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Paulo Freire
1. Reflexões didáticas sobre a constituição do Sistema de Numeração
Decimal – SND pelas crianças
É nos anos iniciais do ensino fundamental que os estudantes são
apresentados aos números e às suas representações e, em especial,
ao sistema de numeração decimal. As atividades matemáticas no
mundo atual requerem, desde os níveis mais básicos aos mais
complexos, a capacidade de contar coleções, comparar e
quantificar grandezas e realizar codificações. Também nesse
estágio é necessário que os alunos compreendam os vários
significados das operações e que, ao desenvolver com alguma
autonomia estratégias próprias para efetuá-las, apliquem suas
propriedades e desenvolvam sua habilidade de argumentar e
justificar suas soluções. É na exploração das relações entre as
propriedades das operações e o nosso sistema de numeração
decimal, assim como das relações entre diferentes operações, que
os estudantes podem adquirir a compreensão e o domínio dos
algoritmos convencionais. (BRASIL, 2016, p.15)
Como apontado em publicações de pesquisas no campo e reforçado nas
orientações curriculares e orientações sobre a utilização de livros
didáticos, tem sido consensualmente defendido que ensinar Matemática não
se reduz à transmissão de informações sobre o saber acumulado
nesse campo. Muito mais amplo e complexo, o processo de ensino e
aprendizagem da Matemática envolve um leque variado de
competências cognitivas e requer, além disso, que se favoreça a
participação ativa dos alunos (BRASIL, 2016, p.14).
Pela nova legislação, a criança inicia o Ensino Fundamental aos 6 anos.
Lorenzato (2008) apresenta a seguinte reflexão: Estariam elas, com seis anos de idade e agora no primeiro ano
escolar, preparadas para a compreensão das distintas funções do
número, do verdadeiro significado do zero, das diferenças entre a
simplicidade da contagem oral e as armadilhas da contagem
escrita? E o que dizer da estranha ideia de fazer o 1 valer mais
que o 2 (no número 12, por exemplo)? Indo mais além, será que as
crianças de seis anos detêm os conhecimentos necessários para a
aprendizagem da Aritmética? Existem pré-requisitos a essa
aprendizagem? Quais seriam eles? Eles seriam os mesmos que
devem anteceder o ensino de Medição e de Geometria? Quais são
as consequências de um ensino sem base, sem suporte, sem
alicerce? Queremos uma aprendizagem superficial, apenas
memorizada, ou uma aprendizagem com significado e compreensão?
(LORENZATO, 2008, p.2)
Não podemos esquecer que a criança é produto de um meio social e
quando ela chega à escola, entra num processo interativo de aprendizagem,
de constituição do conhecimento, que depende, como diz Vygotsky (2002),
de condições internas e externas vivenciadas ao longo da vida. A construção
é mais imediata, mas a constituição é longa e é influenciada por experiências
e aprendizados. Assim, entende-se por condições externas, “os padrões
sociais dados pela cultura e tradição local, os padrões matemáticos, o
currículo, o livro texto e demais recursos didáticos, a abordagem
metodológica, o preparo e a experiência do professor, entre outros”
(ABRAHÃO, 2007, p.2). Já por condições internas, mediando as condições
externas, há de se considerar “a emoção, a motivação, o conteúdo e
representações de conceitos matemáticos, as relações com os conceitos
criados anteriormente, as estratégias intuitivas da criança e as estratégias
de resolução de problemas” (ABRAHÃO, 2007, p.2).
Um dos principais focos da alfabetização matemática é a aprendizagem
do Sistema de Numeração Decimal. Algumas crianças iniciam a contagem
utilizando os dedos, uma habilidade matemática que pode auxiliar o
desempenho aritmético e se constitui como uma forma de mediação
cognitiva. Outras utilizam registros gráficos ou material de contagem como
tampinhas, palitos, pedrinhas, etc. Algumas crianças, quando chegam à
escola, já possuem um certo senso numérico, um sistema primário de
cognição numérica, inato e de abrangência universal. Entretanto, sistemas
secundários que envolvem a compreensão e a utilização de alguns cálculos de
operações matemáticas e a utilização de símbolos ou de linguagem
matemática precisam ser ensinados e dependem da qualidade da mediação.
“Para orientar todo esse processo, está o professor, que proverá o
estabelecimento de diálogos em sala de aula, de forma tal que a criança
possa fazer comunicação, verbal e não-verbal, de seus pensamentos”
(ABRAHÃO, 2007, p.2).
