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Sem Opção Veículo: Correio Braziliense - Caderno: Brasil - Seção: - Assunto: Saúde - Página: 4 - Publicação: 06/07/20 URL Original: Os riscos do efeito sanfona Os riscos do efeito sanfona Ainda sem poder contar com uma vacina contra o novo coronavírus, a população precisa se acostumar a conviver com o abre e fecha das atividades. É o que afirmam os especialistas ouvidos pelo Correio. Apesar de a prática ser comum em meio à pandemia de covid-19, a retomada de forma precoce pode trazer prejuízos já vivenciados em alguns estados brasileiros, como Minas Gerais, que viu o número de infecções explodir após a flexibilização da quarentena. Até a descoberta da imunização, o alerta é para que as autoridades equalizem a discussão que coloca a saúde e a economia em extremos opostos e, assim, consigam amenizar os impactos da pandemia em todas as esferas. À frente das projeções que levaram o governador Ronaldo Caiado a sugerir um lockdown intermitente em Goiás, o professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Goiás Thiago Rangel chama atenção para o equilíbrio das decisões. “Na prática, precisamos sair dessa discussão polarizada entre lockdown e não fazer nada. Essa dicotomia, em que só se prevê dois lados, não é produtiva”, destacou Rangel, em reunião com representantes do governo e da sociedade civil goiana. Durante o encontro, o pesquisador apresentou estimativa de mais de 18 mil mortes por covid até setembro caso não houvesse mudança na forma de enfrentamento da doença no estado. A sugestão apresentada foi de lockdown intermitente, com fechamento durante 14 dias e abertura nos próximos 14, de maneira intercalada até setembro. Segundo Rangel, um fechamento por período longo e indeterminado teria um grande impacto sócioeconômico, com agravamento das desigualdades e possível baixa adesão. “O lockdown é uma ferramenta extremamente importante e que deve ser usada com parcimônia em casos e momentos específicos, porque é extremamente amarga e não é a única ferramenta que nós temos.” O governador Ronaldo Caiado pediu a adesão dos municípios à conduta sugerida. No entanto, cabe aos prefeitos decretar ou não a medida. Enquanto o prefeito de Goiânia, Iris Rezende, seguiu a sugestão e decretou fechamento das atividades não essenciais por 14 dias, a prefeitura de Aparecida de Goiânia informou, por meio de nota, que o município manterá o sistema de matriz de risco e o escalonamento regional de abertura de comércio. Já no Entorno do DF, a decisão foi no sentido de realizar o lockdown somente aos fins de semana. Além disso, houve alteração nos horários dos serviços, essenciais ou não, durante a semana, para evitar aglomerações e conter a disseminação da covid-19. Os municípios goianos atingidos pela medida são: Águas Lindas de Goiás, Abadiânia, Alexânia, Padre Bernardo, Valparaíso, Luziânia, Cidade Ocidental, Santo Antônio do Descoberto e Planaltina de Goiás. A decisão começou a valer no fim de semana. Ferramentas A convivência com a retomada e o fechamento de atividades por um período indeterminado é conformidade entre os especialistas. “Infelizmente, nós vamos conviver com isso por um período ainda não determinado e acho que o platô (estabilização de casos) vai ser um termômetro para definir isso, mas ainda não estamos nele. Para atingi-lo, precisamos de medidas de isolamento efetivas”, avaliou Rodrigo José, médico do serviço de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Imaculada Conceição, em Curvelo. No estado de Minas Gerais, a flexibilização foi descartada pela Secretaria de Saúde nos próximos 15 dias. Isso porque Minas Gerais foi um dos quatro estados que alcançaram mil mortes pelo vírus ao longo da semana passada, após retomar parte das atividades. “Em Minas Gerais, a gente teve uma flexibilização precoce, tanto é que, em duas semanas, a gente teve que fechar. Em Curvelo, cidade do interior do estado, a gente viu o crescimento de número de casos confirmados e também uma grande incidência de internação em terapia intensiva”, afirmou Rodrigo José, que é plantonista da UTI de covid-19 em dois hospitais. Segundo ele, em duas semanas, o número de pacientes internados em UTI no estado dobrou em relação aos últimos 30 dias. Após o salto de casos, o governo estadual recuou na flexibilização, e o secretário de Saúde de Minas, Carlos Eduardo Amaral, informou que prefere não sinalizar uma data específica para a volta gradual de atividades. “Não é momento de flexibilizar ou modificar o isolamento. Trabalhamos com projeções baseadas em análises técnicas de números que tentam chegar mais próximo da realidade”, disse o secretário, na última sexta.

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Veículo: Correio Braziliense - Caderno: Brasil - Seção: - Assunto: Saúde -Página: 4 - Publicação: 06/07/20URL Original:

Os riscos do efeito sanfonaOs riscos do efeito sanfonaAinda sem poder contar com uma vacina contra o novo coronavírus, a população precisa se acostumar a conviver com o abre efecha das atividades. É o que afirmam os especialistas ouvidos pelo Correio. Apesar de a prática ser comum em meio àpandemia de covid-19, a retomada de forma precoce pode trazer prejuízos já vivenciados em alguns estados brasileiros, comoMinas Gerais, que viu o número de infecções explodir após a flexibilização da quarentena. Até a descoberta da imunização, oalerta é para que as autoridades equalizem a discussão que coloca a saúde e a economia em extremos opostos e, assim,consigam amenizar os impactos da pandemia em todas as esferas. À frente das projeções que levaram o governador Ronaldo Caiado a sugerir um lockdown intermitente em Goiás, o professor doDepartamento de Ecologia da Universidade Federal de Goiás Thiago Rangel chama atenção para o equilíbrio das decisões. “Naprática, precisamos sair dessa discussão polarizada entre lockdown e não fazer nada. Essa dicotomia, em que só se prevê doislados, não é produtiva”, destacou Rangel, em reunião com representantes do governo e da sociedade civil goiana. Durante o encontro, o pesquisador apresentou estimativa de mais de 18 mil mortes por covid até setembro caso não houvessemudança na forma de enfrentamento da doença no estado. A sugestão apresentada foi de lockdown intermitente, comfechamento durante 14 dias e abertura nos próximos 14, de maneira intercalada até setembro. Segundo Rangel, umfechamento por período longo e indeterminado teria um grande impacto sócioeconômico, com agravamento das desigualdadese possível baixa adesão. “O lockdown é uma ferramenta extremamente importante e que deve ser usada com parcimônia emcasos e momentos específicos, porque é extremamente amarga e não é a única ferramenta que nós temos.” O governador Ronaldo Caiado pediu a adesão dos municípios à conduta sugerida. No entanto, cabe aos prefeitos decretar ounão a medida. Enquanto o prefeito de Goiânia, Iris Rezende, seguiu a sugestão e decretou fechamento das atividades nãoessenciais por 14 dias, a prefeitura de Aparecida de Goiânia informou, por meio de nota, que o município manterá o sistema dematriz de risco e o escalonamento regional de abertura de comércio. Já no Entorno do DF, a decisão foi no sentido de realizar o lockdown somente aos fins de semana. Além disso, houve alteraçãonos horários dos serviços, essenciais ou não, durante a semana, para evitar aglomerações e conter a disseminação da covid-19.Os municípios goianos atingidos pela medida são: Águas Lindas de Goiás, Abadiânia, Alexânia, Padre Bernardo, Valparaíso,Luziânia, Cidade Ocidental, Santo Antônio do Descoberto e Planaltina de Goiás. A decisão começou a valer no fim de semana. FerramentasA convivência com a retomada e o fechamento de atividades por um período indeterminado é conformidade entre osespecialistas. “Infelizmente, nós vamos conviver com isso por um período ainda não determinado e acho que o platô(estabilização de casos) vai ser um termômetro para definir isso, mas ainda não estamos nele. Para atingi-lo, precisamos demedidas de isolamento efetivas”, avaliou Rodrigo José, médico do serviço de Controle de Infecção Hospitalar do HospitalImaculada Conceição, em Curvelo. No estado de Minas Gerais, a flexibilização foi descartada pela Secretaria de Saúde nospróximos 15 dias. Isso porque Minas Gerais foi um dos quatro estados que alcançaram mil mortes pelo vírus ao longo da semanapassada, após retomar parte das atividades. “Em Minas Gerais, a gente teve uma flexibilização precoce, tanto é que, em duas semanas, a gente teve que fechar. EmCurvelo, cidade do interior do estado, a gente viu o crescimento de número de casos confirmados e também uma grandeincidência de internação em terapia intensiva”, afirmou Rodrigo José, que é plantonista da UTI de covid-19 em dois hospitais.Segundo ele, em duas semanas, o número de pacientes internados em UTI no estado dobrou em relação aos últimos 30 dias. Após o salto de casos, o governo estadual recuou na flexibilização, e o secretário de Saúde de Minas, Carlos Eduardo Amaral,informou que prefere não sinalizar uma data específica para a volta gradual de atividades. “Não é momento de flexibilizar oumodificar o isolamento. Trabalhamos com projeções baseadas em análises técnicas de números que tentam chegar maispróximo da realidade”, disse o secretário, na última sexta.

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Monitoramento e controle Mesmo com uma expectativa de estabilização na curva após agosto, o médico do serviço de Controle de Infecção Hospitalar doHospital Imaculada Conceição, em Curvelo, Rodrigo José indica que medidas subsequentes serão necessárias, já que mesmocom o controle da doença, o vírus permanecerá no país. Por isso, o pesquisador do Observatório Covid-19 da Fundação OswaldoCruz (Fiocruz) Carlos Machado ressalta a importância da vigilância e do monitoramento adequado, diante do convívio com asmedidas de restrição, vistas como o único remédio eficaz contra a infecção até o momento. “As medidas de distanciamento social terão que ser apertadas e afrouxadas a todo momento e nós não temos como fazer issosem vigilância e monitoramento adequados”, afirma. No entanto, na prática, o controle das liberações é, ainda, mais desafiadore necessário. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, a abertura de bares e restaurantes chamou multidões sem máscaras àsruas. Com exigência de funcionar com 50% da capacidade e manter distanciamento de 2 metros, os estabelecimentos nãocomportaram a demanda no primeiro dia de flexibilização, na quinta passada; as pessoas decidiram fazer a festa na rua. “Os agentes determinaram o fechamento de diversos bares, apesar de todos respeitarem os protocolos de segurança sanitária,como distanciamento, uso de máscaras e higienização disponível aos clientes. Devido à aglomeração na rua, todos osestabelecimentos foram orientados e fecharam as portas”, informou a Guarda Municipal do Rio. ExaustãoEm municípios de São Paulo, incluindo a capital, uma liberação semelhante começa esta semana. O temor é de que ocorrasituação de descontrole parecida com a do Rio. “Todos nós estamos ansiosos para sair de casa, para celebrar com os amigos,mas não estamos no momento de celebração. Estamos no momento de solidariedade, entender os protocolos e cumprir. Se issonão acontecer, o Plano São Paulo tem gatilhos para retrocedermos. Os dados vão nos mostrar isso. O papel de liderança dosprefeitos tem sido fundamental, mas o de cada cidadão também é”, alertou a secretária de Desenvolvimento Econômico de SãoPaulo, Patricia Ellen. A capital paulista é uma das cidades onde a flexibilização começa a valer hoje. No fim do mês, caso sejam mantidos os níveis decontrole, academias e salões de beleza também entrarão no rol de atividades permitidas, com restrições. Por outro lado,Campinas foi uma das cidades que retrocederam no afrouxamento, suspendendo todas as atividades não essenciais. Na avaliação do pneumologista do Laboratório Exame Elie Fiss, essa movimentação acontece porque ainda não “conhecemos ahistória natural completa desse vírus. Não tem nem um ano que o conhecemos, tem meses. O vírus influenza, por exemplo,você sabe que aumenta no outono e inverno e depois reduz. Já com o novo coronavírus, nós não sabemos qual ocomportamento dele.” A falta desse conhecimento também traz dúvidas sobre uma possibilidade de reinfecção nos pacientes que já testaram positivouma vez. “A gente ainda não tem conhecimento de qual vai ser o comportamento dessa imunização gerada pela primeirainfecção. É importante ressaltar isso porque, às vezes, as pessoas acham que porque tiveram uma vez, estarão imunizadas enão precisam usar medidas de proteção. Existe uma perspectiva de que esses pacientes não consigam gerar uma imunidadeduradoura, como se esperava”, explica o médico Rodrigo José. (BL e MEC) Ministério da Saúde se esquivaFrequentemente questionado sobre uma orientação de medidas mais intensas diante do aumento de casos registrados, a pastade Saúde tem se esquivado da responsabilidade, empurrando o impasse para as mãos dos gestores locais. “Com relação aorientar a tomar decisão de restrição ou não, não cabe ao Ministério da Saúde, mas ao gestor local. Nós iremos dar o suporte e oapoio necessário em cima da decisão tomada pelo gestor”, afirmou o secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Correia, emcoletiva, na quarta passada. No dia seguinte, o secretário-executivo do ministério, Élcio Franco, voltou a reforçar que cabe aprefeitos e governadores o estabelecimento das medidas de distanciamento social. “Isso já está pacificado e decidido peloSupremo Tribunal Federal”, resumiu. Franco também destacou que cabe aos municípios e estados gerir as verbas repassadas.País rompe marca de 1,6 milhão O Brasil ultrapassou, ontem, a marca de 1,6 milhão de casos confirmados da covid-19. Conforme dados do Ministério da Saúde,foram registrados 26.051 infecções da doença nas últimas 24 horas e 602 óbitos, chegando ao total de 64.867 mortos. O país segue sendo o segundo no mundo em número de casos e vidas perdidas, atrás apenas dos Estados Unidos, que possui2,8 milhões de casos e 129,8 mil mortes. Os dados são compilados pela Universidade Johns Hopkins (EUA).

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São Paulo continua sendo o epicentro da covid-19 no Brasil, com 320,1 mil confirmações para o novo coronavírus e 16 milmortes. No ranking mundial, se comparado ao número de outros países, o estado está atrás, apenas, dos EUA, do Brasil, daRússia e da Índia, com mais casos do que Peru, Chile, Inglaterra, Espanha e Itália, por exemplo. Já o Ceará ultrapassou, no último sábado, o Rio de Janeiro e se mantém em segundo lugar no ranking nacional, com 121.464infectados. O Rio possui um pouco menos, 121.292, mas está na segunda posição quando se observa o número de óbitos, com10.667 pessoas mortas pela doença — o Ceará possui 6.441 óbitos. Os números do ministério informam, também, que o Brasil tem 631.902 pessoas em acompanhamento e 906.286 pacientes quese recuperaram. A quantidade diverge da informação no site de acompanhamento da Johns Hopkins, no qual consta mais de 1milhão de recuperados. Este número é maior do que o dos EUA, que possuem 906.763 recuperados, segundo a plataforma dauniversidade.

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