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OS MODELOS GEOCÊNTRICO E HELIOCÊNTRICO E O DESENVOLVIMENTO
DO PENSAMENTO CIENTÍFICO
Autor: Mariza Dall’Agnol Silvério1
Orientador: Profº Dr. Eduardo Vicentini2
Resumo
Neste artigo, busca-se analisar a contribuição que a utilização, como recurso educacional, de textos científicos e não científicos discutidos de forma interdisciplinar, acompanhados de um histórico das relações entre ciência e sociedade, podem trazer nas aulas de Física. Uma Unidade Didática foi elaborada com textos referentes a diferentes interpretações que o homem, através da história da ciência, elaborou sobre o universo. A atividade foi desenvolvida no Colégio Estadual Francisco Carneiro Martins, com alunos da 1ª série do Ensino Médio. Os textos utilizados destacam os avanços e as dificuldades encontradas para a produção do pensamento científico, buscando facilitar a compreensão sistemática do aluno e possibilitando uma parceria entre a Física e outras áreas do conhecimento, com o objetivo de torná-la mais interessante. A utilização dessa metodologia de estudo potencializou a possibilidade de uma aprendizagem diferenciada, pois contribuiu na superação do desinteresse dos alunos, possibilitando a conexão com outras áreas do saber, relacionando várias disciplinas e efetivando o processo da construção do conhecimento.
Palavras-chave: textos; história da ciência; física; Sistema Geocêntrico e Heliocêntrico.
1 Introdução
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei 9394/96), ao
situar o Ensino Médio como etapa final da Educação Básica, define-o como a
1 Pós graduada pela UNICENTRO em Educação, graduada em Matemática, atuando no Colégio Estadual
Francisco Carneiro Martins. 2 Doutor em Ciências, área de concentração Física, pela Universidade Federal de Minas Gerais.
conclusão de um período de escolarização de caráter geral. “Trata-se de reconhecê-
lo como parte de uma etapa da escolarização que tem por finalidades desenvolver o
educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da
cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.”
(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996)
As disposições deixam claro para o Ensino Médio a importância de preparar
o aluno para o trabalho e formar pessoas capacitadas à inclusão social, acreditando
na possibilidade do aluno modificar o ambiente e o ambiente modificar o aluno.
Nessa relação do indivíduo com o mundo, há a necessidade do professor atuar de
maneira ativa e determinante para que o aluno possa intervir no seu próprio
processo histórico, compreendendo os fenômenos tanto sociais como científicos que
fazem parte desse cotidiano e vinculá-los à evolução e busca de transformações.
Considerando as concepções divulgadas pelas Diretrizes Curriculares da
Educação Básica – Física:
(...) a escola deve incentivar a prática pedagógica fundamentada em
diferentes metodologias, valorizando concepções de ensino, de
aprendizagem (internalização) e de avaliação que permitam aos professores
e estudantes conscientizarem-se da necessidade de uma transformação
emancipadora (...) (DCE,2008, p.15)
Todo aprendizado amplia o universo mental do aluno e trazer textos
científicos e não científicos para a sala de aula irá contribuir para a efetivação do
ensino, não apenas se resumindo a um novo conjunto de informações, mas
estabelecendo uma relação necessária para a compreensão e para um diálogo
inteligente com o mundo, dando condições ao aluno de problematizar acerca de
fenômenos ao seu redor, estabelecendo assim um avanço ao senso comum,
ajudando na sua capacidade de reestruturar uma representação acerca das
interações produzidas, dando a possibilidade da construção e sintetização do que
aprendeu; de pensar e atuar de maneira flexível, crítica e produzindo o
conhecimento.
Paulo Freire afirma:
Não é a curiosidade espontânea que viabiliza a tomada de distância
epistemológica. Essa tarefa cabe à curiosidade epistemológica – superando
a curiosidade ingênua, ela faz a passagem do conhecimento ao nível do
senso comum para o conhecimento científico. Não é o conhecimento
científico que é rigoroso. A rigorosidade se acha no método de aproximação
do objeto. (FREIRE, apud ZANETIC, 1982.p.21)
Para propiciar esse método de aproximação do objeto, tem-se que se levar
em consideração que as questões científicas devem ser abordadas com ênfase
especial ao caráter histórico, relacionando-as ao desenvolvimento de teorias,
destacando seu caráter epistemológico e com a preocupação e intenção de se fazer
uma análise histórico-filosófica, evidenciando o papel dos personagens principais e
não apenas relatando os fatos de maneira cronológica, como isolados de
circunstâncias socioculturais e econômicas; caminhamos à necessidade de
apresentar tópicos sobre a evolução dos conceitos de física, pois a parcialidade dos
conhecimentos nos leva a acreditar que a evolução do pensamento se deu de forma
linear, chegando às ideias e práticas científicas como produto de possível
imaginação.
