35
PHILIPÉIA, PARAYBA DO NORTE, JOÃO PESSOA: Iconografia de um Patrimônio Desmaterializado por João Nicodemos de Araújo Neto 1 RESUMO Este trabalho apresenta uma breve iconografia de logradouros públicos modificados ou derrubados pelas diversas reformas urbanísticas realizadas na cidade de João Pessoa ao longo do tempo. Para tanto foi realizada uma pesquisa literária em trabalhos acadêmicos nas áreas de história, patrimônio, arquitetura entre outros e pesquisa iconográfica, realizada em livros, arquivos de fotos antigas e pinturas. A produção da iconografia foi realizada na forma de xilogravura e infogravura, propondo uma interação entre as técnicas contemporânea e tradicional, cujos resultados culminaram na produção de um álbum de xilogravuras e outro de infogravuras. O trabalho aborda o tema do patrimônio histórico da cidade de João Pessoa e sua importância nos processos identitários dos habitantes da cidade; as primeiras grandes reformas urbanísticas do séc. XX e as mais recentes, em 2009; faz um breve relato histórico da xilogravura e apresenta uma descrição detalhada de sua técnica, demonstrando a possibilidade da inserção dos recursos digitais na sua realização, numa espécie de hibridismo entre o digital e o analógico. PALAVRAS- CHAVE: Xilogravura; Iconografia; Patrimônio. INTRODUÇÃO Neste artigo pretendo abordar o tema do patrimônio cultural da cidade de João Pessoa, capital do estado da Paraíba, partindo da observação de um recorte de sua paisagem urbana, enfocando modificações em alguns logradouros públicos e detalhes ornamentais de seu conjunto arquitetônico, considerado patrimônio histórico. 1 Pós-graduado em Artes Visuais, mestrando em música, área de etnomusicologia (UFPB). Este artigo é parte integrante de monografia com o mesmo título, produzida durante o curso de pós-graduação EAD-SENAC - Artes Visuais- Cultura e criação, em 2012.

PHILIPÉIA, PARAYBA DO NORTE, JOÃO PESSOA: Iconografia de um Patrimônio Desmaterializado

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Trabalho de pesquisa em patrimônio, história e iconografia, sobre a cidade de João Pessoa (PB).

Citation preview

PHILIPIA, PARAYBA DO NORTE, JOO PESSOA: Iconografia de um Patrimnio Desmaterializadopor Joo Nicodemos de Arajo Neto

RESUMO Este trabalho apresenta uma breve iconografia de logradouros pblicos modificados ou derrubados pelas diversas reformas urbansticas realizadas na cidade de Joo Pessoa ao longo do tempo. Para tanto foi realizada uma pesquisa literria em trabalhos acadmicos nas reas de histria, patrimnio, arquitetura entre outros e pesquisa iconogrfica, realizada em livros, arquivos de fotos antigas e pinturas. A produo da iconografia foi realizada na forma de xilogravura e infogravura, propondo uma interao entre as tcnicas contempornea e tradicional, cujos resultados culminaram na produo de um lbum de xilogravuras e outro de infogravuras. O trabalho aborda o tema do patrimnio histrico da cidade de Joo Pessoa e sua importncia nos processos identitrios dos habitantes da cidade; as primeiras grandes reformas urbansticas do sc. XX e as mais recentes, em 2009; faz um breve relato histrico da xilogravura e apresenta uma descrio detalhada de sua tcnica, demonstrando a possibilidade da insero dos recursos digitais na sua realizao, numa espcie de hibridismo entre o digital e o analgico.PALAVRAS- CHAVE: Xilogravura; Iconografia; Patrimnio.INTRODUO

Neste artigo pretendo abordar o tema do patrimnio cultural da cidade de Joo Pessoa, capital do estado da Paraba, partindo da observao de um recorte de sua paisagem urbana, enfocando modificaes em alguns logradouros pblicos e detalhes ornamentais de seu conjunto arquitetnico, considerado patrimnio histrico.

Encampando uma leitura visual, proponho uma representao iconogrfica de alguns logradouros, edificaes ou monumentos que seriam considerados patrimnios materiais da cidade de Joo Pessoa, no fossem desmaterializados pelas reformas modernizadoras de sucessivas administraes pblicas que, seguindo modelos importados de urbanismo, implementaram reformas estruturais e estticas em sua paisagem urbana ao longo do tempo. Um breve histrico se faz necessrio para contextualizao, ensejando uma melhor compreenso sobre tempo a que se refere este trabalho. Para tanto realizei pesquisa bibliogrfica e documental em teses e dissertaes acadmicas, livros, peridicos, revistas, sites e colees de fotos. Com a inteno de apontar para a possibilidade de se conservar a paisagem urbana, como uma forma de preservao da histria pessoal e coletiva de seus habitantes. Pretendo publicar uma breve iconografia em lbum, utilizando a tcnica da xilogravura e realizar exposies das imagens ampliadas por processos digitais e grficos em locais prprios para sua divulgao. A utilizao da tcnica de xilogravura para a realizao desta proposta est relacionada com a importncia histrica desta forma de expresso na rea das artes visuais, sua estreita ligao com a arte popular nordestina e, apresenta ainda, a possibilidade de integrar as tcnicas milenares da xilogravura com as tecnologias digitais contemporneas, na produo de infogravuras. Neste trabalho no pretendo abarcar todas as modificaes ocorridas durante o tempo em seus monumentos e logradouros pblicos, tarefa que seria impossvel num trabalho desta natureza e extenso, tampouco poderia propor uma releitura iconogrfica de todo o material coletado, trabalho igualmente hercleo. Apenas busco lanar um olhar sobre o tema do patrimnio histrico e os efeitos que podem provocar sobre a paisagem urbana e a vida dos habitantes de cidades como esta, que passam periodicamente por reestruturaes e reformas modernizantes, muitas vezes desconsiderando a importncia do patrimnio pblico como referencial de pertencimento e historicidade. Conforme afirmam Funari e Pelegrini(2006 p.29), A valorizao do patrimnio cultural e a necessidade de reabilitar os centroshistricos, na atualidade, constituem premissas bsicas dos debates sobreo desenvolvimento sustentvel nas cidades latino-americanas, pois essescentros representam a sntese da diversidade que caracteriza a prpriacidade. Vista por este ngulo, a reabilitao dos centros histricos, alm depotencializar a identidade coletiva dos povos e promover a preservao deseus bens culturais - materiais e imateriais - podem contribuir para odesenvolvimento econmico e social e, ainda, otimizar os custos financeirose ambientais do desenvolvimento urbano, atravs do aproveitamento dainfraestrutura de reas centrais e do incremento da indstria turstica. Projetos de revitalizao de reas urbanas que no considerem as populaes que nelas habitam, sua histria e importncia, remetem a ideias semelhantes das "faxinas tnicas" ocorridas em tantos lugares do planeta e em diferentes momentos histricos. Remover uma populao para outros locais onde no haja a relao de pertencimento e todo um constructo social e histrico seja soterrado por reformas urbansticas, pode ser catastrfico, do ponto de vista sociolgico. Na cidade de Quito, capital do Equador, que apontada por especialistas como uma das regies latino-americanas que melhor preservou seu centro histrico, foi realizado um projeto de revitalizao orientado pela UNESCO. Reconhecida como patrimnio da humanidade em 1978, a cidade possui o maior stio histrico das Amricas, em extenso e nmero de construes. O projeto visou revitalizar atividades comerciais e servios tradicionais, garantindo o acesso da populao ao patrimnio edificado. No se limitou a reativar a infraestrutura urbana, estimulando a instalaes de hotis, restaurantes, museus e outros aparelhos culturais; investiu na melhoria da qualidade de vida da populao residente e dos trabalhadores informais que ali se encontravam, fomentando a incluso social e o turismo cultural. (FUNARI; PELEGRINI, 2006).

