a      d    a    o  .    c    o    m  .      b    r Steve Jobs morreu na quarta-feira da semana passada. De lá para cá, tudo o que havia para ser falado ou escrito sobre seu impacto no mundo hoje já foi publicado. É impossível evitar a repetição. Mas o ‘Link’ não pode deixar de escolher o que quer dizer sobre o cara que moldou parte do mundo que cobrimos todos os dias. Você provavelmente já viu, ouviu ou leu isso. Mas de tudo o que foi dito sobre Steve Jobs, o que queremos dizer sobre ele é o que ele disse de si mesmo A MORTE É O DESTINO FINAL DO QUAL TODOS NÓS PARTILHAMOS. NINGUÉM JAMAIS ESCAPOU DELA. E É ASSIM QUE AS COISAS DEVERIAM SER, PORQUE AMORTE ÉPROVA VELMENTEA MELHOR INVENÇÃO DE TODA A VIDA para a universidade. Mas, inge- nuamente, escolhi uma univer- sidade quase tão cara quanto Stanord, e toda a poupança dos meuspais,declassetrabalhado- ra,estavasendogastacomomeu ensino superior. Depois de seis meses, não consegui enxergar o méritodaquilo. Eunãotinhaideiadoqueque- ria azer da vida e não imaginava comoauniversidadepoderiame ajudar a descobrir a resposta. E ali estava eu, gastando todo o dinheiro que meus pais tinham poupado durante toda a vida. Decidiabandonarocursoeacre- ditarquetudodariacertonofm. Na época oi assustador, mas, emretrospecto,oiumadasme- lhores decisões que tomei. As- simquelargueiaaculdade,não preciseimaisrequentarasaulas quenãomeinteressavamepude ircomoouvinteàsquepareciam sermaisinteressantes. Nem tudo oi romântico. Eu não tinha quarto no dormitório universitárioe,porisso,dormia nochãodosquartosdoscolegas. RecolhiagarraasdeCoca-Cola paratrocá-lasporUS$0,05eter dinheiro para comprar comi- da. Caminhava mais de 10 km aos domingos, de um extremo ao outro da cidade, para azer a melhor reeição da semana no templo Hare Krishna. Eu amava isso. E percebi depois que boa parte da- quilo com que me depareiao seguir mi- nha curiosidade e minha intuição consistiu em experi- ênciasdevalorincalculável. Eis um exemplo do que quero dizer: naquela época, a Univer- sidade Reed oerecia provavel- mente a melhor instrução cali- gráica de todo o país. Por todo ocâmpus,cadacartazecadaeti- queta de cada gaveta eram ma- ravilhosamente escritos à mão. Porterviradoumdesistenteque não precisava mais assistir às aulasnormais,decidiparticipar dasaulasdecaligrafa. Descobri muito a respeito de ontes seriadas e sans-seri, de  variaçõesnoespaçamentodedi- erentescombinaçõesdeletras, decaracterísticasquemaischa- mam a atenção naquilo que há de melhor na tipografa. Era um assuntomaravilhoso,histórico, de uma sutileza artística que a ciência não é capaz de capturar. Etudomepareceuascinante. Nada disso parecia inspirar a menor esperança de encon- trar uma aplicação prática na minha vida. Mas, dez anos mais tarde, quando estávamos pro-  jetando o primeiro Macintosh, me lembrei daquelas aulas. E todos aqueles conceitos oram incorporados ao nosso projeto para o Mac. Ele oi o primeiro computador a ter uma tipogra- fabelíssima.Seeununcativesse participadodaquelecursocomo ouvinte,oMacnãoteriacontado com dierentes tipos de onte e nem com caracteres de espaça- mento proporcional. Como o  Windows copiou o Mac, é pro-  vável que nenhum computador pessoaltivesseessesrecursos. Se nunca tivesse me tornado umdesistente,nãoteriametor- nado um ouvinte naquela aula decaligrafae,talvez,oscompu- tadoresnãotivessemosmaravi- lhososrecursostipográfcosque têm hoje. É claro que, na época da aculdade, era impossível li- gar esses pontos. Mas, dez anos mais tarde, a relação entre eles estavaclaríssima. Repitoquenãoépossívelligar ospontosquandoolhamospara outuro;sópodemosligá-losao olhar para o passado. É preciso confar que os pontos acabarão seligandounsaosoutros.Épre- ciso coniar em alguma coisa – instinto, destino, carma, o que or. Essa abordagem nunca me decepcionou, e ez toda a die- rençanaminhavida. 