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PESQUISA PARTICIPANTE E PESQUISA AÇÃO: ALTERNATIVAS DE PESQUISA OU PESQUISA ALTERNATIVA Roberto Jarry Richardson. http://jarry.sites.uol.com.br/pesquisaparticipdef.htm acesso em 10 07 2007 Para entender o significado, características e importância da pesquisa participante devemos nos remetermos a sua evolução, particularmente, no últimos vinte anos. America Latina dos sessenta, apresentava-se como um continente rico em processos de modernização social e programas de desenvolvimento. O Banco Mundial, a Aliança para o Progresso, o Corpo de Paz enviavam recursos humanos com o intuito de colaborar com as políticas de desenvolvimento dos nossos paises.Esses profissionais e técnicos incorporavam-se as equipes nacionais e juntos decidiam sobre possíveis estratégias de ação. Foram épocas de muita discussão sobre participação sóciopolítica e econômica, o conceito de marginalidade aparecia, constantemente nos documentos, discursos, conferencias e outras. Procurava -se incorporar os grupos "excluídos" das esferas de decisão às ações a eles destinadas. Pretendia-se transformar objetos das ações em sujeitos históricos.

PESQUISA PARTICIPANTE E PESQUISA AÇÃO

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PESQUISA PARTICIPANTE E PESQUISA AÇÃO: ALTERNATIVAS DE

PESQUISA OU PESQUISA ALTERNATIVA

                                                                                                    Roberto Jarry Richardson.

http://jarry.sites.uol.com.br/pesquisaparticipdef.htm acesso em 10 07 2007

Para entender o significado, características e importância da pesquisa participante

devemos nos remetermos a sua evolução, particularmente, no últimos vinte anos.

America Latina dos sessenta, apresentava-se como um continente rico em processos de

modernização social e programas de desenvolvimento.

O Banco Mundial, a Aliança para o Progresso, o Corpo de Paz enviavam recursos

humanos com o intuito de colaborar com as políticas de desenvolvimento dos nossos

paises.Esses profissionais e técnicos incorporavam-se as equipes nacionais e juntos

decidiam sobre possíveis estratégias de ação. Foram épocas de muita discussão sobre

participação sóciopolítica e econômica, o conceito de marginalidade aparecia,

constantemente nos documentos, discursos, conferencias e outras.

Procurava -se incorporar os grupos "excluídos" das esferas de decisão às ações a eles

destinadas. Pretendia-se transformar objetos das ações em sujeitos históricos. Muitos

cientistas sociais que participaram nesses programas de desenvolvimento tomaram

consciência das limitações e abusos dos modos convencionais de perceber, tratar e

reconstruir a realidade social. Emergem, assim, formas alternativas de pesquisa com

rótulos variados: pesquisa-ação, pesquisa participante, pesquisa militante, etc.

Todas tem em comum a procura de processos de investigação comprometidos com

transformações sociais.

Marcela Gajardo refere-se a cientistas sociais europeus que assinalam, como próprios

aos processos de pesquisa participante, os seguintes aspectos:

a) São baseados nas necessidades de grupos social politicamente marginalizados. Seu

objetivo e o de trabalhar com os grupos excluídos, em situações comuns de trabalho e

estudo e trocar informações para colaborar na mudança das condições de dominação.

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Procura realizar este objetivo em colaboração com grupos relativamente homogêneos,

do ponto de vista social e local.

b) O ponto de partida, o objeto e a meta da pesquisa participante são o processo de

aprendizagem dos que fazem parte da pesquisa. Suposições teóricas não examinadas.