PATRIMNIO HISTRICO BRASILEIRO: primrdios da colonizao. O patrimnio pode ser analisado e compreendido em, pelo menos, duas categorias, material e imaterial, sendo este, todo um conjunto de valores e conhecimentos intangveis, herdados e produzidos socialmente, so saberes e prticas caractersticas de um grupo humano, uma regio, ou pas; e aquele, de natureza tangvel, so construes, monumentos, locais histricos, obras de arte, bibliotecas, acervos, enfim, objetos que sejam considerados como histricos. O patrimnio histrico, normalmente se refere a um variado conjunto de bens histricos mas correntemente esta denominao vem sendo substituda pelos tericos, por patrimnio cultural.( CHOAY, 2001; SILVA; SILVA, 2006). Nos limites estabelecidos para este trabalho, o conceito de patrimnio cultural estar restrito a construes e recortes da paisagem urbana da cidade de Joo Pessoa. As cidades brasileiras dos primrdios da colonizao no obedeciam a algum planejamento quanto disposio das ruas e praas, tendo seu desenho definido pela precariedade das construes que seguiam o alinhamento dos caminhos e o relevo do terreno. Na transio do sculo XIX para o XX, uma onda de reformas estruturais e arquitetnicas marcou grandes cidades brasileiras, como um tipo de entronizao da modernidade que se anunciava, entre outros fatores, pela utilizao da eletricidade na iluminao pblica e dos bondes eltricos substituindo os de trao animal. O Futurismo europeu enaltecia o progresso e a reificao da mquina como redentora da humanidade. A vida nas cidades passava por grandes mudanas. A maioria dos estudos sobre esse tema referenciam as cidades como o Rio de Janeiro, Recife e outras de porte semelhante, mas "a reforma cirrgica levada a cabo no centro da pequena capital paraibana foi proporcionalmente quase to intensa quanto as realizadas nessas duas grandes cidades." (SOUSA; ARAJO, 2011 ). Os autores anotam ainda que "a modernizao e o embelezamento da paisagem edificada da capital do estado da Paraba [foram realizadas] de forma deliberada, atravs da construo ou reforma de edificaes do poder pblico." (SOUSA; ARAJO, 2011). Note-se que tais mudanas ocorreram aps a separao entre o Estado e a Igreja, ocorridos pela lei de 20 de abril de 1911[...] Que decretou a separao oficial entre o Estado e a Igreja, quebrandouma unio que vinha desde o perodo colonial e que fizera dos edifciosreligiosos as principais referncias na paisagem das cidades brasileiras.Com esta separao, igrejas e conventos perdem sua primazia e o Estadotrata de construir outros smbolos para as cidades, demarcando a mudananesta relao de poder. (SARMENTO et al., 2010). Os edifcios oficiais do governo se transformam em smbolos desta transio e inspirados na arquitetura europeia se apresentam como referenciais de poder e domnio nas paisagens urbanas brasileiras, ladeados pelos casares particulares da classe dominante. MEMRIA E IDENTIDADE No fcil dissociar memria de identidade, uma vez que a interdependncia entre uma e outra se faz inexorvel. No pode haver identidade sem memria, pois esta que alimenta o sentimento de continuidade, a relao do indivduo com o tempo. A memria assegura o sentimento de continuidade pessoal e tambm o de uma continuidade social, coletiva. Candal (2009, p.46,47) argumenta que:

Quando nossa memria se torna irremediavelmente falha, sob suas formasindividuais tal como problemas mnsicos severos associados s doenasneurodegenerativas (mal de Alzheimer, Huntington, Parkinson), ou sobformas coletivas que se cr legtimas, a amnsia ento acompanhada deum sentimento de perda de identidade [pessoal e coletiva]. O autor sustenta que a memria tanto pode ser reforada (pela lembrana) como enfraquecida (pelo esquecimento) e, neste caso, pode-se supor que a mudana ou destruio, ainda que parcial, da paisagem urbana afete a capacidade de memria, pessoal e coletiva, de uma populao que fez dela o cenrio do seu texto social e isso poderia acarretar o sentimento de perda da sua identidade. Candau (2009, p.47) argumenta, ainda, que:H, poderamos dizer, uma perda da essncia ou mais exatamente, arepresentao (pessoal ou coletiva) de uma perda da essncia. A memriapode, assim, ser assimilada [ou assemelhada] a essa faculdade constituinteda identidade pessoal que permite ao sujeito de se pensar detentor de umaessncia que permanece estvel no tempo, ou de pensar que o grupo aoqual pertence detentor de uma essncia tendo a mesma propriedade. A memria um tipo capacidade de conservar algumas categorias de informaes, resultante de processos psquicos e sensoriais que permitem ao indivduo construir e reconstruir sua presena no mundo. (LE GOFF, 1994). Pode ser individual ou coletiva e, neste caso, ser construda por experincias vividas pelo indivduo, juntamente com as que lhe foram repassadas como pertencentes ao seu grupo. A memria coletiva fundamenta a identidade coletiva e normalmente se baseia em imagens e paisagens. Tem como caracterstica a simplificao da noo de tempo, identificando o passado como "antigamente", por exemplo, e o presente como "nossos dias". O esquecimento tambm relevante no processo de construo da memria coletiva, que poder ser reelaborada, segundo as convenincias do grupo, pois muitas vezes pode ocultar determinados fatos e ressaltar outros. (SILVA; SILVA, 2006). Parece, portanto, que a memria coletiva seja um tipo de constructo que, para existir, precise de compartilhamento e ratificao social, sustentado por "relquias", mitos, festas, comemoraes e monumentos, que lhe confiram autenticidade. O patrimnio pode ser considerado um dos elementos constitutivos da cultura e "cada forma cultural, uma vez criada, consumida a ritmos variveis pela fora da vida" (BAUMAN, 2012, p. 27). Quanto cultura:

[...] como tende a ser vista agora, tanto um agente da desordem quantoum instrumento da ordem; um fator tanto de envelhecimento eobsolescncia quanto de atemporalidade. O trabalho da cultura noconsiste tanto em sua autoperpetuao quanto em garantir as condiespara futuras experimentaes e mudanas. Ou melhor, a cultura se'autoperpetua' na medida em que no o padro, mas o impulso de modific-lo, de alter-lo e substitu-lo por outro padro continua vivel e potente como passar do tempo. O paradoxo da cultura pode ser assim reformulado: oque quer que sirva para a preservao de um padro tambm enfraqueceseu poder. (BAUMAN, 2012, p. 28). Mais do que alimentar um sentimento de passadismo, apresentando o passado como um tempo ideal onde tudo fora melhor que o presente; o que pretendo, levantar alguns dados que possam reavivar na memria aspectos importantes da vida e da ao dos habitantes precedentes. Concordando com Meyer (2009, p.33) pode-se considerar que:

O historiador precisa de imaginao e inventividade; caso contrrio, estarvencido antes mesmo de comear a cruzada. Motivo pelo qual, [...] noslanamos conquista da memria, com o objetivo de abater oesquecimento. [...] E o combate pela histria obrigou-nos a reconhecer namemria um verdadeiro desafio. Lembrar, evocar, recapitular, fazerpresente, trazer vista as lembranas, o passado longnquo ou prximo, setraduz em armas primordiais contra o esquecimento [...]. Ao recuperar essasvivncias, podemos analis-las, interpret-las, e compreend-las; talvez atperdo-las. O que no podemos, no devemos, ignorar as histrias,esquivar-nos do passado, [...] para valer-nos de novas formas de ver omundo, de entender nosso passado e construir o presente. Manter na memria os acontecimentos do lugar, da cidade, refora o sentimento de identidade e possibilita avaliar os acertos e evitar os erros j cometidos. Compreender os fatos do passado, sem julgamentos pessoais, mas com a coragem crtica buscando alternativas que considerem o patrimnio pblico como um bem comum. AS REFORMAS As necessidades geradas pelo crescimento populacional nas grandes metrpoles parecem legitimar reformas urbanas que preconizam as demolies de reas importantes do ponto de vista do patrimnio histrico e cultural. Todavia, recebem calorosas crticas de autores como William Morris (1834-1896); John Ruskin (1819-1900); Camilo Sitte (1843-1903), cujas proposies so a base do chamado urbanismo ecolgico e organicista e fundamentam as teorias modernas de restauro (FUNARI; PELEGRINI, 2006).Os desafios da restaurao e reconstruo dos monumentos destrudos nos bombardeios da Segunda Guerra (1939-1945) contriburam para a "conscientizao acerca dos valores identitrios dos bairros antigos, como lugares socialmente produzidos, privilegiados pelo acmulo de experincias humanas e de vestgios da cultura material, resultante da permanente apropriao das coisas do passado." (FUNARI; PELEGRINI, 2006, p.31 ). O conceito de patrimnio histrico, que privilegia e reconhece como patrimnio, construes de cunho religioso (do culto catlico), militar ou de antigas propriedades do Estado ou da aristocracia, comeou a mudar nas dcadas finais do sculo XX e a ser ampliado pela compreenso de que a "valorizao dos centros histricos no pode estar dissociada da apreciao do contexto territorial e da paisagem urbana." (FUNARI; PELEGRINI, 2006, p.31). E "esta abertura temtica permitiu que construes menos prestigiadas ou mais populares, como moinhos, mercados pblicos ou estaes de trem, fossem reconhecidos como patrimnio, incluindo-se nesse rol produes contemporneas e bens culturais de natureza intangvel [...]" (FUNARI; PELEGRINI, 2006, p. 32). Casas de sap, como a de Pai Mateus, em Cabaceiras - PB, (ver figura 01), ou casas como a de Mestre Vitalino, em Alto do Moura, Caruaru - PE (ver figura 02), podem ser tombadas como patrimnio histrico e cultural, da mesma maneira que os palcios imperiais ou as igrejas barrocas brasileiras.