2. Minha segunda história é a res- peitodoamoredaperda. Eu tive sorte – descobri cedo aquilo que amo azer. Woz e eu undamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha 20 anos. Trabalhamos duro e, dez anos mais tarde, a Apple ti- nha crescido e virado uma em- presaavaliadaemUS$2bilhões, com mais de 4 mil uncionários. Tínhamos acabado de lançar nossacriaçãomáxima–oMacin- tosh–noanoanterior,eeutinha acabadodecompletar30anos. Eentão,uidemitido.Comoé possívelumapessoaserdemiti- dadeumaempresaqueajudoua undar? Bem, conorme a Apple cresceu, contratamos alguém quemepareceumuitotalentoso para administrar a empresa ao meu lado e, no primeiro ano de parceria,ascoisasderamcerto. Masnossasvisõesparaoutu- rocomeçaramadivergire,fnal- mente, brigamos e nosso con- selho administrativo decidiu tomaropartidodele.Assim,aos 30anos,euestavaora.Anotícia oi muito divulgada. Aquilo que ora o oco de toda a minha vida adultatinhasidotiradodemim, eaexperiênciaoidevastadora. Por alguns meses, não sou-  be ao certo o que azer. Tive a sensação de ter decepcionado a geraçãoanteriordeempreende- dores – de ter derrubado o bas- tãoquandoeleeratransmitidoa mim.EncontreiDavidPackarde BobNoyceetenteimedesculpar porterestragadotudo. Meu racasso oi absoluta- mente público e pensei até em ugir do Vale do Silício. Mas co- mecei a perceber algo: eu ainda amava aquilo que azia. As ine- lizes situações vividas na Apple nãotinhammudadoissoemna- da. Eu tinha sido rejeitado, mas continuavaapaixonado. E, assim, decidi começar de novo. Não percebi isso na épo- ca, mas parece que ter sido de- mitido da Apple oi a melhor coisa que poderia ter aconteci- do para mim. O peso do sucesso oi substituído pela leveza de ser um iniciante de novo, me- nos cheio de certezas a respeito de tudo. Aquilo me deu a liber- dade necessária para começar um dos períodos mais criativos da minha vida. Nos cinco anos seguintes, undei uma empresa chamada NeXT, outra chamada Pixar e me apaixonei por uma mulher antásticacomaqualmecasei.A Pixaravançouatécriaroprimei- rolonga-metragemdeanimação eitoporcomputador,ToyStory, e virou o estúdio de animação mais bem sucedido do mundo. Numa reviravolta notável, a Ap- ple comprou a NeXT, eu voltei para a Apple e a tecnologia que desenvolvemosnaNeXTestáno coraçãodorenascimentodaAp- ple.ELaureneeeuconstruímos  juntosumaamíliamaravilhosa. Tenhocertezaquenadadissote- ria acontecido se eu não tivesse sidodemitidodaApple. Foi um remédio muito amar- go, mas parece que o paciente precisava tomá-lo. Às vezes a vi- da nos atinge na cabeça com um tijolo. Não percam a é. Estou convencido de que a única coisa quememantevetrabalhandooi oamorquesentiaporaquiloque azia.Éprecisodescobrir aquilo que amamos. E isso vale tanto para o trabalho quanto para a  vidaaetiva. O trabalho vai ocupar uma parte substancial de nossas  vidas, e a única maneira de i- carmos realmente satiseitos é desempenhar um trabalho que acreditamos ser grandioso. E a única maneira de azer um tra-  balho grandioso é amar aquilo que azemos. Se ainda não des- cobriram o que é que amam a- zer,sigamprocurando. E, como ocorre em todos os grandes relacionamentos, as coisas só melhoram com o pas- sar dos anos. Assim, continuem procurandoatéencontraraqui- loqueamam.Nãosecontentem commenosdoqueisso. 3. Minha terceira história é a res- peitodamorte. Quando tinha 17 anos, li uma rasearespeitodamortequeera mais ou menos assim: “Se viver cadadiadesuavidacomoseos- se o último, chegará um dia em quevocêestarácerto”.  Aquilomeimpressionoumui- to e, desde então, nos últimos 33 anos, tenho me olhado no espe- lho todos os dias pela manhã e me eito essa pergunta: “Se este osseoúltimodiadaminhavida, seráqueeuariamesmooquees- touprestesaazerhoje?”E,sem- pre que a resposta é “não” por muitos dias seguidos, percebo queprecisomudaralgumacoisa. Lembrar que logo estarei morto é a erramenta mais im- portante que encontrei para me ajudar a tomar as grandes decisões da vida. Ainal, quase tudo – todas as expectativas, todo o orgulho, todo o medo do racasso ou do constrangimen- to – tudo isso se torna insignif- cante diante da morte, restan- do só aquilo que é importante. Lembrar que vamos morrer é a melhormaneiraqueconheçode evitaraarmadilhadepensarque temos algo a perder. Já estamos nus. Não há motivo para não se- guirocoração. Há cerca de um ano, ui diag- nosticado