Pelo contrario, o trabalho científico  e entendido como contribuição prática para a

transformação social, como contribuição à democratização. Incentiva-se uma tomada de

consciência dos grupos sociais marginalizados, em relação a sua situação e necessidades,

para que estas possam melhorar mediante a organização e a ação política.

c) Ao invés de se manter distancia entre o pesquisador e o grupo que vai ser examinado,

 tal como se exige nas ciências sociais tradicionais, propõe-se a interação. Isso significa,

para o pesquisador, trabalhar, talvez viver, no grupo escolhido, a fim de elaborar

perspectivas e experimentar ações que perdurem, inclusive depois de terminado o

projeto.

d) No desenrolar do estudo, aspira-se a uma comunicação o mais possível horizontal

entre todos os participantes. Isso pressupõe que as metas e o desenvolvimento do projeto

não sejam previamente determinados, mas que se elaborem com a intervenção de todos

os participantes e que, no decorrer da pesquisa, possam ainda ser mudados.

e)Utiliza o dialogo como  meio de comunicação mais importante no processo conjunto

de estudo e coleta de informação. Tenta, por isso, desligar-se da linguagem das ciências

sociais, acessível somente aos iniciados. Sustenta que a ciência exerce poder e que a

informação e o conhecimento são suscetíveis de manipulação, com o fim de legitimar

situações de dominação ou criar estados de dependência.

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Assim, a pesquisa participante enfatiza a socialização do saber, tentando romper com o

monopólio do conhecimento, através da participação dos sujeitos na analise e solução de

seus problemas.

Portanto, diferença fundamental entre a pesquisa participante e a pesquisa "tradicional" e

o controle sobre a produção e uso do conhecimento. Na pesquisa "tradicional" o

pesquisador    assume   a   responsabilidade   de elaborar o problema, decidir os aspectos

metodológicos, coletar informações, analisar os dados e disseminar os resultados. Em

contrapartida, o enfoque da pesquisa participante aponta para:

 

a) promoção da produção coletiva de conhecimentos, rompendo o monopólio do saber e

da informação, permitindo que ambos se transformem em patrimônio dos grupos

marginalizados;

 

b) promoção da analise coleta na ordenação da informação e no use que dela se possa

fazer;

 

c) promoção da analise critica, utilizando ainformação ordenada e classificada, a fim de

determinar as raízes e as causas dos problemas e as vias de solução para os mesmos;

 

d) estabelecimento de relações entre problemas individuais e coletivos, funcionais e

estruturais, como parte da busca de soluções conjuntas para os problemas enfrentados."

(Gajardo, p.47)

 

Em geral, a pesquisa participante surgiu como uma alternativa de pesquisa orientada a

solucionar problemas imediatos e locais com a participação plena dos autores sociais.

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O pesquisador passou a ser um "animador" responsável da analise critica e construção

da realidade.

 

A Pesquisa Ação:

        

 As origens do conceito pesquisa-ação remontam à década dos trinta. Kurt Lewin,

professor alemão que em 1933 teve que abandonar a Universidade de Berlim para

instalar-se   nos   Estados   Unidos da América do Norte, elaborou a pesquisa-ação.

Como

dizia Lewin, "Quando falamos de pesquisa, estamos pensando em pesquisa-ação, isto e,

uma ação em nível realista, sempre acompanhada de uma reflexão autocrítica objetiva e

de uma avaliação dos resultados. Como o objetivo é aprender, não devemos ter medo de

enfrentar as próprias insuficiências. Não queremos ação sem pesquisa, nem pesquisa

sem ação" (Barbier,1985,p.38)

 

Desde o seu inicio a pesquisa-ação se orientou para a solução dos problemas surgidos

pelo crescimento industrial, modernização e outros. No caso de Lewin, a preocupação

concentrou-se nos problemas da inserção de fabricas em zonas rurais, cuja mão-de-obra

era incapaz de atingir os altos padrões de produção das regiões industriais do Norte dos

EUA. Mas, o seu propósito não era conscientizar os operários com relação à situação de

vida, senão adaptá-los às condições de trabalho das fábricas.

 

Os estudos de pesquisa-ação multiplicaram-se durante e depois da Segunda Guerra

Mundial, procurando alternativas de pesquisa que valorizassem a ação humana. No

entanto,é preciso reconhecer que Kurt Lewin praticamente ignorou um outro tipo de

intervenção cujo objetivo é transformar as estruturas sociais e políticas da sociedade de

classe. Enquanto Lewin procurava influenciar os operários para fazê-los produzir mais,

através do mecanismo de estimulação e de competição, o outro tipo de intervenção

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procura as classes populares porque somente elas podem transformar a situação de

exploração produzida pelo capitalismo.