Sem esquecer os benefcios oriundos das restauraes do pelourinho, em Salvador, e de centros histricos como os de Olinda e Recife, Funari e Pelegrini (2006) apontam para o fato de que, assim como em Barcelona, Nova York e Boston, o que ocorreu foi uma "pseudo auto sustentabilidade pautada por postulados econmicos e visaram reduo dos custos de investimento pblico," (FUNARI; PELEGRINI, 2006, p.53) e negligenciaram a gesto associada de polticas ambientais, urbansticas e habitacionais, alm de reduzirem o patrimnio a meros cenrios da indstria cultural, subservientes lgica do entretenimento, dissociando toda a fruio dos bens culturais da memria social e histrica. (FUNARI; PELEGRINI, 2006). Algo semelhante ocorreu na Praa Vital Negreiros em sua reforma mais recente, em 2009, onde no existe uma s rvore para sombra, nem bancos que favoream o convvio social, possivelmente para no interromper a viso dos palcos instalados para os "eventos culturais". O entorno da Igreja do Rosrio dos Pretos era um epicentro social. Ali foi construdo, em 1924, o ponto final dos bondes eltricos que iniciaram seu funcionamento na cidade da Parayba e por onde passavam todas as pessoas que circulavam pelo centro da cidade. A igreja, juntamente com o casario, foi demolida para dar lugar Praa Vidal de Negreiros, que o povo seguiu chamando de ponto dos cem ris em referncia ao ponto dos bondes eltricos. Com o prdio da igreja, foi demolida a histria de quase 200 anos de atuao e trabalho social da Irmandade de Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos e de tantas pessoas quantas dela participaram enquanto benfeitores ou beneficirios de sua atuao junto sociedade da cidade da Parayba. (SARMENTO et al., 2010). Esta praa passaria ainda por mais trs grandes reformas ao longo do tempo, em 1951, em 1970 e em 2009.

TEORIAS EM PRTICA - UM OLHAR ESTRANHO SOBRE A ICONOGRAFIA LOCAL Para uma imerso na memria afetiva da cidade, para retirar as vendas do olhar estrangeiro de quem aqui est h pouco tempo, foram realizadas pesquisas em arquivos de fotos antigas da cidade da Parayba do Norte (atualmente Joo Pessoa), revistas e livros, imagens e textos que revelassem seu passado e de seus moradores. Isso proporcionou um "emprstimo" de saudade e nostalgia que motivaram emocionalmente a produo das imagens. Do que que se constitui a memria individual (ou coletiva)?

Em primeiro lugar, so os acontecimentos vividos pessoalmente. Emsegundo lugar, so os acontecimentos que eu chamaria de "vividos portabela", ou seja, acontecimentos vividos pelo grupo ou pela coletividade qual a pessoa se sente pertencer. So acontecimentos dos quais a pessoanem sempre participou mas que, no imaginrio, tomaram tamanho relevoque, no fim das contas, quase impossvel que ela consiga saber separticipou ou no. Se formos mais longe, a esses acontecimentos vividospor tabela vm se juntar todos os eventos que no se situam dentro doespao-tempo de uma pessoa ou de um grupo. perfeitamente possvelque, por meio da socializao poltica, ou da socializao histrica, ocorraum fenmeno de projeo ou de identificao com determinado passado,to forte que podemos falar numa memria quase que herdada. (POLLAK,1992, p.201). Este olhar estrangeiro similar ao do historiador que, segundo Moreira (1996, p. 1 83):

[...] pressupe sempre sua natureza de "estrangeiro", seja em relao sfontes das quais se serve, seja em relao ao seu objeto de pesquisa."Estrangeiro" ainda em relao ao tempo por ele analisado. Podemos assimfazer uma analogia entre o olhar do visitante estrangeiro e do historiador,entre os habitantes locais e um diarista. Ser com esse olhar que opesquisador dever tentar analisar e compreender as relaes existentesentre o cotidiano e a mudana, entre o cotidiano e os grandesacontecimentos. As referncias visuais para a produo das imagens so fotos antigas da cidade que identificam espaos pblicos e edifcios que foram derrubados ou modificados pelas reformas urbanas e detalhes da ornamentao de algumas fachadas que nos remetem a referncias histricas nem sempre divulgadas. Numa espcie de releitura das imagens escolhidas, utilizando a tcnica da xilogravura e da infogravura (tcnica digital para a produo de imagens), busca-se20 apresentar aos habitantes contemporneos da cidade algumas imagens de uma paisagem que foi referncia material da histria de geraes antecedentes, que compartilharam ali a construo e a significao de suas vidas. A SELEO DAS IMAGENS - Pesquisa Iconogrfica As escolhas das imagens que compem esta breve iconografia, foram feitas segundo os critrios adiante: a) Importncia histrica dos locais representados. Neste caso, no considerada apenas a histria oficial, mas a condio de historicidade que pode ser compreendida do ponto de vista da psicologia como "um conjunto dos fatores que constituem a histria de uma pessoa [ou grupo de pessoas] que condicionam seu comportamento em uma dada situao" (HOUAISS, 2009); b) Pelo fato de fazerem parte do que seria patrimnio material e cultural no fossem destrudos pelas aes modernizantes de algumas administraes pblicas, provavelmente desinformadas de seu valor histrico-cultural; c) Pela plasticidade e expressividade que proporcionam enquanto leitura visual na tcnica da xilogravura e da infogravura; d) Pela possibilidade de essas imagens despertarem para a necessidade de se avaliar planejar, e pesquisar junto populao e a setores competentes como conselhos de arquitetura, histria e patrimnio, futuras mudanas ou reestruturaes urbanas que se faro prementes diante do crescimento demogrfico e outros fatores que se apresentem.

