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1 Orçamentos Participativos: potencialidades, limites e principais dilemas dessa invenção democrática contemporânea. Luciano Fedozzi * Introdução O tema da participação na instância local de governo vem ocupando lugar de destaque na agenda política mundial nos últimos quinze anos. A ampliação da importância desse tema ocorre no contexto histórico de profundas mudanças socioeconômicas, políticas e culturais que impactaram diversas dimensões da vida social, tanto nos países capitalistas centrais, como na periferia do sistema. A transnacionalização da economia e os efeitos produzidos pelo uso exclusivamente instrumental e mercantil das inovações tecnológicas modificaram as bases materiais e sociais até então assentadas na produção industrial fordista-taylorista e no modelo social, político e cultural que conformaram parcela significativa dos Estados capitalistas no pós-guerra. Os efeitos desse período de transição à época contemporânea não se restringem às estruturas de produção e de consumo. Eles também são sentidos nas relações sociais e nos modos de vida das populações. Estabilidade, especialização profissional única e previsibilidade das condições de vida e de trabalho cederam lugar à precariedade, à fragmentação, à informalidade e à vulnerabilidade, tornando o cotidiano uma experiência marcada pelas sensações de velocidade, de efemeridade dos eventos e insegurança (Beck, 2006; Subirats, 2005). Como se sabe, esse quadro de transformações produziu novas formas de desigualdade social em países do chamado “primeiro mundo” e agravou antigas situações de exclusão dos países que não lograram construir a noção igualitária da cidadania. A quebra de vínculos de reciprocidade e de confiança, inclusive no âmbito das instituições de socialização primária, vem gerando barreiras para a construção de projetos coletivos e para a gestação de energias utópicas necessárias à criatividade social transformadora. A fragmentação das formas de vida que se expressa na segregação social, na precarização do trabalho, no individualismo exacerbado (forma naturalizada de ascensão social), na exclusão do acesso aos bens materiais e culturais necessários à dignidade humana, assim como no recrudecimento do confronto entre tradições culturais e étnicas heterogêneas e na destruição ambiental, abalaram a noção de cidadania como pertencimento a um mundo comum, que permite o “direito a ter direitos” no dizer de Arendt (1990). Esse conjunto de transformações que acompanharam o ideário neoliberal a partir dos anos 80 – em verdade uma reação histórica ao conjunto de direitos que efetivou o conteúdo da cidadania moderna (Hirschman, 1990) 1 -, também impactou as formas de * Doutor em Sociologia e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Coordenador do Gabinete de Planejamento da Prefeitura Municipal de Porto Alegre na gestão que implantou o Orçamento Participativo (1989- 1992). Autor de quatro livros sobre o Orçamento Participativo de Porto Alegre. 1 Os direitos civis, políticos e sociais constituíram a noção básica de cidadania moderna, configurando-a como um novo status substancialmente enriquecido de direitos que visam à igualdade humana básica. Esta igualdade é indefinida em seu conteúdo e extensão, porque historicamente construída (Marshall, 1990). Conforme Hirschman (1989), a cada uma das três etapas correspondeu historicamente uma tese reacionária.

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Por: Luciano Fedozzi

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Orçamentos Participativos: potencialidades, limites e principais dilemas dessa invenção democrática contemporânea.

Luciano Fedozzi*

Introdução

O tema da participação na instância local de governo vem ocupando lugar de destaque na agenda política mundial nos últimos quinze anos. A ampliação da importância desse tema ocorre no contexto histórico de profundas mudanças socioeconômicas, políticas e culturais que impactaram diversas dimensões da vida social, tanto nos países capitalistas centrais, como na periferia do sistema. A transnacionalização da economia e os efeitos produzidos pelo uso exclusivamente instrumental e mercantil das inovações tecnológicas modificaram as bases materiais e sociais até então assentadas na produção industrial fordista-taylorista e no modelo social, político e cultural que conformaram parcela significativa dos Estados capitalistas no pós-guerra. Os efeitos desse período de transição à época contemporânea não se restringem às estruturas de produção e de consumo. Eles também são sentidos nas relações sociais e nos modos de vida das populações. Estabilidade, especialização profissional única e previsibilidade das condições de vida e de trabalho cederam lugar à precariedade, à fragmentação, à informalidade e à vulnerabilidade, tornando o cotidiano uma experiência marcada pelas sensações de velocidade, de efemeridade dos eventos e insegurança (Beck, 2006; Subirats, 2005). Como se sabe, esse quadro de transformações produziu novas formas de desigualdade social em países do chamado “primeiro mundo” e agravou antigas situações de exclusão dos países que não lograram construir a noção igualitária da cidadania. A quebra de vínculos de reciprocidade e de confiança, inclusive no âmbito das instituições de socialização primária, vem gerando barreiras para a construção de projetos coletivos e para a gestação de energias utópicas necessárias à criatividade social transformadora. A fragmentação das formas de vida que se expressa na segregação social, na precarização do trabalho, no individualismo exacerbado (forma naturalizada de ascensão social), na exclusão do acesso aos bens materiais e culturais necessários à dignidade humana, assim como no recrudecimento do confronto entre tradições culturais e étnicas heterogêneas e na destruição ambiental, abalaram a noção de cidadania como pertencimento a um mundo comum, que permite o “direito a ter direitos” no dizer de Arendt (1990). Esse conjunto de transformações que acompanharam o ideário neoliberal a partir dos anos 80 – em verdade uma reação histórica ao conjunto de direitos que efetivou o conteúdo da cidadania moderna (Hirschman, 1990)1 -, também impactou as formas de * Doutor em Sociologia e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Coordenador do Gabinete de Planejamento da Prefeitura Municipal de Porto Alegre na gestão que implantou o Orçamento Participativo (1989-1992). Autor de quatro livros sobre o Orçamento Participativo de Porto Alegre. 1 Os direitos civis, políticos e sociais constituíram a noção básica de cidadania moderna, configurando-a como um novo status substancialmente enriquecido de direitos que visam à igualdade humana básica. Esta igualdade é indefinida em seu conteúdo e extensão, porque historicamente construída (Marshall, 1990). Conforme Hirschman (1989), a cada uma das três etapas correspondeu historicamente uma tese reacionária.

