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Editor: Instituto Politécnico de Santarém
Coordenação: Gabinete coordenador do projecto
Ano 6; N.º 227; Periodicidade média semanal; ISSN:2182-5297; [N.53]
FOLHA INFORMATIVA Nº02-2013
Planeamento Urbanístico ad hoc para territórios de exceção:
Parte II – O caso exemplar da Aldeia Avieira das Caneiras
Ana Lídia Virtudesa e Filipa Almeidab
Departamento de Engenharia Civil e Arquitetura da Universidade da Beira Interior a Professora auxiliar b Mestre e doutoranda em Arquitetura
Resumo.
Desde Fevereiro de 2010 que uma equipa de investigadores da Universidade da Beira
Interior do domínio científico do Urbanismo tem vindo a estudar as aldeias Avieiras do
Tejo. O conteúdo desta folha informativa intitulada “Planeamento Urbanístico ad hoc para
territórios de exceção: Parte II - O caso exemplar da Aldeia Avieira das Caneiras” é o
reflexo desse trabalho acerca do qual se divulgam alguns resultados.
Palavras chave: Aldeias Avieiras do Tejo, Planeamento Urbanístico, Caneiras, Instrumentos
de Gestão Territorial, Planos Municipais de Ordenamento do Território.
1. Introdução.
Em todo o mundo, vários fatores justificam a existência de assentamentos urbanos junto a
rios. A morfologia urbana do território é muitas vezes herdada da paisagem fluvial. A palafita
sobre a água é uma das mais antigas tipologias da arquitetura vernácula, cuja origem e
permanência se entendem numa viagem no tempo e à volta do mundo (Bahamón et al., 2009).
Em Portugal, as aldeias Avieiras do Tejo expressam a diversidade ecológica do rio e cultural
da malha urbana. Testemunham uma longa história de geografias comuns entre o rio e os
assentamentos urbanos e constituem uma relevante herança palafítica fluvial da arquitetura
vernácula. Esta herança adaptou ao rio (perante as cheias do Tejo) a arquitetura da costa
Atlântica (implantada nas movediças dunas de areia), expressando um dos mais assinaláveis
movimentos migratórios internos em Portugal, com origem nos finais do séc. XIX: a vinda dos
Avieiros para o Tejo. Na sua génese, os assentamentos urbanos Avieiros, foram reunindo as
condições necessárias, inerentes ao sedentarismo crescente da comunidade de pescadores, de
um abrigo mais estável, confortável e duradouro. Para tal, foram sendo utilizados na
construção das casas, materiais locais, sustentáveis e renováveis, como a madeira, os caniços
ou os ramos de árvores (ver figuras seguintes).
Caneiras - 2011
As aldeias Avieiras localizam-se junto ao rio Tejo, em ambas as margens e apresentam
diferentes tipologias no que concerne à estrutura espacial na relação com o território
envolvente. Alguns núcleos Avieiros encontram-se isolados, junto ao rio, afastados dos
grandes centros urbanos sendo esta a situação mais frequente, como o Porto da Palha
(Azambuja), a Palhota (Cartaxo) ou o Patacão (Alpiarça). Outros estão inseridos na malha
urbana de uma cidade mais vasta, como bairro, mais ou menos preterido no conjunto da urbe,
como era o caso do bairro Avieiro da Póvoa de Santa Iria, já demolido. Outros ainda localizam-
se a pouca distância de cidades de média dimensão, em relação às quais funcionam como
subúrbios, permitindo os movimentos pendulares diários das suas populações residentes,
como é o caso das Caneiras junto a Santarém.
Em termos de organização espacial identificam-se diversas situações nos núcleos Avieiros.
Os conjuntos edificados compostos por várias casas, palafitas de arquitetura vernacular a que
se foram juntando outros tipos de edifícios que formam no seu todo o aglomerado urbano,
caracterizado por espaços coletivos como as ruas, os passeios, os largos e até alguns
equipamentos coletivos (como a igreja das Caneiras), redes de infraestruturas e alguma
diversidade funcional, com destaque para o comércio, cafés ou restaurantes, museus ou
correios, para além da habitação. São os casos das aldeias Avieiras das Caneiras e do
Escaroupim onde estas caraterísticas são mais evidentes. Outras aldeias são compostas por um
conjunto de casas em número mais reduzido do que nos casos anteriores, nos quais a
organização como conjunto dá lugar a espaços coletivos de cariz urbano entre os edifícios,
essencialmente associados à função de garantirem o acesso à aldeia e às casas. Identificam-se
ruas ou largos mas não existem equipamentos nem diversidade funcional esgotada na
habitação. São os casos do Porto da Palha, da Palhota e do devoluto Patacão.