A igreja do Rosrio dos Pretos A primeira imagem que ocorreu representar foi a da Igreja de Nossa Senhora do Rosrio, conhecida como Igreja de Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos.Esse nome sugere uma igreja frequentada por escravos ou negros forros e seus descendentes, uma categoria antropolgica, cuja histria no est registrada adequadamente e seus heris no constam nos livros da histria oficial. Movido por esse desejo de resgate histrico, foi-se a campo em busca do prdio da igreja que fora erigida pela irmandade de Nossa Senhora do Rosrio dos pretos e, segundo Sousa Junior (2008 apud SARMENTO et al.,2010):[...] Alm das atividades religiosas que se manifestavam na organizao deprocisses, festas, coroaes de reis e rainhas, tambm exerciamatribuies de carter social como: ajuda aos necessitados, assistncia aosdoentes, visita aos prisioneiros, concesso de dotes, proteo contra osmaus-tratos de seus senhores e ajuda para a compra da carta de alforria. Destaca-se o fato de que a irmandade promovia os rituais de procisso e festas mesclando os ritos sagrados de origem catlica com o sagrado das religies africanas e que oferecia aos seus associados um "enterro digno", com velrio, cortejo e sepultamento dentro do edifcio religioso. (ALVES, 2008 apud SARMENTO, et al., 2010).

Com estes dados histricos estaria mais que justificada a escolha da imagem da igreja para uma das representaes iconogrficas. O prdio da Igreja do Rosriodos Pretos foi demolido juntamente com outros imveis vizinhos, para a criao da Praa Vidal de Negreiros, heri oficial das lutas contra os holandeses (SILVA, 2006,p.160). A foto existente no permite um bom ngulo de viso da igreja, possivelmente por estar em uma rua estreita inviabilizando uma imagem frontal, pelas tcnicas fotogrficas de ento. Seus detalhes arquitetnicos no esto bem visveis, mas a reproduo de sua imagem se justifica por sua importncia histrica.

A igreja das Mercs A Igreja das Mercs, que esteve situada na Praa 1817, foi tambm escolhida para ser representada iconograficamente como mais uma pea do patrimnio pblico sacrificada em nome da modernizao e do progresso. A Praa 1817 foi, possivelmente, uma homenagem aos brasileiros que naquele ano se moveram contra a Coroa Portuguesa com o objetivo de instituir uma Repblica Nacional Brasileira. Tal movimento teve importante adeso no estado da Paraba entre o povo e representantes da administrao local (MARIANO, 2012). Heris de um lado e outro, contam suas participaes nessa histria conforme sua ideologia e convenincia.

Se a Praa 1817 foi o testemunho de uma significativa adeso popular, ao ponto de dedicarem um logradouro em sua homenagem, no sabido, mas foi igualmente destruda e com ela, sua histria.

Igreja da misericrdia - Reforma, Reconstruo e Restaurao A Igreja da Santa Casa de Misericrdia da Paraba, uma das primeiras edificaes oficiais construdas no Brasil, foi fundada em meados do sc. XVI e tombada pelo Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (IPHAN) em 25 de abril de 1938. Possua em seus primrdios o Hospital de Caridade e o Cemitrio da Cidade (SCCUOGLIA; TAVARES; 2009). Do conjunto arquitetnico original, restou somente a Igreja que, seguindo os modelos das igrejas portuguesas da Misericrdia, apresenta uma arquitetura definida por uma limpidez de linhas e simples articulao de slidos geomtricos, com uma nica nave e fronto triangular e sineira simples ou torre-campanrio. (MOREIRA, 2000 apud SCCUOGLIA; TAVARES, 2009). Em 1938, quando ocorreu o tombamento do prdio da igreja, o IPHAN decidiu que ele voltaria a ter a forma original, depois de passar pela demolio do hospital, em 1924, e dos anexos em datas anteriores.

Largo do Errio A Praa do Errio teve diversas denominaes, como Praa do Pelourinho, Largo da Intendncia e atualmente denomina-se Praa Baro do Rio Branco. Em 1912 o prdio principal do Largo abrigava a Casa dos Contos ou Tesouraria da Fazenda Imperial, depois foi Sede do Governo da Provncia e Agncia Central dos Correios, a partir de 1869. Conforme informaes colhidas na praa, em placas instaladas pela prefeitura municipal, passou por vrias reformas, onde numa delas, foi acrescentado mais um pavimento. Todo o conjunto da praa foi tombado pelo IPHAN e acolhe, atualmente, o projeto "Sabadinho Bom", realizado aos sbados com apresentaes de grupos de choro e outros estilos musicais.

Com as reformas urbanas do incio do sculo XX, a demolio da Igreja do Rosrio dos Pretos e a construo da Praa Vidal de Negreiros, foi edificada a torre do relgio, com quatro mostradores, que rapidamente o povo apelidou de "praa do relgio". Ponto central da cidade, por onde circulavam todas as pessoas que buscavam seu comrcio ou servios, foi assim saudada pelo ento Presidente do Estado, Slon de Lucena, (SCOCUGLIA; LINS, 2009).Em sua mais recente reforma, no ano de 2009, a praa foi transformada em um espao para eventos onde so realizados shows musicais em algumas pocas do ano, seguindo um modelo de divulgao da cultura musical de massas. Note-se a ausncia total de arborizao e quase a inexistncia de bancos, o que caracterizaria uma praa. Isso acontece possivelmente pela constatao de que a existncia de rvores prejudicaria a visibilidade do palco, no momento das apresentaes.Xilogravura, uma linguagem milenar.

Ainda que no seja objetivo principal deste trabalho descrever a tcnica ou contar a histria da xilogravura, algumas consideraes a este respeito podem ser teis para a compreenso desta linguagem artstica e da sua importncia para o desenvolvimento e difuso do conhecimento da humanidade.

O dicionrio Larousse define xilogravura assim: gravura obtida pelo processoda xilografia. Xilografia quer dizer arte de gravar em [ou por meio da] madeira. Tcnica de impresso em que o desenho entalhado com goiva, formo, faca ouburil em uma chapa de madeira. (LAROUSSE, 2001, p. 1042). Arte milenar com origem provvel na China e na ndia antigas, conforme O Museu da Xilogravura que resume assim sua histria:

No se sabe ao certo quando a xilografia comeou a ser praticada, nemquem foi o seu inventor. A xilogravura em papel mais antiga, dentre as quese conhecem, ilustra um exemplar da orao budista Sutra Diamante,editada por Wang Chieh, na China, no ano 868. Acredita-se, porm, que axilografia no Extremo Oriente j estampasse tecidos sculos antes, talvezinicialmente na ndia. Na Europa, o testemunho mais remoto um tecidoimpresso no sculo doze. H, porm, quem afirme que a estampariaeuropeia de tecidos exista desde o sculo sexto. Nos sculos, quatorze equinze, os europeus utilizaram intensamente a xilografia para produzirimagens sacras (santinhos) e cartas de baralho (CASA DA XILOGRAVURA,20013, p. 01). Foi muito utilizada na Europa durante o perodo renascentista, quando teve importncia fundamental na criao da imprensa. Gutenberg se utilizou da tcnica para fazer tipos mveis de madeira (inicialmente, depois de metal) possibilitando a impresso de livros. Note-se sua importncia no impulso para o desenvolvimento da humanidade, com a impresso de livros e a divulgao de ideias, o que redundou na Reforma religiosa e contribuiu para o Renascimento.

