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Quase Mário Sá Carneiro “Um pouco mais de sol – eu era brasa, Um pouco mais de azul – eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe de asa... Se ao menos eu permanecesse aquém... Assombro ou paz? Em vão... tudo esvaído Num grande mar enganador de espuma; E o grande sonho despertado em bruma, O grande sonho – ó dor! – quase vivido... Quase o amor, quase o triunfo e a chama, Quase o princípio e o fim – quase a expansão... Mas na minh’alma tudo se derrama.... Entanto nada foi só ilusão! De tudo houve um começo ... e tudo errou... - Ai a dor de ser – quase, dor sem fim... – Eu falhei-me entre os mais , falhei em mim, Asa que se lançou mas não voou...

Os Eleitos

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Poemas e literatura brasileira e portuguesa

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Page 1: Os Eleitos

Quase Mário Sá Carneiro

“Um pouco mais de sol – eu era brasa,Um pouco mais de azul – eu era além.Para atingir, faltou-me um golpe de asa...Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... tudo esvaídoNum grande mar enganador de espuma;E o grande sonho despertado em bruma,O grande sonho – ó dor! – quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,Quase o princípio e o fim – quase a expansão...Mas na minh’alma tudo se derrama....Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo ... e tudo errou...- Ai a dor de ser – quase, dor sem fim... –Eu falhei-me entre os mais , falhei em mim, Asa que se lançou mas não voou...

Page 2: Os Eleitos

Aniversário

Fernando Pessoa

NNo tempo em que festejava o dia dos meus anos,Eu era feliz e ninguém estava morto.Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma, De ser inteligente para entre a família,E de não ter esperanças que os outros tinham por mim.Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,O que fui de coração e parentesco.O que fui de serões de meia-província,O que fui de me amarem-me e eu ser menino,O que fui – ai, meu Deus!, o que só hoje sei o que fui...A que distância...(Nem o acho...)O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,Pondo grelado nas paredes...O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),

O que eu sou hoje é terem vendido a casa

É terem morrido todos, É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,

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Por uma viagem metafísica e carnal,Com uma dualidade de eu para mim...Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,

O aparador com muitas coisas – doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçadoAs tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!Não penses! Deixa o pensar na cabeça!Ó meu Deus, meu Deus!Hoje já não faço anos.Duro.Somam-se-me dias.Serei velho quando for.Mais nada.Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira !..

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos ! ...

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Conheço a Residência da Dor

Cecília Meireles

CConheço a residência da dor.É um lugar afastado,Sem vizinhos, sem conversa, quase sem lágrimas,Com umas imensas vigílias diante do céu.

A dor não tem nome,Não se chama, não atende.Ela mesma é solidão:Nada mostra, nada pede, não precisa.Vem quando quer.

O rosto da dor está voltado sobre um espelho,Mas não é rosto de corpo,Nem o seu espelho é do mundo.

Conheço pessoalmente a dor.A sua residência, longe,Em caminhos inesperados.

Às vezes sento-me à sua porta, na sombra das suas árvores.E ouço dizer:“Quem visse, como vês, a dor, já não sofria”.E olho para ela, imensamente.Conheço há muito tempo a dor.Conheço-a de perto.Pessoalmente.

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Sete Anos de Pastor Jacó Servia

Luís de Camões

Sete anos de pastor Jacó serviaLabão, pai de Raquel, serrana bela:Mas não servia ao pai, servia a ela,E a ela só por prêmio pretendia.Os dias, nas esperança de um só dia,Passava , contentando-se com vê-la:Porém o pai, usando de cautela,Em lugar de Raquel lhe dava Lia.Vendo o triste pastor que com enganosLhe fora assim negada a sua pastora,Como se a não tivera merecida,Começa a servir outros sete anos, Dizendo: - Mais servira, se não foraPara tão longo amor tão curta a vida!

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À Carolina

Fernando Pessoa

Querida, ao pé do leito derradeiroEm que descansas dessa longa vida,Aqui venho e virei, pobre querida, Trazer-te o coração do companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiroQue, a despeito de toda a humana lida,Fez nossa existência apetecidaE num recanto pôs um mundo inteiro.

Trago-te flores, - restos arrancadosDa terra que nos viu passar unidosE ora mortos nos deixa e separados.

Que eu, se tenho nos olhos malferidosPensamentos de ida formulados,São pensamentos idos e vividos.

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Além das Paredes, dos Móveis

Cecília Meireles

Além das paredes, dos móveis,Principalmente o espelho,Principalmente o relógio,

Além das portas com seus caminhos,Além da janela com seu pensar,

Estão as palavras.

As palavras pousadas aqui e ali,São invulneráveis.Fiéis a si mesmas.

As palavras não morrem.

Tão leves e cheias de eternidade.

E assim estão em redor de nós,Com sua substância,E há dentro delas eternos olhos Que nos fitam.

De um lado, a eterna estrela, e do outro a vaga incerta, meu pé dançando pela extremidade da espuma, e meu cabelo por uma planície de luz deserta.

Calada vigiarei meus dias

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Quanto mais vigiados, mais curtos Com que mágoa o horizonte avisto. Aproximado e sem recurso. Que pena! A vida ser só isso

O Universo Não é Uma Idéia Minha.

Fernando Pessoa - Albertp Caieiro.

O Universo não é uma idéia minha.A minha idéia de Universo é que é uma idéia minha.A noite não anoitece pelos meus olhos,A minha idéia da noite é que anoitece pelos meus olhos,Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentosA noite anoitece concretamenteE o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.

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Versos Íntimos

Augusto dos Anjos

Vês!, ninguém assistiu ao formidável Enterro de tua última quimera.Somente a ingratidão – esta pantera –Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!O Homem, que nesta terra miserável ,Mora entre feras, sente a inevitável Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!O beijo, amigo, é a véspera do escarro,A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se alguém causa ainda pena a tua chaga,Apedreja essa mão vil que te afaga, Escarra nessa boca que te beija!

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Mozart No Céu

Manuel Bandeira

No dia 5 de dezembro de 1791 Wolfgang Amadeus MozartEntrou no céu, como um artista de circo, fazendo piruetasExtraordinárias sobre um mirabolante cavalo branco.

Os anjinhos atônitos diziam: que foi? Que não foi?Melodias jamais ouvidas voavam nas linhas suplementaresSuperiores da pauta.Um momento se suspendeu a contemplação inefável.A Virgem beijou-o na testaE desde então wolfgang Amadeus Mozart foi o mais moço dos anjos.

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Como Alguém Que Acordou Muito Tarde.

Cecília Meireles

Como alguém que acordou muito tarde,e sente falta do dia passado,do dia desconhecidoque esteve sobre seus olhos fechados

repleto de movimento e dançatodos os dias choramos,

secretamente, sem lágrimas nem consciênciaalguma coisa que se passou fora de nós

E suspiramos com um suspiro vazio,e entristecemos, de repente.

Page 12: Os Eleitos

The Deserted Village

Oliver Goldsmith

Doce aldeia risonha, graciosos relvados,Teus prazeres fugiram, teus encantos retiraram-seQual névoa em teus jardins, vê-se a mão do tiranoE a desolação entristece todo o teu verde.Um senhor apenas é dono do lugar inteiroAumenta o júbilo dos ricos, os pobres decaem...”

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Nel Mezzo Del Camin...

Olavo Bilac

Chequei. Chegaste. Vinhas fatigada E triste, e triste e fatigada eu vinha, Tinhas a alma de sonhos povoada,E a alma de sonhos povoada eu tinha...

E paramos de súbito na estrada Da vida: longos anos, presa à minhaA tua mão, a vista deslumbradaTive da luz que o teu olhara continha.

Hoje segues de novo... Na partidaNem o pranto os teus olhos umedece,Nem te comoves com a dor da despedida.

E eu, solitário, voto a face, e tremo,Vendo o teu vulto que desapareceNa extrema curva do caminho extremo.

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O Tear

Olavo Bilac

A fieira zumbe, o piso estala, chiaO liço range o estambre na cadeira;A máquina dos tempos, dia a dia,Na música monótona vozeia.

Sem pressa, sem passar, sem alegria,Sem alma, o tecelão, que cabedeceia,Carda, retorce, estira, asseda, fia,Dobra e entrelaça, na infindável teia.

Treva e luz, ódio e amor, beijo e queixume,Consolação e raiva, gelo e chamaCombinam-se e consomem-se no urdume.

Sem princípio e sem fim, eternamentePassa e repassa a aborrecida tramaNas mãos do tecelão indiferente...

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Preparação Para a Morte.

Manuel Bandeira

A vida é um milagre.Cada flor,Com sua forma, sua cor, seu aroma,Cada flor é um milagre.Cada pássaro, Com sua plumagem, seu vôo, seu canto,Cada pássaro é um milagre.O espaço, infinito,O espaço é um milagre.O tempo, infinito,O tempo é um milagre.A memória é um milagreA consciência é um milagre.Tudo é milagre.Tudo, menos a morte.Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres.

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A Arte de Amar

Manuel Bandeira

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua almaA alma é que estraga o amor.Só em Deus ela pode encontrar satisfação,Não noutra alma.Só em Deus – ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

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A Um Poeta- Realismo

Antero de Quental

Tu que dormes, espírito sereno,Posto à sombra dos cedros seculares,Como um levita à sombra dos altares,Longe da luta e do fragor terreno,

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno,Afugentou as larvas tumulares...Para surgir do seio desses mares,Um mundo novo espera só um aceno...

Escuta! É a grande voz das multidões!São teus irmãos, quase erguem! São canções...Mas de guerra... e são vozes de rebate!

Ergue-te, pois soldado do Futuro,E dos raios de luz do sonho puro,Sonhador, faze espada de combate!

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A Um Poeta

Olavo Bilac

Longe do estéril turbilhão da rua,Beneditino, escreve! No aconchegoDo claustro, na paciência e no sossego,Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o empregoDo esforço; e a trama viva se construaDe tal maneira que a imagem fique nua,Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício Do Mestre. E, natural, o efeito agrade,Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a Beleza, gêmea da Verdade,Arte pura, inimiga do artifício, É a força e a graça na simplicidade.

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Berço

Bernardo Lopes

Recordo: um largo verde e uma igrejinha,Um sino, um rio, um pontilhão e um carroDe três juntas bovinas que ia e vinhaRinchando alegre, carregando barro.

Havia a escola, que era azul e tinhaUm mestre mau, de assustador pigarro...(Meus Deus! Que é isto? Que emoção a minhaQuando estas cousas tão singelas narro?)

Seu Alexandre, um bom velhinho ricoQue hospedara a Princesa; o tico-ticoQue me acordava de manhã, e a serra...

Com seu nome de amor Boa Esperança,Eis tudo quanto guardo na lembrançaDa minha pobre e pequenina terra!

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Busque Amor, Novas Artes, Novo Engenho

Luís de Camões

Busque Amor novas artes, novo engenho,Para matar-me, e novas esquivanças;Que não pode tirar-me as esperanças,Que mal me tirará o que eu não tenho.Olha de que esperanças me mantenho!Vede que perigosas seguranças !Que não temo contrastes nem mudanças,Andando em bravo mar, perdido o lenho.Mas, conquanto não pode haver desgostoOnde esperança falta, lá me escondeAmor um mal, que mata e não se vê;Que dias há que na alma me tem postoUm não sei quê, que nasce não sei onde,Vem não sei como, e dói não sei por quê

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Alma Minha Gentil, Que Te Partiste

Luís de Camões

Alma minha gentil, que te partisteTão cedo desta vida, descontente,Repousa lá no Céu eternamenteE viva eu cá na terra sempre triste.Se lá no assento etéreo, onde subiste, Memória desta vida se consente,Não te esqueças daquele amor ardenteQue já nos olhos meus tão puro viste.E se vires que pode merecer-teAlguma coisa a dor que me ficouDa mágoa, sem remédio, de perder-te,Roga a Deus, que teus anos encurtouQue tão cedo de cá me leve a ver-te,Quão cedo de meus olhos te levou.

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Profissão de Fé

Carvalho Junior

Odeio as virgens pálidas, cloróticas,Beleza de missal que o romantismoHidrófobo apregoa em peças góticas,Escritas nuns acessos de histerismo.

Sofismas de mulher, ilusões óticas,Raquíticos abortos do lirismo,Sonhos de carne, compleições exóticas,Desfazem-se perante o realismo.

Não servem esses vagos ideaisDa fina transparência dos cristais,Almas de santa e corpo de alfenim.

Prefiro a exuberância dos contornos,As belezas da forma, seus adornos,A saúde, a matéria, vida, enfim.

Page 23: Os Eleitos

Ás Vezes Em Dias de Luz Perfeita e Exata

Fernando Pessoa – Alberto Caieiro

Às vezes, em dias de luz perfeita e exata,Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,Pergunto a mim próprio devagar Por que sequer atribuo eu Beleza às coisas.

Uma flor acaso tem beleza?Tem beleza acaso um fruto?Não: tem cor e formaE existência apenas.

A beleza é o nome de qualquer cousa que não existeQue eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.Não significa nada.Então por que digo eu das coisas: são belas?

Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homensPerante as coisas,Perante as coisas que simplesmente existem.

Que difícil ser próprio e não ver senão o visível!

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Canção do Vento e da Minha Vida

Manuel Bandeira

O vento varria as folhas,O vento varria os frutos, O vento varia as flores...

O vento varria as luzesO vento varria as músicas, O vento varria os aromas...

E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De aromas, de estrelas, de cânticos.

O vento varria os sonhosE varria as amizades...O vento varrias as mulheres...E a minha vida ficavaCada vez mais cheia De afetos e de mulheres

O vento varia os mesesE varria os teus sorrisosO vento varria tudo!E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De tudo.

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O Que Nós Vemos Das Coisas São As Coisas

Fernando Pessoa – Alberto Caieiro

O que nós vemos das coisas são as coisas.Por que veríamos nós uma coisa se houvesse outra?Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos?Se ver e ouvir são ver e ouvir?

O essencial é saber ver.Saber ver quando se vêE nem pensar quando se vêNem ver quando se pensa.

Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!),Isso exige um estudo profundo,Uma aprendizagem de desaprenderE uma seqüestração na liberdade daquele conventoDe que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternasE as flores as penitentes convictas de um só dia,Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelasNem as flores senão flores,Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.

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Um Poema

Arquibald Mac Leish

Um poema deveria ser palpável e mudoComo um fruto redondo,Um poema deveria não ter palavras Como o vôo dos pássaros,Um poema não deveria significar coisa alguma E simplesmente ser

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Vôo

Cecília Meireles

A Darcy DamascenoAlheias e nossas as palavras voam.bando de borboletas multicores,as palavras voambando azul de andorinhas,bando de gaivotas brancas,as palavras voam.voam as palavrascomo águias imensas.Como escuros morcegoscomo negros abutres,as palavras voam.

Oh! alto e baixoem círculos e retasacima de nós, em redor de nósas palavras voam.

E às vezes pousam.

Abril, 1964

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Desencanto

Manuel Bandeira

Eu faço versos como quem choraDe desalento... de desencanto...Fecha o meu livro, se por agoraNão tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardenteTristeza esparsa... remorso vão...Dói-me nas veias. Amargo e quente,Cai, gota a gota, do coração.

E nesses versos de angústia roucaAssim dos lábios a vida corre,Deixando um acre sabor na boca. - Eu faço versos como quem morre.

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Consultório

Cecília Meireles

O doente quis ajudar no diagnóstico.Contou coisas antigas,Íntimas.

O médico sacudia a cabeça,Um pouco distraído.

O doente voltou a contar.Pôs uma vírgula que faltava.Tirou lá de um canto da memóriaUm pormenor que ficara na sombra.

O médico sacudia a cabeça.No seu dedo, a esmeralda resplandecia.Do tamanho de um grão de milho.E luminosa como um domingo ao ar livre.

O doente acabara a narrativa.A confissão.Era um doente bem intencionado.Um homem de consciência.

O médico levantou-se, e disse:“Muito bem. Aqui o aparelho é que vai falar a verdade.”

E começou a copiar os sinais que a máquina ditava.A máquina sabia mais que o doente.A máquina sabia mais que o médico.A máquina sabia mais que a vida.A máquina sabia mais que Deus.

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Dor Oculta

Guillherme de Almeida

Quando uma nuvem nômade destila gotas, roçando a crista azul da serra,umas brincam na relva; outras, tranqüila, serenamente entranham-se na terra.

E a gente fala da gotinha que errade folha em folha e, trêmula, cintila,mas nem se lembra da que o solo encerra,da que ficou no coração da argila!

Quanta gente, que zomba do desgosto mudo, da angústia que não molha o rostoE que não tomba, em gotas, pelo chão. Havia de chorar se adivinhasse que há lágrimas que correm pela face E outras que rolam pelo coração!

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Um Mover de Olhos, Brando e Piedoso

Luís de Camões

Um mover de olhos, brando e piedoso,Sem ver de quê; um riso brando e honesto,Quase forçado; um doce e humilde gesto,De qualquer alegria duvidoso;Um despejo quieto e vergonhoso;Um repouso gravíssimo e modesto;Uma pura bondade, manifestoIndício da alma, limpo e gracioso;Um encolhido ousar; uma brandura;Um medo sem ter culpa; um ar sereno;Um longo e obediente sofrimento:Esta foi a celeste formosuraDa minha Circe, e o mágico venenoQue pôde transformar meu pensamento.

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Paisagem e Silêncio

Cecíllia Meireles

O hirto cipestre com pássaros escondidos na rama crespa.A rendada folhagem das sucessivas acácias.Folhas coloridas, agaves, roseiras descendo entrelaçadas a encosta pedregosa

Para onde foram as borboletas que aqui dançaram ?

Os telhados muito velhos, ainda com clarabóias.Escuros vãos de janelas, tão velhos que não se avista ninguém.

Coníferas, palmeiras. Tudo imóvel,a não ser uma fumaça que sobe azuladamente entre as árvores.

O flanco da montanha, com seus verdes turvos,Com sua pedra riscada por sulcos de água.

Nuvens tempestuosas, grossas nuvens aquosasCrescendo insensivelmente, cinzentas, pardas, lívidas.São conchas monumentais, balaustradas, zimbórios frágeis.Montanhas aéreas de opalas foscas:

De repente, duas pequenas asas fugitivas:- o pombo branco.Atrás delas, igual a elas, assim clara, alta e rápida,Uma voz de crianças a correr.

Depois, entre o olhar e a tarde, Prossegue o silêncio.

Abril, 1954.

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Canção do Exíllio

Gonçalves Dias

“Kennst du das Land, wo die Citronen blühn, Im dunkeln Laub die Gold-Orangen glühn,Kennst du es wohl? – Dahin, dahin!Möcht ich... ziehn.”

( G( GOETHOETH ) )

Minha terra tem palmeiras,Onde canta o sabiá;As aves que aqui gorjeiam,Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,Nossas várzeas têm mais flores,Nossos bosques têm mais vida,Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho à noite,Mais prazer encontro eu lá;Minha terra tem mais palmeirasOnde canta o sabiá.

Minha terra tem primores,Que tais não encontro eu cá;Em cismar – sozinho, à noite –Mais prazer encontro eu lá;Minha terra tem palmeiras,Onde canta o sabiá.

Não permita Deus que eu morra,Sem que eu volte para lá;Sem que desfrute dos primoresQue não encontro por cá;Sem qu’inda aviste as palmeira,Onde canta o Sabiá .

“Conheces a região onde florescem os limoeiros?Laranjas de ouro ardem no verde-escuro da folhagem;(...) Conheces bem? Nesse lugarEu desejaria estar.”

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Diálogos No Jardim

Cecíllia Meireles Debaixo de tanto calor,O pássaro arranjou um ramo verde e fresco, E pôs-se a falar.

O pássaro perguntava-me:“Lembras-te das grandes árvores,com lágrimas douradas de resina?”

respondi-lhe que sim, que me lembrava,que naquele tempo ouvíramos falara em âmbar, e queríamos fazer colares de resina:mas em nossas mãos ela perdia a transparência.

“Lembras-te dos cajus maduros,caindo fofamente na folhagem morta do chão?”

respondi-lhe que sim, que ainda os via,muito longe, amarelos e túrgidos,às vezes, rebentados na queda,escorrendo, perfumosos sumo doce.

“Lembras-te das rodelinhas douradasque a folhagem e o sol balançavam por cima dos livros?”

Respondi-lhe que sim, e que eram livros de histórias,E foram depois romances, e um dia poemas,E mais tarde pensamentos difíceis...

E o passarinho perguntava:“Lembras-te da tua voz devolvida pelo eco?”

E eu me lembrava, mas não das palavras,Só que as respostas eram sempre incompletas.“E o recorte da montanha no horizonte,

Page 36: Os Eleitos

Lembras-te como era azul e negro? E as palmeiras?E as sebes de flores encarnadas?”

E eu me lembrava de tudo, e sentia o aroma da tarde, e o canto das cigarras, e o lamento dos sabiáse das rolas, e via brilhar a bola azul do telhado que amei tanto,e sentia, tão doce, a minha perpétua solidão.

E perguntei ao pássaro: “Onde estavas,para me perguntares tudo isso?Também já viveste tanto ?”

E ele me respondeu: “Não, tudo isso está no fundo dos teus olhos.Eu só vou perguntando o que estou lendo...E porque o leio, canto.”

Abril, 1956.

Page 37: Os Eleitos

Linha Reta

Cecíllia Meireles

Não tenteis interromper o pássaro que voa em linha retaDe leste a oeste. Alto e só.

Não lhe pergunteis se avista cidades, mares pessoas Ou se tudo é um liso deserto. Vasto e só.

Ele não passa para contemplar essas coisas do mundo.Ela vai de leste, ele vai para oeste. Alto e só.

Ele vai com sua música dentro dos olhos fechados.Quando chegar ao fim, abrirá os olhos e cantará sua música.Vasta e só.

Page 38: Os Eleitos

Por Quem Os Sinos Dobram

John Done

Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é umapartícula do continente, uma parte da terra; se um

torrão é arrastado para o mar, a Europa ficadiminuída, como se fosse um promontório,

como se fosse o solar do teus amigos ouo teu próprio; a morte de qualquer

homem me diminui, porque souparte do gênero humano.E por isso não perguntes

por quem ossinos sobram;eles dobram

por ti.

Page 39: Os Eleitos

Para Ser Grande

Fernando Pessoa Para ser grande, sê inteiro: nadaTeu exagera ou exclui.Sê todo em cada coisa. Põe quanto ésNo mínimo que fazes.Assim em cada lago a lua todaBrilha, porque alta vive.

Page 40: Os Eleitos

Momentos Num Café

Manuel Bandeira Quando o enterro passouOs homens que se achavam no caféTiraram o chapéu maquinalmenteSaudavam o morto distraídosEstavam todos voltados para a vidaAbsortos na vidaConfiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demoradoOlhando a esquife longamenteEste sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade

Que a vida é traiçãoE saudava a matéria que passavaLiberta para sempre da alma extinta.

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Perfeição

Olavo Billac

Nunca entrarei jamais no teu recinto:Na sedução e no fulgor que exalas,Ficas vedada, num radiante cintoDe riquezas, de gozos e de galas.

Amo-te, cobiçando-te... E, faminto,Adivinho o esplendor das tuas salas,E todo o aroma dos teus parques sinto, E ouço a música e o sonho em que te embalas.

Eternamente ao meu olhar ponpeias,E olho-te em vão, maravilhosa e bela,Adarvada de altíssima ameias.

E à noite, à luz dos astros, a horas mortas,Rondo-te, e arquejo, e choro, ó cidadela!Como um bárbaro uivando às tuas partas!

Page 42: Os Eleitos

Prelúdio

Cecília Meireles Trinta anos sobre a música.O violoncelo trouxe-lhe a casa,a janela sem cortina,um muro branco.uma árvore.Prelúdio

Trinta anos!O violoncelo chorava dentro de outra casaOutra janela sem cortinas.Nem muro branconem árvore.Prelúdio.

Pousada a face na mão, pensava:

Tinha passado tinta anos. Prelúdio.

Page 43: Os Eleitos

Amor é Fogo Que Arde Sem Se Ver

Luís de Camões Amor é fogo que arde sem se ver,É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente;É dor que desatina sem doer;É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gente;É nunca contentar-se de contente;É cuidar que se ganha em se perder;É querer estar preso por vontade;É servir a quem vence o vencedor;É ter com quem nos mata lealdade.Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amizade,Se tão contrário a si é o mesmo Amor ?

Page 44: Os Eleitos

As Três Orquídeas

Cecíllia Meireles

À Dom Marcos Barbosa

As três orquídeas do mosteiro fitam-me com seus olhos roxos.Elas são alvas, todas de pureza,com uma leve mácula violácea para um pureza de sonho triste, um dia.

Que dia? Que dia? Dói-me a sua brevidade.Ah! Não vêem o mundo. Ah! Não me vêem como eu as vejo.Se fossem de alabastro seriam mais amadas?Mas eu amo o eterno e o efêmero e queria fazer do efêmero o eterno.

As três orquídeas brancas eu sonharia que durassem,com sua nervura humana,a graça leve do seu desenho,o tênue caule de tão delicado verde.Se elas não vêem o mundo, que o mundo as visse.Quem pode deixar de sentir sua beleza?Antecipo-me em sofrer pelo seu desaparecimento.E paira sobre elas a gentileza igualmente frágil,a gentileza florilda mão que as trouxe para alegrar a minha vida.

Durai, durai, flores, como se estivésseis ainda no jardim do mosteiro amado onde fostes colhidasque escrevo para perdurardes em palavras,pois desejaria que para sempre vos soubessem,alvas, de olhos roxos (ah! Cegos?)Com leves tristezas violáceas na brancura de alabastro.

Agosto, 1964.

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Disposições Finais

Cecília Meireles

Não é preciso que me visitem, se estiver doente,Embora o convívio dos amigos seja, comumente, agradável.

Não é preciso que exclamem, por estar morta: “coitada !” “Que pena !”Embora seja esse o uso normal na terrena vida.

Não é preciso trazerem flores, embora o mundoDas flores seja como o dos mortos, profundo e belo.

Não é preciso vestirem luto, - nem isso a mais ninguém ocorre...- embora ajudasse a pagar quem morre, com mais sombra.

Não é preciso rezar ofícios, embora a minha sorteFosse esta de só pensar no que separa morte e vida

Não é preciso nenhuma notícia ou comentário avulso,embora eu sentisse o mundo bater no meu pulso, tão forte

Principalmente, não é preciso que ninguém chore nem me recorde com tristeza,porque seria absurdo, contra a natureza das coisas:

Os mortos não querem nada, no seu reino grande e frio,e estão livres de convenções, e nada vale o amor tardio. O amor, enfim.

Page 47: Os Eleitos

Tarde de Chuva na Infância

Cecília Meireles

Esta tarde é feita de trovões redondos,Dentro de morros de água.

É uma tarde de goiabas maduras, em cima da mesa.

De calda que ferve, com cravo e canela.

E que perfume no ar tempestuoso!

É uma tarde com vento molhado que bate nos bambus.

Com um galo sonolento que fecha os olhos de vez em quandoE torna abri-los para ver se a chuva passou.

É uma tarde para ler os primeiros livros,E procurar entender os enigmas da vida:“Nem por muito madrugar amanhece mais cedo”“Duro com duro não faz bom muro”“Uma andorinha só não faz verão”.

Page 48: Os Eleitos

Renúncia

Manuel Bandeira Chora de manso e no íntimo... ProcuraCurtir sem queixa o mal que te crucia:O mundo é sem piedade e até ririaDa tua inconsolável amargura.

Só a dor enobrece e é grande e é pura.Aprende a amá-la que a amarás um dia.Então ela será tua alegria,E será, ela só, tua ventura...

A vida é vã como a sombra que passa...Sofre sereno e d’alma sombranceira,Sem um grito sequer, tua desgraça.

Encerra em ti tua tristeza inteira.E pede humildemente a Deus que a façaTua doce e constante companheira...

Page 49: Os Eleitos

Chuva

Cecíllia Meireles Sobre as casas fechadas, a chuva.Sobre o sono dos homens, a chuva.Sobre os mortos inúmeros, a chuva.

A chuva noturna sobre as árvores,A chuva noturna sobre os templos,A chuva noturna sobre o mar,Sobra as solidão deste mundo, a chuva.A solidão da chuva, na solidão.

Abril, 1954.

Page 50: Os Eleitos

Archibald Mcleish

In Manuel Bandeira

Haverá pouca coisa a esquecer:O vôo dos corvos,Uma rua molhada, O modo do vento soprar,O nascer da lua, o pôr-do-sol,Três palavras que o mundo sabe,Pouca coisa a esquecer.

Será bem fácil de esquecer.A chuva pingaNa argila rasaE lava lábios, Olhos e cérebro.A chuva pinga na argila rasa.

A chuva mansa lavará tudo:O vôo dos corvos, O modo do vento soprar,O nascer da lua, o pôr-do-sol.Lavará tudo, até chegarAos duros ossos desnudados,E os ossos, os ossos esquecem.

Page 51: Os Eleitos

Essa Que Eu De Amar...

Guilherme de Almeida

Essa que eu hei de amar perdidamente um diaserá tão loura, e clara, e vagarosa, e bela,que eu pensarei que é o sol que vem, pela janelatrazer luz e calor a esta alma escura e fria.

E, quando ela passar, tudo o que eu não sentia da vida há de acordar no coração, que vela...e ela irá como o sol, e eu irei atrás delacomo sombra feliz... –tudo isso eu me dizia,

quando alguém me chamou. Olhei: um vulto louro,e claro, e vagaroso, e belo, na luz de ourodo poente, me dizia adeus, como um sol triste... e falou-me de longe: “eu passei a teu lado,mas ias tão perdido em teu sonho dourado,meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!”

Page 52: Os Eleitos

O Bicho.

Manuel Bandeira Vi ontem um bichoNa imundície do pátioCatando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,Não examinava nem cheirava:Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão.Não era um gato,Não era um rato.

O bicho, meus Deus, era um homem.

Page 53: Os Eleitos

Poema Só Para Jaime Ovalle

Manuel Bandeira

Quando hoje acordei, ainda fazia escuro(Embora a manhã já estivesse avançada).Chovia.Chovia uma triste chuva de resignaçãoComo contraste e consolo ao calor tempestuoso da noite.Então me levantei,Bebi o café que eu mesmo preparei, Depois me deitei novamente , acendi um cigarro e fiquei pensando...- Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.

Page 54: Os Eleitos

Língua Portuguesa

Olavo Bilac

Última flor do Lácio, inculta e bela, És a um tempo, esplendor e sepultura:Ouro nativo, que na ganga impuraA bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura,Tuba de alto clangor, lira singelaQue tens o trom e o silvo da procela,E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aromaDe virgens selvas e de oceano largo!Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”E em que Camões chorou, no exílio amargo,O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Page 55: Os Eleitos

Autopsicografia

Fernando Pessoa

O poeta é um fingidor.Finge tão completamenteQue chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreveNa dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve,Mas só a que eles não têm

E assim nas calhas de rodaGira, a entreter a razão, Esse comboio de cordaQue se chama o coração.

Page 56: Os Eleitos

Saudade

Guilherme de Almeida

Só.Para além da janela,nem uma nuvem, nem uma folha amarelamanchando o dia de ouro em pó...mas, aqui dentro, quando bruma,quanta folha caindo, uma por uma,dentro da vida de quem vive só!

Só – palavra fingida,palavra inútil, pois quem sente saudade nunca está sozinho: e a gente tem saudade de tudo nesta vida...de tudo! De uma esperapor uma tarde azul de primavera:de um silêncio, da música de um pécantando pela escada;de um véu erguido, de uma boca abandonada;de um divã; de um adeus; de uma lágrima até!

No entanto, no momento,tudo isso passa na asa do vento, somo um simples novelo de fumaça...e é só depois de velho, numa tarde esquecida,que a gente se surpreende a resmungar:“Foi tudo o que vivi de toda a minha vida”E começa a chorar...

Page 57: Os Eleitos

Mar Português

Fernando Pessoa

Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraramQuantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a penaSe a alma não é pequena.Quem quer passar além do BojadorTem que passar além da dor.Deus ao mar o perigo e o abismo deu,Mas nele é que espelhou o céu.

Page 58: Os Eleitos

Cartas de Amor

Guillherme de Almeida Todas as cartas de amor são ridículas.Não seriam cartas de amor se não fossem Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,Como as outras, Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,Têm de ser Ridículas.

Mas, afinal,Só as criaturas que nunca escreveramCartas de amorÉ que são Ridículas.

A verdade é que hoje As minhas memórias Dessas cartas de amor É que são Ridículas (Todas as palavras esdrúxulas,Como os sentimentos esdrúxulos,São naturalmente Ridículas.)

Page 59: Os Eleitos

Canção Entre Parênteses

Guilherme de Almeida

Que bom que você veio!

(Estava de ouro na janela o poente:e cerrei a janela calmamente;

no meu cigarro havia um céu inteiroe deixei-o apagar-se no cinzeiro;

o romance que eu lia era o mais lindo:e marquei minha página, sorrindo;

o meu sorriso era o melhor que existe:e desfolhei-o, docemente triste;

a frase que eu pensava era tão louca:e fechei para um beijo a minha boca:

nos meus olhos a vida ia cantando:e olhei para você quase chorando...)

Que bom que você veio!

Page 60: Os Eleitos

MMEUSEUS OITOOITO ANOSANOS

Oh! Souvenirs! Printemps! Ourores!

Oh! Que saudades que tenho Livre filho das montanhas,Da aurora da minha vida, Eu ia bem satisfeito,Da minha infância querida Da camisa aberto o peito,Que os anos não trazem mais! - Pés descalços, braços nus -Que amor, que sonhos, que flores, Correndo pelas campinas

À roda das cachoeiras,Naquelas tardes fagueiras Atrás das asas ligeirasÀ sombra das bananeiras, Das borboletas azuis !Debaixo dos laranjais! Naqueles tempos ditososComo são belos os dias Ia colher as pitangas,Do despontar da existência Trepar a tirar mangas,- respira a alma inocência Brincava à beira do mar;como perfumes a flor; Rezava às Ave-Marias,o mar é – largo sereno, Achava o céu sempre lindo,o céu – um manto azulado, Adormecia sorrindoo mundo – um sonho dourado, E despertava a cantar!a vida – um hino d’amor! Oh! que saudades que tenhoQue auroras, que sol, que vida, Da aurora da minha vida,Que noites de melodia Da minha infância queridaNaquele doce alegria, Que os anos não trazem mais!Naquele ingênuo folgar! _ Que amor, que sonhos, que flores,O céu bordado d’estrelas, Naquelas tardes fagueirasA terra de aromas cheia, À sombra das bananeiras,As ondas beijando a areia Debaixo dos laranjais!E a lua beijando o mar!

Oh! Dias da minha infância! ( Á( ÁLVARESLVARES DEDE A AZEVEDOZEVEDO ) )Oh! Meu céu de primavera!Que doce a vida não eraNessa risonha manhã!Em vez das mágoas de agora,Eu tinha nessas delíciasDe minha mãe as caríciasE beijos de minha irmã!

“Oh! Lembranças! Primaveras! Aurora!”

Page 61: Os Eleitos

Cárcere Das Almas

Cruz e Souza

Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,Soluçando nas trevas, entre as gradesDo calabouço olhando imensidadesMares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza Quando a alma entre grilhões as liberdadesSonha e sonhando, as imortalidadesRasga no etéreo Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadasNas prisões colossais e abandonadas,Da Dor do calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves, Que chaveiro do céu possui as chavesPara abrir-vos as portas do Mistério?!

Page 62: Os Eleitos

Os Lusíadas – Primeiro Canto

Luís de Camões

As armas e os barões assinaladosQue da Ocidental praia lusitana,Por mares nunca dantes navegadosPassaram ainda além da Taprobana,Em perigos e guerras esforçadosMais do que prometia a força humana,E entre gente remota edificaramNovo Reino que tanto sublimaram;

E também as memórias gloriosas Daqueles Reis que foram dilatando A Fé, o Império, e as terras viciosasDe África e de Ásia andaram devastando,E aqueles que por obras valorosasSe vão da lei da morte libertando:Cantando espalharei por toda a parte,Se a tanto me ajudar o engenho e arte

Cessem do sábio Grego e do TroianoAs navegações grandes que fizeram:Cale-se de Alexandre e de Trajano A fama das vitórias que tiveram:Que eu canto o peito ilustre Lusitano,A quem Neptuno e Marte obedeceram.Cesse tudo o que a musa antiga canta,Que outro valor maior se alevanta

E vós Tágides minhas, pois criadoTendes em mim um novo engenho ardente,Se sempre, em verso humilde, celebradoFoi de mim vosso rio alegremente,Dai-me agora um som alto e sublimado,Um estilo grandíloco e corrente,

Page 63: Os Eleitos

Por que de vossas águas Febo ordeneQue não tenha inveja às de Hipocrene.

Dai-me uma fúria grande e sonorosaE não de agreste avena ou flauta rude,Mas de tuba canora e belicosa,Que o peito acende e a cor ao gesto muda.Dai-me igual canto aos feitos da famosaGente vossa, que a Marte tanto ajuda; Que se espalhe e se cante no Universo, Se tão sublime preço cabe em verso.

E vós, ó bem nascida segurançaDa Lusitana antiga liberdade, E não menos certíssima esperançaDe aumento da pequena Cristandade,Vós, ó novo temor da Maura lança,Maravilha fatal da nossa idade, Dada ao mundo por Deus, que todo o mande, Para do mundo a Deus dar parte grande.

Vós, tenro e novo ramo florescente,De uma árvore, de Cristo mais amadaQue nenhuma nascida no Ocidente,Cesárea ou Cristianíssima chamada,Vede-o no vosso escudo, que presenteVos amostra a vitória já passada,Na qual vos deu por armas e deixouAs que Ele para si na Cruz tomou;

Vós, poderoso Rei, cujo alto ImpérioO Sol, logo em nascendo, vê primeiro;Vê-o também no meio do Hemisfério,E, quando desce, o deixa derradeiro;Vós, que esperamos jugo e vitupérioDo torpe Ismaelita cavaleiro,Do Turco Oriental e do GentioQue ainda bebe o licor do santo Rio;

Page 64: Os Eleitos

Um Pássaro Pia Sob a Chua Noturna

Cecília Meireles

Um pássaro pia sob a chuva noturna.

Que socorro pode ter?

São muitos os fios d’água,muitas as folhas das árvores,muitas as trevas da noite:

- de que lado vem a pequena voz assustada?

Talvez haja sobre-humanas caridadespara os sofrimentos das vidas inumanas.Por que apenas os homens ousariam esperar compaixões?

E de que tamanho será uma noite como esta para um pássaro que sofre, ente águas e trevas?

Page 65: Os Eleitos

Felicidade

Guilherme de Almeida

Ela veio bater à minha portaE falou-me, a sorrir, subindo a escada:“Bom dia, árvore velha e desfolhada!”E eu respondi: “Bom dia, folha morta!”

Entrou e nunca mais me disse nada.Até que um dia ( quando, pouco importa!)Houve canções na ramaria tortaE houve bando de noivos pela estrada...

Então chamou-me e disse: “Vou-me embora!”Sou a Felicidade! Vive agoraDa lembrança do muito que te fiz”

E foi assim que, em plena primavera,Só quando ela partiu, contou quem era...E nunca mais eu me senti feliz!

Page 66: Os Eleitos

Humorismo

Guilherme de Almeida

Sossego macio da tarde.Um sol cansadoPassa pelo rosto suadoUma nuvenzinha alva como um lençoPara enxugar as primeiras estrelas.Silêncio.

E o sol vai caminhando sobre os montes tranqüilos,Vai cochilando. E de repenteTropeça e cai redondamenteSob a pateada dos sapos e a vaia dos grilos.

Page 67: Os Eleitos

No Meio do Caminho

Carlos Drummond de Andrade

No meio do caminho tinha uma pedratinha uma pedra no meio do caminhotinha uma pedrano meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimentona vida de minhas retinas tão fatigadas.nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedratinha uma pedra no meio do caminhono meio do caminho tinha uma pedra.

Page 68: Os Eleitos

O Carrasco

Cecíllia Meireles

Todos os dias vinha o carrasco dizia-lhe- Estende as mãos, para torcer-te os dedos,- Não poderás fazer mais nada no mundo,serás um homem inutilizado.

Todos os dias chorava de joelhos:- Não me tires as mãos, porque não te poderei socorrer.Nem enxugar as lágrimas, se sofreres.Nem coroar-te de fores, se ainda fores feliz.Porque lembra-te que és meu filho!

Mas o carrasco dizia-lhe:- Não me comovo. Eu sou o vingador. O sucessor. Estende as mãos.

Um dia não chorou mais.Suas mãos tinham secado. Já não doíam.

O carrasco estava na sua frente, estupefato.Então já não o podia fazer sofrer?

Fevereiro, 1954.

Page 69: Os Eleitos

Fragmentos

Carlos Drummond de Andrade

Não faças versos sobre acontecimentos Não há criação nem morte perante a poesia. Diante dela, a vida é um sol estático, não aquece nem ilumina. As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Não faça poesia com o corpo, esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Penetra surdamente no reino das palavras.Lá estão os poemas que esperam ser escritos.Estão paralisados, mas não há desespero,há calma e frescura na superfície intata.Ei-los, sós e mudos, em estado de dicionário.

Page 70: Os Eleitos

As Pérolas

Cecília Meireles O mercador dizia-me que as pérolas deste colar Levaram dez anos a ser reunidasPequenas pérolas – de que mares? – de que conchas?- menores que lágrimas, apenas maiores que grãos de areia, transpiração das flores.Talvez o mercador mentisse. Mas a própria mentiranão perturbava a beleza das pérolas. E eu via dez anos, de mar em mar, em muitas mãos escuras e magras, sob longos olhares pacientes, aquele pequeno orvalho medido, perfurado, enfiado para uma criatura de muito longe,desconhecida e inesperada, que um dia tinha de recebê-las aqui.

Maio, 1954.

Page 71: Os Eleitos

Viagem

Cecília Meireles

Eu canto porque o instante existeE a minha vida está completaNão sou alegre nem sou triste:Sou poeta.

Irmão das coisas fugidiasNão sinto gozo nem tormentoAtravesso noites e diasNo vento.

Se desmorono ou se edifico,Se permaneço ou me desfaço- não sei, não sei. Não sei se fico ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.Tem sangue eterno a asa ritmada.E um dia sei que estarei mudo - mais nada.

Page 72: Os Eleitos

Os Sapos

Manuel Bandeira

Enfunando os sapos,Saem da penumbra,Aos pulos, os sapos.A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,Berra o sapo-boi:-“Meu pai foi à guerra!”-“Não foi!” – “foi!” – “Não foi!”

O sapo-tanoeiro,Parnasiano aguado,Diz: -“Meu cancioneiroÉ bem martelado.

Vede como primo Em comer os hiatos!Que arte! E nunca rimoOs termos cognatos.

O meu verso é bomFrumento sem joio.Faço rimas comConsoantes de apoio.

Vai por cinqüenta anosQue lhes dei a norma:Reduzi sem danosA fôrma a forma.

Clame a saparia Em críticas céticas:

Page 73: Os Eleitos

“Não há mais poesiaMas há arte poética.

Page 74: Os Eleitos

Urra o sapo-boi:-“Meu pai foi rei” –“Foi!”-“Não foi!” –“Foi!” – “Não foi!”.

Brada em um assomo o sapo-tanoeiro:-“A grande arte é como Lavor de joalheiro.

Ou bem estatuário.Tudo quando é belo,Tudo quanto é vário,Canta no martelo.”

Outros, sapos-pipas(Um mal em si cabe).Falam pelas tripas:-“Sei!” – “Não sabe!” – “Sabe!”.

Longe dessa grita,Lá onde mais densa A noite infinitaVerte a sombra imensa;

Lá fugido ao mundo,Sem glória, sem fé,No perau profundoE solitário, é

Que soluças tu,Transido de frio,Sapo cururuDa beira do rio...

Page 75: Os Eleitos

Soneto Da Separação

MVinícius de Moraes

De repente do riso fez-se o prantoSilencioso e branco como a brumaE das bocas unidas fez-se a espumaE das mãos espalma das fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o ventoQue dos olhos desfez a última chamaE da paixão fez-se o pressentimentoE do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repenteFez-se de triste o que se fez amanteE de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo o distanteFez-se da vida uma aventura erranteDe repente, não mais que de repente

Page 76: Os Eleitos

Dia da Rosa

Cecília Meireles

À Lúcia Machado de Almeida

No primeiro dia, foi apenas um mistério de seda e néctar.Fechada como um sono.Uma abelha rodava, descobrindo-aO resto ficava desatendo àquele silêncio.

No entanto, cada minuto se movia naquela haste.invisível e ativo:ali também reinava o tempo.

No segundo dia, foi como um sorriso, um olhar levantando pálpebras translúcidas.um rosto aparecendo na sombra, redondo e claro. E ninguém podia deixar de ser alegre, vendo-a

No terceiro dia, todas as suas sedas se expandiram.Parecia uma voz, um cântico.Pensei que fosse morrer, nessa abundância,mas apenas se debruçava em perfume.E, como borboletas ou pássaros, as pessoas vinham sentir, extasiadas, seu aroma De fruta e mel.

(o ar estava mudado: tudo eram ímãs de frescura.)

No entanto, deixou cair subitamente aquela glória de aromas e sedas,aquele vestuário efêmero e radioso.Ficou sendo somente um coração coroadocom leves espinho eterno de ouro.

Page 77: Os Eleitos

Mas ninguém mais amava essa infinita beleza póstuma.O esquema secreta da vida, que ali se manifestava:Início, biografia continuação!

Arte Poética

Verlaine

Música, antes de qualquer coisa,E para tal prefere o ímpar,Mais vago e mais solúvel no ar,Sem nada que lhe pese ou que lhe pouse.

É preciso também que não vás nuncaEscolher tuas palavras sem algum engano:Nada mais caro que a canção cinzentaOnde o indeciso se junta ao preciso.

São belos olhos atrás dos véus,É a grande luz trêmula do meio-dia,É através do morno céu de outono,O azul desordenado das claras estrelas!

Porque nós queremos ainda o Matiz,Não a cor, nada senão o Matiz!Oh! Só o Matiz vinculaO sonho ao sonho e a flauta à trompa!

Foge para longe da Piada assassina,Do Escript cruel e do Riso impuro,Que fazem chorar os olhos do Azul,E todo este alho de baixa cozinha!

Toma a eloqüência e torce-lhe o pescoço!

Page 78: Os Eleitos

Farás bem, com um pouco de energia,Em tornar a rima um pouco razoável:Se não a vigiarmos, até onde irá?

Oh, o que dizer dos danos da Rima!Que criança surda ou que negro loucoNos forjou essa jóia de um vintémQue soa oca e falsa sob a lima?

A música, ainda e sempre!Que teu verso seja a coisa fugidiaQue sentimos escapar de uma alma em caminhada

Na direção de outros céus e de outros amores.

Que teu verso seja a boa aventuraEsparsa no vento crispado da manhãQue vai florindo a hortelã e o timo...E todo o resto é literatura.

Page 79: Os Eleitos
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As Pombas

Raimundo Correia

Vai-se a primeira pomba despertada...Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenasDe pombas vão-se dos pombais, apenasRaia sangüínea e fresca a madrugada...

E à tarde, quando a rígida nortadaSopra, aos pombais de novo elas, serenas,Ruflando as asas, sacudindo as penas,Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam,Como voam as pombas dos pombais:

No azul da adolescência as asas soltam,Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,E eles aos corações não voltam mais...

Page 81: Os Eleitos

Irene No Céu

Manuel Bandeira

Irene pretaIrene boaIrene sempre de bom-humor.

Imagino Irene entrando no céu:Licença, meu branco!E São Pedro bonachão:Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.

Page 82: Os Eleitos

Correspondência

Baudelaire A natureza é um tempo onde vivos pilares Deixam escapar por vezes confusas palavras;O homem por aí passa entre florestas de símbolosQue o observam com olhos familiares.Como longos ecos que ao longe se confundem Numa tenebrosa e profunda unidade,Imensas como a noite e como a claridade,Os perfumes, a cores e os sons se correspondem.Há perfumes tão frescos como carnes de infantes,Doces como oboés, verdes como pradariase outros estrados, ricos e triunfantes,tendo a expansão das coisas infinitascomo âmbar, o almíscar, o benjoim, o incenso,que cantam os êxtases do espírito e dos sentidos.Forças originais, essência, graçaDe carnes de mulher, delicadezas...Tudo esse eflúvio que por ondas passaDo Éter nas róseas e áureas correntezas...Cristais diluídos de clarões álacre,Desejos, vibrações, ânsias, alentos,Fulvas vitórias, triufamentos acres,Os mais estranhos estremecimentos...

Flores negras do tédio e flores vagasDe amores vãos, tantálicos, doentios...Fundas vermelhidões de velhas chagasEm sangue, abertas, escorrendo em rios...

Tudo! Vivo e nervoso e quente e forte,Nos turbilhões quiméricos do sonho,

Page 83: Os Eleitos

Passe, cantando, ante o perfil medonhoE o tropel cabalístico da Morte...

Crepúsculo Na Mata

Guillherme de Almeida

Na tarde tropical, arfa e pesa a atmosfera. A vida, na floresta abafada e sonora, úmida exalação de aromas evapora, E no sangue, na seiva e no húmus acelera.

Tudo, entre sombras, - o ar e o chão, a fauna e a flora, A erva e o pássaro, a pedra e o tronco, os ninhos e a hera, A água e o réptil, a folha e o inseto, a flor e a fera, - tudo vozeia e estala em esto de pletora

o amor apresta o gozo e o sacrifício na ara: guichos, berros zinir, silvar, ululos de ira, ruflos, chilros, frufrus, balidos de ternura...

Súbito, excitação declina, a fere pára: E misteriosamente, em gemido que expira, Um surdo beijo morno alquebra a mata escura...

Page 84: Os Eleitos

Mãos Dadas

Manuel Bandeira

Não serei o poeta de um mundo caduco.Também não cantarei o mundo futuro.Estou preso à vida e olho meus companheiros.

Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.Entre eles, considero a enorme realidade.O presente é tão grande, não nos afastemos,Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadasNão serei o cantor de uma mulher, de uma história,não direi os suspiros ao anoitecer, já paisagem vista da janela,Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicidasNão fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.O tempo é a minha matéria, o tempo pressente, os homens pressentes A vida presente.

Page 85: Os Eleitos

Nise? Nise? Onde Estás? Aonde Espera

Cláudio Manoel da Costa

Nise? Nise? onde estás? aonde esperaAchar-te uma alma, que por ti supira,Se quanto a vista se dilata, e gira,Tanto mais de encontar-te desespera!

Ah se ao menos teu nome ouvir puderaEntre esta aura suave, que respira!Nise, cuido, que diz; mas é mentira.Nise, cuidei que ouvia; e tal não era.

Grutas, troncos, penhascos da espessura,Se o meu bem, se a minha alma em vós se escondeMostrai, mostrai-me a sua formosura.

Nem ao menos o eco me responde!Ah como é certa a minha desventura!Nise? Nise? onde estás? aonde? aonde?

Page 86: Os Eleitos

Cansaço

Fernando Pessoa

O que há em mim é sobretudo cansaço –Não disto nem daquilo,Nem sequer de tudo ou de nada:

A sutileza das sensações inúteis,As paixões violentas por coisa nenhuma,Os amores intensos por o suposto em alguém,Essas coisas todas –Essas e o que falta nelas eternamente -;Tudo isso faz um cansaço,Este cansaço,Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,Há sem dúvida quem deseje o impossível,Há sem dúvida quem não queira nada –Três tipos de idealista, e eu nenhum deles:Porque eu amo infinitamente o infinito,Porque eu desejo impossivelmente o impossível,Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,Ou até se não puder ser...E o resultado?Para eles a vida vivida ou sonhada,Para eles a média entre tudo e nada, isto é isto...Para mim só um grande, um profundo,E, ah com que felicidade infecundo cansaço,

Page 87: Os Eleitos

Um supremíssimo cansaço,Íssimo, íssimo, íssimo, Cansaço.

Page 88: Os Eleitos

Serenata

Cecília Meireles

Repara na canção tardiaQue timidamete se eleva,Num arrulho de fonte fria

O orvalho treme sobre a trevaE o sonho da noite procuraA voz que o vento abraça e leva.

Repara na canção tardiaQue oferece a um mundo desfeitoSua flor de melancolia.

É triste, mas tão perfeito,O movimento em que murmura,Como o do coração no peito.

Repara na cação tardiaQue por sobre o teu nome, apenasDesenha a sua melodia.

E nessas letras tão pequenas O universo inteiro perdura.E o tempo suspira na altura

Por eternidades serenas.

Page 89: Os Eleitos

Eu Via a Rápida Pillhagem do Tempo

Ausome

Eu via a rápida pilhagem do tempo fugidioE, apenas nascida, envelheceram as rosas;E eis que, enquanto eu falo, se desfaz a rútila Cabeleira das flores vermelhas e o soloBrilha resplandecente de púrpura.Tantas formas, tantos nascimentos e mudanças váriasUm só dia aparecem e neste mesmo dia encontram o fim.Queixamo-nos, ó natureza, da brevidade de tanta Coisa bela; imediatamente tomas os dons que nos ofertasO tempo das rosas é o tempo de um dia;Rápida, sua velhice se junta à adolescência:Aquela que, ao nascer, viu brilhar o astro da manhãEnvelhecida contempla-a no seu regresso à tarde.Pior, pois se poucos momentos lhe restamProlonga-lhe, por seu raios, a existência.Colhe, virgem, as rosas, enquanto a flor é novaE nova a tua juventude e relembraQue assim também se apressa o tempo de tua vida.

Page 90: Os Eleitos

O Tempo

Padre Antônio Vieira

“O primeiro remédio que dizíamos, é o tempo. Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Atreve-se o tempo a coluna de mármores, quanto mais a corações de cera? São as afeições como a vida, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito. São como as linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas. Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino, porque não há amor tão robusto que chegue a ser velho. De todos os Instrumentos com que o armou a natureza, o desarma o tempo. Afrouxa-lhe o arco, com que já não atira; embota-lhe as setas, com que já não fere; abre-lhe os olhos, com que vê o que não via; e faz-lhe crescer as asas, com que voa e foge. A razão natural de toda esta diferença, é porque o tempo tira a novidade às coisas, descobre-lhes os defeitos, enfastia-lhe o gosto, e bastam que sejam usadas para não serem as mesmas. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor? O mesmo amar é causa de não amar, e o ter amado muito, de amar menos.”

Page 91: Os Eleitos

Vou-me Embora Pra Pasárgada

Manuel Bandeira Vou-me embora pra PasárgadaLá sou amigo do reiLá tenho a mulher que eu queroNa cama que escolhereiVou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra PasárgadaAqui eu não sou felizLá a existência é uma aventuraDe tal modo inconseqüenteQue Joana a Louca de EspanhaRainha de falsa dementeVem a ser contraparenteDa nora que nunca tive

E como farei ginásticaAndarei de bicicletaMontarei em burro braboSubirei no pau de sebo Tomarei banhos de mar!E quando estiver cansadoDeito na beira do rioMando chamar a mãe-d’águaPra me contar as históriasQue no tempo de eu menino Rosa vinha me contarVou-me embora pra pasárgada

Em Pasárgada tem tudoÉ outra civilização Tem um processo seguroDe impedir a concepção Tem telefone automático

Page 92: Os Eleitos

Tem alcalóide à vontadeTem prostitutas bonitasPara a gente namorarE quando eu estiver mais tristeMas triste de não ter jeitoQuando de noite me derVontade de me matar- Lá sou amigo do rei –terei a mulher que eu querona cama que escolhereivou-me embora pra Pasárgada

Antífona

Cruz e Souza

Ó formas alvas, brancas, Formas clarasDe luares, de neves, de neblinas!...Ó formas vagas, fluidas, cristalinas...Incensos dos turíbulos das aras...Formas do Amor, constelarmente puras,De virgens e de Santas vaporosas...Brilhos errantes, mádidas frescurasE dolências de lírios e de rosas...

Indefiníveis músicas supremas,Harmoniosas da Cor e do Perfume...Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...

Visões, salmos e cânticos serenos,

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Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...Dormências de volúpicos venenosSutis e suaves, mórbidos, radiantes...

Infinitos espíritos dispersos,Inefáveis, edênico, aéreos,Fecundai o Ministério destes versosCom a chama ideal de todos os mistérios.

Do sonho as mais azuis diafaneidadesQue fuljam, que na Estrofe se levatemE as emoções, todas as castidadesDa alma do Versos, pelos veros cantem.

Que o pólen de ouro dos mais finos astros Fecunde e inflame a rima clara e ardente...Que brilhe a correção dos alabastrosSonoramente, luminosamente.

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De Rosa e de Açucena

Garcilaso de La Veja

Enquanto que de rosa e de açucenase mostra a viva cor do vosso gestoe que o vosso olhar, ardente, honesto,acende o coração e o refreia:

e enquanto o seu cabelo que no veiodo ouro foi escolhido, em vôo prestopelo formoso colo branco, ereto,o vento move, espalha e desordena;

colhei de vossa alegre primaverao doce fruto antes que o tempo airado cubra de neve este formoso cume.

pois murchará a rosa o vento frioe tudo alterará ligeira a idadepara não trazer mudança ao seu costume.

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Simplicidade, Simplicidade

Guillherme de Almeida Simplicidade... simplicidade...Ser como as rosas, o céu sem fim,A árvore, o rio... Por que não há de Ser toda gente também assim?

Ser como as rosas: bocas vermelhasQue não disseram nunca a ninguémQue têm perfumes... Mas as abelhas E os homens sabem o que elas têm!

Ser como o espaço, que é azul de longe,De perto é nada...Mas quem o vê- árvores, aves, olhos de longe...busca-o sem mesmo saber por quê.

Ser como o rio cheio de graça,Que move o moinho, dá vida ao lar, Fecunda as terras... E, rindo, passa,Despretensioso, sempre a cantar.

Ou ser como a árvore: aos lavradoresDá lenha e fruto, da sombra e paz;Dá ninho às aves; ao inseto, flores...Mas nada sabe do bem que faz.

Felicidade – sonho sombrio!Feliz é o simples que sabe serComo o ar, as rosas, a árvore, o rio:

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Simples, mas simples sem o saber!

Retrato

Cecília Meireles Eu não tinha este rosto de hoje,assim calmo, assim triste, assim magro,nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas;eu não tinha este coraçãoque nem se mostra.

Eu não dei por esta mudançatão simples, tão certa, tão fácil: - Em que espelho ficou perdida a minha face?

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A Arte de Ser Feliz

Cecília Meireles

HOUVE um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa e sentia-me completamente feliz.

HOUVE um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém a minha alma ficava completamente feliz.

HOUVE um tempo em que minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, a às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz.

HOUVE um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.

Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz.

Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas

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brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Ás vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz.

Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

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Ismália

Alphonsus de Guimaraens Quando Ismália enlouqueceu,Pôs-se na torre a sonhar...Viu uma lua no céu,Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,Banhou-se toda em luar...Queria subir ao céu,Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,Na torre pôs-se a cantar...Estava perto do céu,Estava longe do mar...

E como um anjo pendeuAs asas para voar...Queria a lua do céu,Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deuRuflaram de par em par...Sua alma subiu ao céu,Seu corpo desceu ao mar...

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Brandas Ribeiras, Quanto Estou Contente

Cláudio Manoel da Costa Brandas ribeiras, quanto estou contenteDe ver-nos outra vez, se isto é verdade!quanto me alegra ouvir a suavidade,Com que Fílis entoa a voz candente!

Os rebanhos, o gado, o campo, a gente,Tudo me está causando novidade;Oh como é certo, que a cruel saudadeFaz tudo, do que foi, mui diferente!

Recebei (eu vos peço) um desgraçado,Que andou até agora por incerto giroCorrendo sempre atrás do seu cuidado:

Este pranto, estes ais, com que respiro,Podendo comover o vosso agradoFaçam digno de vós o meu suspiro

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A Hóspede

Guilherme de Almeida

NNÃOÃO precisas bater quando chegares.Toma a chave de ferro que encontraressobre o pilar, ao lado da cancela, e abre com elaa porta baixa, antiga e silenciosa.Entra. Aí tens a poltrona, o livro, a rosao cântaro de barro e o pão de trigo O cão amigopousará nos teus joelhos a cabeça.Deixa que a noite, vagarosa, desça.Cheiram a relva e sol, na arca e nos quartos, os linhos fartos,e cheira a lar o azeite da candeia.Dorme. Sonha. Desperta. Da colmeianasce a manhã de mel contra a janela. Fecha a cancelae vai. Há sol nos frutos dos pomares.Não olhes para trás quando tomareso caminho sonâmbulo que desce. Caminha – e esquece.

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Rondó Do Muito Triste

Guilherme de Almeida

DDAA triste vida que eu vivoo menos triste é a tristeza.muito mais triste é a incertezaessa falta de motivopara viver como eu vivosó de surpresa em surpresa, cada vez mais sendo presadas coisas de que me privoe sujeito, embora esquivo,às ordens da natureza:causadora, com certeza, desse gosto negativo da triste vida que eu vivo.

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Coitado Que Em Um Tempo Choro e Rio

Luís de Camões

CCOITADOOITADO que em um tempo choro e rio:Espero e temo, quero e aborreço:Juntamente me alegro e entristeçoDe uma cousa confio e desconfio.

Avôo sem asas; estou cego e guioE no que valho mais menos mereço:Calo e dou vozes, falo e emudeço.Nada me contradiz, e eu aporfio.

Qu’ria, ser se pudesse, o impossível;Qu’ria poder mudar-me, e estar quedo:Usar de liberdade, e ser cativo;

Queria que visto fosse e invisível;Qu’ria desenredar-me, e mais me enredo:Tais os extremos em que triste vivo.

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Retrato de Mulher Triste

Cecília Meireles

VVESTIUESTIU-SESE para um baile que não háSentou-se com suas últimas jóias.E olha para o lado, imóvel.

Está vendo os salões que se acabaram,Embala-se em valsas que não dançou,Levemente sorri para um homem.O homem que não existiu.

Se alguém lhe disser que sonha,Levantará com desdém o arco da sobrancelhas.Pois jamais se viveu com tanta plenitude.

Mas para falar de sua vidaTem que abaixar as quase infantis pestanas,E esperar que se apaguem duas infinitas lágrimas.

Page 105: Os Eleitos

Canção do Amor Perfeito

Cecília Meireles

O O TEMPOTEMPO seca a belezaSeca o amor, seca as palavras.Deixa tudo solto, leve, desunido para semprecomo as areias nas águas.

O tempo seca a saudade, seca as lembranças e as lágrimas.Deixa algum retrato, apenas,vagando seco e vaziocomo estas conchas das praias.

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Quem Deixa o Trato Pastoril

Cláudio Manuel da Costa

QQUEMUEM deixa o trato pastoril amadoPela ingrata, civil correspondência,Ou desconhece o rosto da violência,Ou do retiro a paz não tem provado.

Que bem é ver nos campos transladadoNo gênio do pastor, o da inocência!E que mal é no trato, e na aparênciaVer sempre o cortesão dissimulado!

Ali respira amor sinceridade;Aqui sempre a traição seu rosto encobre;Um só trata a mentira, outro a verdade.

Ali não há fortuna, que soçobre;Aqui quanto se observa, é variedade:Oh ventura do rico! Oh bem do pobre!

Page 107: Os Eleitos

Vaso Grego

Alberto de Oliveira EESTASTA de áureos relevos, trabalhadaDe divas mãos, brilhante copa, um dia,Já aos deuses servir como cansada,Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

Era o poeta de Teos que a suspendiaEntão, e, ora repleta ora esvasada,A taça amiga aos dedos seus tinia,Toda de roxas pétalas colmada,

Depois... mas o lavor da taça admira,Toca-a, e do ouvido aproximando-a, às bordasFinas hás de lhe ouvir, canora e doce,

Ignota voz, qual se da antiga liraFosse a encantada música das bordas,Qual se essa voz de anacreonte fosse.

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Eu Me Encontrei, Meninas

EEUU me encontrei, meninas, numa bela manhã,Em meio a maio, num verde jardimHavia em torno violetas e líriosEntre a erva verde e vagas flores novas,Azuis, amarelas, brancas e vermelhasNas quais eu pus a mão, para colher algumasPara adornar os meus louros cabelosE cingir de guirlanda os belos fios.Eu me encontrei, meninas...Mas depois que enchi de flores uma borda,Eu vi as rosas e não apenas de uma cor:Eu as colhi então para encher todo o regaçoPorque era tão suave o seu perfumeQue todo me senti despertar o coraçãoDe doce desejo e de um prazer divino.Eu me encontrei, meninas...Eu pensei: aquelas rosas entãoJamais poderei dizer quanto eram belas, Qual rebentava do botão ainda,Quais eram um pouco velhas, quais as novas.Amor me disse então: -vá colhe daquelas Que mais vê florescente em seu espinho

Page 109: Os Eleitos

Eu me encontrei, meninas...Quando a rosa todas as suas pétalas espalha, Quando é mais bela, e é mais agradável,Então está boa para compor guirlandasAntes que sua beleza desapareça;Assim, meninas, enquanto são mais floridascolham as belas rosas do jardim

Eu me encontrei, meninas...

Tecendo A Manhã

João Cabral de Melo Neto UUMM galo sozinho não tece uma manhã:Ele precisará sempre de outros galos.De um que apanhe esse grito que ele

Que apanhe o grito que ele um galo antesE o lance a outro; e de outros galosQue com muitos outros galos se cruzemOs fios de sol de seus gritos de galo,Para que a manhã, desde uma teia tênue, Se vão tecendo, entre todos os galos

E se encorpando em tela, entre todos,Se erguendo tenda, onde entrem todos,Se entretendo para todos, no toldo(a manhã) que plana livre de armação.A manhã, toldo de um tecido tão aéreoQue, tecido, se eleva por si: luz balão.

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Autopsicografia

Fernando Pessoa

OO POETAPOETA é um fingidor.Finge tão completamente Que chega a finge que é dor A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,Na dor lida sentem bemNão as duas que ele teve, Mas só a que eles não tem.E assim nas calhas de rodaGira, entender a razão, Esse comboio de cordaQue se chama o coração.

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O Rio de Minha Aldeia

Fernando Pessoa - Alberto Caieiro

O TTEJOEJO é o mais belo rio que corre pela minha aldeiaMas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeiaPorque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia

O Tejo tem grandes naviosE navega nele ainda,Para aqueles que vêem em tudo o que lá não estáA memória das naus

O Tejo desce da EspanhaE o Tejo entra no mar em PortugalToda a gente sabe isso.Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeiaE para onde ele vaiE donde ele vemE por isso, porque pertence a menos gente,É mais livre e maior o rio da minha aldeia

Pelo Tejo vai-se para o mundoPara além do Tejo há a AméricaE a fortuna daqueles que a encontramNinguém pensou no que há alémDo rio da minha aldeia

O rio da minha aldeia não faz pensar em nadaQuem está ao pé dele está só ao pé dele.

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Quando Você For Velhinha

Hugués Vaganay

QQUANDOUANDO você for velhinha, à noite, à luz da vela,Sentada ao pé do fogo, enovelando e fiando,Dirá, cantando meus versos, em se maravilhando:“Ronsard me celebrava no tempo em que era bela!”

Então não terá serva a ouvir tal novidadePor força do labor já meio adormecidaQue à fama de Ronsard, não vá se despertando,A bendizer seu nome com imortal louvor.

Eu estarei sob a terra e fantasma sem osso,Sob os sombrios mirtos encontrarei repouso.Você será a lareira uma velha agachada,

A lamentar meu amor e seu desprezo altivo.Viva, se crê no que digo, não espere o amanhã, Colha, desde hoje, as rosas dessa vida.

Page 114: Os Eleitos

Pousa A Mão Na Minha Testa

Manuel Bandeira

NNÃOÃO te doa do meu silêncio:Estou cansado de todas as palavras.Não sabes que te amo?Pousa a mão na minha testa:Captarás numa palpitação inefávelO sentido da única palavra essencial- Amor.

Page 115: Os Eleitos

Renúncia

Álvares de Azevedo

EEUU deixo a vida como deixa o tédiodo deserto o poento caminheirocomo as horas de um longo pesadelo,que se desfaz ao dobre de um sineiro;

como um desterro de minha alma errante,onde o fogo insensato a consumia...Só levo uma saudade – é desses temposque amorosa ilusão embelecia.

Só levo uma saudade – é dessas sombrasque eu sentia velar nas noites minhas...De ti, ó minha mãe, pobre coitada,que por minhas tristeza te definhas!

Descansem o meu leito solitáriona floresta dos homens esquecida,à sombra de uma cruz – e escrevam nela:foi poeta, sonhou e amou na vida...

Page 116: Os Eleitos

Valsa

Cecíllia Meireles FFEZEZ tanto luar que eu pensei nos teus olhos antigos e nas tuas antigas palavras.O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos, que tornei a viver contigo enquanto o vento passava.

Houve um noite que cintilou sobre o teu rosto e modelou tua voz entre as algas. Eu moro, desde então, nas pedras frias que o céu protege e estudo apenas o ar e as águas.

Coitado de quem pôs sua esperança nas praias fora do mundo... - Os ares fogem, viram-se as águas,mesmo as pedras, com o tempo, mudam.

Page 117: Os Eleitos

Mote Alheio

Luís de Camões

MMOTEOTE A ALHEIROLHEIRO

VVÓSÓS, Senhora, tudo tendes,Senão que tendes os olhos verdes

VVOLTASOLTAS

Dou-te em vós NaturezaO sumo da perfeição;Que o que em vós é senãoÉ em outras gentileza;O verde não se despreza, Que, agora que vós o tendes,São belos os olhos verdes.Ouro e azul é a melhor Cor porque a gente se perde;Mas a graça desse verdeTira a graça a toda cor.Fica agora sendo a florA cor que nos olhos tendes,Porque são vossos e verdes.

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Cruz Na Porta Da Tabacaria

Fernando Pessoa

CCRUZRUZ na porta da tabacaria!Quem morreu? O próprio Alves? DouAo diabo o bem-‘star que trazia.Desde ontem a cidade mudou.

Quem era? Ora, era quem eu via.Todos os dias o via. EstouAgora sem essa monotonia.Desde ontem a cidade mudou.

Ele era o dono da tabacaria.Um ponto de referência de quem sou.Eu passava ali de noite e de dia.Desde ontem a cidade mudou.

Meu coração tem pouca alegria.E isto diz que é morte aquilo onde estou.Horror fechado da tabacaria!Desde ontem a cidade mudou.

Mas ao menos a ele alguém o via,Ele era fixo, eu, o que vou,Se morrer, não falto, e ninguém diria:Desde ontem a cidade mudou.

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Lamento das Coisas

Augusto dos Anjos TTRISTERISTE,, a escutar pancada por pancada, A Sucessividade dos segundos,Ouço, em sons subterrâneos, do Orbe oriundos,O choro da energia abandonada!

É a dor da Força desaproveitada- O cantochão dos dínamos profundos,Que, podendo mover milhões de mundos,Jazem ainda na estática do Nada!

É o soluço da forma mais imprecisa...Da transcendêcia que não realiza...Da luz que não chegou a ser lampejo...

E é em suma, o subconsciente aí formidandoDa natureza que parou, chorando,No rudimentarismo do desejo!

Page 121: Os Eleitos

A Moleirinha

Guerra Junqueiro

PPELAELA estrada plana, toc-toc-tocGuia um jumentinho uma velhinha errante.Como vão ligeiros, ambos a reboque,Antes que anoiteça, toc-toc-toc,A velhinha atrás, o jumentinho adiante.

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Cartas de Amor

Guilherme de Almeida AASS minhas mãos estão com saudades das tuas...Elas eram tão frias! Frias como duasConchas em que o meu beijo lento pareciaUma pérola quente, tímido, ouviaO eco do coração que se vinha quebrarEm ti, como se escuta o soluço do mar nas conchas exiladas...

Ainda há pouco, quandoEu deixei minha mão pensativa sonhando Sobre esta folha branca que te escrevo, tiveA impressão de que ela era um pássaro que viveMorrendo numa folha – a última folha... Em breveO vento a levará como um esquife leveOnde o pássaro há de ir gelado, imóvel, mudo,Por ele há de cantar – e os vento outonais, E as cigarras... – por ele que não soube maisCantar o canto azul de sua mocidade...As minhas mãos estão chorando de saudade...Elas estão lembrando aquele adeus caladoQue está lá atrás, gesticulando no passado,Como um trapo de seda... Ainda me lembro: eu tinhaTão diluída e apertada a tua mão na minha,Que, como os fios de uma seda que se esgarce,Nossos dedos custaram tanto a separar-se!Foi uma vida que esse adeus rasgou em duas

As minhas mãos estão com saudades das tuas.

Page 123: Os Eleitos

Soneto

Gregório de Matos

NNASCEASCE o sol, e não dura mais que um diaDepois da luz se segue a noite escura,Em tristes sombras morre a formosura.Em contínuas tristezas a alegria.

Porém, se acaba o Sol por que nascia?Se formosa a Luz é, por que não dura?Como a beleza assim se transfigura?Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,Na formosura não se dê constânciaE na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim, pela ignorância,E tem qualquer dos bens por natureza.A firmeza somente na inconstância.

Page 124: Os Eleitos

Psicologia de Um Vencido

Augusto dos Anjos

EEUU, filho do carbono e do amoníaco,Monstro de escuridão e rutilância,Sofro, desde a epigênese da infância,A influência má dos signos do zoodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,Este ambiente me causa repugnância...Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsiaQue se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme – este operário das ruínas –Que o sangue podre das carnificinasCome, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,E há de deixar-me apenas os cabelos,Na frialdade inorgânica da terra!

Page 125: Os Eleitos

Aprendizagem Amarga

Thiago de Melo

CCHEGAHEGA um dia em que o dia se terminaantes que a noite caia inteiramente.Chega um dia em que a mão, já no caminho,de repente se esquece do seu gesto.Chega um dia em que a lenha já não chegapara acender o fogo da lareira.Chega um dia em que o amor, que era infinito,de repente se acaba, de repente.

Força é saber amar doce e constantecom o encanto da rosa alta na haste,Para que o amor ferido não se acabe Na eternidade amarga de um instante.

Page 126: Os Eleitos

Soneto da Felicidade

Vinícius de Morais

DDEE tudo, ao meu amor serei atentoAntes e com tal zelo, e sempre e tantoQue mesmo em face do maior encantoDele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momentoE em seu louvor hei de espalhar meu cantoE rir meu riso e derramar meu prantoAo seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procureQuem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive)Que não seja imortal, posto que é chamaMas que seja infinito enquanto dure

Page 127: Os Eleitos

Ternura

Vinícius de Morais

EEUU te peço perdão por te amar de repenteEmbora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos.Das horas que passei à sombra dos teus gestosBebendo em tua boca os perfumes dos sorrisosDas noites que vivi acalentandoPela graça indizível dos teus passos eternamente fugindoTrago a doçura dos que aceitam melancolicamente.E posso te dizer que o grande afeto que te deixoNão traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das [promesssasNem as misteriosas palavras dos véus da alma...É um sossego, uma unção, um transbordamento de caríciasE só te pede que repouses quieta, muito quietaE deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o [Olhar extático da aurora.

Page 128: Os Eleitos

O Deus-Verme

Augusto dos Anjos

FFATORATOR universal do transformismo.Filho da teleológica matéria,Na superabundância ou na miséria,Verme – é o seu nome obscuro de batismo.

Jamais emprega o acérrimo exorcismoEm sua diária ocupação funérea,E vive em contubérnio com a bactéria,Livre das roupas do antropomorfismo.

Almoça a podridão das drupas agras,Janta hidrópicos, rói vísceras magrasE dos defuntos novos incha a mão...

Ah! Para ele é que a carne podre fica,E no inventário da matéria ricaCabe aos seus filhos a maior porção!

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O Caso de Inês de Castro

Luís de Camões

PPASSADAASSADA esta tão próspera vitória,Tonado Afonso à Lusitana Terra,A lograr da paz com tanta glóriaQuanta soube ganhar na dura guerra,O caso triste e digno de memória,Que do sepulcro os homens desenterra,Aconteceu da mísera e mesquinhaQue depois de ser morta foi rainha

Tu, só tu puro amor, com força crua,Que os corações humanos tanto obriga,Desta causa à molesta morte sua,Como se fora pérfida inimiga.Se dizem, fero Amor, que a sede tuaNem com lágrima triste se mitiga,É porque queres, áspero e tirano,Tuas aras banhar em sangue humano.

Estavas, linda Inês, posta em sossego,De teus anos colhendo doce fruto,Naquele engano da alma, ledo e cego,Que a Fortuna não deixa durar muito,Nos saudosos campos do Mondego,De teus formosos olhos nunca enxuto,Aos montes ensinando e às ervinhas O nome que no peito escrito tinhas

Page 130: Os Eleitos

Do teu Príncipe ali te respondiamAs lembranças que na alma lhe moravam,Que sempre ante seus olhos te traziam.Quando dos teus formosos se apartavam;De noite, em doces sonhos que mentiam,De dia, em pensamentos que voavam;E quando, enfim, cuidava e quanto via Eram tudo memórias de alegria.

Page 131: Os Eleitos

Ilusões da Vida

Francisco Otaviano QQUEMUEM passou pela vida em branca nuvem,E em plácido repouso adormeceu;Quem não sentiu o frio da desgraçaQuem passou pela vida e não sofreuFoi espectro de homem, não foi homem,Só passou pela vida, não viveu.

Page 132: Os Eleitos

Poema em Linha Reta

Fernando Pessoa NNUNCAUNCA conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,Indesculpavelmente sujo, Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,Que tenho sofrido enxovalhos e calado,Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachadoPara fora da possibilidade do soco;Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda gente que eu conheço e fala comigoNunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,Nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humanaQue confessasse não um pecado, mas uma infâmia;Que contasse não uma violência, mas uma cobardia!Quem há nesse largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,Arre, estou farto de semideus!Onde é que há gente no mundo?

Page 133: Os Eleitos

Então sou eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,Podem ter sido traídos – mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?Eu, que venho sido vil, literalmente vil,Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Page 134: Os Eleitos

Apontamento

Fernando Pessoa

A A MINHAMINHA alma partiu-se como um vaso vazio. Caiu pela escada excessivamente abaixo Caiu das mãos da criada descuidada. Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá! Tenho mais sensações do que tinha quando me saneia eu. Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia. Os deuses que há debruçam-se do parapeito da escada. E fitam os cacos que a criada deles fez em mim.

Não se zanguem com ela. São tolerantes com ela. O que era eu um vaso vazio?

Olham os cacos absurdamente conscientes, Mas conscientes de si mesmos, não conscientes deles.

Olham e sorriem. Sorriem tolerantes à criada involuntária.

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas. Um caco brilha, virado do exterior lustroso entre os astros. A minha obra? A minha alma principal? A minha vida? Um caco. E os deuses olham-no especialmente, pois não sabem por que ficou ali.

Page 135: Os Eleitos

Primavera

Manuel Bandeira

CCHEGASHEGAS tão primavera, que os caminhoscorrem pedindo flores aos teus pés;e o amor das asas improvisa ninhosna árvore cheia de segredos que és.

E és também a paisagem toda: açudesmansos de sol e azul nos olhos sós;no pensamento, rios de inquietudes;e perspectivas de canções na voz.

Vais. E a luz beija a sombra que desfolhas.Descem plumas dos céus da tarde. E tu,colhendo a boca de uma estrela, molhas na água da noite o gesto branco e nu.

Somes. E do teu rastro despovoado- sem flores, ninhos, águas e canções,nem sombra, pluma e estrela do passado –brotam florestas e constelações.

Page 136: Os Eleitos

Poesia

Carlos Drummond de Andrade GGASTEIASTEI uma hora pensando um versoQue a pena não quer escrever.No entanto, ele está cá dentroInquieto e vivo.Ele está cá dentro E não quer sair.Mas a poesia deste momentoInunda minha vida inteira.

Page 137: Os Eleitos

O Morcego

Augusto dos Anjos MMEIAEIA--NOITENOITE. Ao meu quarto me recolho.Meu Deus! E este morcego! E, agora vede:Na bruta ardência orgânica da sede,Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

“Vou mandar levantar outra parede...”-Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolhoE olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. ChegoA tocá-lo. Minh’alma se concentra.Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!Por mais que a gente faça, à noite, ele entraImperceptivelmente em nosso quarto!

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Você

Guilherme de Almeida

EESCUTESCUTE aqui uma coisa: - você é linda!É tudo para mim! Você é esta terra morena e quente, que eu não sei aindaque tamanho que tem nem o que encerra,nem o que vale... Você é este ar cheirosoque eu respiro com medo que se acabe...

Você é este sol bonzinho e preguiçoso que faz tudo bonito que não cabe na terra, mas que cabe até no fundodos meus olhos... Você é esta vida boaque eu levo sem sentir... Você é este mundo...Você...

Mas eu estou falando à toa,porque eu sei que você não acredita...você não sabe que você é bonita,não sabe como eu gosto de você...Nem eu sei, imagina!

Mas por que,mas por que você é tão bonita?por que é que eu gosto tanto de você?

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A Um Poeta

Guilherme de Almeida PPOETAOETA da rua, vais...E, à tua frente, Teus sonhos, tua ilusões douradasVão como as folhas mortas: tristemente,Sobre o dorso veloz das enxurradas.

Quando sobe, redonda e transparente,A lua subterrânea das baladas,Sombra te segue mudamente,Conspirando contigo nas calçadas...

Se, erguendo os braços, o teu vulto atiraUm gesto à glória, na ânsia de alcançá-la,Teu corpo toma a forma de uma lira!

Se a glória desce e, bêbado de luz,Abres os braços, na ânsia de abraçá-la,Teu corpo toma a forma de uma cruz!

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Rio sem Discurso

João Cabral de Melo Neto QQUANDOUANDO um rio corta, corta-se de vezO dicurso-rio de água que ele fazia;Cortado, a água se quebra em pedaços,Em poços de água, em água paralítica.Em situação de poço, a água equivaleEm uma palavra em situação dicionária:Isolada, estanque no poço dela mesma,E porque assim estanque, estancada;E mais: porque assim estancada, muda,E muda porque com nenhuma comunica,Porque cortou-se a sintaxe desse rio, O fio de água porque ele discorria

O curso de um rio, seu discurso-rio,Chega raramente a se reatar de vez;Um rio precisa de muito fio de águaPara refazer o fio antigo que o fez.Salvo a grandiloqüência de uma cheiaLhe impondo interina outra linguagem,Um rio precisa de muita água em fiosPara que todos os poços se enfrasem:Se reatando, de um para outro poço,Em frases curtas, então frase e frase,Até a sentença-rio do discurso únicoEm que se tem voz a seca ele combate.

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Enquanto Por Competir com Seu Cabelo

Gôngora

EENQUANTONQUANTO por competir com teu cabeloouro polido ao sol rebrilha em vãoenquanto com menosprezo na planícieolha tua branca fronte o lírio belo

enquanto a cada lábio por colhê-loseguem mais olhos que ao cravo temporãoe enquanto triunfa com desdém louçãodo luzente cristal teu gentil colo;

goza colo, cabelo, lábio e fronteantes que o que foi em tua dourada idadeouro, lírio, cravo, cristal luzente

não só em prata ou violeta truncadase torne, mas tu e isso tudo juntamenteem terra, em fumo, em pó, em sombra, em nada.

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Lisbon Revisiterd

Fernando Pessoa - Álvaro de Campos Não: não quero nada, Já disse que não quero nada. Não me venham com conclusões! A única conclusão é a morrer. Não me tragam estéticas! Não me falem em moral! Tirem-me daqui a metafísica! Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) Das ciências, das artes, da civilização moderna! Que mal fiz eu aos deuses todos? Se têm a verdade, guardem-na! Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica. Fora disso sou doido, com todo o direito de sê-lo. Com todo o direito a sê-lo, ouviram? Não me macem, por amor de Deus! Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa? Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade. Assim, como sou, tenham paciência! Vão para o diabo sem mim, Ou deixem-me ir sozinho para o diabo! Para que haveremos de ir juntos? Não me peguem no braço! Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho. Já disse que sou sozinho! Ah, que maçada querem que eu seja da companhia! Ó céu azul – o mesmo da minha infância –

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Eterna verdade vazia e .perfeita! Ó macio Tejo ancestral e mudo, Pequena verdade onde o céu se reflete! Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje! Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta. Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo... E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quer estar sozinho!

Tenho Dó das Estrelas

Fernando Pessoa

Tenho dó das estrelas, Luzindo há tanto tempo,Há tanto tempo...Tenho dó delas.

Não haverá um cansaçoDas coisas,De todas as coisas, Como das pernas ou de um braço?

Um cansaço de existir, De ser, Só de ser,O ser triste brilhar ou sorrir...

Não haverá, enfim,Para as coisas que são.Não a morte, mas simMas uma outra espécie de fim,Ou uma grande razãoQualquer coisa assimComo um perdão?

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Quero Ignorado

Fernando Pessoa

Quero ignorado, e calmoPor ignorado, e próprioPor calmo, encher meus diasDe não querer mais deles.

Aos que a riqueza tocaO ouro irrita a peleAos que a fama bafejaEmbacia-se a vida.

Aos que a felicidadeÉ sol, virá a noite.Mas ao que nada ‘spera Tudo que vem é grato.

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Se Te Queres Matar

Fernando Pessoa

Se te queres matar, por que não te queres matar? Ah! aproveita! Que eu, que tanto amo a morte e a vida, Se ousasse matar-me, também me mataria... Ah! se ousares, ousa! De que te serve o mundo interior que desconheces? Talvez matando-te, o conheças finalmente... Talvez, acabando, comeces... E não cantes, como eu a vida por bebedeira, Não saúdes como eu a morte em literatura! Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente! Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém... Sem ti correrá tudo sem ti. Talvez seja pior para os outros existires que matares-te... Talvez peses mais durando que deixando de durar... A mágoa dos outros? ... Tens remorso adiantado De que te chorem? Descansa: pouco te chorarão... O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco, Quando são de coisas nossas, Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte, Porque é coisa da qual nada acontece aos outros... Primeiro é a angústia surpresa da vinda Do mistério e da falta da tua vida falada... Depois o horror do caixão vivo e material, Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas, Lamentando a pena de teres morrido, E tu mera causa ocasional daquela carpidação, Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas... Muito mais morto aqui que calculas, Mesmo que esteja muito mais vivo além... Depois a trágica retirada para o jazigo ou cova, E depois o princípio da morte da tua memória. Há primeiro em todos um alívio

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Da tragédia maçadora de teres morrido... Depois conversa aligeira-se quotidianamente, E a vida de todos os dias retorna o seu dia... Depois lentamente esqueceste. Só é lembrado em duas datas aniversariamente: Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste. Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada. Duas vezes no ano pensam em ti. Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram, E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

Encara-te a frio o que somos... Se queres matar-te, mata-te... Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência!... Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida? Que escrúpulos tem o impulso que gera As seivas e a circulação do sangue, e o amor? Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida? Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem. Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?

És importante para ti, porque é a ti que te sentes. É tudo para ti, porque para ti és o universo, E o próprio universo e os outros Satélites da tua subjetividade objetiva És importante para ti porque só tu és importante para ti. E se assim, ó mito serão os outros assim?

Tens como Hamlet, o pavor do desconhecido Mas o que é conhecido? O que tu conheces, Para que chames desconhecido qualquer coisa em especial?

Tens como Falstaff, o amor gorduroso da vida? Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente Torna-te parte carnal da terra e das coisas! Dispersa-te, sistema físico-químico De células norturnamente conscientes Pela noturna consciência da inconsciência dos corpos, Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências, Pela relva e a erva da proliferação dos seres,

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Pela névoa atômica das coisas, Pelas paredes turbilhonantes Do vácuo dinâmico do mundo...

Cantiga Alheia

Luís de Camões

CCANTIGAANTIGA A ALHEIALHEIA

Na fonte está LianorLavando a talha e chorando.Às amigas perguntando:- Vistes lá o meu amor?

VVOLTASOLTAS

Posto o pensamento nele,Porque a tudo o amor obriga,Cantava, mas a cantigaEram suspiros por ele.Nisso estava LianorO seu desejo enganando,Às amigas perguntando:- Vistes lá o meu amor?O rosto sobre uma mão,Os olhos no chão pregados,Que, de chorar já cansados,Algum descanso lhe dão.Desta sorte LianorSuspende de quando em quandoSua dor e, em si tornado, Mais pesada sente a dor.Não deita dos olhos água,Que não quer que a dor se abrandeAmor, porque, em mágoa grande,

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Seca as lágrimas a mágoa.Depois que de seu amorSoube, novas perguntando,De improviso a vi chorando.Olha que extremos de dor!

Sobre a Ambição

Guilherme de Almeida

Sóde pó

Deus o fez.Mas ele, em vezde se conformar

quis ser sol, e ser mar,E ser céu... Ser tudo, enfim!

Mas nada pôde! E foi assimque se pôs a chorar de furor...

Mas – ah! – foi sobre sua própria dorque as lágrimas tristes rolaram. E o pó,molhado, ficou sendo lodo - e lodo só

Ainda Sobre a Ambição

Guilherme de Almeida Num círculo vicioso, homem, todos os teus Esforços se consomem:

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O homem que quer ser rei, o rei que quer ser Deus, e Deus que quer ser homem!

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Por quê

Guilherme de Almeida

Por que acordaste naquela hora morta? Por que me abriste a portae aceitaste o sorriso que eu sorria e a rosa que eu trazia?Por que acendeste a lâmpada e a lareira? Por que estendeste a esteira?Por que cerraste o reposteiro o os trincos? Por que tiraste os brincos?Por que soltaste a tua trena de ouro e o teu cinto de couro?Por que fechaste os olhos? Por que abriste a boca? Por que ouvisteo que eu não disse? Porque não disseste o que ouvi? Por que destea mão à minha mão na despedida, no adeus à minha vida?

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Desejos de Doente

Francisco Otaviano

Querida, quando eu morrer,Com tua boquinha breveNão me venhas tu dizer: - “A terra lhe seja leve”.

Nesse dia, vem calçadaDe botinas de cetimQuero a terra bem pisada,Tendo teu pé sobre mim.

Em paga de meus amores,Quando tombar o caixão,Deita-lhe um ramo de floresColhidas por tua mão.

E se mais posso pedir-teNesta terna despedida,Deixa dos olhos cair-teUma lágrima sentida.

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Cantique D’Amour

Guilherme de Almeida

Amo pela alegria de amar:pela promessa de felicidadeque há de sempre florir no teu sorriso, que há deeternamente arder no teu olhar...

Amo pela alegria luminosa do amor: do amor que é como um solpara o qual eu me volto todo, cada dia,hipnotizado como um girassol...

Amo – e esse amoré toda a esplêndida, a única alegriada minha vida...

E se algum dia tu me vires chorando, partido de dor,como uma pobre coisa desgraçada,como uma triste flor esmigalhadaente os teus dedos, meu amor,não enxugues meu pranto! Ri! Ri! teu sorrisode ouro! Sacode tua vida como um guizosobre a minha!

E, depois, deixa-me só, pensandoque é de alegria que eu estou chorando!

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Cartas do Meu Amor

Guillherme de Almeida

Ela me escreve: “Meu amor, o dia é lindo!“As cigarras estão cantando, estão tinindo“Nas folhas verdes, como um guizo de ouro... E eu penso“em ti, no nosso amor, neste desejo imenso“de te ver, de te ouvir, de irmos os dois, sozinhos,“sob este mesmo céu, pelos mesmos caminhos“em que íamos, nas tardes limpas de novembro,“esquecer nossa vida... Amor, como eu me lembro!“A cidade era branca, estirada na areia“das praias: parecia uma enorme sereia“que dormisse, esquecida, a mão à flor das ondas,“e, nos cabelos verdes, pérolas redondas, “e, na boca entreaberta, a saudade de um beijo...“Ah! Meu amor, ah! meu amor, como eu revejo“tudo! O terraço fresco onde a sombra das vinhas“era fria na pedra... E as tuas mãos, e as minhas,“Entrelaçadas, fechando a vida em sua palma...“E o teu beijo imprevisto... E aquele gosto de alma“que me ficou na boca... E, a nossos pés, deitada,“a Cidade Encantada... a Cidade Encantada...“Era lindo em teus olhos verdes o universo:“o mar cantava dentro deles como um verso,“e havia o grande adeus de uma vela alva e um ritmo“de sermos musicais nesse verso marítimo...“Mas .... a tua alma partiu nos teus olhos cor de água...“E eu fiquei debruçada em mim mesma , na mágoa,“na angústia, na aflição, na tristeza, na dor“de ser só... Meu amor, meu amor, meu amor...

Beijo a carta. Olho em torno a tarde comovida,

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( Como brilha, através de uma lágrima, a vida! )

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Meio de expressãoObjetiva agregar valoresAlocar recursosExatamente neste pontoParticular importânciaÉ vista com reservasJá vai tardeA ciência por isso marcará passoDou um exemploPotencialmente custosoMas, atençãoAtende pelo nome de A união íntimaEm que peseCom muito vagarVivo interesseSeria, quando muitoTanto isso é verdade queÀ semelhançaDe modo análogoDe igual modoFirma propósitoUma coisa é certaNão é sem motivoDas duas, uma:Num exercício de iraSe fez sentir entre nósEstabelece o equilíbrioNão é só issoPropicia o surgimentoPor um processo análogoNenhuma, por certoExpressão a um tempoQuestão emergencialLonge dissoPode ainda, em certo sentidoE, não raro,E, como tal,Muito a propósitoEstorvo à passagem

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Mutatis mutantis, é claro

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Fundado no caráterA verdade porém é muito outraRevela sinais evidentesAssim, e somente assimSeria, quando muito,Teria jurado qualquer coisaPor entender queÉ, pode serExige sólida formação teóricaUma coisa é certaNesse ponto, uma vez maisLonge dissoSão, digamos,Suas idéias presidiamAinda que difusamenteArrepiar caminhoAcredita-se que.. nada mais falsoPor fatores de ordemPerdeu seu norteAdmirada a exaustãoEm resumoNão é bem assimTanto isso é verdade queAfirmação de cunho geralPode ainda, em certo sentidoBem de perto de tal modo queSustentam opiniões divergentesEu quero dizer da minha alegriaConcorre de qualquer modoCom bastante propriedadeNão é menos verdadeiro queFicou sem margem de manobraPor palavras encobertasNum segundo instanteContribuem, em menor escalaSão, por assim dizerUma coisa é certaPor certoRepousa na crençaMas que ninguém se engane

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Que se insinuam na narrativaFaz sentidoDe tatoAinda assimNo momento seguinteO que se seguiu a issoO resultado já era esperadoUma última colocação apenasInsistiu na idéiaVai nisso um enganoA partir daíEquilíbrio precárioEspecial interessePelo sim, pelo não... observa. É mesmoele é, por excelência,no que diz respeito a a palavra foi cunhadaa situação é algo embaraçosaa realidade é palpávelSolução há, basta quererE estava corretoA idéia é sedutoraEm sua limitaçãoEm esferas apartadasEm outros termosEle totalizaA crítica nega o caráterPara, em segredo,Esse cheiro era-lhe familiarPermita-me estar comovidoNão é nem podia serNão é para menosSe não, vejamosÉ necessário, isto simEm outros termos.Guardar silêncioPode-se dizer, com razãoAo abrigo dessa afirmaçãoNão disse palavra

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Em uma palavraPois bem,Ou antesEm termos aproximadosNesse particularO mais das vezesA isso acrescentou queDelicada belezaQuis ver-lhe as mãosPalpitava-lhe por dentroLá fora já se fazia diaUnificar a um só tempoFechou a porta atrás de siAssenta sobre as basesPrecisa ser reelaboradaSolução há basta quererApenas quer enfatizarAté porqueNa sua totalidadeEstorvo à passagem

Ao abrigo dessa afirmaçãoE num passo mais alémSão, por assim dizerTem razão, é isso mesmoEm vãoDá unidade ao conjuntoNega na essênciaAfirmação conteudísticaSão, de restoEm grande medida

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PPENSAMENTOSENSAMENTOS & P & PROVÉRBIOSROVÉRBIOS

Cada homem é o senhor do seu destino. Termina cada dia a tua obra o melhor que puderes.

O que você sabe não tem valor algum, o valor está no que você faz com o que sabe.

A luz não vem ao mundo para zombar das trevas e sim para iluminá-las

Opiniões são como pregos: quanto mais se bate nelas, tanto mais profundamente penetram.

Nenhuma agulha tem duas pontas.

Procurar proveito em tudo só traz aborrecimentos.

Quem me lisonjeia é meu inimigo; quem me critica é meu amigo.

Não uses uma espada de ouro se queres cortar um rabanete.

Quem não sabe suportar contrariedades nunca terá acesso às coisas grandiosas.

Só o ignorante se zanga; o sábio compreende.

O tolo faz o que não pode deixar de fazer; o sábio deixa de lado o que não sabe fazer

Quem olha para si mesmo não ilumina o mundo.

Antes de começar a reformar o mundo, dá três voltas através de tua própria casa.

Mesmo que prendas o galo no galinheiro, o sol nasce.

Chá frio e arroz frio ainda são toleráveis; mas ninguém suporta palavras frias.

Diz o que queres dizer, amanhã.

Lição de pipa: quem quer subir muito alto, precisa aprender a voar contra o vento.

Nunca acendas um fogo que não possas apagar.

Ninguém está mais longe da verdade do que aquele que sabe todas as respostas.

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Paz e calma não alegram perenemente o coração, e no entanto desgraças e calamidades não representam o fim.

Depois de ser consumido pelo fogo, o capim dos campos torna a brotar. O charme é o segredo de toda beleza. Não existe beleza sem charme.

Eis aqui uma regra preciosa: não tenha em sua casa coisa alguma que não seja útil ou que não considere bela.

Raramente conhecemos alguma pessoa de bom senso além daquelas que concordam conosco.

Nada é mais justamente distribuído que o bom senso: ninguém julga que precisa mais do que já tem.

Se a calúnia fosse uma cobra, seria uma cobra voadora; ela tanto rasteja como voa.

Calunie, calunie: alguma coisa sempre ficará.

A capacidade vale pouco sem a oportunidade.

Capacidade executiva é decidir rapidamente e mandar outra pessoa fazer.

Conserve os olhos fechados antes do casamento; depois, semicerrados.

O amigo do homem gosta dele e deixa-o ser como é; sua esposa ama-o mas está sempre procurando modificá-lo.

Toda mulher deveria casar, mas o homem, não.

Ser amável todos os dias com a mesma pessoa acaba com os nervos da gente.

Um bom marido deveria ser surdo e uma boa esposa, cega.

Censure seus amigos em particular, mas elogie-os publicamente.

As pessoas adquirem uma característica especial procedendo de maneira especial.

É proibido matar: todos os assassinos serão punidos, salvo se matarem em grandes quantidade e ao som de trombetas.

Charme é a maneira de receber um “sim” sem ter feito qualquer pergunta clara.

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A presente sua decisão e nunca suas razões; as decisões podem estar certas, as razões sem dúvida estarão erradas.

Cuidado com as despesas insignificantes; os pequenos furos podem afundar um navio gigantesco.

O melhor caminho para sair de uma dificuldade é através dela.

As flores do próprio jardim não têm perfume tão intenso quanto as silvestres; em troca duram mais.

Para que a ira, a violenta excitação? Ímpetos são de curta duração. Chuva de granizo não dura uma hora, não dura um dia a ventania, breve é o fulgor do raio. Se as poderosas forças celestes voltam logo a se acalmar, por que o homem, que tão pouco importa, não sabe crer e esperar ?

A ausência de desejos leva à paz interior.

O homem tem três maneiras de agir com prudência: primeiro, através da reflexão, que é a mais nobre; segundo, pela imitação, que é a mais fácil; terceiro, pela experiência, que é a mais amarga.

Quem sorrir em vez de esbravejar, é sempre o mais forte.

O peixe que não foi pescado é sempre grande

Quem não persevera nas pequenas tarefas, falhará nos grandes planos.

Aprender é como remar contra a corrente: é só parar, e anda-se para trás.

É muito fácil dizer que se foi esperto ontem.

Cava o poço antes de ter sede.

Um só olho merece mais crédito que dois ouvidos.

O sábio não conhece dúvidas, o bom não conhece mágoas, o valente não conhece o medo.

Tanto faz correr como ir devagar, todo caminho tem fim.

Nada é melhor empregado do que a dádiva feita a um verdadeiro amigo necessitado.

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Não saber e fingir que sabe é condenável; saber mas agir como os que não sabem é sabedoria.

Cada qual assume a cor de seu meio-ambiente.

Rato disposto a morrer vai morder a cauda do gato.

Aprende como se o conhecimento fosse inatingível, e como se receasse a tornar a perdê-lo.

Saber como se faz uma coisa é fácil; fazê-la é que é difícil.

O tolo faz o que não pode deixar de fazer; o sábio desiste do que não sabe fazer.

Não basta dirigir-se ao rio com a intenção de pescar peixes; é preciso levar também a rede.

Quem quer ir muito longe deve principiar bem no começo.

Para quem ama, até água é doce.

Não deixes o falcão levantar vôo antes de avistar a lebre

Quem faz as leis precisa governar com severidade; quem as aplica, com moderação.

Depois de três anos, até um desgraça pode servir para alguma coisa.

Também uma torre com cem mil pés de altura está pousada no chão.

Uma palavra amiga contém calor para três invernos; uma palavra áspera fere como seis meses de frio rigoroso.

Quanto mais pobre a pessoa, tanto maior o número de demônios que encontra.

Dificilmente se mata a fome com um bolo pintado.

Se passares por cima de uma obrigação, não receies a volta pelo mesmo caminho.

Não te vanglories; entre os ouvintes pode estar alguém que te conheceu quando criança.

Quem ganha de presente um boi, tem que retribuir com um cavalo

Não fales com palavras de veludo se podes praticar ações de pedra.

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Quem fica na ponta dos dedos, não se conserva muito tempo em pé.

Ultrapassar um alvo é tão ruim quanto não chegar a ele.

Madrugando três vezes, ganha-se um dia inteiro.

Lucro e fama jamais procuram o dorminhoco

A felicidade e a infelicidade não comparecem espontaneamente; só quando são chamadas.

Comprei um pão e ganhei rosas vermelhas. Como me sinto feliz por ter ambas as coisas nas mãos.

Ser bom é muito mais do que ser mal.

Quem quer come, não deve ofender o cozinheiro.

Quando você tem de escolher e não escolhe, já é uma escolha.

O espírito pode fazer do inferno um céu e do céu um inferno.

Confessamos as faltas pequenas a fim de insinuar que não cometemos as grandes.

A melhor maneira de convencer um idiota de que ele está errado é deixá-lo agir como deseja.

Não espere o Juízo Final. Ele ocorre diariamente.

As três coisas mais difíceis são: guardar um segredo, esquecer uma injustiça e utilizar bem o lazer.

As mentalidades pequenas se interessam pelo extraordinário; as grandes mentalidades, pelo corriqueiro.

Os olhos acreditam neles mesmos; os ouvidos acreditam nos outros.

Se desejamos que os outros guardem os nosso segredos, primeiro devemos guardá-los nós mesmos.

Qualquer pessoa pode zangar-se; isso é fácil. O difícil é zangar-se com a pessoa certa, no grau certo, na hora certa, com o objetivo certo e da maneira certa.

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A insatisfação é o primeiro passo para o progresso de um homem ou uma nação.

A personalidade é para a pessoa o que o perfume é para flor.

Não é na novidade mas no hábito, que encontramos os maiores prazeres.

Nada precisa ser tão reformado como os hábitos dos outros.

Se deseja ser agradável socialmente, deixe que lhe ensinem muitas coisas que já sabe.

Dois homens não podem ficar juntos durante meia hora sem que um adquira evidente superioridade sobre o outro.

Há oradores que procuram compensar a falta de profundidade com a extensão.

Em geral, leva-se mais de três semanas para preparar um bom discurso de improviso.

Se eu tivesse presente à criação, teria dado algumas sugestões úteis para melhor organização do universo. ( Rei Afonso, o Sábio)A sabedoria da vida consiste em suportar as coisas sem importância.

Reserva meia hora por dia para tuas preocupações e usa-a para tirar uma soneca.

Toda desgraça nasce da boca.

Quem viu o mar não se impressiona com açudes

Quinze minutos de primavera valem mais do que um saco de ouro.

Ama teu amigos, mas sê mais rápido que eles.

A verdade se contenta com poucas palavras.

Quem semeia espinhos não deve andar descalço.

Nunca esperes gratidão. Assim sentirás menos o pontapé recebido.

Com o mar calmo qualquer um poder ser bom piloto.

Ao beber água convém pensar na fonte.

O espectador tem visão mais clara da cena do que o participante.

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Julgado pela maior parte dos seus efeitos, o amor se assemelha mais ao ódio que à amizade.

Por que o amor, aparentemente tão doce, é tão prepotente e tão brutal quando posto à prova.

O maior problema de toda arte é produzir por meio de aparências a ilusão de uma realidade mais grandiosa.

Insista em si mesmo; nunca imite.

Se quiser conhecer verdadeiramente um homem, dê-lhe autoridade.

Quem está firmemente estabelecido como autoridade logo aprende a pensar em segurança, e não em progresso, como a mais alta lição de política.

Concede-te um instante de repouso, e compreenderás o quanto era tola tua agitação. Aprende a calar, e perceberás que falavas demais. Sê bondoso, e verás que tua opinião sobre os outros era severa demais.

Nunca te zangues! Senão poderias queimar num só dia a lenha acumulada em muitas semanas de duros esforços.

Deus não impõe ao homem nenhuma carga superior às suas forças

Ter o suficiente significa felicidade; ter mais do que o necessário é desdita. Isto vale para todas as coisas, principalmente o dinheiro.

Não convém fazer promessas quando se está sob a ação de uma grande alegria; nunca responder uma carta quando se está dominado por grande irritação.

Das trinta e seis maneiras de fugir, a melhor é correr.

Esperando com paciência, o tempo será radioso.

Que teus atos sejam pautados por ti, e não pelos acontecimentos.

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O que fazemos não perece para sempre. Tudo amadurece a seu tempo, e dá frutos na hora certa.

Só vemos nossos próprios erros através dos olhos dos outros.

Também um ramo corado torna a crescer, também a lua decrescente torna a aumentar. Sábio quem pensa nisto, e não se desgasta com contrariedades.

Quem cala não provoca brigas

A cobiça empobrece a vida do homem, pois a fartura do mundo não o torna rico.

Feliz é quem vive sem doenças, rico o que não tem dívidas.

Se o fato aconteceu, não o comentes; é muito difícil recolher novamente a água derramada sobre a areia.

Recompensa com uma fonte inesgotável a quem te presenteou com uma gota de água. Exigi muito de ti mesmo, e espera pouco dos outros. Desta forma, pouparás muito aborrecimento.

Viver um dia de lazer ininterrupto, significa ser imortal por um dia.

Todo mundo é como Deus o fez, e muitas vezes bastante pior.

Não há gosto, nem desgosto grande, naquilo em que a imaginação não tem a maior parte , e a vaidade, empenho.

A ingratidão não consiste só no esquecimento do favor; mas também em sua aversão oculta, que temos a quem nos obrigou, por isso quando o vemos, o encontramos, sempre é com pesar e desagrado. Insensivelmente se forma uma espécie de divórcio entre quem recebe um favor e a quem o faz; este por vaidade afeta o não lembrar-se do benefício feito, aquele tem pejo de haver-se esquecido dele.

Não é bom ser livre demais. Não é bom ter todas as necessidades.

As virtudes se perdem no interesse como os rios se perdem no mar.

As pessoas fracas não podem ser sinceras.

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A sinceridade é uma abertura do coração. Encontra-se em muito poucas pessoas, e a que se vê em geral não é mais que uma fina dissimulação para atrair a confiança dos outros.

Esquecemos facilmente nossas faltas quando só nós a conhecemos.

Não é tão fácil granjear nome por meio de uma obra perfeita quando fazer valer uma obra medíocre graças ao nome que já se adquiriu.

O perfeito cavalheiro é o que não assalta nas grandes estradas e não mata ninguém; enfim, aquele cujos vícios não são escandalosos.

Não há pessoas mais azedas do que as doces por interesse.

Não é verdade que os homens sejam melhores na pobreza do que na riqueza.

É preciso tudo esperar e tudo temer do tempo e dos homens.

É raro obter muito dos homens de quem se precisa.

Quem acredita não precisar mais dos outros torna-se intratável.

Os homens sentem vontade de prestar serviço só enquanto não podem fazê-lo.

Os mentirosos são baixos e fanfarrões.

A esterilidade do sentimento alimenta a preguiça.

Nenhum homem é fraco por opção.

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Renúncia

Manuel Bandeira CCARTAARTA-R-RENÚNCIAENÚNCIA DEDE J JÂNIOÂNIO Q QUADROSUADROS

Fui vencido pela reação, e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram-se os meus esforços para conduzir esta nação pelo caminho da sua verdadeira libertação política e econômica, único que possibilita o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso Povo.

Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando nesse sonho a corrupção, a mentira e a covardia, que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos indivíduos, inclusive do exterior.

Sinto-me, porém esmagado. Forças terríveis levantaram-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração. Se permane- cesse, não manteria a confiança e a tranqüilidade, ora quebradas e indispensáveis ao exercício da minha autoridade.

Creio, mesmo, que não manteria a própria paz pública. Encerro, assim com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes e para os operários, para a grande família do país esta página de minha vida, e de vida nacional. A mim não falta a coragem da renúncia.

Saio com um agradecimento e um apelo. O agradecimento aos companheiros que, comigo, lutaram a sustentaram dentro e fora do governo, e de forma especial, as forças armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nessa oportunidade.

O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos; de todos para cada um.

Somente assim seremos dignos deste país e do mundo. Somente assim, seremos dignos da nossa herança e da nossa predestinação cristã.Retorno, agora, a meu trabalho de advogado e professor.Trabalharemos, todos. Há muitas formas de servir a nossa pátria.

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Brasília, 25 de agosto de 1961.

“Ao Congresso Nacional, nesta data e por este instrumento deixo com o Ministro da Justiça as razões do meu ato, renunciando ao mandato de presidente da República.”

Brasília, 25 de agosto de 1961.(A) Jânio da Silva Quadros.

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Renúncia

Manuel Bandeira CCARTAARTA-T-TESTAMENTOESTAMENTO DEDE G GETÚLIOETÚLIO V VARGASARGAS

“Mais uma vez, as foças e os interesses contra o povo, coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim.

Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia de trabalho. A lei dos lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios.

Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobras e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobras foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.

Assumi o Governo dentro da aspiral inflacionária que destruía os valores de trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano.

Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes de mais de 100 milhões de dólares por ano.

diarem, sentireis no pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com perdão. E aos que pensam que me derrotaram, respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate.

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Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram o meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho a eternidade e saio da vida para entrar na História.”Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta do uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser o meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro. Eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater a vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipen-

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( G( GETÚLIOETÚLIO D DORNELESORNELES V VARGASARGAS ) )

Renúncia

Manuel Bandeira

EECLESIASTESCLESIASTES

“Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás. Reparte com sete, e ainda até com oito, porque não sabes que mal haverá sobre a terra. Estando as nuvens cheias, derramam a chuva sobre a terra, e caindo a árvore para o sul, ou para o norte, no lugar em que a árvore cair ali ficará. Quem observa o vento, nunca semeará, e o que olha para as nuvens nunca segará. Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre de que está grávida, assim também não sabes as obras de Deus, que faz todas as coisas. Pela manhã semeia a tua semente, e à tarde não retires a tua mão, porque tu não sabes qual prosperará; se esta, se aquelas, ou ambas igualmente serão boas. Verdadeiramente suave é a luz, e agradável é aos olhos ver o sol. Mas se o homem viver muitos anos e em todos eles se alegrar, também se deve lembrar dos dias das trevas, porque hão de ser muitos. Tudo quanto sucede é vaidade. Alegra-te, jovem, na tua mocidade, e recreia-te o coração nos dias da tua juventude, e anda pelos caminhos do teu coração, e pelas vistas dos teus olhos: sabe, porém, que por todas estas coisas te trará Deus a juízo. Afasta pois a ira da tua carne o mal, porque a adolescência e a juventude são vaidade.”

(E(ECLESIASTESCLESIASTES, 11), 11)

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Renúncia

Manuel Bandeira O SO SERTANEJOERTANEJO

O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.

A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações atléticas.

É desgracioso, desengonçado, torto, Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados.Agrava-o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um caráter de humildade deprimente. A pé, quando parado, recosta-se invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se sofreia o animal para trocar duas palavras com um conhecido, cai logo sobre um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela. Caminhando, mesmo a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança celeremente, num banbolear característico, de que parecem ser o traço geométrico os meandros das trilhas sertanejas. E se na marcha estaca pelo motivo mais vulgar, para enrolar um cigarro, bater o isqueiro, ou travar ligeira conversa com um amigo, cai logo – cai é o termo – de cócoras , atravessando largo tempo numa posição de equilíbrio instá-vel, em que todo o seu corpo fica suspenso pelos dedos grandes dos pés , sentado sobre os calcanhares, com uma simplicidade a um tempo ridícula e adorável.É o homem permanentemente fatigado.Reflete a preguiça invencível, a atonia muscular perene, em tudo: na palavra remorada, no gesto contrafeito, no andar desaprumado, na cadência langorosa das modinhas, na tendência constante à imobilidade e à quietude.Entretanto, toda esta aparência de cansaço ilude.Nada é mais surpreendedor do que vê-la desaparecer de improviso. Naquela organização combalida operam-se, em segundos, transmutações completas. Basta o aparecimento de qualquer incidente exigindo-lhe o desencadear das energias adormecidas. O homem transfigura-se. Empertiga-se estandeando novos relevos, novas linhas na estatura e no gesto; e a cabeça firma-se-lhe, alta, sobre os ombros possantes, aclarada pelo olhar desassombrado e forte; e corrigem-se-lhe, prestes,

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numa descarga nervosa instantânea, todos os efeitos do relaxamento habitual dos órgãos; e da figura vulgar do taberéu canhestro, reponta, inesperadamente, o aspecto dominador de um titã acobreado e potente, num desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinária. (Euclides da Cunha – Os Sertões, pág.: 95/6)

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Renúncia

Manuel Bandeira

CLASSIFICAÇÃO DAS CONSOANTES

1- QUANTO AO MODO DE ARTICULAÇÃO :a. oclusivas: p, t, k, b, d, g, m, n, nh.b. constritivas: f, v, s, z, s’, z’, l, lh, r, R.* fricativas: f,v, z, z’, s, s’* laterais: l, lh.* vibrantes: r (simples), R(múltiplo).

2- QUANTO À ZONA DE ARTICULAÇÃO :a. bilabiais : p, b, m.b. labiodentais: f, v.c. linguodentais: t, d, n.e. alveolares: s, l, z, r.f. palatais : s’, z’, lh, nh.g. velares : k, g, R

3- QUANTO AO PAPEL DA CORDAS VOCAIS: a. surdas : p, t, k, f, x, s.b. sonoras: b, d, g, v, j, z, l, lh, r, R, m, n, nh.

4-QUANTO AO PAPEL DAS CAVIDADES BUCAL E NASAL :a. orais: (p,b); (t,d); (k,g); (f,v); (s,z); (x,j); r, R, l, lh.b. nasais: m,n.nh.

“Há uma série de vogais anteriores, com um avanço da parte anterior da língua e a sua elevação gradual, e outra série de vogais posteriores, com um recuo da parte posterior da língua e a sua elevação gradual. Nesta há, como acompanhamento, um arredondamento gradual dos lábios. Entre uma e outras, sem avanço ou elevação apreciável da língua, tem-se a vogal /a/ como vértice mais baixo de um triângulo de base para cima. A articulação da parte anterior, central (ligeiramente anterior) e posterior da língua dá a classificação articulatória das vogais – anteriores, central e posteriores. A elevação gradual da língua na parte anterior

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ou na parte posterior, conforme o caso, dá a classificação articulatória de vogal baixa, vogais médias de 1º grau (abertas), vogais médias de 2º grau (fechadas) e vogais altas.

(E(ESTRUTURASTRUTURA DADA L LÍNGUAÍNGUA P PORTUGUESAORTUGUESA, J.M.C.J., , J.M.C.J., PÁGPÁG. 41). 41)

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Renúncia

Manuel Bandeira EEMPREGOMPREGO DODO H HÍFENÍFEN

1- SUFIXOS TUPIS: NASAL TÔNICA OU ACENTUADA GRAFICAMENTE. -açu, -guaçu, -mirim.

2- HÍFEN DIANTE DE QUALQUER LETRA: -bem, -sem, -aquém, -recém, -além, -pós, -pré, -pró, -soto, -sota, -vice, -nuper, -ex, -co, -para.

3- HÍFEN DIANTE DE VOGAL, H, R, S. -auto, -neo, -proto, -pseudo, -extra, -intra, -infra, -ultra, -contra, -semi, -supra.

4- HÍFEN DIANTE DE H, R, S. -ante, -anti, -arqui, -sobre, -mini.

5- HÍFEN DIANTE DE H E R: -hiper, -super, -inter.

6- HÍFEN DIANTE DE H E VOGAL: -circum, -com, -mal, -pan.

7- HÍFEN DIANTE DE R. -ab, -ad, -ob, sob, sub. (b)

8-HÍFEN DIANTE DE H. -entre.

Obs.: Quanto a –pos, -pre, -pro, inacentuados, é preciso advertir se a palavra que se compõe de um desses prefixos é ou não antiga na língua: se for antiga, o prefixo é átono e aglutinado ao radical: pospor, preanunciar, pressentir, pretônico, prorrogar, propugnar, etc.

Obs.: Emprega-se o prefixo –bem quando a palavra que se lhe segue tem vida autônoma na língua ou quando a pronúncia o requer : bem-humorado, bem-estar, bem-parecido, bem-me-

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quer. Quando –bem e –mal são usados na frase como advérbio não se aglutinam nem se separam por hífen: carne mal assada, recado bem transmitido.

Obs.: Exemplos de prefixo –co usado sem hífen: coabitar, coadquirir, coagente , coagir, coagregar, coaquisição, coequação, coessência, coestaduano, coeterno, coexistência, coextensão, coigualdade, coincidir, coindicar, coirmão, colaborar, colateral, coligação, coligar, colimitar, conotação, conotar, coobrar, coobrigação, coobrigar, coocupar, coonestar, cooperar, cooptar, coordenar, correferir, correger, correlacionar, correlatar, corroborar, corromper.

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Todos os animais são iguais, mas alguns são mais igual que outros.

Quando o povo se incube de raciocinar tudo está perdido.

Nada de reprimir o povo: deixem que ele vá para o inferno em paz.

Quem pensa demais, não chega à idéia certa.

Deve-se olhar dentro do pote.

Sempre se pode apagar o passado: é uma questão de arrependimento, de retratação, de esquecimento. O que não se pode evitar é o futuro.

Futuro: aquele período no qual nossos negócios prosperam, nossos amigos são leais e nossa felicidade está assegurada.

Num país bem governado, a pobreza é algo que deve causar vergonha; num país malgovernado, a riqueza que algo que deve causar vergonha.

A mulher que revela a idade ou é jovem demais para ter alguma coisa a perder ou velha demais para ter alguma coisa a ganhar.

O clássico é algo que todo mundo gostaria de ter lido e ninguém deseja ler.

Se os escritores não lessem e os leitores não escrevessem, a literatura seria extraordi-nariamente melhor.

Uma minoria pode estar certa; a maioria está sempre errada.

Deus tolera os maus, mas não para sempre.

Deviam parar com essa demagogia sobre as massas. As massas são rudes, desprepa-radas, ignorantes, perniciosas em suas reivindicações e influências. Não precisam de lisonjas e sim de instrução.

Os médicos receitam remédios que pouco conhecem, para curar doenças que conhecem menos ainda, em seres humanos que desconhecem inteiramente.

Às vezes a mentira explica melhor que a verdade o que se passa na alma.

Elogiar sempre moderadamente é sinal de mediocridade.

Disputar com um igual é duvidoso, com um superior, uma loucura, com um inferior, uma vulgaridade.

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Qualquer imbecil pode dizer a verdade, mas quem tem certa sagacidade sabe mentir bem.

Uma verdade contada com más intenções supera todas as mentiras.

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No coração dos poderosos o prazer e a ostentação superam o interesse.

A arte de agradar é a arte de enganar.

Para os fracos a razão é quase impotente.

Não devemos temer demasiadamente que nos enganem.

Se fosse possível dar sem perder, ainda assim se encontrariam homens inacessíveis.

Os preguiçosos têm sempre vontade de fazer alguma coisa.

A natureza deu aos homens talentos diversos. Uns nascem para inventar, outros para adornar; mas o dourador atrai mais os olhares que o arquiteto.

O ódio dos fracos não é tão perigoso quanto a sua amizade.

A franqueza pode ser útil quando é usada com arte ou quando, pela sua raridade, não recebe crédito.

Chega a ter o seu lado cômico vê o sem-número de indivíduos que, na prática, tomam só a si mesmos como reais, considerando os outros como fantasmas.

O remorso e a inquietação que muitas pessoas sentem em ralação ao que fizeram não são, no fundo, outra coisa senão o temor do que lhes poderá acontecer em conseqüência de tal ação.

Buscamos nossa felicidade fora de nós mesmos e na opinião dos homens, que sabemos aduladores, pouco sinceros, sem eqüidade, cheios de inveja, de caprichos e de preconceitos: que extravagância!

A experiência confirma que a brandura ou a indulgência para consigo e a dureza para com os outros são um só e mesmo vício.

O interesse fala toda sorte de línguas e faz toda sorte de papéis, até mesmo o de desinteressado.

Em todas as profissões e em todas as artes, cada u faz para si uma aparência e um exterior que ele põe no lugar da coisa cujo mérito que obter; de sorte que o mundo todo não é composto senão de aparências e é em vão que trabalhamos para nele encontrar alguma coisa de real.

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Todos os homens procuram ser felizes: não há exceção; por diferentes que sejam os meios que empreguem, todos tendem a esse fim O que faz que alguns vão à guerra, e outros não, é este mesmo desejo, que em cada um se acompanha de diferentes opiniões. A vontade não dá jamais o menor passo que não seja em direção a esse objeto. É o motivo de todas as ações de todos os homens, até mesmo dos que vão enforcar-se.

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Renúncia

Manuel Bandeira

EECLESIASTESCLESIASTES

Lembras-te do teu criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais venhas a dizer: Não tenho neles contentamento: Antes que se escureçam o sol, e a luz, e a lua, e as estrelas, e tornem a vir as nuvens depois da chuva: No dia em que tremerem os guardas da casa, e se curvarem os homens fortes, e cessarem os moedores, por já serem poucos, e se escurecerem os que olham pelas janelas; E as duas portas da rua se fecharem por causa do baixo ruído da moedura, e se levantar à voz das aves, e todas as vozes do canto se baixarem; como também quando temerem o que está no alto, e houver espantos no caminho e florescer a amendoeira, e o gafanhoto for um peso, e perecer o apetite: porque o homem se vai à sua eterna casa, e os pranteadores andarão rodeando pela praça; antes que se quebre a cadeia de prata, e se despedace o copo de outro, e se despedace o cântaro junto à fonte, e se despedace a roda junto ao poço. E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu. vaidade de vaidade, diz o pregador, tudo é vaidade. E quanto mais sábio foi o pregador, tanto mais sabedoria ao povo ensinou; e atentou, e esquadrinhou e compôs muitos provérbios. procurou o pregador achar palavras agradáveis; e o escrito é a retidão, palavras de verdade. As palavras dos sábios são como aguilhões, e como pregos fixados pelos mestres das congregações, que nos foram dadas pelo único Pastor. E, de mais disto, filho meu, atenta: não há limite para fazer livros, e o muito estudar enfado é da carne. De tudo o que se tem ouvido, o fim é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos; porque este é o dever de todo o homem. Porque Deus há de trazer a juízo toda a obra, e até tudo o que está encoberto, que seja bom que seja mau.

( E( ECLESIASTESCLESIASTES, 12 ), 12 )

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Renúncia

Manuel Bandeira EESTOUROSTOURO DADA B BOIADAOIADA

“De súbito, porém, ondula um frêmito sulcando, num estremeção repentino, aqueles centenares de dorsos luzidios. Há uma parada instantânea. Entrebatem-se, enredam-se, trançam-se e alteiam-se fisgando vivamente o espaço, e inclinam-se, embaralham-se milhares de chifres. Vibra uma trepidação no solo; e a boiada estoura...

A boiada arranca.

Nada explica, às vezes, o acontecimento, aliás vulgar, que é o desespero dos campeiros.

Origina-o o incidente mais trivial - o súbito vôo rasteiro de uma araquã ou a corrida de um mocó esquivo. Uma a rês se espanta e o contágio, uma descarga nervosa subitânea, transfunde o espanto sobre o rebanho inteiro, E um solavanco único, assombroso, atirando, de pancada, por diante, revoltos, misturando-se embolados, em vertiginosos disparos, aqueles corpos maciços corpos tão normalmente tardos e morosos.

É lá se vão: não há mais contê-los ou alcançá-los. Acalmam-se as caatingas, árvores dobradas, partidas, estalando em lasca e gravetos; desbordam de repente as baixadas num murulho de chifres; estrepitam, britando e esfarelando as pedras, torrentes de cascos pelos tombadores; rola surdamente pelos tabuleiros ruído soturno e longo de trovão longínquo...

Destroem-se em minutos, feito montes de leivas, antigas roças penosamente cultivadas; extinguem-se, apisoados, os pousos; ou esvaziam-se, deixando-os os habitantes espavoridos, fugindo para os lados, evitando o rumo retilíneo em que se pespenha a “arribada”, - milhares de corpos que são um corpo único, monstruoso, informe, indescritível, de animal fantástico, precipitado na carreira doida. E sobre este tumulto, arrodeando-o ou arremessando-se impetuoso na esteira de destroços, que deixa após si aquela avalanche viva, largado numa disparada estupenda sobre barrancos, e valos, e cerros, e galhadas – enristado o ferrão, rédea soltas, soltos os estribos, estirado sobre o lombilho, preso às crinas do cavalo – o vaqueiro!

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...................................................................................................................................”

( O( OSS S SERTÕESERTÕES – E – EUCLIDESUCLIDES DADA C CUNHAUNHA, 105/6), 105/6)

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Renúncia

Manuel Bandeira CCLASSIFICAÇÃOLASSIFICAÇÃO D DASAS V VOGAISOGAIS

1- QUANTO AO PAPEL DAS CAVIDADES BUCAL E NASAL: a. ORAIORAIs: a, e, é, i, o , ub. nasais: ã, ,e, i, o, u, na, en, in, on, un, am, em, im, om, um.

2- QUANTO AO TIMBRE :a. abertas : á, é, ó.b. fechadas: ê, i, ô, u.c. reduzidas: a, e(=i), o(=u).* as vogais tônicas nasais são fechadas: (mando, menta, minto, monte, mun)* as vogais átonas nasais são reduzidas: (amparo, entrada, inchado, combate)

3- QUANTO À ZONA DE ARTICULAÇÃO :a. anteriores ou palatais: é, ê, i, b. médias ou centrais : a, ã.c. posteriores ou velares: ó, ô, u.

4- QUANTO À INTENSIDADE :a. tônicas: má, fé, carnê, tupi, pó, novo nu.b. átonas: pretônicas ou postônicas./c. subtônicas: vagamente, levemente, timidamente, pozinho, nuzinho.

5- QUANTO À ELEVAÇÃO DA LÍNGUA : i u a. altas: i, u, b. médias: é, ó, ê, ô, , 2º grau ê ôc. baixas: a 1º grau é ó a anter. cent. post.6- QUANTO À POSIÇÃO DOS LÁBIOS :a. arredondadas: ó, ô, u.b. não-arredondadas: é, ê, i, a.

7- QUANTO À FORMA DO RESSONADOR :

Hellwag

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a. centrípetas: i, ê, ô, u.b. centrífugas: é,o, a.

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Renúncia

Manuel Bandeira FFONEMAONEMA

Conjunto de articulações dos órgãos fonadores cujo efeito acústico estrutura as formas lingüísticas e constitui numa enunciação o mínimo seguimento distintivo. Os fonemas de uma língua não correspondem necessariamente às letras da grafia usual e só na TRANSCRIÇÃO FONÉTICA ficam a nossos olhos rigorosa e sistematicamente indicados. Como seguimento mínimo da fonação, o fonema é uma subdivisão da sílaba. A individualidade significativa de depende dos fonemas que os constituem e que nos permitem distinguir uma forma mínima de outra (faz::fez:fiz). Daí o método da COMUTAÇÃO para depreender os fonemas de uma língua: imprimir mudança fonética a uma forma mínima ou um vocábulo para ver se com isso se obtém outra forma mínima ou outro vocábulo, o que, acontecendo, revela que com a mudança se chegou a outro fonema. Nem todas as articulações que se executam, por ocasião da emissão de um fonema, servem para defini-lo; em sua totalidade elas constituem não um fonemas, mas um SOM DA FALA, que tem interesse para a fonética, mas não para a fonêmica. O fonema se individualiza apenas por algumas dessas articulações, que são os seus TRAÇOS DISTINTIVOS, pois por meio delas se distingue dos demais fonemas da língua, como evidencia a comutação. Assim, o fonema /t/ em português se define por 3 traços distintivos: 1) uma articulação da ponta da língua com a parte interna da arcada dentária superior (fonema dental), que se distingue por exemplo do /p/, cuja articulação é nos lábios; 2) uma interrupção momentânea da corrente de ar deter-minada pela oclusão da cavidade bucal (consoante oclusiva), que o distingue por exemplo do /s/, onde não há essa oclusão; 3) um abrimento da glote que impede a vibração das cordas vocais e que os distingue por exemplo do /d/, onde há essa vibração; daí, por comutação, tia: pia: sai: dia;Esses traços distintivos são suscetíveis de alteração em função de certas circunstâncias da enunciação, criando-se assim, dentro do conceito de fonema, o de suas variantes ou ALOFONES. Elas são livres, quando dependem dos hábitos articulatórios um tanto diversos dos falantes da língua; posicionais, quando dependem da posição do fonema na enunciação, onde a contiguidade de certos outros fonemas ou a sua posição na sílaba altere a articulação; estilística, quando por intenção estilística a articulação se enriquece de traços excepcionais.Quando a alteração anula a distinção entre dois ou mais fonemas, diz-se que houve uma neutralização entre eles e o resultado articulatório é o ARQUIFONEMA; pode acusticamente corresponder a um dos fonemas ou ser um como que denominador

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comum de todos eles, contendo apenas os traços distintivos em comum. A neutralização é o resultado extremo da variação posicional, como em português a da distinção entre /s/: /z/: /s’/: /z’/ em posição final diante de pausa (ex.: us, luz, flux tem a mesma consoante final ,. Que na pronúncia mais geral luso-brasileira é um [s’] atenuado em chiamento). A neutralização deve ser distinguida cuidadosamente do debordamento, que é o emprego facultativo de um fonema em lugar de outro em determinada forma da língua, como em português, em muitas formas, a substituição e /e:/ por /i/ ou de /o:/ por /u/ quando pretônicos (ex.: /mininu/ ou /meninu/, /kuruz’a/ ou /koruz’a/ para menino, coruja).Em toda língua os fonemas são em número limitado e fixo e se dispõem espontaneamente num paradigma de grupos opositivos (ex.: em português, /p/: /b/, oposição por ausência ou presença de sonoridade) e associativos (ex.: em português /p/-/b/ pela coincidência da articulação labial); esse paradigma é o SISTEMA FONÊMICO da língua. A oposição primária e praticamente universal entre os fonemas é a vogal e consoante.

( D( DICIONÁRIOICIONÁRIO DEDE L LINGÜÍSTICAINGÜÍSTICA EE G GRAMÁTICARAMÁTICA, J.M.C.J., , J.M.C.J., PÁGSPÁGS. 118/119 ). 118/119 )

Page 191: Os Eleitos

Renúncia

Manuel Bandeira Vício das subordinações: (página 49)

O princípio dirigente da arte do estilo deveria ser este: não pode alguém pensar, nitidamente, de cada vez, senão um pensamento. Não lhe podemos exigir, portanto, que pense, ao mesmo tempo, dois e sobretudo vários. Pois é isso que lhe impõe aquele que os atocha, sob a forma de incidências, nas descontinuidades de uma frase principal, para isso despedaçada; atira-o dess´arte, inútilemnte e jovialmente, na perplexidade. E´ o que fazem, mais a isso que as outras línguas vivas, pode bem ser, mas não justifica o mérito da cousa. Prosa alguma se lê mais fácil e agradavelmente que francesa, porque, geralmente, se acha isenta de tal vício. O francês enlaça os pensamentos na ordem mais lógica e, normalmente, mais natural, e assim os submete, sudessivamente, ao seu leitor, que os pode, azadamente, examinar e consagrar a cada qual sua atenção inteira. O alemão, longe disso, entrecruza-os num período embrulhado, mais embrulhado, cada vez mais embrulhado, por querer dizer seis cousas de pancada, em logar de as emitir umas após outras. (Schopenhauer, Ecrivains et. Style, pg. 78).

Page 192: Os Eleitos

Renúncia

Manuel Bandeira Da concisão: (página 39)

Todo exagero produz geralmente o contrário do fim previsto. Assim, as palavras servem para tornar as idéias perceptíveis, mas somente até certo ponto. Amontoadas além da justa conta escurentam sempre as idéias a comunicar. Missão do estilo e encargo do juízo é para na riscaexacta; pois, cada palavra demasiada é contraproducente. Voltaire disse a propósito: <O adjetivo é inimigo do substantivo > Mas, na verdade, muitos escritores buscam esconder, na superabundância das palavras a pobreza das idéias. Evite-se, conseqüentemente, toda prolixidade e todo encrustamento de notículas insignificantes que não pagam a pena de ser lidas. Devemos economizar o tempo, os esforços e a paciência do leitor. Se o fizermos, ele crerá, de boa mente, que mereça leitura atenta o que lhe oferecemos e recompensará nosso trabalho. Vale mais omitir alguma cousa boa que ajuntar algo insignificante. Aplica-se bem, aqui, a frase de Hesíodo: a metade é preferível ao todo. Em suma: não dizer tudo! <O segredo do enfaramento é dizer tudo>. Logo, sempre que possível, só a quintessência, só o essencial, nada que o leitor não possa, por si mesmo, repensar. Recorrer a muitas palavras para exprimir poucas idéas é sinal infalível de mediocridade. O do cérebro eminente, ao contrário, é concentrar muitas idéas em poucas palavras>.

(Schopenhauer ___ Ecrivains et style, p. 58).

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Renúncia

Manuel Bandeira Sobre o acumulamento: (página 60)

E´ claramente contra ar regras da sã razão entrecruzar dois pensamentos como cruz de pau. E´ no entanto o que se dá quando interrompemos o que principiarmos a dizer para intercalar alguma cousa diferentíssima, ou quando confiamos à guarda do leitor, até nova ordem, um período começado, ainda desprovido de sentido e cujo complemento havemos de esperar. E´ como se puséssemos um prato vazio na mão dos convidados, na esperança de que se encha por si mesmo. Falando franco, as entre vírgulas são da mesma família que as notas de infra-página e os parênteses no trecho; todas três, apurando bem, diferem só de grau. Demóstenes e Cícero, por vezes, perpetraram dêsses períodos caudatos. Inseridos uns nos outros; melhor teriam feito evitando-os. Essa construção atinge o mais alto acume da absurdeza quando as cláusulas incidentes não se intercalam organicamente, mas se encravam fracturando o período directamente>

(Schopenhauer ___ Ibidem, p. 81).

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Renúncia

Manuel Bandeira b) Sobre o estilo picado (braquiologia) : (página 61)

A verdadeira brevidade de expressão consiste em dizer somente o que deve ser dito, em evitar toda explicação prolixa daquilo que toda a gente pode, por si mesma, pensar, distinguindo exactamente o necessário do supérfluo. Por outro lado, importa não sacrificar a clareza e muito menos a gramática à brevidade. Enfraquecer a expressão de um pensamento, obscurecer ou estiolar o sentido de um período para ecomizar algumas palavras é mingua deplorável de juízo(Schopenhauer___ Ibidem, p. 60).

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Renúncia

Manuel Bandeira Valor da precisão: (página 63)

Entre as muitas expressões que podem traduzir um só dos nossos pensamentos só uma existe boa. Nem sempre a achamos falando ou escrevendo; mas a verdade é que ela existe, que tudo o mais, fora ela, é fraco e não satisfaz o homem de espírito que se quer fazer ouvir. Um bom autor, cuidadoso no escrever, observa muitas vezes que a expressão buscada há muito, desconhecida e emf;m achada, era a mais simples e natural, a que deveria acudir logo, sem esforço. (La Bruyere ___ Les caracteres ___ ed. Flam. p. 59.)

(página 96)

Renúncia

Manuel Bandeira Um bom escritor rico de idéas, impõe-se bem depressa ao seu leitor, como tendo alguma cousa que dizer; e isso dá, a este último, a paciência de o seguir atentamente. Um escritor desse estofo, precisamente porque tem algo que dizer, exprimir-se-á sempre do modo mais singelo e mais claro. Timbra, com efeito, em despertar no leitor a idea mesma que lhe ocorre no momento e não outra... O que também o carateriza é que evita, quanto possível, todas as expressões fixadas, feitas para desembaraçar nas ocasiões difíceis. Eis porque se vale sempre, em qualquer caso, da expressão mais abstracta, ao passo que os de tino escolhem a mais concreta, que faz ver as cousas de mais perto e é fonte de toda evidência.(Schopenhauer ____ Ecrivains et style____ tr. Dietrich p. 51 e 52)

Renúncia

Manuel Bandeira Os homens de talento, ao contrário, nos falam realmente em seus escritos e sabem consqüentemente comover-nos e interessar-nos; só eles colocam as palavras com plena conciência, escolha e reflexão. Seu estilo assim, é, relativamente aos outros, o que um quadro, pintado realmente, é, contraposto a um quadro feito por padrão. Aí, em cada palavra como em

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cada pincelada, há uma intenção especial; aqui, ao revés, tudo é feito mecanicamente. Schopenhauer. Idem __ p. 53).

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Fez circular a idéia de queFez você agir sem o benefício do intelectoFicou sem margem de manobraFilósofo ou não, o fato é queFilósofo que vem a ser exatamenteFirma propósitoFoi dramática por duas razões. Primeiro porqueFoi feito na íntegra, com o propósito de demonstrarFormalismo tacanho é assim: para receberFragmentos da mensagem diluídos num discurso sem fimFundado no caráterGracejo não tinha, a situação não era para gracejoGuardadas as devidas proporçõesGuardar silêncioHá um ponto nesse terreno a ser consideradoHá várias razões que me levam a não participar da formatura, a principal delas.Havia acenado com a perspectivahomem é o homem; Caim não matou Abel semana passadaIdéias secundárias assumam feição gramaticalImpôs-lhe uma derrota fenomenalImprimem certo caráter pesadoInsistiu na idéiaIsolar os fatos numa perspectivaIsso é inegável, se quisermos elaborar um conceito coerente de sujeitoIsso gera aquilo que os químicos chamam de efeito paradoxal. Ou seja, tudo sai ao contrário.Isso lhe faculta amplo painel estilísticoIsso nos leva a um terceiro pontoJá é considerado, e com razãoJá mencionado no parágrafo precedenteJá vai tardeJamais tinha inventado alguma coisa; não era inventorLá em cima no jantar não disse palavraLá fora já se fazia diaLançaria um novo perfume, e que perfumeleitor pode pensar que é o verdadeiro ... E estará corretoleitor pode pensar que redação técnica é algum bicho papão. Não é. Na verdade, os princípios

Não é só issoNão era exatamente o que eu pensavaNão falta na da de essencial para a compreensão do fatoNão iria muito longeNão lhe havia chegado de graça; ele o conquistaraNão pela sua beleza, ainda que imaculada, mas pela riqueza de detalhamento

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Não pensamos assim, uma vez queNão se furtou a declarar queNão tem correspondenteNão tive filhos. Não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.Não vá pensar que.... nada dissoNão vamos por isso cometer o erro de atribuir importância exagerada à originalidade de suas afirmaçõesNão vejo vantagem em acompanhá-lo emNaquilo que essa renovação tem de originalNas perspectivas românticas são as vias de acesso ao estado naturalNega na essênciaNegar à linguagem a capacidade de refletir a realidadeNem mesmo o caroço era desperdiçado: triturado, servia como ração animal; queimado, transformava-se em carvão.Nenhuma, por certoNesse contexto temos que admitirNesse esquema a idéia é sedutoraNesse particularNesse ponto, uma vez maisNo entanto é bom lembrar que não existe passado histórico em “estado puro”. Todo passado é uma interpretação retrospectiva feita a partir de crenças presentes.No entanto, subjacente a issoNo momento seguinteNo que diz respeito aNos comunica toda a sorte de fatosNum exercício de iraNum exercício de raciocínioNum segundo instanteObjetiva agregar valoresObserva. É mesmo

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Por esse não se deixava mais passar para trás; não quando essa pessoa eraPor fatores de ordemPor natural associação de idéiasPor oportunoPor palavras encobertasPor que estão os empresários infelizes? Vamos partir do princípio.Por um processo análogoPorque são fragmentários a base deve ser outraPotencialmente custosoPouco apropriado ao papel de Precisa encontrar um corpo unificado de resultadosPrecisa ser reelaboradaPrecisamente por esta razãoprincípio fundamental da linguagem poéticaProblemática ampla e demasiada obscura em muito dos seus pontosprofessor assim se expressaProjeto de longa maturaçãoprojeto envolve investimentos anuaisPropicia o surgimentoQuando cheguei, o local estava devolvido ao silêncioQuanto a isso ele se calouque acabamos de ouvir mudou-se para o coraçãoque causa espanto a todos que se detém na análise desse episódioque governa essas diretrizesQue ninguém nos ouça, mas cá entre nósQue se insinuam na narrativaQue se seguiu a issoQue tem motivado em grande parteQuer que eu explique? É simples.Questão emergencialQuis ver-lhe as mãosRealçam certo caráter contraditórioRealmente não é o contrário, é outra coisaReclamados por associação de ordem eminentemente apriorísticaRepousa na crençaRepresenta a camada aparente de uma grave situação socialResgatados pelas mãos da literaturaReside apenas no imaginário infantilResistem ao oficial português, liquidando-o no local. É o começo da ...Respondia sem revolta ou renúncia na voz

Tão satisfeito quanto decepcionadoTem campos de competência diferentesTem razão, é isso mesmoTem um componente autoritário

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Teria jurado qualquer coisaTiveram lugar de relevoTiveram repercussão na LiteraturaTodo o esquema está sujeito a revisõesTomou feição literáriaTransformação operada no domínio da arteTudo brilhava e, de dor, ele teve de fechar por um momentos os olhosTudo isso é irreal e aponta para uma crise profunda e graveTudo isso sublinha o caráterTudo na vida é assim: nós agimos para evitar sofrimento ou para procurar Um exercício a serviço da inteligênciaUm quieto distanciamentoUm trabalho como esse pode ser planejado sem necessidade de pesquisa. É algo que o aluno pode fazer servindo-se Uma coisa dessas está sempre associada a riscosUma coisa pode ser clara em si mesma e não ser explicada de forma clara Uma coisa é certaUma frase deliciosa pelo que tem de poético e fantasiosoUma guerra civil de proporções genocidasUma letra redonda, fina, bonita letra, letra de mulherUma orientação profundamente nacionalistaUma última colocação apenasUnificar a um só tempoVai compor o fenômeno literárioVai nisso um enganoVai operar a fusão fáticaVejamos porque, explorando apenas dois pontos da questãoVendo a batalha perdida, arrancou as insígneas, e espada na mão, mergulhou na horda invasora. Nunca mais foi ...Vivo interessevocabulário denunciavolante já não agia sobre o carroVolveu os olhos em minha direção

Empresta ao flanco uma aparência desoladaEncarar a questão de maneira unilateralEncontra expressão adequada naEnfim, são termos usados em circunstâncias diferentes. E basta isso paraEquilíbrio precário Ensiná-los a criar ou aprisionar idéias; ensinar enfim a pensarEram-lhe demasiado desconfortávelErro de método denunciado logo nas primeiras linhas, se bem que...Especial interesseEssa associação sugere fato novoEssa concepção, panegírica por excelênciaEssa dupla possibilidade motiva dúvidas

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Essa história é por demais conhecida. Passemos adianteEssa idéia merece exame mais acuradoEssa observação dá a exata medidaEssa observação me parece essencialEssa regra não alcança as oxítonasEssas palavras soam estranhas aos nossos ouvidos secularesEsse cheiro era-lhe familiarEsse é o nó central da questãoEsse raciocínio se desenvolveu em meioEstá em cursoEstabelece o equilíbrioEstamos diante de uma concepção unilateral da línguaEstamos em presença de um novo tipo de ....Estamos no domínio da gramáticaEstava claramente no centro dos seus interessesEstava na origem do pensamentoEstorvo à passagemEu quero dizer da minha alegriaExatamente como se quisesseExatamente como se quisesse assinalarExatamente neste pontoExemplo de gerúndio a indicar açãoexemplo não tem aceitação pacíficaExige sólida formação teóricaExiste também em outros segmentosExpressão a um tempoFatos não se discutem, opiniões simFaz sentidoFechou a porta atrás de si

Linha de pensamento inaugurada peloLonge de serem absolutos, estão a mais das vezes ligados a condições determinadas: dito de outro modo, não é a espécie que ..., mas simLonge dissolugar estava devolvido ao silênciomais das vezesManeira simplista de explicar as coisasManifesta acentuada tendênciaMarte ocupa um lugar especial no imaginário da humanidadeMas a medula do sistema, seu elemento definidorMas creio que há aqui uma confusão de perspectivaMas eu realço certos pontosMas há um fato a ser consideradoMas não são, e a explicação é simples

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Mas o entrechoque de sua personalidadeMas os empresários em geral ,e os bancos em particularMas que ninguém se enganeMas também e principalmente a socialMas, atençãoMecanismo poético por excelênciaMeio de expressãoMenos malMensagem que não se esgota no mero registro de conteúdos objetivosMuita exibição de conhecimentos factuaisMuito a propósitoMuito afastado de sua significação original.. PerfeitamenteMutatis mutantis, é claroNa expectativa direta de uma exploração mais eficienteNa melhor das hipóteses, era um sistema tacanhoNa sua totalidadeNão admitem fronteiras; há isto sim, como que uma interpenetração Nada mais.Não constituem grupos contínuos; ao contrário formamNão deve faltar; omiti-la é retirar o caráterNão disse palavraNão é bem assimNão é difícil entender porque. Veja só:Não é menos verdadeiro queNão é nem podia serNão é para menosNão é sem motivo

Oposição diametralmente oposta O escritor escreve tentando recompor, quem sabe, um mundo perdido, a casa perdida. Tenta recompor, quem sabe, enquanto escreve, a família despedaçada., o próprio eu despedaçado Oferece melhor adequação com os fatosOlhar de Richis pousou sobre eleOlhava para o sol, que, oblíquo, se estendia no horizonteOnde acaba o crime e começa a polícia, tão identificados estão um com o outro.Organizar a sociedade em bases novasOs cabelos iam-lhe até os joelhosOs cientistas podem comprovar isso de duas maneiras. A primeira, e mais exataOs exemplos falam por si como evidência em favor dessa análiseOs fatos não vão em sua defesaOs principais núcleos de civismoOu antesOutras alterações poderão ocorrer, isso é naturalPalpitava-lhe por dentro Para bem captar esse aspecto da questão

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Para, em segredo,Parecia uma publicação brasileira, só desgraçaParticular importânciaPelo sim, pelo nãoPerdeu seu nortePerfume ativoPermita-me estar comovidoPermitiu que a insinuação se insinuasse Pior aindaPode ainda, em certo sentidoPode funciona, mas dentro de certos limitesPode funcionar, mas dentro de limites muito estreitosPodem ocorrer exageros, e eles ocorrem efetivamentePodemos ainda, em certo sentido,Podemos estar na presença de Pode-se dizer, com razãoPodia voltar para casa; não quisPois bem,Pô-los ao serviçoPor certoPor entender que

O resultado já era esperadoResultam antes da conjugação das partesRevela sinais evidentes de Richis ia à frente, magnífico na aparênciaSão aliás opiniões divergentesSão componentes importantes a serem consideradosSão, de restoSão, digamos,São, por assim dizerSatisfação e entusiasmoSe as frases parecem estranhas, tal se dá porque não são genuínasSe é verdade que .... também é verdade que ...Se fez sentir entre nósSe moveu na tentativa de Se não, vejamosSe prestam a equívocos e imprecisõesSe prevalecem de tais passagem; porque, de duas, uma:Se tornou sensível ao ataqueSeja como forSeja como for, para prevenir, homens com mais de quarenta anos deveriam submeter-se ao menos uma vez por ano a exames preventivos. É chato, mas é necessário.Sejam quais forem as alterações, uma coisa é certaSem negar o que aí existe de verdade

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Sentou-se em sua casinha esperando a morte. Que não veio.Ser o homem a causa eficienteSeria, quando muitoSignifica um passo em direção aosistema parlamentar é impermeável a golpesSó pode ser entendido à luz da ideologiaSó que ele contraria esse princípioSó que essa tarefa escapa à estilística como ciênciaSob muitos aspectos são superiores à destilaçãoSolução há basta quererSua desconfiança deu lugarSua obra incorporou elementos outrosSua visão desfocada desloca-se para o futuroSuas idéias presidiamSustentam opiniões divergentesTalvez só reste hoje à noite um resquício de mijo de gato. VeremosTanto isso é verdade queNão constituem grupos contínuos; ao contrário formamA pontuação pode ser diferente da do texto acimaAssim é nos Estados Unidos, assim é no BrasilO princípio fundamental da linguagem poéticaNão vejo vantagem em acompanhá-lo emDecorre de uma multiplicidade de causasA química que catalisou adesões para Azeredo é outraPermitiu que a corrupção se insinuasse A experimentação de resto foi fundamentalHá um ponto nesse terreno a ser consideradoNa expectativa direta de uma exploração mais eficienteMas a medula do sistema, seu elemento definidoraí tudo bem, mas a situação não fica só nesses limitesSe é verdade que .... também é verdade que ...Ele talvez tenha sido o que melhor soube captar.

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Pode funcionar, mas dentro de limites muito estreitosTudo na vida é assim: nós agimos para evitar sofrimento ou para procurar ..Eis porque a questão da língua é sempre um produto de fatoresPor que estão os empresários infelizes? Vamos partir do princípio.Com as quais o Governo não tem nada que ver, não fosse por um detalheComo as bactérias anaeróbias, as ditaduras.... o que não suportam é a luz.Bastaria isso talvez para ressaltar a qualidade impecável da traduçãoEnfim, são termos usados em circunstâncias diferentes e basta isso paraIdéias secundárias assumam feições gramaticaisOutras alterações poderão ocorrer, isso é naturalFoi feito na íntegra, com o propósito de demonstrarAliviado, quase satisfeitoOs cientistas podem comprovar isso de duas maneiras. A primeira, e mais exataA abdicação criou um momento de transição na vida política brasileira, pela instauração de uma experiência ‘republicana’, traduzida na forma de governo regencial.”

“A máquina de escrever é a penúltima das grandes invenções cujo mecanismo é compreensível. Aperta-se uma tecla, que aciona um pequeno braço, que viaja até o papel e, no momento que o comprime, o faz com intermediação de uma fita molhada de tinta.”

“A porta se abriu , e ele entrou e a luz do sol caiu-lhe de cheio no rosto. O quartinho estava como que tomado por prata flutuante. Tudo brilhava e, de dor, ele teve de fechar por um momento os olhos.”

“Ele divulgou uma nota afirmando que não iria dignificar esse tipo de jornalismo com uma resposta. Bobagem. Os tablóides não procuram dignificação. Eles fazem um tipo de jornalismo que separa o joio do trigo – e publicam o joio. De vez em quando tem momentos de glória – o caso Morris é um desses”

“Era de atitude humilde. Parecia até que se escondia atrás do braço estendido como alguém que espera pancadas. Era Grenouille.”

“Foi como receber a visita do sol. Assim que a bomba explodiu no céu de Hiroshima, a 580 metros de altitude, formou-se uma bola de fogo que rapidamente se expandiu num raio de 230 metros. Seria um belo espetáculo se não fosse o resto. Foi como sofrer o esbarrão do sol.”

“Mas como solvente, que deveria ser acrescentado no fim; e que, pelo amor de Deus, deveria manipular os fracos de vagar, calma e vagarosamente, como cabia a um artesão”.

“Mas note-se: a identificação do sujeito não se faz com base na definição apreendida: faz-se com base em outra definição, nunca exteriorizada.”

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“Nada há a acrescentar a estes versos. A língua não é mais instrumento de comunicação e expressão no sentido usual desses termos; é comunicação e expressão sim, mas unicamente de beleza de formas, sons e sentidos criados através dela”

“Tinha apenas uma coifa inicial nos seios. Em uma palavra, a jovem era uma criança. Mas que criança.”

“Uma coisa dessas não teria ocorrido antigamente; esse era um exemplar novo da espécie que só poderia surgir nessa época doentia e desmoralizada”

Bar: lugar barulhento, escuro e enfumaçado. Parte da clássica definição não vale mais para a Califórnia – lá, desde l.º de janeiro é proibido fumar nos bares. O veto vai se fiscalizado pelos próprios donos. A multa pela primeira reclamação de um cliente é de 100 dólares; se as queixas continuarem, sobe para 7.000 dólares. Beber ainda pode.”

Oferece melhor adequação com os fatosExiste também em outros segmentosPrecisa encontrar um corpo unificado de resultadosÉ nesse sentido que devemos entender o caráterA nomenclatura eliminou sob o argumentoResultam antes da conjugação das partesMuita exibição de conhecimentos factuaisDesejo de lançar trevas onde havia luzÉ preciso, com ele, dar um passo adianteRespondia sem revolta ou renúncia na vozEmpresta ao flanco uma aparência desoladaSua visão desfocada desloca-se para o futuroSó pode ser entendido à luz da ideologiaTiveram repercussão na LiteraturaTomou feição literáriaFoi dramática por duas razões. Primeiro porqueSejam quais forem as alterações, uma coisa é certaA realidade ganha contorno de filmes surreaisFormalismo tacanho é assim: para receberRichis ia à frente, magnífico na aparênciaUma guerra civil de proporções genocidasPara bem captar esse aspecto da questãoSão mais lentos do que a potência do motor faz suporSó que essa tarefa escapa à estilística como ciênciaSó pode ser entendido à luz da ideologiaNão lhe havia chegado de graça; ele o conquistaraSob muitos aspectos são superiores à destilaçãoOrganizar a sociedade em bases novas

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O sistema parlamentar é impermeável a golpesPor esse não se deixava mais passar para trás; não quando essa pessoa eraMarte ocupa um lugar especial no imaginário da humanidadeA partir daí a investigação se imobiliza numa situação específicaNas perspectivas românticas são as vias de acesso ao estado naturalEssas palavras soam estranhas aos nossos ouvidos secularesMensagem que não se esgota no mero registro de conteúdos objetivosO código sobreleva a mensagem; triunfa o maneirismoO leitor pode pensar que é o verdadeiro ... E estará corretoDeve-se buscar o outro lado do contraditório. E vamos encontrá-loFragmentos da mensagem diluídos num discurso sem fimErro de método denunciado logo nas primeiras linhas, se bem queOs exemplos falam por si como evidência em favor dessa análiseA dificuldade de uma investigação mais aprofundada esbarra na faltaE essas crianças rá, rá, rá, eram absolutamente normaisEssa história é por demais conhecida. Passemos adianteO homem é o homem; Caim não matou Abel semana passadaOnde acaba o crime e começa a polícia, tão identificados estão uns com Representa a camada aparente de uma grave situação socialEle talvez o que melhor soube captar o caráter

Se as frases parecem estranhas , tal se dá porque não são genuínasUma frase deliciosa pelo que tem de poético e fantasiosoNão admitem fronteiras; há isto sim, como que uma interpenetraçãoNa melhor das hipóteses, era um sistema tacanhoEstamos diante de uma concepção unilateral da línguaA correção gramatical nos seus aspectos mais profundosÉ preciso penetrar no sentido exato que ele empresa ao termoBastaria isso talvez para ressaltar a qualidade impecável da traduçãoEnfim, são termos usados em circunstâncias diferentes e basta isso paraIdéias secundárias assumam feição gramaticalOutras alterações poderão ocorrer; isso é naturalFoi feito na íntegra, com o propósito de...Até aí tudo bem mas a situação não fica nesses limitesCom toda a exatidão há de se imitar a misturaFatos não se discutem, opiniões simEncarar a questão de maneira unilateralBem de perto de tal modo queSustentam opiniões divergentesEu quero dizer da minha alegriaEstamos no domínio da gramáticaSó que ele contraria esse princípioComporta pouca possibilidade de erroNesse contexto temos que admitirPor natural associação de idéias

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A coincidência porém acaba por aquiDentro desse linha de raciocínioIsso nos leva a um terceiro pontoIsso lhe faculta amplo painel estilísticoA emergência de propostas e açõesEle fez valer o argumento de queSão aliás opiniões divergentes

Eram-lhe demasiado desconfortávelImpôs-lhe uma derrota fenomenalEssa regra não alcança as oxítonasTem um componente autoritárioRealçam certo caráter contraditórioResgatados pelas mãos da literaturaManifesta acentuada tendênciaO volante já não agia sobre o carroAo analisar a ditadura do HaitiAzar dele, sorte do contribuinteÉ coisa do domínio da sensibilidadeTransformação operada no domínio da arteNos comunica toda a sorte de fatosEis ainda o que revela o poemaO que governa essas diretrizesÉ preciso, com ele, dar um passo adianteComeçava uma nova era para os estudosNão é menos verdadeiro queEle nunca fez semelhante coisaÉ, em essência, um termo a maisFilósofo ou não, o fato é queE nisso não vai nenhuma novidadeAinda há uma questão a ser consideradaSem negar o que aí existe de verdadeDotar de instrumentos adequadosSe prestam a equívocos e imprecisõesUma orientação profundamente nacionalistaMecanismo poético por excelênciaExatamente como se quisesse assinalarEncontra expressão adequada naNão deve faltar; omiti-la é retirar o caráterMas creio que há aqui uma confusão de perspectivaEm suma não analisamos, sofismamos análiseAs muralhas pareciam tudo, menos protetorasConsiderado em si, cheirava divinamente bomA praça era, em seu comprimento, atravessadaSentou-se em sua casinha esperando a morte. Que não veio.

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Por natural associação de idéias

Não se furtou a declarar queDar palavras ao seu espantoEm termos aproximadosTanto isso é verdade queA mais completa expressãoEsse é o nó central da questãoO resultado já era esperadoTudo isso sublinha o caráterTiveram lugar de relevoComo vimos e não obstanteO vocabulário denunciaDivorciada da realidadeA conclusão a tirar é queNão tem correspondenteUm quieto distanciamentoÉ oportuno lembrar que Significa um passo em direção aoOs fatos não vão em sua defesaQuanto a isso ele se calouE, num passo mais alémMas também e principalmente a socialTão satisfeito quanto decepcionadoEssa observação me parece essencialAo contrário, ela estava satisfeitaA situação é algo embaraçosaNão pensamos assim, uma vez queEstava na origem do pensamentoNesse esquema a idéia é sedutoraSua desconfiança deu lugarNão vá pensar que.... nada dissoA informação está vinculada a Exatamente como se quisesseNo entanto, subjacente a issoNum exercício de raciocínio

Porque são fragmentários a base deve ser outraEstava claramente no centro dos seus interessesJamais tinha inventado alguma coisa; não era inventorÉ útil fazer uma pausa para uma advertênciaEle exige um grau de detalhamento muito grandeÉ comunicação sim, mas unicamente de belezaAnalogamente, ambos, dicionário e gramáticaSão componentes importantes a serem considerados

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É preciso saber falar e calar ao seu tempoSem negar o que nela existe de verdadeE nisso não vai nenhuma novidadeGuardadas as devidas proporçõesParecia uma publicação brasileira, só desgraçaE ganhariam muito mais, mas nãoAfirma ele, para logo em seguida acrescentarQuando cheguei, o local estava devolvido ao silêncioNão falta na da de essencial para a compreensão do fatoO que acabamos de ouvir mudou-se para o coração

Bem de perto, de tal modo queE ganhariam muito mais, mas nãoGuardadas as devidas proporçõesDecidir a situação em seu favorAqui se impõe, uma vez maisSustentam opiniões divergentesA confusão nasce da incapacidadeÉ nesse contexto que devemos entenderOposição diametralmente opostaEla é a um tempo bela e quietaAfirmação de cunho geralMas eu realço certos pontosÉ que, segundo orientação atualImprimem certo caráter pesadoAcenou com a possibilidade deConvém citá-lo textualmenteTem campos de competência diferentesLá em cima no jantar não disse palavraE este era, de fato, divinamente bomEle desapareceu engolido pela escuridãoEle não queria vinho e sim outra coisaO olhar de Richis pousou sobre eleOs cabelos iam-lhe até os joelhosContribuem em melhor escalaEncarar a questão de modo unilateralNaquilo que essa renovação tem de originalEle quer fazer o contrário, garantirHavia acenado com a perspectivaLançaria um novo perfume, e que perfume Problemática ampla e demasiada obscura em muito dos seus pontos Tudo isso é irreal e aponta para uma crise profunda e grave Vejamos porque, explorando apenas dois pontos da questão Disse que não o conhecia; mentira, sempre andaram juntos De Deus se falará mais tarde, fiquemos momentaneamente com

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Talvez só reste hoje à noite um resquício de mijo de gato. Veremos Projeto de longa maturaçãoÉ nesse sentido que devemos entender o caráterComporta pouca possibilidade de erroMas há um fato a ser consideradoÉ comunicação sim, mas unicamente de belezaÉ útil fazer uma pausa para uma advertênciaA ciência lingüística é desse último tipo

É preciso não perder de vistaAcabam aqui as certezas absolutasIsolar os fatos numa perspectivaO exemplo não tem aceitação pacíficaPouco apropriado ao papel de Não é difícil entender porque. Veja só:É verdade, eu sei, mas...Cabe aqui um reparoFez você agir sem o benefício do intelectoO professor assim se expressaO resultado foi surpreendenteEstava claramente no centro dos seus interessesPodia voltar para casa; não quisUma coisa dessas está sempre associada a riscosOferece melhor adequação com os fatosJá mencionado no parágrafo precedente

Que tem motivado em grande parteAtingiu níveis elevadíssimosPodemos ainda, em certo sentido,Volveu os olhos em minha direçãoSer o homem a causa eficienteAqui se impões uma vez maisPrecisamente por esta razãoEssa observação dá a exata medidaEla a um tempo boa e má

Podem ocorrer exageros, e eles ocorrem efetivamenteOlhava para o sol, que, oblíquo, se estendia no horizonteDestituída de toda determinação espacialReside apenas no imaginário infantilA notícia transpirou para fora da salaManeira simplista de explicar as coisasConvém por isso precisar o alcance das palavrasFilósofo ou não, o fato é quePode ainda, em certo sentido

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Exatamente como se quisesseE, veja só, lá estava o dinheiroFilósofo que vem a ser exatamenteSe prestam a equívocos e imprecisões

Realmente não é o contrário, é outra coisaQuer que eu explique? É simples.A questão, em todos os seus detalhesO projeto envolve investimentos anuaisEssa idéia merece exame mais acuradoEssa associação sugere fato novoComeçava a fornecer novos padrões de respostaTodo o esquema está sujeito a revisõesAs restrições impostas dão margemVai compor o fenômeno literárioUm exercício a ser viço da inteligênciaAssume uma dimensão antológica; ao contrário, soube aproveitarAristóteles pode vir ao nosso encontroFez circular a idéia de queA observação merece reparoBeneficiou-se amplamenteSe moveu na tentativa de Duzentas baixas. Esse foi o total de mortosDefinitivamente esse não é bomAbsoluta falta de emotividadeÉ. Pode serE era jovem, muito jovemPior aindaAntes eu queriaNa sua totalidadeEstá em cursoÀ semelhançaA mais completa expressãoNão é sem motivoVivo interesseA conclusão a tirar é queA tragédia que destruiu Angra chegou sob a forma de uma grande chuvaPode funciona , mas dentro de certos limitesMuito afastado de sua significação original.. PerfeitamenteReclamados por associação de ordem eminentemente apriorísticaAinda a barriga não cresceu e já os filhos brilham nos olhos da mãeO que causa espanto a todos que se detém na análise desse episódioSe prevalecem de tais passagem; porque, de duas, uma:Uma coisa pode ser clara em si mesma e não ser explicada de forma clara

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Mas os empresários em geral ,e os bancos em particularTudo brilhava e, de dor, ele teve de fechar por um momentos os olhosÉ que palavras não criam idéias; estas, esse existem é que forçosamente...Cheirava de modo intenso, quase doloroso, agudo e marcanteE estamos autorizados por, essa crença errôneaEnsiná-los a criar ou aprisionar idéias; ensinar enfim a pensarNegar à linguagem a capacidade de refletir a realidadeEstamos diante de uma concepção unilateral da línguaUma letra redonda, fina, bonita letra, letra de mulherGracejo não tinha, a situação não era para gracejoA correção gramatical nos seus aspectos mais profundosÉ necessário penetrar no sentido exato que ele empresta ao termo

Argumenta em favorPor oportunoE nisso tem razão inegávelA observação direta dos fatosEm sua abordagem inicialDão a exata medidaPô-los ao serviçoSeja como forA intervalos regularesNada mais.Digo maisArrisco uma respostaObjetiva agregar valoresVai operar a fusão fáticaNão é bem assimA exemploNão iria muito longeSatisfação e entusiasmoDe inspiração aristotélicaPerfume ativoMenos malAqui vai uma advertênciaDou uma pistaA observação é fantasiosaCremos que simDecorre daíQue ninguém nos ouça, mas cá entre nósCom muitos níveis de profundidadeOs principais núcleos de civismoA idéia foi jogada na vala comumMas não são, e a explicação é simples

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Linha de pensamento inaugurada peloExemplo de gerúndio a indicar açãoO resultado foi uma torrenteÉ uma constante administrativa queJá é considerado, e com razãoComo uma hipótese de trabalhoA comparação não se esgota dianteRevela sinais evidentes de A língua usada para falar de si é a própria língua. Resultado: o conceito de metalinguagem encontra opositores

Isso gera aquilo que os químicos chamam de efeito paradoxal. Ou seja, tudo sai ao contrário.

Isso é inegável, se quisermos elaborar um conceito coerente de sujeito

Dada a complexidade maior dos fatos que se acham na base de suas inquirições

Não vamos por isso cometer o erro de atribuir importância exagerada à originalidade de suas afirmações

Aprender a escrever e, em grande parte, se não principalmente, aprender a pensar.

“Ele divulgou uma nota afirmando que não iria dignificar esse tipo de jornalismo com uma resposta. Bobagem. Os tablóides não procuram dignificação. Eles fazem um tipo de jornalismo que separa o joio do trigo – e publicam o joio. De vez em quando tem momentos de glória – o caso Morris é um desses”

“A porta se abriu , e ele entrou e a luz do sol caiu-lhe de cheio no rosto. O quartinho estava como que tomado por prata flutuante. Tudo brilhava e, de dor, ele teve de fechar por um momento os olhos.”

“Tinha apenas uma coifa inicial nos seios. Em uma palavra, a jovem era uma criança. Mas que criança.”

“Era de atitude humilde. Parecia até que se escondia atrás do braço estendido como alguém que espera pancadas. Era Grenouille.”Como se os demais fatos fossem de pouca monta. Compreende-se: a gramática tradicional

Não pela sua beleza, ainda que imaculada, mas pela riqueza de detalhamento

Há várias razões que me levam a não participar da formatura, a principal delas.

Resistem ao oficial português, liquidando-o no local. É o começo da ...

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No entanto é bom lembrar que não existe passado histórico em “estado puro”. Todo passado é uma interpretação retrospectiva feita a partir de crenças presentes.

Longe de serem absolutos, estão a mais das vezes ligados a condições determinadas: dito de outro modo, não é a espécie que ..., mas sim

É preciso batalhar contra os rumores. Como os submarinos, o rumor navega submerso, dispara torpedos e é um alvo difícil.

O escritor escreve tentando recompor, quem sabe, um mundo perdido, a casa perdida. Tenta recompor, quem sabe, enquanto escreve, a família despedaçada., o próprio eu despedaçado

Não tive filhos. Não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.“Nada há a acrescentar a estes versos. A língua não é mais instrumento de comunicação e expressão no sentido usual desses termos; é comunicação e expressão sim, mas unicamente de beleza de formas, sons e sentidos criados através dela”

( Maria Tereza Camargo Biderman )

“A abdicação criou um momento de transição na vida política brasileira, pela instauração de uma experiência ‘republicana’, traduzida na forma de governo regencial.”

“A máquina de escrever é a penúltima das grandes invenções cujo mecanismo é compreensível. Aperta-se uma tecla, que aciona um pequeno braço, que viaja até o papel e, no momento que o comprime, o faz com intermediação de uma fita molhada de tinta.”

“ É proibido fumar.Bar: lugar barulhento, escuro e enfumaçado. Parte da clássica definição não vale

mais para a Califórnia – lá, desde l.º de janeiro é proibido fumar nos bares. O veto vai se fiscalizado pelos próprios donos. A multa pela primeira reclamação de um cliente é de 100 dólares; se as queixas continuarem, sobe para 7.000 dólares. Beber ainda pode.”

“Mas note-se: a identificação do sujeito não se faz com base na definição apreendida: faz-se com base em outra definição, nunca exteriorizada.”

“Mas como solvente, que deveria ser acrescentado no fim; e que, pelo amor de Deus, deveria manipular os fracos de vagar, calma e vagarosamente, como cabia a um artesão”.

“Foi como receber a visita do sol. Assim que a bomba explodiu no céu de Hiroshima, a 580 metros de altitude, formou-se uma bola de fogo que rapidamente se expandiu num raio de 230 metros. Seria um belo espetáculo se não fosse o resto. Foi como sofrer o esbarrão do sol.”

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“Uma coisa dessas não teria ocorrido antigamente; esse era um exemplar novo da espécie que só poderia surgir nessa época doentia e desmoralizada”

O leitor pode pensar que redação técnica é algum bicho papão. Não é. Na verdade, os princípios

Um trabalho como esse pode ser planejado sem necessidade de pesquisa. É algo que o aluno pode fazer servindo-se de

Vendo a batalha perdida, arrancou as insígneas, e espada na mão, mergulhou na horda invasora. Nunca mais foi visto.

Nem mesmo o caroço era desperdiçado: triturado, servia como ração animal; queimado, transformava-se em carvão.

Seja como for, para prevenir, homens com mais de quarenta anos deveriam submeter-se ao menos uma vez por ano a exames preventivos. É chato, mas é necessário.

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“Tomemos as seguintes palavras:

COTA ZEROStop.

A vida parou Ou foi o automóvel?

Constituiriam, assim agrupadas, o que podemos chamar um poema? Há poesia nesse enunciado? Nosso primeiro impulso é negativo, sobretudo o das pessoas que, por força da tradição, se habituaram a identificar a poesia com determinadas técnicas do verso, presas a formas fixas, à limitação de recursos rítmicos, com pausas obrigatórias e sílabas contadas, além de não dispensarem a necessidade de uma exposição lógica e imediatamente perceptível à primeira leitura...

Se, no entanto, indicarmos um responsável por aqueles termos, como Carlos Drummond de Andrade, já haverá certa relutância em nos lançarmos contra a opinião dos “entendidos”, negando-lhes a validade como obra de arte literária.

Já percebemos como é precário o nosso julgamento, marcado por preconceitos e estereótipo os mais variados.

O certo é que há “poesia” nas palavras acima. Examinemos:

O título anuncia uma situação neutra indicada pela palavra “zero”, simultaneamente positivo e negativo, precedida pela palavra “cota”, entendida como parte, quinhão que cabe a cada um, ou, como na linguagem matemática, a distância de um ponto a um plano de referência.

Stop. Palavra universalmente conhecida e difundida que indica parada momentânea, estacionamento. Muito usada na sinalização do trânsito para orientação de veículos.

Mas quem pára é a vida; isso é muito mais sério e importante: se a vida pára, é a neutralidade, a ausência de valores; é o desespero, a angústia de não saber aonde vamos e, às vezes, nem de onde viemos... E o poeta surpreende o leitor: espera-se naturalmente que o automóvel pare; a parada da vida provoca um impacto de surreal.

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Qual seria a solução? Fugir para Minas? Abrir a porta? Cuspir ou tomar o bonde? Atingir uma utopia? Descobrir uma antagonia? Ou dar de ombros, menosprezar a vida, como se ela não fosse mais do que um automóvel que passa?

Essa última, a solução: ironizar – ou foi o automóvel? Desvalorizar, para não chorar. Rir, num riso chapliniano, onde, através do humor, percebe-se a tragédia de quem se sente neutro, nulo, vazio, num instante da existência em que para a vida e a cota “ainda” é zero.

E estamos diante de uma situação que não é exclusiva do poeta. Qualquer pessoa, em qualquer tempo, pode ver-se adiante do sinal: Stop; verificar a nulidade “zero” ainda; e assumir uma atitude indiferente, de autodefesa. As palavras permitem concluir que a cota zero não é colocada em termos definitivos. O sinal usado indica, como assinalamos, um parar momentâneo. O que importa, sobretudo, é que tal com foram arrumadas, são capazes de revelar algo de universal, são capazes de atingir a sensibilidade e traduzir um sentimento trágico do mundo.

Observe-se: a língua, enquanto explicitação da linguagem de uma comunidade, restringe-se à simples representação de fatos ou situações particulares, observados ou inventados. A literatura configura-se como tal, quando, ao tratar desses fatos ou situações, realça-lhes os elementos universais e característicos. A partir de realidades singulares, revela-se, no texto literário, uma dimensão plural.

E se um poema se faz com palavras, nesse elas como que se completam, se ligam mais estreitamente, criando uma ambientação semântica onde idéia de estacionamento, parada, é a constante: “zero”, “stop”, “parou”; e sem exagerar, a vida também se move por si, como o "automóvel”. O autor traz para a poesia os elementos mais cotidianos, inclusive o termo estrangeiro, como numa ânsia de comunicação universal.

A mensagem está contida em sete termos, cuja conotação consegue criar a condição de poesia.

* valorização poética do cotidiano;* integração poética da civilização material;* desvalorização irônica da vida;* sentimento trágico da existência;* humor, como solução.

Mas, como se observa de imediato, não é fácil penetrar no “reino das palavras”, acostumados que muitos estão com um tipo de estrutura que, por tradicional e quase sempre lógica, atinge a sensibilidade com mais presteza.

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Cremos, entretanto, que o hermetismo desse poema lhe confere um valor, quando nos leva a um esforço de penetração na mensagem nele contida: a vitória da compreensão amplia o âmbito de fruição do deleite estético que toda obra de arte literária deve proporcionar.

Quanto ao ritmo, cabem algumas observações. O autor não se prende à métrica tradicional, em que se consegue a melodia do verso através de uma regularidade nítida e sistemática no número de sílabas e da disposição dos acentos tônicos: ele age com plena liberdade, utiliza-se do verso livre.

Nota-se que há rima toante, com predominância da vogal tônica /o/, ora aberta, ora fechada. O título entra também como componente importante na estrutura rítmica, além de ser indispensável à compreensão do texto. Nada é supérfluo nessa manifestação artística.

Observemos ainda a pontuação: o verso “Stop”. termina num ponto, que obriga a uma pausa; mas o segundo verso deixa ao leitor terminá-lo com um sinal amarelo ou passar livremente para o verde do último, como se o desvio, irônico, encontrado para o impasse trágico da parada da vida abrisse o caminho para o amortecimento da tensão...

Cremos poder afirmar, após essas considerações, que as palavras do poema constituem uma “revelação” de realidade do século XX, em que vivemos, perplexos quando a vida pára, na busca de soluções nem sempre encontradas, o que conduz a um estado de permanente indagação: E agora?

O poema que estamos examinando traz a marca de uma universalidade que não o limita a esta ou àquela região geográfica, a esta ou àquela comunidade, e muito menos aos espaços individuais do poeta: a mensagem que transmite é comum ao homem. E não somente ao homem do século atual, mas ao homem de todos os tempos, bastando observar que se confere às palavras “Stop” e “automóvel” uma carga simbólica que permite substituí-la pelo sinal e pelos veículos do passado ou do futuro. Nesse sentido, o poema é atemporal e conduz ao sinfronismo com que alguns identifica a literatura.

Desnecessário reiterar que “Cota zero” é uma obra de arte da palavra, quando verificamos que, com tão poucas [palavras] tanto se consegue.

( Domício Proença Filho, Estilos de Época na Literatura)

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“Há, sobretudo, em todas as épocas, o tipo ideal do homem daquela época, o homem medieval, o homem renascentista, o homem barroco, o homem classicista, o homem romântico e esses homens seriam mudos, e, por conseqüência, esquecidos, se certos entre eles não tivessem o dom individual da expressão artística, realizando-se em obras que ficam.”

( Otto Maria Carpeaux )

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A maior para das objetivas é projetada para que a imagem obtida seja o mais livre de distorções possível, embora nem sempre se consiga isso. A objetiva olho-de-peixe é uma exceção: produz imagens distorcidas em que tanto as linha verticais quanto as horizontais se curvam para fora.

Há dois tipos de objetivas olho-de-peixe: circular e de quadro cheio. Todas criam um campo circular de luz, mas em geral se capta somente a área retangular central da imagem. Com a circular, contudo, a própria imagem se torna redonda se com a parte central do filme (ou do sensor digital) utilizada, na verdade. Os cantos da imagem conseqüentemente são pretos.

Objetivas com abertura rápidas estão presentes na maior parte das distâncias focais conhecidas da monoreflex 35 mm, São mais caras, mais pesadas e maiores do que as objetivas normais. Muitas são fixas: as zoom geralmente têm aberturas máximas menores do que ....

— Duplo propósito— Preside as relações.— Derivas das relações

As pessoas em férias gostam de tirar fotos de amigos ou familiares em frente de edifícios famosos , mas nem sempre se consegue uma foto de qualidade, seja da pessoa ou do edifício. Uma boa sugestão é colocar a pessoa ao lado do quadro em primeiro plano de forma que os dois objetos se diferenciem visualmente.

Que Obra de Arte é o Homem?

Shakespeare, Hamlet

“Que obra de arte é o homem: tão nobre no raciocínio; tão vário na capacidade; em forma e movimento, tão preciso e admirável, na ação é como um anjo; no entendimento é como um Deus; a beleza do mundo; o exemplo dos animais.”

Espírito Das Leis

Montesquieu

É uma verdade eterna: qualquer pessoa que tenha o poder, tende a abusar dele. Para que não haja abuso, é preciso organizar as coisas de maneira que o poder seja contido pelo poder.”

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Os Caracteres

La Bruyère

“Entre as muitas expressões que podem traduzir um só dos nossos pensamentos, só uma existe boa. Nem sempre a achamos, falando ou escrevendo; mas a verdade é que ela existe; que tudo o mais fora dela, é fraco e não satisfaz o homem de espírito que se quer fazer ouvir. Um bom autor, cuidadoso no escrever, observa muitas vezes que a expressão buscada há muito, desconhecida e enfim achada, era a mais simples e natural, a que deveria acudir logo, sem esforço.”

Bíblia Sagrada

Gênesis 29, 15-30

“Porque tu és meu irmão, hás de servir-me de graça? Declara-me qual será o teu salário. Ora, Labão tinha duas filhas; o nome da mais velha era Lia, e o nome da mais moça, Raquel. Lia tinha olhos fracos, ao passo que Raquel era de formosa de porte e semblante. Jacó amava Raquel, e disse: Sete anos te servirei por Raquel, tua filha mais moça. Então disse Labão: Melhor é que eu a dê a ti do que a outro; fica comigo. Assim serviu Jacó sete anos por amor a Raquel; mas estes lhe pareceram como poucos dias, pelo muito que a amava. Então Jacó disse a Labão: Dá-me minha mulher. O meu tempo já está cumprido e eu quero tomá-la por mulher. Reuniu, pois, Labão a todos os homens daquele lugar, e fez um banquete. Mas chegada a tarde, ele tomou Lia, sua filha , e a trouxe a Jacó. E Jacó se deitou com ela. E Labão deu sua serva Zilpa por serva a Lia, sua filha. Quando amanheceu, eis que era Lia; pelo que perguntou Jacó a Labão: que é isso que me fizeste? Não te servi em troca de Raquel. Por que pois me enganaste? Respondeu Labão: Não se faz assim em nossa terra; não se dá a mais nova antes da primogênita. Cumpre a semana desta; então te daremos também a outra, pelo trabalho de outros sete anos que ainda me servirás. E Jacó fez assim. Cumpriu a semana de Lia então Labão lhe deu por mulher a Raquel, sua filha. Labão deu sua serva Bila por serva a Raquel, sua filha. Jacó deitou-se também a Raquel, e amou também a Raquel muito mais do que a Lia; E serviu a Labão ainda outros sete anos.” “Na verdade, por si mesmas, as pessoas não sabem perdoar, isso nem mesmo está ao alcance delas. Elas são impotentes para anular um pecado cometido. Isso ultrapassa as forças meramente humanas. Fazer com que um

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pecado não conte, apagá-lo, diluí-lo no tempo, em outras palavras transformar alguma coisa em nada, é um ato impenetrável e sobrenatural. Apenas Deus, porque escapa às leis deste mundo, porque é livre, porque sabe criar milagres, pode lavrar os pecados, pode transformá-los em nada, pode absolvê-los. O homem não tem poder de absolver o homem, a não ser apoiando-se na absolvição divina.”

( M( MILANILAN K KUNDERAUNDERA – A – A BRINCADEIRABRINCADEIRA ) )

A vida humana não é senão uma ilusão perpétua; não fazemos mais do que nos entre-enganarmos e nos entre-adularmos. Ninguém fala de nós em nossa presença como fala em nossa ausência. A união que existe entre os homens é fundada tão só sobre este mútuo engano; e poucas amizades subsistiriam se cada um soubesse o que o seu amigo diz dele quando ele não está presente, embora o amigo fale sinceramente e sem paixão. O homem não é, portanto, mais do que mascaramento, mentira e hipocrisia, tanto em si mesmo quanto em face dos outros. O homem não quer que se lhe diga a verdade, evita dizê-la aos outros; e todas essas disposições, tão afastadas da justiça e da razão, têm uma raiz natural no seu coração. (P(PASCALASCAL))

Além das Paredes, dos Móveis

Cecília Meireles

Não nos arrebatemos contra os homens ao ver a sua dureza, a sua ingratidão, a sua injustiça, a sua soberba, o amor de si próprios e o esquecimento dos outros: eles são feitos assim, é a sua natureza; encolerizar-se é não poder suportar que a pedra caia ou que o fogo se eleve.. ( L ( LAA B BRUYÈRERUYÈRE ) )

O homem é quase sempre tão malvado quando precisa ser. Quando se conduz cor-retamente, pode-se julgar que a malvadeza não lhe é necessária. Vi pessoas de cos-tumes dulcíssimos, inocentíssimos, cometerem ações das mais atrozes para escapa-rem de algum dano grave, de outro modo inevitável.( L( LEOPARDIEOPARDI ) )

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Serenata Para Sopros

Antônio Salieri

“Na página, só um pulso, como uma enferrujada caixa de compreensão, e então, subitamente, bem acima, um oboé, uma nota isolada, suspensa, constante, até que uma clarineta a tome, adoçando-a numa frase deliciosa, cheia de indefinidas ânsias. Pareceu-me que estava ouvindo a voz de Deus.” “A vaidade está tão ancorada no coração do homem que um soldado, um peão, um cozinheiro, um carregador se gaba e quer ser admirado; e os próprios filósofos o desejam; e os que escrevem contra querem a glória de ter bem escrito; e os que o lêem querem a glória de os ter lido; e eu, que escrevo estas coisas, tenho talvez esse desejo; e talvez os que as lerão...”

( P( PASCALASCAL))

Enjambement

Maurice Grammont

‘Não é exato que o enjambement suprima, como dizem alguns, a pausa do fim do verso, nem que ele suprima ou mesmo enfraqueça o último acento rítmico do verso; longe disso, a pausa final do verso que cavalga é tão nítida e tão longa como as outras, e o seu último acento rítmico é também forte. Tudo se reduz ao seguinte: enquanto nos versos comuns abaixamos a voz no fim de cada verso, deixamo-la interrompida e suspensa no fim daquelas que cavalgam. Daí resulta um aguçamento da atenção do auditor, que fica em ansiosa expectativa, durante a pausa. E como a voz abaixou, ela deve, na parte excedente, aumentar de intensidade ou mudar e entoação.”Enjabemment

Celso Cunha

Chama-se cavalgamento ou enjabemment ao recurso estilístico que, na expressão em verso, consiste em terminá-lo “em discordância flagrante da sintaxe, pela separação de palavras estreitamente unidas num grupo fônico.”

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“A consciência de Deus é autoconsciência, o conhecimento de Deus é autoconhecimento. A religião é o solene desvelar dos tesouros ocultos do homem, a revelação dos seus pensamentos íntimos, a confissão aberta dos seus segredos de amor.”

( L( LUDWIGUDWIG F FEUERBACHEUERBACH ) )

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Disperso

Cecília Meireles

“Há sentimentos antigos, dentro de nós, que não perdem a sua força, que não se deixam aniquilar pelo tempo e pelos acontecimentos; estão apenas reclinados como em cadeiras invisíveis, numa obscura sala de espera, Por serem tão antigos, permitem-se ficar de olhos fechados, silenciosos e anônimos, tão inativos como se não existissem. Mas, de repente, acordam, levantam-se dos seus lugares, acendem as luzes, fazem-se tão vivos e presente que não resistimos ao seu poder e docilmente nos submetemos às revisões da memória e à sua crítica.”

A Eloqüência

Pascal

“A eloqüência é a arte de dizer as coisas de maneira que aqueles a quem falamos possam entendê-las sem dificuldade e com prazer; que nelas se sintam interessados, a ponto de serem impelidos mais facilmente pelo amor-próprio a refletir sobre elas.Consiste, portanto, em uma correspondência que procuramos estabelecer entre o espírito e o coração daqueles a quem falamos, por um lado, e, por outro, entre os pensamentos e as expressões de que nos servimos; o que pressupõe termos estudado muito bem o mecanismo do coração do homem a fim de conhecer-lhe as molas e encontrar, em seguida, as proporções certas do discurso que desejamos ajustar-lhe. Cumpre colocarmo-nos no lugar dos que deve ouvir-nos, e experimentar também em nosso próprio coração a forma dada ao discurso, para ver se um de adapta ao outro e se podemos ter a certeza de que o ouvinte será forçado a render-se. É preciso, na medida do possível, confinarmo-nos dentro da naturalidade mais singela; não fazermos grande o que é pequeno, nem pequeno o que é grande. Não basta que uma coisa seja bela, é necessário que seja adequada ao assunto, que nada tenha de mais, em que nada lhe falte. Simbolismo

Doomício Proença Filho

“Como todas as artes, a literatura evolui: evolução cíclica com retor-nos estritamente determinados e que se complicam com as diversas modificações

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trazidas pela marcha do tempo e as perturbações do meio. Seria supérfluo fazer observar que cada nova fase evolutiva da arte corresponde exatamente à decrepitude senil, ao inelutável fim da escola imediatamente anterior. Dois exemplos são suficientes: Ronsard triunfa sobre a incapacidade dos últimos imitadores de Marot, o Romantismo estende suas auriflamas sobre os escombros clássicos mal guardados por Casimir Deelavigne e Etenne de Jouy. É que toda a manifestação artística termina fatalmente por empobrecer-se, por esgotar-se; então, de cópia em cópia, de imitação em imitação, o que foi pleno de seiva e de frescor torna-se seco e encarquilha-se; o que foi novo e espontâneo torna-se vulgar e o lugar-comum”.Sobre As Religiões

Feuerbach - E. Durkheim

“A religião é o solene desvelar dos tesouros ocultos do homem, a revelação dos seus pensamentos mais íntimos, a confissão pública dos seu segredos de amor. Como forem os pensamentos e as disposições do homem, assim será o seu Deus; quanto valor tiver um homem, exatamente isto e não mais será o valor do seu Deus. Consciência de Deus é autoconsciência, conhecimento de Deus é autoconhecimento. Deus é a mais alta subjetividade do homem... Este é o mistério da religião: o homem projeta o seu ser na objetividade e então se transforma a si mesmo num objeto face a esta imagem, assim convertida em sujeito.”

“Não existe religião alguma que seja falsa. Todas elas respondem, de formas diferentes, a condições dadas de existência humana

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“Nós, pintores, queremos, pelos movimentos do corpo, mostrar os movimentos da alma (...) Convém portanto que os pintores tenham um conhecimento perfeito dos movimentos do corpo e os aprendam da natureza, para imitar, por mais difíceis que sejam, os múltiplos movimentos da alma..”

( L( LEONEON B BATTISTAATTISTA A ALBERTILBERTI ) )“Não lhe estendeu a mão: tão longe também não ia sua simpatia. Nunca lhe dera a mão. Aliás sempre evitara tocá-lo, devido a um certo nojo, como se houvesse o perigo de nele se contaminar, nela se sujar. Só disse um bem curto adieu . Grenouille inclinou a cabeça e se afastou, curvado.” A rua estava vazia.

( P( PATRICKATRICK S SÜSKINDÜSKIND - O - O PERFUMEPERFUME ) )

O Perfume

Patrick Süskind

“Por favor! – Disse Baldini, que sabia que nesse negócio não havia um jeito meu ou um jeito seu, mas só um jeito possível e correto, que consistia em, conhecendo-se a fórmula e refazendo-se os cálculos de acordo com a quantidade a ser obtida, produzir a partir das diferentes essências um concentrado medido com toda a exatidão, que, por sua vez, precisava ser diluído em álcool, de novo em proporção exata, que em geral oscilava entre um por dez a um por vinte, para formar o perfume definitivo. Outro jeito não existia, e ele o sabia. E por isso tinha de lhe parecer simplesmente um milagre aquilo que ele pôde então contemplar e que no começo observou com zombeteiro distanciamento, depois com perturbação e, finalmente, com nada mais que desamparado espanto. E a cena penetrou de tal modo em sua memória que até o fim dos seus dias não amais a esqueceu.”A Religião

Karl Max

A crítica arrancou as flores imaginárias da corrente não para que o homem viva acorrentado sem fantasias ou consolo, mas para que ele quebre a corrente e colha a flor viva. A crítica da religião desilude o homem, a fim fazê-lo pensar e agir e moldar a sua realidade como alguém que, sem ilusões, voltou à razão; agora ele

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gira em torno de si mesmo, o seu sol verdadeiro. A religião é nada mais que o sol ilusório que gira em torno do homem, na medida em que ele não gira em torno de si mesmoSermão da Sexagésima

Padre Antônio Vieira

“Fazer pouco fruto a palavra de Deus no mundo, pode proceder de um de três princípios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte de Deus. Para uma alma se converter por meio de um sermão, há de haver três concursos: há de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há de concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há de concorrer Deus com a graça, alumiando. Para um homem se ver a si mesmo, não necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e olhos, e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que coisa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, e é necessárias luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento (...”)Ninguém Morre Antes Da Hora

Montaine

“Ninguém morre antes da hora. O tempo que perdeis não vos pertence mais do que o que precedeu vosso nascimento, e não vos interessa: ‘considerai em verdade que os séculos inumeráveis, já passados, são para vós como se não tivessem sido’. Qualquer que seja a duração de vossa vida, ela é completa. Sua utilidade não reside na duração e sim no emprego que lhe dais. Há quem viveu muito e não viveu. Meditai sobre isso enquanto o podeis fazer, pois depende de vós, e não do número de anos, terdes vivido bastante. Imagináveis então nunca chegardes ao ponto para o qual vos dirigíeis? Haverá caminho que não tenha fim?”

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A Cordialidade

Schopenhauer

A A CORDIALIDADECORDIALIDADE é a negação convencional do egoísmo nos detalhes do relacionamento diário e é, por certo, uma hipocrisia que se reconhece, se exige e se louva. Porque o que ela oculta, o egoísmo, é tão torpe que não se quer vê-lo, embora se saiba que existe, como os objetos desagradáveis que se quer ver ao menos cobertos por uma cortina. Barroco

Manuel Bandeira

“A A ÚNICAÚNICA certeza, é então, a incerteza; a única constância, a inconstância; a única firmeza, a não-firmeza, o que mostra o caráter movediço de um momento histórico e cultural em que a vontade e medo, sensualidade e razão, corpo e espírito, vida e morte se roçam tão intimamente que só podem gerar uma literatura paradoxal, torturada e ao mesmo tempo extremamente rica, extremamente fecunda em seu poder de expressão dos mais antigos dilemas humanos. Apolo ou Dionísio? Humanismo ou Teocentrismo? Razão ou emoção?”

Tudo Está Dito

Pascal TUDO está dito e chegamos tarde demais depois de mais de sete mil anos em que há homens que pensam. Quanto aos costumes, o mais belo e o melhor é tirado dos outros; não fazemos mais do que seguir no rasto dos mais antigos e dos modernos mais avisados.

Page 231: Os Eleitos

O Perfume

Patrick Süskind “O perfume era um desgosto de tão bom. O miserável do Péssier, infelizmente, era um entendido, um mestre, que Deus o perdoe, ainda que mil vezes nada tivesse estudado! Baldini desejava que fosse seu esse Amor e Psiquê. . Nada tinha de ordinário. Absolutamente clássico, redondo e harmônico. E, apesar disso, fascinantemente novo. Era fresco, mas não barato nem banal; aromático sem ser gorduroso, tinha profundidade, uma maravilhosa, fascinante, embriagadora profundidade marrom-escura – e, no entanto, não era nem um pouco sobrecarregado ou opressivo.”

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4º Motivo da Rosa Não te aflijas com a pétala que voa:também é ser, deixar de ser assim.

Rosa verás, só de cinza franzida,mortas intactas pelo teu jardim.

Eu deixo aroma até nos meus espinhos,ao longe, o vento vai falando em mim.

E por perder-me é que me vão lembrando,por desfolhar-me é que não tenho fim.

Cecília Meireles.

Surdina

Quem toca piano sob a chuva,na tarde turva e despovoada?De que antiga, límpida músicarecebo a lembrança apagada?

Minha vida, numa poltronajaz diante da janela aberta.

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Vejo árvores, nuvens—e a longarota do tempo, descoberta.

Entre os meus descansados ouvidos, alguém colhe com dedos calmosramos de som, descoloridos.

A chuva interfere na música.Tocam tão longe! O turvo diaMistura piano,árvore, nuvens,Séculos de melancolia...

Cecília Meireles.

Não há dúvida que as línguas se aumentam e alteram com o tempo e as necessidades dos usos e costumes. Querer que a nossa pare no século de quinhentos, é um erro igual ao de afirmar que a sua transplantação para a América não lhe inseriu riquezas novas. A este respeito a influência do povo é decisiva. Há, portanto, certos modos de dizer, locuções novas, que de forma entram no domínio do estilo e ganham direito de cidade.

Mas se isto é um fato incontestável, e se é verdadeiro o princípio que dele se deduz não me parece aceitável a opinião que admite todas as alterações de linguagem, ainda aquelas que destroem as leis da sintaxe e a essencial pureza do idioma. A influência popular tem um limite; e o escritor não está obrigado a receber e dar curso a tudo o que o abuso, o capricho e a moda inventam e fazem correr. Pelo contrário, ele exerce também uma grande parte de influencia a este respeito, depurando a linguagem do povo e aperfeiçoando-lhe a razão(Machado de Assis, in Critica)

Aprendizagem amarga

Chega um dia em que o dia se terminaantes que a noite caia inteiramente.Chega um dia em que a mão, já no meio do caminho,de repente se esquece do seu gesto.Chega um dia em que a lenha já não chegapara acender o fogo da lareira.Chega um dia em que o amor, que era infinito,de repente se acaba, de repente.

Força é saber amar doce e constantecom o encanto de rosa alta na haste,Para que o amor ferido não se acabena eternidade amarga de um instante.

(Thiago de Mello)

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Grande Sertão: Veredas

Guimarães Rosa “O senhor .... mire e veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montãoE, outra coisa: o diabo, e às brutas; mas deus é traiçoeiro – dá gosto! A força dele, quando quer – moço!- me dá medo pavor! Deus vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é a lei do mansinho - assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se divertindo, se economiza. A pois: um dia, num curtume, a faquinha minha que eu tinha caiu dentro dum tanque, só caldo de casca de curtir, barbatimão, angico, lá sei. – “amanhã eu tiro...” – falei, comigo. Porque era de noite, luz nenhuma eu não disputava..”.

Sobre o Perdão

Milan Kundera

“A A MAIORIAMAIORIA das pessoas se entrega à miragem de uma dupla crença: acredita na perenidade da memória e na possibilidade de reparar. Uma é tão falsa quanto a outra. A verdade se situa justamente no oposto:Tudo será esquecido e nada será perdoado. O papel da reparação – tanto pela vingança, quanto pelo perdão será representado pelo esquecimento. Ninguém irá reparar as injustiças cometidas, mas todas as injustiças serão esquecidas.”

Memórias Póstumas

Machado de Assis

“EESTESTE último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu

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rosto. Mais, não padeci a morte de D. Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa desse capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa existência.”Quincas Borbas

Machado de Assis “PPOUCOSOUCOS dias morreu... Não morreu súdito nem vencido. Antes de principiar a agonia, que foi curta, pôs a coroa na cabeça, - uma coroa que não era, ao menos, um chapéu velho ou uma bacia, onde os espectadores palpassem a ilusão. Não, senhor; ele pegou em nada, levantou nada e cingiu nada; só ele via a insígnia imperial, pesada de ouro, rútila de brilhantes e outras pedras preciosas. O esforço que fizera para erguer meio corpo não durou muito; o corpo caiu outra vez; o rosto conservou porventura uma expressão gloriosa. - guardem a minha coroa, murmurou. Ao vencedor... A cara ficou séria, porque a morte é séria; dois minutos de agonia, um trejeito horrível, e estava assinada a abdicação.”Resistência

Churchill “O O INIMIGOINIMIGO é cruel e implacável.. Pretende tomar nossa terra regada com o suor de nosso rosto, tomar nossos cereais e nosso petróleo obtido com o trabalho de nossas mãos... Pretende germanizar os povos, transformá-los em escravos de príncipes e barões alemães. É por isso que ... ao inimigo não se deve deixar um único cereal, nem um galão de combustível... Tudo deve ser retirado ou destruído... Nas áreas ocupadas pelo inimigo devem-se organizar guerrilhas... É preciso persegui-los e aniquilá-los... e frustrar suas iniciativas.”

Bíblia Sagrada

Evangelho de São Mateus

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“Não junteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará o vosso coração. A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz; Se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se, portanto a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão tais trevas! Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom. Por isso vos digo; não andeis cuidadoso quanto a vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que mantimento, e o corpo mais do que o vestido? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas?

E qual de vós poderá, com todos os seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura? E, quanto ao vestido, porque dais solícitos? Olhai para os lírios do campo, como eles crescem : não trabalham nem fiam; E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda sua glória, se vestiu como qualquer deles. Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada ao forno, não vos vestirá muito mais a vós , homem de pouca fé?

Não andeis pois inquietos dizendo: Que comeremos ou que beberemos ou com que nos vestiremos ? (Porque todas estas coisas os gentios procuram.) De certo vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas; Mas buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas. Não vos inquieteis pois pelo dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.”