 

Na América Latina, a pesquisa-ação adquire força em fins da década dos sessenta,

contextualizada por uma forte crítica à suposta unidade do método entre ciências sociais

e

naturais, à visão parcial e unidimensional da realidade social, à separação entre o

científico e o político, e à marginalização de grupos do desenvolvimento econômico e

social latino-americano.

Existe diferença entre a pesquisa participante e a pesquisa-ação?

Michel Thiollent (1985) oferece uma caracterização geral da pesquisa-ação,

distinguindo-a da pesquisa participante. A primeira, alem da participação, supõe uma

forma de ação planejada de caráter social, educacional, técnico ou outro, que nem     

sempre se encontra em propostas de pesquisa participante. Mas,ambas buscam

alternativas à pesquisa convencional.

O autor define pesquisa-ação como "...um tipo de pesquisa social com base empírica

que e concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de

um problema coletivo e na qual os pesquisadores e os participantes representativos da

situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participante". Do

ponto de vista cientifico, "a pesquisa-ação e uma proposta metodológica e técnica que

oferece subsídios para organizar a pesquisa social aplicada sem os excessos da postura

convencional ao nível da observação, processamento de dados, experimentação, etc.

Com ela, se introduz uma maior flexibilidade na concepção e na aplicação dos meios de

investigação concreta" (Thiollent, op. cit. p.24).

Para Michel Thiollent e outros, características fundamentais da pesquisa-ação são: - a

participação das pessoas implicadas nos problemas pesquisados e uma ação destinada a

resolver o problema em questão. Essa ação seria a que distingue    a dita pesquisa de

pesquisa participante. De extrema importância e a ênfase colocada na participação das

pessoas na pesquisa, não como"objetos" de estudo, mas como elementos ativos do

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processo de investigação. Logicamente, essa postura tem conseqüências para a

organização e realização da pesquisa e determina diferenças fundamentais com a

pesquisa "tradicional ou "convencional". Não existe a relação sujeito-objeto de

pesquisa: tanto pesquisadores quanto "usuários" são sujeitos ativos de um processo; a

formulação do   problema,   objetivos,   possíveis  hipóteses, coleta de  dados, etc.,   são

discutidos   e

analisados pelo grupo como um todo papel dos pesquisadores se refere basicamente a

preservar o caráter cientifico da pesquisa(analise sistemática e critica da realidade),

portanto, a metodologia tem um importante papel a desempenhar.

                                                                                                                   

Assim, a pesquisa-ação e considerada uma estratégia metodológica da pesquisa social

na qual ha uma ampla interação entre pesquisadores e pessoas implicadas na situação

investigada; dessa interação surgem os problemas a serem pesquisados o objeto da

pesquisa e a situação e os problemas encontrados;o objetivo consiste em resolver ou

esclarecer esses problemas; ha um acompanhamento permanente de toda a atividade dos

atores da situação; e, a pesquisa não se limita apenas a uma ação, mas procura aumentar

o conhecimento de todas as pessoas envolvidas no processo.

 

Situação atual e possibilidades

 

As características históricas, culturais e sóciopolíticas do contexto determinam os

fatores que facilitam ou obstaculizam as possibilidades reais da pesquisa alternativa. As

experiências conhecidas no Brasil e no resto da América Latina refletem nos seus

resultados e limitações as contradições do momento histórico no qual se desenvolvem.

Concordando com Maria Tereza Sirvent (1985), nas sociedades caracterizadas por uma

alta concentração de renda com uma maioria da população em condições de pobreza e

miséria absoluta, esses projetos participativos são facilitados por uma vontade política

de “abertura democrática:” mas, na prática não passam de experiências isoladas num

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clima geral de autoritarismo, paternalismo institucional, arbitrariedades, desemprego e

fome.