A xilogravura no Brasil A xilogravura chegou ao Brasil com a tipografia, no incio do sculo XIX, mais precisamente em 1808 com a vinda da Famlia Real portuguesa e sua corte, que trouxe includa na bagagem a maquinaria para Impresso Rgia. A interiorizao deste equipamento possibilitou o surgimento, no nordeste brasileiro, dos folhetos de cordel impresso (que at ento, faziam parte de uma tradio oral), tendo como capa o recurso da xilogravura com um papel utilitrio que marcou sua trajetria na arte popular. (CARVALHO, 1995). Por seu carter inicialmente utilitrio,

Muitos autores, em razo de atitudes elitistas, hesitam em atribuir a talmanifestao cultural o estatuto de obra de arte. Este processo dedesqualificao do popular passa pela nfase que esses mesmos autoresdo ao carter utilitrio destas prticas, vincadas por um cotidiano em quevida e obra de seus produtores se imbricam de modo indissolvel(CARVALHO, 1995, p. 143). Na xilogravura nordestina no muito comum a utilizao de meios tons, ou tons de cinza, como rea de transio para a dureza de contraste entre o branco e o preto puros; a utilizao de cores, com vrias matrizes para cada cor da gravura tambm no ocorre com frequncia at o final do sc. XX, mas est se tornando mais recorrente.

Novo status para a xilogravura no Brasil. A xilogravura ganha status de obra de arte, na segunda metade do sc.XX devido a "interveno de instituies como as Universidades e Fundaes e da figura do marchand." (CARVALHO, 1995, p.154). Antes disso, porm, eraconsiderada uma atividade de artesania, devido origem de seus primeiros artfices, artesos nordestinos que adaptaram suas habilidades nova necessidade. Quanto a isso, Carvalho (1995, p. 148) argumenta que:

No se pode falar na prevalncia da arte sobre o engenho, estando ahabilidade manual a servio de um projeto que implicava na criatividade.Isso precisa ficar bem claro para que no se pense nos primeiros xilgrafoscomo meros artesos, mas como criadores, a partir da constatao de quedeveriam dar forma ao que no existia. E mesmo os casos de cpia no seexcluem a releitura, a possibilidade do acrscimo de elementos, asmodificaes que, mesmo sutis, do nova pea uma unicidade que sedesvincula do modelo, fazendo com que tenha autonomia e sob esta ticapossa ser analisada. Embora haja quem alimente esta discusso, possvel concordar com Carvalho quanto ao valor do trabalho do arteso enquanto criador do que ainda no existe considerando-o igualmente artista. A xilogravura pode ser considerada na totalidade dos seus processos, desde o desenho na prancha de madeira, o entalhe (ou corte) at a impresso, uma forma autnoma de arte com histria e vida prpria (vez por outra apropriada por correntes artsticas distanciadas da cultura popular). GOMES (2013) comenta o fato de a xilogravura popular ter influenciado fortemente os movimentos de Arte Moderna no Brasil, sem que fosse por ela influenciada, reconhecendo assim, o valor e a capacidade criadora dos artistas populares. Outras formas de gravura, como a gravura em metal e a litogravura detm outro status na histria da arte e mesmo no mercado de arte. Numa descrio, fundamentada em experincia emprica e ilustrada pelas fotos detalhadas que seguem, pode-se afirmar que sua tcnica consiste em desenhar numa prancha de madeira (xilo) previamente lixada a imagem que se pretende imprimir.

Cavam-se as partes da imagem que sero brancas, deixando as linhas e reas que recebero a tinta, produzindo assim um tipo de baixo relevo, onde sero impressas as partes planas da prancha que recebero a tinta tipogrfica.

Aplica-se a tinta com um rolo de maneira uniforme por toda a prancha e imprime-se no papel ou tecido por presso mecnica, que poder ser feita por uma prensa (prelo) ou o produzida com a frico de uma colher em sua parte convexa.

.

O Museu da Xilogravura descreve assim sua tcnica:Para preparar uma matriz xilogrfica preciso realizar trabalho deentalhe em um pedao de madeira, deixando em relevo a imagem quese pretenda reproduzir. As partes altas (em relevo) recebero a tinta etransferiro a imagem para o suporte. Geralmente as xilogravuras soimpressas em papel, mas tambm podem ser feitas por impresso emoutros tipos de suporte. Quase sempre a impresso feita com oemprego da tinta, que previamente aplicada sobre a matriz. Noentanto, h xilogravuras impressas sem tinta, nas quais o relevoprovocado pela presso da matriz sobre o papel o bastante para queo observador possa distinguir a imagem. (CASA DA XILOGRAVURA,20013, p. 01). Esta tcnica de gravao apresenta algumas peculiaridades que so determinantes para se obter os resultados desejados. Ainda fundamentadas em experincia emprica, pode-se afirmar que a imagem ser desenhada em negativo ou espelhado, isto , as formas e linhas que estiverem direita, sero impressas esquerda.

.