Atualmente, grande parte deste património arquitetónico e urbanístico já desapareceu,
está ao abandono ou descaracterizado, quer em termos arquitetónicos pelas sucessivas
alterações a que foi sendo sujeito sem qualquer guia de ‘boas práticas arquitetónicas’ quer em
termos urbanísticos por razões idênticas.
Este artigo pretende analisar o enquadramento das aldeias Avieiras do Tejo nos
instrumentos de gestão territorial, i.e., nos planos urbanísticos, tendo como exemplo o caso
das Caneiras. Trata-se da aldeia Avieira mais populosa, que funciona como subúrbio da cidade
de Santarém, da qual está próxima, facto este não alheio à vitalidade que revela, quando
comparada com a generalidade dos restantes núcleos urbanos (desaparecidos ou em declínio).
2. Enquadramento das Caneiras no PDM de Santarém.
O Instrumento de Gestão Territorial (IGT) em vigor na aldeia Avieira das Caneiras é o Plano
Diretor Municipal (PDM) de Santarém. Foi aprovado por Resolução do Conselho de Ministros
n.º 111/95 e publicado em Diário da República a 24 de Outubro de 1995, após o que entrou
em vigor. Foi objeto de diversas alterações, de acordo com um processo que se pretende
contínuo e permanente de observação e intervenção no território como é o planeamento
urbanístico. Ora, os elementos fundamentais constituintes do PDM (peças desenhadas ou
plantas e peças escritas ou regulamento) que definem as regras da ocupação, uso e
transformação do solo - nomeadamente as ações de edificar e urbanizar - são a planta de
ordenamento, que estabelece os usos do solo, as três plantas de condicionantes - planta da
Reserva Agrícola Nacional (RAN), planta da Reserva Ecológica Nacional (REN) e planta de
outros condicionantes, como sejam as servidões administrativas -, e ainda o regulamento. Este
último estabelece todas as considerações em função do respetivo uso do solo ou dos
condicionantes aos usos do solo, identificados nas peças desenhadas. Assim, apresenta-se nos
itens seguintes o enquadramento detalhado da aldeia das Caneiras nos elementos
fundamentais do PDM de Santarém. Pretendem-se identificar os tipos de usos, ocupações e
transformações do solo permitidos ou interditos por este IGT neste aglomerado urbano.
2.1 As Caneiras na Planta de Ordenamento do PDM de Santarém.
De acordo com a planta de ordenamento do PDM de Santarém, à escala 1:25.000, o núcleo
mais antigo das Caneiras, onde se localizam as casas palafíticas Avieiras, pertence à classe de
Espaços Agroflorestais (integrados na RAN)1 (ver figuras seguintes). De acordo com o
regulamento do PDM de Santarém, nesta classe de espaços a Câmara Municipal poderá
autorizar a edificação de uma habitação isolada e unifamiliar desde que a parcela tenha uma
dimensão igual ou superior à unidade mínima de cultura. Estas construções deverão ter um
piso, uma área coberta inferior a 200m2 e uma altura máxima de 6 metros. Refere o
regulamento do PDM que estas condições devem ser aplicadas sem prejuízo do disposto no
regime jurídico da RAN e da REN. É ainda permitida a construção de equipamentos de
interesse municipal se os mesmos não puderem ser instalados em espaço urbano ou
urbanizável.
Localização das Caneiras na Planta de Ordenamento do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
1 As principais regras de ocupação do solo, de edificabilidade e de urbanização aplicáveis aos espaços agroflorestais estão definidas no art.65º do Regulamento do Plano Diretor Municipal de Santarém.
Classificação do núcleo antigo Caneiras nos espaços agroflorestais (integrados na RAN) - Planta de Ordenamento do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
2.2 As Caneiras na Planta da Reserva Ecológica Nacional do PDM de Santarém.
Pela consulta da planta da Reserva Ecológica Nacional do PDM de Santarém, à escala
1:25.000, verifica-se que a aldeia das Caneiras está abrangida por esta condicionante
urbanística, no território correspondente à totalidade do seu aglomerado urbano (ver figuras
seguintes). A REN foi criada com o objetivo de proteger as áreas de maior valor e sensibilidade
ecológica ou suscetíveis de riscos naturais2. Nela se incluem, entre outros territórios, os cursos
de águas e os respetivos leitos, as suas margens e as zonas ameaçadas pelas cheias3. Visa
estabelecer os condicionantes à ocupação, uso e transformação do solo, definindo as
atividades que considera serem compatíveis com a proteção e a valorização ecológica.
No que se refere a obras de construção, alteração e ampliação de edifícios, localizados
junto aos cursos de água, como é a aldeia das Caneiras, o regime da REN apenas permite a
construção de cabinas para motores de rega com uma área de construção inferior a 4m2.
Quanto aos usos e às atividades relacionadas com os equipamentos coletivos de recreio e
lazer, o regime da REN permite a instalação destes equipamentos de apoio às zonas de recreio
balnear e à atividade náutica de recreio, a existência de espaços verdes de utilização coletiva
como parques ou jardins, e ainda a abertura de trilhos pedonais destinados à educação e
interpretação ambiental nas margens dos rios4.
Nas áreas incluídas na REN são interditas as ações de iniciativa pública ou privada que se
traduzam em operações de loteamento, obras de urbanização (tais como redes de
infraestruturas de abastecimento de água, drenagem de águas pluviais ou esgotos),
construção e ampliação, vias de comunicação, escavações ou aterros e destruição do
revestimento vegetal.
2 Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional, Decreto-Lei n.º166/2008, art. 2º, n.º1. 3 Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional, Decreto-Lei n.º166/2008, art. 4º, n.º3 – alínea a), nº4 – alínea c). 4 Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional, Decreto-Lei n.º166/2008 - Anexo II.
Localização das Caneiras na Planta da REN do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
Classificação das Caneiras na Reserva Ecológica Nacional do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
2.3 As Caneiras na Planta da Reserva Agrícola Nacional do PDM de Santarém.
Pela consulta da planta da RAN do PDM de Santarém, à escala 1:25000, observa-se que o
núcleo antigo das Caneiras onde se localizam as casas palafíticas Avieiras está incluído na RAN.
A RAN tem como objetivo geral proteger os solos com elevada ou moderada aptidão agrícola.
Estes solos devem ser afetos à atividade agrícola e constituem áreas non aedificandi, i.e. são
interditas a quaisquer obras de urbanização, construção ou ampliação, exceto5 instalações de
apoio à atividade agrícola e pecuária, habitação para o agricultor em exploração agrícola ou
para o proprietário do terreno caso não exista outra alternativa viável, estabelecimentos de
turismo rural, estabelecimentos industriais e comerciais complementares à atividade agrícola e
equipamentos de produção de energia renovável. Também são permitidas obras e
intervenções indispensáveis à salvaguarda do património cultural, designadamente de
natureza arqueológica, recuperação paisagística ou medidas de minimização determinadas
pelas autoridades competentes na área do ambiente6.
Por outro lado, o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação7 consagra o princípio da
proteção do existente que estabelece que, se um prédio rústico já integrar uma edificação, não
pode ser recusada a licença para obras de reconstrução ou alteração com fundamento em
normas legais ou regulamentares supervenientes à construção originária, desde que tais obras
resultem na melhoria das condições de segurança e salubridade da edificação e não originem
ou agravem desconformidades com as normas vigentes8.
Assim sendo, e de acordo com o quadro anterior, se os espaços agroflorestais forem
abrangidos pela RAN e pela REN simultaneamente, o que acontece em grande parte da aldeia
das Caneiras, incluindo na zona onde se situa o núcleo antigo i.e. das casas palafitas Avieiras,
os únicos usos ou atividades compatíveis com ambas as restrições estão relacionados com o
turismo, recreio e lazer, com as atividades agrícolas e florestais e com a criação de
infraestruturas (ver figuras seguintes). Na restante parte do aglomerado urbano pertence à
classe de espaços agroflorestais, ainda que esteja excluída da RAN, como é também abrangida
pela REN, e sendo este o regime de uso do solo mais restritivo, permitem-se os mesmos usos e
atividades da situação anterior.
Localização das Caneiras na Planta da RAN do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
5 Decreto-Lei n.º 73/2009, art. 22º 6 Decreto-Lei n.º 73/2009, art. 22º, nº1, alínea j) 7 Decreto-Lei 26/2010 (republicação do Decreto-Lei nº. 555/1999). Regime Jurídico da Urbanização e Edificação 8 Decreto-Lei 26/2010, art. 60º, nº2.
Classificação das Caneiras na Reserva Agrícola Nacional do PDM de Santarém (1:25.000) – 1995.