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legitimação das instituições democráticas. À terceira “onda democrática” (Huntington, 1991)2 sucedeu um novo paradoxo para a democracia representativa como estrutura básica do Estado moderno: por um lado, a crescente ampliação de sua adoção como regime político liberal no mundo; por outro lado, perda de qualidade e crise de legitimação. A crescente perda da capacidade popular de influenciar as decisões de governo, apesar das formalidades democráticas, em detrimento do peso cada vez maior das corporações privadas transnacionais e do monopólio midiático da legitimidade da informação, é uma das causa do crescente déficit de legitimidade da democracia contemporânea. A noção de autonomia como auto-legislação e soberania popular, prometida pela modernidade, é cada vez mais distante da prática democrática. Reinventar formas de democracia deliberativa caracterizadas pelo uso público da razão dialógica (ponto comum às diversas teorias democráticas de caráter republicano-radical ou mesmo liberal, que vêem adotando esse conceito desde os anos 90, a exemplo de Habermas (1995, 1997), Benhabib (1992), Elster (1998) e Rawls (1996), para se contrapor à noção minimalista da democracia vista como “agregação de interesses privados”, é tarefa de extrema dificuldade no contexto atual de descrença na própria atividade política como meio de transformação e instância privilegiada para a emancipação social. Sabe-se que a supressão de direitos sociais, advinda da revanche neoliberal, tende à restrição dos direitos civis e políticos, e, conseqüentemente, à restrição da própria democracia, pois foi através da conquista do direito à participação política que se ergueram as bases igualitárias da noção de cidadania (Bobbio, 1986). A apatia popular – apontada pelos clássicos da polis antiga como um dos mais poderosos inimigos da res publica (a idéia de que a “coisa pública” ou o Estado é de todos que fazem parte da polis e que por isso dela devem participar ativamente), assim como as novas formas de intransparência (paradoxal ao volume de “informações” na contemporaneidade) são causas e efeitos do déficit da democracia atual. O enfraquecimento das energias utópicas na forma concebida pela modernidade desde o século XIX é parte desse cenário, mas certamente a história não acabou. Tornou-se mais complexa e renitente aos pensamentos lineares e deterministas, impondo desafios inéditos de reinvenção dos horizontes emancipatórios. É nessa etapa de retrocessos, mas, também, de resistências, que vêm emergindo e se ampliando no mundo experiências inovadoras de democracia participativa, especialmente em nível local. A participação tornou-se, hoje, palavra quase banalizada e se apresenta com significados e estratégias distintas de atores diversificados, tais como o Banco Mundial e organizações revolucionárias marxistas e trotkystas. As experiências de democracia participativa na gestão pública local vêm ocorrendo nos marcos do Estado Democrático de Direito e, em geral, vinculadas à descentralização político-administrativa (também incentivada por organismos internacionais), apresentando-se em arranjos institucionais diferenciados quanto à divisão real do poder entre Estado e atores da sociedade civil. É nesse contexto que surgiram os Orçamentos Participativos (doravante OP´s), como forma alternativa de democracia participativa em nível local. O efeito-demonstração 2 Segundo Huntington (1991), o processo de democratização do Estado moderno pode ser dividido em três momentos históricos (denominado de “ondas”) para expressar a expansão do número de países que adotaram o regime democrátrico-liberal: a primeira onda teria ocorrido no século XIX; a segunda, após a Segunda Guerra Mundial, e a terceira, teria iniciado na década de 1970, prolongando-se até o final dos anos 80.

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causado pela experiência paradigmática de Porto Alegre, que perdura há vinte anos (iniciada em 1989) pela Frente Popular, aliança entre o PT e o PCB, e desde 2005, sob o comando de outros partidos - PPS-PTB)3 contribuiu para a disseminação dessa inovação ainda que por vezes na forma da replicação mitificada desse modelo. No Brasil, o número de cidades passou de 10, entre 1989 a 1992, para 30, entre 1993 e 1996, e cerca de 140, entre 1997 e 2000 (FNPP e Ribeiro e Grazia. Vozes, 2003)4. Estima-se que hoje sejam mais de 200 os municípios (de porte pequeno, médio e grande), em contextos rurais e urbanos5 que praticam alguma forma autodenominada de OP´s. O crescimento do discurso participacionista nas eleições municipais de 2004 e a valorização dos OP´s pelas agências multilaterais de financiamento, como o BID e o Banco Mundial (que vêm os OP´s fundamentalmente como forma de controle sobre os gastos públicos), além da posição favorável de órgãos ligados à ONU e à União Européia, ampliou o leque de partidos que passaram a defender a idéia da participação no orçamento. É evidente que os casos existentes (e que deixaram de existir) expressam a heterogeneidade de objetivos, formas, conteúdos e resultados. A partir dos anos 1990 a expansão dos autodenominados OP´s vem ocorrendo em praticamente todos os continentes. Não há dados empíricos sobre o número total de casos hoje no mundo. A maior parte deles ocorre na América Latina e, em número crescente na Europa, na África e Ásia, além do Canadá (cerca de 40 experiências, em especial, na Espanha e na Itália, seguidas pela França e Alemanha) (Rede 9 URB-AL, Porto Alegre, 2006; Allegretti y Herzberg , 2004; Fernández y Fortes, 2008; Sintomer, HERZBERG, RÖCKE, 2008). Assim como na América Latina, são casos muito distintos entre si. Além disso, apesar da existência de práticas mais aprofundadas em território Europeu, como Sevilla, estudos pioneiros sobre a implantação de OP´s na Europa revelam que em alguns países eles vêm sendo adotados, dentre outras razões, não para democratizar a democracia ou promover eqüidade, mas, sim, para implementar ajustes fiscais e diminução do papel do Estado (SINTOMER, Y.; HERZBERG, C.; RÖCKE, 2008). Embora não seja desejável definir o “que é o OP”, entende-se que é possível e necessário avaliar a qualidade desses processos, inclusive porque pesquisas demonstram que vários casos se caracterizam por serem simulacros de participação. Por isso, partindo-se do pressuposto da inexistência de um “modelo” a ser replicado, o presente artigo objetiva refletir sobre alguns parâmetros avaliativos atinentes às condições favorecedoras ou limitadoras da construção de OP´s (resumidamente contidas no Anexo 1), bem como suas potencialidades, riscos e dilemas contidos nessa invenção democrática contemporânea. Tais parâmetros serão apresentados e

3 O prefeito José Fogaça, reeleito em 2008, saiu do PPS e retornou ao PMDB, que passou a dirigir a Administração Municipal em aliança com outros 11 partidos. 4 Embora na primeira fase de criação os autodenominados OP's ocorreram basicamente em administrações do PT, é importante ressaltar que nem todas administrações ou a maioria delas governadas por esse partido (hoje, em torno de 200 municípios) o adotam como sistemática de gestão. Em segundo lugar, cerca de 50% do total de casos (104), no período pesquisado (1997-2000), ocorreram em governos de siglas partidárias de matiz ideológico distinto (FNPP e Ribeiro e Grazia, 2003, p. 39) 5 O Brasil possui 5.507 municípios (Censo IBGE, 2000)

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discutidos a partir de perguntas-chave, pois se entende que elas ensejam múltiplas possibilidades de respostas sobre a prática e a teoria dos autodenominados OP´s. 1. Que lugar a participação ocupa no sistema decisório da gestão local ? Uma das questões válidas para análise dos processos de participação em curso diz respeito ao lugar que ela ocupa no sistema decisório local, se periférico ou nuclear. É nesse sentido que o surgimento dos chamados OP´s tornou-se particularmente importante, por tratar das possibilidades de intervenção popular no principal instrumento de gestão do Estado moderno, que é o orçamento público. O orçamento sintetiza, em grande parte, o moderno contrato social, pois regula os direitos e os deveres que nascem da reciprocidade entre governantes e governados e das relações entre os poderes representativos do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário). Por isso, o orçamento representa parcela significativa de como se dá a produção do fundo público (política de receitas) e de onde ele provém, e de que forma esse produto social é distribuído ou apropriado pelos atores na sociedade (perfil das despesas). Por essas razões o orçamento é considerado o núcleo duro do planejamento governamental e se insere no campo das chamadas decisões políticas fundamentais da gestão sócio-estatal. Dar transparência a essa “caixa preta” e promover a incidência popular no destino dos recursos públicos adquire, por isso, alta relevância democrática. Do ponto de vista do conteúdo, os OP´s podem constrarrestar o processo de espoliação urbana6 e promover condições para o acesso universal à cidade. Não obstante, a discussão do orçamento não esgota o leque das decisões importantes que afetam a vida social, em nível local, regional ou nacional, e sua compatibilização com outras políticas tem se mostrado desafio difícil de ser compreendido e, sobretudo, praticado7. O objetivo de transformar realmente o modelo de gestão tradicional do Estado, por parte daqueles que querem construir o OP como forma de democratização da gestão sócio-estatal e de promoção da cidadania ativa, exige uma série de iniciativas e de rupturas a fim de abrir a Administração Municipal, tornando-a transparente e permeável à intervenção popular. Mas essa difícil tarefa, em geral proporcional às complexidades advindas da escala demográfica, bem como do tipo de estrutura administrativa historicamente construída (níveis de verticalização e de pessoalização), incluindo-se as capacidades tecnológicas de gestão e a cultura do corpo técnico-burocrático (se mais ou menos aberta a inovações), além do nível de sustentabilidade financeira, requer a resolução positiva de certos dilemas na gestão participativa, a exemplo da mediação entre o componente técnico e o componente participativo, e a articulação satisfatória entre eficiência e democracia, como atributos da boa governabilidade democrática. 6 A noção de espoliação urbana decorre da constatação de que a industrialização e a urbanização periféricas ao capitalismo avançado fazem nascer amplas necessidades coletivas de reprodução mas a intervenção do Estado é limitada para atendê-las. Os fundos públicos são prioritariamente destinados ao financiamento imediato da acumulação do capital e, quando se dirigem ao consumo coletivo, privilegiam as camadas de maior renda". No Brasil, a expansão dos núcleos favelados atingiu 78,3% dos municípios com população entre 100 e 500 mil habitantes, na década de 1990. (Ribeiro, 1994, p.273-4 In: Ribeiro e Santos Júnior, 1994). 7 Alude-se aqui, por exemplo, a relação entre OP e o conteúdo das políticas públicas setoriais (para além de obras); instrumentos urbanísticos de reforma urbana; planejamento urbano global e desenvolvimento econômico, etc.

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A primeira dimensão diz respeito às formas encontradas para o processamento técnico-político das demandas comunitárias no interior da administração pública. Ou seja, aqui não se trata somente da questão do nível real de comprometimento do conjunto dos órgãos municipais com a nova forma de gestão, mas também da real capacidade em termos gerenciais para absorver essa profunda mudança de modelo que eleva a tensão entre as dimensões técnica e política. Poder-se-ia falar aqui da clássica relação, na estratégia governamental, entre o "projeto de governo" e a "capacidade de governo" para executá-la (Matus, 1989). Em geral, a estrutura do Estado, mesmo em sua fração municipal, é fragmentada e compartimentada em suas funções, as quais - agravadas pelas naturais divergências político-ideológicas entre os dirigentes políticos - tendem à bloquear programas que exigem a integração do conjunto da administração8. Nesse sentido, uma das questões-chave na análise dos autodenominados OP´s diz respeito a qual unidade gerencial cabe coordenar o processo participativo, assim como quais são os procedimentos internos adotados para garantir o caráter intersetorial, transversal e multidisciplinar da gestão, requisitos importantes para a maior probabilidade de êxito do modelo participativo. No caso de Porto Alegre, foi necessário criar instâncias de planejamento e de relações comunitárias ligadas diretamente ao centro político do governo (Gabinete do Prefeito), com a função estratégica de processamento técnico-político das demandas e sua transformação em plano de governo. Essa reforma na estrutura político-adminitrativa exigiu a criação de instâncias horizontais de planejamento para proporcionar a coordenação entre os responsáveis por essa função de cada órgão (Fórum das Assessorias de Planejamento). Juntamente com a criação da Coordenação de Relações Comunitárias, também no Gabinete do Prefeito, o processo participativo ganhou legitimidade interna para coordenar a mudança do modelo de gestão, frente ao conflito com o corpo técnico-urbanístico, em especial da Secretaria de Planejamento Municipal até então responsável pelas funções orçamentárias e urbanísticas9. Porém, as mudanças realizadas no período inicial da construção do OP (1990-91), não avançaram posteriormente para o conjunto da gestão, no sentido da intersetorialidade e da multidisciplinaridade na elaboração e execução de projetos. Apesar de sua longevidade verifica-se permanência e até retrocesso no nível de fragmentação e de burocratização da gestão, situação que é percebida pelos integrantes do OP como entrave à participação e à eficácia das decisões tomadas, e, por isso, reiteradamente criticada por eles (Fedozzi, 2003, p.176-201). Os dados disponíveis atualmente sobre os OP's no Brasil demonstram as variações das formas encontradas para a sua gestão. Haveria uma maioria de casos (47,5%) cujas unidades responsáveis ou estiveram a cargo de organismos novos criados especificamente para essa tarefa (23,3%), ou estiveram sob coordenação de órgãos da administração com "elevado poder decisório" (24,2%). A coordenação dos OP's nos demais casos teria sido exercida por instâncias de participação reunindo governo e

8 Veja-se a análise de Tlalpan no excelente estudo comparativo com Porto Alegre (Morales, 2005, p. 242) 9 Não se defende aqui a necessidade imperativa da coordenação do processo participativo pelo Gabinete do Prefeito, mas, sim, a necessidade de obter amplo apoio interno do conjunto das Secretarias e dos órgãos municipais para efetivar a necessária abertura do poder local. Em alguns casos a coordenação realizada por secretarias situadas no mesmo nível hierárquico das demais encontra, por vezes, maiores dificuldades de viabilização prática das decisões do do OP, em especial quando o núcleo político governamental possui baixo nível de adesão ao novo modelo. Sobre os dilemas, conflitos e tensões na história de construção do OP de Porto Alegre ver Fedozzi (2000)

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população (13,6%) ou equipes destacadas pela Prefeitura para coordenar a implantação do OP (35,9%) (FNPP e Ribeiro e Grazia, 2003, p. 42) (3,3% NR). Dada a complexidade da questão e da diversidade dos contextos torna-se impossível, sem análise in loco, extrair conclusões abrangentes sobre esse tema. É possível afirmar, entretanto (frente ao caráter nuclear do orçamento e ao poder a ele associado), que nos casos onde o OP é um procedimento secundário na política governamental (expressando por vezes a vontade heróica de um grupo ou de uma determinada secretária isolada no interior da administração), as chances de implantação efetiva da participação no orçamento são diminutas, senão nulas. No Brasil, apenas 58,2% dos casos (dentre 104) iniciados nas gestões 1997-2000 completaram os quatro anos de mandato, por razões financeiras ou de ordem política (Ibidem, 2003, p. 42).

2. Qual é o poder real de decisão e o grau de controle social nos OP's? Devido ao caráter nuclear que ocupa na gestão sócio-estatal a discussão dos orçamentos públicos com os atores da sociedade civil (em especial, com os segmentos excluídos do desenvolvimento social) adquire importância central para o avanço da democracia e da inclusão social. Mas, por isso mesmo, o compartilhamento do poder de decisão com a população sobre a alocação dos recursos é desafio de difícil implementação prática, na medida que pressupõe efetiva vontade dos governantes (em especial, do mandatário maior, o Prefeito, além dos parlamentos locais), e do corpo técnico-burocrático (detentor de saber técnico e das informações) de dividir o poder. A possibilidade de construção mais ou menos exitosa dos OP's está condicionada ao grau de convicção, dos dirigentes políticos e do corpo administrativo, na participação como valor ético-político da democracia e na crença da capacidade da população em participar de escolhas complexas, como é o caso dos orçamentos10. Por isso, a questão do poder real de decisão é "prova de fogo" sobre o verdadeiro significado do adjetivo participativo contido nos autodenominados OP's. Sabe-se que há diversos níveis de participação possíveis e diversas são as experiências reais quanto à relação de co-responsabilidade entre o Governo Local e os atores da sociedade civil. A escala abaixo (Figura 1), ao estabelecer níveis hipotéticos da relação entre dirigentes das instituições e participantes, ilustra as gradações possíveis a respeito da partilha do poder. As experiências de OP´s demonstram, regra geral, que construir a relação de co-gestão - quanto à real divisão do poder sobre a alocação dos recursos públicos - é algo de difícil conquista prática. Mesmo no Brasil, onde há maior número de casos (sendo pelos menos metade dirigidos pelo PT), as práticas indicam que os OP´s constituem-se majoritariamente como “consulta” e não na forma de co-gestão (FNPP e Ribeiro e Grazia, 2003. Tabela 43, p. 86)11. Nesse sentido, o conceito de co-gestão serve mais 10 Não por outra razão as teorias elitistas da democracia (cujos expoentes maiores são Schumpeter e Weber) entendem que a o estreitamento da prática democrática é uma tendência realista das sociedades modernas, pela impossibilidade de compatibilizar “administração complexa, racionalidade e participação”. 11 Apenas 29% dos municípios indicaram que a decisão sobre os investimentos ultrapassou mais de 50% desses recursos. Menos da metade (44%) respondeu que os OP's deliberaram sobre a arrecadação, os convênios e os financiamento externos. Além disso, a participação foi restrita no momento de finalizar o Projeto de Lei Orçamentária. A grande maioria dos casos (77%) informou que essa função se deu sob responsabilidade de órgãos da Prefeitura, e não de alguma instância municipal do OP (FNPP e Ribeiro e Grazia, 2003, p. 94).

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como guia normativo para a criação e o desenvolvimento dos OP´s, pois está longe de caracterizar a priori a qualidade empírica dos autodenominados OP's hoje existentes.