O entalhe da madeira dever ser feito com grande preciso exigindo do gravador, habilidades especiais de artesania. Alguns artistas renascentistas contratavam artesos para este trabalho, mas esta no prtica comum entre os gravadores contemporneos que veem no corte da madeira uma espcie de caligrafia que, diferencia e identifica seus autores. Quanto ao corte da madeira, a xilogravura pode ser: xilogravura a fio (ou em madeira deitada) que feita em tbuas cortadas no sentido longitudinal ao tronco, e xilogravura de topo (ou madeira em p), cujo corte feito no sentido transversal ao tronco. Esta permite uma gravura mais rica em detalhes, enquanto aquela, devido ao sentido das fibras da madeira, que dificultam o corte em algumas direes, oferece impresses menos detalhadas.

Digital x Analgico Para um entendimento sobre as representaes em sistema analgico e sistema digital sero feitas algumas analogias e comparaes de maneira que se possa compreender as caractersticas de cada forma dentro do universo das Artes Visuais, mais especificamente sobre as possibilidades da xilogravura, analgica e a infogravura (gravura digital). Tais consideraes resultam de longos anos de experincia artstica nas diversas formas de expresso em artes visuais e utilizao de vasta gama de materiais, desde as aguadas de nankin, antigas mquinas analgicas de fotografia e filmagem at as mais recentes cmeras digitais com poderosos solftware para tratamento e edio de imagens e sons, explorando suas possibilidades na criao de animaes a partir de xilogravuras e tanto mais. A princpio, considere-se que o mundo, como percebido pelos seres humanos, seja um mundo analgico. As cores e as linhas, as formas e os volumes so assim percebidos pelos sentidos da viso. O mesmo se d com o som e outras formas de vibrao. A luz natural igualmente percebida analogicamente. Note-se que a percepo do mundo para os seres humanos seja analgica, isto , apreende-se por analogia. Segundo o dicionrio Houaiss, em sua verso digital, analgico "[...] forma de medida ou representao de grandezas na qual um sensor ou indicador acompanha de forma contnua, sem hiatos nem lacunas, a variao da grandeza que est sendo medida ou representada. Em termos de cores pode ser dito que do amarelo para o vermelho no h um "salto" quantitativo ou qualitativo, no existe um "hiato" ou uma "lacuna" entre estas cores, mas uma transio gradual em que a luz branca refratada ou refletida passa por infinitos matizes de alaranjados entre o amarelo e o vermelho. Ainda se pode dizer que existam infinitos matizes de amarelo e de vermelho e que todos os matizes de vermelho sejam denominados "vermelho" por analogia (por serem anlogos). Assim, o vermelho, o amarelo ou qualquer outra cor em suas infinitas variaes de matizes sejam apenas um "recorte" da luz branca, que tem um determinado valor vibracional (quantidade de vibraes por milissegundo). desta maneira que o olho humano saudvel v as cores, desconsiderando-se aqui, os aspectos psicolgicos que possivelmente exeram alguma influncia sobre as percepes humanas. (PEDROSA, 1977).

Representaes Analgicas - Uma mquina fotogrfica analgica aquelas que utilizam pelcula sensvel luz funciona de maneira semelhante. Os elementos qumicos contidos no filme so sensveis luz e, quando expostos a ela, grafam em sua superfcie as diversas gradaes de luz e sombra, em preto e branco ou em cores. Uma bem aproximada imitao do olho humano. Uma tela pintada por tinta acrlica ou leo; uma aquarela, um desenho colorido a crayon, ou guache; uma aguada em tinta nankin e mesmo nas artes da gravura como a xilogravura, a litogravura, a serigrafia, monotipia, enfim quase a totalidade das formas de expresso em artes visuais que se utilizem de cores estaro enquadradas na categoria de representao analgica. Entre as excees esto as instalaes e performances que se utilizem de "cor luz" por meio de iluminao artificial (sujeitas a leis da fsica-tica) e a infogravura, que a gravura produzida por processos digitais.Digital - cor e representao Uma compreenso, ainda que superficial, do que seja a linguagem binria, pode comear com uma consulta ao dicionrio. HOUAISS em sua verso digital define Digital "informtica: que assume unicamente valores inteiros (diz-se degrandeza); informtica: que trabalha exclusivamente com valores binrios (diz-se dedispositivo) ". Entenda-se que os computadores trabalham com a linguagem digital, onde todos os valores so expressos pela combinao de dois dgitos (zero e um), portanto, "unicamente com valores inteiros". Assim, as medidas e valores tomados por esta linguagem sempre apresentaro lacunas, saltos de um valor a outro. As medidas de vibrao, seja de luz ou de som, ou ainda a localizao de um ponto num plano ou no espao, estaro sujeitas a esta caracterstica. Pode-se dizer que na linguagem digital, entre zero e um, no existe nada, ao passo que na analgica existe um infinito e, entre um e dois, outro infinito e assim ad infinitum... No pretendo, neste trabalho, estabelecer uma relao de hierarquia entre as possibilidades analgicas e digitais, ou divulgar qualquer tipo de pensamento ou opinio purista. Contrrio a isso, o que se prope uma interao entre as duas linguagens onde as possibilidades da tecnologia digital sero inseridas no processo da construo analgica buscando facilitar suas operaes e, num caminho de volta, produzir imagens digitais a partir das xilogravuras criadas acrescentando ou alterando seus elementos e propores, numa releitura cujo resultado ser a impresso das infogravuras.Transitando entre o analgico e o digital - No que se refere ao campo das artes visuais, este trabalho prope uma interseo entre as tcnicas analgicas e digitais, na produo de gravura. Embora alguns autores discordem quanto aos mtodos digitais, da mesma forma que outros considerem a xilogravura uma linguagem pertencente ao artesanato, negando-lhe ostatus de arte, o que pretendo no fomentar tal debate, mas apresentar algumas possibilidades de interao das tcnicas contemporneas com as tradicionais. Numa longa sequncia de leituras e releituras que se inicia com a digitalizao das fotos originais e passa pela produo dos desenhos mo livre, transferncia dos desenhos para a madeira e desta para o papel, na etapa seguinte as xilogravuras so digitalizadas e manipuladas para a produo das infogravuras.

