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Gustavo Nonato Bertoldo
OS PRINCÍPIOS DA INTERVENÇÃO MÍNIMA E DA
INSIGNIFICÂNCIA EM CONFRONTO AO DIREITO PENAL MÁXIMO
Centro Universitário Toledo
Araçatuba - SP
2019
Gustavo Nonato Bertoldo
OS PRINCÍPIOS DA INTERVENÇÃO MÍNIMA E DA
INSIGNIFICÂNCIA EM CONFRONTO AO DIREITO PENAL MÁXIMO
Trabalho de conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em
Direito à Banca Examinadora do Centro Universitário
Toledo, sob orientação do Prof. Mestre Jefferson Jorge da
Silva.
Centro Universitário Toledo
Araçatuba - SP
2019
Gustavo Nonato Bertoldo
ESTUDANDO AS NORMAS DA ABNT
Trabalho de conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em
Direito à Banca Examinadora do Centro Universitário
Toledo, sob orientação do Prof. Mestre Jefferson Jorge da
Silva.
Aprovado em _02_de ___Abril____de __2019__
BANCA EXAMINADORA
Professor Mestre Jefferson Jorge da Silva
Professor Mestre Thiago de Barros Rocha
Professor Doutor Luiz Gustavo Boiam Pancotti
Centro Universitário Toledo
Araçatuba - SP
2019
I have a dream.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela capacidade, discernimento e oportunidades que
me concedeu para dar mais um passo em minha vida. Agradeço a minha família, que são
minha base e meu exemplo de vida. Agradeço aos meus amigos que me apoiaram e me deram
forças em muitos momentos. Agradeço a mim, por nunca ter desistido, mesmo defronte a
tantas adversidades. Agradeço, imensamente também, aos Promotores de Justiça de
Araçatuba, os quais me apoiaram a todo tempo, me inspiraram e me incentivaram para a
conclusão desta etapa. E em especial, ao meu Professor Mestre Jefferson Jorge, o qual além
de meu orientador tornou-se um grande amigo no decorrer destes cinco anos de graduação. À
todos, os meus mais sinceros agradecimentos.
RESUMO
O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo o estudo dos princípios da
intervenção mínima do Estado e do princípio da insignificância. Doutra ponta, faremos um
estudo da política do direito penal máximo, popularmente conhecido como política de
tolerância zero. Nessa consonância traçaremos uma comparação entre os três temas, ou seja,
de um lado os princípios norteadores do Direito Penal, e doutro uma teoria elaborada nos
países desenvolvidos (política de tolerância zero). Dessa maneira, procuraremos demonstrar
se o Direito Penal brasileiro utiliza de maneira coerente o poder punitivo dado pelo Estado.
Buscando, ao final, uma conclusão sobre o estudo e comparação desenvolvida. Ao final
concluiremos se atualmente o nosso país seria capaz de desenvolver tal política, ou se os
princípios da intervenção mínima e insignificância seriam mais coerentes para o nosso
ordenamento jurídico. Como metodologia utilizamos bases lógicas de investigação, com uma
abordagem qualitativa e quantitativa.
Palavras-chave: Direito Penal. Princípio da intervenção mínima. Princípio da insignificância.
Direito Penal Máximo.
ABSTRACT
The present work of conclusion of course has as objective the study of the principles of the
minimal intervention of the State and of the principle of insignificance. On the other hand, we
will study the politics of maximum criminal law, popularly known as zero tolerance policy. In
this consonance we will draw a comparison between the three themes, that is, on the one hand
the guiding principles of Criminal Law, and on another hand a theory developed in developed
countries (zero tolerance policy). In this way, we will try to demonstrate if the Brazilian
Criminal Law consistently uses the punitive power given by the State. Seeking, in the end, a
conclusion about the study and comparison developed. In the end, we will conclude whether
our country would be able to develop such a policy, or whether the principles of minimum
intervention and insignificance would be more coherent for our legal system. As methodology
we use logical bases of investigation, with a qualitative and quantitative approach.
Keywords: Criminal Law. Principle of minimum intervention. Principle of insignificance.
Maximum Criminal Law.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 8
I NOÇÕES FUNDAMENTAIS DO DIREITO PENAL .................................................... 10
1.1 Conceito, função e características do Direito Penal .......................................................... 10
1.2 Conceito de crime .............................................................................................................. 12
1.2.1 Aspecto formal ............................................................................................................... 13
1.2.2 Aspecto material ............................................................................................................. 13
1.2.3 Aspecto analítico ............................................................................................................ 14
1.2.4 A definição legal de crime no Brasil .............................................................................. 15
1.3 Princípios limitadores do poder punitivo estatal ............................................................... 15
1.3.1 Princípio da legalidade ................................................................................................... 16
1.3.2 Princípio da culpabilidade .............................................................................................. 17
1.3.3 Princípio da humanidade ................................................................................................ 17
1.3.4 Princípio da irretroatividade ........................................................................................... 18
1.3.5 Princípio adequação social ............................................................................................. 19
1.3.6 Princípio ofensividade .................................................................................................... 20
1.3.7 Princípio proporcionalidade ........................................................................................... 20
1.3.8 Princípio fragmentariedade............................................................................................. 21
1.3.9 Outros princípios ............................................................................................................ 21
II PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO ESTADO ........................................ 23
2.1 Contexto histórico ............................................................................................................. 24
2.2 Conceito, critérios e característica do princípio da intervenção mínima ........................... 28
2.3 O princípio da intervenção mínima na América Latina e no direito penal brasileiro ....... 33
III PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA... ........................................................................ 36
3.1 Esboço histórico ................................................................................................................ 37
3.2 Conceitos, características e aplicação da insignificância .................................................. 40
3.3 Princípio da insignificância e excludente da tipicidade material ....................................... 46
3.4 Críticas ao princípio da insignificância .............................................................................. 48
3.5 Direito Penal Máximo: conceito e características ............................................................. 50
3.5.1 Teoria das janelas quebradas ........................................................................................... 52
3.5.2 Comparação entre o direito penal máximo e os princípios da intervenção
mínima do Estado e insignificância .......................................................................................... 55
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................58
REFERÊNCIAS....................................................................................................................61
8
INTRODUÇÃO
O ordenamento jurídico vive um conflito entre duas ideologias penais. De um lado, o
Law and order, também conhecido como Direito Penal Máximo, ainda crente na antiga
promessa do Direito Penal de acabar com a criminalidade, tendo como instrumento o
incremento da sanção penal. Por sua vez, ideologias como o princípio da intervenção mínima
e princípio da insignificância, resultados da evolução dos ideais iluministas da primazia da
razão e do antropocentrismo, sustentam que no Estado Democrático de Direito a intervenção
do Estado deve sempre ser a mínima possível.
Não há dúvidas que criminalidade tem crescido de maneira alarmante em todo o
mundo, principalmente no nosso país.
Observa-se que os delitos não se restringem às grandes metrópoles, como São Paulo,
Rio de Janeiro, Brasília etc. Hoje, infelizmente, é possível afirmar que esse câncer social está
alastrado em todas as cidades do território brasileiro, mesmo as cidades mais pacatas e
remotas estão sofrendo com todos os tipos de delitos.
Nesse ponto, pequenos crimes como furtos (art. 155, do CP) são os mais frequentes,
a uma, porquanto são de fácil consumação, a duas porque a lei penal brasileira possui
princípios limitadores do poder punitivo estatal.
O presente trabalho vai analisar até que ponto tais princípios limitadores são
importantes para o Direito Penal, e se o Direito Penal Máximo caberia em nosso país.
No capítulo 1, abordaremos as noções fundamentais do Direito Penal, tais como, o
conceito, funções e características. Veremos, também, os princípios limitadores do poder
punitivo estatal.
No capítulo 2, discorreremos sobre o princípio da intervenção mínima do Estado.
Segundo esse princípio, o Direito Penal só deve intervir em último caso, ou seja, quando os
outros ramos do ordenamento forem insuficientes para solução do problema.
Assim, podemos dizer que de acordo com esse princípio o poder punitivo estatal
seria a ultima ratio da sociedade.
No capítulo 3, faremos uma análise do principio da insignificância, que é o
argumento utilizado pelo judiciário para reconhecer a desproporcionalidade no uso do Direito
Penal em alguns casos, visando eliminar a aplicação de sanções graves a pequenos delitos.
9
A principal ideia é que a lesão ao patrimônio, nestes casos, não é relevante o bastante
para justificar a repressão penal, embora à vítima possa recorrer ao Direito Civil para ver
reparado o prejuízo.
Dessa maneira, caso a conduta, apesar de ser formalmente típica, cause pequena
lesão ao bem jurídico tutelado, não existirá tipicidade material, o que transforma o
comportamento em atípico.
Como o comportamento é atípico, ele se torna indiferente ao Direito Penal e incapaz
de gerar condenação ou mesmo de dar início à persecução penal. Nesse caso, quem efetuou o
delito não será preso.
Além disso, no terceiro capítulo faremos uma análise ao Direito Penal Máximo.
Alguns juristas sustentam que ao verificar-se a ocorrência do pequeno delito, por vezes
flagrantemente cometidos, que trouxe prejuízos para o cidadão honesto, este seja punido com
rigor e sem benesses, porque escolheu ferir o ordenamento jurídico. Aqui, é possível observar
resquícios da política de tolerância zero.
O Direito Penal Máximo já foi utilizado com sucesso nos EUA, lá, pela primeira vez
após 30 anos de aumento dos índices de criminalidade nas grandes metrópoles, os delitos
apresentam grande redução. Ouve-se falar, também, na “broken windows theory‖ (teoria das
janelas quebradas).
Ao final, buscaremos realizar uma comparação/confrontação entre esses temas, pois
de um lado temos os princípios que de certa forma tiram o poder punitivo do Estado, e de
outro lado a política que aplica sanções em todo e qualquer delito, seja ele de grande ou
pequena relevância. A questão é, qual seria o mais adequado para o nosso país.
Utilizaremos como metodologia bases lógicas da investigação, que se inicia pela
percepção de uma lacuna nos conhecimentos acerca da qual formula hipóteses e, pelo
processo dedutivo, testa a ocorrência de fenômenos abrangidos pela hipótese.
Quanto à abordagem do problema a pesquisa é quantitativa e qualitativa. Podemos
dizer que é qualitativa porque em nosso projeto houve uma análise apresentando por dados, e
qualitativa porque o nosso objetivo é forçar o surgimento de aspectos subjetivos e atingem
motivações não explícitas, ou mesmo conscientes, de maneira espontânea.
10
I – NOÇÕES FUNDAMENTAIS DO DIREITO PENAL
1.1 Conceito, função e características do Direito Penal
Ao mencionarmos Direito Penal, pensa-se, rapidamente, em fatos humanos
classificados como crimes (delitos), pensa-se, também, nos responsáveis por tais atos, ou seja,
os criminosos (delinquentes), e, depois, nas consequências jurídicas (pena).
Sob esse prisma, o Direito Penal é o que define o fato-crime, dispõe sobre quem deva
responder e, ao final fixa as penas e medidas de segurança a serem impostas.
Para Bitencourt o Direito Penal apresenta-se como: ―Um conjunto de normas
jurídicas que tem por objetivo a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções
correspondentes – penas e medidas de segurança‖ (2011, p. 32)
Os bens resguardados por ele não interessam somente ao indivíduo, mas a
coletividade como um todo. Viver em sociedade exige o estabelecimento de regras
disciplinadoras entre os individuais que a compõe.
Assim ensina Francisco de Assis Toledo:
Usa-se também a expressão como sinônimo de ―ciência penal‖. No último sentido,
direito penal é um conjunto de conhecimentos princípios, ordenados metodicamente,
de modo a tornar possível a elucidação do conteúdo das normas penais e dos
institutos em que elas se agrupam, com vistas à sua aplicação aos casos ocorrentes,
segundo critérios rigorosos de justiça. É assim, a ciência penal uma ciência prática,
como ensina Welzel, não apenas porque se põe a serviço da administração da justiça
(Rechtspflege), mas com significado mais profundo, por ser uma teoria do agir
humano justo e injusto. (2002, p. 2)
O Direito Penal tem como principal função resguardar e garantir essas condições
indispensáveis da convivência em sociedade, é ele quem defende os bens jurídicos
fundamentais, entre eles a vida (bem de maior valia), a saúde, a liberdade, a propriedade,
arrolados entre os denominados bens jurídicos.
Segundo o professor Capez (2004), para o exercício do Direito Penal, operam-no, em
nome do Estado, as denominadas instâncias formais de controle, como a polícia (mantenedora
da ordem, investigativa ou judiciária), o Ministério Público (como órgão legítimo a promover
a ação penal pública) e o Poder Judiciário (para a função de judicante).
Infelizmente, nos dias atuais a criminalidade é um fenômeno social normal, porque
ocorre em todas as classes e camadas sociais, sem distinções. Para Durkheim (2010), o delito
11
não é somente um fenômeno social normal, como também cumpre outra função importante, a
de conservar aberto o canal de mutação que a sociedade necessita.
Não obstante, quando tais crimes aos direitos dos indivíduos assumem proporções
maiores, os outros meios de controle social mostram-se impotentes e ineficazes, surgindo o
Direito Penal como ultima ratio social, aplicando o direito punitivo do Estado.
Nesse sentido, a definição ao direito penal é:
Definimos o direito penal como o conjunto de normas que ligam ao crime, como
fato, a pena como consequência, e disciplinam também as relações jurídicas daí
derivadas, para estabelecer a aplicabilidade das medidas de segurança e a tutela do
direito de liberdade em face do direito punitivo do estado (MARQUES, 2009, p.21).
Podemos dizer que se faz necessário aplicar sanções a tais atos infracionais,
porquanto de nada adiantaria o estabelecimento de normas e regras, se, em contrapartida, não
houvesse consequências rígidas para punir os praticantes.
Entretanto, essa proteção é exercida não apenas pela sanção pura e simples, mas
também pela intimidação social, mais conhecida como prevenção geral exercida mediante a
difusão do temor aos possíveis infratores.
Daí deriva-se uma das principais diferenças entre o Direito Penal e os demais ramos
do Direito, qual seja, a finalidade preventiva, ou seja, estabelecer normas proibitivas e
respectivas sanções, visando, acima de tudo, evitar o crime.
Nesse diapasão, podemos consignar que o Direito Penal não age apenas
punitivamente (como pensa a sociedade), sendo a prevenção, a meu ver, muito mais
vantajosa.
Não há duvidas que melhor seria se houvesse a celebração de compromissos éticos
entre o Estado e o indivíduo, porém esse é um passo que a sociedade brasileira ainda não
alcançou, infelizmente.
Pois bem, entrando nas características, o Direito Penal, que é a ciência cultural que
pertence à classe das ciências do ―dever ser‖ e não à do ―ser‖, pois as regras por ele impostas
―devem ser‖ observadas por todos no respeito aos mais relevantes interesses sociais.
É também uma ciência normativa porque tem como premissa o estudo da norma
(Direito Positivo), além disso, o Direito Penal faz uma escala de valores dessas normas, que
variam de acordo com o fato que lhe dá conteúdo, por isso é também valorativo.
Ensina Damásio (2011, p. 48) ―O Direito não empresta às normas o mesmo valor,
porém, esse varia, de conformidade com o fato que lhe da conteúdo―.
12
Tem ainda a lei penal caráter finalista, na medida em que procura tutelar os bens
jurídicos fundamentais, ou seja, ele tem como premissa maior resguardar a ordem jurídica,
que só pode ser protegida pela ameaça legal de aplicação de sanções, como a pena.
E, finalmente, o Direito Penal é sancionador, por proteger a ordem jurídica aplicando
penas (sanções).
Essas são as principais características do Direito Penal contemporâneo.
Discute-se, ainda, se o Direito Penal é constitutivo, alguns autores afirmam que se
trata de direito constitutivo, pois possuí um ilícito próprio, que vem da tipicidade, uma sanção
(pena), e alguns institutos exclusivos, dentre eles o sursis.
Lembra Walter de Abreu Garcez que:
As normas jurídicas não se recolhem a comportamentos estanques, mas sim atuam
em harmonia no quadro de uma sistematização geral, sem que por tais correlações se
possa falar em acessoriedade, secundariedade ou complementabilidade e umas e
outras. A meu ver, data vênia, o Direito Penal é excepcionalmente constitutivo.
(1972, p. 14)
Observamos, em tempo, que como ciência jurídica o Direito Penal tem caráter
dogmático, uma vez que se fundamenta no direito positivo, exigindo-se o total cumprimento
de suas normas pela sua obrigatoriedade.
O caráter dogmático é muito importante para o nosso tema.
Por ser uma ciência dogmática exige-se, necessariamente, o TOTAL cumprimento
das normas, devemos refletir se a política de tolerância zero é o melhor meio para o
cumprimento normativo.
1.2 Conceito de crime
Antes de adentrar no conceito em si, importante salientar que na segunda metade do
século XIX, a doutrina alemã, sob forte influência do método analítico, é quem definiu o atual
conceito de crime, fato que ocorreu com ajuda de outros países, como Itália, Espanha,
Portugal, Grécia, Áustria e Suíça.
13
Como relatado no tópico acima, o caráter dogmático é uma característica do Direito
Penal, e, em consequência desse caráter, podemos dizer que o conceito de crime é
essencialmente jurídico.
O crime pode ser conceituado sob os seguintes aspectos: material, formal e analítico.
1.2.1 Aspecto formal
O aspecto formal alcança apenas um dos aspectos do fenômeno criminal, o mais
aparente, que é a contradição do fato a uma norma, não penetra, contudo, em sua essência, em
seu conteúdo, em sua matéria.
Sob o aspecto formal, pode-se dizer, simplesmente, que crime é o fato humano
contrário a lei.
O conceito dado pelo professor Damásio (2011, p. 193) é, também, nesse sentido
―Sob o aspecto formal, crime é um fato tipico e antijurídico. A culpabilidade, como veremos,
tem outra natureza”.
Na visão de Fernando Capez:
É aquele que busca, sob um prisma jurídico, estabelecer os elementos estruturais do
crime. A finalidade desse enfoque é propiciar a correta e mais justa decisão sobre a
infração penal e seu autor, fazendo com que o julgador ou intérprete desenvolva seu
raciocínio em etapas. Sob esse ângulo, na perspectiva da moderna dogmática alemã,
adota-se um conceito tripartido de delito, desde o início do século XX, com Fraz v.
Liszt e Ernest Beling, lecionando-se que crime é todo fato típico, ilícito
(antijurídico) e culpável. (2004, p. 253).
Assim, podemos concluir que o conceito de crime no aspecto formal é basicamente
qualquer ação legalmente punível.
1.2.2 Aspecto material
Diferente do aspecto formal, o material procura estabelecer a essência do conceito,
ou seja, por que determinada atitude é considerada criminosa e o outro não, por que aquele
cidadão que cometeu furto foi condenado, e aquele outro que praticou o mesmo ato não.
14
Com efeito, a melhor orientação para obtenção de um conceito material de crime, é
dizer que é aquele que tem em vista o bem protegido pela lei penal. Analisando esses aspectos
é visível que o conceito material é mais abrangente que o formal, isso porque ele abrange
algumas ciências extrajudiciais como Sociologia, a Filosofia, a Psicologia etc.
Visto esse alargamento, o Mirabete sustentou:
Tem o Estado que velar pela paz interna, pela segurança e estabilidade coletivas
diante dos conflitos inevitáveis entre os interesses dos indivíduos e entre os destes e
o do poder constituído. Para isso, é necessário valorar os bens e os valores
individuais ou coletivos, protegendo-se, através da lei penal, aqueles que mais são
atingidos quando da transgressão do ordenamento jurídico‖ (2011 p. 80)
Podemos dizer que essa proteção é efetuada pela aplicação da sanção, e
consequentemente esses bens serão juridicamente tutelados pela lei.
A mesma visão foi exposta por Fernando Capez (2004), segundo ele o crime
(conceito material) pode ser definido como todo fato humano que, propositada ou
descuidosamente, lesa ou expõe a perigo bens jurídicos considerados fundamentais para a
existência da coletividade e da paz social.
1.2.3 Aspecto analítico
Além dos citados conceitos (aspectos) formal e material, faz-se necessária a adoção
de um conceito analítico de crime. Os dois conceitos mencionados anteriormente não são
suficientes para permitir à dogmática penal a realização de uma análise dos elementos
estruturais (tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade) do conceito de crime.
Dessa forma, o conceito analítico, predominante, conceitua o crime como a ação
típica, antijurídica e culpável. A punibilidade, apesar de considerada como ―a possibilidade de
aplicar-se a pena‖, não é elemento do crime, mas somente uma consequência.
Importante colocarmos o entendimento de Mirabete:
O conceito formal de delito com referencia aos elementos que compõe (melhor seria
falar-se em aspectos ou características do crime), de caráter analítico tem evoluído,
Battabline, embora reconheça que o delito é um todo unitário, decompõe-no em
elementos por razoes praticas, definindo-o como ―fato humano descrito no tipo e
cometido com culpa, ao qual é aplicável a pena‖ (2011, p. 81).
15
O crime, nessa concepção que adotamos, é, pois, ação típica, ilícita e culpável.
1.2.4 A definição legal de crime no Brasil
Nota-se que ao contrário dos Códigos Penais de 1830 e 1890, o atual Código Penal
(1940, com Reforma Penal) não define crime.
Dessa forma, a ei de ntrodução ao C digo Penal brasileiro (Decreto-lei n. 3.9114
41), limitou-se apenas a destacar as características que diferem as infrações penais
consideradas crimes daquele que constituem contravenções penais, as quais, como se sabe,
restringem-se à natureza da pena de prisão aplicável.
Faz a seguinte definição de crime: ―Considera-se crime a infração penal a que a lei
comina pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativamente ou
cumulativamente com a pena de multa, contravenção, a infração a que a lei comina,
isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativa―.
Nessa seara, floresce a preocupação em estabelecer um Direito Penal Mínimo, que
respeite de forma objetiva, o direito à vida, estruturando-se nos princípios basilares advindos
da Lei Maior, tais como: o princípio da dignidade da pessoa humana, da ofensividade,
princípio da legalidade e os princípios da intervenção mínima e da insignificância, temas do
nosso trabalho.
1.3 Princípios limitadores do poder punitivo estatal
Primeiramente, importantíssimo relatar que a legitimação formal do Direito Penal se
dá com a aprovação das leis penais em conformidade com a Constituição Federal, portanto
poderíamos chamar de princípios reguladores do controle penal de princípios constitucionais
fundamentais de garantia do cidadão.
Na perspectiva constitucional, nenhuma conduta pode, materialmente, ser
considerada criminosa se de algum modo não colocar em risco valores fundamentais da
coletividade.
Nesse sentido, Fernando Capez consignou:
16
Imaginemos um tipo com a seguinte: manifestar ponto de vista contrário ao regime
político dominante ou opinião capaz de causar melindre nas lideranças políticas‖.
Por evidente, a par de estarem sendo obedecidas garantias formais de veiculação em
lei, materialmente esse tipo não teria qualquer subsistência, por ferir o princípio da
dignidade da pessoa humana e, assim, não resistir ao controle de compatibilidade
vertical com os princípios incertos na ordem constitucional. Na doutrina não existe
divergência a respeito. A polêmica circunscreve-se aos limite desse controle por
parte do Poder Judiciário (2004, p. 120)
Por esse motivo, nesse tópico faremos um resumo sobre os princípios limitadores do
poder punitivo estatal, entre eles estão os que serão abordados em nosso trabalho, ou seja, o
princípio da intervenção mínima e o princípio da insignificância. Todos esses princípios são
de garantia do cidadão, e estão amparados pelo novo texto constitucional de 1988 (art. 5º).
1.3.1 Principio da legalidade
O princípio da legalidade (reserva legal) constitui uma concreta limitação ao poder
punitivo estatal. Em outros termos, podemos dizer que pelo princípio da legalidade, a
elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei.
Esse princípio já está previsto no art. 4 da Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão. No direito brasileiro vem contemplado nos arts. 5, II, 37; e 84, IV, da Constituição
Federal de 1988.
Diz Rogério Greco:
O principio da legalidade possui quatro funções fundamentais: 1) Proibir a
retroatividade da lei penal (nullun crimen nulla poena sine lege praevia); 2) proibir
a criação de crimes e penas pelos costumes (nullun crimen nulla poena sine lege
scripta); 3) proibir o emprego da analogia para crimes, fundamentar ou agravar
penas (nullun crimen nulla poena sine lege stricta); 4) Proibir incriminacoes vagas e
indeterminadas (nullun crimen nulla poena sine lege ceta) (2008, p. 2)
Com efeito, a Constituição Federal de 1988, ao abrigar os direitos e garantias
fundamentais, em seu art. 5º, inc. XXX X, definiu: ―não haverá crime sem lei anterior que o
defina, nem pena sem prévia cominação legal‖.
Segundo Julio Fabbrini Mirabete:
Pelo princípio da legalidade alguém só pode ser punido se, anteriormente ao fato por
ele praticado, existir uma lei que o considere crime. Ainda que o fato seja imoral,
antissocial ou danoso, não haverá possibilidade de punir o autor, sendo irrelevante a
circunstância de entrar em vigor, posteriormente, uma lei que o preveja como crime.
(2011, pg. 51,).
17
Assim restou clarividente que o princípio da legalidade tem grande afinidade com os
princípios abordados no trabalho.
Doutra ponta, a legalidade material nada mais é do que o enquadramento do
conteúdo da lei aos direitos e garantias fundamentais, previstos na Carta Magna.
Como se sabe, no Estado Constitucional de Direito, como no Brasil, a legalidade
demonstra que tal Estado é rígido por uma constituição.
Vale ressaltar, que o princípio da legalidade exige uma obediência incondicional à
constituição.
1.3.2 Principio da culpabilidade
De outra banda, preceitua o princípio da culpabilidade que ―não há crime sem
culpabilidade.‖ No entanto, decorre daí três consequências materiais: a) não há
responsabilidade objetiva pelo simples resultado; b) a responsabilidade penal não é pelo fato e
sim pelo autor; c) a medida da pena é a culpabilidade.
Em outras palavras, segundo o princípio da culpabilidade a pena só pode ser imposta
a quem, agindo com dolo ou culpa, e merecendo juízo de reprovação, cometeu um fato típico
e antijurídico.
Segundo Gustavo Octaviano Diniz Junqueira:
O princípio da culpabilidade tem duas vertentes: a) nullum crime sine culpa – não há
crime sem culpa ou dolo. Veda a possibilidade do reconhecimento da
responsabilidade objetiva em direito penal. Assim, não basta que fisicamente o
sujeito tenha lesado o bem jurídico; é preciso que tenha atuado com dolo e culpa. b)
a pena não pode ser maior que a reprovabilidade do sujeito pelo fato praticado, o que
impede que o Estado instrumentalize o sujeito como exemplo para prevenir novos
crimes. Inviabiliza ainda a possibilidade de o sujeito ser responsabilizado pelo que é,
e não pelo que fez (ao mesmo tempo que impede que o sujeito seja responsabilizado
pelo que é, e não pelo que fez – prevalência do direito penal do autor sobre o direito
penal sobre do fato). Se não há culpabilidade (reprovabilidade), não pode haver
punição. (2005, p.29)
Não podemos esquecer que o juízo de culpabilidade rejeita a responsabilidade penal
objetiva.
1.3.3 Princípio da humanidade
18
Dando continuação ao rol de princípios limitadores do poder punitivo estatal, o
princípio da humanidade sustenta que a punição dada pelo Estado não pode, de maneira
nenhuma, atingir a dignidade da pessoa humana.
Encontramos posicionamento nesse sentido no Tratado de Direito Penal escrito por
Cezar Roberto Bitencourt:
A proscrição de penas cruéis e infames, a proibição de tortura e maus tratos nos
interrogatórios policiais e a obrigação imposta ao Estado de dotar sua infraestrutura
carcerária de meios e recursos que impeçam a degradação e a dessocialização dos
condenados são corolários do princípio da humanidade. (2011, p. 47)
Não obstante, lembra-nos, com razão, Jeschek, a despeito da adoção do princípio da
humanidade, que:
O Direito Penal não pode equiparar-se ao direito da assistência social. Serve, num
primeiro plano, à justiça distributiva de fazer valer a responsabilidade do autor pela
infração ao Direito, de modo que experimente a resposta da comunidade jurídica ao
fato por ele cometido. Por isso, não se pode renunciar aos prejuízos e sofrimentos,
ser inspiradas pelo princípio da humanidade. (1981, p. 30).
Portanto, esse princípio é o grande entrave para adoção da pena capital e da prisão
perpétua no sistema penal brasileiro.
1.3.4 Principio da irretroatividade
Insculpida na declaração Francesa dos Direitos Humanos do Homem e do Cidadão,
de 1789, a irretroatividade da lei penal, foi consagrada no art. 1º do Código Penal e no art. 5º,
inc. XXXIX, da Constituição Federal: não há crime sem lei anterior que o defina.
O art. 5.º, XXXIX, consagra a regra do nullum crimen nulla poena sine praevia lege.
Assim, de uma só vez, assegura tanto o princípio da legalidade (ou reserva legal), na medida
em que não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal, como o princípio
da anterioridade, visto que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal.
Por sua vez, a regra do inciso XL do art. 5, ao mesmo tempo que estabelecia a
irretroatividade da lei penal, in pejus, consolida a retroatividade da lei penal mais benigna.
Entretanto, necessário salientar que o princípio da irretroatividade vige somente em
relação a lei mais severa (art. 2º, do CP). E mais, elas não atingem leis temporárias ou
excepcionais.
19
1.3.5 Princípio da adequação social
Segundo esse princípio, quando o sentimento social de justiça não for afetado pelo
comportamento humano, mesmo sendo ―considerado‖ como criminoso, não pode constituir
delitos, sob pena de a lei incriminadora padecer do vício de inconstitucionalidade.
Daí surge o princípio da adequação social.
Data vênia, temos criticas a essa teoria, a uma porquanto costume não revoga lei, a
duas porque pode o magistrado substituir o legislador e dar por revogada uma lei em vigência.
Mesmo assim, atualmente é impossível deixar de reconhecer sua relevância na
interpretação de um tipo penal. Por esse motivo, quando usamos esse princípio ao lado de
outros pode-se excepcionalmente levar à exclusão da tipicidade.
Ensina Junqueira:
A ideia de que a conduta adequada socialmente não merece tutela penal é óbvia, mas
a doutrina tem buscado resolver o problema de diversas maneiras. No presente
enfoque, afirmamos que apenas aparentemente o tipo descreve condutas
(eventualmente) socialmente adequadas. Na verdade, quando buscamos seu sentido
(e interpretar é buscar o alcance e sentido da norma), concluímos que jamais poderia
trazer como merecedora de tutela penal conduta aceita ou até mesmo fomentada pela
sociedade, como o caso da cirurgia plástica para alteração de sexo, da perfuração
para colocação de brincos ou da criação de risco permitido (viajar de avião). É
verdade que os mesmo problemas podem ser resolvidos em outros momentos, como
na teoria do crime especificamente na tipicidade, mas a inspiração é a mesma: o
conceito material de crime. Daí o estudo no presente tópico, sendo que acreditamos
ser uma decorrência da subsidiariedade. (2005, p. 37)
Consta frisar que não devemos confundir esse princípio com o princípio da
insignificância, pois naquele a conduta deixa de ser punida por não mais ser considerada
injusta pela coletividade, e nesse a conduta é considerada pouco lesiva.
O princípio da adequação social, concebido por Hans Welzel, possui dupla função.
Uma delas é a de restringir o âmbito de abrangência do tipo penal, limitando sua interpretação
e de excluindo as condutas consideradas socialmente adequadas e aceitas pela sociedade.
Por sua vez, a segunda função é dirigida ao legislador em duas vertentes. A primeira
delas orienta o legislador quando da seleção das condutas que deseja proibir ou impor, com a
finalidade de proteger os bens considerados mais importantes. Se a conduta que está na mira
do legislador for considerada socialmente adequada, não poderá reprimi-la valendo-se do
Direito penal.
20
A segunda vertente destina-se a fazer com que o legislador repense os tipos penais e
retire do ordenamento jurídico a proteção sobre aqueles bens cuja conduta já se adaptaram
perfeitamente à evolução da sociedade.
1.3.6 Princípio da ofensividade
Veremos agora o princípio da ofensividade, que basicamente sustenta não haver
crime quando a conduta não tiver oferecido, pelo menos, um perigo concreto, real, efetivo ao
bem jurídico penalmente protegido.
Segundo Bitencourt:
O princípio da ofensividade no Direito Penal tem a pretensão de que seus efeitos
tenham reflexos em dois planos: no primeiro, servir de orientação à atividade
legiferaste, fornecendo substratos político-jurídicos para que o legislador adote, na
elaboração do tipo penal, a exigência indeclinável de que a conduta proibida
represente ou contenha verdadeiro conteúdo ofensivos a bens jurídicos socialmente
relevantes. (2011, p. 52)
Se não bastasse isso, o princípio da ofensividade considera inconstitucionais todos os
chamados ―delitos de perigo abstrato‖, pois segundo ele inexistem crimes sem concreta, real e
efetiva lesão ao bem jurídico.
1.3.7 Princípio da proporcionalidade
De outros ares, o princípio da proporcionalidade, que veremos agora, tem intima
ligação com o tema principal que será abordado, pois segundo ele deve haver uma
proporcionalidade entra a conduta a ser aplicada e o crime praticado.
Com efeito, diz Capez (2008, p. 130):
Para o princípio da proporcionalidade, quando o custo for maior que a vantagem, o
tipo será inconstitucional, porque contrário ao Estado Democrático de Direito. Em
outras palavras: a criação de tipos incriminadores deve ser uma atividade
compensadora para os membros da coletividade.
Utilizamos, ainda, um exemplo citado no livro do professor Capez que se refere a um
julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade na qual o Supremo Tribunal Federal
21
suspendeu por liminar os efeitos de uma ação Medida Provisória n. 2.045 de 2000, a qual
proibia o registro de armas de fogo, por considerar não haver proporcionalidade entre os
custos sociais como desemprego e perda de arrecadação tributária e os benefício que
compensassem o sacrifício.
Vemos aqui, um exemplo latente da aplicação do princípio da proporcionalidade, a
qual procura eliminar, dentro do possível, toda e qualquer intervenção desnecessária do
Estado na vida privada dos cidadãos.
1.3.8 Princípio da fragmentariedade
Temos, ainda, o princípio da fragmentariedade que é consequência do princípio da
intervenção mínima, pois preceitua que o Direito Penal não deve proteger todos os bens
jurídicos, só os mais importantes, não os tutelando, também de todas as lesões, intervindo
somente nos casos de maior gravidade.
Nesse ponto:
Nem toda lesão a bem jurídico com dignidade penal carece de intervenção penal,
pois determinadas condutas lesam de forma tão pequena, tão ínfima, que a
intervenção penal, extremamente grave, seria desproporcional, desnecessária.
Apenas a grave lesão a bem jurídico com dignidade penal merece tutela penal.
(JUNQUEIRA, 2005, p. 37)
Portanto, é notório que esse princípio está totalmente relacionado com o tema
abordado em nosso projeto.
1.3.9 Outros princípios
Derradeiramente, necessário mencionar outros princípios que não foram abordados,
mas são igualmente relevantes, tais como: princípio da alteridade ou da transcedentalidade,
princípio da confiança, princípio da necessidade e da idoneidade, princípio da proibição da
analogia, princípio do estado de inocência, princípio do ―ne bis in idem”, entre outros.
22
Aqui encerramos o tópico que abordou os princípios do Direito Penal, dando maior
ênfase aqueles que são considerados limitadores do poder punitivo estatal.
No próximo capítulo abordaremos o princípio da intervenção mínima, segundo
alguns autores esse princípio é a viga mestre do Direito Penal Democrático.
23
II PRINCÍPIO DA INTERVENCÃO MÍNIMA DO
ESTADO
O princípio da intervenção da mínima diz que o Direito Penal só deve intervir em
último caso, quando os outros ramos do ordenamento se revelarem insuficientes para solução
do conflito.
O Direito Penal deverá intervir o mínimo possível nas relações sociais, e somente
será chamado para atuar quando a criação de um crime for estritamente necessária para a
tutela do bem e a garantia de direitos (é um princípio para quem cria leis).
Em comparação aos outros ramos do direito, o Direito Penal é a ultima saída, ou seja,
primeiro devemos tratar o fato com o Direto Civil, Direito Tributário, Direito do Trabalho,
Direito Administrativo, como por exemplo uma multa que é criada no Direito Administrativo
ou Tributário, criar uma indenização no direito civil pelo dano, contudo, se isso não for
suficiente cria-se o crime.
Portanto, comparado com os outros ramos do direito, o Direito Penal é subsidiário,
pois ele vai ser usado posteriormente, aqui nasce um dos princípios correlacionados com o
princípio da intervenção mínima, ou seja, princípio da subsidiariedade.
O Direito Penal é subsidiário em relação aos demais ramos do direito, sendo a última
saída para a tutela de um bem jurídico (ultima ratio).
Um exemplo é que na Constituição Federal de 1988 veio a tutela do meio ambiente,
na qual lesões ao meio ambiente deveriam ser punidas e são tuteladas pela Carta Magna.
Quem causava lesão ao meio ambiente tinha que indenizar, pagar o prejuízo, sanção
administrativa a empresa, uma multa, fechar ou interditar a empresa ate que ela concerte o
problema que esteja gerando um dano ao meio ambiente.
Ocorre que tais sanções não estavam resolvendo, pois as empresas estavam pagando
as multas e continuavam a afetar o meio ambiente, reparavam os danos, afetavam as famílias,
indenizavam, mas continuava a mesma coisa, então o Direito Civil e o Direito Administrativo
não estavam sendo insuficientes. Em razão disso, dez anos depois ao se perceber essa
insuficiência foi necessário chamar o Direito Penal para intervir, respeitando-se, assim, a
intervenção mínima, já que os outros ramos do direito não conseguiram tutelar esses bens,
criando, assim, a Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9605/98).
24
Segundo esse princípio o Direito Penal deve intervir o mínimo possível nas relações
sociais, última saída, ultima alternativa, para que o Estado proteja bem jurídico, garanta
direitos, ou seja, não deve ser usado de qualquer forma. Só quando estritamente necessário, o
legislador só deve criar um crime quando for a última saída.
Portanto, quando se pega um bem jurídico, por exemplo um patrimônio, deve-se
olhar se precisa da intervenção penal, ou seja, ver as forma de lesões que esse bem suporta, se
o Direito Penal precisa atuar cria-se crime, e se não precisa deixa para os outros ramos. Como
por exemplo, um menino que está jogando bola na frente e quebra a janela da vizinha, apesar
de ser dano ao patrimônio ele pode ser resolvido no âmbito civil, ou até mesmo com a
conversa entre as partes, foi por falta de cuidado, e não foi uma conduta dolosa, (dano
culposo, por falta de cuidado).
Agora, se for com intenção deve-se incriminar, ou seja, responder por crime de dano
ao patrimônio, sim, na forma dolosa. Vale dizer que o dano ao patrimônio por falta de cuidado
não é crime, pois a sociedade não precisa do Direito Penal para resolver esse tipo de
problema.
Neste caso nós fragmentamos o bem tutelado, olhando as formas de violação dele, e
escolhendo o que realmente precisa de tutela penal, já que a intervenção é mínima.
Deve-se fragmentar um bem jurídico para que a intervenção penal incida somente
nos fragmentos, nas formas de lesão em que seja estritamente necessário, exemplo, dano
culposo não é crime. Um exemplo seria de uma pessoa que vem dirigindo uma bicicleta
desatentamente e bate no orelhão quebrando-o, aqui não houve crime.
Insta salientar que nem todo o fato lesivo é crime.
2.1 Contexto histórico
Quando surgiram os primeiros grupos sociais, vieram com eles alguns problemas
típicos da coletividade, os conflitos.
25
Em razão disso, foi necessário criar alguns dogmas (regras) para garantir a harmonia
desses grupos, aplicando-se sanções aos que desrespeitavam tais regras. Todavia, nem sempre
pertenceu ao Estado o direito de aplicar tais sanções.
Antigamente, a punição fundava-se mais no caráter religioso, no Oriente Médio, por
exemplo, os delinquentes eram torturados e duramente castigados, tudo com escopo de
agradar os ―deuses‖.
A ei de Talião é muito conhecida, tinha como máxima ―olho por olho, dente por
dente”, pois a violência era retribuída com mais violência e crueldade.
Por sua vez, no Direito Romano, o chefe da família era o principal responsável pela
aplicação de sanções no seu grupo social, tal premissa é conhecida como pater familiae.
Segundo Nucci:
O Direito Romano, dividido em períodos, contou, de início, com a prevalência do
poder absoluto do pater famílias, aplicando as sanções que bem entendesse ao seu
grupo. Na fase do reinado, vigorou o caráter sagrado da pena, firmando-se o estágio
da vingança pública. No período republicano, perdeu a pena o seu caráter de
expiração, pois separou-se o Estado e o culto, prevalecendo então, o Talião e a
composição. Havia, para tanto, a possibilidade de se entregar um escravo para
padecer a pena no lugar do infrator, desde que houvesse a concordância da vítima –
o que não deixava de ser uma forma de composição, como bem lembra Pierangeli.
(2005, p. 58)
Ocorre que alguns filósofos e juristas ficaram incomodados com tais excessos e com o
caráter intimidador das penas, criando-se, assim, o Direito Penal como ciência.
Pode-se dizer que tal corrente foi enraizada pela obra do Marquês de Beccaria (Dos
Delitos e das Penas), tendo como principal premissa a proporcionalidade entre a pena aplicada
e a conduta praticada.
Na visão de Beccaria a medida dos delitos era:
Já notamos que a exata medida dos crimes é o prejuízo causado à sociedade. Eis
uma dessas verdades que, ainda que evidentes para o espírito menos anguto, porém
escondidas por um concurso singular de circunstancias, apenas são conhecidas de
um pequeno número de pensadores em todos os países e em todos os séculos. As
opiniões disseminadas pelos tiranos e as paixões dos déspotas abafaram as noções
simples e as ideias naturais que formaram sem dúvida a filosofia das sociedades
primitivas. Contudo, se a tirania oprimiu a natureza por uma ação insensível, ou por
impressões violentadas sobre os espíritos do vulgo, hoje, finalmente, as luzes de
nosso século desfazem os tenebrosos planos do despotismo, reconduzindo-nos aos
princípios da filosofia e indicando-no-los com mais certeza. Esperamos que a
perniciosa influência dos séculos passados não esteja perdida e que os princípios
naturais ressurjam entre os homens, apesar de todos os obstáculos que se lhes
opõem. A grandeza do crime não depende da intenção de quem o pratica, como
entenderam erroneamente alguns, pois a intenção do acusado depende das
impressões provocadas pelos objetos presentes e das disposições que vêm da alma.
Tais sentimentos variam em todos os homens e no próprio indivíduo, com a rápida
sucessão da ideias, das paixões e das circunstancias. Se a intenção fosse punida,
seria necessário ter não apenas um Código particular para cada cidadão, mas uma
26
nova lei para cada crime. Frequentemente, com a melhor das intenções, um cidadão
faz à sociedade os maiores males, enquanto um outro lhe presta imensos serviços
com a predestinação de causar mal. (2007, p. 70)
Nesse contexto, é possível dizer que a ideologia da intervenção mínima é resultado
da evolução dos ideais iluministas da primazia da razão e do antropocentrismo.
Com efeito, essa foi a explanação de Beccaria sobre a origem das penas e o direito de
punir:
A moral política não pode oferecer à sociedade nenhuma vantagem durável, se não
estiver baseada em sentimentos indelegáveis do coração do homem. Qualquer Lei
que não estiver fundada nessa base achará a ceder. Desse modo, a menor forca,
aplicada continuamente, destrói por fim um corpo de aparência sólida, pois lhe
imprimiu um movimento violento. Façamos uma consulta, portanto, ao coração
humano; encontraremos nele preceitos essências do direito de punir. Ninguém faz
graciosamente o sacrifício de uma parte de sua liberdade apenas visando ao bem
público. Tais fantasias existem apenas nos romances (2007, p. 18).
Sem dúvidas, o caráter social e humanitário dessa obra foi um marco para o Direito
Penal, porque aqui nasceu a escola Clássica.
A esse respeito:
É inequívoco que o processo de modernização do direito penal somente teve início
com o Iluminismo, a partir das contribuições de Bentham ( Inglaterra), Montesquieu
e Volteire (França), Hommel e Feuerbach (Alemanha), Beccaria, Filangieri e Pagano
(Itália). Houve preocupação com a racionalização na aplicação das penas,
combatendo-se o reinante arbítrio do judiciário. A inspiração contratualista voltava-
se ao banimento do terrorismo punitivo, uma vez que cada cidadão teria renunciado
a uma porção de liberdade para delegar ao Estado a tarefa de punir, nos limites da
necessária defesa social. A pena ganha um contorno de utilidade, destinada a
prevenir delitos e não simplesmente castigar. (NUCCI, 2005, p. 60)
Posteriormente, surgiu a escola Positivista, que preocupava-se com o criminoso e as
circunstâncias que o levaram ao crime. Podemos dizer que nasceu aqui o caráter preventivo
do Direito penal.
Doutra ponta, no Brasil, as Ordenações Filipinas (1603), baseadas, praticamente, nos
preceitos religiosos, confundia o crime com o pecado e com a ofensa moral.
Depois de dois séculos, no ano de 1830, quando foi proclamada a independência, Dom
Pedro I sancionou o Código Criminal do Império. Com a Republica, em 1890, foi editado o
Código Criminal da República.
Ocorre que, surgiram várias leis para emendá-lo, razão pela qual um novo Código
Penal foi editado em 1940.
27
Diversas foram as reformas que o Código Penal passou, tais como: Lei n. 7.210 de
1984, que regulou a execução da penas e das medidas de segurança; Lei n. 9.714 de 1998, que
no que concerne as penas restritivas de direito.
Nos dias hodiernos, a Constituição Federal adotou o princípio da humanidade das
penas, significando que o Estado, através da utilização das regras de Direito Penal, deve
pautar-se pela benevolência na aplicação da sanção penal, buscando o bem estar de todos na
comunidade, inclusive dos condenados, que não merecem ser excluídos somente porque
delinquiram, até porque uma das finalidades da pena é a ressocialização.
Ensina Rogério Greco:
Embora de difícil tradução, podemos construir um conceito de dignidade de pessoa
humana entendendo-a como uma qualidade irrenunciável e inalienável, que integra a
própria condição humana. É algo inerente ao ser humano, um valor que não pode ser
suprimido, em virtude da sua própria natureza. Até o homem mais vil, o homem
mais detestável, o criminoso mais frio e cruel, é portador desse valor. Podemos
adotar o conceito proposto por Ingo Wolfgang Sarlet, que procurou condensar
alguns dos pensamentos mais utilizados para definição do conceito de dignidade da
pessoa humana, dizendo ser ―a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano
que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres
fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho
degradante e desumano, como venham a lhe garantiras condições existenciais
mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação
ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão
com os demais seres humanos (2008, p. 8)
Determinou-se, então, que não haverá penas ―de morte, salvo em caso de guerra
declarada, nos termos do art. 84, X X‖, ―de caráter perpétuo‖, ―de trabalhos forcados‖, ―de
banimento‖, ―cruéis‖ (art. 5, X X).
Na realidade, a crueldade é o gênero do qual são espécies a pena de morte, de prisão
perpétua, de trabalhos forçados e banimento.
De toda a forma, a alínea ―e‖ do inciso X V (penas cruéis) deve ser entendida como
residual, isto é, quando a pena não estiver prevista nas alíneas anteriores, ainda assim
podendo-se caracterizar como cruel não deve ser assimilada pelo sistema penal.
Diz Pedro Lenza:
Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, sendo
que a lei considerará crime inafiançável a prática da tortura (art. 5, XLIII). A Lei n.
9455 de 1997 integrou a referida norma constitucional, definindo os crimes de
tortura. (2010, p.756).
Dessa forma, podemos observar que nas sociedades primitivas o Estado atuava em
demasia ao punir os delinquentes, pois os soberanos eram a lei.
28
Não obstante, tais medidas foram sendo abandonas com o decorrer do tempo, devido a
evolução da sociedade e do direito, até porque os legisladores e os operadores do direto
contam com princípios norteadores do poder punitivo Estatal, alguns desses princípios foram
brevemente citados no capítulo anterior.
2.2 Conceito e características do princípio da intervenção mínima
É importante destacar, desde logo, que os princípios do Direito Penal constituem a
face orientadora da aplicação das normas abstratamente previstas em lei aos casos concretos
emergentes dos conflitos sociais.
Logo, podemos dizer que princípio, no sentido jurídico, significa uma ordenação que
se irradia e imanta o sistema normativo, proporcionando alicerce para a interpretação,
integração, conhecimento e eficiente aplicação do direito positivo.
Existem princípios expressamente previstos em lei, enquanto outros estão implícitos
no sistema normativo. E, ainda, os que estão enumerados na Carta Magna, denominados de
princípios constitucionais (explícitos e implícitos). A intervenção mínima é um princípio
constitucional implícito.
O princípio da intervenção mínima é conhecido também como ―ultima ratio‖, isso
porque, segundo ele o Direito Penal só deve preocupar-se com a proteção dos bens mais
importantes, ou seja, o Direito Penal só pode ser invocado quando todos os outros meios que
protegeriam o bem tutelado forem insuficientes.
Assim leciona Rogério Greco:
O princípio da intervenção mínima, ou ultima ratio, é o responsável não só pela
indicação dos bens de maior relevo que merecem a especial atenção do Direito
Penal, mas se presta também, a fazer com que ocorra a chamada descriminalização.
Se é com base nesse princípio que os bens são selecionados pra permanecer sob a
tutela do Direito Penal, porque considerados como os de maior importância, também
será como fundamento nele que o legislador, atento ás mutações da sociedade, que
com sua evolução deixa de dar importância a bens que, no passado, eram da maior
relevância, fará retirar do nosso ordenamento jurídico penal certos tipos
incriminadores. (2008, p. 54)
Encontramos um julgado nesse sentido:
Ao direito se comete a função de preservar a existência mesma da sociedade,
indispensável à realização do homem como pessoa, seu valor supremo. Há de ser
mínimo e subsidiário. (STJ, REsp. 402419/RO, Rel. Min. Hamilton Cavalhido, 6 T.,
DJ 15/12/2003 p. 413)
29
A sanção penal estabelecida para cada delito deve ser aquela ―necessária e suficiente
para a reprovação e prevenção do crime‖ (na expressão acolhida pelo art. 59 do CP),
evitando-se o excesso punitivo, sobretudo com a utilização abusiva da pena privativa de
liberdade.
Vários princípios citados no capítulo anterior estão ligados com o princípio da
intervenção mínima, tais como, legalidade, humanidade, culpabilidade, adequação social e
fragmentalidade, todavia, os princípios da proporcionalidade e subsidiariedade merecem
maior relevância.
Assim destaca Nucci:
Proporcionalidade é o que se espera da harmônica aplicação dos princípios
constitucionais e das normas infraconstitucionais. Por isso, o princípio esparja-se por
todos os ramos do Direito, adquirindo especial relevo na esfera penal. Não teria
menor sentido, levando-se em conta a proteção subsidiária que o Direito Penal deve
assegurar aos conflitos sociais, sustentando-se na adequada posição de intervenção
mínima, prever penas exageradas para determinados delitos considerados de menor
importância, bem como estipular sanções ínfimas para aqueles que visam à proteção
de bens jurídicos considerados de vital relevo. (2005, p. 37)
No tocante ao princípio da subsidiariedade, o Direito Penal deve ser o último
instituto a ser utilizado para proteger os bens, é a ultima ratio. Se outros ramos jurídicos
forem suficientes, deverão ser utilizados, os danos culposos não são abrangidos pelo penal.
Ex. Dano de veículo ocasionado culposamente, será resolvido na esfera cível.
Destarte, ao elaborar tipos penais incriminadores deve o legislador inspirar-se na
proporcionalidade, sob pena de incidir em erros, com arranhões inevitáveis a preceitos
constitucionais, tais como o princípio da intervenção mínima.
Como se sabe, no Estado Democrático de Direito, o povo é detentor da titularidade da
soberania. Dessa forma, é possível afirmar que o Direito Penal exerce um poder secundário,
subsidiário, pois é o povo que aliena a parcela necessária para que o poder do Estado se
constitua.
Portanto, o princípio da intervenção mínima quer dizer que o Direito Penal não deve
interferir em demasia na vida do indivíduo, retirando-lhe autonomia e liberdade. Afinal, a lei
penal não deve ser observada como primeira opção (prima ratio) do legislador para compor
os conflitos existentes em sociedade e que, pelo atual estágio de desenvolvimento moral e
ético da sociedade, sempre estarão presentes.
Nesse sentido leciona o professor Damásio E. de Jesus:
30
Procurando restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a
definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas e
cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só
devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros ramos
do Direito não conseguirem prevenir a conduta ilícita.‖ (2003, p.10).
Dessa forma, segundo ele o Estado não deve recorrer de plano às duras sanções
impostas pelo Direito Penal.
Segundo Capez:
Estatui que o Direito Penal só deve intervir em último caso, ou seja, quando os
demais ramos do ordenamento se revelarem insuficientes para a solução do conflito.
Desse modo, o estudante que tenta sair da biblioteca pública com uma revista
debaixo do braço, ou o empregado que mexe nas coisas do patrão, realizam condutas
cuja lesividade não chega a reclamar a imposição de uma repressão criminal,
podendo ser exemplarmente punidas no campo cível, trabalhista ou administrativo.
Se a sociedade consegue a maior parte de seus conflitos sem a interferência do
direito penal, qual seria a razão para emprega-los nesses casos? Ficará reservado
como ultima ratio, devendo ser convocado apenas para situações de real gravidade.‖
(2004, p. 125/126)
Com efeito, só haverá Direito Penal naqueles raros episódios típicos em que a lei
descrever um fato como crime; ao contrário, quando ela nada disser, não haverá espaço para
uma atuação criminal.
Nesse contexto, é importante enfatizar que o princípio abordado possui dois
destinatários principais, são eles: o legislador e o operador do direito.
Ao legislador o princípio exige cautela no momento de eleger as condutas que
merecerão punição criminal, abstendo-se de incriminar qualquer comportamento. Somente
aqueles que, segundo comprovada experiência anterior, não puderam ser convenientemente
contidos pela aplicação de outros ramos do direito deverão ser catalogados como crimes em
modelos descritivos legais.
Ao operador do direito, recomenda-se não proceder ao enquadramento típico quando
notar que aquela pendência pode ser satisfatoriamente resolvida com a atuação de outros
ramos menos agressivos do ordenamento jurídico.
Sem dúvidas, o operador do direito deve estar ligado às mutações da sociedade, que
com sua evolução deixa de dar importância a bens que, no passado, eram da maior relevância,
fazendo retirar do ordenamento jurídico-penal certos tipos incriminadores.
Podemos utilizar como exemplo o furto de um chocolate em um supermercado já
solucionado com o pagamento do débito e a expulsão do inconveniente freguês, não há
31
necessidade de movimentar a máquina persecutória do Estado, tão assoberbada com a
criminalidade violenta, o crime organizado, o narcotráfico, etc.
Segundo Mirabete:
O crime não se distingue das infrações extrapenais de forma qualitativa, mas apenas
quantitativamente. Como a intervenção do Direito Penal é requisitada por uma
necessidade mais elevada da proteção à coletividade, o delito deve consubstanciar
em um injusto mais grave e revelar uma culpabilidade mais elevada; deve ser uma
infração que merece a sanção penal. O desvalor do resultado, o desvalor da ação e a
reprovabilidade da atitude interna do autor é que convertem o fato em um ―exemplo
insuportável‖, que seria um mal precedente se o Estado não o reprimisse mediante a
ação penal. Isso significa que a pena deve ser reservada para os casos em que
constituam único meio de proteção suficiente da ordem social frente aos ataques
relevantes. (2001, p 104,)
Nesse ponto, segundo esses autores a história nos tem demonstrado que a violência e
a prisão não são a solução para os problemas de insegurança na sociedade, para a
criminalidade.
Segundo esse princípio a sanção penal não deve ser considerada mais como solução
de todos os conflitos sociais, pois é incontestável que o endurecimento da pena não
representa, assim como o aumento de leis penais, uma melhora ou diminuição da
criminalidade.
Temos como principal exemplo o nosso país, pela infinidade de leis, não obstante a
criminalidade só aumenta.
Alguns juristas afirmam que falta a elaboração de mecanismos de políticas públicas
para que tais leis sejam aplicadas de maneira coerente, buscando sempre o ponto de vista do
direito penal mínimo, que não condiz com a severidade das penas.
Assim nos ensina Nucci:
Caso o bem jurídico possa ser protegido de outro modo, deve-se abrir mão da opção
legislativa penal, justamente para não banalizar a punição, tornando-a, por vezes,
ineficaz, por não cumprida pelos destinatários da norma e não aplicada pelos órgãos
estatais encarregados da segurança pública. Podemos anotar que a vulgarização do
direito penal, como norma solucionadora de qualquer conflito, pode levar seu
descrédito (2010, p. 47)
O Direito Penal deve conseguir a tutela da paz social obtendo o respeito à lei e aos
direitos dos demais, mas sem prejudicar a dignidade, o livre desenvolvimento da
personalidade ou a igualdade e restringindo ao mínimo a liberdade.
Nesse ponto, ensina Fabrine:
Apenas a condutas deletérias da espinha dorsal axiológica do sistema global
histórico cultural da sociedade devem ser tipificadas e reprimidas. Não se devem
incriminar os fatos em que a conduta não implique risco completo ou lesão a
32
nenhum dos bens jurídicos reconhecidos pela ordem normativa constitucional. O
ordenamento positivo, pois, deve ter como expcional a previsão de sanções penais e
não se apresentar como um instrumento de satisfação contingentes e particulares,
muitas vezes servindo a interesses políticos do momento para aplacar o clamor
público exacerbado pela propaganda. (2011, p. 104).
Elaboramos pesquisas na jurisprudência recente de nossos Tribunais, e verificamos
que o princípio da intervenção mínima vem sendo bastante utilizado, em consonância com os
princípios que lhe são decorrentes.
Isso pode ser comprovado a partir da leitura do acórdão proferido pelo Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul.
Senão vejamos:
Denúncia. Delito do art. 243 da lei 8.069/90 (oferecimento de bebida alcoólica).
Rejeição. Mantida. Considerando os princípios da intervenção mínima do direito
penal e da adequação social, mantém-se a rejeição da denúncia que imputou a um
jovem de 19 anos de idade o crime do art. 243 da Lei 8.069/90, porque teria
oferecido a outro jovem, este com 15 anos de idade, uma lata de cerveja, quando
ambos se encontravam no interior de um clube social. DECISÃO: Apelo ministerial
desprovido. Unânime. (TJRS - AC 70019592260 - 7ª C. Cr. - Rel. Sylvio Baptista
Neto - J. 09.08.2007).
Nesse caso, o Direito Penal deve ser visto como subsidiário aos demais ramos do
direito.
Também já entendeu o Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. PENAL. FURTO. COMPORTAMENTO SOCIALMENTE
REPROVÁVEL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. 1.
A missão do Direito Penal moderno consiste em tutelar os bens jurídicos mais
relevantes. Em decorrência disso, a intervenção penal deve ter o caráter
fragmentário, protegendo apenas os bens jurídicos mais importantes e em casos de
lesões de maior gravidade. 2. O princípio da insignificância considera necessária, na
aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de uma mínima
ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzido
grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica
provocada (precedentes HC 84.412, STF, Rel. Min. Celso de Mello). 3. Se parece
claro que o furto de uns "poucos litros de água potável" não ensejaria o acionamento
da máquina jurídico-penal do Estado, pela inexpressividade da lesão jurídica
provocada, por outra volta, não se deve olvidar que tal conduta se mostra bastante
reprovável, sob o ponto de vista de sua repercussão social. Inaceitável a
complacência do Estado para com aqueles que, em condições de arcar com as
respectivas contraprestações, venham a usufruir irregularmente e de forma gratuita
de bens e serviços públicos, em detrimento da grande maioria da população. 4.
Recurso parcialmente conhecido e provido. (STJ - RESP 406986 - MG - 6ª T. - Rel.
Min. Hélio Quaglia Barbosa - DJU 17.12.2004).
O caso acima demonstra claramente o caráter subsidiário do direito penal, porquanto
ele busca tutelar apenas os bens jurídicos mais relevantes.
33
2.3 O princípio da intervenção mínima na América Latina e no direito penal brasileiro
Em nosso contexto latino-americano, apresenta-se um argumento de reforço em favor
da mínima intervenção do sistema penal.
É possível afirmar que toda a América está sofrendo as consequências de uma
agressão aos direitos humanos, que afeta o nosso direito ao pleno desenvolvimento, que se
encontra consagrado no art. 22 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A Organização dos Estados Americanos reconhece através da jurisprudência
internacional da Comissão dos Direitos Humanos, que declara ter sido violado direito ao
desenvolvimento em El Salvador no Haiti.
Nesse ponto, se a intervenção do sistema penal é, efetivamente, violenta, e sua
intervenção pouco apresenta racional e resulta ainda mais violenta, o sistema penal nada mais
faria que acrescentar violência àquela que, perigosamente, já produz o injusto que
continuamente somos submetidos.
Com isso, o Direito Penal deve, sem dúvidas, corresponder ao princípio da intervenção
mínima na América Latina, não somente pelas razões que se apresentam como válidas nos
países centrais, mas também em face de nossas características periféricos, que sofrem os
efeitos da agressão aos Direitos Humanos de violação do direito do desenvolvimento.
Mais precisamente, no Brasil, o princípio da intervenção mínima tem sido aplicado
com grande frequência pelo Supremo Tribunal Federal.
Senão vejamos:
EMENTA: Habeas Corpus. Descaminho. Imposto não pago na importação de
mercadorias. Irrelevância administrativa da conduta. Parâmetro: art. 20 da Lei
nº 10.522/02. Incidência do princípio da insignificância. Atipicidade da conduta.
Ordem concedida. A importação de mercadoria, iludindo o pagamento do imposto
em valor inferior ao definido no art. 20 da Lei nº 10.522/02, consubstancia conduta
atípica, dada a incidência do princípio da insignificância. O montante de impostos
supostamente devido pelo paciente (R$ 189,06) é inferior ao mínimo legalmente
estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia a referência a outros
débitos congêneres em seu desfavor. Ausência, na hipótese, de justa causa para a
ação penal, pois uma conduta administrativamente irrelevante não pode ter
relevância criminal . Princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da
necessidade e da intervenção mínima que regem o Direito Penal. Inexistência de
lesão ao bem jurídico penalmente tutelado. Precedentes. Ordem concedida para o
trancamento da ação penal de origem. (STF/HC 96376 / PR Julgamento em
31/08/2010)
E mais:
Princípio da insignificância — Identificação dos vetores cuja presença legitima o
reconhecimento desse postulado de política criminal — Conseqüente
descaracterização da tipicidade penal em seu aspecto material — Delito de furto
34
simples, em sua modalidade tentada — Res furtiva no valor (ínfimo) de R$ 20,00
(equivalente a 5,26% do salário mínimo atualmente em vigor) — Doutrina —
Considerações em torno da jurisprudência do STF — Pedido deferido. O princípio
da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade
penal. O princípio da insignificância — que deve ser analisado em conexão com os
postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima> do Estado em matéria
penal — tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada
na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado — que considera
necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos
vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma
periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do
comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada — apoiou-se,
em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter
subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por
ele visados, a do Poder Público. O postulado da insignificância e a função do direito
penal: de minimis, non curat praetor. O sistema jurídico há de considerar a
relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos
do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria
proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam
essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se
exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O
direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor
— por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes — não
represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico
tutelado, seja à integridade da própria ordem social." (HC 92.463, Rel. Min. Celso de
Mello, julgamento em 16-10-07, DJ de 31-10-07). No mesmo sentido: HC 93.288,
Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 11-3-08, DJE de 24-10-08.
Sem dúvidas, essas decisões deveriam ser usadas com mais frequência, a fim de
modificar a estereotipada visão de que o sistema carcerário brasileiro é considerado como um
dos piores do mundo.
Nesse caso não foi aplicado o princípio da intervenção mínima:
VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL - Fitas de vídeo falsificadas, destinadas à
locação - Absolvição - Impossibilidade - Delito configurado - Condenação mantida -
A locação de fitas de videocassete, reproduzidas sem a necessária autorização da
entidade competente, caracteriza o delito de violação de direito autoral, enquadrável
na figura do § 2º do artigo 184 do Código Penal, não aproveitando ao agente a
alegação de desconhecimento da falsificação, se atuava na condição de proprietário
de uma videolocadora, sendo, portanto, responsável pela aquisição dos produtos
comercializados pelo estabelecimento - Princípio da intervenção mínima ou "ultima
ratio" - Inaplicabilidade ao caso concreto - A "pirataria" prejudica não só os direitos
dos artistas e autores, mas toda a indústria e o comércio legal, aumentando ainda
mais o desemprego, reduzindo o recolhimento de tributos, além de macular a
imagem do Brasil no exterior, em detrimento, pois, de toda a sociedade, devendo,
então, ser reprimida também penalmente - Suspensão condicional do processo -
Descabimento na fase recursal - Tendo sido criado para evitar transtornos de um
processo criminal, já estando o processo findo e a sentença proferida, não há mais
razão lógica ou jurídica para a aplicação do "sursis" processual - Prestação
pecuniária - Proximidade do mínimo previsto para a espécie, não havendo que se
falar em demasia - Manutenção - Recurso conhecido e desprovido. (Apelação
Criminal n. 1.0223.99.030270-3/001 - Comarca de Divinópolis - Relator: DES.
GUDESTEU BIBER - Data do Julgamento: 16/08/2005).
Como já dito, o Brasil vive um dilema entre duas ideologias penais. De um lado o
direito penal máximo. Por outro lado, a ideologia da intervenção mínima.
35
Com efeito, com a lei 9099/95, tentou-se consagrar no Brasil o discurso da
intervenção mínima, ela proporcionou a suspensão condicional do processo e a exigência da
representação em alguns tipos delitivos, além da transação para delitos de pequeno potencial
ofensivo, demonstrando grande intenção de descriminalização.
Quando foi remetido aos Juizados Especiais todos os crimes de menor potencial
ofensivo, e a pena máxima não fosse superior a um ano de prisão, incluiu as contravenções,
além de condicionar a persecução das lesões leves, culposas ou dolosas, à representação do
ofendido.
Pode-se dizer que os Tribunais brasileiros vem temperando os rigores das leis penais
com soluções consentâneas com a moderna política penal.
Apesar de ter melhorado, é claro que a legislação penal brasileira necessita ser
revista, todavia, não para se criar novas figuras penais, despenalizar condutas, aumentar ou
reduzir drasticamente as penas.
Nota-se também, como nos julgados acima, que o princípio da insignificância está
umbilicalmente ligado ao princípio da intervenção mínima, pois para a aplicação de ambos é
necessária a presença de uma mínima ofensividade da reprovabilidade do comportamento e
inexpressividade da conduta lesão jurídica.
Leciona Nucci:
Com relação à insignificância (crime de bagatela), sustenta-se que o direito penal,
diante de seu caráter subsidiário, funcionando como ultima ratio, no sistema
punitivo, não se deve ocupar de bagatelas. (2008, p. 216)
O próximo capítulo abordará de forma abrangente o princípio da insignificância e
sua importância no tocante a exclusão de lesões ínfimas.
36
III PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
Não há dúvidas que o princípio da insignificância está intimamente relacionado com
o princípio da intervenção mínima, pois, as condutas mínimas devem ser redigidas pelo
princípio da insignificância, que encontra fundamento no princípio da intervenção mínima.
São penalmente irrelevantes os fatos que provoquem lesões insignificantes aos bens
jurídicos. É excludente supralegal de tipicidade, demonstrando que lesões ínfimas ao bem
jurídico tutelado não são suficientes para, romper o caráter subsidiário do Direito Penal,
tipificar a conduta.
É um princípio decorrente da lesividade, lesões insignificantes, mínimas, pequenas
deverão ser desconsideradas, não caracterizando crime e gerando atipicidade do fato.
Hoje esse é um princípio muito amplo, não se restringe mais a crimes patrimoniais
como anteriormente, portanto não é só para os furtos de um, dois, três reais, obviamente que
esses casos são os de maiores incidências, contudo, se abre para muitos crimes como crime
contra a honra, crimes militares, crimes contra administração pública, algumas lesões
corporais e inclusive para os crimes tributários.
Não obstante, para as seguintes hipóteses em que de acordo com o STF não se aplica
a insignificância.
Não tem insignificância em crime com violência ou grave ameaça à pessoa (roubo),
Também não cabe no crime de tráfico de drogas (art. 33, lei 11.343/06), deve ficar
salientado que não cabe insignificância para o crime de tráfico de drogas, existem algumas
decisões em que o porte de droga para uso pode ser considerado como insignificante, mas se a
pessoa for pega vendendo apenas um comprimido de êxtase em uma festa, aqui não caberia
insignificância, pois a conduta vender é um dos verbos do art. 33, da Lei 11.343/06.
Crime de falsificação de moeda (art. 289, CP), da mesma forma não tem
insignificância no que tange ao valor falsificado, por exemplo, uma pessoa que falsifica uma
nota de dois reais deverá ser punido. O STF diz esse não é crime patrimonial, ou seja, a
preocupação não é com o valor, e sim com a com a confiança que se tem na moeda circulante
no país, pois um real falso que circula já pode gerar temor na população.
Vale lembrar que falsificações grosseiras não caracterizam o crime, porem não se
aplica a insignificância e o fato será considerado atípico em razão de crime impossível.
37
Apesar de existirem alguns parâmetros para aplicação da insignificância, existe uma
exceção na qual vai se verificar o caso concreto, em crimes tributários (Lei 8.137) o STF
trabalha com critério objetivo, considerando insignificantes lesões de até 20 mil reais, com
base nos parâmetros definidos na lei de execução fiscal para cobrança de dívida.
Vale salientar que esse valor anteriormente estava no montante de R$ 10 mil , porém,
com a previsão dos arts. 1º, I, e 2º, da Portaria nº 75, de 22 de março de 2012, passou para R$
20 mil.
Frisa-se, ainda, que a evolução histórica da quantia adotada pelo STF como requisito
para seu reconhecimento, comparam-se os valores tomados como base para a aplicação do
princípio da insignificância a crimes contra o patrimônio e enfatiza-se o papel do Direito
Penal, ainda mais quando analisado em sua vertente de Direito Penal Tributário.
Dessa forma, se no âmbito tributário não se cobra divida de 20 mil, porque não vale a
pena, imagine no direito penal.
O princípio da insignificância gera atipicidade do fato, em razão da ausência de
tipicidade material, de acordo com o STF.
O STF diz que para que seja típico para o direito penal ele tem que ter tipicidade
formal, que é o próprio artigo de lei, somado a tipicidade material é a lesão concreta ao bem
jurídico (principio da lesividade). Consequentemente, uma lesão que seja insignificante, por
mais que seja lesão a bem alheio, não será suficiente para geral tipicidade material, e sem
atipicidade material o fato se torna atípico para o Direito Penal.
3.1 A origem do princípio da insignificância
Não é possível dizer com certeza a origem do princípio da insignificância, há
controvérsias sobre esse tema.
Alguns autores afirmam que ele nasceu no direito romano, eles sustentam que o
brocardo “mínima non curat praetor, de minimis non curar praetor ou de minimis praetor
non curat”, já tinha um caráter de insignificância, pois segundo o brocardo o pretor não cuida
de coisas pequenas/mínimas, delitos de bagatelas. Diomar Ackel Filho é um dos autores que
sustentam essa origem.
Os pretores tinham como principal função administrar a justiça, seus cargos eram
vitalícios, estabeleciam as audiências do fórum.
38
Carlos Vico Mañas compartilha tal entendimento:
pode-se afirmar que o princípio já vigorava no direito romano, pois o pretor, em
regra geral, não se ocupava de causas ou delitos insignificantes, seguindo a máxima
contida no brocardo minimis non curat pretor. (1994, p. 56)
Por sua vez, existem outros entendimentos, nos quais no direito romano naquela
época o conhecimento acerca da legalidade penal era muito pequeno, e que o brocardo citado
acima era apenas uma máxima, sendo o Direito Romano alicerçado pelo Direito Privado. O
principal autor que sustenta essa tese é Mauricio Antonio Ribeiro Lopes.
Ensina Lopes:
Não se pode desvincular o princípio da insignificância do princípio da legalidade
[...]. A insignificância não é exceção à legalidade, mas princípio complementar
densificador de seu conteúdo material. Onde não se valoriza a legalidade, qual será o
papel da insignificância? Ao contrário de grande parte da doutrina, menos atenta a
esse aspecto, entendo que o que justifica modernamente o princípio da
insignificância e sua aceitação no Direito Penal não é seu caráter opositor ao direito
positivo, qual fosse uma solução extrajurídica para problemas aplicativos daquela
modalidade descritiva de direito,mas a sua natureza intrínseca à normatividade
jurídica.
O princípio da insignificância, conquanto possa ser extralegal, não é extrajurídico,
tampouco contrajurídico. É um princípio sistêmico, decorrente da própria natureza
fragmentária do Direito Penal. Para dar coesão ao sistema penal é que se o fez.
Sendo, pois, princípio específico do Direito Penal, não consigo relaciona-lo com a
(paradoxalmente) máxima minimis non curat praetor, que serve como referência,
mas não como via de reconhecimento do princípio. (2000, p. 41-42)
Como dito acima, há uma grande controvérsia sobre o assunto, tanto é que Guzmám
Dalbora consignava que o Direito Romano até tinha uma rasa ideia sobre o principio da
insignificância, não obstante, esse conhecimento não se relaciona com a atual conjectura da
insignificância.
Este autor chega afirmar, até mesmo, que os juristas romanos não tinham
conhecimento da máxima ―mínima non curat praetor”, e que este adágio tem melhor
enquadramento no pensamento liberal dos humanistas.
Neste sentido, é o magistério de Dalbora :
Parece-nos, com efeito, que o adágio mínima non curat praetor tem que haver
surgido com muita maior probabilidade entre os humanistas que o que é lícito supor
a propósito dos juristas da Recepção. (...) Desta sorte, que os humanistas
construíram o apotegma mínima non curat praetor, que, conforme restou explicado,
tem um sentido eminentemente liberal e refratário a qualquer imposição autoritária,
não parece – dentro, por suposto, das possibilidades de uma conjectura –
hipoteticamente infundado (1996, p. 62-65)
Antes mesmo de adentrar nas características e no conceito do princípio da
insignificância, é notório que ele está intimamente ligado com o princípio da legalidade, até
39
porque, alguns autores consagrados salientam que a insignificância só veio surgir com o
advento do Iluminismo, ou seja, período em que a legalidade teve seu auge.
Com efeito, assim consigna Cássio Vinicius D. C. V. Lazzari Prestes:
Também se afirma que teve sua origem, juntamente com o princípio da legalidade,
durante o Iluminismo, como forma de limitação do poder absolutista do Estado. A
Declaração Universal da dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em seu
artigo 5°., implicitamente, faz referência ao princípio insignificância, revelando que
a lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade, o que cria um caráter seletivo
para o Direito Penal e o desprezo às ações insignificantes. (2003, p. 36)
Em harmonia com o art. 5°. da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do
Cidadão de 1789, o art. 8°, da mesma Declaração, diz que é preciso de uma verdadeira lesão
ao bem jurídico tutelado para que haja interferência do Direito Penal.
Senão vejamos:
Artigo 8° - A Lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias,
e ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada
antes do delito e legalmente aplicada.
Nota-se, claramente, que esse dispositivo evidenciou os princípios da intervenção
mínima, legalidade, anterioridade da lei penal e da fragmentariedade. E como é sabido, o
princípio da insignificância está implicitamente ligado a eles.
É incontestável que Beccaria teve grande relevância na construção na construção do
princípio da legalidade, e por consequência no princípio da insignificância, ensina Lopes:
Dentro desse panorama merece destaque específico Beccaria, com seu opúsculo Dei
delitti e delle pene. Ali, com extremo vigor, concluía que ―apenas as leis podem
indicar as penas de cada delito e que o direito de estabelecer leis penais não pode ser
senão da pessoa do legislador, que representa toda a sociedade ligada por um
contrato social. Adiante, quando fala da medida dos delitos, Beccaria expressa que
―a exata medida do crime é o prejuízo causado à sociedade. Aí está uma dessas
verdades que, ainda que evidentes para o espírito menos arguto, porém escondidas
por um concurso singular de circunstâncias, apenas são conhecidas de um pequeno
número de pensadores em todos os países e em todos os séculos. (2000, p. 41).
Temos, ainda, uma terceira corrente, que sustenta que o princípio abordado só veio
surgir no período pós guerra, ou seja, após a primeira metade do século XX. Isso porque,
segundo esses autores, com a iminência da guerra houve grande escassez de alimentos e
mantimentos, o que motivava a população (faminta e destruída) praticar pequenos furtos a fim
de saciar a fome. Dessa forma, esses pequenos delitos foram denominados como crimes de
bagatela (Bagatelledelikte).
40
É possível dizer que os delitos de pequena monta tiveram maior incidência nessa
época, contudo, é certo que o princípio da insignificância está umbilicalmente ligado ao
princípio da legalidade, portanto, também pode ter nascido com as ideias liberais dos filósofos
iluministas.
Não podemos deixar de relatar que a formulação teórica do princípio estudado pode
estar ligado à possibilidade de restringir o alcance da tipicidade que pregava Claus Roxin em
1964.
O ponto inicial, utilizado por Roxin, foi o crime de constrangimento ilegal. Mais
tarde, com suporte na fragmentariedade e subsidiariedade do Direito Penal, defendeu-se a
ampliação do princípio da insignificância para afastar a tipicidade de outras condutas, tais
como o furto.
Ivan Luiz da Silva leciona sobre o tema:
O recente aspecto histórico do Princípio da Insignificância é, inafastavelmente,
devido a Claus Roxin, que, no ano de 1964, o formulou com base de validez geral
para determinação geral do injusto, a partir de considerações sobre a máxima latina
minima non curat praetor.Conquanto a formulação atual do Princípio em debate
tenha sido realizada por Roxin, encontramos vestígios dele na obra de Franz von
Liszt, que, em 1903, ao discorrer sobre a hipertrofia da legislação penal, afirmava
que a legislação de seu tempo fazia uso excessivo da pena e, ao final, indaga se não
seria oportuno restaurar a antiga máxima latina minima non curat praetor.(...) Assim,
não obstante a formulação contemporânea do Princípio da Insignificância, não há
como se ocultar que sua origem se encontra no antigo brocardo romanístico minima
non curat praetor, ou de minimis praetor non curat, como aparece mencionado em
numerosos autores que desde o século XIX o invocam a pedem sua restauração:
Carrara, von Liszt, Quintiliano Saldaña, Claus Roxin, Baumann, Zaffaroni, dentre
outros. (2006. p. 87)
Nos dias hodiernos, não há dúvidas que o princípio da insignificância está sendo
amplamente estudado e tem grande importância para o Direito Penal, pois com o crescimento
descontrolado da violência, possibilitando ao magistrado um veredito mais coerente com o
sistema constitucional e democrático do que com a letra fria da lei.
3.2 Conceito, critérios e aplicação do princípio da insignificância
Como já mencionado no capítulo acima, princípio tem a ideia de começo, momento
em que determinada coisa teve origem.
41
Nesse ponto vale mencionar, que o princípio da insignificância não tem previsão
legal no direito brasileiro, sendo considerado, todavia, princípio auxiliar de determinação da
tipicidade, sob a ótica da objetividade jurídica.
Nota-se, de antemão, que a insignificância está relacionada com outros princípios do
direito. Dessa forma, faremos um breve comentário sobre esses princípios, dado a importância
de cada um na estruturação do princípio da insignificância.
Por se tratar de ciência de natureza social e lidar com seres humanos, não cabe ao
direito adotar critérios rígidos e absolutos. Logo, o operador do direito deve aplicar o razoável
a cada caso concreto.
Daí surge um dos princípios que solidificam a insignificância, qual seja, o princípio
da razoabilidade.
Outro princípio que serve de base para a bagatela é o princípio da igualdade, pois
para não se desvirtuar o sentido da norma penal, e consequentemente conduzir a graves
injustiças, a equidade deve ser utilizada pelo seu caráter de justiça social.
Nesse contexto, é possível afirmar que a ligação entre a equidade e a insignificância,
é uma das bases de sustentação da bagatela como força excludente de crime.
Para Moraes (2006, p. 31) ―estão proibidas as diferenças arbitrais, as discriminações
absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida que se desigualam, é
exigência do pr prio conceito de Justiça‖.
Algumas vezes a sanção penal, mesmo aplicada no menor grau, torna-se, em
verdade, mais grave que o grau de reprovabilidade da conduta do agente. Surge, nesse caso, o
tratamento desigual do indivíduo, motivo pelo qual há necessidade de mecanismos para
excluir a tipicidade, qual seja, princípio da insignificância.
Por sua vez, o princípio da subsidiariedade também dá sustento ao objeto de estudo
nesse capítulo, pois o Direito Penal deve ser o último instituto a ser utilizado para proteger os
bens, é a ultima ratio.
No tocante a fragmentariedade, só os bens jurídicos mais importantes devem ser
protegidos pelo Direito Penal, ou seja, apenas os ataques mais intoleráveis são punidos, daí
que surge a aplicação da insignificância.
Outro princípio que se correlaciona com a insignificância é o da adequação social,
pois destina-se para orientar o legislador na escolha de condutas a serem proibidas ou
impostas, bem como na revogação de tipos penais.
E por fim, o princípio da proporcionalidade que tem como premissa evitar
intervenções desnecessárias e excessivas.
42
Logo, o princípio da proporcionalidade serve como fundamento ao da
insignificância, porque este concretiza a proporcionalidade existente entre o fato delituoso e a
reação do Estado, visando realizar a justiça em seu sentido material.
Em tempo, podemos citar outros princípios que também se relacionam com a
insignificância, quais sejam, princípio da dignidade da pessoa humana, princípio da legalidade
e princípio da ofensividade.
Após breve análise dos princípios fundamentadores, passaremos a discorrer sobre o
princípio da insignificância propriamente dito.
O princípio da insignificância não presume a completa anuência social da ação, mas
apenas uma consonante tolerância dessa conduta por sua insuficiência de graveza.
Ensina Capez:
Klaus Tiedemann chamou-o de princípio da bagatela, excluindo o juízo de tipicidade
condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal, mas
não apresentar relevância material no concreto. Nessas circunstâncias, pode-se
afastar liminarmente a tipicidade penal, porque na verdade o bem jurídico não
chegou a ser lesado. Na verdade, o princípio da bagatela no direito brasileiro,
consoante lembra Paganella Boschi, sendo considerado, contudo, princípio auxiliar
de determinação da tipicidade, sob a ótica da objetividade jurídica. Funda-se no
brocardo minimis non curat praetor e na conveniência da política criminal. Se a
finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico quando a lesão, de tão
insignificante, torna-se imperceptível, não será possível proceder a seu
enquadramento típico, por absoluta falta de correspondência entre o fato narrado na
lei e o comportamento iníquo realizado. É que no tipo somente estão descritos os
comportamentos capazes de ofender o interesse tutelado pela norma. Por essa razão,
os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos. A tipicidade penal
está a reclamar ofensa de certa gravidade exercida sobre os bens jurídicos, pois nem
sempre ofensa mínima a um bem ou interesse juridicamente protegido é capaz de se
incluir no requerimento reclamado pela tipicidade penal, o qual exige ofensa de
alguma magnitude a esse mesmo bem jurídico. O Superior Tribunal de Justiça, por
intermédio de sua 5º Turma, tem reconhecido a tese da exclusão da tipicidade nos
chamados delitos de bagatela, aos quais se aplica o princípio da insignificância, dado
que à lei não cabe preocupar-se com infrações de pouca monta, insuscetíveis de
causar o mais ínfimo dano à coletividade. (2004, p. 121/122).
Como observa Damásio de Jesus, ―esse princípio tem sido adotado pela nossa
jurisprudência nos casos de furto de material insignificante, lesão insignificante ao fisco,
maus tratos de importância mínima, descaminho e dano de pequena monta, lesão corporal de
pequena singeleza etc‖. (2011. p. 10).
O crime de bagatela serve como um norte de interpretação aos aplicadores do direito,
ou seja, atua como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal para evitar situações
dispares.
Observa-se, portanto, que o princípio da insignificância sustenta que o Direito Penal
não pode preocupar-se com ninharias, da mesma forma que não podem ser admitidos tipos
43
incriminadores que descrevam condutas totalmente inofensivas ou incapazes de lesar o bem
jurídico.
Lopes discorre sobre o assunto:
O princípio da bagatela surge como recurso teleológico para integração semântica e
política do direito penal e não para ser utilizado como substrato vago, de ânimo de
ocasião, acarretando, daí, tão-só imprecisão, a incerteza denotativa e, por fim, a total
imprevisibilidade da reação estatal a condutas legalmente típicas (1994, p. 102).
Após conceituarmos o princípio, importante demonstrarmos alguns critérios
necessários para a sua aplicação.
Segundo Nucci existem três critérios para aplicação da insignificância:
Há três regras, que devem ser seguidas, para a aplicação do princípio da
insignificância. 1) o bem jurídico afetado não pode ser de grande valor para a vítima;
2) não pode excessiva quantidade de um produto unilateralmente considerando
insignificante; 3) não pode envolver crimes contra a administração pública, de modo
a afetar a moralidade administrativa. (2010, p. 216)
Dentre as regras destacadas por Nucci, entendemos que a de maior relevância é a de
que o bem jurídico afetado não pode ser de grande valor para a vítima. Isso porque, para
algumas pessoas certos bens podem ser insignificantes, contudo, para outras ele poder ter
valor significante, tanto materialmente quanto sentimentalmente.
Um exemplo que pode ser citado é de uma pessoa que furta uma cesta básica da rede
de Supermercados Pão de Açúcar, para essa grande empresa o furto de tais produtos
certamente são insignificantes, por outro lado, se o furto da cesta básica ocorre na casa de um
homem que vive com um salário mínimo por mês e tem 6 filhos menores de idade, certo é que
esses produtos farão falta ao decorrer do mês, ou seja, aqui a cesta básica teria significância.
Nesse ponto:
Furto simples. Subtração de sessenta reais, em espécie. Rejeição da tese de
atipicidade (bagatela). Numerário de utilidade e significância à vítima. Conduta
típica. Privilégio reconhecido, com redução pontual das penas, substituição da
privativa de liberdade por restritiva de direitos e estipulação do regime inicial aberto.
Condenação mantida‖. (TJSP. Apelação Criminal com Revisão 990081158795.
Relator(a): André Carlos de Oliveira. Comarca: Araraquara. Órgão julgador: 8ª
Câmara de Direito Criminal D. Data do julgamento: 13/03/2009.)
Foi decidido ainda:
Nos delitos patrimoniais, os objetos subtraídos portam valores relativos, pelo que
não se pode inferir da inexistência do crime pela irrelevância do objeto, sem se
cotejar o valor da res com as condições econômicas de cada vítima. O que se mostra
desprezível para alguns pode vir a ter importância transcendental para outros‖
(tratando do futo de uma galinha, de quem tinha apenas um galo, duas galinhas e
poucos frangos) (TACRIM/SP, RJDTACRIM 4/99).
44
No tocante a excessiva quantidade de um produto unilateralmente considerado
insignificante:
A quantidade de mercadoria apreendida em poder do acusado (cerca de 4.000 maços
de cigarros de fabricação nacional, destinados a exportação) não autoriza, in casu, a
aplicação do princípio da insignificania. (REsp. 193.367- RO, 5ª T. rel. José Arnaldo
da Fonseca, v.u., 20.05.1999, DJ21.06.1999, p.191)
No que se refere ao crime contra a administração pública:
Não se aplica o chamado ―princípio da insignificância‖ quando a hip tese engloba
crimes contra a administração pública em razão da efetiva ofensa ao bem
juridicamente tutelado. A aferição da insignificância é matéria afeta ao juízo da
intrução e não do habeas corpus. Óbice da Súmula. RHC 8.357-GO 5ª t. rel. Edson
Vidigal, 15.04.1999, v.u, DJ 25.10. 1999, p.99)
Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o princípio da insignificância
só deve ser aplicado quando balizado pelos seguintes vetores objetivos: a) a mínima
ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) o
reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e d) a inexpressividade da lesão
jurídica provocada.
Nesse sentido:
O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os
postulados da fragmetariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal
– tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, a presença de
certos vetores, tais como a) a mínima ofensividade da conduta do agente, b) a
nenhuma periculosidade social da ação, c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade
do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se,
em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de um caráter subsidiário
do sistema penal reclama e impõe, em razão dos próprios objetivos por ele visados, a
intervenção mínima do Poder Público. (STF, HC 84687/MS, Rel. Min. Celso de
Mello, 2. T. DJ 27/10/2006, p. 279. )
Vale ressaltar outro julgado proferido pelo STF:
Rejeitou-se, ainda, a aplicação do principio da insignificância, porquanto esta, como
causa supralegal de excludente de tipicidade, exige a presença cumulativa dos
seguintes requisitos: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a nenhuma
periculosidade da ação; o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento
e, d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Nesse sentido, asseverou-se que
não se revelariam suficientes para caracterizar a insignificância do delito apenas a
pequena potencialidade lesiva da infração e o perigo concreto para a Administração
Militar (HC 90.977-MG, 1. T., Rel Cármen Lúcia, 08/05/2007, v. u. Informativo)
Observa-se que a doutrina e a jurisprudência não chegaram a um consenso quanto
aos requisitos necessários para o reconhecimento do princípio da insignificância,
consequentemente, provocando a absolvição, por exclusão de tipicidade.
Acentua-se que na aplicação do princípio da insignificância devem ser considerados
somente os aspectos objetivos do fato, excluindo-se outros de caráter subjetivo.
45
Com isso, entendemos que os critérios de avaliação do desvalor da ação e o desvalor
do resultado são os que conferem maior objetividade na verificação da insignificância penal
de determinada conduta tipificada.
Por oportuno, insta recordar que Francisco de Assis Toledo, apontava que a gradação
qualitativa e quantitativa do injusto permite que o fato penalmente insignificante seja excluído
da tipicidade penal.
Nota-se que os parâmetros para a aplicação do princípio da insignificância não há
uma regra legal a ser seguida. Motivo pelo qual, as jurisprudências dos Tribunais estão sendo
utilizadas como um norte para a aplicação desse princípio.
Colecionamos alguns julgados:
O princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do
tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado
apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente,
em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade
ao bem jurídico tutelado pela norma penal, o que consagra o postulado da
fragmntariedade do direito penal. (STJ. Resp. 849035, Rel. Min. Arnaldo Esteves
Lima, 5 T. DJ 7/5/2007).
Com efeito:
O princípio da insignificância é um instrumento de interpretação corretiva da larga
abrangência formal dos tipos penais e, para sua aplicação, prescinde de menção em
lei, pois decorre do Estado Democrático de Direito, constante na Constituicao
Federal de 1988. (TJMG, AC 1.0460.03.012807-4/001, Rel. Des. Pedro Vergara, DJ
2/6/2007)
E mais :
O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL:
"DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR". - O sistema jurídico há de considerar a
relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos
do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria
proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam
essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se
exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O
direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor
- por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente,
por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à
integridade da própria ordem social. HABEAS CORPUS Relator(a): Min. CELSO
DE MELLO Julgamento: 19/10/2004 Órgão Julgador: Segunda Turma
Publicação: DJ 19-11-2004 PP-00037 EMENT VOL-02173-02 PP-00229
Conferir, ainda:
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Segundo o princípio da insignificância, que se revela por inteiro pela sua própria
denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja
necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas. Assim,
no sistema penal brasileiro, por exemplo, o dano do art. 163 do Código Penal não
deve ser qualquer lesão à coisa alheia, mas sim aquela que possa representar
prejuízo de alguma significação para o proprietário da coisa; o descaminho do art.
334, parágrafo 1, d, não será certamente a posse de pequena quantidade de produto
estrangeiro, de valor reduzido, mas sim a de mercadoria cuja quantidade ou cujo
valor indique lesão tributária, de certa expressão, para o Fisco; o peculato do art. 312
não pode estar dirigido para ninharias como a que vimos num volumoso processo no
qual se acusava antigo servidor público de ter cometido peculato consistente no
desvio de algumas poucas amostras de amêndoas; a injuria, a difamação e a calúnia
dos arts. 140, 139, 138, devem igualmente restringir-se a fatos que realmente
possam afetar significamente a dignidade, a reputação, a honra, o que exclui ofensas
tartamudeadas e sem conseqüências palpáveis; e assim por diante. (Francisco Assis
Toledo, Princípios Básicos do Direito Penal, p. 133)
Sendo o delito uma ofensa a um interesse dirigido a um bem jurídico relevante,
preocupa-se a doutrina em estabelecer para um princípio para excluir do Direito Penal certas
lesões insignificantes.
Como se vê nos casos acima, não há dano de furto quando a coisa alheia não tem
qualquer significação para o proprietário da coisa.
Da mesma forma não existiria contrabando se o agente estivesse como posse
pequena quantidade de produto estrangeiro de valor reduzido, que não cause lesão de certa
expressão para o fisco; como não haveria peculato quando o servidor público se apropria de
ninharias do Estado; não existiria crime contra a honra quando não se afeta significativamente
a dignidade, a reputação, a honra de outrem; não haveria maus tratos quando não se ocasiona
prejuízo considerável ao bem estar corporal; não ocorreria dano ao patrimônio público de
pequena monta; não existiria estelionato quando o agente utiliza de fraude para não pagar a
passagem no metrô.
Pode-se concluir que é indispensável que o fato tenha acarretado uma ofensa de certa
magnitude ao bem jurídico protegido, para que se possa concluir por um juízo positivo de
tipicidade.
A excludente de tipicidade pelo princípio da insignificância será abordada no
próximo tópico.
3.3 Princípio da insignificância como excludente da tipicidade material
47
Como elemento derradeiro do fato típico tem-se a tipicidade, que nada mais é que a
correspondência exata, a adequação perfeita entre o fato natural, concreto, e a descrição
contida na lei.
Pode-se dizer que o tipo penal tem duas funções, a primeira é a garantia, já que se
aperfeiçoa e sustenta o princípio da legalidade do crime. A segunda é a de identificar a
antijuridicidade do fato a sua contrariedade ao ordenamento jurídico.
Praticado um fato típico, presume-se também a sua antijuridicidade, presunção que
cessa diante da existência de uma causa que exclua.
Existem as excludentes supralegais, que afastam a tipicidade, embora não estejam
expressamente previstas no Código penal, como ocorre com a adequação social e
insignificância.
Com a evolução do Direito Penal, para que o fato seja penalmente punível, não é
mais aceitável o juízo de tipicidade apenas em sua extensão formal, sendo preciso analisar,
igualmente, sua face material.
A tipicidade material reúne a imputação objetiva, a imputação subjetiva e o resultado
jurídico. Em razão disso, o fato materialmente típico é o que fere concretamente o bem
jurídico protegido pela norma.
A corrente majoritária na doutrina e na jurisprudência brasileira entende que o
princípio da insignificância torna materialmente atípica conduta que tenha uma afetação
insignificante ao bem jurídico tutelado por determinada norma.
Rogério Greco leciona no mesmo sentido:
Analisando em sede de tipicidade material, abrangida pelo conceito de tipicidade
conglobante, tem a finalidade de afastar do âmbito do Direito Penal aqueles fatos
que, à primeira vista, estariam compreendidos pela figura típica, mas que, dada à sua
pouca ou nenhuma importância, não podem merecer a atenção do ramo mais radical
do ramo jurídico. Os fatos praticados sob o manto da insignificância são
reconhecidos como de bagatela. (2008, p. 06).
Portanto, o princípio da insignificância atua excluindo a tipicidade material porque o
fato cometido não gerou risco ao bem jurídico tutelado, ou porquanto o resultado jurídico não
foi atingido de forma relevante, inexistindo, assim, em ambos os casos a dimensão valorativa
do tipo penal.
Nessa órbita:
A excludente da tipicidade (do injusto) pelo princípio da insignificância (ou da
bagatela), que a doutrina e a juris,prudência vem adimitindo, não está inserta na lei
brasileira, mas é aceita por analogia, ou interpretação interativa, desde que não
contra legem. Não há como confundir, por exemplo, pequeno valor da coisa
subtraída com valor significante ou ínfimo, no primeiro caso há somente um
abrandamento da pena, no segundo há exclusão da tipicidade. Somente uma
48
quantidade de maconha totalmente inexpressiva, incapaz inclusive de permitir ―o
prazer de fumar‖, poderá ter o condão de tornar atípica a ação de seu portador. No
Estado do Rio Grande do Sul, já se absolveu réu acusado pelo crime pelo crime de
posse de entorpecente por ser mínima (1 grama) a quantidade do tóxico, mas o
Tribunal de Justica acabou não aceitando tal orientação, mantendo aquela dos
Tribunais Superiores. (BITENCOURT, 2011, p. 102)
Na falta de um resultado jurídico relevante, pois as agressões ao bem jurídico
realizadas ocorrem de maneira insignificante, não existirá tipicidade penal.
Confira-se nesse sentido:
Furto simples tentado (art. 155, caut, c/c, o art. 14, II, ambos do CP). O valor ínfimo
da res furtivaI, sem força para causar dano relevante ao patrimônio da vítima, não
gera repercução na seara penal, à míngua de efetiva lesão do bem jurídico tutelado
(princípio da insignificância). Absolvição que se impunha com força no art. 386, III,
do CPP. Sentença monocrética corfirmada. Apelo provido. (...) Nestes lindes, em
reforço aos argumentos constantes da sentença recorrida, registro que o auto de
avaliação indireta (fl. 21/v.) dá conta que os bens subtraídos possuem o valor de R$
60,86 (sessenta reais e oitenta e seis centavos). Ou seja, o valor da rei furtivae
equivalia a 33,81% do salário mínimo vigente à época do fato (R$ 180,00). Logo, a
conduta imputada a ré é insignificante e não justifica a repressão penal, em virtudade
da sua desproporcionalidade em relação aos danos supostamente ocasionados pela
conduta denunciada. Portanto, é plenamente aplicável ao caso o princípio da
insignificância, ante a irrelevância da conduta da ré S. para o direito penal (delito de
bagatela), à mingua de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado, o que conduz a
pretensão punitiva (imprópria) deduzida ao veredcto absolutório centrado no art.
386, , do CPP‖ ( Ap. 70.009.794.884- Caxias do Sul, 6ª C. rel. Aymoré Roque
Pottes de Mello, 23.12.2004, v.u boletimAASP 2494, out. 2006)
Portanto, o princípio da insignificância, equivale à desconsideração típica pela não
materialização de um prejuízo efetivo, pela existência de danos de pouquíssima importância.
3.4 Críticas ao princípio da insignificância
Como já visto no tópico anterior, o princípio da insignificância tem grande
dificuldade no tocante a fixação de critérios e parâmetros precisos, em razão disso, alguns
doutrinadores estabelecem algumas objeções a sua aplicação.
Por não estar legislado, a corrente mais formalista sustenta ser inaplicável o
princípio.
Ocorre que a insignificância nada mais é do que importante construção dogmática,
solidificada em conclusões de ordem político-criminal, que busca solucionar situações de
injustiça provenientes da falta de relação entre a conduta reprovada e a pena aplicável.
49
Existe, também, objeções sobre a indeterminação conceitual, pois segundo esses
autores a indeterminação de conceito pode gerar riscos a segurança jurídica.
Outra objeção é no tocante a previsão legal de tipos privilegiados, contravenções
penais e infrações penais de menor potencial ofensivo.
Nesse ponto, consigna-se que os sistemas penais que expressamente criminalizem
condutas menores não podem aceitar o princípio da insignificância.
No nosso país, o Código Penal prevê figuras privilegiadas, tais como, o furto (art.
155, § 2º, do CP), o estelionato (art. 170 do CP) e a receptação (art. 180, § 3º, do CP). Além
disso, encontra-se em vigor o estatuto das contravenções penais, ou seja, infrações penais
consideradas de menor gravidade.
Dessa maneira, nessas hipóteses, a interpretação restritiva dos respectivos
dispositivos legais, com a consequente afirmação de atipicidade material das condutas,
significaria aplicação da analogia contra legem, violadora, assim, do princípio da legalidade.
A nosso ver, trata-se de conclusão errônea, porquanto nada impede que, feita a
valoração normativa da ofensa, nos moldes anteriormente sugeridos, o intérprete reconheça
que, de tão ínfima, não subsume-se sequer aos tipos privilegiados e contravencionais.
Como se vê, é necessário ter cautela na aplicação do princípio da insignificância para
evitar a impunidade de comportamentos que, embora provoquem danos de menor monta,
sejam significantemente reprováveis ou revelem alguma periculosidade social, bem como
para não se incentivar, pela possibilidade de afastamento da sanção penal, a habitualidade ou
a proliferação ao ataque aos bens tutelados pelo ordenamento jurídico.
Encontramos um julgado nesse sentido:
Princípio da insignificância. Reconhecimento do crime de bagatela no furto de bem
que foi avaliado em R$45,00. Impossibilidade. É impossível aplicar o princípio da
insignificância, consubstanciado no chamado crime de bagatela, no furto de animal
avaliado em R$45,00, porque isso só pode acontecer na subtração de bens de valor
juridicamente irrelevantes, como uma flor, um palito ou um alfinete (TAC SP, AC,
Rei. Mesquita de Paula).
Há críticas ainda no sentido de que se perde muito tempo, gasta-se dinheiro com a
nomeação de advogados, custos de funcionários, para se chegar ao final e concluir pela
atipicidade da conduta dos agentes, em evidente desproporcionalidade entre a utilidade e
efetividade da justiça criminal.
Derradeiramente, alguns Tribunais sustentam que o nosso ordenamento jurídico não
acolheu a teoria da bagatela, não cumprindo ao Judiciário deixar de tutelar os bens
expressamente destacados pelo legislador nos diplomas legais. Segundo eles, o princípio da
50
insignificância não está a merecer qualquer amparo, porque não há respaldo jurídico em se
considerarem corretas condutas como furtar, receptar e roubar.
Após essa breve análise das críticas ao princípio estudado, nota-se que elas não têm o
condão de eliminar a validade do princípio da insignificância como instrumento político-
criminal e sistemático de descriminalização.
Por sua vez, abordaremos agora um método que vai na contramão dos princípios da
insignificância e intervenção mínima, pois segundo ele todos os delitos devem ser punidos, é
o chamado Direito Penal Máximo.
3.5 Direito penal máximo : Conceito e carácterísticas
Pode-se dizer que essa corrente parte da premissa de que o Direito Penal é a solução
eficaz para conter todos os males relacionados com a violência existente no seio social,
portanto, sua utilização, além de importante é imprescindível.
Diferentemente dos capítulos acima, que sustentaram que o Direito Penal deve ser
visto como ultima ratio da sociedade, o Direito Penal Máximo preocupa-se com todo e
qualquer bem, não importando o seu valor, devendo ser utilizado como prima ratio.
Segundo o Direito Penal Máximo, todo o comportamento que se desvia da boa
conduta social, independentemente do grau de importância, merecem o juízo de censura a ser
levado a efeito pelo Direito Penal.
A mídia tem papel fundamental para a disseminação do Direito Penal Máximo, isso
porque, profissionais não habilitados, tais como, jornalistas, apresentadores de programas
sensacionalistas (Datena) e repórteres, chamam para si a responsabilidade de criticar as leis
penais.
Com isso, eles fazem a sociedade crer que com a criação de novos tipos penais,
afastamento de determinadas garantias processuais e penas mais severas, seriam as medidas
ideais para uma vida mais harmônica e tranquila, afastando-se, assim, aqueles cidadãos não
adaptados.
Tomemos como exemplo o advento da Lei n.º 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos),
que amparado pela norma constitucional, conforme assevera o artigo 5.º, inciso XLIII, da
Constituição Federal, causou grande discussão no meio jurídico principalmente por seu valor
motivacional.
51
Não há dúvidas que tal advento legislativo foi determinado pela força midiática
provocada por determinados crimes que assustaram a nossa sociedade, tais como: extorsão
mediante sequestro, homicídios e execuções promovidos por grupos de extermínio (Milícias),
atuação maciça de grupos e facões criminosa (Comando Vermelho e PCC), crimes
relacionados à liberdade sexual com resultado morte, terrorismo e, atualmente, o tráfico ilícito
de entorpecentes.
Entretanto, por se sentir pressionado pela força da mídia, os legisladores acabam
criando normas desproporcionais ou elaboradas as pressas, tudo com o fito de aplacar a
sensação de insegurança e impunidade que paira sobre o seio da sociedade.
Pois bem.
O Direito Penal Máximo é também conhecido como Movimento de Lei e Ordem.
Pode-se dizer que o Movimento de Lei e Ordem é política criminal que tem como
objetivo transformar conhecimentos empíricos sobre o crime, propondo alternativas e
programas a partir se sua perspectiva.
Esse movimento iniciou-se na década de 70 nos Estados Unidos e ganhou amplitude
até os dias atuais, com a ideia de repressão máxima e alargamento de leis incriminadoras.
Nesse sentido leciona Cervini:
Um dos princípios do "Movimento de Lei e Ordem" separa a sociedade em dois
grupos: o primeiro, composto de pessoas de bem, merecedoras de proteção legal; o
segundo, de homens maus, os delinquentes, aos quais se endereça toda a rudeza e
severidade da lei penal. Adotando essas regras, o Projeto Alternativo alemão de
1966 dizia que a pena criminal era "uma amarga necessidade numa comunidade de
seres imperfeitos". É o que está acontecendo no Brasil. Cristalizou-se o pensamento
de que o Direito Penal pode resolver todos os males que afligem os homens bons,
exigindo-se a definição de novos delitos e o agravamento das penas cominadas aos
já descritos, tendo como destinatários os homens maus (criminosos). Para tanto, os
meios de comunicação tiveram grande influência.1994, p. 5).
O Direito Penal Máximo, e consequentemente a Medida de Lei e Ordem, sofreram
uma ramificação, em meados de 1991, e ficou conhecida também como Política de Tolerância
Zero.
Essa ramificação surgiu não com o intuito primordial de diminuir a criminalidade,
como prega o Direito Penal Máximo, mas de refrear a insegurança das classes altas e médias
da sociedade, tirando os ―excrementos humanos‖ de suas vistas recriminando severamente
delitos menores tais como embriaguez, a jogatina, a mendicância.
Por derradeiro, percebe-se que o Direito Penal Máximo, a Medida de Lei e Ordem e
a Política de Tolerância Zero, desabrocharam devido as classes mais favorecidas da
sociedade, movidos pela mídia, clamarem por segurança, mas em verdade, pretende-se a
dizimação dos pobres das ruas das grandes cidade, colocando todos atrás das grades, longe da
52
vista da sociedade para que o Estado os tranque e ―jogue a chave fora‖. Porquanto em
decorrência de pequenos crimes são adotadas penas de crimes hediondos, para dar exemplo e
demonstrar sensação de segurança à esta pequena parte da sociedade
3.5.1 Teoria das janelas quebradas
No ano de 1982 dois criminologistas americanos James Wilson e George Kelling
desenvolveram uma teoria denominada como ―Broken Windows Theory”, ou seja, Teoria das
Janelas Quebradas. Essa teoria tinha como objetivo evidenciar a relação de causalidade que
existe entre a desordem e a criminalidade nas grandes metrópoles.
A pesquisa desenvolvida pelos criminologistas tinha por alicerce uma experiência
executada por um psicólogo americano Philip Zimbardo.
Esse psicólogo deixou um automóvel num bairro de classe alta na cidade de Palo
Alto, Califórnia. Ele observou que na primeira semana o carro permanecia intacto, todavia
após quebrar uma janela do veículo, ele estava totalmente quebrado e roubado por grupos
vândalos e criminosos que transitavam por ali.
Na visão dos autores, o fato de se quebrar a janela de um prédio e imediatamente não
consertá-la pode desencadear uma onda de criminalidade.
Nesse sentido:
O programa de tolerância zero tem sua origem, em grande medida, em função de um
famoso artigo publicado por James Q. Wilson em parceria com George Kelling, no
ano de 1982, na revista norte-americana Atlantic Montly. O artigo intitulou-se
―Broken Windows: the police and neighborhood safety‖. A idéia central do
pensamento ali desenvolvido é o de que uma pequena infração, quando tolerada,
pode levar ao cometimento de crimes mais graves, em função de uma sensação de
anomia que viceja em certas áreas da cidade. A leniência e condescendência com
pequenas desordens do cotidiano não devem ter sua importância minimizada. Ao
contrário. Não se deve negligenciar essa importante fonte de irradiação da
criminalidade violenta. Esse pensamento é metaforicamente exposto com a teoria
das janelas quebradas. ―Psic logos sociais e chefes de polícia tendem a concordar
que se uma janela de um prédio é quebrada e não é consertada, todas as demais
janelas serão imediatamente quebradas.‖ A Teoria é expressada através de um
interessante exemplo. Dois carros foram abandonados, sem placas, com o capô
aberto em duas ruas de diferentes cidades. Uma, em Palo Alto, Califórnia. Outra no
Bronx, Nova York. O carro parado no bairro do Bronx é imediatamente depenado,
em não mais que 10 minutos. Os primeiros a chegar ao veículo foram pai, mãe e um
filho (de uma mesma família) que levaram o radiador e a bateria. Em pouco tempo,
o carro foi totalmente depredado. Em um prazo de vinte e quatro horas o carro servia
de playground para as crianças. A maior parte dos vândalos estava bem vestida, e
eram brancos. O carro, nas mesmas condições, estacionado em um bairro de elite em
Palo Alto, não foi tocado no prazo de uma semana. O pesquisador, então, destruiu
uma janela do veículo com um martelo e em poucas horas o veículo foi igualmente
depenado. Isto foi feito, da mesma forma, por pessoas brancas aparentemente
respeitáveis.Segundo os autores, a explicação da diferença das posturas das
comunidades explica-se pela sensação se anomia no Bronx, pela freqüência com
53
que carros são abandonados, coisas são roubadas e pela anterior experiência de
vandalismos por quem conhece que ali ―ninguém dá bola‖ para as coisa. (Revista
Internacional de Direito e Cidadania, outubro/2009, p. 166)
Tomemos como exemplo hipotético uma fabrica que há poucos meses foi desativada,
nesses meses ela continuou intacta, até o momento que um jovem resolveu quebrar uma das
janelas de sua fechada.
Depois de alguns dias, todas as janelas da antiga fábrica estavam quebradas, pois os
outros jovens e vândalos perceberam que ali não existia autoridades para conservar a ordem
na localidade. Como as janelas já estavam quebradas, os vândalos passaram a criar mais
coragem e pichar todo o prédio, deixando aquela fábrica com aspecto de abandono total.
Ao perceberem que as autoridades não tomaram providencias sobre a pichação, que é
algo mais fácil de ser notado do que simplesmente persianas quebradas, os vândalos e
andarilhos invadiram a antiga fábrica.
Por ali ficaram muitos dias, e novamente nada aconteceu. Em razão disso, passaram
a utilizar drogas dentro do prédio e, posteriormente ali passou ser utilizado não só como local
de consumo, mas como ponto de tráfico.
Com medo da traficância no local, os vizinhos e comerciantes ao redor da fábrica
começaram a mudar do local gradativamente, as suas casas passaram a ser vandalizadas da
mesma forma que ocorreu na antiga fábrica, criminosos de outros bairros passaram a residir
nessas residências.
Em pouco tempo, aquele que era um bairro tranquilo, sem muita violência, se
transformou num local dominado pela criminalidade, onde os mais variados tipos de crimes
ocorriam corriqueiramente sem que nada acontecesse.
Foi ai que as autoridades notaram que aquele bairro estava ―perdido‖, e tentaram
intervir, contudo, os criminosos instalados ali há muito tempo, com recursos e armas,
impediam que as autoridades entrassem no local.
Dessa forma, após esse exemplo hipotético e ilustrativo, fica mais fácil visualizar
qual é o fundamento da Teoria das Janelas Quebradas, qual seja, que os pequenos delitos
devem ser punidos, pois se isso não ocorrer certamente acarretará maiores consequências, ou
seja, delitos cada vez mais graves.
Apesar do exemplo ser meramente ilustrativo a Teoria das Janelas Quebradas já foi
utilizada nos EUA, pois lá houve a aplicação da Política de Tolerância Zero, que tem como
fundamente essa teoria. Isso ocorreu mais precisamente na cidade de Nova Iorque.
54
Encontramos o artigo elaborado por Amanda Soares Gomes sobre o uso dessa teoria
em Nova Iorque:
A criminalidade em Nova York teve um crescimento lento e constante ao longo dos
anos 70 e 80 em virtude da tolerância aos pequenos ilícitos. As pessoas que
pichavam não eram contidas, e os números de grupos vândalos aumentavam. O
problema no metrô (transporte subterrâneo de Nova York) era ainda mais grave por
ser um local fechado, à noite deserto, e que era muito utilizado pelos nova-iorquinos.
Em 1993 concorriam para a prefeitura de Nova York o David Dinkins (até então
prefeito) e Rudolf Giuliani (prefeito eleito 1994-2002) ambos prometiam combater a
criminalidade de maneira eficiente. A principal reclamação da população era a cerca
dos grupos de jovens que limpavam os pára-brisas dos carros sem a autorização dos
donos e exigiam o pagamento pelo feito de forma agressiva que causava medo nas
pessoas e isso era considerado pelos nova-iorquinos uma falta de ordem e
autoridade. Quando Rudolf ganhou as eleições de Nova York ele trouxe para a
polícia Willian Bratton que atuou como Comissário da Polícia da Cidade de Nova
York, que antes já havia contratado o Kelling.Com a chegada do novo comissário
Kelling começou a incentivá-lo com livros e ideias. Bratton foi encarregado a
solucionar o problema do metrô. Quando ele começou a fazer uma análise do estado
em que se encontrava o metrô percebeu algumas janelas quebradas, sendo as
principais: as pessoas que pulavam as catracas (o que causava um prejuízo muito
grande para os cofres públicos), a desordem e a criminalidade. Bratton teve uma
pequena dificuldade para colocar em prática a política criminal, pois os policiais
estavam acostumados a combater os crimes mais violentos (homicídios, estupros,
roubos, dentre outros) e não delitos menores. Superado esse obstáculo começou a
aplicar a Broken Windows Theory. Uma das primeiras medidas tomadas foi impedir
que pulassem as catracas; logo, quando os outros desordeiros perceberam que
aqueles que pulavam estavam sendo repreendidos, eles desistiam de ter a mesma
conduta. Para realizar as prisões dos puladores de catraca, os policias geralmente
ficavam a paisana, em traje civil, e quando o pulador de catraca chegava, olhava
para os lados, não via policial e pulava, era imediatamente preso. Aqueles que
praticavam mendicância eram levados para abrigos. Os que pichavam os trens e
paredes eram presos e rapidamente a ―arte‖ era apagada. Os policiais americanos
perceberam que as pessoas que pulavam as catracas, estavam armadas ou tinham
mandados de prisão contra si, ou seja, dessa forma combatendo aquele delito menor
evitou-se que aqueles que estavam armados praticassem outros crimes. É importante
ressaltar que nem todos que cometem crimes menores necessariamente cometerão
um crime grave, porém se não encontrarem alguma repressão, a tendência que se
cometa um delito grave é maior. Em poucos meses Bratton e a sua equipe conseguiu
diminuir a criminalidade no metrô significativamente, portanto uma janela quebrada
será era consertada. Solucionado o problema do metrô, foi a vez de recuperar as ruas
de Nova York. E começaram agindo contra os grupos de vândalos que lavavam os
pára-brisas e extorquiam dinheiro dos motoristas. Essa conduta era punida com
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serviços comunitários não levava a prisão, as pessoas eram intimadas e muitas não
cumpriam a determinação judicial, cujo o descumprimento, autorizava que fossem
presos. As prisões foram feitas (os outros ficavam com medo da sanção), o que
atormentava os nova-iorquinos por anos acabou-se em semanas. O resultado da
aplicação da Broken Windows Theory foi a redução de forma satisfatória da
criminalidade em Nova York que anteriormente era conhecida como a ―Capital o
Crime‖. Hoje a cidade é considerada a mais segura dos Estados Unidos.
No Brasil é muito comum pessoas deixarem os lares por conta da criminalidade,
como se vê nas grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro.
Não se sabe ao certo se seria conveniente a utilização da Teoria das Janelas
Quebradas no Brasil, porém esse tema será abordado no próximo tópico.
3.6 Comparação entre o Direito Penal Máximo e os princípios da intervenção mínima do
e insignificância
Nesse tópico faremos uma abordagem dos três temas principais do nosso trabalho,
quais sejam, o princípio da intervenção mínima, princípio da insignificância e o Direito Penal
Máximo.
Os dois primeiros temas abordados são bem diferentes do Direito Penal Máximo,
isso porque, naqueles buscava-se afastar o Estado de pequenos delitos que não atingem de
forma severa o bem jurídico tutelado.
No tocante ao princípio da intervenção mínima, as relações sociais serão reguladas
pelos outros ramos do direito, cabendo, em ultimo caso, a sanção penal, ultima ratio.
A ultima ratio, dessa forma, vai legitimar o Direito Penal somente quando
fracassarem todos os outros meios (políticas sociais), quando se torna difícil o convívio
social.
O princípio da insignificância tem grande ligação com o princípio da intervenção
mínima, todavia, reúne quatro condições essenciais para ser aplicado: a mínima ofensividade
da conduta, a inexistência de periculosidade social do ato, o reduzido grau de reprovabilidade
do comportamento e a inexpressividade da lesão provocada.
Vejamos alguns trechos da sentença prolatada pelo ilustre Juiz de Direito Ronaldo
Tovani, substituto da comarca de Varginha, Minas Gerais, que concedeu liberdade provisória
a Alceu da Costa, vulgo ―Rolinha‖, preso em flagrante por ter furtado duas galinhas e ter
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perguntado ao delegado: ―Desde quando furto é crime neste Brasil de Bandidos?‖. O ilustre
magistrado lavrou então sua sentença em versos, apreciemos da original manifestação:
No dia cinco de outubro
Do ano ainda fluente
Em Carmo da Cachoeira
Terra de boa gente Ocorreu um fato inédito
Que me deixou descontente.
O jovem Alceu da Costa
Conhecido por ―Rolinha‖
Aproveitando a madrugada
Resolveu sair da linha
Subtraindo de outrem
Duas saborosas Galinhas
(...)
Desta forma é que concedo
A esse homem da simplória
Com base no CPP
Liberdade provisória
Para que volte para casa
E passe a viver em glória.
Se virar homem honesto
E sair dessa sua trilha
Permaneça em cachoeira
Ao lado de sua família
Devendo, se ao contrário,
Mudar-se para Brasília‖.
Em resumo, o conceito do princípio da insignificância é o de que a conduta praticada
pelo agente atinge de forma tão ínfima o valor tutelado pela norma que não se justifica a
repressão. Juridicamente, isso significa que não houve crime algum.
Mais precisamente na realidade brasileira, dos 340 Habeas Corpus autuados no
Supremo Tribunal Federal entre 2008 e 2010 pleiteando a aplicação do princípio da
insignificância, 91 foram concedidos, número que equivale a 26,76% do total.
(http/www.direito.it/categorias17.com.br)
Não obstante, existe o movimento contrário denominado como Direito Penal
Máximo, que tem como máxima que qualquer conduta fora da normalidade social deve
penalizada, ou seja, punir todo e qualquer delito, tendo como uma de suas vertentes a política
de Tolerância Zero.
Segundo o Direito Penal Máximo, todo o comportamento que se desvia da boa
conduta social, independentemente do grau de importância, merece se penalizado
judicialmente.
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Podemos citar como exemplo, as pessoas que pulavam as catracas para entrar
gratuitamente no metrô de Nova Yorque, mesmo sendo uma pequena infração as autoridades
passaram a coibir tais condutas, tudo isso para evitar crimes mais graves.
O exemplo citado acima também pode se relaciona com outra vertente do Direito
Penal Máximo, conhecida como Teoria das Janelas Quebradas, na qual pequenas condutas
devem ser punidas para que não causem prejuízos maiores.
Após essas explanações, é notório que tanto os princípios da invenção mínima e
insignificância, quanto o Direito Penal Máximo, possuem pontos positivos e também pontos
negativos.
Mas acreditamos que para o sistema penal brasileiro, a utilização da insignificância é
muito relevante, mesmo não estando legislada.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
No Brasil a criminalidade vem aumentando cada vez mais, contudo, para tentarmos
solucionar os nossos problemas, concluímos que não podemos nos basear somente na
experiência de sucesso nova-iorquina (Direito Penal Máximo, que teve como correntes a
Política de Tolerância Zero e a Teoria das Janelas Quebradas).
Senão vejamos.
Em primeiro lugar, importante salientar que a sociedade brasileira e a sociedade
norte-americana são bem distintas, não que uma seja melhor que a outra. O que as diferem são
a cultura, a grande desigualdade social, a política e legislação.
No que se refere a cultura, a própria sociedade brasileira não toleraria a punição de
todos os seus comportamentos antissociais, aos quais já está acostumada cotidianamente.
Aqui, estamos acostumados com o famoso ―jeitinho brasileiro‖, onde condutas criminais são
vistas com bons olhos, ou seja, consideramos de alto status agir desta forma, como se isto
significasse ser uma pessoa articulada, bem posicionada socialmente, capaz de obter
vantagens inclusive ilícitas, consideradas imorais por outros países.
Para o mundo jurídico esse tipo de conduta assume um sentido negativo, significando
não só ludibriar, mas violar normas, leis e convenções sociais, se tornou uma forma
dissimulada de status social tipicamente brasileiro, no qual são usados recursos como apelo e
chantagem emocional, laços familiares, recompensas, promessas, dinheiro, e outros ou
francamente antiéticos para obter favores para si ou para outrem, às vezes confundido ou
significando suborno ou corrupção.
Nos dias hodiernos é normal ignorar as leis em favor das amizades, assim, elas ficam
cada vez mais desmoralizadas e incapazes de se impor. Além disso, o fato de afastar as leis e
seus castigos típicos é uma prova de boa-vontade e um gesto de confiança, o que favorecia
boas relações de comércio e tráfico de influência.
Podemos citar alguns exemplos, tais como, o pagamento de propina, para ser
aprovado no exame da carteira de habilitação de motoristas, dar dinheiro para o policial de
trânsito não aplicar uma multa. Aqui, infelizmente, esses tipos de condutas não são
necessariamente considerados subornos, mas apenas apelos ao uso de flexibilidade,
complacência.
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Diferentemente, nos EUA, as leis não admitem permissividade alguma, e possuem
franca influência na esfera dos costumes e da vida privada. Popularmente dizendo, lá, ou
―pode‖, ou ―não pode‖.
Dos exemplos citados acima, podemos extrair outro grande problema, a corrupção,
isso porque, o policial que aceita propina está praticando corrupção.
Contudo, devemos observar tal conduta de modo mais amplo, pois muitas vezes os
funcionários públicos são mal remunerados, o que os levam a ganhar esse dinheiro por fora.
Não podemos defender tais condutas, todavia, é nítido que o Estado tem grande parcela de
culpa nesse problema.
Outro motivo que inviabilizaria o Direito Penal Máximo no Brasil é a grande
desigualdade social, fator que propulsiona a criação de empregos no submundo, tais como as
pessoas que vendem balas nos sinais, os famosos flanelinhas que ―guardam‖ carros,
ambulantes, pessoas que pegam recicláveis, etc... Aqui, esse tipo de trabalho não pode ser
visto como nos EUA, pois se essas pessoas não usarem esses meios para ganhar dinheiro vão
passar fome.
Se não bastasse isso, por sermos um país subdesenvolvido não temos condições de
custear uma política criminal como a de Tolerância Zero, para sua implementação, seria
necessária a construção de mais presídios, contratação de policiais, dentre outras medidas.
E mais, não teríamos abrigos para todos os andarilhos, desabrigados e mendigos
como nos EUA, lá, todos que praticavam mendicância eram levados para abrigos, fato que
também diminuiu a criminalidade.
Dessa forma, é possível concluir que a nossa sociedade não está preparada para uma
política severa como esta, razão pela qual devemos utilizar sim o princípio da insignificância
e também o princípio da intervenção mínima, pelo menos por enquanto.
Necessário destacar que o nosso ordenamento jurídico acertou em alguns pontos,
como a suspensão condicional do processo e a transação penal.
A Suspensão Condicional do Processo está prevista no art. 89 da lei 9.099/95, ela é
uma forma de solução alternativa para problemas penais, que procura evitar o início do
processo em delitos cuja pena mínima não ultrapassa 1 (um) ano, quando o acusado não for
reincidente em crime doloso e não esteja sendo processado por outro crime.
É importante ressaltar que o Direito Penal não é responsável por resolver todos os
problemas da sociedade. É necessário que as autoridades competentes criem políticas de
prevenção para que a ordem seja mantida, e também socialização para aqueles que venham a
transgredir a norma jurídica.
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Não há duvidas que é melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los, Beccaria já
dizia que o meio mais seguro, mas ao mesmo tempo mais difícil de tornar os homens menos
inclinados a praticar o mal, é aperfeiçoar a educação.
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