Além disso, e fundamentalmente, na medida em que a abertura democrática ou os

projetos participativos,   não impliquem em   ideologias  de modificação das estruturas

do

poder social, político e econômico, essas experiências isoladas serão permitidas pelo

esquema de poder vigente. Mas, no momento que cresçam e  desenvolvam grupos

comprometidos com transformações sociais, os projetos passam a ser uma ameaça

contra esse poder. Indubitavelmente, e muito fácil acabar com experiências isoladas.

Na década dos oitenta, a América Latina experimentou transformações importantes. Na

maioria dos países ressurgem regimes políticos democráticos, deixando para atrás a

época do autoritarismo militar. Além disso, aprofundou-se um processo de contestação

às tendências modernizadoras e participantes próprias à expansão capitalista, as quais

não conseguiram criar sociedades mais jutas, nem capazes de alcançar um crescimento

que diminuísse a fome e a miséria. Pelo contrario, os modelos de desenvolvimento

vigentes, contribuíram a aumentar a exploração e pobreza dos povos latino-americanos.

Concomitante a esse questionamento da modernização e do modelo capitalista existente,

desenvolveram-se, na América Latina. Experiências que baseadas num processo de

produção e disseminação do conhecimento, procuram aumentar a capacidade própria

dos setores populares na descoberta de modelos alternativos. O intelectual que participa

dessas experiências constata que os paradigmas e metodologias utilizadas para

interpretar a realidade social mostram-se inadequados para trabalhar os processos

vividos. Os movimentos sociais que se apresentam a si mesmos como portadores de um

sentido político popular ganham força e ocupam  todos os espaços disponíveis.

Na pesquisa social, surgem novos enfoques metodológicos que insistem na importância

da participação da população, tradicionalmente objeto alienado de estudo, na produção

do conhecimento social. Considera-se, a pesquisa, como um processo de conhecimento

e de transformação da realidade, procuram-se estratégias de participação da população

no planejamento e execução da investigação. Configuram-se novas tendências e

metodologias de pesquisa, agrupadas sob um mesmo título, pesquisa participante.

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Hoje, ninguém pode duvidar da contribuição dessa pesquisa alternativa para a

construção de uma nova ciência e uma sociedade mais justa.

 

 

Problemas da Pesquisa Participante

 

A pesquisa participante, conto prática em processo de consolidação, apresenta diversos

problemas. Estes problemas permitem uma variedade de reflexões que abarcam desde as

técnicas e a concepção do método, ate os aspectos epistemológicos que orientarão a

construção de um novo conhecimento. Entre aquelas reflexões interessa-me destacar as

seguintes: -  os problemas teóricos da pesquisa alternativa e a definição da pesquisa

participante como estratégia metodológica.

 

Problemas teóricos

 

Seguindo as idéias de Justa Espeleta (1986) chama a atenção nos projetos de pesquisa

participante, a linguagem. Uma linguagem que pretende denominar a realidade de

“outro” modo e que procura constituir-se ao mesmo tempo em linguagem crítica.

Este “outro” modo um modo diferente daquele utilizado pela ciência social dominante.

Trata-se, em geral, de uma linguagem com claras conotações marxistas. Mas, muitas

vezes, o material produzido apresenta serias ambigüidades nos conceitos utilizados. Por

exemplo, “transformação da realidade” pode ser usado tanto para falar da mudança de

hábitos alimentares de um grupo, como para designar um fenômeno cognitivo referente

a sujeitos individuais; “transformação’ aparece também freqüentemente como sinônimo

de “mudança social”; relações sociais” e usado para falar de interação; “classe social”

tem uma infinidade de acepções; a relação “sujeito-objeto” - categoria da epistemologia

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- refere-se habitualmente    a uma   interação   entre pessoas. Por outro lado, ‘construção

do

conhecimento” pode referir-se tanto i gênese da teoria como a síntese que o pesquisador

chegava fazer de alguns saberes populares; ‘pesquisa”, enfim, pode ser permutada por

método ou por técnicas.

Um outro aspecto a considerar a freqüente transposição de categorias estruturais

(sistema social, classe, reprodução) para a analise de situações particulares, específicas.

Situações que a linguagem funcionalista designa como microsociais um grupo de mães,

um grupo de camponeses, um bairro. A transposição coloca um problema

epistemológico a adequação das categorias ao nível e ao tipo de processos a estudar.

Este problema é importante, tanto para a teoria como para a metodologia.

É comum ver trabalhos de pesquisa participante que utilizam o conceito de classes

sociais no sentido positivista, procurando atributos ‘‘materiais’’ para identificar e situar

pessoas na ‘‘escala” social, que tem pouco a ver com o conceito marxista de classes,

onde a questão é mais complexa, se historia e se situa em termos de relações históricas

de dominação. Além disso. conceitos gramscianos como “bom senso”. “senso comum”

ou ‘‘intelectual orgânico” são de uso freqüente nesta produção, individualizando

categorias criadas para a escala do movimento social ou personalizando - pela via de

atributos “objetivos” - categorias cuja definição teórica tem conhecidos compromissos

com significações muito precisas e ausentes deste uso. O intelectual, por exemplo, que

‘‘devolve” o conhecimento mais elaborado, recolhido nos setores populares, costuma

chamar-se, por este fato, de “intelectual orgânico”. Evidentemente este não é o sentido

outorgado por Gramsci à categoria intelectual orgânico.

Essas e outras confusões surgem porque, na prática, a pesquisa participante esta mais

voltada à solução de problemas imediatos, com recursos a nível local.

Lamentavelmente, o pesquisador esquece a teoria e cai num perigoso a-teorismo.

Devemos lembrar que a teoria social esta sempre vinculada a processos históricos e que

não se pode enfrentar a realidade sem uma perspectiva que permita visualizá-la e defini-

la.

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Conseqüência dessa falta de teorização surge, por exemplo, uma séria confusão entre

observação participante e pesquisa participante. Existem muitos especialistas em

pesquisa participante que sugerem que dita pesquisa deveria expressar a conjunção da

observação participante com a participação em pesquisa. Nestes momentos devemos

fazer referência a dois grandes pensadores: Malinowski e Marx. Bronislaw Malinowski,

antropólogo inglês (1884-1942) foi o elaborador da observação participante que o levou

a uma teoria, o funcionalismo. Karl Marx, foi quem introduziu a dimensão política para

o uso da ou a participação da pesquisa. Não podemos negar que a observação

participante e a única técnica que possibilita a interação entre o pesquisador e os

sujeitos, permitindo uma abordagem pessoal. Mas, quando Malinowski procurava

compreender as sociedades primitivas estava satisfazendo uma necessidade do Império

Britânico para ajustar a sua administração, no sentido de consolidar a dominação

política e econômica. Como afirma Espeleta. “o saber de Malinowski um saber que se

imbrica  numa  necessidade  histórica  de  dominação. Um saber não só  útil, senão

necessário ao poder’’ Pelo contrário, como já se sabe, Marx opta pela perspectiva

histórica dos explorados.

           A revolução social é a sua meta. Mudar a sociedade implica construir um novo

conhecimento sobre ela e, nesse processo, vai-se construindo o método,

Em resumo, Malinowski, procura ordenamentos e Marx o movimento da sociedade. O

primeiro, utiliza uma técnica, a observação participante, para investigar os

ordenamentos das sociedades primitivas. O segundo, insiste no compromisso histórico

da pesquisa social com a transformação da sociedade capitalista.

                       Assim, podemos constatar as diferenças fundamentais entre a pesquisa

participante e a observação participante. Confundir ambas ou tentar conjugá-las e um

erro produzido pela falta de teorização. O pesquisador corre o risco de abrir caminho ao

senso comum como elemento vital da analise científica.

 

A Pesquisa Participante como Estratégia Metodológica.