Figura 1 - Escala dos graus de participação nas decisões

IINNFFOORRMMAAÇÇÃÃOO

OONNSSUULLTTAA FFAACCUULLTTAATTIIVVAA

CCOONNSSUULLTTAA OOBBRRIIGGAATTÓÓRRIIAA CCOO--GGEESSTTÃÃOO DDeelleeggaaççããoo AAUUTTOOGGEESSTTÃÃOO

Fonte: Bordenave (1986)

O caso emblemático de Porto Alegre provavelmente assim se constituiu exatamente por proporcionar certa partilha do poder de decisão sobre o destino dos recursos. Mas, por outro lado, a interpretação do OP de Porto Alegre como sistema de co-gestão diverge dos conceitos comumente utilizados por partidos, ONG´s, ou por estudos acadêmicos, que o entendem como sendo uma “esfera pública não-estatal, auto-regulamentada, e exercício de democracia direta”, ou ainda uma “estrutura autônoma do Estado e auto-regulada”, advinda de normas de funcionamento definidas pela própria comunidade, com independência seja do Executivo seja do Legislativo” (Genro, 1995, p. 11-13,; Souza, 1997, p. 255; Pont, 1997, p. 23-6). Essa abordagem – que esteve ancorada na visibilidade e no prestígio internacional angariado pelo OP - não se sustenta na realidade empírica do mesmo. Esses conceitos acima arrolados para descrever a prática de Porto Alegre contribuíram para mitificar a experiência real do OP, porquanto supõe ausência (irreal) do poder do Estado (político-administrativo), tanto na operacionalização do processo como nas decisões compartilhadas da instituição, além de superestimar a autonomia dos atores populares em relação ao Estado. Em oportunidade anterior apoiando-se no lastro teórico do conceito de esfera pública12 (Habermas, 1984, 1995), a noção de esfera pública de co-gestão foi proposta para definir a realidade empírica do OP de Porto Alegre sobre o caráter dessa instituição, que se define strictu sensu não por ser estatal, mas, também, não propriamente não-estatal (Fedozzi, 2000b, p. 71). Na realidade, a dinâmica do OP se caracteriza como forma de co-gestão porque sua estrutura de funcionamento se define por não ser estatal, mas, também, não propriamente “não-estatal”. O sistema político do OP põe em 12 O conceito de esfera pública remete a uma terceira arena societária situada entre o Estado e a sociedade civil que funciona como locus societário de geração e fundamentação do poder legítimo. Para discussão sobre a categoria esfera pública no âmbito das teorias democráticas ver Habermas (1995, 1997) e Benhabib, Seyla In: Calhoun, Craig (org.) (1992).

GGoovveerrnnoo

Participantes

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contato (a) o poder administrativo da esfera pública estatal; (b) os fluxos comunicativos gerados na esfera pública autônoma13, constituída em geral pelas associações voluntárias enraizadas no mundo da vida; (c) e as instâncias deliberativas criadas por esse contato regular e, portanto, institucionalizadas pelo funcionamento sistemático e previsível do OP (COP e os Fóruns de Delegados) A noção de co-gestão se justifica porque o OP colocou em contato permanente (a) o poder administrativo da esfera pública estatal; (b) os fluxos comunicativos gerados nas esferas públicas autônomas14, constituída pelas associações voluntárias enraizadas na sociedade civil; (c) e as instâncias deliberativas institucionalizadas pelo funcionamento sistemático e previsível da participação15 (COP e os Fóruns de Delegados) O funcionamento do OP exige a complementaridade – inerentemente tensa – entre as formas de democracia representativa (Executivo e Legislativo) e as formas de participação da população. Essas, não obstante, também requerem em sua dinâmica operacional formas de representação, que ocorrem na eleição dos conselheiros e dos delegados. Por isso, por exemplo, o conceito de “democracia direta” não descreve a totalidade da estrutura de funcionamento do OP de Porto Alegre. Tratando-se do caráter das relações entre governo local e atores da sociedade civil (como elemento co-gestivo), as experiências de OP's no Brasil e no mundo mostram a existência de grande diversidade na formatação institucional desses processos. De forma geral, se observa que as experiências se estruturam a partir de instâncias como reuniões regionais, reuniões temáticas e, em menor grau, a formação de alguma instância central de representação dos moradores e de negociação com o governo local. É grande o número de casos nos quais são realizadas reuniões presumivelmente "de base", ou ainda, Congressos, mas que não chegam a constituir alguma instância institucional permanente (tais como Conselhos do OP). Em geral são formas de participação em instâncias com frágil organicidade, de caráter esporádico e/ou concentradas em curto espaço de tempo. Cabe ressaltar, entretanto, a importância da criação de canais institucionais (adequados à realidade sócio-política, econômica, cultural e à densidade demográfica), que permitam o contato permanente e previsível do processo de gestão compartilhada, a fim de que a participação efetivamente se institucionalize em instâncias regulares de funcionamento e não se torne dependente da vontade ad hoc (conveniente ou não ao Governo Municipal), em abrir-se para o diálogo permanente e em submeter-se, ao controle social e a accountability. Ainda relacionado ao caráter co-gestivo (ou não) dos OP´s as experiências têm demonstrado que a sustentabilidade do mesmo e a conseqüente adesão popular é diretamente dependente da efetividade das decisões tomadas pela participação. Ou

13 Adota-se aqui a noção de Habermas sobre esferas públicas autônomas como aquelas “que não são criadas e mantidas pelo sistema político para fins de criação de legitimação” (Habermas, 1990). 14 Esferas públicas autônomas são aquelas “que não são criadas e mantidas pelo sistema político para fins de criação de legitimação” (Habermas, 1990), 15 Compõem a esfera pública de co-gestão do OP de Porto Alegre respectivamente: (a) as unidades administrativas voltadas especialmente para o gerenciamento e o processamento técnico-político da discussão orçamentária com os moradores, com destaque, até 2004, para o GAPLAN (Gabinete de Planejamento) e a CRC (Coordenação de Relações com a Comunidade); (b) os indivíduos e as associações voluntárias autônomas, formadas principalmente por organizações de base regional – associações de vizinhos, clube de mães e outras que articulam a participação dos moradores e a seleção das prioridades; e (c) as instâncias institucionais permanentes de deliberação, o COP (Conselho do Orçamento Participativo) e os Fóruns de Delegados das Assembléias Regionais e Temáticas.