Para a pesquisadora Constance Kamii (1994) “número é uma síntese de
dois tipos de relação que a criança elabora entre os objetos” (p.13). Uma é a
relação de ordem e a outra é a de inclusão hierárquica. Muitas vezes, quando
pedimos para a uma criança que conte alguns objetos, o que ela faz é
reproduzir a sequência numérica decorada, sem se preocupar se contou
mesmo todos os objetos ou se algum deles foi contado mais de uma vez.
Segundo Lorenzato (2008), as crianças precisam ter alguns processos
mentais bem trabalhados, para que consigam compreender o SND e possam
resolver questões construindo significado e compreendendo o que estão
fazendo.
Tem sido uma preocupação constante dos professores, buscar
estratégias e recursos lúdicos, concretos ou situações didáticas que possam
“apontar caminhos, instruções, dar pistas e prestar assistências que possam
favorecer a criança a partir das etapas já estabelecidas (concretas,
informais ou não tão elaboradas) a alcançar novas etapas mais formais, mais
complexas e mais abstratas”(ABRAHÃO, 2007, p.2).
Lorenzato (2008), apoiado em Piaget, apresenta 7 processos mentais
básicos para a aprendizagem da Matemática, particularmente para a
aprendizagem e compreensão do SND: Correspondência, Comparação,
Classificação, Sequenciação, Seriação, Inclusão e Conservação. A seguir
vamos pensar em cada um desses processos mentais e em alguns caminhos
que o professor pode seguir para explorar possibilidades de organização
mental para a aprendizagem do SND.
2. Pensando sobre os processos mentais para a aprendizagem do
Sistema de Numeração Decimal
2.1. Correspondência. Estabelecer relação “um a um”, por exemplo. Uma criança para cada cadeira; um nó na corda para cada quantidade
numérica; um número para cada letra. Ou seja, Dados dois conjuntos A e B,
dizemos que eles estão em correspondência biunívoca quando a cada
elemento de A corresponde um único elemento de B e reciprocamente. Quando se estabelece correspondência entre dois conjuntos que tem a
mesma quantidade de elementos, dizemos que eles têm a mesma
cardinalidade, o mesmo número cardinal, quantidades equivalentes.
Na aprendizagem do número, a criança aprende a fazer relação de
correspondência em 3 formas básicas: Foto 1: objetoxobjeto (uma cadeira para cada criança),
Foto 2: objetoXsigno (uma quantidade gráfica ou concreta a um símbolo
matemático),
Foto 3: signoxsigno (10 a dez)
Foto 1: Objeto x Objeto
Fonte: Retirada da Internet (Domínio Público) e adaptada
Foto 2: Objeto x Signo
Foto 3: Signo x Signo
2.2 Comparação: reconhecer diferenças ou semelhanças entre
quantidades numéricas entre conjuntos.
Compare as quantidades entre dois dos conjuntos abaixo. Quem tem mais?
Quantos a mais? Qual conjunto tem menos elementos? Quantos a menos?
Com a mediação certa e com o tempo a criança entende o que significa 2<3,
6>5, 3=3, 5+1=6, 6-1=5 (Foto 4)
Foto 4: Comparação
2.3 Classificação. Separar por categorias observando semelhanças e
diferenças.
A princípio, utilizando os Blocos Lógicos, por exemplo, pode-se solicitar
que as crianças façam a classificação por cores, formas e tamanho (Foto
5). A classificação permite que a criança construa as classes do SND.
Primeiramente pelo agrupamento das unidades, depois pelo agrupamento
das dezenas e assim sucessivamente (Foto 6). Progressivamente ela vai
construir os conjuntos dos ímpares, dos pares, dos múltiplos e etc.
Foto 5: Blocos Lógicos - Classificação
Foto 6: Agrupando quantidades
Conjunto de números naturais ímpares: {1, 3, 5, 7, 9, 11, 13, ...}.
Conjunto de números naturais pares: {0, 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14, ...}
2.4 Sequenciação. Sequenciar os elementos de um conjunto de maneira
que a disposição desses elementes tenha uma regularidade ou “lei de
formação”.
O trabalho pode iniciar com uma historinha, tipo a história em
quadrinhos a seguir, pode explorar sequências de figuras geométricas,
entre outras. Com experiências desafiadoras e atividades bem
selecionadas os alunos irão construir sequências numéricas como as
exemplificadas abaixo. (Foto 7)
Foto 7: Sequenciação.
- Sequências repetitivas:
- Sequências recursivas:
- Sequência de números pares: 0, 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14, ...