 

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Diversos autores consideram a pesquisa participante uma estratégia metodológica. Isto

gera diversos problemas que prejudicam o avanço da pesquisa alternativa. Devemos

lembrar que as críticas à pesquisa convencional se dão particularmente no campo

epistemológico do empirismo e positivismo das Ciências Sociais. Logicamente, os

supostos epistemológicos influem nos supostos metodológicos.

Em geral, o empirismo e o positivismo aplicado às Ciências Sociais refletem uma visão

atomista do homem e da sociedade. Em outras palavras, o elemento mais importante um

sistema social é o individuo, sendo preciso conhecer as suas opiniões, atitudes,

costumes, etc. A totalidade se resume a soma das individualidades. O exemplo mais

claro desse critério e a teoria da amostragem    aplicada   às ciências humanas.   Em

geral, uma amostra deve ser representativa de uma população ou universo. Como se

trabalha com amostras? Geralmente se aplicam questionários ( 50 ou mais pessoas)  que

incluem diversas perguntas relacionadas ao problema pesquisado. Após coletar e

codificar os dados, analisa-se a informação, somando as opiniões  de cada respondente, 

considerando-as como opiniões do grupo. Este  é   um pressuposto epistemológico não

aceito pelos cientistas sociais que trabalham com pesquisa alternativa: o importante é o

conhecimento coletivo, a ação, reação e opinião do grupo ante uma situação

determinada. Portanto, toda amostragem que se baseia em princípios de individualidade

não se adequa à pesquisa alternativa, seja ação ou participante.

Um outro pressuposto epistemológico do empirismo e positivismo que se reflete na

pesquisa convencional é o “aparencialismo”(seguindo o conceito de Jacobo Waiselfiz)

pelo qual se limita a capacidade de conhecer à aparência imediata dos fenômenos. em

uma perspectiva deliberadamente externa e coisificada. Ao limitar a análise ao nível

imediato da realidade e às formas de apresentação dos fenômenos, o âmbito da

problemática a ser pesquisada fica limitada ao dado empírico, enfatizando-se o império

das técnicas de medição, levantamento e analise de dados. Mas, essa aparência, por ser

um modo imediato de manifestações de um processo histórico, é um ocultamento do

real.

Devemos lembrar que os cientistas sociais da América Latina, como produto de alguns

sucessos e muitos fracassos e repressões aos movimentos populares da década de 60,

começaram a questionar politicamente o trabalho do cientista social; questionam os

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aspectos epistemológicos, teóricos e metodológicos da pesquisa e da ciência

convencional; e procuram alternativas de compreensão da realidade social.

Assim, a pesquisa alternativa, incluindo a pesquisa participante, a pesquisa ação, etc.,

não se define apenas por uma metodologia participativa. É uma outra concepção de

ciência, com supostos teóricos e epistemológicos críticos que evidentemente levam a

uma pesquisa que procura contribuir à transformação social.

 

A Ciência e a Pesquisa Alternativa

 

Ao longo deste trabalho, diversos críticas à ciência convencional tem sido feitas:- a

definição, aos aspectos epistemológicos, aos aspectos teóricos, à metodologia, técnicas e

outros. Logo a seguir, tentar-se-á descrever alguns aspectos fundamentais da ciência que

deve orientar a pesquisa alternativa.

 

Princípios Ontológicos e Epistemológicos

 

A realidade social é um processo concreto e historicamente condicionado, no qual a

atividade humana produz e reproduz o mundo material, social e cultural. Este mundo

pode ser representado simbolicamente e internalizado pelos seres humanos, mas, possui

uma existência histórica objetiva. A sociedade não é, apenas, um agrupamento de

estruturas sociais e pautas de comportamento produzidas historicamente. A subjetividade

e a autonomia dos seres individuais só pode ser separada do contexto social e simbólico

para fins analíticos. Em conseqüência, a sociedade não pode ser vista como a soma tio

indivíduos socializados;  é uma totalidade de relações nas quais os indivíduos estão

inseridos. Além disso, as pessoas e grupos criam seu mundo e história sob condições

produzidas no passado histórico. Em outras palavras, produzem as condições e estruturas

historicamente objetivas, nas quais se baseiam para criar o mundo do futuro. Disso se

depreende que uma determinada formação social deve ser examinada concretamente, não

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em termos abstratos. Os fenômenos devem ser enfocados na sua totalidade, sem dela

abstraí-los. Segundo se sabe, a produção social ocorre sempre nesses contextos totais e

esta configurada por eles. Não se pretende afirmar que em todo trabalho científico, a

formação social global (deva ser analisada, é impossível. Isso significa que as analises

feitas de qualquer fenômeno social, devem incorporar, como elemento fundamental a

inserção desse fenômeno na formação social total. Em outras palavras, um determinado

fenômeno deve ser visto a luz das principais estruturas o tendências de uma formação

social. Nesta visão totalizante, a formação social o concebida como um conjunto de

relações sociais, historicamente, em desenvolvimento Retomando a forma de análise

totalizante, o pesquisador deve trabalhar a relação existente entre as tendências

fundamentais da formação social e suas formas, historicamente, espec!ficas. Analisar

uma ou outra das possibilidades (o fundamental ou o específico) é um trabalho

incompleto. A análise deve mostrar as formas específicas de manifestação das tendências

fundamentais de uma formação social para fazer isto, é preciso passar da complexidade

das observações a um modelo conceitual da formação, o qual identifica os componentes

essenciais e secundários, situe acontecimentos, e identifique as principais tendências.

Existe, assim, um processo de interação entre a observação empírica e a formação do

modelo conceitual. Isto não e uma interação unilateral dominada pelo empirismo ou o

teoricismo, ambos configuram a pesquisa.

Na visão aqui exposta, a produção do conhecimento segue os mesmos princípios. Esta

configurada pelo contexto e pela forma de inserção dos “produtores de conhecimento”

na realidade social. Ditos “produtores” reagem ao mundo real, mas, não em termos

passivos (visão funcionalista). Mediante a suas práticas compartilhadas, modelam o

conhecimento gerado e, podem chegar a transformar a realidade. Deve-se insistir que as

referidas práticas desenvolvem-se em determinados contextos sociais e estão,

parcialmente,

 

configuradas por esses contextos.

Neste ponto, cabe destacar o pensamento de Álvaro Vieira Pinto(1985) com relação à

produção do conhecimento. Não se pode partir de “eu penso”, idéia intemporal

metafísica,relativa a um ‘‘eu’’ que não e ninguém, que não esta situado no tempo e no

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espaço, mas do fato histórico, social, objetivo de que “nós pensamos. Este nós, colocado

na origem da reflexão gnosiológica representa o abandono das especulações metafísicas.

Com efeito, ao reconhecer na origem da teoria do conhecimento um “nós’’, não um

“eu’’, parte-se de uma situação objetiva, de um fato concreto e social que fixa e

qualifica a posição de cada individuo num processo histórico. O “nós” implica a

inclusão do individuo num processo objetivo, exterior a ele e a qualquer outro homem,

cuja validade não precisa de confirmação, porque o próprio homem e a confirmação

dele. A existência histórica do individuo, é conhecida e fornece o ponto de partida para

o raciocínio que procura entender o conhecimento, não por uma evidência interior, mas

por uma experiência exterior, social e histórica. O individuo pode ignorar o processo

histórico, mas o processo histórico não ignora a ele, esse processo que contribui à

formação cultural do homem, pela qual se pode questionar, interpretar e transformar a

realidade social a que pertence. Assim, o conhecimento deve ser construído partindo

não da subjetividade humana, mas da objetividade, da existência concreta do mundo em

transformação permanente. O individuo cria a própria consciência no âmbito de uma

consciência social que o envolve, antecede e condiciona.

Após das reflexões feitas anteriormente, vale a pena formular alguns princípios que se

identificam com as bases científicas da pesquisa alternativa:-

 1º -  Para viver e se reproduzir, o homem deve transformar a realidade, e em primeiro

lugar, a realidade material.