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seja, a legitimidade dos OP´s é proporcional à circularidade objetiva entre decisão e execução das demandas. Mesmo em casos mais consolidados, se as demandas acordadas não são realizadas pelo Governo, por razões de ordem financeira (situação de Porto Alegre no primeiro ano e novamente a partir de 2002)16 ou política, ocorre descrédito da participação e frustração do processo. Duas questões importantes sobre esse item se apresentam na análise dos casos de OP´s. A primeira é a transparência sobre as finanças, pois há o risco de criar falsas expectativas quanto à capacidade de atendimento das demandas e, assim, desacreditar a participação, conforme ressaltaram diversos Prefeitos e representantes municipais em Seminário da URB-AL (Rede 9, 2006). A segunda diz respeito à importância da discussão pública sobre a política de receitas. Em geral, grande parcela da população desconhece de onde provém a receita local, tanto em relação à divisão entre as instâncias (federal, regional, local, etc.), quanto à fonte e o tipo de impostos (critérios de medição, justeza dos impostos, etc.). Os OP´s podem abrir oportunidades para a criação da consciência fiscal da população e inclusive para a diminuição da inadimplência no pagamento dos impostos quando a população percebe o retorno concreto em termos de serviços públicos. Nesse sentido, a questão das formas de controle sobre a evolução financeira e a execução física das obras e planos acordados torna-se de crucial importância, mas também de extrema dificuldade prática. Se o controle sobre a execução física das obras é menos complexo e é favorecido quando há instâncias institucionais e previsíveis de participação (em formas variadas, tais como Conselhos do OP, “comissões de obras”, prestação de contas em assembléias, comitês de vigilância, etc.), a transparência sobre as finanças (receitas e despesas), por parte dos governos, implica não só o desafio de encontrar formas adequadas, pedagógicas e acessíveis frente ao conjunto heterogêneo de participantes (considerando-se as assimetrias de capital escolar), mas também implica relações de poder, e como se sabe, o “segredo” é a alma da “razão de Estado”.

3. Quem define e como são definidas as regras da participação? A questão das regras da participação e da distribuição dos recursos constitui tema chave porque implica na definição do procedimento adotado nas formas da democracia participativa. O compartilhamento do poder de decisão com a população é desafio de difícil implementação em sua plenitude. Ele pressupõe efetiva vontade dos governantes (em especial, do mandatário maior, o Prefeito), e do corpo técnico-burocrático (detentor de saber técnico e das informações) de dividir o poder. E isso depende, é claro, do lugar que o OP ocupa no projeto político-ideológico governamental. A construção argumentativa das regras e critérios - além de oportunizar uma solução racional para o dilema sempre presente entre "recursos escassos versus demandas reprimidas" - parece ser um dos elementos de maior valor pedagógico e de aprendizagens favoráveis à construção de uma cultura democrática. A discussão sobre procedimentos permite 16 Não há espaço aqui para discutir a situação atual do OP de Porto Alegre após a derrota do PT, em 2004. Pode-se apenas mencionar que, se por um lado há continuidade da dinâmica em suas formas e estruturas, por outro lado evidencia-se um estado de fragilização do processo por razões de natureza variada, entre as quais, o baixo compromisso da atual administração – apesar do discurso de compromisso com a manutenção do OP– com a sustentação prática do mesmo. De qualquer forma a crise iniciou antes da alternância no poder, principalmente em função da crise financeira a partir de 2002, quando as prioridades escolhidas pela população passaram a não ser realizadas sem que houvesse tratamento transparente dessa situação por parte do governo do PT à época.

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exercitar aprendizagens relativas à descentração da perspectiva sócio-moral (a ultrapassagem do egocentrismo) necessária à consciência de cidadania, ao incentivar o reconhecimento do outro, o diálogo, a escuta e o respeito à diversidade, possibilitando que a legitimidade das decisões passe a depender das relações entre as demandas particulares (de cada bairro, organizações, etc) e as regras pactuadas coletivamente. Assim como a possibilidade de praticar a justiça distributiva (componente objetivo da igualdade), a oportunidade de construir um espaço comum de vivência da participação, em sua heterogeneidade, pluralidade e conflitos, é um potencial dos OP´s que podem promover ganhos de consciência e de auto-estima (elemento subjetivo da igualdade). Sabe-se, entretanto, que a mudança da consciência social é a mais difícil de ser alcançada em todas as culturas, como demonstra vasta literatura sobre o tema. Esta realidade pôde ser constatada na investigação realizada em 2002 com os participantes do OP de Porto Alegre, a qual indicou que a participação promoveu mudança de consciência social compatível com a consciência de cidadania crítica, necessária à transformação social, porém exige longo tempo de envolvimento dos sujeitos (8 anos ou mais). Além disso, a variável nível de escolaridade demonstrou-se interveniente nas aprendizagens oportunizadas. Mesmo após 8 anos de participação, 1/3 dos indivíduos apresentaram consciência social compatível à consciência de “pré-cidadania”, isto é, aquém de patamares mínimos necessários à consciência social autônoma e crítica17. Na trajetória do OP de Porto Alegre, uma das aprendizagens coletivas mais importantes, tanto para os novos governantes como para os participantes decorreu da discussão dos procedimentos a serem adotados. Nesse processo mediado por conflitos e contradições diversas inerentes às formas co-gestivas, o governo não impôs sua visão unilateral e nem simplesmente consultou a população para, finalmente, tomar sozinho as decisões finais, prática comum em modelos tradicionais que concebem a participação como adesão. Mas, também não delegou o poder instituinte das regras aos moradores, o que configuraria processo de auto-gestão (a complexidade da gestão pública, especialmente em municípios de porte médio e grande, torna idealista ou utópica a alternativa de transferência total do poder de decisão sobre o conjunto do orçamento para os participantes da sociedade civil). O Executivo adotou, sim, a produção argumentativa de consenso sobre o regramento a ser adotado. O fez, entretanto, mediante uma intervenção governamental ativa e com grande poder de iniciativa e de influência,18 embora autonomamente em relação ao Legislativo Municipal, o que se revelou como ponto de conflito entre esse Poder, o Executivo e o OP. Assim, a criação do OP foi resultante de uma trajetória sinuosa, indeterminada (com crises e contradições irredutíveis a soluções definitivas), mas, ao mesmo tempo, do encontro sinérgico entre pelo menos cinco variáveis: 1) a decidida vontade política dos novos governantes para democratizar a gestão sócio-estatal; 2) a efetividade das 17 FEDOZZI, L. O Eu e os outros: participação e transformação da consciência moral e cidadania. Porto Alegre/Rio de Janeiro: Tomo Editorial/IPPUR-UFRJ, 2008. 18 A construção do método para a distribuição dos recursos, assim como a definição da estrutura e do processo na dinâmica do OP (a regionalização, as instâncias e as formas de representação) e sua alteração em 2001, são exemplos desse modelo de co-gestão. Sobre a gênese do OP de Porto Alegre e sua trajetória tortuosa e indeterminada de construção pode ser consultada em Fedozzi (2000).

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decisões compartilhadas, consignando credibilidade à participação; 3) a eficácia na gestão político-administrativa das demandas em geral; 4) a governabilidade financeira para responder às demandas aprovadas e possibilitar a emergência de um ciclo virtuoso; e 5) a existência prévia de um tecido associativo crítico, condição fundamental que exerceu a necessária pressão “de fora para dentro do Estado”, para que “as coisas acontecessem” (Anexo I). Por outro lado, se há alguns elementos na construção do OP de Porto Alegre assemelhados à prática da democracia deliberativa, isto é, o uso público da razão com transformação das posições dos agentes, a prática tem demonstrado limites na promoção de condições igualitárias da participação entre os atores sociais. O conhecimento sobre as regras do jogo, por parte do público do OP, é dependente do maior ou menor tempo de participação, da ocupação de postos no nível hierárquico das instâncias (de cúpula ou de base) e do maior ou menor capital escolar. A relação entre maior nível de instrução formal e o maior conhecimento das regras e critérios do OP ficou evidenciada na pesquisa com os participantes em 2005: a soma das respostas dos que afirmaram conhecer "muito" e "mais ou menos" as regras do OP é de 43,8%, 58% e 70,6%, para as escolaridades, respectivamente, de 1o, 2o e de 3o Graus (ver Observando o Orçamento Participativo em wwwwww..oobbsseerrvvaappooaa..ccoomm..bbrr). Esses dados expressam as assimetrias inerentes às condições de partida dos indivíduos e dos grupos que participam dos OP´s, ponto este que merece reflexão sobre as formas (tipo de instâncias), os métodos de trabalho (funcionamento e pedagogias) utilizadas a fim de criar condições mais igualitárias para os setores com menor capital escolar, econômico e tempo. No caso de Porto Alegre, a complexa dinâmica de regramento da participação e de distribuição dos recursos no OP (cf. Regimento Interno) e a inexistência de práticas pedagógicas adequadas, tornam ainda mais difícil essa meta, implicando situação de heteronomia na relação com o processo dos setores menos escolarizados e/ou com menor tempo de participação em relação aos demais participantes e ao governo municipal, que detém vantagens no sistema.

4. Quem são os atores da participação? Quanto aos sujeitos participantes da sociedade civil nos OP´s pode-se aventar duas questões. A primeira refere-se à inclusão/exclusão de segmentos sociais, atores, grupos ou representações de classes ou camadas sociais. O segundo refere-se à própria forma da participação: se individual ou por representação de organizações sociais; ou ainda por sistema misto. De qualquer forma, pesquisas sobre OP´s indicam a tendência de êxitos maiores (em termos de qualidade e de efeitos redistributivos) quando existe, no contexto histórico anterior à criação do OP, um tecido social com tradição associativa e práticas de ação coletiva, em especial, das camadas excluídas do desenvolvimento e das decisões sobre as políticas públicas. Não obstante, a existência de tradição associativa não significa per se maior democratização. Há casos em que as próprias organizações sociais resistem à abertura da participação proporcionada pelo OP, devido à cultura da troca de favores e da influência pessoal entre lideranças comunitárias e agentes políticos (há casos no Brasil

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como Florianópolis e Gravataí, este na região metropolitana de Porto Alegre). Nesse sentido, a participação aberta a todos os indivíduos nos OP´s parece ser um critério que desestimula o monopólio da representação comunitária por organizações sociais que, por vezes, têm suas práticas marcadas por aparelhamento e mesmo pelo clientelismo (de partidos, grupos e líderes) na relação com suas bases sociais. Nesse sentido, a construção de OP´s – quando orientados para o objetivo de democratizar a democracia (em sua forma e conteúdo) - impõe duplo desafio para os principais atores do processo: o governo municipal e os agentes da sociedade civil. Ao governo cabe abrir-se à participação criando canais efetivos para tal e, ao mesmo tempo, incentivar e respeitar a autonomia das organizações sociais. Essa mudança exige uma série de rupturas em geral proporcionais às complexidades advindas da escala demográfica, do tipo de estrutura administrativa historicamente construída, e da resolução de certos dilemas inerentes à democracia participativa, a exemplo da mediação entre o conhecimento técnico (e o poder a ele associado) e o saber popular, além da articulação entre eficiência (saber fazer) e governabilidade (legitimidade). Como expressão da democracia participativa - a complementaridade inerentemente tensa entre a representação e a participação - é legítimo supor a necessidade de os governos apresentarem propostas de obras e projetos a serem incluídos nos OP´s, visando preservar a visão global da cidade ou beneficiar o patrimônio público. A questão é saber: 1) se essas propostas governamentais são transparentemente discutidas nas instâncias de participação e 2) qual a parcela de recursos que ocupam no montante total previsto no orçamento. Há variações quanto a esses procedimentos nos OP's derivadas de razões de ordem política (vontade ou não de compartilhar o poder decisório sobre o conjunto do orçamento), de ordem técnica e de ordem objetiva quanto à situação financeira. Na pesquisa com OP´s no Brasil, os dados sobre a decisão dos investimentos indicam, por um lado, um percentual majoritário de OP's cujo método de decisão ocorreu por meio da negociação de propostas frente à população (76%). Outros mostram a existência de formas que incluem recursos de decisão exclusiva do Prefeito, ou vinculados a compromissos com eleitores, ou ainda a uma quota pré-estabelecida pelo governo para a deliberação por parte da população (p. ex: 50% decicidos pelo governo e 50% pelas comunidades) (Ibidem, p. 90). Outros ainda se caracterizam pela discussão de todo o montante dos investimentos, mas sem que o governo abdique-se de propor obras e projetos de caráter global ou multi-regional. Entretanto, não é possível avaliar como ocorreram os casos de "negociação de propostas com a população". Sabe-se que algumas práticas baseiam-se na definição de critérios objetivos, impessoais e universais como método para a distribuição dos recursos nas regiões do OP. Outras preferem a prática de negociação aberta, sem critérios, em instâncias do OP, como é o caso de Campinas (SP). Já a discussão de todos os itens que compõem a peça orçamentária (receita e despesas) constitui-se como um dos maiores desafios dos OP´s. A complexidade do conjunto da peça orçamentária exige que os órgãos governamentais utilizem transparência nas análises técnicas sobre as carências, bem como o fornecimento - por meios pedagógicos adequados - de informações sobre os custos e os impactos nas políticas públicas do montante destinado à manutenção e à ampliação dos serviços, incluindo despesas com os funcionários. Caso contrário torna-se ilusório achar que a