com câncer. Fiz um exame às 7h30 da manhã, e ele mostrou claramente um tumor no meu pâncreas. Eu nem sabia oqueeraumpâncreas.Osmédi- cosdisseramqueeraquasecerto queaqueleeraumtipodecâncer considerado incurável e que eu não deveria esperar viver mais doquetrêsouseismeses. O médico me disse para vol- tar para casa e resolver minhas pendências, algo que equivale à maneiracodifcadadosmédicos de dizer que vamos morrer. Sig- niica que temos de tentar con- tar aos ilhos em poucos meses tudo aquilo que imaginamos ter 10 anos para dizer. Signifca cer- tifcar-se de que tudo oi arran-  jado para que a situação seja tão ácilquantoopossívelparaasua amília.Signifcadespedir-se. Convivi com o diagnóstico o dia todo. Naquela noite, fz uma  biópsia, procedimento no qual eniaram um endoscópio pela minha garganta,atravessando o estômago e chegando ao intes- tino, cutucando meu pâncreas com uma agulha para recolher algumascélulasdotumor. Eu estava sedado, mas minha mulher, que estava presente, contou que quando os médicos analisaramascélulasaomicros- cópio, todos começaram a cho- rar, pois tratava-se de um tipo raríssimodecâncernopâncreas quepodesertratadopormeiode cirurgia. Eu fz a cirurgia e agora estoubem.Essaoiaocasiãoem que vi a morte mais de perto e esperonãorepetiraexperiência naspróximasdécadas. Mas,depoisdeterpassadopor isto, posso agora dizer a vocês algoquemepareciamenosclaro quandoamorteeraum conceito intelectual: ninguém quer mor- rer.Mesmoaspessoasquedese-  jamirparaoParaísonãoquerem morrerparachegaratélá.  Ainda assim, a morte é o des- tino fnal do qual todos nós par- tilhamos.Ninguémjamaisesca- poudela.Eé assim queascoisas deveriam ser, porque a morte é provavelmenteamelhorinven- çãodetodaavida.Elaéogrande agente transormador da vida. Elatiradocaminhooqueévelho eabreespaçoparaoqueénovo. No momento, vocês são o novo, mas, um dia, alguns anos mais tarde, vocês se tornarão gradualmente velhos e serão ti- rados do caminho. Peço perdão porsertãodramático,masissoé  bastanteverdadeiro. Nossotempoélimitadoe,por isso,nãodevemosdesperdiçá-lo  vivendo uma vida que não seja a nossa.Nãosedeixemaprisionar pelo dogma – que equivale a vi-  ver de acordo com os resultados dopensamentodeoutrapessoa. Não deixem o ruído da opinião alheia aogar a voz que vem do interiordecadaumdevocês. E, mais importante, tenham a coragemdeseguirseucoraçãoe sua intuição. De alguma manei- ra,elesjásabemaquiloquevocês realmente desejam se tornar . Tudoomaisésecundário. Quando eu era jovem, havia uma publicação antástica cha- mada The Whole Earth Catalog , que oi uma das bíblias da mi- nha geração. Foi criada por um sujeito chamado Stewart Brand pertodaqui,emMenloPark,eele deu vida à publicação com o seu toque poético. Isso era no im dos anos 60, antes dos compu- tadorespessoaisedaeditoração eletrônica, o que quer dizer que tudo era eito usando máquinas de escrever, tesouras e câme- ras Polaroid. Era uma espécie de Google em orma de livro de  bolso, 35 anos antes de o Google ter sido inventado. Tratava-se deumapublicaçãoidealista,que transbordavadeerramentasba- canasenoçõesgeniais. Quando a revista pareceu ter cumprido sua missão, eles ize- ramumaediçãofnal.Estávamos emmeadosdadécadade70,eeu tinhaaidadedevocês.Naquarta capa da última edição havia uma oto de uma estrada interiorana nas primeiras horas da manhã, o tipo de estrada na qual os mais aventureirosgostamdepedirca- rona.Abaixodaotoestavames- crito:“Continuemesomeados. Continuembobos”.Aquela oia mensagemdedespedidadeles. Continuem esomeados. Continuem bobos. Sempre desejei isso para mim mesmo. E agora que vocês estão se or- mando para dar início a um no-  vo começo, é isso que desejo a  vocês.Continuemesomeados. Continuembobos. Muitoobrigadoatodos. TRADUÇÃODEAUGUSTOCALIL Em 2005, Jobs foi convidadopara seroparaninfo da turma de formandosda Universidade deStanford, naCalifórnia. Naépoca,Jobs estava no fim doprocessode recuperaçãode umacirurgiaque retirouumtumor deseupâncreas. Ele falou duranteoito minutosparaum estádio cheio de estudantes.      E      S      P      E      C      I      A      L

Pôster Steve Jobs

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Page 1: Pôster Steve Jobs

 

Éumahonraestarcomvocêsho- jenasuacerimôniadeormaturaem uma das melhores universi-dadesdomundo.Nuncameor-mei na aculdade. Este discursoé o mais perto que já ch eguei deumaormatura.Hojequerocon-tar a vocês três histórias da mi-nha vida. Só isso. Nada de mais. Apenastrêshistórias.

1. A primeira história éa respeito de ligar os

pontos. Desisti decursar a Universi-

dadeReeddepoisdos primeiross e i s m e s e s d e

aula, mas conti-nuei a requentar o

câmpus como ouvin-tepormais18

meses antesde desistir de vez.

Porqueeulargueiaacul-dade?Tudocomeçouantesdeeunascer.Minhamãebiológicaeraumamulherjovemesolteiraquetinha se ormado na aculdade edecidiu me entregar à adoção.Ela azia questão que eu osseadotado por um casal ormadono ensino superior e, por isso,tudo oi arranjado para que euosseadotadologoaonascerporumadvogadoeamulherdele.

Mas,quandonasci,ocasalde-cidiu que na verdade o que que-riam era uma flha. Assim, meuspais, que estavam na lista de es-pera,receberamumteleonemano meio da madrugada pergun-tando: “Temos um inesperado bebê menino; vocês o querem?”Elesresponderam:“Éclaro”.

Posteriormente, minha mãe biológica descobriu que minhamãe nunca tinha se ormadona aculdade e que meu pai nãoconcluiu o ensino médio. Ela serecusou a assinar os documen-tos fnais da adoção e só mudoude ideia alguns meses depois,quando meus pais prometeramqueumdiaeuiriaàuniversidade.

Bem,17anosmaistarde,euui

CONTINUEMBOBOS

SteveJobs

rememberingsteve [email protected]

     h    t    t   p   :     /     /   w   w   w

 .   e   s

    t   a     d

   a   o

 .   c   o   m

 .     b   r

Steve Jobs morreu na quarta-feira da semana passada. De lá para cá, tudo o que havia para ser falado ou escrito sobre seuimpacto no mundo hoje já foi publicado. É impossível evitar a repetição. Mas o ‘Link’ não pode deixar de escolher o que querdizer sobre o cara que moldou parte do mundo que cobrimos todos os dias. Você provavelmente já viu, ouviu ou leu isso.Mas de tudo o que foi dito sobre Steve Jobs, o que queremos dizer sobre ele é o que ele disse de si mesmo

A MORTE É O DESTINO FINAL DOQUAL TODOS NÓS PARTILHAMOS.NINGUÉM JAMAIS ESCAPOU DELA.

E É ASSIM QUE AS COISAS DEVERIAM SER,PORQUE A MORTE É PROVAVELMENTE AMELHOR INVENÇÃO DE TODA A VIDA

para a universidade. Mas, inge-nuamente, escolhi uma univer-sidade quase tão cara quantoStanord, e toda a poupança dosmeuspais,declassetrabalhado-ra,estavasendogastacomomeuensino superior. Depois de seismeses, não consegui enxergar oméritodaquilo.

Eunãotinhaideiadoqueque-ria azer da vida e não imaginavacomoauniversidadepoderiame

ajudar a descobrir a resposta. Eali estava eu, gastando todo odinheiro que meus pais tinhampoupado durante toda a vida.Decidiabandonarocursoeacre-ditarquetudodariacertonofm.

Na época oi assustador, mas,emretrospecto,oiumadasme-lhores decisões que tomei. As-simquelargueiaaculdade,nãopreciseimaisrequentarasaulasquenãomeinteressavamepudeircomoouvinteàsquepareciamsermaisinteressantes.

Nem tudo oi romântico. Eunão tinha quarto no dormitóriouniversitárioe,porisso,dormianochãodosquartosdoscolegas.Recolhia garraas de Coca-Colaparatrocá-lasporUS$0,05eterdinheiro para comprar comi-da. Caminhava mais de 10 kmaos domingos, de um extremoao outro da cidade, para azer amelhor reeição da semana no

t e m p l o H a r eK r i s h n a . Euamava isso. E

percebi depoisque boa parte da-

quilo com que medepareiao seguir mi-

nha curiosidade e minhaintuição consistiu em experi-ências de valor incalculável.

Eis um exemplo do que querodizer: naquela época, a Univer-sidade Reed oerecia provavel-mente a melhor instrução cali-gráica de todo o país. Por todoocâmpus,cadacartazecadaeti-queta de cada gaveta eram ma-ravilhosamente escritos à mão.Porterviradoumdesistentequenão precisava mais assistir àsaulasnormais,decidiparticipardasaulasdecaligrafa.

Descobri muito a respeito deontes seriadas e sans-seri, de variaçõesnoespaçamentodedi-erentescombinaçõesdeletras,decaracterísticasquemaischa-mam a atenção naquilo que há de melhor na tipografa. Era umassuntomaravilhoso,histórico,de uma sutileza artística que aciência não é capaz de capturar.Etudomepareceuascinante.

Nada disso parecia inspirara menor esperança de encon-trar uma aplicação prática naminha vida. Mas, dez anos maistarde, quando estávamos pro- jetando o primeiro Macintosh,me lembrei daquelas aulas. Etodos aqueles conceitos oramincorporados ao nosso projetopara o Mac. Ele oi o primeirocomputador a ter uma tipogra-fabelíssima.Seeununcativesseparticipadodaquelecursocomo

ouvinte,oMacnãoteriacontadocom dierentes tipos de onte enem com caracteres de espaça-mento proporcional. Como o Windows copiou o Mac, é pro- vável que nenhum computadorpessoaltivesseessesrecursos.

Se nunca tivesse me tornadoumdesistente,nãoteriametor-nado um ouvinte naquela auladecaligrafae,talvez,oscompu-tadoresnãotivessemosmaravi-

lhososrecursostipográfcosquetêm hoje. É claro que, na épocada aculdade, era impossível li-gar esses pontos. Mas, dez anosmais tarde, a relação entre elesestavaclaríssima.

Repitoquenãoépossívelligarospontosquandoolhamosparaouturo;sópodemosligá-losaoolhar para o passado. É precisoconfar que os pontos acabarãoseligandounsaosoutros.Épre-ciso coniar em alguma coisa –instinto, destino, carma, o queor. Essa abordagem nunca medecepcionou, e ez toda a die-rençanaminhavida.

2.Minha segunda história é a res-peitodoamoredaperda.

Eu tive sorte – descobri cedoaquilo que amo azer. Woz e euundamos a Apple na garagemdos meus pais quando eu tinha20 anos. Trabalhamos duro e,dez anos mais tarde, a Apple ti-nha crescido e virado uma em-presaavaliadaemUS$2bilhões,com mais de 4 mil uncionários.Tínhamos acabado de lançarnossacriaçãomáxima–oMacin-tosh–noanoanterior,eeutinhaacabadodecompletar30anos.

Eentão,uidemitido.Comoépossívelumapessoaserdemiti-dadeumaempresaqueajudouaundar? Bem, conorme a Applecresceu, contratamos alguémquemepareceumuitotalentosopara administrar a empresa aomeu lado e, no primeiro ano deparceria,ascoisasderamcerto.

Masnossasvisõesparaoutu-rocomeçaramadivergire,fnal-mente, brigamos e nosso con-selho administrativo decidiutomaropartidodele.Assim,aos30anos,euestavaora.Anotíciaoi muito divulgada. Aquilo queora o oco de toda a minha vidaadultatinhasidotiradodemim,eaexperiênciaoidevastadora.

Por alguns meses, não sou- be ao certo o que azer. Tive asensação de ter decepcionado ageraçãoanteriordeempreende-dores – de ter derrubado o bas-tãoquandoeleeratransmitidoamim.EncontreiDavidPackardeBobNoyceetenteimedesculparporterestragadotudo.

Meu racasso oi absoluta-mente público e pensei até emugir do Vale do Silício. Mas co-mecei a perceber algo: eu aindaamava aquilo que azia. As ine-lizes situações vividas na Applenãotinhammudadoissoemna-

da. Eu tinha sido rejeitado, mascontinuavaapaixonado.

E, assim, decidi começar denovo. Não percebi isso na épo-ca, mas parece que ter sido de-mitido da Apple oi a melhorcoisa que poderia ter aconteci-do para mim. O peso do sucessooi substituído pela leveza deser um iniciante de novo, me-nos cheio de certezas a respeitode tudo. Aquilo me deu a liber-

dade necessária para começarum dos períodos mais criativosda minha vida.

Nos cinco anos seguintes,undei uma empresa chamadaNeXT, outra chamada Pixar eme apaixonei por uma mulherantásticacomaqualmecasei.A Pixaravançouatécriaroprimei-rolonga-metragemdeanimaçãoeitoporcomputador,ToyStory,e virou o estúdio de animaçãomais bem sucedido do mundo.Numa reviravolta notável, a Ap-ple comprou a NeXT, eu volteipara a Apple e a tecnologia quedesenvolvemosnaNeXTestánocoraçãodorenascimentodaAp-ple.ELaureneeeuconstruímos juntosumaamíliamaravilhosa.Tenhocertezaquenadadissote-ria acontecido se eu não tivessesidodemitidodaApple.

Foi um remédio muito amar-go, mas parece que o pacienteprecisava tomá-lo. Às vezes a vi-da nos atinge na cabeça com umtijolo. Não percam a é. Estouconvencido de que a única coisaquememantevetrabalhandooioamorquesentiaporaquiloqueazia. É preciso descobrir aquiloque amamos. E isso vale tantopara o trabalho quanto para a vidaaetiva.

O trabalho vai ocupar umaparte substancial de nossas vidas, e a única maneira de i-carmos realmente satiseitos édesempenhar um trabalho queacreditamos ser grandioso. E aúnica maneira de azer um tra- balho grandioso é amar aquiloque azemos. Se ainda não des-cobriram o que é que amam a-zer,sigamprocurando.

E, como ocorre em todos osgrandes relacionamentos, ascoisas só melhoram com o pas-sar dos anos. Assim, continuemprocurando até encontrar aqui-loqueamam.Nãosecontentemcommenosdoqueisso.

3.Minha terceira história é a res-peitodamorte.

Quando tinha 17 anos, li uma

rasearespeitodamortequeeramais ou menos assim: “Se vivercadadiadesuavidacomoseos-se o último, chegará um dia emquevocêestarácerto”.

 Aquilomeimpressionoumui-to e, desde então, nos últimos 33anos, tenho me olhado no espe-lho todos os dias pela manhã eme eito essa pergunta: “Se esteosseoúltimodiadaminhavida,seráqueeuariamesmooquees-touprestesaazerhoje?”E,sem-pre que a resposta é “não” pormuitos dias seguidos, perceboqueprecisomudaralgumacoisa.

Lembrar que logo estareimorto é a erramenta mais im-portante que encontrei parame ajudar a tomar as grandesdecisões da vida. Ainal, quasetudo – todas as expectativas,todo o orgulho, todo o medo do

racasso ou do constrangimen-to – tudo isso se torna insignif-cante diante da morte, restan-do só aquilo que é importante.Lembrar que vamos morrer é amelhormaneiraqueconheçodeevitaraarmadilhadepensarquetemos algo a perder. Já estamosnus. Não há motivo para não se-guirocoração.

Há cerca de um ano, ui diag-nosticado com câncer. Fiz umexame às 7h30 da manhã, e elemostrou claramente um tumorno meu pâncreas. Eu nem sabiaoqueeraumpâncreas.Osmédi-cosdisseramqueeraquasecertoqueaqueleeraumtipodecâncerconsiderado incurável e que eunão deveria esperar viver maisdoquetrêsouseismeses.

O médico me disse para vol-tar para casa e resolver minhaspendências, algo que equivale à maneiracodifcadadosmédicosde dizer que vamos morrer. Sig-niica que temos de tentar con-tar aos ilhos em poucos mesestudo aquilo que imaginamos ter10 anos para dizer. Signifca cer-tifcar-se de que tudo oi arran- jado para que a situação seja tãoácilquantoopossívelparaasuaamília.Signifcadespedir-se.

Convivi com o diagnóstico odia todo. Naquela noite, fz uma biópsia, procedimento no qualeniaram um endoscópio pelaminha garganta, atravessando oestômago e chegando ao intes-tino, cutucando meu pâncreascom uma agulha para recolheralgumas células do tumor.

Eu estava sedado, mas minhamulher, que estava presente,contou que quando os médicosanalisaramascélulasaomicros-cópio, todos começaram a cho-rar, pois tratava-se de um tiporaríssimodecâncernopâncreasquepodesertratadopormeiodecirurgia. Eu fz a cirurgia e agoraestoubem.Essaoiaocasiãoemque vi a morte mais de perto eesperonãorepetiraexperiêncianaspróximasdécadas.

Mas,depoisdeterpassadoporisto, posso agora dizer a vocêsalgoquemepareciamenosclaroquandoamorteeraum conceito

intelectual: ninguém quer mor-rer.Mesmoaspessoasquedese- jamirparaoParaísonãoqueremmorrerparachegaratélá.

 Ainda assim, a morte é o des-tino fnal do qual todos nós par-tilhamos.Ninguémjamaisesca-poudela.Eé assim queascoisasdeveriam ser, porque a morte éprovavelmente a melhor inven-çãodetodaavida.Elaéograndeagente transormador da vida.Elatiradocaminhooqueévelhoeabreespaçoparaoqueénovo.

No momento, vocês são onovo, mas, um dia, alguns anosmais tarde, vocês se tornarãogradualmente velhos e serão ti-rados do caminho. Peço perdãoporsertãodramático,masissoé bastanteverdadeiro.

Nossotempoélimitadoe,porisso,nãodevemosdesperdiçá-lo

 vivendo uma vida que não seja anossa.Nãosedeixemaprisionarpelo dogma – que equivale a vi- ver de acordo com os resultadosdopensamentodeoutrapessoa.Não deixem o ruído da opiniãoalheia aogar a voz que vem dointeriordecadaumdevocês.

E, mais importante, tenham acoragemdeseguirseucoraçãoesua intuição. De alguma manei-ra,elesjásabemaquiloquevocêsrealmente desejam se tornar.Tudoomaisésecundário.

Quando eu era jovem, haviauma publicação antástica cha-mada The Whole Earth Catalog ,que oi uma das bíblias da mi-nha geração. Foi criada por umsujeito chamado Stewart Brandpertodaqui,emMenloPark,eeledeu vida à publicação com o seutoque poético. Isso era no imdos anos 60, antes dos compu-tadorespessoaisedaeditoraçãoeletrônica, o que quer dizer quetudo era eito usando máquinasde escrever, tesouras e câme-ras Polaroid. Era uma espéciede Google em orma de livro de bolso, 35 anos antes de o Googleter sido inventado. Tratava-sedeumapublicaçãoidealista,quetransbordavadeerramentasba-canasenoçõesgeniais.

Quando a revista pareceu tercumprido sua missão, eles ize-ramumaediçãofnal.Estávamosemmeadosdadécadade70,eeutinhaaidadedevocês.Naquartacapa da última edição havia umaoto de uma estrada interiorananas primeiras horas da manhã,o tipo de estrada na qual os maisaventureirosgostamdepedirca-rona.Abaixodaotoestavames-crito: “Continuem esomeados.Continuem bobos”. Aquela oi amensagemdedespedidadeles.

Continuem esomeados.Continuem bobos. Sempredesejei isso para mim mesmo.E agora que vocês estão se or-mando para dar início a um no- vo começo, é isso que desejo a vocês. Continuem esomeados.Continuembobos.

Muitoobrigadoatodos.

TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

 

Em 2005, Jobs foiconvidado paraser o paraninfoda turma deformandos daUniversidadede Stanford,na Califórnia.Na época, Jobsestava no fimdo processo derecuperação deuma cirurgia queretirou um tumorde seu pâncreas.Ele faloudurante oitominutos para umestádio cheio deestudantes.

     E     S     P     E     C     I     A     L

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