Sobre a maneira que se ensinava, podemos exemplificar pelo que foi
apresentado em um documento autobiográfico de Einstein, por volta de 1946, onde
percebe-se que se faz válido até os tempos atuais:
(...) como estudantes, éramos obrigados a acumular essas noções em
nossas mentes para os exames. Esse tipo de coerção tinha (para mim) um
efeito frustrante. (...) Na verdade, é quase um milagre que os métodos
modernos de instrução não tenham exterminado completamente a sagrada
sede de saber, pois esta planta frágil da curiosidade científica necessita,
além de estímulo, especialmente de liberdade; sem ela, fenece e morre. É
um grave erro supor que a satisfação de observar e pesquisar pode ser
promovida por meio de coerção e da noção de dever. (EINSTEN, apud
ZANETIC, 1982, p. 21)
É necessário promovermos em sala de aula a superação de uma visão
tradicional onde o aluno é um indivíduo que só aprende na escola e não traz
contribuições empíricas.
Espera-se que a aplicação deste tema em estudo, leve o aluno a partir do
conhecimento popular adquirido de geração em geração e por meio de uma
educação informal chegar ao conhecimento com enfoque formativo, produzido e
obtido de modo racional, sistematizado e que possa contribuir para a construção
racional lógica e social do conhecimento, fomentando a curiosidade e a busca
pessoal por informações e explicações.
Sobre a utilização de textos literários científicos, ZANETIC observa:
A utilização de textos literário-científicos de Galileu e Kepler, bem como
outros de Newton que sintetizam a visão de mundo apresentadas pelos
seus dois precursores, poderá desempenhar duas funções aparentemente
opostas: de um lado, favorecer uma compreensão mais abrangente das
teorias físicas por aqueles alunos “normalmente” atraídos pela física, a
minoria; de outro, permitir que aqueles alunos que “normalmente” são
atraídos pela poesia, outra minoria, percebam que a física também tem
dimensões que a aproximam da arte. (ZANETIC, apud DCE, 2008, p.21)
A importância que a ciência e a tecnologia têm na atual sociedade, faz com
que, muitas vezes, a literatura expresse questões sobre tal, como a importância da
ciência na vida das pessoas para além dos dramas. É comum hoje, nos depararmos
com obras literárias que expressam conceitos físicos, visões da ciência e suas
relações com a sociedade. Estas obras podem ser trabalhadas como
contextualização histórico-social do conhecimento científico, suas influências e
consequências na cultura, na economia, na política. Desta forma, a utilização de
textos literários com veia científica, também poderá promover a interdisciplinaridade:
Se contemplarmos a necessidade de ir além do conhecimento do senso
comum e quisermos romper com os obstáculos epistemológicos, científicos
ou não, uma leitura atenta do bosque cultural onde se cruzam os caminhos
da ciência e da arte pode ser bastante adequada para construir uma ponte,
no ensino de ciência, entre o universo científico e o universo da literatura
universal. (Ibid., p. 35-36)
O professor, ao voltar-se para os estudos teóricos e epistemológicos da
Física, irá além dos manuais didáticos e estabelecerá a relação necessária entre
essa ciência e outros campos do conhecimento, estimulando os alunos a perceber
essas relações e a não neutralidade da produção científica. O resgate do tempo
histórico no processo da aprendizagem é fundamental, pois os alunos poderão ter a
visão de que a ciência não é mágica e que a evolução das ideias científicas foi lenta,
e por vezes penosa.
Portanto, este trabalho procurou subsídios através de textos científicos e não
científicos para que, utilizando-os como método didático-pedagógico, houvesse a
apreensão dos conteúdos, leis, relações da Física e sua utilização, bem como
ficasse claro a observação da influência no pensamento científico com a sociedade
da época em que estavam inseridos seus precursores.
Mais especificamente, procurou-se articular o conhecimento Físico com o
conhecimento de outras áreas do saber científico, apresentando o conhecimento
apreendido através de textos e fazendo a correspondência necessária entre a
Astronomia do Renascimento e suas relações com a evolução das ideias da Física.
2 Elaboração da Unidade Didática
Foi elaborada uma unidade didática a qual se propõe discutir e definir meios
para que no ensino da Física, especificamente sobre o tema “Geocentrismo e
Heliocentrismo”, seja fundamentado numa prática pedagógica diferenciada,
articulando o conhecimento com a cultura e com a sociedade da época, e ainda,
ressaltando que a curiosidade e o fascínio pela astronomia sempre estiveram
presentes em diferentes tempos e espaços do processo de formação do
pensamento científico.