O passo a seguir produzir alteraes na xilogravura digitalizada acrescentando ou retirando detalhes conforme a inteno artstica, utilizando-se das possibilidades da tecnologia digital, para manipular as imagens, buscando um tipo de hibridismo que possa acrescentar elementos e referncias visuais que permitam novas leituras da representao iconogrfica, ampliando seu valor expressivo. Na seo dos apndices deste trabalho pode-se observar cada uma das imagens representadas em desenho, xilogravura e infogravura.

CONSIDERAES FINAIS O presente trabalho apresenta a possibilidade de se conservar a paisagem urbana, ainda que de forma iconogrfica e sugere que as mudanas que se fizerem necessrias sejam amplamente debatidas pela administrao pblica (incluindo-se aqui rgos como IPHAN - Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, IPHAEP - Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico do Estado da Paraba, IHGP Instituto Histrico e Geogrfico Paraibano e outros) com a populao e categorias profissionais das reas de pesquisa como arquitetura, histria, sociologia, antropologia, patrimnio, sade pblica e tantas quantas se apresentarem. Durante a pesquisa, que perpassou por dezenas de trabalhos acadmicos em reas como a histria, arquitetura, patrimnio, livros de arte, peridicos e arquivos de imagens, muito se pode conhecer e apreender sobre as origens da cidade, sua histria e seus habitantes. Na pesquisa de campo em busca de imagens atuais da paisagem urbana e seu patrimnio, pude constatar a existncia de inmeros imveis em adiantado estado de deteriorao, alguns dos quais, tombados pelos institutos de patrimnio oficiais. Outros em que s existem remanescentes a fachada, demonstrando que h muito que se trabalhar em termos de preservao do patrimnio material da cidade. Ainda que no seja objetivo deste trabalho destacar suas caractersticas de destino turstico, nota-se que a Cidade de Joo Pessoa uma das belas cidades brasileiras. Abriga em sua paisagem urbana um nmero expressivo de obras de arte; sua arquitetura rica e diversificada contando, inclusive, com obras assinadas por Oscar Niemeyer, o que lhe confere importncia especial. Sua paisagem natural exuberante e ainda conserva uma parte de mata atlntica, o que tambm merece destaque. Tudo isso e muito mais pode ser percebido in loco e nos sites e publicaes oficiais. Sem a pretenso de apresentar concluses sobre o tema, que permite amplos avanos enquanto objeto de pesquisa e debates, a inteno de demonstrar a possibilidade de uma interao entre duas formas de gravura, a analgica (xilogravura) e a digital (infogravura) na consecuo de leituras e releituras sem purismos ou ortodoxias e sob abordagem no hierarquizante, parece que foi atingida. Tendo como objetivo principal a produo de breve iconografia (lbum com xilogravuras e infogravuras) sobre logradouros pblicos destrudos ou modificados pela ao das administraes pblicas, sua representao por meio da gravura e, diante do material produzido: um lbum com cinco xilogravuras e uma coleo com cinco infogravuras, pode-se considerar atingido tal objetivo. O tema das reformas urbansticas, construes, reconstrues e as formas de implementao e representao dessas aes, est longe de ser esgotado. Desta forma, possvel o aprofundamento nos debates e uma reformulao constante dos argumentos com que se busca compreender e interagir com esses processos. Assim tambm, o tema da representao iconogrfica da cidade de Joo Pessoa, no poderia ser esgotado com algumas gravuras. H muito que ser pesquisado, representado e tarefa de tal magnitude poder ser incentivada por financiamentos pblicos, privados, e executada por seus artistas e estudantes dos diversos cursos de arte que suas universidades oferecem.XILOGRAVURAS

REFERNCIAS BAUMAN, Zygmunt. Ensaios Sobre o Conceito de Cultura. Rio de Janeiro: ZAHAR. 2012. CANDAU, Joel. Bases antropolgicas e expresses mundanas da buscapatrimonial: memria, tradio e identidade. Revista Memria em Rede, v.1,dez.2009/mar.2010.Pelotas. CARVALHO, Gilmar de. Revista Instituto de Estudos Brasileiros - SP, 39:143- 158, 1995. Disponvel em: . Acesso em: 23/05/2013. CHOAY, F. A alegoria do patrimnio. So Paulo: Editora Unesp, 2001. FIGUEIREDO, Valria Maria Chaves de; OLIVEIRA, Ana Paula, RESENHA de BENJAMIN, Walter. A obra de arte na poca de sua reprodutibilidade tcnica. Disponvel em:. Acesso em: 16/04/2013. FUNARI, Pedro Paulo; PELEGRINI Sandra C. A. Patrimnio Histrico e Cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. GOMES, Dygenes Chaves. 2005 - 2010 - Ensaios Sobre Artes Visuais naParaba. Joo Pessoa-PB: 2OU4, 2012. HOLANDA, Srgio Buarque de. Razes do Brasil. So Paulo: Companhia das Letras, 2004. HOUAISS. Dicionrio Eletrnico. Verso monousurio 3.0 - Junho de 2009. LAROUSSE, tica. Dicionrio da lngua portuguesa. So Paulo: tica, 2001. LE GOFF, Jacques. Histria e memria. Campinas: Ed. Unicamp, 1994. MEDEIROS, Coriolano de. O Tambi da minha infncia. Joo Pessoa - PB: A Unio Editora, 1994. MAIA, Doralice Styro. As Intervenes Urbansticas e as Transformaes dasRuas da Cidade da Parahiba. ANPUF - XXII Simpsio Nacional de Histria - Joo Pessoa, 2003. MARIANO, Serioja R. C. Memrias da Insurreio de 1817 na Paraba: O Dirio do Sargento Francisco Incio do Valle. VI Simpsio Nacional de Histria Cultural; Universidade Federal do Piau - UFPI46 MUSEU CASA DA XILOGRAVURA Disponvel em: . Acesso em: 22/03/2013. MEYER, E.. O fim da memria. Revista Estudos Histricos, Brasil, 22, set. 2009. Disponvel em: . Acesso em: 04/05/ 2013. MOREIRA, Regina. Os Dirios Pessoais e a (Re)Construo da Histria. RevistaEstudos Histricos, v. 9, No 17 (1996). Disponvel em: