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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
MARA DELVAZ GARCIA GANDOLFO
A SEQUÊNCIA DIDÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA: UMA FERRAMENTA PARA A
APROPRIAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL “RESENHA DE
FILMES”
CORNÉLIO PROCÓPIO
2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE DO PARANÁ
CAMPUS DE CORNÉLIO PROCÓPIO
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL
- PDE
MARA DELVAZ GARCIA GANDOLFO
A SEQUÊNCIA DIDÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA: UMA FERRAMENTA PARA A
APROPRIAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL “RESENHA DE
FILMES”
Artigo apresentado ao Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) da Secretaria do Estado da Educação (SEED). Orientador: Eliana Merlin Deganutti de Barros
CORNÉLIO PROCÓPIO
2015
A SEQUÊNCIA DIDÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: UMA
FERRAMENTA PARA A APROPRIAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL
“RESENHA DE FILMES”
Mara Delvaz Garcia Gandolfo1 Eliana Merlin Deganutti de Barros2
Resumo: Este artigo apoia-se nas contribuições teóricas acerca de gêneros discursivos apresentadas por Bakhtin, sintetizadas nas Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná, com foco no Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), que tem J.P Bronckart como um dos seus precursores. Como viés investigativo e metodológico elegeu-se a sequência didática, metodologia de ensino da língua proposta pelo ISD, a qual se pauta na apropriação de uma prática de linguagem configurada em um gênero de texto. Este trabalho tomou como objeto de estudo o gênero “resenha de filmes”, dado seu caráter predominantemente argumentativo. Com o objetivo de ampliar a prática da leitura e escrita, dez obras fílmicas foram analisadas durante quinze oficinas aplicadas em uma turma do 9o ano no Colégio Estadual Nóbrega da Cunha, Município de Bandeirantes, priorizando habilidades de narrar/expor/defender opiniões. Os resultados atestam a legitimidade da sequência didática como instrumento de ensino, de aprendizagem e de avaliação, bem como definidora de caminhos para a apropriação contextualizada de aspectos estruturais da língua pátria. Palavras-chave: gêneros textuais; resenha de filmes; sequência didática. Abstract: This article is supported by the theoretical contributions about discursive
genres presented by Bakhtin, synthesized in the Paraná State Curriculum Guidelines,
focusing on Sociodiscursive Interactionism (ISD), which has JP Bronckart as one of
its precursors. As investigative and methodological bias was elected the didactic
sequence, language teaching methodology proposed by ISD, which is guided in the
appropriation of a language practice configured in a text genre. This work took as the
object of study the gender "review of films", given its predominantly argumentative
character. In order to expand the practice of reading and writing, ten film works were
analyzed for fifteen workshops applied in a class of 9th year in the State College
Nobrega da Cunha, Municipality of Bandeirantes, prioritizing skills to narrate / expose
/ defend opinions. The results attest to the legitimacy of the teaching sequence as a
teaching, learning and assessment device, as well as defining paths for contextualized
appropriation of structural aspects of the native language.
Key words: Text genres; Movie reviews; Didactic sequence.
1 Professora de Língua Portuguesa pela Secretaria de Estado de Educação do Estado do Paraná. Atualmente lotada no Município de Bandeirantes - Núcleo Regional de Cornélio Procópio. 2 Orientadora: Doutora em Estudos da Linguagem pela Universidade Estadual de Londrina
(UEL). Professora da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP), campus de Cornélio Procópio.
1 Introdução
Dados alarmantes de pesquisas apontam para a fragilidade da educação
institucionalizada, colocando em foco seus ‘atores’, todo seu ‘elenco’, ‘equipe
técnica’, bem como seus ‘patrocinadores’, sinalizando para a urgência em se
repensar o ‘roteiro’ para uma nova ‘produção’. Essa metáfora é ‘enredo’ de uma
questão que, pela complexidade e amplitude, também ‘protagonista’ nos ‘scripts’
de políticas de governo (muitas vezes coadjuvante), nas grades curriculares (das
universidades aos primeiros anos da Educação Básica) e na sala de aula, qual
seja: o efetivo letramento do ‘público’, (leia-se do aluno), nos diferentes níveis de
ensino e nas ‘redes’ públicas e privadas.
Avaliações Institucionais para o Ensino Fundamental – Séries Finais no
Ensino da Língua Portuguesa – como a Prova Brasil e Sistema de Avaliação de
Educação Básica do Paraná (SAEP), apontam para o baixo índice de acerto nas
questões que envolveram domínios básicos de compreensão leitora e de
argumentação, isso porque, ainda são nítidos e notórios os resquícios de um
ensino de Língua Portuguesa (com destaque à interpretação e produção textual)
desarticulado e descontextualizado, desconsiderando ‘os agentes do discurso’,
e o texto em sua vertente sociodiscursiva, ou seja, o texto tomado em sua
totalidade, texto este que tem um autor, uma intencionalidade, vozes sociais,
lacunas a serem preenchidas e pontuadas, silêncios a serem analisados e
compreendidos e, por fim, e não menos importante, um destinatário, ou seja, um
leitor.
Por outro lado, também em diferentes graus, um novo direcionamento
‘descortina-se’ e com ele ‘acendem-se as luzes’ para um novo ‘espetáculo’
assentado nas bases conceituais do construto dos gêneros discursivos de
Bakhtin (1997) e do aporte teórico do Interacionismo Sociodiscursivo (doravante
ISD), que tem como nomes expoentes Bronckart (2003) e Schneuwly e Dolz
(2004); corrente essa que encontra sustentação nas Diretrizes Curriculares do
Estado do Paraná.
O gênero textual “resenha de filmes”, que circula socialmente, foi
escolhido em razão do fascínio dos adolescentes contemporâneos pela
linguagem imagética; em um segundo momento tal opção considerou o referido
gênero dada a sua estrutura predominantemente argumentativa, exigindo do
aluno exercitar habilidade específica de expor/defender opiniões, ao mesmo
tempo em que vislumbra o convencimento do leitor.
Para delimitação do campo de análise foi tomado como corpus
representativo do gênero em questão o curta metragem Balão Vermelho (1956),
UP Altas Aventuras (2009), e oito longas metragens: Como treinar o seu dragão
2, Malévola, Frozen – Uma Aventura Congelante, Meu Malvado Favorito 2,
Planeta dos Macacos – O Confronto, Rio 2, Jogos Vorazes – em chamas e
Espelho, Espelho Meu; e ainda dez resenhas retiradas de revistas, jornais e sites
da Internet que serviram de referencial para a produção final do aluno.
Isso posto, o formato deste trabalho, pela validação de seus resultados,
define-se como uma intervenção pedagógica cujas dimensões ensináveis
poderão configurar-se como transposição didática futura (SCHNEUWLY; DOLZ,
2004) para turmas do Ensino Fundamental II.
2 Fundamentação teórica
2.1 Gêneros textuais
O trato dos gêneros diz respeito ao trato da língua em seu cotidiano nas
mais diversas formas. [...] podemos dizer que os gêneros são uma “forma de
ação social” (MARCUSCHI: 2008). No entanto, o que se observa, é uma grande
diversidade conceitual decorrente de uma concepção não hegemônica de tal
conceito, oriunda de correntes teóricas diversas e das motivações, nem sempre
convergentes, de linguístas e antropólogos e outros estudiosos. Dessa forma,
para fins de padronização e didatismo, o presente estudo usa a expressão
“gêneros textuais” como sinônima da expressão “gêneros do discurso”3, uma vez
que o aporte teórico do presente estudo é a teoria delineada por Bronckart
(2003), o Interacionismo Sociodiscursivo – ISD –, que utiliza a expressão “gênero
textual”.
3Para Bakhtin (1997), as relações entre linguagem e sociedade são indissociáveis. Segundo o autor, as diferentes esferas da atividade humana, entendidas como domínios ideológicos, dialogam entre si e produzem, em cada esfera, formas relativamente estáveis de enunciados, denominados gêneros discursivos.
Para o próprio Bakhtin (1997),
a incalculável diversidade linguística se estratifica em diferentes formas, mais ou menos estáveis, as quais podemos chamar de gêneros, isto é, manifestações da língua tipificadas por características formais recorrentes e correlacionadas a diferentes atividades sociais. Assim também a escrita se estratifica em gêneros, uma forma convencional da linguagem, à qual atribuímos algum papel social, algum valor, alguma função (BAKHTIN, 1997 p.278).
Vistos por essa perspectiva, os gêneros textuais são, portanto, as
diferentes formas de uso da linguagem que variam de acordo com as diferentes
esferas de atividade humana, ou seja, “tipos relativamente estáveis de
enunciados determinados pelas especificidades de uma dada esfera de
comunicação” (BAKHTIN, 1997, p.279).
Berbare (2004) esclarece que embora a variedade dos gêneros
discursivos, orais e escritos, seja imensa, suas “formas estáveis de manifestação
na superfície textual trazem marcas que nos permitem identificá-los”. Não há
como negar que conceito de gêneros (textual ou discursivo) tem ajudado vários
pesquisadores (de correntes teóricas diversas) a compreender as mais variadas
práticas de linguagem que interagem nas múltiplas esferas de nossa sociedade
(BARROS, 2008).
Machado (2005, p. 251) afirma que “a apropriação dos gêneros é um
mecanismo fundamental de socialização, de possibilidade de inserção prática
dos indivíduos nas atividades comunicativas humanas”. Ainda nesta direção, em
Bazerman (apud BARROS, 2008), os gêneros são apontados como enunciados
associados às situações retóricas utilizadas pelas pessoas, em uma interação,
num certo dado momento do tempo e lugar.
Para Sobral (2003), o trabalho com gêneros, no cenário da sala de aula,
está diretamente ligado às situações comunicativas, havendo a necessidade de
se privilegiar os momentos de interlocução para assegurar a aprendizagem do
gênero estudado, não sendo viável criar graus de dificuldade que vão além da
realidade discursiva do aluno. A nosso ver, o planejamento, a antecipação, a
previsibilidade são importantes para o referido autor:
Na esfera escolar, parecem circular gêneros de diversas esferas, pois o papel social da escola de produzir conhecimentos e despertar consciências comporta perfeitamente o planejamento de ensino, nesse caso em questão, de diferentes gêneros do discurso, sem que se perca o seu sentido efetivo, concreto e real (SOBRAL, 2003).
Sobral (2003) também considera importante
Contemplar o estudo dos gêneros em sala de aula, inserindo o aluno
num diálogo mais amplo com o discurso social/cultural, livrando-o das práticas textuais desprovidas de carga ideológica e de autoria, dos meros exercícios de verificação de escrita (s/p.).
Nessa perspectiva Barros (2008) adverte que
Para que esse instrumento possa ser explorado em suas potencialidades, e com isso se torne um mediador eficaz, não só do ensino, mas também de toda interação interpessoal, ou seja, para que ele possa realmente transformar, enriquecer a atividade linguageira, ele precisa ser dominado pelo sujeito (p.36).
Para tanto um paradigma tem que ser quebrado, isso porque, muito
diferente do que tradicionalmente se aborda os fatos linguísticos/gramaticais
descontextualizados da ação de linguagem que os mobiliza, o ensino por meio
de gêneros textuais pode devolver à língua o estatuto que mais lhe compete – o
da interação social (BARROS, 2008 p. 39).
Barros (2008, p.38-39) sintetiza as capacidades de linguagem que o
sujeito deve dominar em relação a um determinado gênero textual, para que
possa ser mobilizado, pelo domínio do mesmo, um processo efetivo de
aprendizagem, quais sejam: capacidades de ação, capacidades discursivas e
capacidades linguístico-discursivas. Em síntese:
A primeira possibilita ao agente adaptar sua produção de linguagem ao contexto, ou seja, às representações do ambiente físico, do estatuto social dos participantes e do lugar social onde se passa a interação; a segunda possibilita ao agente escolher a infraestrutura geral de um texto, ou seja, a escolha dos tipos de discurso e das sequências textuais, bem como a escolha e elaboração de conteúdos que surgem como efeito de um gênero já existente e que deverá ser adaptado para a situação de produção; a terceira possibilitam ao agente realizar as operações implicadas na produção textual, sendo elas de quatro tipos: as operações de textualização (conexão, coesão nominal, e coesão verbal); os mecanismos de gerenciamento de vozes e expressão das modalizações; a construção de enunciados (oração e período) e, finalmente a escolha de itens lexicais
(BARROS, 2008, p.38-39).
Os gêneros textuais são, portanto, as diferentes formas de uso da
linguagem que variam de acordo com as diferentes esferas de atividade humana.
O discurso, por sua vez, materializa-se sob a forma de texto, e é por meio do
texto, ou enunciados (orais e escritos) que se caracterizarem pelo conteúdo
temático, construção composicional específica e pelos recursos linguísticos
(estilo próprio), marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação.
Brandão (2005) aponta que, para Bakhtin, os discursos são produzidos de
acordo com as diferentes esferas de atividade do homem e em cada esfera de
atividade social, portanto, os falantes utilizam a língua de acordo com gêneros
de texto específicos.
As DCE (PARANÁ, 2008) apresentam, de forma sistematizada,
sugestões de gêneros para serem trabalhados, a partir de um agrupamento por
esferas sociais: cotidiana, literária/artística, científica, escolar, imprensa,
publicitária, política, jurídica, produção de consumo e midiática e por isso
deveriam estar sempre à mão de profissionais atentos. Esse mesmo documento,
subsidiado pelos estudos de Schneuwly e Dolz (2004), apresenta os gêneros
orais e escritos, agrupando-os pelos domínios sociais de comunicação e
aspectos tipológicos, que merecem ser consultados por professores que
tencionem levar seus alunos a uma distinção clara da pertença a este ou aquele
domínio.
Quadro 1 – Domínios sociais e aspectos tipológicos dos gêneros textuais
Domínios sociais de comunicação Aspectos tipológicos
Cultura Literária Ficcional
Narrar
Documentação e memorização das ações humanas
Relatar
Discussão de problemas sociais controversos
Argumentar
Transmissão e construção de saberes
Expor
Instruções e prescrições
Descrever ações
Fonte: a autora (dados retirados do material das Olimpíadas de Língua Portuguesa)
Importante e necessário destacar o papel do destinatário como
determinante do gênero textual em uma situação real de comunicação. Ou seja,
na interação que se faz com o interlocutor, e nas considerações sobre ele (suas
opiniões, convicções, entre outros) é que escolha do gênero será determinada.
Dessa forma, todo texto é produzido levando em conta o destinatário do
enunciado.
Sobre a questão da relação indissolúvel do destinatário com o
enunciado Bakhtin (1997) acrescenta:
Ter um destinatário dirigir-se a alguém, é uma particularidade constitutiva do enunciado, sem a qual não há, e não poderia haver, enunciado. As diversas formas típicas de dirigir-se a alguém e as diversas concepções típicas do destinatário são as particularidades constitutivas que determinam a diversidade dos gêneros do discurso (BAKHTIN 1997, p. 325).
Essa diversidade não é estanque e pura. Bakhtin (1997) postula que,
por sua heterogeneidade, os gêneros do discurso se constituem numa
diversidade infindável, sendo difícil uma classificação fixa para inventariá-los. O
autor completa que “a diversidade funcional parece tornar os traços comuns a
todos os gêneros do discurso abstratos e inoperantes” (1997, p.280).
Assim sendo deve-se atentar para que o estudo dos gêneros textuais
não tenha como objetivo a classificação de textos pelos seus traços formais ou
suas propriedades linguísticas, mas, sim, a análise de sua funcionalidade
sociocomunicativa. Para tanto, a escola, segundo Brandão (2005) deve:
Aprimorar ou fazer conhecidos gêneros que normalmente não são do âmbito da experiência cotidiana do aluno, visando ampliar seu universo de conhecimento. Seria importante, nesse trabalho, levar o aluno a entender o seu funcionamento de forma que ele não apenas reconheça, identifique os já existentes, mas também esteja apto a integrar nas suas práticas de produção e recepção novas modalidades discursivas. Para se depreender a natureza do gênero discursivo a via de entrada é o texto. As abordagens que se fizerem no texto devem contemplar as dimensões que constituem o gênero tal como definido por Bakhtin: caracterização do conteúdo (dimensão temática), da construção composicional (dimensão textual) e do estilo (dimensão linguística) (BRANDÃO, 2005, p.8).
A presença dos gêneros textuais como ferramenta de ensino nos
diferentes níveis de ensino ganha visibilidade, no entanto é sempre oportuno
questionar sua legitimidade em consonância com as DCE (PARANÁ, 2008). O
referido documento prevê os seguintes conteúdos básicos, conforme quadro:
Quadro 2 – Conteúdos básicos para o Ensino da Língua Portuguesa
CONTEÚDOS BÁSICOS
GÊNEROS DISCURSIVOS
Para o trabalho das práticas de leitura, escrita, oralidade e análise linguística serão adotados como conteúdos básicos os gêneros discursivos conforme suas esferas sociais de circulação. Caberá ao professor fazer a seleção de gêneros, nas diferentes esferas, de acordo com o Projeto Político Pedagógico, com a Proposta Pedagógica Curricular, com o Plano Trabalho Docente, ou seja, em conformidade com as características da escola e com o nível de complexidade adequado a cada uma das séries.
LEITURA
• Conteúdo temático; • Interlocutor; • Intencionalidade do texto; • Argumentos do texto; • Contexto de produção; • Intertextualidade; • Discurso ideológico presente no texto; • Vozes sociais presentes no texto; • Elementos composicionais do gênero; • Relação de causa e consequência entre as partes e elementos do texto; • Partículas conectivas do texto; • Progressão referencial no texto; • Marcas linguísticas: coesão, coerência, função das classes gramaticais no texto, pontuação, recursos gráficos como aspas, travessão, negrito; • Semântica: • - operadores argumentativos; - polissemia; - expressões que denotam ironia e humor no texto.
ESCRITA
• Conteúdo temático; • Interlocutor; • Intencionalidade do texto; • Informatividade; • Contexto de produção; • Intertextualidade; • Vozes sociais presentes no texto; • Elementos composicionais do gênero; • Relação de causa e consequência entre as partes e elementos do texto; • Partículas conectivas do texto; • Progressão referencial no
texto;
Fonte: DCE (PARANÁ, 2008), grifos da autora.
Pelo exposto no quadro percebe-se que o trato com o texto ganhou novos
contornos e vai além da interpretação de ideias nele contidas ou aspectos
formais. Salientamos ainda que a não compreensão dos aportes teóricos dos
gêneros, ao lado da leitura deficitária da realidade social em sua amplitude e
complexidade, são entraves ao seu ensino. Para Barros (2012):
[...] ao dominar um gênero – por meio de mediações formativas –, o
aluno aprende a mobilizar os seus esquemas de utilização, tanto no nível acional, discursivo, como linguístico. Nesse sentido, ele não aprende apenas a reconhecer sua estrutura composicional ou seus elementos linguísticos mais regulares, aprende, sobretudo, a agir numa determinada situação verbal, a intervir no mundo por meio da linguagem, pois o gênero, como objeto de ensino, é, além de um instrumento didático, também um instrumento cultural (p.70).
Por isso é importante que novas leituras sejam feitas ininterruptamente, a
fim de que, efetivamente, promover um ensino significativo. Neste trabalho,
especificamente, possibilidades de trabalho com o gênero “resenha de filmes”
são mostradas em uma sequência didática, ferramenta que tem conquistado
educadores, tanto no âmbito da leitura como no da produção textual, dentro da
vertente do Interacionismo Sociodiscursivo.
2.2 O Interacionismo Sociodiscursivo – ISD
O ISD é apontado por Bronckart (2003) como uma corrente do
Interacionismo Social de Vigotski que, por sua vez, não é um movimento
formalmente constituído, mas uma orientação epistemológica geral, ou um
posicionamento epistemológico e político, construído essencialmente a partir das
obras de Spinoza, de Marx e de Vygotski (1998). Dessa forma o ISD pretende
realizar apenas uma parte do projeto do Interacionismo Social focando o papel
fundador da linguagem e, sobretudo, do funcionamento discursivo da atividade
discursiva no desenvolvimento humano (BRONCKART, 2003).
Baltar (2006) afirma que
O ISD considera que há espécies de textos, funcionando como unidades relativamente estáveis disponíveis no arquitexto, criadas historicamente pela prática social: atividades gerais e atividades de linguagem, circulando nos diversos ambientes discursivos, que os usuários de uma língua natural escolhem e atualizam quando participam de uma atividade de linguagem, de acordo com o efeito de sentido que querem provocar nos seus interlocutores. É o trabalho de análise e de conceitualização dessas espécies de textos que dá origem à noção empregada pelo ISD de gêneros textuais (BALTAR, 2006).
Assim sendo, o quadro teórico sugerido por Bronckart (2003) abre
grande possibilidade de mediação ‘didática’ para os professores de língua
materna, junto aos seus alunos, no desenvolvimento da competência discursiva
por meio do trabalho com textos, ao associarem leitura/produção às atividades
de linguagem e aos ambientes discursivos em que de fato ocorre a interação
social (BALTAR, et al. 2006).
Barros (2014) afirma que
O ISD, na sua vertente didática, tem como postulado a articulação de práticas de linguagem a um projeto de comunicação coletivo, concretizado no desenvolvimento do procedimento sequência didática
(SD), a partir do qual uma turma de aprendizes deve trabalhar sistematicamente para a resolução de um problema de comunicação (de preferência real ou ficcionalizado pela ação didática). Problema
esse que é materializado pela produção/leitura de um gênero de texto (2014, p. 46).
Em linhas gerais o ISD toma a linguagem como um fenômeno social e
histórico, um lugar de interação e defende que o texto é a unidade concreta da
comunicação e, o gênero, o megainstrumento (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004) de
toda interação interpessoal.
Os PCN (BRASIL, 1998) trouxeram importantes colaborações no tocante
ao objetivo principal da Língua Portuguesa, qual seja, o de desenvolver a
competência comunicativa dos alunos; assim, o texto passa a ser visto como a
unidade de base do ensino da língua e, o gênero textual, por sua vez, o seu
objeto/instrumento.
Segundo Barros (2012, p.72),
[...] antes de um determinado conhecimento chegar à sala de aula [...], esse deve passar por um conjunto de transformações e adaptações. [...] a esse processo de transição entre o conhecimento científico do objeto de ensino e o conhecimento didatizado, a literatura vem denominando transposição didática.
A expressão “transposição didática” foi assim nomeada pelo francês
Michel Verret, no ano de 1975, mas foi Yves Chevallard, educador e matemático
francês que aprofundou seus estudos (BARROS, 2014).
Machado e Cristovão (2006) explicam que
O termo transposição didática não deve ser compreendido como a simples aplicação de uma teoria científica qualquer ao ensino, mas como o conjunto das transformações que um determinado conjunto de conhecimentos necessariamente sofre, quando temos o objetivo de ensiná-lo, trazendo sempre deslocamentos, rupturas e transformações diversas a esses conhecimentos (MACHADO; CRISTOVÃO, 2006, p. 552).
Barros (2014) elaborou um esquema que sintetiza a engenharia da
transposição didática dos gêneros na perspectiva do ISD:
Figura 1 – A engenharia da transposição didática dos gêneros na perspectiva
do ISD
Fonte: Barros (2014, p. 45).
Tal esquema toma por base o construto dos pesquisadores do grupo de
Genebra, segundo os quais, para que um gênero se torne viável no processo da
transposição didática é necessária a construção de uma ferramenta que vai
mediar o conhecimento nesse gênero e o torne ensinável, denominada por eles
de modelo didático de gênero (BARROS, 2012).
De Pietro e Schneuwly (apud BARROS, 2012, p.74) elencam as
seguintes características de um modelo didático:
uma dimensão praxeológica; uma força normativa (da qual, segundo os autores, é
impossível fugir); pode ser implícito/intuitivo (partir do conhecimento prévio do
professor) ou explícito/conceitualizado (ser elaborado a partir de um corpus de textos do gênero);
é o ponto de início e o ponto de chegada do trabalho didático com o gênero;
é uma teorização mais genérica das atividades linguageiras; é sempre o resultado de práticas de linguagem anteriores,
portanto, históricas; permite, a partir das práticas sociais de referência, produzir
SD.
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.97) definem sequência didática
como “um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira
sistemática, em torno de um gênero textual oral e escrito”, ou seja, é um
procedimento metodológico organizado a partir de um conjunto de atividades
ligadas entre si, tendo como objeto unificador um gênero textual (NASCIMENTO,
2009). Esse procedimento organiza o planejamento do conteúdo, ou seja, das
dimensões ensináveis do gênero, objeto da SD, propiciando ao aluno o domínio
de uma prática de linguagem “real”, facilitando sua aprendizagem de forma
progressiva.
Barros (2014), subsidiada pelo ISD, assim define uma SD:
[...] sequência de módulos de ensino, organizadas conjuntamente para melhorarem uma determinada prática de linguagem”, e tem como objetivo buscar “confrontar” os alunos com práticas de linguagem historicamente construídas, os gêneros textuais, para lhes dar possibilidade de reconstruí-las e delas se apropriarem” [...] Ela é a finalidade primeira da modalização didática dos gêneros textual (BARROS, 2014, p. 46).
Esse conjunto de atividades, segundo o grupo de Genebra, apresenta-se
por etapas que se iniciam pela apresentação da situação (ao apresentar ao aluno
uma situação concreta de uso de linguagem e a necessidade de produção de
um texto de um gênero escolhido para atendê-la) e pela produção final (avaliação
do desenvolvimento real do aluno, em que se faz a comparação entre a primeira
e a última produção), estas intermediadas por oficinas/módulos e por reescritas
(momento de oportunidade de aprimoramento das capacidades de linguagem)
(BARROS, 2014) conforme esquema abaixo:
Figura 2 – Esquema da Sequência Didática proposto pelo grupo de Genebra
Fonte: Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 98)
De forma mais detalhada, este esquema inicia-se com a
APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO, momento em que o professor propõe um
problema de comunicação, que será solucionado com a produção do gênero a
ser exercitado na próxima etapa, ou seja, a PRODUÇÃO INICIAL, a exemplo da
“resenha de filmes”, gênero eleito neste estudo com o objetivo precípuo de
garantir aos alunos a expressão de suas opiniões com clareza e coerência.
A segunda etapa é a PRODUÇÃO INICIAL, momento em que os alunos
tentarão elaborar um primeiro texto, depois de motivados durante a fase de
apresentação da situação, mesmo que ainda não respeitem todas as
características do gênero permitindo-lhes, mesmo que parcialmente, seguir as
instruções dadas pela professora, pois os alunos ainda não foram inseridos em
um trabalho sistemático com o gênero.
A primeira produção pode ser simplificada, pois configura-se como um
instrumento de avaliação diagnóstica em uma perspectiva de avaliação
formativa. Ela dará indicações para que o professor faça as
mediações/intervenções, apontando o caminho que o aluno ainda tem a
percorrer.
Essa etapa permite que o professor tenha uma visão clara dos
conhecimentos prévios dos alunos, quais dificuldades reais eles apresentam, o
que é preciso apresentar como proposta de trabalho a fim de desenvolver suas
capacidades de linguagem, ajustando assim as atividades seguintes que
culminarão com a produção final.
Nos MÓDULOS, terceira etapa da SD, deverão ser trabalhados os
principais problemas diagnosticados na primeira produção e dar aos alunos os
instrumentos necessários para superá-los. Nessa etapa, segundo Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004), deve-se:
Quadro 3 – Etapas de trabalho nos módulos da SD
1- Trabalhar problemas em níveis diferentes:
Representação da situação comunicativa (contexto de produção);
Elaboração dos conteúdos: aluno deve conhecer técnicas para buscar, elaborar ou criar conteúdos;
Planejamento do texto, referente à infraestrutura do texto;
Realização do texto: escolha dos meios de linguagem mais eficazes para escrever o texto, como vocabulário apropriado; tempos verbais; organizadores textuais; introdução de argumentos.
2. Variar as atividades e exercícios:
Atividades de observação e análise de textos;
Tarefas simplificadas de produção de textos;
Elaboração de uma linguagem comum.
3. Capitalizar as aquisições (listas de constatações)
Investigar as aprendizagens.
Fonte: a autora, dados de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004)
A quarta e última etapa, da PRODUÇÃO FINAL, constitui-se como
uma avaliação do desenvolvimento real do aluno pelo confronto da primeira e a
última produção; e permite ao aluno, colocar em prática as noções e os
instrumentos elaborados nos módulos como também acionar o controle sobre
seu próprio processo de aprendizagem.
Segundo Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004), os processos de reescrita
nessa etapa são importantes, visto que “o texto permanece provisório enquanto
estiver submetido ao trabalho de reescrita. [...] O aluno deve aprender que
escrever é (também) reescrever”. Nos limites prescritos pelo ISD o ato de
produzir um texto implica, sempre no ato da revisão, da reescrita, que pode ser
feita de forma individual, coletivamente, em pares. Embora os autores citados
não concebam os processos de reescrita como uma fase distinta na produção
final, Barros (2014, p 47) “evidencia a revisão/reescrita textual como uma fase
distinta, mas não condicionada a uma ordem linear, ou seja, uma fase que pode
acontecer a qualquer momento da SD dependendo das especificidades de cada
contexto de intervenção”. Essa última etapa também permite ao professor
concluir o processo da avaliação formativa, já anunciado anteriormente.
Dolz et al (2004) apresentam, de forma sucinta, o objetivo do trabalho
com SD, qual seja: criar contextos de produção e oferecer aos alunos atividades
variadas, para que eles apropriem-se de um determinado gênero em diversas
situações de comunicação. Para Schneuwly e Dolz (2004, p. 53), efetivamente,
as SD favorecem “a mudança e a promoção dos alunos a uma melhor maestria
dos gêneros e das situações de comunicação”.
No entanto, para que tal objetivo seja legítimo e aplicado em situações
vindouras, as atividades da SD devem ser criteriosamente selecionadas,
adaptadas ao universo do público alvo, de forma a possibilitar o mapeamento
das dificuldades explicitadas na primeira versão (marcas enunciativas, dos
tempos verbais que determinam o gênero posto em aprendizagem), uma vez
que esta primeira versão será o instrumento por meio do qual se realizará o texto
definitivo.
Dolz (apud BARBOSA; ROVAI, 2012 p.43) lista cinco condições para que
uma SD possa ser considerada tal como foi concebida pelos pesquisadores da
Universidade de Genebra – um dispositivo didático para o ensino-aprendizagem
da produção textual:
partir de um projeto (situação de comunicação);
contar com uma produção inicial;
prever atividades que se proponham a ensinar (os módulos);
contemplar dimensões linguísticas e discursivas nessas atividades;
prever uma produção final que integre as aprendizagens e que conte com
uma “grade de controle”, um roteiro de autoavaliação que permita ao
aluno revisar e editar seu texto (ferramenta externa que pode contribuir
com a internalização de procedimentos de revisão e edição de texto).
Isso posto, a SD serve, a nosso ver, a dois propósitos claros: dar
direcionamento à ação do professor (ensino) e à ação do aluno (aprendizagem)
que, se bem conduzido pela ação planejada do professor, poderá analisar seus
avanços no processo, tornando-se ‘autodidata’ pela revisão analítica de sua
produção inicial comparativamente à produção final num exercício ininterrupto
de reescrita e refacção.
Apresenta-se a seguir as especificidades do gênero “resenha de filmes”,
objeto da sequência didática que será analisada.
3 Modelo teórico/didático: resenha de filmes
Barros (2008), ao anunciar o potencial dessa ferramenta (filmes) no
âmbito da escola, associando-se a ela, a crítica de cinema, afirma que ambas
podem configurar-se como um instrumento complementar no ensino da língua
(BARROS, 2008 p. 18-19). O gênero “resenha de filme”, denominado também
como “crítica de cinema”, “crítica de filme” ou simplesmente “crítica”, tem como
função social divulgar e avaliar criticamente obras culturais.
Para Barros (2008), a resenha de filmes
É um gênero que transita entre o mundo jornalístico e o cultural, pois o tema que veicula pertence ao mundo das Artes, mas quem o veicula é a esfera jornalística. Tem como suporte o jornal, a revista e também a web (sites especializados em cinema/cultura, e também versões on-line de jornais/revistas impressas) (BARROS, 2008 p.54)
Ainda segundo Barros (2008):
A crítica de cinema, veiculada pelo jornalismo cultural, além das características prototípicas do gênero, como a
exposição de informações relativas ao filme-alvo, a narração parcial do enredo fílmico, a avaliação crítica de aspectos relevantes do filme também passa a incorporar nuances do discurso jornalístico contemporâneo: ênfase na linguagem imagética (foto do filme-alvo em destaque, muitas vezes ocupando espaço superior ao texto verbal), destaque aos títulos e subtítulos, inserção de informações fílmicas periféricas, extensão textual/verbal reduzida (BARROS, 2008 p.171).
A resenha de filmes apresenta três características fundamentais, segundo
França (2002): 1) o conteúdo temático abordado refere-se a uma produção
fílmica; 2) há abordagens do filme (produto) e do filme (ficção); 3) há passagens
apreciativas (crítica propriamente dita) em relação à obra cinematográfica.
Monteiro (1998, p.22), por sua vez, equipara a resenha a um resumo
crítico: “o ponto alto da resenha é a visão crítica de quem a escreve. Além de
trazer o assunto devidamente, este é acompanhado de uma análise, de uma
visão crítica”. Nessa mesma direção, Barros (2008) considera o resumo como
parte da resenha e não o compreende sem a visão crítica.
Para Machado (2005), a mobilização de conteúdos pertinentes à
elaboração de texto que fazem parte do gênero resenha, a sumarização
(resumo) é muito importante, entretanto esse gênero traz mais “que uma simples
apresentação concisa de conteúdos; traz também interpretações e avaliações
do resenhador”. Acrescenta ainda que, no gênero resenha o resumo é
apresentado de forma parcial já que o objetivo do mesmo é incitar o destinatário
a ler uma obra, ou no nosso caso, resenha de filme, assistir a um filme.
Considerando as palavras de Machado, Lousada e Abreu-Tardelli (2004):
Inúmeros tipos de textos se caracterizam por apresentar informações selecionadas e resumidas sobre o conteúdo de outro texto. Outros, além de apresentar essas informações, também apresentam comentários e avaliações. Os primeiros são resumos e os segundos são resenhas (MACHADO, LOUSADA E ABREU-TARDELLI, 2004, p. 15).
Texto veiculado tanto pela mídia impressa e pela web está em diálogo
constante com as práticas de linguagem que emergem na esfera da criação
cinematográfica, mas pode servir de exercício de escrita, em situação de sala de
aula, como prescrito nas DCE (PARANÁ, 2008). Em outras palavras, a resenha
de filmes pode servir de suporte e modelo para produções de textos em que a
criticidade e argumentatividade são aliadas.
Segundo Berbare (2004), a crítica deve servir apenas como parâmetro de
avaliação, nunca como fator decisivo de apreciação de um filme. Baseando em
resultados de sua pesquisa, a autora “propõe questões que podem nortear a
produção do gênero”:
Qual é o gênero cinematográfico do filme (drama, comédia, suspense...)?; Deque trata o filme (Qual é o seu enredo)?; De que modo o tema foi tratado (de maneira comum ou algum enfoque especial)?; Tem ele alguma característica especial (efeitos especiais, figurinos, etc.)?; Qual é o público alvo do filme?; Qual é a duração do filme?; Quem é o diretor (informações sobre outros trabalhos, premiação)?; O filme é premiado ou está concorrendo a algum prêmio? Qual o ano de produção e o seu país de origem? (BERBARE, 2004, p. 45).
Segundo Bronckart:
É com base nos nossos conhecimentos sobre gênero (aspecto convencional) que, diante de uma situação de produção, adotamos um determinado “modelo” que, para aquela situação específica, nos parece ser o mais adequado. Entretanto, o agente-produtor nunca vai simplesmente reproduzir o gênero, ele vai adaptá-lo às exigências particulares do contexto e da forma como ele representa esse contexto (apud BARROS, 2008 p.50).
Barros (2008, p.55) indica que o gênero “resenha de filmes” aparece
em seções ou cadernos especializados em entretenimento/cultura/arte/cinema,
partilhando espaços com outras modalidades de crítica, como a de livros ou de
CD. O texto da crítica é sempre assinado e seu autor pode, ou não, ser um
jornalista. Esse gênero tem como tema principal uma obra cinematográfica alvo
da crítica. Desta forma, o objetivo comunicativo do gênero transita entre a
apresentação de informações do filme (data de estreia, gênero cinematográfico,
duração, diretores, atores, etc.), a sumarização do enredo e a asserção
valorativa de alguns aspectos da obra. A tendência, ora para a descrição das
informações (aí compreendida a descrição factual da narração), ora para a
argumentação crítica, vai depender do contexto em que a crítica está inserida: o
tipo de suporte, o público alvo, a linha editorial do jornal/revista, a competência
e/ou o nível de especialização do crítico, o objetivo dos editores, etc.
Há algumas décadas esse gênero era potencialmente um texto elitizado,
pois destinava-se a uns poucos leitores. No entanto, com popularização da
Internet em meados da década de 1990 e, junto com esse processo, o
aparecimento de sites dedicados à crítica de cinema, passou apresentar-se
como uma variável importante quando se discute a questão do espaço dedicado
aos textos sobre cinema. A publicação através da Internet elimina o fator custo
relativo à impressão, papel e distribuição presente nos jornais e revistas. Assim,
um texto num site pode ter dez linhas ou dez páginas que custará o mesmo do
ponto de vista material. Eliminado assim o fator custo físico nas publicações
online, as revistas sobre cinema na Internet se prestariam bem ao teste desta
variável com relação à qualidade dos textos críticos (FRANÇA, 2002, p.116).
O leitor contemporâneo tem pouco tempo disponível, necessitando de
informação de forma objetiva, que possa ser lida rapidamente. Além desse fator,
pesquisas sobre os comportamentos dos usuários de Internet mostram que eles
geralmente permanecem pouco tempo em cada página acessada.
A internet ganhou cadeira cativa no cenário escolar de acordo com Sobral
(2003):
Na esfera escolar parecem circular gêneros de diversas esferas, pois o papel social da escola de produzir conhecimentos e despertar consciências, comporta perfeitamente o planejamento de ensino, nesse caso em questão, de diferentes gêneros do discurso, sem que se perca o seu sentido efetivo, concreto e real.
Por isso, o autor considera essencial contemplar o estudo dos gêneros
em sala de aula, inserindo o aluno num diálogo mais amplo com o discurso
social/cultural, livrando-o das práticas textuais desprovidas de carga ideológica
e de autoria, dos meros exercícios de verificação de escrita.
De forma mais incisiva, Pinheiro (1998, p.122-123) nos indica o aspecto
crítico da resenha cinematográfica, pois
Considera a crítica como um espaço de representação social da(s) cultura (s) em questão [...], as resenhas de filmes aqui estudadas são produzidas por autores não especializados, dirigidas a um público interessado nesse tipo de gênero cinematográfico, difundidos por sites e concernentes a um mesmo objeto (filmes a estrear ou em cartaz nos cinemas. O crítico de cinema deve apreciar, avaliar, julgar, ou seja, revelar sua posição quanto ao dito, seguindo o princípio da elocutividade.
Ainda de acordo com Pinheiro (1998, p.123),
A crítica cinematográfica deve se conformar a uma organização discursiva que compreenda uma informação
sobre o filme sob seus diferentes aspectos – ficha técnica, o filme como objeto de produção, como gênero, como diegese, como cinema (técnica cinematográfica), informação sobre o realizador e os atores; uma apreciação sobre o filme, ou seja, avaliação do sujeito-crítico que permitirá ao leitor formar indiretamente uma opinião previa capaz de orientar sua escolha, e finalmente uma justificativa dessa apreciação, isto é, os argumentos que motivam a avaliação [...].
Diante do exposto, inquestionavelmente a resenha de filmes configura-se
uma prática pedagógica pautada na criticidade e argumentatividade.
4 Sequência didática para a apropriação do gênero textual resenha de
filmes
A sequência didática que deu origem a este artigo foi organizada em 15
oficinas, seguindo o esquema proposto pelo Grupo de Genebra e sistematizado
por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), descritas sistematicamente no quadro
que se segue:
Quadro 4 - Quadro sinóptico da sequência didática da resenha de filmes
SINOPSE – SEQUÊNCIA DIDÁTICA DA RESENHA DE FILMES Oficinas Objetivos (para o
professor) Atividades Conteúdo
01 Leitura do script: preparando o elenco e definindo papeis! Parte I
*Motivar os alunos para as infinitas leituras que fazemos. *Instigar os alunos para o universo imagético do cinema.
* Leitura do texto: O LIVRO É PASSAPORTE, É BILHETE DE PARTIDA – Bartolomeu Campos Queirós. * Reflexão oral sobre os diferentes tipos de leitura. * Leitura de Charge.
* Reflexão sobre a importância de todas as leituras * Exploração das imagens do ler que veiculam na sociedade * Leitura e análise de charge
02 Leitura do script: preparando o elenco e definindo papeis! Parte II
* Apresentar aos alunos uma nova possibilidade de leitura: a leitura de filmes. * Apresentar o projeto aos alunos.
*Montagem do ranking dos filmes favoritos dos alunos * Socialização e troca dos resultados apresentados *Atividade xerocada: listagem dos dez filmes mais vistos em 2014 *Análise dos gêneros dos filmes citados na atividade.
* Entrevista oral com os alunos para levantamento dos filmes vistos por eles. * Apresentação do ranking dos filmes mais vistos em 2014. * A distinção dos diferentes gêneros dos filmes (drama, comédia, etc.)
*Discussão acerca da viabilidade da produção cinematográfica que envolvem filmes vistos, ou não vistos, por eles. *Atividade oral: a frequência com que assistem filmes no cinema ou na TV. *Texto: “Você já viu esse filme!” discussão e ampliação do quadro com situações usadas frequentemente pelos roteiristas de cinema em filmes vistos pelos alunos (cenas clichê) * Tarefa de casa: pesquisa no dicionário da expressão clichê e contextos nos quais pode ser usada.
* Cenas-clichê.
03 Reconhecimento do gênero e de seu suporte - Parte I
* Reconhecer os elementos constitutivos do gênero textual “resenha de filme”, motivando os alunos para a primeira produção.
*Apresentação do curta O Balão Vermelho. *Discussão acerca do filme e anotação de informações pertinentes. * “Leitura” do filme percebendo quais elementos teriam conferido a ele a premiação no quesito originalidade. * Leitura de resenhas do filme e pesquisa de seu contexto de produção distinções entre resenha e sinopse. *Reconhecimento de sua ficha técnica. *Releitura de obra de arte.
* Leitura de diversas resenhas do filme assistido pelo grupo. *Leitura de obra de arte.
04 Reconhecimento do gênero e de seu suporte: Parte II
* Reconhecer os elementos constitutivos do gênero textual “resenha de filme”.
*Produção coletiva de uma resenha sobre o filme assistido no quadro de giz *Divisão da turma em grupos e sorteio de um filme a ser assistido *Assistir (em grupo) aos filmes sugeridos pelo corpus representativo do gênero; produzir textos similares a uma resenha e apresentar para a sala, focando cenas
Produção textual coletiva * Pesquisas *Leitura
importantes, música, figurino, cenário, etc. *Pesquisa da ficha técnica *Ler resenhas diversas sobre os filmes assistidos e de alguns outros pesquisados em revistas, jornais e sites da internet. (Anexo 1A)
05 Reconhecimento do gênero e de seu suporte: Parte III e Produção Inicial
*Reconhecer os elementos constitutivos do gênero textual “resenha de filme” pela leitura de resenhas disponibilizadas na internet, revistas e jornais.
*Feitura do quadro sinóptico dos filmes do corpus de análise. *Leitura de resenhas diversas sobre os filmes assistidos e de alguns outros pesquisados em revistas, jornais e sites da internet. *Apresentação para a sala enredo do filme pelos grupos. (Anexo 1B)
*Leitura e apresentação oral. *Produção de sinopse.
06 Produção inicial: uma avaliação diagnóstica
*Identificar os problemas de escrita em relação à resenha de filmes
*Filme UP – Altas aventuras. * Pesquisa de sua ficha técnica. *Primeira produção textual do gênero em questão. (Anexos 2A -2B)
*Produção escrita de resenha do filme
07 O Contexto de produção
*Analisar o contexto de produção de resenhas de filmes.
*(Em grupos) análise do contexto de produção que serviu de base para a construção dos textos selecionados para a atividade. *Produção coletiva do filme assistido pelos grupos, com foco no contexto de produção proposto.
*Leitura, análise e produção coletiva de texto
08 Plano textual da resenha de filme
*Reconhecer o plano textual global no gênero estudado: suas características, títulos e subtítulos.
*Reconhecimento do gênero resenha de filmes por meio da leitura de dois textos do corpus. *Reconhecimento e importância dos títulos nas resenhas estudadas
*Leitura de textos do corpus *Identificação das particularidades do gênero
09 Recursos argumentativos
*Reconhecer a sequência argumentativa no gênero
*Leitura, reflexão e análise de diferentes posicionamentos de resenhadores nos subtítulos dos textos. *Opinião e argumentos (construção de quadro)
*Leitura de argumentos e produção de opinião *Operadores argumentativos
*Atividade com operadores argumentativos. *Produção de opinião a partir de argumentos lidos.
10 O grupo narrar/expor na resenha de filme
*Identificar a presença da narratividade no gênero resenha. *Produzir um conto a partir de um filme assistido.
*Listagem das finalidades do resumo do enredo nas resenhas de filme. *Observação do tempo verbal na narrativa. *Atividade com as fases da narrativa no resumo do enredo. *Discussão e produção de parágrafo de opinião sobre a situação final (desfecho) num resumo de enredo. *Posição da sequência narrativa em resenhas de filmes. Atividades complementares. *Produção de um conto a partir do filme assistido pelos alunos: Up-Altas Aventuras.
*Desfecho e omissão do final no resumo do enredo *Posição de trechos narrativos em resenhas *Produção de conto
11 Coesão Verbal *Analisar marcas da coesão verbal em fragmentos apresentados.
*Identificação da sequência verbal no resumo de resenhas de filmes. *Identificação das marcas da coesão verbal nas resenhas lidas.
*Coesão verbal
12 Coesão nominal: sequenciação e marcas linguísticas
*Analisar marcas da coesão nominal em fragmentos apresentados.
*Identificação da sequência nominal no resumo de resenhas de filmes. *Identificação das marcas da coesão nominal nas resenhas lidas.
*Coesão Nominal
13 Produção final: reescrita da resenha
*Orientar o aluno na reescrita do texto proposto na produção inicial
*Produção textual. (Anexos 3A – 3B)
*Resenha de Filme
14 Revisão da escrita da resenha
*Reestrutura das resenhas a partir das orientações dadas pelo professor.
*Digitalização das resenhas revistas. (Anexo1C) *Seleção de imagens para ilustrá-las (edição).
*Reestruturação textual *Edição de Texto
15 O espetáculo continua…
*Partilhar com o público escolar os resultados do projeto.
*Apresentação do filme Up – Altas Aventuras para comunidade escolar. *Montagem de mural com as resenhas editadas.(Anexos 1D-1E-1F)
*Filme *Edição de resenhas
Fonte: a autora.
A Figura 3 retoma as etapas da SD com a distribuição das 15 oficinas já
citadas.
Figura 3 – Esquema da SD da resenha de filmes
Apresenta-ção do
projeto e reconheci-mento do
gênero
Oficinas
1, 2, 3, 4
Módulos 1, 2, 3
Produção final
Oficina 13
Produção inicial
Oficina 5
Módulo 1 Contexto de Produção e
Plano Textual do gênero resenha
Oficinas 6, 7, 8
Módulo 2 Recursos
Argumentativos; Elementos coesivos
Oficina 9
Módulo 3 Recursos da narratividade;
Elementos coesivos
Oficinas 10, 11,
12
Revisão Edição
Publicação dos
resultados
Oficinas 14 e 15
Fonte: a autora.
Optamos por comentá-las sequencialmente para que os passos da SD
fossem explorados devidamente.
Em preparação para a Produção Inicial (primeira etapa da SD), foram
realizadas quatro oficinas. Não nos atemos em apontar o número de horas/aula
dispensadas para cada uma delas, mas cumpre-nos dizer que todo o projeto foi
desenvolvido ao longo de oito meses. Cada oficina priorizou três aspectos:
objetivos claramente definidos, conteúdos norteadores e um rol atividades bem
diversificadas favorecendo a checagem se as metas estabelecidas foram ou não
atingidas, de modo que novas ações pudessem ser replanejadas. Vale ressaltar
que ao longo da realização das oficinas um diário foi mantido pelos
pesquisadores, a fim de perceber alegrias, frustrações, acertos e erros na
caminhada para posteriores reflexões e análises. Para efeitos didáticos o
chamaremos de diário reflexivo (DR)4; quanto às atividades propostas para os
alunos todas foram desenvolvidas em um caderno brochura grande que o
chamaremos de blocão de notas (BN).
Para Liberali (1999, p. 11), a prática reflexiva “vem assumindo, cada vez
mais, um papel de preponderância”. Nas palavras de Fernandes (2006, p. 32),
tal postura “baseia-se em novas visões acerca da natureza das interações
sociais que se estabelecem nas salas de aula entre os alunos e entre os
professores e os alunos”. O autor acrescenta ainda que “principal função é a de
conseguir que os alunos aprendam melhor, isto é, com significado e
compreensão” (FERNANDES, 2006, p. 32). A prática reflexiva, a nosso ver, em
linhas gerais, tem redefinido o papel de alunos e professores.
Dentro da SD o envolvimento do aluno é um elemento facilitador da
aprendizagem, sem contar que muitas atividades das oficinas foram realizadas
em grupo, outro diferencial que oportunizou a interação/mediação na
apropriação dos conteúdos propostos.
Ao apresentar aos alunos infinitas leituras que veiculam na sociedade pela
percepção dos infinitos suportes existentes, adentrando no universo imagético
do cinema (Oficina 1), pela fala de uma aluna “Ler é essencial para não sermos
manipulados”, e concordância da turma, ficou evidente o objetivo proposto foi
atingido. Pela enquete realizada algumas informações também merecem
destaque: dos 29 alunos da turma 20 afirmaram gostar de ler; 5 gostam mais ou
menos e 4 não gostam. Ao apresentar o projeto (Oficina 2) a grande maioria dos
alunos demonstrou interesse. “Oba filmes!“, disseram alguns. Para esta oficina
foi pedido que trouxessem anotados no BN os 10 filmes que assistiriam
novamente. Um dado interessante foi revelado: os gêneros preferidos da maioria
dos adolescentes são terror e guerra, filmes violentos em sua maioria. No
4 O diário reflexivo como instrumento de avaliação e de investigação didática foi utilizado por Darsie (1998), no contexto de um trabalho de formação inicial de docentes e amplamente divulgado no meio acadêmico, não sendo muito comum no ensino fundamental. No entanto, a figura do profissional com prática reflexiva tem sua origem em Dewey (1959), retomada por Schön (2000) e Perrenoud (2002).
entanto alguns alunos citaram filmes do corpus de análise. Quatro alunos citaram
os filmes Frozen e Malévola, dois citaram Meu Malvado Favorito e Up, Jogos
Vorazes foi citado quase que pela totalidade. Ter filmes do corpus na lista dos
preferidos dos alunos deixou-nos mais confortáveis. A proposição da feitura
desta lista, que serviria de suporte para a abordagem de cenas clichê, foi
notadamente interessante, pois prontamente os alunos fizeram referências às
cenas mais comuns também presentes nos filmes apontados por eles. O pedido
de pesquisa prévia assenta-se no modelo de aprendizagem difundida no Brasil
por Pedro Demo5.
A fim de reconhecer os elementos constitutivos do gênero textual
“resenha de filme” (Oficinas 2 e 3), foi feita a ‘leitura’ curta-metragem6, de O
Balão Vermelho, e destacadas informações pertinentes: data de produção,
origem, diretor, atores, autor da trilha sonora, efeitos especiais, entre outras.
Como atividades foram propostas pesquisa da ficha técnica do filme, a fim de
colocar os alunos ‘no cenário’ das aulas pela compreensão efetiva dos termos
“curta metragem”, “sinopse” e “resumo”. Pedido foi que registrassem, em um
parágrafo, a opinião acerca do filme e só depois lhes foram apresentadas
algumas resenhas do filme em questão, pedindo que atentassem para os
elementos constitutivos desse gênero textual: dados do filme (ficha técnica),
resumo parcial do enredo (ou sinopse) e crítica.
A postura dos alunos durante a leitura dos textos disponibilizados foi a de
‘garimpagem’. Eles sabiam o que pretendiam. O exercício era identificar e
destacar com segurança utilizando lápis de cores diferentes. A troca de
impressões entre os alunos ao definir qual a cor usar e em qual fragmento do
texto foi muito instigante. Para finalizar foram retomadas as ‘diferentes formas
do ler’ com a leitura da tela RedBallon de Paul Klee (1922), disponível em
<http://www.guggenheim.org/newyork/collections/collectioonline/artwork/2143>.
Outro momento mágico. Os alunos sentiram-se valorizados ao
perceberem os detalhes que, segundo eles, teriam deixado passar, não fosse a
discussão da Oficina 1, o que confirma as palavras de Barros (2012) um modelo
didático de gênero pode servir como “base teórica para elaborar diversas SD,
5 Demo, Pedro. Educar pela pesquisa. Campinas, 1996. 6 Produção francesa, dirigida por Albert Lamorisse, recebeu a Palma de Ouro em Cannes em 1956 e o Oscar por Melhor Roteiro Original em 1957.
que precisam ser adaptadas a um contexto de ensino específico, por se
configurarem em ferramentas didáticas que possibilitam a transposição do
conhecimento teórico de um gênero para novo conhecimento a ser ensinado”.
Por sua vez, Baltar et al. (2006) nos indicam outra vantagem no
trabalho com a SD pela seleção de gêneros que sejam mais pertinentes:
No intuito de ampliar o universo conceitual dos sujeitos envolvidos no processo de ensinagem, na perspectiva do SD, cabe antes trabalhar com o desenvolvimento da competência discursiva por meio de atividades e ações de linguagem significativas e situadas nos variados ambientes discursivos, do que com a língua apenas enquanto sistema (BALTAR et.al. 2006, p. 379-380)
Discursos como “a falta de diálogo, de cor” (a produção é toda em preto e
branco com destaque apenas para o balão em vermelho); “o final inesperado, foi
chato”; ou ainda, “não concordo que o filme seja comédia, fantasia tudo bem,
mas não é comédia” reitera o caráter pessoal e subjetivo do gênero resenha, por
isso todos os argumentos foram respeitados e acatados como coerentes (ao
menos neste momento) considerando o contato tão recente com o gênero. Nas
palavras de Marcuschi (2002, p.20), “os gêneros não são instrumentos
estanques e enrijecedores da ação criativa, ao contrário, caracterizam-se como
eventos textuais altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos”.
Apresentados os três elementos constitutivos, para efetivação do conceito
e estrutura do gênero em questão, as atividades da Oficina 4 culminaram com
uma produção coletiva do filme Balão Vermelho com registro no quadro de giz e,
posteriormente no BN, para retomada dos aspectos da narratividade presentes,
e da crítica, que pode aparecer de forma implícita ou explícita. A construção de
um mapa conceitual finalizou esta seção de conceitos semânticos e estruturais
do gênero resenha.
A construção de mapa conceitual segundo Novak e Gowin (2003)
configura-se “como uma ferramenta para organizar e representar conhecimento
onde os conceitos complexos se constroem a partir do agrupamento de outros
mais simples (NOVAK; GOWIN 2003, P. 147).
O mapa conceitual neste momento prestou-se a, além de explorar a
técnica de resumo, estabelecer conexões analíticas, o que,
inquestionavelmente, desenvolve o raciocínio lógico, tão necessário na
argumentação. Uma outra razão para a utilização deste recurso foi porque os
alunos demonstraram dificuldades em separar informações essenciais das
informações secundárias. Para alguns deles “tudo parecia ser essencial”. Por
isso a escolha desta ferramenta foi muito eficaz.
De posse do mapa, a turma foi dividida em oito grupos e a cada grupo foi
pedido que assistissem a um filme do corpus anotando no BN o resumo do
enredo focando os aspectos mais relevantes da trama, uma sinopse para ser
repassada aos outros grupos, bem como informações de sua ficha técnica e
outras informações curiosas, a exemplo de investimentos e renda de bilheteria.
No reconhecimento dos elementos que constituem o gênero “resenha”, a
maioria conseguiu fazer as atividades de maneira correta (ficha técnica, sinopse
e crítica) dos filmes apresentados pelos grupos. A tarefa foi realizada com
interesse e preocupação, no entanto alguns alunos demonstraram dificuldades,
muitas destas puderam ser sanadas na oficina 4, que consistiu na montagem de
um quadro geral dos oito filmes assistidos. Depois cada grupo recebeu resenhas
selecionadas pelo professor para que o grupo confrontasse posicionamento do
resenhador com as opiniões dos componentes do grupo. Finalizando foram lidas
algumas resenhas de filmes vistos por outros grupos. Uma troca de interesse
real!
Registre-se que alguns grupos se destacaram e mostraram interesse em
buscar informações relevantes sobre o filme. Surpreendente! Os grupos de
Planeta dos Macacos: O Confronto; Frozen – Uma aventura Congelante e Como
treinar seu dragão 2, foram ótimos na pesquisa e apresentação, pela produção
da sinopse. Por outro lado, a dificuldade de alguns grupos na compreensão e
produção desse gênero ainda persistiram.
O filme Up – Altas Aventuras foi então foi apresentado em contraturno
para a produção inicial (Oficina 5) após pesquisa de sua ficha técnica,
curiosidades e leitura de uma resenha. A maioria não tinha assistido ao filme,
o que foi ótimo. No momento oportuno, a maioria dos alunos, de posse da ficha
técnica pesquisada, produziram a resenha em folha própria e poucos, bem
poucos alunos, pediram ajuda.
No primeiro módulo (Oficinas 6,7,8) foram abordados o contexto de
produção, plano textual e demais particularidades do gênero, a exemplo do título
e subtítulos. As resenhas pesquisadas pelos alunos na Folha de S. Paulo e Folha
de Londrina dos filmes Planeta dos Macacos – O confronto e Frozen – uma
aventura congelante serviram de base para explorar a situacionalidade da
produção textual abordada por Bronckart (apud BARROS, 2007).
Quadro 5 – Contexto de produção segundo o ISD
Contexto de produção textual: situcionalidade
Mundo Físico Mundo sociossubjetivo
o lugar físico de produção;
o momento de produção;
o emissor que produz fisicamente o texto oral ou escrito;
o receptor que recebe o texto concretamente.
o lugar social da interação (escola, família, igreja, interação comercial, interação do cotidiano, etc.);
a posição social do emissor – o enunciador (professor? Pai? Superior hierárquico? Amigo?);
a posição social do receptor – o destinatário (aluno? Filho? Amigo? Subordinado?).
Fonte: adaptação de Barros (2007).
A construção do quadro foi uma atividade exaustiva, mas rendeu ótimos
resultados! Resultados estes comprovados na análise do plano textual das
resenhas Meu Malvado Favorito 2 e Planeta dos Macacos – o Confronto, que
serviu como ‘avaliação diagnóstica’. A evolução dos alunos foi tão perceptível,
ao menos a motivação era geral, que foi sugerido que escolhessem dois filmes
do corpus para uma nova produção (Frozen – uma aventura congelante e
Malévola foram os escolhidos). Perceber a importância dos títulos e subtítulos
também rendeu boas colocações. Os alunos facilmente inferiram a intenção e as
pistas deixadas pelos resenhistas quanto a esses elementos. Antecipando o
momento da produção final foi deixado livre que essa atividade se repetisse
também com Up – Altas Aventuras.
O módulo 2 (Oficina 9) deu lugar para o estudo dos recursos
argumentativos e elementos coesivos que dão maior clareza à sequência
argumentativa. O amadurecimento da turma em relação ao gênero, situando a
opinião do resenhista suscitou muita discussão entre os elementos do grupo. Foi
enriquecedor vê-los discutindo e sistematizando os conceitos/definições para os
vocábulos opinar, avaliar e criticar com auxílio do dicionário. A pesquisa deveria
ser ampliada em casa com os vocábulos argumentar e argumento buscando na
web no site <www.dicionariocriativo.com.br>.
Instalou-se na sala um debate sobre os gêneros discursivos do grupo do
argumentar. Os alunos foram alertados acerca dos riscos dos “achismos”, isso
porque ao expor uma opinião deve-se demonstrar confiabilidade naquilo que
está sendo dito com bases em argumentos coerentes, ao mesmo tempo em que
desperta esta mesma confiabilidade no ouvinte/leitor. Alguns temas polêmicos
(uso de uniforme e uso do celular na escola) foram trazidos à baila e, ao fim do
debate, ficou claro que “se dou opinião, tenho que ter argumentos para sustentá-
la”, pois meu interlocutor pode acatar ou refutar o meu argumento. Por isso ao
escrever é preciso refletir antes e “não escrever qualquer coisa”. Para exercitar
‘a escrita com fins de atingir o leitor’ os alunos redigiram resenhas de Frozen –
uma aventura congelante e Meu Malvado Favorito 2 para os ‘leitores’ do 6º ano.
Uma experiência intraduzível!
Aos alunos do 6º ano nada foi explicado acerca da especificidade do
gênero, pois, segundo Kleiman (2002), “o conjunto de noções e conceitos sobre
o texto que chamaremos de conhecimento textual, faz parte do conhecimento
prévio e desempenha um papel importante na compreensão do texto”. A
compreensão leitora destes ‘alunos leitores’ serviu de termômetro para balizar
se os elementos do gênero em questão foram privilegiados pelos ‘autores’. Uma
troca muito enriquecedora, pois nas palavras de Garcez (2004), “o processo de
compreensão expande-se, extrapola-lhe as possibilidades e prolonga-lhe o
funcionamento do contato com o texto propriamente dito”.
O módulo 3 (oficinas 10, 11, 12) retomou os recursos da narratividade e
elementos coesivos abrindo o leque para aulas específicas de conteúdos
gramaticais aplicados aos textos produzidos. Notamos que muitos alunos
anotavam as regras gramaticais apresentadas sem que fosse pedido para fazê-
lo (muito interessante esta postura). Dúvidas de ortografia, concordância e
regências nominal e verbal foram sanadas. Após estas informações as resenhas
foram reescritas com muito capricho, para então serem encaminhadas para a
turma do 6º ano.
As atividades destas três oficinas foram muito produtivas, destaque aos
tempos verbais do ‘mundo’ narrado e ‘mundo comentado’, definidos por Koch
(2004). Para os objetivos propostos apenas foi esclarecido, que basicamente os
tempos são três: presente (o agora, o hoje), pretérito (o ontem, o passado) e
futuro (o amanhã); apenas isso bastou para localizarem os aspectos narrativos
dos textos.
Para fixar a retomada destes conceitos os alunos foram ‘convocados’ a
produzir um intertexto, ou seja, transformar o enredo do filme Up – Altas
Aventuras em um conto. Antes, é claro, retomou-se as fases e os elementos da
narrativa, comentando novamente sobre o gênero NARRAR. Alguns tiveram
dificuldade em produzir o conto por esquecimento e outros escreveram demais.
Enfim foi uma atividade válida, foi pedido depois para que trocassem os cadernos
para um ler o conto do outro (o leitor é o destino final do texto). Com a leitura dos
contos Lisetta (Antônio Alcântara Machado) e A cartomante (Machado de Assis)
foram aprofundados os elementos do enredo (situação inicial, conflito, clímax e
desfecho), esclarecendo assim mais uma vez que os dois últimos elementos
não podem aparecer no gênero “resenha de filme”.
Nas análises dos fragmentos de resenhas produzidas destaque foi dado
à predominância dos verbos do grupo expor/comentar (tempo presente) e
narrar (tempo pretérito). A sistematização dos casos de concordância verbal e
nominal, bem como coesão verbal e nominal, rendeu estudo exaustivo inclusive
com ajuda da internet (Qual adolescente não tem um celular na bolsa?). Os
alunos demonstraram amadurecimento e autonomia na realização das
pesquisas orientadas.
Foram alvos de pesquisa: adjetivo, locução adjetiva e oração adjetiva,
pronomes pessoais retos e oblíquos, possessivos e demonstrativos, sinônimos,
hiperônimos e hipônimos, o uso da repetição como recurso estilístico, termos
que podem ser substituídos por outros de mesmo valor semântico, numerais, a
linguagem denotativa e conotativa. Foi um sucesso a pesquisa e a percepção
dos problemas de coesão, coerência, concordância nos próprios textos. Esta
fase, que chamamos de “Treinando a criticidade”, fez jus a todo o projeto.
Antes de partir para a Produção Final (Oficina 13), com os alunos mais
atentos e autônomos retomamos o quadro com os elementos articuladores mais
comuns, usado na Oficina 11, para que eles se sentissem mais seguros na
refacção dos seus textos.
Quadro 6 – Elementos articuladores
USO EXPRESSÕES
Tomar posição Do meu ponto de vista; em minha opinião;
pensamos que; pessoalmente acho
Indicar certeza Sem dúvida; está claro que; com certeza; é
indiscutível
Indicar probabilidade Provavelmente; me parece que;ao que tudo
indica; é possível que
Indicar causa e/ou
consequência
Porque; pois; então; logo; consequentemente
Acrescentar argumentos Além disso; também; ademais
Indicar restrição (oposição) Mas; porém; todavia; contudo; entretanto; apesar
de; não obstante
Organizar argumentos Inicialmente; primeiramente; em segundo lugar;
por um lado; por outro lado
Preparar conclusão Assim; por fim; finalmente; portanto; enfim.
Fonte: Pontos de Vista, Caderno virtual do professor, Olimpíada de Língua Portuguesa. p.115, 2014. Disponível em: <https://www.escrevendoofuturo.org.br/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=18&Itemid=8>. Acesso em: 25 nov. 2014.
Para a refacção dos textos muitas resenhas acerca do filme Up – Altas
Aventuras foram disponibilizadas para leitura e confrontação das críticas nelas
presentes. A seguir foram entregues as resenhas por eles produzidas. Foi uma
verdadeira surpresa! As falas dos alunos foram permeadas com expressões:
“Nossa, quantas falhas”! “Não gostei do título”! “Quantos erros de concordância
e de coesão”! “Me deixa refazer isso”! “Professora, cadê a ficha técnica”? “Faltou
muita coisa”! “Posso mudar de opinião”? A reestruturação de alguns fragmentos
que apresentavam ‘problemas’, e análise de outros muito bons serviu de suporte
para a refacção propriamente dita (Oficina 13). Para tanto foi utilizada uma lista
de constatações adaptada de Barros (2008).
Momentos de extrema riqueza (descritos na seção dos resultados) foram
vivenciados na revisão e edição das resenhas (digitalizadas pelos próprios
alunos no laboratório de informática (Oficina 14). A materialidade do texto digital
e depois na forma impressa conferiu ao próprio texto, ao autor e leitor um novo
status, deixando de ser mero objeto de avaliação do professor para objeto de
apreciação pelo coletivo da escola (Oficina 15). Os limites da leitura
ultrapassaram as superfícies do texto, pois para cada aluno, o seu texto era o
produto de processo de facção, análise e refacção, situado em um contexto de
produção marcado pela interação com as especificidades de um gênero.
4.1 Análise das produções de resenhas de dois alunos
Na Produção Inicial, o aluno 1 (Anexo 2 – Figura 7) demonstrou
conhecimento prévio do gênero resenha de filmes, apresentou informações
pertinentes de sua ficha técnica, diretor e gastos com filmes que, provavelmente
observou na leitura de outros textos do gênero. Título criativo, diferentemente de
outros alunos que usaram o nome do filme como título. Na sinopse mostrou
certo domínio na escrita, com alguns erros ortográficos, porém utilizou
marcadores de coesão. Na crítica usou a primeira pessoa demonstrando noção
de argumentatividade.
Na Produção Final o aluno 1 (Anexo 2 – Figura 8) demonstra ter
aprimorado o conhecimento sobre resenha de filmes após as oficinas da SD. Há
uma mudança significativa no título, pois o aluno acrescenta um subtítulo muito
criativo. Ele apresenta curiosidades sobre filme atual do mesmo diretor de Up –
Altas Aventuras, acrescentando os nomes dos atores conforme apresenta as
personagens ao longo da sinopse. Seu texto apresenta coesão com pronomes,
substantivos e adjetivo; faz retomadas lexicais com propriedade e elementos
articuladores na frase e entre os parágrafos (mas, porém, todavia, entretanto,
diante disso, quando, apesar de). Demonstra coerência nas ideias apresentadas.
No final traz o investimento do filme, compara-o com outras animações da
Disney, apresenta uma crítica coerente e coesa.
Na Produção Inicial, o aluno 2 (Anexo 3 – Figura 9), de forma mais
simplificada, por meio das leituras de outros textos do gênero, demonstra certo
conhecimento; traz um título que reaproveita na sua produção final; usa a ficha
técnica de pesquisa anterior. Na sinopse apresenta alguns erros ortográficos e
de coesão. Apresenta uma crítica simples com alguns problemas de coesão
verbal, porém demonstra ter compreendido a estrutura do gênero.
Na Produção Final, o aluno 2 (Anexo 3 – Figura 10) também demonstra
ter assimilado melhor o gênero depois das oficinas da SD. Apesar de o título ser
o mesmo, seu subtítulo é muito criativo e interessante. Já na ficha técnica traz
os investimentos com o filme, inclui curiosidades sobre o diretor e público
brasileiro nos cinemas. Acrescenta outras informações à sinopse e à crítica, de
modo a melhorar seu texto e deixá-lo mais interessante; faz retomadas simples
com pronomes e substantivos, repete alguns elementos articuladores, faz uso
de poucos recursos de coesão nominal e apresenta ao final um problema de
coesão verbal.
Percebemos que em relação às capacidades de linguagem o aluno 1
consegue avançar de modo eficaz na produção das resenhas. O aluno 2
também consegue realizar a produção inicial de modo satisfatório. Em relação
às capacidades de ação é visível nas duas produções finais os ajustes feitos
pelos mesmos e a adequação do texto às situações de produção: o uso de
organizadores textuais, o grau de formalidade exigido pelo gênero, um emissor
que faz uma crítica construtiva, com títulos e subtítulos satisfatórios.
Os dois textos que servem para análise conseguem se enquadrar no
plano textual global que foi trabalhado durante o desenvolvimento da SD e estão
de acordo com o grau de desenvolvimento de cada aluno. Os dois textos
exploram o teor argumentativo, apresentam ao final uma crítica melhor
elaborada (aluno 1), outra de forma mais simples (aluno 2); porém demonstrando
sem dúvida, o conhecimento que adquiriram ao longo das oficinas. Com isso
acreditamos na possibilidade que esse procedimento metodológico: a sequência
didática e a lista de constatação/controle do gênero utilizadas foram realmente
eficazes para a construção do conhecimento sobre o gênero “resenha de filmes”.
5 Considerações finais
Em linhas gerais, o Interacionismo Sociodiscursivo toma a linguagem
como um fenômeno social e histórico, um lugar de interação e defende que o
texto é a unidade concreta da comunicação e, o gênero, o megainstrumento
(SCHNEUWLY; DOLZ, 2004) de toda interação interpessoal. Tal assertiva
poderia parecer óbvia para muitos professores de Língua Portuguesa e
desprovida de um apelo para ser posta em prática, comprovando sua eficácia,
isso porque, durante o processo de formação continuada de profissionais da
educação, professores em especial, é comum vê-los ‘rejeitar’ alguns conceitos
por julgá-los como ‘modismos’, ou ainda, como práticas por eles já
experimentadas.
No entanto, com o aprofundamento teórico desta vertente – ISD – no viés
investigativo e metodológico da sequência didática (e o gênero resenha de filmes
como prática de linguagem), comprovada está a legitimidade desta vertente
teórica, e metodológica, como instrumentos de ensino, de aprendizagem e de
avaliação, bem como definidora de caminhos para a apropriação contextualizada
de aspectos estruturais da língua pátria, sem a ‘gramatização’ da qual muitos
não conseguem se libertar.
Com a aplicação da SD em uma turma de 9º ano confirmamos as palavras
de Barros (2014), subsidiada pelo ISD, quando diz que “sequência de módulos
de ensino, organizadas conjuntamente para melhorarem uma determinada
prática de linguagem”, neste trabalho a resenha de filmes, “tem como objetivo
buscar “confrontar” os alunos com práticas de linguagem historicamente
construídas” e neste confronto “os gêneros textuais oferecem a possibilidade de
reconstruí-las e delas se apropriarem” [...] Ela é a finalidade primeira da
modalização didática dos gêneros textual (BARROS, 2014, p. 46).
No entanto, para que tal objetivo seja legítimo e aplicado em situações
vindouras, lembramos que as atividades da SD7 devem ser criteriosamente
selecionadas, adaptadas ao universo do público alvo, de forma a possibilitar o
mapeamento das dificuldades explicitadas na primeira versão (marcas
enunciativas, dos tempos verbais que determinam o gênero posto em
aprendizagem), uma vez que esta primeira versão será o instrumento por meio
do qual se realizará o ‘texto definitivo’.
Neste sentido o processo de maturação dos 29 alunos ao longo do contato
com as 15 oficinas e um grande número de atividades criteriosamente
preparadas foi notório e apontou para a eficiência cinco condições para que uma
SD possa ser considerada “um dispositivo didático para o ensino-aprendizagem
da produção textual”, quais sejam: partir de um projeto (situação de
comunicação); contar com uma produção inicial; prever atividades que se
proponham a ensinar (os módulos); contemplar dimensões linguísticas e
discursivas nessas atividades; prever uma produção final que integre as
aprendizagens e que conte com uma “grade de controle”, um roteiro de
autoavaliação que permita ao aluno revisar e editar seu texto (ferramenta externa
que pode contribuir com a internalização de procedimentos de revisão e edição
de texto), segundo Dolz (apud BARBOSA; ROVAI, 2012 p.43).
7 Todas as atividades poderão ser acessadas no Portal da Educação Dia a Dia educação (www.diaadia.pr.gov.br) pois fazem parte do acervo do Programa de Desenvolvimento da Educação – PDE – do Estado do Paraná.
Além do envolvimento dos alunos na realização das atividades
propostas, bem como os diversos ‘sinais‘ de apropriação de conceitos (destaque
às atividades que envolveram pesquisa prévia e composição do BN) a reescrita
dos textos foi o ‘termômetro que confirmaram as palavras de Dolz, Noverraz,
Schneuwly (2004), quando salientam que os processos de reescrita nessa etapa
são importantes, visto que “o texto permanece provisório enquanto estiver
submetido ao trabalho de reescrita. [...] O aluno deve aprender que escrever é
(também) reescrever”. Mesmo depois do processo de refacção alguns alunos
alegaram que o texto poderia ser melhorado, isso porque nos limites prescritos
pelo ISD o ato de produzir um texto implica sempre no ato da revisão, da
reescrita, que pode ser feita de forma individual, coletivamente, em pares.
Embora Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004) não concebam os processos
de reescrita como uma fase distinta na produção final, Barros (2014, p 47)
“evidencia a revisão/reescrita textual como uma fase distinta, mas não
condicionada a uma ordem linear, ou seja, uma fase que pode acontecer a
qualquer momento da SD dependendo das especificidades de cada contexto de
intervenção”. Essa última etapa também permite ao professor concluir o
processo da avaliação formativa.
Outro aspecto que merece ser considerado é o caráter coletivo que se
estabeleceu pelas interações em sala, fato este já descrito também por Barros
(2014, p. 46), ao afirmar que O ISD configura-se como um projeto de
comunicação coletivo, concretizado no desenvolvimento do procedimento da
sequência didática (SD), a partir do qual uma turma de aprendizes deve trabalhar
sistematicamente para a resolução de um problema de comunicação (de
preferência real ou ficcionalizado pela ação didática).
Inquestionavelmente “a mudança e a promoção dos alunos a uma
melhor maestria dos gêneros e das situações de comunicação” (SCHNEUWLY;
DOLZ, 2004, p. 53). Isto posto, a SD serve, a nosso ver, a dois propósitos claros:
dar direcionamento à ação do professor (ensino) e à ação do aluno
(aprendizagem) que, se bem conduzido pela ação planejada do professor,
poderá analisar seus avanços no processo, tornando-se ‘autodidata’ pela revisão
analítica de sua produção inicial comparativamente à produção final num
exercício ininterrupto de reescrita e refacção.
Registre-se ainda que a ‘redescoberta’ do “conteúdo temático, interlocutor,
intencionalidade do texto, argumentos do texto, contexto de produção,
intertextualidade, discurso ideológico presente no texto, vozes sociais presentes
no texto, elementos composicionais do gênero” (MARCUSCHI apud PARANÁ,
2008), suscitou momentos de reflexão da prática docente/discente desviando-
se dos riscos de uma ação educativa fragmentada, desarticulada e
descontextualizada, o que de certa forma também já fora anunciado por Baltar
et al. (2006) “é possível postular que o conhecimento e a apropriação dos
gêneros textuais que circulam na sociedade é condição basilar para o
desenvolvimento da competência discursiva dos usuários de uma língua” nas
diferentes interações sociais.
Machado (1998) já alertava para a falta de construção de conhecimento
científico sobre inúmeros gêneros que se pretendem ensinar na escola o que
pode fazer com que seu ensino fique submetido ao senso comum e à ideologia.
Nessa mesma direção, Gregolin (2001) já antevia o risco no qual incorre
professores que não relacionam as dificuldades que os alunos têm em produzir
e interpretar textos com a não competência docente em trabalhar com os
diferentes textos dos diferentes gêneros, então se sentem expostos quando seus
alunos são submetidos às avaliações institucionais.
Queremos crer que, a médio e longo prazo, os dados destas avaliações,
amplamente divulgadas pela mídia, que apontam para a ineficácia do ensino,
possam ser revertidos porque o status de aprendizes da língua passará para
analistas de fatos da língua enquanto usuários, pois infelizmente o modo como
alunos têm sido ensinados os levam a comportarem-se como ‘estrangeiros em
sua pátria’.
Ressaltamos que, embora os resultados do presente estudo devem-se à
escolha do gênero resenha de filmes, e a magia que emana no universo
imagético, apostamos que a SD seja igualmente eficaz com diferentes gêneros,
não só aqueles em que a criticidade argumentativa estejam presentes.
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ANEXOS
ANEXO 1 – Fotos da implementação do projeto
Anexo 1A: Alunos lendo e analisando as resenhas.
Anexo 1B: Apresentação das resenhas do corpus.
Anexo 1C: Digitalização das resenhas produzidas no laboratório de informática.
Anexo 1D: Preparo da apresentação para a comunidade escolar.
Anexo 1E: Montagem da casinha do Sr. Carl Frederiksen.
Anexo 1F: Projeção no salão da escola do filme Up-Altas Aventuras.
ANEXO 2 – Produção inicial
Anexo 2A: Texto produzido e digitalizado do aluno 1.
Anexo 2B: Texto produzido e digitalizado do aluno 2.
ANEXO 3 – Produção final
Anexo 3A: Texto produzido e digitalizado do aluno 1.
Anexo 3B: Texto produzido e digitalizado do aluno 2.