Esta unidade didática também tem o propósito de estimular um processo de
reflexão e tomada de consciência dos aspectos sociais que envolveram as questões
sobre astronomia com o objetivo de desenvolver uma compreensão abrangente por
parte de educadores e educandos.
Compreendemos que precisamos nos aproximar mais da Historia da
Ciência, de seus sujeitos e seus papéis dentro da formulação do pensamento
cientifico, por isso este material tem, também, o objetivo de contribuir para uma
abordagem ampliada do tema e subsidiar o professor e alunos na tarefa de superar
mecanismos que se encontram enraizados na medida em que se abordam
superficialmente os conteúdos, sem uma cronologia dos acontecimentos.
Os textos que a compõem, estão ligados ao conteúdo estruturante
Movimento, e ao conteúdo especifico Gravitação Universal e apresentam-se em uma
sequencia lógica e cronológica junto à história, e ao final de cada texto seguem os
questionamentos e encaminhamentos sugeridos e desenvolvidos, bem como, em
alguns, há a sugestão de sites para o enriquecimento do trabalho. Todos eles têm
como objeto principal a reflexão e a formação de ideias que reafirmem a construção
por vezes dolorosa do pensamento científico.
3 Desenvolvimento
A incorporação de textos como recurso educacional é uma tendência
curricular, elencada nas novas concepções sobre o ensino da Física e sobre a
educação científica. Sua utilização ainda é restrita portanto, especificamos alguns
cuidados ao se apresentar os textos científicos aos alunos, visto que muitas vezes
sua utilização em sala de aula é desprezada como uma forma de metodologia
alternativa em virtude da dificuldade encontrada tanto por professores como por
alunos em sua interpretação.
Isso acontece pelo fato do desconhecimento das técnicas de estudo de um
artigo científico, por exemplo. Sabe-se que a leitura de um texto científico exige
muito mais atenção, pois se trata de um gênero específico, onde se utiliza uma
linguagem mais complexa e com uma ordenação no raciocínio que por vezes nosso
aluno não está acostumado a utilizar; porém, somente se dará a efetivação de uma
compreensão e a retenção da significação de tais textos se consentirmos e
oportunizarmos a sua leitura, produzindo uma rotina para que o processo se torne a
cada dia mais eficaz e prazeroso.
Há a necessidade de permitir primeiramente uma compreensão global do
significado do texto, uma interpretação crítica do mesmo, auxiliando o aluno no
desenvolvimento do raciocínio lógico, fornecendo instrumentos para que o trabalho
seja realizado e para que os conceitos inseridos sejam compreendidos e melhores
aproveitados.
Para que a leitura seja eficaz e alcance seus objetivos, primeiramente
devemos orientar os alunos para que sejam efetuadas três formas de análises a
cada texto, sendo elas:
- Análise Textual.
- Análise Temática.
- Análise Interpretativa
3.1 Tipos de linguagem utilizadas
3.1.1 Linguagem com veia científica
Sabemos da importância atribuída à ciência e à tecnologia na sociedade
atual, e isto faz com que diversos autores expressem em seus textos o
entrelaçamento entre a obra literária e conceitos físicos, visões da ciência, relação
da ciência com a sociedade. Esse tipo de obra permite trabalhar o papel da ciência
na vida das pessoas, suas consequências e influências.
Na proposta do Ensino Médio Inovador, apresentado pelo Governo Federal,
são apresentados alguns eixos para o trabalho pedagógico, sendo alguns deles:
- A Física como cultura: a física habita o universo das produções humanas, como a
arte, a literatura, a ciência e outras, onde a imaginação e a criatividade estão
presentes.
- Metáforas físicas: física e literatura habitam no mesmo universo cultural, uma
influenciando a outra.
- A obra literária como expressão de maneiras de ver o mundo físico: clássicos
físicos expressam visões de mundo dentro de um contexto histórico social.
- Ciência e poesia: as aproximações são possíveis porque ambas se alimentam de
criatividade e imaginação.
Sendo assim, a linguagem literária também poderá auxiliar para que os
objetivos almejados pela leitura sejam significativos. A linguagem não científica,
caracterizada por sua plurissignificação, cuja base é a conotação, é utilizada muitas
vezes com um sentido diferente daquele que lhe é comum. Ela agrega um sentido
aos significados das palavras, deixa o leitor imaginar o que pode haver nas
entrelinhas do texto. Cada leitor pode interpretar de uma maneira diferente o
contexto.
Por isso, a necessidade do encaminhamento pedagógico para a sua leitura.
Num primeiro momento situar o aluno no reconhecimento da obra, quais conceitos
físicos estão inseridos e com que intencionalidade. A observação é fundamental
para que a interpretação seja realizada levando em consideração tempo-espaço-
sociedade.