- Sequência de números ímpares: 1, 3, 5, 7, 9, 11, 13, ...
- Sequência de Fibonacci: 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, ...
2.5 Seriação. É uma sequência que segue algum critério, ou seja, uma
sequência ordenada. Abaixo, alguns exemplos de séries possíveis:
- Série do menor para o maior:
- Série crescente dos naturais de 1 a 9: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9.
- Série crescente dos naturais pares de 2 a 16: 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14, 16.
- Série crescente dos números ímpares de 5 a 19: 5, 7, 9, 11, 13, 15, 17, 19.
- Série dos múltiplos de 3 até 24: 3, 6, 9, 12, 15, 18, 21, 24.
- Série decrescente dos naturais de 22 a 15: 22, 21, 20, 19, 18, 17, 16, 15.
A seriação auxilia na compreensão de que a ordem de escrita dos algarismos
de um número define a ordem do número. Por exemplo, 245 = duas centenas,
quatro dezenas e cinco unidades é um número da ordem das centenas e está
entre 200 e 300, ou seja 200<245<300. Apesar de utilizarem os mesmos
algarismos, 245 ≠ 254 ≠ 425 ≠ 452 ≠ 524 ≠ 542. Todos esses números
representam quantidades diferentes e por isso, são escritos de formas
diferentes. Ou seja, são números diferentes uns dos outros.
Utilizar o Quadro Valor de Lugar (QVL, CAVALU, Ábaco de Papel, Quadro
de Pregas são algumas formas como esse recurso didático é chamado e
utilizado) pode ajudar, e muito, a seriação. Veja nas imagens (Foto 8),
representação dos números utilizando diferentes tipos de QVL.
Foto 8: Representações de números em diferentes QVL.
2.6 Inclusão. Incluir um conjunto por outro.
A inclusão se inicia com a criança percebendo por exemplo, que a rosa é uma
flor, assim, o conjunto das rosas está incluído no conjunto das flores. Da
mesma forma, o conjunto das flores contém o conjunto das rosas. Uma rosa
é um elemento do conjunto de flores, logo, uma rosa pertence ao conjunto
das flores (Foto 9). Com isso, iniciamos a reflexão sobre os conceitos de
inclusão (contém, está contido) e de pertinência (pertence e não pertence).
Foto 9: Inclusão
Conjunto de Rosas está contido no conjunto de flores.
Fonte: Internet – domínio público
Figura da esquerda: O conjunto A está contido (incluso) em B
Figura da direita: O conjunto A não está contido (incluso) em B
Fonte: Internet – domínio público
Inclusão de conjuntos numéricos
É por meio da inclusão que estudamos a intersecção de classes:
Conjunto Verde: Peças circulares.
Conjunto Vermelho: Peças azuis.
Intersecção entre os dois conjuntos: Peças circulares azuis. (Foto 10)
Foto 10: Interseção de classes
2.7 Conservação: A quantidade se mantém, independente da forma,
posição ou arrumação (Fotos 11, 12, 13 e 14):
Foto 11: Conservação da quantidade discreta.
Foto 12: Conservação de quantidade de massa
Foto 13: Conservação de quantidade de líquido
Foto 14: Conservação de quantidade de comprimento.
3. Sugestões e recursos para se pensar o estudo do Sistema de
Numeração Decimal
3.1 O ábaco de papel, palitos e amarradinhos de 10 palitos
Para encaminhar o trabalho pedagógico de uma forma significativa, alguns
recursos didáticos têm sido utilizados. Por meio de diálogos e conduzindo a
dinâmica de participação em sala de aula, a criança manipula objetos, se
envolve nas atividades lúdicas e formais e se comunica por meio de palavras,
desenhos e registros para ilustrar e apresentar seu pensar matemático.
Há preocupação crescente em se descobrir não só maneiras de utilizar
recursos pedagógicos que facilitem a constituição de conceitos
matemáticos e o processo de desenvolvimento da criança, como também
de apontar caminhos, instruções, dar pistas e prestar assistências que
possam favorecer a criança a partir das etapas já estabelecidas
(concretas, informais ou não tão elaboradas) a alcançar novas etapas
mais formais, mais complexas e mais abstratas. Uma das estratégias
utilizadas pelos professores tem sido partir de situações do cotidiano do
aluno, contextualizadas no mundo real e que para eles se apresentam
significativas, para aplicações sistematizadas, que tanto podem
instrumentalizar a pessoa para a vida, quanto colaborar para o
desenvolvimento do raciocínio. A alta potencialidade do conhecimento
matemático pode favorecer na criança a capacidade de pensar
logicamente e abstrair, prever e criar estratégias, criticar, conjecturar
e argumentar, justificar e comprovar, além de favorecer a criatividade e
a autonomia. Uma formação básica dessa natureza pode encaminhar a
criança na construção de sua cidadania, inseri-la no mundo cultural e
ajudá-la na inserção ao mundo social. As atuais tendências indicam que,
no ensino da matemática, deve-se aproveitar a bagagem de
conhecimentos informais que a criança traz sobre números e operações
[...] A cada ano escolar, a criança apresenta concepções certas e erradas
que foram incorporadas por ela nos anos anteriores de vivência intra e
extra-escolar. Elas precisam ser respeitadas nos seus diferentes ritmos
de aprendizagem, para que (re)adquiram a confiança em sua capacidade
de aprender. Partindo das necessidades da turma, o professor organiza
seu planejamento procurando criar situações que gradativamente levem
os alunos a construírem os significados dos conjuntos numéricos e das
operações. (ABRAHÃO, 2007, p. 2-3)
Um dos recursos muito simples e de bastante valor pedagógico para fazer
valer a compreensão do SND são os palitos de sorvete ou canudinhos de
refrigerante. Cada um deles na cor natural vale uma unidade. Um
amarradinho de 10 palitos naturais equivale a uma dezena que pode ser
negociada com a turma e pode ser trocado por um palito vermelho (ou da cor
que eles quiserem). Dez vermelhos formam um amarradinho de palitos
vermelhos que corresponde a centena, ou seja, 100 palitos da cor natural.
Esse amarradinho de dez palitos vermelhos pode ser trocado por um palito
azul e assim por diante.
Esse trabalho vai sendo registrado no QVL, assim a criança vai
compreendendo o significado dos algarismos no número e o seu valor
posicional (Foto 15).
Foto 15: Palitos e o QVL
Um palito natural vale uma unidade natural.
Um amarradinho de 10 naturais vale 1 dezena que pode posteriormente ser trocado por um
palito vermelho.
Na imagem da direita o QVL representando o número 23.
3.2 Outros tipos de ábaco de papel para estudar o SND
Além de ábacos industrializados (Foto 16), muitos ábacos podem ser criados
pelas crianças (Foto 17 e 18).
Foto 16: Ábaco industrial
Foto 17: Representação do número 133 em um ábaco produzido com isopor,
palitos e tampinhas coloridas. Na foto, a tampinha amarela representa a
unidade, a vermelha representa a dezena e a verde, a centena.
Foto 18: Um ábaco construído com copinhos descartáveis e varetas
coloridas.
3.3 As réguas de Cuisenaire
Um material bastante colorido, industrializado e simples é o material
Cuisenaire, constituído por uma série de dez barrinhas de madeira, sem
marcação das unidades e formando uma escala de 1 a 10, por isso também é
conhecida como escala de Cuisenaire ou barra ou réguas de Cuisenaire (Foto
19). Foi criado pelo professor belga Georges Cuisenaire Hottelet (1891-
1980) para ajudar alunos com dificuldades. Além de permitir visualizar e
manipular a construção dos números naturais, possibilita obter adições e
subtrações simples (Foto 20), encontrar o sucessor e o antecessor (Foto
21), entre várias outras operações matemáticas desde a Educação Infantil
até o Ensino Básico.
Foto 19: Réguas de Cuisenaire
Foto 20: Adição e Subtração
Foto 21: Sequência numérica: Sucessor e Antecessor
3.4 O Material Dourado
O Material Dourado de Montessori (Foto 22) teve esse nome porque foi
idealizado pela médica educadora italiana Maria Montessori (1870-1952)
para ensinar crianças especiais. Por ser um recurso sensorial ajuda a criança
a desenvolver autonomia, concentração, coordenação e ordem. Segue os
mesmos princípios vistos nos ábacos de papel com os palitos ou no ábaco de
madeira ou de contas e as relações numéricas abstratas passam a ter uma
imagem concreta, facilitando a compreensão.
Foto 22: Material Doutado
O Sistema de Numeração Decimal se caracteriza pelos agrupamentos de 10
em 10. Neste sistema, utilizamos os algarismos indo-arábicos 0, 1, 2, 3, 4, 5,
6, 7, 8 e 9. Na escrita de um número, o algarismo 0 (zero) representa a
ausência de unidade naquela posição.
O SND precisa ser ensinado porque na escrita numérica os alunos recorrem
a justaposição de escritas organizando-as de acordo com a fala. Assim, as
crianças podem escrever o número 3207 da seguinte forma 30002007.
Atividades de reflexão:
1. Como você ajudaria a criança a evitar a escrita justaposta, isto é a
evitar que ela escreva 300901 para representar o número 391?
2. Como você ajudaria a criança a entender que 13 ≠ 31 ≠ 103, por
exemplo?
Observe que o cubo grande é formado por 10 placas, cada placa é formada
por 10 barras e cada barra é formada por 10 cubinhos. Este material
baseia-se nas regras do nosso sistema de numeração. Podemos fazer uma
adaptação do Material Dourado para o trabalho em classe, com papel
quadriculado de 1cm X 1cm (Foto 23), onde as peças são feitas da seguinte
forma:
Foto 23: Representação do Material Dourado no papel
Este material em papel possui a limitação de não ser possível a construção
do cubo grande, o que é uma desvantagem em relação ao material
tridimensional feito de madeira ou mesmo de outros materiais
emborrachados e mais leves. O primeiro contato do aluno com o material
deve ser de forma lúdica, para que ele possa explorá-lo livremente. É nesse
momento que a criança percebe a forma, a constituição e os tipos de peça
do material. A princípio, o professor trabalha com a linguagem da criança
para depois evoluir para os nomes convencionais: cubinho, barra e placa
(unidade, dezena e centena). O objetivo disto é levar o aluno a perceber que
toda notação é um dos muitos modos válidos para expressar seu pensamento
e suas formas de raciocínio.
As primeiras atividades mais sistematizadas, que podem ser propostas com
o Material Dourado ou por meio de sua representação em papel, têm como
objetivos fazer com que o aluno perceba as relações entre as peças e
compreenda as trocas no Sistema de Numeração Decimal. Embora seja
possível representar o milhar, é conveniente iniciar com as unidades, depois
as dezenas e assim por diante.
Muitas atividades foram testadas por Abrahão (2002) tanto
individualmente quanto com grupos de crianças do primeiro até o quinto ano
e com graduandos da Pedagogia, evidenciando um significativo avanço na
compreensão e na aprendizagem do SND e suas operações.
3.5 Quadro aditivo.
Um recurso que pode ser bem utilizado em sala de aula para a construção do
conhecimento de número pelo aluno é o Quadro Aditivo (Foto 24). A ideia é
que o quadro seja utilizado junto com os outros recursos como meio de
registro e que ele esteja disponível para os alunos irem preenchendo de
acordo com as ideias construídas. Tendo apenas a primeira linha preenchida
com os números de 0 a 9 e a primeira coluna com as dezenas, de 0 a 90. Aos
poucos os alunos vão completando o quadro aditivo. Não há uma ordem pré-
definida para preencher o quadro, que deve ficar fixado em um local visível
da sala e ao alcance dos alunos. Cada criança também poderá ir construindo
um quadro semelhante no seu caderno ou na sua pasta.
Foto 24: Quadro Aditivo
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
10 12 13 14 15 16 17 18 19
20 21 22 24 25 27 28 29
30 31 33 34 35 37 38 39
40 41 42 43 44 45 47 48 49
50 51 52 54 55 57 58 59
60 61 62 64 65 67 68 69
70 71 72 73 74 75 77 78 79
80
90 91 92 93 94 95 97 98 99
4. Algumas sugestões de atividades lúdicas para a construção do
SND
4.1 Jogos livres
Objetivo: Tomar contato com o Material Dourado, de maneira livre, sem
regras.
Durante algum tempo, os alunos brincam com o material, fazendo
construções livres. O Material Dourado é construído de maneira a
representar um sistema de agrupamento. Sendo assim, muitas vezes as
crianças descobrem sozinhas relações entre as peças. Por exemplo, podemos
encontrar alunos que concluem:
- Ah! A barra é formada por 10 cubinhos!
- E a placa é formada por 10 barras!
- Veja, o cubo é formado por 10 placas!
4.2 Montagem
Objetivo: Perceber as relações que há entre as peças.
O professor sugere as seguintes montagens: uma barra; uma placa feita de
barras; uma placa feita de cubinhos; um bloco feito de barras; um bloco
feito de placas. O professor estimula os alunos a obterem conclusões com
perguntas como estas:
- Quantos cubinhos vão formar uma barra?
- E quantos formarão uma placa?
- Quantas barras preciso para formar uma placa?
Nesta atividade também é possível explorar conceitos geométricos,
propondo desafios como estes:
- Vamos ver quem consegue montar um cubo com 8 cubinhos? É possível?
- E com 27? É possível?
4.3 Nomeando as peças
Separem, na mesa, o material que se pede em cada questão, antes de
desenhá-lo.
1- Represente a menor peça deste material. Neste trabalho nós iremos
chamar esta peça de unidade.
Representação:
2- Represente a barra e responda:
a) Quantos cubinhos (unidades) cabem na barra?
b) Que outro nome pode ser dado à barra? Por que vocês escolheram esse
nome?
Representação:
3- Represente a placa e responda:
a) Quantas barras/dezenas cabem na placa? Como foi possível chegar a esta
conclusão?
b) Quantos cubinhos/unidades cabem na placa? Como vocês chegaram a esta
conclusão?
c) Que outro nome pode ser dado à placa? Por que vocês escolheram esse
nome?
Representação:
4- Represente o “cubão” e responda:
a) Quantas placas/centenas cabem no “cubão”? Como vocês chegaram a esta
conclusão?
b) Quantas barras/dezenas cabem no “cubão”? Como foi possível chegar a
esta conclusão?
c) Quantos cubinhos/unidades cabem no “cubão”? Como vocês chegaram a
esta conclusão?
d) Que outro nome pode ser dado ao “cubão”? Por que vocês escolheram
esse nome?
Representação:
4.4 Ditado
Objetivo: Relacionar cada grupo de peças ao seu valor numérico.
O professor mostra, um de cada vez, cartões com números (Foto 25). As
crianças devem representar os números com as peças correspondentes,
utilizando a menor quantidade delas.
Foto 25: Representações de números com o Material Dourado
Variação: O professor mostra peças, uma de cada vez, e os alunos escrevem
a quantidade correspondente.
4.5 Fazendo Trocas
Objetivo: Compreender as características do sistema decimal.
- fazer agrupamentos de 10 em 10;
- fazer reagrupamentos;
- fazer trocas;
- estimular o cálculo mental.
Para esta atividade, cada grupo deve ter um dado marcado de 4 a 9. Cada
criança do grupo, na sua vez de jogar, lança o dado e retira para si a
quantidade de cubinhos correspondente ao número que sair no dado. Veja
bem: o número que sai no dado dá direito a retirar somente cubinhos. Toda
vez que uma criança juntar 10 cubinhos, ela deve trocar os 10 cubinhos por
uma barra. E aí ela tem direito de jogar novamente. Da mesma maneira,
quando tiver 10 barrinhas, pode trocar as 10 barrinhas por uma placa e
então jogar novamente. O jogo termina, por exemplo, quando algum
consegue formar duas placas.
O professor então pergunta:
- Quem ganhou o jogo?
- Por quê?
Se houver dúvida, fazer as “destrocas”. O objetivo do jogo das trocas é a
compreensão dos agrupamentos de dez em dez (dez unidades formam uma
dezena, dez dezenas formam uma centena, etc.), característicos do sistema
décimal. A compreensão dos agrupamentos na base 10 é muito importante
para o real entendimento das técnicas operatórias das operações
fundamentais. O fato de a troca ser premiada com o direito de jogar
novamente aumenta a atenção da criança no jogo. Ao mesmo tempo, estimula
seu cálculo mental. Ela começa a calcular mentalmente quanto falta para
juntar 10, ou seja, quanto falta para que ela consiga fazer uma nova troca.
Cada placa será destrocada por 10 barras;
Cada barra será destrocada por 10 cubinhos.
Variações: Pode-se jogar com dois dados e o aluno pega tantos cubinhos
quanto for a soma dos números que tirar dos dados. Pode-se utilizar
também uma roleta indicando de 1 a 9.
5. Preparando para a adição e a subtração
5.1 Atividade 1
O professor mostra às crianças a representação da Foto 26:
Foto 26: Representação do número 245
Para que elas reproduzam com suas peças, e a seguir pergunta:
Como você faria para mostrar um número com mais dezenas do que
este? E com menos unidades?
Qual seria o número representado se colocássemos mais 2 centenas
no número mostrado? E mais 3 dezenas? E mais 8 unidades?
O que aconteceria com o número se tirássemos 2 dezenas e 3
unidades?
O professor discute cada resultado com as crianças e pede que
elas registrem todo o que foi feito da forma como jugarem
melhor. Ao mesmo tempo em que analisa os registros feitos
pelas crianças, ele apresenta as outras formas, não como
imposição, mas como opção. Com isso as crianças irão
percebendo a organização e a praticidade da linguagem
matemática.
MUITO
IMPORTANTE
5.2 Atividade 2
Propor às crianças que:
a. Representem 123 com placas, barras e cubinhos.
b. Representem a mesma quantidade usando apenas barras e cubinhos.
c. Representem a mesma quantidade usando apenas cubinhos.
O objetivo desta atividade é fazer com que o aluno perceba que para
representar a quantidade 123 podemos utilizar os seguintes modelos
apresentados pelo MD:
1 placa, 2 barras e 3 cubinhos
ou 12 barras e 3 cubinhos
ou 123 cubinhos
ou então,
1 centena, 2 dezenas e 3 unidades
ou 12 dezenas e 3 unidades
ou 123 unidades.
5.3 Atividade 3
Quantas centenas, dezenas e unidades há em cada número representado a
seguir:
6 Desenvolvendo a escrita de números
6.1 Preenchendo tabelas
Objetivo: os mesmos das atividades “4.4 Ditado” e “4.5 Fazendo trocas”:
Preencher tabelas respeitando o valor posicional;
Fazer comparações de números;
Fazer ordenação de números.
As regras são as mesmas da atividade “Fazendo trocas”. Na apuração, cada
criança escreve em uma tabela a quantidade conseguida.
Exemplo:
Júlia 1 8 9
Alice 1 9 6
Aninha 2 0 0
Outras
Olhando a tabela, as crianças respondem perguntas como estas:
Quem conseguiu a maior quantidade (número)?
E a menor? Por que?
Quantas barras Aninha tem a mais que Alice?
Olhando a tabela à procura do vencedor, a criança compara os números e
percebe o valor posicional de cada algarismo. Por exemplo: na posição das
dezenas, o 2 vale 20; na posição das centenas vale 200. Ao tentar
determinar os demais colocados (segundo, terceiro e quarto lugares) a
criança começa a ordenar os números.
Quem é o vencedor?
Quem ficou em 1°, 2° e 3° lugar?
6.2 Partindo do cubinho
Objetivo: os mesmos das atividades anteriores.
Cada criança recebe um número de cubinhos para trocar por barras e depois
por placas. A seguir deve escrever na tabela os números correspondentes às
quantidades de placas, barras e cubinhos obtidos após as trocas.
6.3 Ampliando a compreensão
Repetir a atividade a atividade pegando peças de centenas, de dezenas e de
unidades.
Objetivo: fazer a criança perceber que, por exemplo, em 203, embora o
algarismo que ocupa a ordem das dezenas seja o zero, existe 20 dezenas
“embutidas” nas 2 centenas e que, mesmo só aparecendo o 3 na ordem das
unidades, o número contém 203 unidades, sendo que 200 delas estão
agrupadas nas 2 centenas.
Este trabalho será facilitado se o professor for progressivamente
apresentando outras formas de escrita das quantidades, aproveitando a
própria estrutura do material, como mostrado anteriormente.
Quantos cubinhos (unidades)? 311 = 300 + 10 + 1 203 = 200 + 3
O que acontece como número de peças se você trocar cada barra por
10 cubinhos? A quantidade representada muda?
O que acontece se você trocar cada placa por barras?
6.4 Aprofundando a atividade anterior
O professor propõe que os alunos separem as peças necessárias para
representar 360 e que escrevam quantas centenas, dezenas e unidades há
neste número:
Utilizando apenas as placas e barras quantas representações
diferentes vocês podem fazer para 360? Mostrem com o material e
façam um registro.
Em qual representação você usou o maior número de peças? E o
menos?
Qual é o maior número de peças que podemos usar para representar
750? E o menor?
Ao realizar esta atividade as representações possíveis para 360 podem ser:
3 placas e 6 barras ou 2 placas e 16 barras ou 1 placa e 26 barras ou 36
barras.
O objetivo é mostrar ao aluno que, embora diferentes representações de
360 possam ser feitas como o material, escolhemos a representações por 3
placas e 6 barras porque é a que revela os princípios de notações e trocas
de Sistema de Numeração Decimal.
7 Estudando ordens e classes
A ilustração do material dourado acima representa um número:
a) Qual número é esse? _____________
b) Nesse numeral cada algarismo habita um lugar chamado ordem. O
número 5 está na 1ª. ordem. Quais são os algarismos que estão na 2ª.
ordem? ______ 3ª. ordem? ________ 4ª. ordem?________ .
c) Cada conjunto de três ordens forma uma classe. Quais são os
algarismos que ocupam a 1ª. classe? ___________ .
d) Qual o algarismo que ocupa a 2ª. classe? ___________.