 2º -  Para transformar algo material devemos conhecê-lo, e para conhecê-lo, devemos

tratar com ele, transformá-lo. Isto significa que só aqueles envolvidos na transformação

material têm a possibilidade de conhecer a realidade. Quem produz a transformação

material (produção)? As classes sociais.

3º - Além da realidade material, existem concretos reais não-materiais (as relações

sociais). As relações sociais de produção primam sobre as outras relações sociais.

4º - O processo de produção de conhecimento é um processo de transformação, mental e

ativa, determinado pela classe social.     

 Os princípios assinalados fundamentam uma pesquisa alternativa e um método

dialético com diversas implicações para a análise dos fenômenos sociais:-

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            - A importância de estudar a produção material como condição para a

compreensão de todos os aspectos da realidade; 

            - o estudo da totalidade como condição para compreender todos os aspectos da

sociedade(econômico, político, e social);

             - a necessidade de estudar as classes sociais como unidade básica da sociedade,

num contexto de antagonismo dessas classes;

             - a necessidade de estudar as relações sociais que caracterizam as classes

sociais;

             - o estudo da estrutura interna, da lógica, dessas relações sociais;

             - a necessidade de estudar o presente e o passado histórico das relações sociais,

procurando os princípios que permitem a manifestação dessas estruturas (relações

sociais).

 

               A aplicação dos princípios formulados, permitem estabelecer três critérios

metodológicos de uma ciência social alternativa:-

 

1º - Considerar o fenômeno social como algo determinado pela totalidade. Os

fenômenos sociais são objetivos, independentes da vontade de indivíduos ou grupos

isolados.

 

2º - Considerar o fenômeno social como algo determinado pelas classes sociais e pelas

estruturas.

 Segundo já vimos os fenômenos sociais surgem pela luta de classes e podem

subdividir-se em categorias, as mais importantes são:  as econômicas, ideológicas e

políticas. Estes são es principais tipos de dominação de uma classe sobre as outras. Cada

uma destas categorias é o objeto de estudo de ciências sociais específicas.

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3º - Considerar o fenômeno social como algo determinado historicamente. A

determinação das estruturas é um processo. Portanto o fenômeno deve ser estudado no

presente e no seu passado.

 

 

A utilização destes princípios permite esclarecer muitos problemas da pesquisa

participante. Por exemplo, quem participa? De quê? Sabemos que esse quem” é um

sujeito histórico. Não é um indivíduo isolado que somado a outros indivíduos forma um

grupo ou uma sociedade. É um ser social, “produtor” de conhecimento que compartilha

as suas práticas, em determinados contextos, para transformar a realidade a que

pertence.

De que participa? Participa da produção material em uma realidade total com relações

sociais que caracterizam as classes de uma determinada formação social.

Assim, ‘‘quem participa? De quê? Um sujeito histórico e social que protagoniza

processos sociais, procurando a transformação da realidade.

Atualmente a pesquisa participante enfoca e tenta solucionar problemas reais que

afetam as condições de vida dos setores populares. Os processos procuram organizar os

indivíduos enfatizando fenômenos locais ou setoriais e com durações variáveis.

Indubitavelmente, essa pesquisa participante tem contribuído a modificar situações

isoladas. No entanto, deve assumir a responsabilidade de uma pesquisa alternativa para

uma nova ciência. Quem faz pesquisa participante deve ter claramente definidos os seus

pressupostos epistemológicos e gnosiológicos de uma ciência que procura descobrir a

essência dos fenômenos e as leis que os regem, com o fim de aproveitar as propriedades

das coisas e dos processos naturais em benefício do homem.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

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GAJARDO, Marcela. Pesquisa Participante na America Latina, São Paulo, Brasiliense, 1986

 

BARBIER, Rene. Pesquisa-Ação na Instituição Educativa. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor. 1985

 

THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-Ação.São Paulo, Cortez, 1985.

 

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