3.1.2 Linguagem científica
O texto científico se difere dos demais em alguns aspectos. São textos
basicamente informativos, serve para transmitir conhecimentos, relatar uma
pesquisa, seus resultados e/ou uma análise desses resultados. Os temas tendem a
ser mais específicos não permitindo a plurissignificação.
4 Textos selecionados para abordagem do tema
Os textos abaixo relacionados foram selecionados como recurso
complementares aos didáticos.
4.1 Texto 1
Foi utilizado para discutir a importância e necessidade de uma história para
a Física.
Resumo: As civilizações antigas tinham um ou mais mitos de criação para
responder a algumas questões, esses mitos têm uma linguagem metafórica, ou
seja, consiste na substituição de uma ou mais palavras por outras que aguçam a
imaginação, como um recurso de linguagem. É importante analisá-los de acordo
com o contexto social, religioso e linguístico de uma determinada sociedade e de
sua época.
Abaixo, encontra-se transcrita um pedaço da letra composta por Chico
Buarque, em sua canção „Sobre todas as coisas’, onde esse recurso de linguagem
é utilizado.
Ao Nosso Senhor
Pergunte se ele produziu nas trevas o esplendor
Se tudo foi criado – o macho, a fêmea, o bicho, a flor
Criado para adorar o Criador.
E se o Criador
Inventou a criatura por favor
Se do barro fez alguém com tanto amor
Para amar Nosso Senhor
Não, Nosso Senhor
Não há de ter lançado em movimento terra e céu
Estrelas percorrendo o firmamento em carrossel
Pra circular em torno do Criador (...)
Fonte: ROCHA, João Fernando. Origens e Evolução das Ideias da Física. Ed EDUFBA, 2002,
Salvador, 374 p. 38.
Em sala de aula foram discutidas as seguintes questões:
1- Quando Chico se refere a „estrelas percorrendo o firmamento em carrossel‟ o que
ele está metaforicamente descrevendo?
(está metaforicamente descrevendo o movimento circular que os céus parecem
descrever diariamente em torno da Terra)
2- E quando diz „se o barro fez alguém com tanto amor‟, o compositor está se
referindo a que?
(ao mito bíblico de Adão, nome que etimologicamente vem de Adamá, ou seja, terra
em hebráico e que metaforicamente representa o simbolismo do homem telúrico que
tira da terra o seu sustento, como já faziam as primeiras sociedades sedentárias que
aravam e semeavam o solo)
Foi feita uma explanação sobre os mitos dos Deuses na antiga Grécia, sobre
os símbolos do zodíaco descritos através dos referenciais das estrelas. Verificou-se
grande interesse e participação dos alunos, sendo receptivos e mostraram
disposição para aprender, colocando suas ideias e participando do debate.
4.2 Texto 2
Foi utilizado quando se faz referência às “Filosofias Gregas” que nortearam
o pensamento e explicação do cosmos.
Resumo: Uma grande contribuição, que influenciou a civilização ocidental em todas
as áreas do pensamento, foi quando da transcrição da Bíblia para o grego e
posteriormente para o latim. Muitos pensadores medievais como Agostinho, Tomás
de Aquino, dentre muitos outros, procuraram conciliá-la com a filosofia platônica e
aristotélica, criando a escola medieval. Neste texto, vemos um pequeno pedaço do
Gênesis (que em hebraico significa “no início”) o qual descreve em forma de mito a
origem do universo e é seguramente um dos textos mais lidos da história da
humanidade.
Reprodução dos primeiros versículos da forma latinizada da Vulgata1:
No princípio, Deus criou o céu e a terra.
E a terra era informe e vazia. E havia trevas sobre a face do
abismo; e o espírito de Deus se movia sobre as águas.
E disse Deus: “Que seja feita a luz”. E a luz se fez.
E Deus viu que a luz era boa. E separou a luz das trevas.
Chamou a luz de Dia e as trevas de Noite. E fez-se a tarde e a
manhã do dia um.
E disse também Deus: “Seja feito o firmamento em meio às
águas e divida as águas das águas.”
E Deus fez o firmamento, dividindo as águas que estavam sob
o firmamento e as que estavam sobre o firmamento. E isso se
fez assim.
E Deus deu ao firmamento o nome de céu. E fez-se a tarde e
amanhã do dia seguinte.
Deus disse: “Removam-se as águas que estão sob o céu, em
um lugar, e que apareça o seco”. E isso se fez assim.
E Deus chamou o seco de Terra e denominou a reunião das
águas de Mar. E Deus viu que era bom.
Fonte: ROCHA, João Fernando. Origens e Evolução das Ideias de Física. Ed. EDUFBA, 2002,
Salvador, p. 41 e 42.
_____________________
1 Vulgata é a forma latina abreviada de vulgata editio ou vulgata versio ou vulgata lectio,
respectivamente edição, tradução ou leitura de divulgação.
Após a leitura foram realizados os seguintes comentários:
Segundo ROCHA (2002), todo o pensamento ocidental, desde o princípio da
era cristã até o Renascimento (final do século XV), seria inteiramente
dominado pela doutrina judaica da criação, incorporada ao Cristianismo, na
qual um Deus único e eterno produz todas as coisas, nomeando-as em
seguida. Nada surge por acaso, por evolução ou por vontade própria. O
universo é criado pela ação e vontade divinas que ordena as coisas por
separação de algo informe e semelhante a um caos inicial, não havendo
forças ativas que a essa vontade possam se opor.
A partir do Renascimento, pouco a pouco, o pensamento bíblico ortodoxo1 é
substituído por uma visão na qual Deus é percebido como um Criador que
permite às forças da natureza produzir uma lenta, porém irreversível
evolução natural. Passa o homem a se perceber não mais como mero
contemplador, mas como protagonista, ou, pelo menos como coadjuvante,
no processo do conhecimento da criação e evolução da obra divina.
______________________ 1 Ortodoxo - que está conforme a uma doutrina definida; que é rígido em suas convicções.
O texto apresentado foi de fácil interpretação, os alunos puderam retirar com
facilidade as ideias e várias contribuições foram feitas, colocaram seus
conhecimentos empíricos, relacionando–os aos seus credos. Houve uma grande
contribuição e a discussão que se seguiu demonstrou que a grande maioria dos
alunos, tem dificuldades em relacionar religião e ciência.
4.3 Texto 3
Foi utilizado quando se faz um paralelo das filosofias gregas com os
ensinamentos da Igreja da época em conformidade com o sistema de Ptolomeu.
Resumo: Dante Alighieri (1265–1321), no seu poema épico A divina comédia
demonstrou a forte influência do pensamento aristotélico-ptolomaico, a partir da
leitura produzida por Tomás de Aquino, responsável pela aproximação desse
paradigma aos ensinamentos e dogmas da Igreja de então.
Conforme ZANETIC (2006), O paraíso de Dante é formado por nove céus
concêntricos girando em torno da Terra imóvel, seguindo de perto uma descrição
de Ptolomeu. Um exemplo extraído do canto XXVII ilustra essa influência:
As partes deste céu são tão uniformes, que eu não posso dizer
qual Beatriz escolheu para meu lugar.
Mas ela, que via o meu desejo de saber, começou, sorrindo tão
alegre, que no seu rosto parecia regozijar-se o próprio Deus:
deste céu começa a natureza do mundo como do seu
princípio, fazendo que a Terra seja firme no centro do universo
e as outras partes em torno se movam.
E este céu não tem nenhum outro lugar senão a Mente divina,
em que se acende o amor, que o faz girar, e a virtude, que ele
derrama.
A luz intelectual, plena de amor do Empírio, contém em si o
Primeiro Móbil, assim como este contém os outros oito;
O Empíreo não pode ser compreendido senão de Deus.
Fonte: ALIGHIERI, 1958, p. 287/288, apud, Pro-Posições, v. 17, n. 1, p.49 - jan./abr. 2006.
Foi apresentado o texto, onde houve a intermediação da leitura pela
professora, colocando em discussão as ideias do texto. Este texto foi
particularmente de difícil interpretação, onde recorremos a uma análise mais
detalhada, colocando cada palavra dita „estranha‟ dentro do seu contexto.
4.4 Texto 4
Foi utilizado quando se retrata o sistema de Copérnico.
Resumo: refere-se à teoria heliocêntrica de Copérnico e sua repercussão na
época.
Martinho Lutero (1483-1546), teólogo alemão é considerado o pai da
Reforma Protestante, chegou a afirmar, com relação à teoria heliocêntrica de
Copérnico, que admitir a Terra girando em torno do Sol era como admitir que não
é a carroça que vai para a frente, mas sim os burros que fazem a Terra ir para
trás. Ele ainda escreveu em 1539:
As pessoas estão dando ouvidos a um astrólogo estrangeiro
que quis demonstrar que é a Terra que gira e não os céus, o
Sol e a Lua... Esse estúpido quer mudar toda a ciência da
Astronomia; mas as Sagradas Escrituras dizem que Josué
ordenou que o Sol se detivesse, e não a Terra.
Fonte: Eugene Hecht. Física em perspectiva. Wilmington: Addison-Wesley Ibero
Americana, 1987.
Foram feitos os seguintes comentários pela professora:
O famoso livro de Copérnico, De Revolutionibus Orbium Coelestium (Das
revoluções dos corpos celestes), onde apresentou suas teorias, causou
grande polemica. A Igreja declarou a teoria heliocêntrica herética, por estar
em desacordo com suas doutrinas, proibindo a sua divulgação em 1616.
Nessa época a Igreja Católica, passava por várias crises. Além das
disputas políticas envolvendo o alto clero, voltaram a pesar sobre a
instituição denuncias de corrupção e outras acusações de ordem moral.
Alguns filósofos cristãos, influenciados pelo pensamento humanista,
passaram a responsabilizar a Igreja e seus dogmas pela perpetuação da
miséria e da ignorância na sociedade europeia.
Apesar da repressão da Igreja, o movimento contrário às práticas
consideradas imorais cresceu de forma contínua. Em 1517, o monge
Martinho Lutero (1483-1546) protestou contra o comportamento do alto
clero e do papado, incentivando outras pessoas a fazerem o mesmo. Esse
movimento, que ficou conhecido como Reforma, tornou-se tão grande que
provocou uma cisão na Igreja.
Seguiu-se a aula com os seguintes questionamentos:
1- Qual era o posicionamento da Igreja a respeito do cosmos?
2- Qual razão levava a Igreja a defender o geocentrismo?
3- Martinho Lutero, apesar de ser o Pai do Protestantismo, defendia o
geocentrismo? Por quê?
Essa atividade proporcionou a verificação do aumento da efetiva
participação dos alunos. Eles relacionaram tais questões com as disciplinas de
filosofia e história, com grandes contribuições. A socialização do saber foi muito
significativa.
4.5 Texto 5
Foi utilizado quando se refere às contribuições de Galileu Galilei.
Resumo: Galileu foi o fundador de uma nova ciência, pois a fez sair da sombra da
teologia e da tradição aristotélica e aplicou-lhe um novo método, o experimental.
Mas quebrar os paradigmas de então foi muito difícil. Após publicar seu livro
Diálogo dos Grandes Sistemas, foi acusado de pôr em cheque o que a Bíblia dizia.
Esta carta de Galileu é exemplo disto:
Posto isto, parece-me que nas discussões respeitantes aos
problemas da natureza, não se deve começar por invocar a
autoridade de passagens das Escrituras; é preciso, em primeiro lugar,
recorrer à experiência dos sentidos e a demonstrações necessárias.
Com efeito, a Sagrada Escritura e a natureza procedem igualmente
do Verbo divino, sendo aquela ditada pelo Espírito Santo, e esta, uma
executora perfeitamente fiel das ordens de Deus. Ora, para se
adaptarem às possibilidades de compreensão do maior número
possível de homens, as Escrituras dizem coisas que diferem da
verdade absoluta, quer na sua expressão, quer no sentido literal dos
termos; a natureza, pelo contrário, conforma-se inexorável e
imutavelmente às leis que lhe foram impostas, sem nunca ultrapassar
os seus limites e sem se preocupar em saber se as suas razões
ocultas e modos de operar estão dentro das capacidades de
compreensão humana. Daqui resulta que os efeitos naturais e a
experiência sensível que se oferece aos nossos olhos, bem como as
demonstrações necessárias que daí retiramos não devem, de
maneira nenhuma, ser postas em dúvida, nem condenadas em nome
de passagens da Escritura, mesmo quando o sentido literal parece
contradizê-las.
(Galileu, Carta a Cristina de Lorena)
Também escreve Galileu, ainda sobre o método experimental:
Ao cientista só se deve exigir que prove o que afirma. (...) Nas
disputas dos problemas das ciências naturais, não se deve começar
pela autoridade dos textos bíblicos, mas sim pelas experiências
sensatas e pelas demonstrações indispensáveis. (Galileu, Audiência
com o Papa Urbano VIII)
Fonte:http://filosofialogos.blogspot.com/2007/07/filosofia-e-cincias-da-natureza-7.html
Foi realizado o seguinte questionamento:
Qual a relevância dos fatos descritos acima que configurou a uma nova
visão da ciência?
Ficou claro que a leitura e estudo deste texto possibilitou uma análise do
processo de construção do pensamento científico, localizando-o na história da
humanidade, com seus problemas e consequentemente na formulação de teorias;
onde estas tinham um grande envolvimento com a organização social da época.
4.6 Texto 6
Foi utilizado quando se fala das contribuições de Kepler.
Resumo: Pequeno trecho da carta de Kepler do inicio da sua carreira onde
descreve através de suas observações a explicação do movimento dos céus, sendo
estes produzidos pela ação de forças físicas e não por influencia de forças divinas.
Kepler exprimiu a sua linha de pensamento numa carta escrita a Herwart
(1605), no inicio de sua carreira:
Estou muito preocupado com a investigação das causas físicas. O
meu proposito é mostrar que a máquina celeste deve ser
assemelhada não um organismo divino, mas antes a um relógio
(...) pelo menos na medida em que todos os múltiplos movimentos
são causados por uma única e muito simples força magnética, tal
como no caso do relógio todos os movimentos são provocados por
um simples peso. Além disto, mostro como é que este conceito
físico pode ser apresentado através do cálculo e da geometria.
Fonte: ALVARENGA, Beatriz; MÁXIMO, Curso de Física. 6. ed. São Paulo: Scipione, 2006.
Foram realizados os seguintes comentários pela professora:
Segundo ALVARENGA (2006), Kepler quis mostrar que a máquina celeste é
semelhante a um relógio acionado por uma única força, o que se tratava, na
verdade, de um objetivo profético. Estimulado pelo trabalho de William
Gilbert no campo do magnetismo, publicado alguns anos antes, Kepler
imaginava forças magnéticas originadas do Sol a conduzir os planetas ao
longo das suas órbitas. Era uma hipótese razoável e prometedora. À medida
que foi desenvolvida, a ideia básica de que um único tipo de força controla
os movimentos de todos os planetas mostrou-se correta; mas a força não é
magnética, e é necessária não para impelir os planetas para frente, mas
para lhes defletir as trajetórias de modo a que percorram órbitas fechadas.
Kepler foi um dos primeiros a procurar as causas dinâmicas para os
movimentos. Este novo interesse em explicações físicas marca o início duma
das principais características da ciência física moderna.
Dando prosseguimento à aula, a turma foi dividida em duplas de alunos para
que complementassem o texto, acessando o vídeo “Poeira Das Estrelas – Parte 02”
com duração de 10 minutos e 48 segundos, pelo link:
http://youtube.com/watch?v=LkYrmgkJp5c&feature=related
Os alunos se mostraram motivados com a associação do vídeo ao tema e a
facilitação da aprendizagem foi significativa, pois tais recursos fomentaram o diálogo
e a participação.
4.7 Texto 7
O texto utilizado foi retirado da Revista Época que transcreveu com
exclusividade um trecho do livro de Marcelo Gleiser sobre a vida do astrônomo
Johannes Kepler. Foi acessado pelo endereço eletrônico:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI54929-15228-7,00-
O+SENHOR+DO+UNIVERSO.html Acessado em 14/10/2011.
Após a leitura, os alunos redigiram um resumo das principais ideias do texto,
explicitando assim, seu entendimento.
Com isso, pode-se verificar que já havia uma facilidade maior na
organização do raciocínio, e que a construção do conhecimento estava sendo
efetivada.
4.8 Texto 8
Resumo: O texto abaixo é uma das citações de Isaac Newton, extraída de seu
Escólio Geral, onde deixa claro que para ele o universo é entendido como obra de
um único e eterno Criador, Senhor do universo, dotado de inteligência superior que
estabelece as leis da natureza de forma simples e objetiva através de uma
linguagem matemática.
Os seis planetas primários são revolucionados em torno do Sol, em
círculos concêntricos, com movimentos dirigidos às mesmas partes
e quase no mesmo plano. Dez luas são revolucionadas em torno da
Terra, Júpiter e Saturno em círculos concêntricos a eles, com a
mesma direção de movimento e quase nos planos das órbitas
desses planetas; mas não se deve conceber que simples causas
mecânicas poderiam dar origem a tantos movimentos regulares (...)
Este magnífico sistema do Sol, planetas e cometas poderiam
somente proceder do conselho e domínio de um Ser inteligente e
poderoso (...) esse Ser governa todas as coisas, não como a alma
do mundo, mas como Senhor de tudo; e por causa de seu domínio
costuma-se chamá-lo de Senhor Deus Pantókrator ou Soberano
Universas (...) Ele é eterno e infinito, onipotente e onisciente, isto é,
sua duração se estende da eternidade à eternidade, sua presença
do infinito ao infinito; Ele governa todas as coisas que são ou podem
ser feitas...
Aqui também evidenciamos o epitáfio do poeta Pope, que os ingleses,
orgulhosamente inscreveram no túmulo de Sir Isaac Newton, vizinho ao de William
Shakespeare, no Panteão dos gênios britânicos da Abadia de Westminster, em
Londres:
“A natureza e as leis da Natureza estavam ocultas na noite. Deus
disse: Seja Newton! E tudo se fez luz!”
Fonte: ROCHA, João Fernando. Origens e Evolução das Ideias de Física. Ed. EDUFBA, 2002,
Salvador, p.110, 111 e 128.
Primeiramente buscou-se saber o que significa escólio, ou seja: princípios de
certa forma não tão filosóficos, sendo o seu papel de apresentar generalidades em
que a filosofia parece estar fundamentada.
Logo após os comentários realizados pela turma, foi solicitado que duplas de
alunos assistissem ao vídeo “Poeira Das Estrelas – Parte 04” com duração de 09
minutos e 30 segundos, acessando o link postado abaixo, e foi solicitado que
fizessem um pequeno comentário oral a respeito.
http://youtube.com/watch?v=4ZIYMmJ2ewE
Foi possível constatar que a maior dificuldade dos alunos foi em quebrar as
barreiras de atividades de ensino já estruturadas, pré-definidas, as quais estão
acostumados para abrirem-se e sentirem-se motivados e desafiados a responder a
várias indagações, que os conduziriam à reflexão e construção do pensamento.
4.9 Texto 9
Resumo: Relato de como a astrologia foi decisiva para a origem da ciência
moderna.
Foi utilizado o texto: “Astrologia: escrito nas estrelas”, publicado na Revista
Superinteressante na edição 230 de setembro/2006 por Reinaldo José Lopes.
Acesso pelo endereço:
http://super.abril.com.br em 24/11/2011- superarquivo ano 2006, setembro.
Após a leitura do texto foi solicitado a formação de duplas de alunos para
que acessem o endereço na sala de informática, orientando-os para que após a
leitura, relatem as dificuldades encontradas e pontuem as principais ideias do texto.
Após o debate, ficou evidente que o texto mostrou-se potencialmente
significativo, verificou-se uma aproximação maior do conteúdo à realidade do aluno,
eles sentiram-se motivados e ficou claro que havia um conhecimento prévio, pois
eles conseguiram relacioná-los aos conceitos físicos do texto.
5 Conclusão
Trabalhar com textos científicos e não científicos, também contribuiu para a
efetivação do ensino, não apenas se resumindo a um novo conjunto de informações,
mas estabeleceu uma relação necessária para a compreensão e para um diálogo
inteligente com o mundo. Foi oportunizado ao aluno condições de problematizar
acerca de fenômenos ao seu redor, estabelecendo assim um avanço ao senso
comum; ajudando na sua capacidade de reestruturar uma representação junto às
interações produzidas, dando a possibilidade da construção e sintetização do que
aprendeu; de pensar e atuar de maneira flexível, crítica e produzindo o
conhecimento.
Foi possível realizar uma discussão integrada entre ciência, história, filosofia
e cultura, o que raramente se realiza em sala de aula.
A ideia que se discutissem textos de maneira interdisciplinar evidenciou que
a imaginação do homem é a ferramenta principal para a busca do conhecimento.
Cada qual com seus domínios, com seus valores e conhecimentos prévios, mas
sempre explorando o universo e se ajustando ao meio, muitas vezes por motivos
políticos, religiosos ou outros.
Ao final do processo, ficou evidente que a utilização dessa metodologia de
estudo, potencializou a possibilidade de uma aprendizagem diferenciada, pois
contribuiu muito ao superar o desinteresse do aluno, pois houve a conexão
necessária com outras áreas do saber, relacionando várias disciplinas, provocando
um novo discurso dos alunos, maneiras diferentes de pensar e falar, buscando suas
memórias e efetivando o processo da construção do conhecimento.
6 Referências
ALVARENGA, Beatriz; MÁXIMO, Curso de Física. 6. ed. São Paulo: Scipione, 2006.
AZEVEDO, Gislaine Campos; SERIACOPI, Reinaldo. História. 1. ed. São Paulo: Ática, 2008.
CAMPOS, Flávio de; MIRANDA, Renan Garcia. A Escrita da História. 1. ed. São Paulo: Escala Educacional, 2005
DCE – Diretrizes Curriculares da Educação Fundamental da Rede de Educação Básica do Estado do Paraná (versão eletrônica). http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação. Diretrizes Curriculares de Física para a Educação Básica. Curitiba, SEED, 2006.
ROCHA, J. F. et al. Origens e Evolução das Ideias da Física. Salvador. EDUFBA, 2002.
SOUZA, Paulo N. P. de e SILVA, Eurides Brito da. A nova LDB. São Paulo: Pioneira, 1997.
ZANETIC, J. Física e Cultura. Revista Ciência e Cultura (on line), vol 17, n.1, São Paulo, janeiro/abril, 2006. Disponível em: http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.
ARAUJO,B. A.. O Texto Científico. Disponível em: <http://www.ucb.br/prg/comsocial/cceh/index.htm>. Acesso em: 30 junho 2011.