2ª classe:
milhares
1ª classe:
Unidades simples
Centena
de milhar
6ª ordem
Dezena de
milhar
5ª ordem
Unidade de
milhar
4ª ordem
Centena
simples
3ª ordem
Dezena
simples
2ª ordem
Unidade
simples
1ª ordem
8 Valor Absoluto e Valor Relativo
O valor absoluto e o valor relativo são importantes para a compreensão do
valor posicional do algarismo no número.
Por exemplo: 123, o valor relativo do número vai de acordo com a ordem que
ele está posicionado, ou seja, o valor relativo do algarismo 1 é 100, já que ele
está posicionado na casa das centenas, do 2 que está na casa das dezenas é
20 e do 3 é 3, pois está na casa das unidades. Já o valor absoluto independe
da ordem em que o algarismo está, ou seja, o valor absoluto do algarismo 1 é
1, do 2 é 2 e do 3 é 3.
8.1 Atividade
Como podemos inserir Valor Absoluto e Valor Relativo usando o material
dourado?
Vamos observar a situação abaixo:
Paulão numa contagem de copos enumerou 1636 copos. Como lemos esse
número? ________________________________________ .
Agora vamos representar com o material dourado. Complete a tabela.
Unidade de
milhar
Centena simples Dezena simples Unidade simples
Responda:
a) Quantas unidades vale o algarismo 1? _________ .
b) Quantidade de unidades do algarismo 6? _________ ou _________.
c) Qual o valor?
1 6 3 6
Absoluto
Relativo
9 Estudando a ideia de sucessor de um número
Objetivo: Entender que o sucessor é o número que tem "1 a mais" na
sequência numérica.
Vamos fazer um trem?
O professor propõe aos alunos:
- Vamos fazer um trem. O primeiro vagão é um cubinho. O vagão seguinte
terá um cubinho a mais que o anterior e assim por diante. O último vagão
será formado por duas barras.
Quando as crianças terminarem de montar o trem vão receber plaquetas
aonde escreverão o código de cada vagão. Escreva uma sequência algébrica
para esse código geral.
O desenvolvimento dessa atividade leva a formação da ideia de sucessor. A
criança consegue visualizar o "mais um" na sequência dos números. Essa
atividade contribui também para a compreensão do valor posicional dos
algoritmos no momento da escrita numérica.
9.1 Atividade
Seja n um vagão do trem, ou ainda, seja n um número natural qualquer. Quem
é o sucessor de um número natural n qualquer? Como você explicaria isso
para um colega da sua turma?
10 Estudando a ideia de antecessor de um número
Objetivo: Compreender que o antecessor é o número que tem "1 a menos" na
sequência numérica.
Um Trem Especial.
O professor combina com os alunos:
- Vamos fazer um trem especial. O primeiro vagão vai ter duas barras
(desenhar as barras no quadro). O vagão seguinte tem um cubo a menos e
assim por diante. O último vagão será um cubinho.
Quando as crianças terminarem de montar o trem vão receber plaquetas
aonde escreverão o código de cada vagão.
Essa atividade leva a formação da ideia de antecessor. A criança consegue
visualizar o "menos um" na sequência dos números. Essa atividade contribui
também para a compreensão do valor posicional dos algoritmos no momento
da escrita numérica.
10.1 Atividades
1. Seja n um vagão do trem, ou ainda, seja n um número natural qualquer.
Quem é o antecessor de um número natural n qualquer? Como você
explicaria isso para um colega da sua turma?
2. Que sentença matemática pode ajudar a encontrar o sucessor ou o
antecessor de um número?
Referências Bibliográficas:
ABRAHÃO, Ana M. C. Matemática. Caderno do professor. SMERJ,
Multirio. Rio de Janeiro, 2007.
ABRAHÃO, Ana M. C. Inteligências Múltiplas na Educação Matemática. In
Presença Pedagógica. Belo Horizonte: Dimensão, p 38-47, 2002.
BRASIL, Plano Nacional do Livro Didático, In:
http://www.fnde.gov.br/programas/livro-didatico/guias-do-
pnld/item/7027-escolha-pnld-2016 , 2016.
KAMII, Constance. A criança e o número. Papirus. Campinas. 1994
LORENZATO, Sergio. Para aprender Matemática. 2. ed. rev. Campinas:
Autores Associados, 2008. Coleção Formação de Professores.
VIGOTSKI, Lev S. A Formação Social da Mente. São Paulo. Martins Fontes.
2002.