2.4 As Caneiras na Planta de Outros Condicionantes do PDM de Santarém.
Da consulta da planta de outros condicionantes do PDM de Santarém nas Caneiras verifica-
se a existência de uma servidão administrativa i.e. um espaço non aedificandi, correspondente
à linha de água do rio Tejo, considerado um curso de água navegável ou flutuável.
Consequentemente, a servidão non aedificandi i.e. onde é proibido edificar, é de 30,00 metros
de largura contados a partir da linha que delimita o leito9 do rio. As construções palafíticas
avieiras inserem-se dentro desta servidão.
Localização das Caneiras na Planta de Outros Condicionantes do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
9 Lei 54/2005, art. 11º. Estabelece a titularidade dos recursos hídricos.
Classificação das Caneiras na Planta de Outros Condicionantes do PDM de Santarém (1:25.000) - 1995.
Em síntese, os usos e as atividades admitidos pelo regulamento do PDM de Santarém para
os espaços agroflorestais (ver quadro seguinte) diferem no caso de haver paralelamente uma
inclusão em área de Reserva Agrícola Nacional10 ou de Reserva Ecológica Nacional11.
Ações permitidas nos espaços agroflorestais - extrato do quadro de compatibilidade de usos do solo (anexo do regulamento do PDM de Santarém) – 1995.
No caso de os espaços agroflorestais serem abrangidos quer pela RAN quer pela REN, como
acontece em grande parte do aglomerado urbano de Caneiras, incluindo na zona onde se situa
o núcleo antigo das palafitas junto ao rio, os usos e atividades permitidos e compatíveis com
todas as condicionantes urbanísticas são os seguintes: turismo, recreio e lazer, agrícola e
florestal e infraestruturas. A restante parte da aldeia, mais afastada do rio está excluída da
RAN. Contudo, como o regime de edificabilidade e urbanização permitido na REN é mais
restritivo do que o permitido na RAN ou nos espaços agroflorestais, os usos e atividades aqui
permitidas são idênticas às do núcleo mais antigo.
10 Decreto-Lei n.º 73/2009. Regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional. 11 Decreto-Lei n.º166/2008. Regime jurídico da Reserva Ecológica Nacional.
3. Organização fundiária das Caneiras.
Uma análise da planta cadastral das Caneiras revela que o núcleo de casas palafíticas junto
ao Tejo está implantado numa única parcela i.e. numa única unidade fundiária. Quer isto dizer
que as várias habitações palafíticas pertencentes a vários proprietários estão incluídas numa
única parcela (ver figura seguinte). Este facto poderá constituir uma dificuldade para a
legalização dos edifícios uma vez que dificulta a correspondência entre cada um deles e os
respetivos terrenos onde se implantam, de modo a que cada proprietário possa garantir a
independência quer da sua casa quer do terreno que lhe está associado.
A planta cadastral caracteriza e identifica os prédios existentes em território nacional. Em
termos cadastrais ou fundiários a nomenclatura utilizada inclui três denominações relativas às
parcelas: prédio rústico, prédio urbano ou prédio misto. Por prédio rústico entende-se a parte
não edificada do terreno que pode corresponder à sua totalidade; por prédio urbano entende-
se a parte do terreno ocupada pelo edifício; por prédio misto entende-se o terreno que inclui a
parte edificada i.e. o imóvel e a parte não edificada (quintal, logradouro ou espaço livre).
Localização das Caneiras na Planta de Cadastro Rústico (1:2.000) - 1960/70.
4. Conclusões
Neste início de século exige-se um urbanismo de exceção para situações especiais como a
das aldeias Avieiras do Tejo, encontrando nos instrumentos de gestão territorial, como o PDM,
o plano de urbanização ou o plano de pormenor, as respostas até agora ausentes. Tais
medidas devem ser definidas tendo em consideração as características de cada aldeia Avieira
mas também o conjunto de todos estes aglomerados na sua ligação ao rio. Foram as
características patrimoniais, paisagísticas e morfológicas únicas existentes junto ao Tejo que
originaram as aldeias Avieiras. As cheias, o rio, a biodiversidade de habitats de fauna e flora
fazem deste legado um património valioso, que carece de atenção no planeamento urbanístico
nos seus variados e complexos articulados, instrumentos, regras e normativas.
Algum caracter de precariedade associado às aldeias Avieiras evidencia a urgência de
encontrar soluções que registem e preservem este património e que o insiram no legado
multicultural europeu, como espaços vivos e vividos de habitats voluntários de quem quer
viver o rio.
A sociedade contemporânea é marcada pela diversidade de situações, espaços e modos de
vida: de quem gosta da cidade; de quem a utiliza intensivamente; de quem não gosta tanto
assim mas necessita e depende dela; de quem ocupa os seus bairros sociais, subalternos e
espacialmente segregados; ou de quem opta por viver no campo, numa aldeia frágil e bela nas
margens de um rio.
É tempo de os urbanistas integrarem nos seus sonhos profissionais, de uma forma ou de
outra, os sonhos dos cidadãos para os quais pensam o território. Sonho de uma habitação
unifamiliar isolada ou integrada num conjunto de moradias; de uma habitação coletiva
integrada num pequeno conjunto, num conjunto médio ou num grande conjunto habitacional;
no centro da cidade, na periferia ou numa aldeia isolada abraçada pelo Tejo.
O estudo do território é indissociável das características da comunidade e da sociedade,
crescentemente individualizada que separa ou reúne os indivíduos e crescentemente
racionalizada que substitui a tradição pela razão, os cidadãos pelas estatísticas, os sentimentos
pelos números, onde cresce a diferenciação social pela diversificação de grupos e indivíduos na
mesma comunidade (ASCHER, 2010).
Como se conclui com o exemplo das Caneiras, o momento presente exige o olhar de um
urbanismo reflexivo i.e. num atento e constante exercício de reflexão, antes, durante e depois
do plano urbanístico, capaz de aplicar a solução adequada e não apenas a que está disponível.
Todo o cidadão na sua qualidade de agente que opera no território, enquanto não violar as leis
da justiça, é livre de satisfazer os seus interesses à sua própria medida, aspirações e
perspetivas.
Há que aprender com a experiência. A experiência de um pescador Avieiro deveria
ensinar-nos a estarmos preparados. Contudo, nem sempre o planeamento urbanístico reúne o
articulado capaz de especificar antecipadamente todas as contingências, oportunidades ou
catástrofes. Situações excecionais sem resposta no quadro formal exigem instrumentos
flexíveis com soluções ad hoc.
O caminho é difícil, pois os campos dos outros parecem sempre mais verdes. No entanto,
as aldeias palafíticas do Tejo indicam-nos o caminho: as suas mutações são continuidades que
se condensam no tempo e no espaço, revelando o memorial final de labutas e desejos, onde o
orgulho do passado se exibe e evidencia. Urge definir meios de intervenção e valorização deste
território que adicionem às expetativas, saberes e experiências de cada habitante, o empenho,
a persistência e o rigor do urbanismo, em prol da identidade destes lugares.
BIBLIOGRAFIA
ASCHER, Françoise (2010): Novos Princípios do Urbanismo / Novos Compromissos Urbanos – um léxico. Livros Horizonte, Lisboa.
BAHAMÓN, A., & ÁLVAREZ, A. M. (2009). Palafita: da arquitectura vernácula à contemporânea. Lisboa: Argumentum.
VIRTUDES, Ana; ALMEIDA, Filipa; TRINDADE, Daniel (2011): “Exigências de um Urbanismo na Mudança do Ciclo”, in VIII Congresso Ibérico de Urbanismo, AUP e AETU, FE, Universidade da Beira Interior, 27-29 Outubro 2011, Covilhã – PORTUGAL.
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VIRTUDES, Ana; LOUREIRO, Vânia (2011). “Da Arquitectura Vernacular à informalidade Contemporânea dos Assentamentos: reabilitação urbana do bairro Avieiro da Póvoa de Santa Iria”, in 2.º Congresso Nacional da Cultura Avieira, ESE, Instituto Politécnico de Santarém, 17-18 Junho 2011, Santarém – PORTUGAL.
VIRTUDES, Ana; ALMEIDA, Filipa (2011). “Challenges of Urban Rehabilitation in Planning Process: the forgotten heritage of Avieiras Stilt-House Villages”, in II Congresso Internacional sobre Cidades, Culturas e Sociabilidades, FL, Universidade do Porto, 3-4 Junho 2011, Porto - PORTUGAL.
VIRTUDES, Ana; ALMEIDA, Filipa; NAVARRO, Filipa (2010). “Identidade das Aldeias Avieiras: território, paisagem e arquitectura”, in 5.º Congresso Internacional de Ordenamento do Território, ISCSP, Universidade Técnica de Lisboa, 27-28 Outubro 2010, Lisboa – PORTUGAL.
VIRTUDES, Ana; ALMEIDA, Filipa; NAVARRO, Filipa (2010). “Aldeias Avieiras: oportunidade de desenvolvimento do património rural”, in VIII Coloquio Ibérico de Estudios Regionales, 21-22 Octubre 2010, Cáceres – SPAIN.