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população tenha condições para deliberar sobre itens cuja tradução prática é menos "objetiva" (comparativamente ao item de investimentos) e de difícil avaliação qualitativa. Por sua vez, aos atores sociais da sociedade civil cabe o duplo desafio: capacitar-se para co-gerir a política orçamentária e as políticas públicas, e, ao mesmo tempo, autogestionar-se, isto é, salvaguardar a sua independência política e sua autonomia organizativa, sob pena de configurar – sob novas formas discursivas – formas veladas de tutela e de patronagem política na relação com o Estado e com o sistema político-partidário. Trata-se de um dos desafios mais complexos das experiências, ainda mais presente em sociedades com tradição de tutela estatal e de cooptação política. Sem a capacidade autônoma e de controle social dos atores populares (no seio da sociedade civil) sobre o Estado, os potenciais emancipatórios contidos nos OP´s são bloqueados. Não obstante, a capacidade de auto-gestão não depende somente do amadurecimento da consciência social para tal. Alguns casos de OP´s mais consolidados revelam que o longo tempo dedicado, por parcela dos militantes comunitários, para a sustentação do processo participativo, limita o trabalho necessário para dinamizar as organizações da sociedade civil, com prejuízos para a autônoma social e política desses atores. Em Porto Alegre, não por acaso grande parte dos participantes são de ocupações profissionais cujo maior “tempo livre” funciona como certo “capital” para a participação (autônomos, aposentados, “do lar” e desempregados somam 58,64%) (Fedozzi, 2007). A relação entre participação e respeito à heterogeneidade dos sujeitos também é desafio de suma importância. Esta questão está implicada, por um lado, com a amplitude do leque de atores (caráter pluralista), e, por outro lado, com os atores que devem ser priorizados para o acesso aos bens e serviços públicos (caráter redistributivo). Ambas as questões estão implicadas com as assimetrias, não somente de capital escolar, como já comentado, mas também em termos de gênero e de etnias. Formatos de OP´s específicos para crianças (casos de Bauru e, hoje, de Fortaleza), para a juventude (Belém), para escolas (Porto Alegre) são meios utilizados para ampliar o espectro de atores envolvidos. O OP da cidade de Rosário (Argentina), por exemplo, adotou paridade de gênero na eleição dos representantes, mas essa prática não é majoritária nas modalidades de OP´s. Além disso, em algumas cidades (a exemplo de Rosário e de Belo Horizonte), a população também escolhe prioridades orçamentárias por meio eletrônico (internet e celular). Essa mesma tentativa foi fracassada em Porto Alegre (em 2001) porque os integrantes do OP entenderam que os custos da participação se tornariam desiguais entre a participação presencial e a digital. Ocorre que a grande maioria dos integrantes não tem acesso aos meios eletrônicos e necessita despender longo tempo, às vezes anos, em reuniões, para vislumbrar o atendimento de suas demandas. A questão do tempo como recurso escasso remete à difícil resolução do dilema entre a qualidade (em situações de co-presença dos indivíduos) versus quantidade da participação. O número de participantes pode ser maior co o uso de tecnologias de informação (internet, telefone celular), mas, em geral, há uma perda da interação, das trocas, enfim, da possibilidade de aprendizagem pelo diálogo. A inclusão dos segmentos de extrema pobreza revela-se um grande desafio não suficientemente resolvido pelos OP´s, pois a luta diária pela sobrevivência limita a

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integração em processos institucionalizados e questiona modelos que se valem de formas tradicionais de sensibilização e de incentivo à participação. Esse limite se apresenta também em situações mais longevas como é o caso de Porto Alegre, ainda que o perfil dos participantes demonstre claramente o caráter inclusivo dos segmentos pobres em proporção maior do que representam no conjunto da população da cidade19. Não obstante esse caráter redistributivo da experiência de Porto Alegre (trata-se de camadas sociais que nunca tiveram voz e poder na destinação dos recursos públicos) há diferenças de oportunidades entre o público participante. Os indivíduos com menor escolaridade e menor renda perdem proporcionalmente posições na formação das instâncias hierárquicas do OP (assembléias de base, Fórum de Delegados e Conselho do Orçamento)20. Esse fato leva ao tema crucial da necessária capacitação, raramente existentes, bem como da adoção de métodos pedagogicamente adequados, em especial para o trabalho com setores de baixa escolaridade. Esse, sem dúvida, é um dos maiores limites apresentados pela longa experiência de Porto Alegre.

5. Quais são os efeitos dos OP´s? Em que pese os limites e dilemas que se apresentam aos OP´s - na medida em que ele não pode ser entendido como panacéia para resolver problemas históricos oriundos da profunda desigualdade social dos países periféricos - pode-se inferir efeitos e potenciais políticos, sociais e culturais para a democratização da sociedade, para a apromoção da justiça social e a ampliação da participação no mundo contemporâneo. A seguir serão expostos sinteticamente alguns desses principais efeitos:

5.1 - Efeitos políticos

Do ponto de vista político, a julgar pela experiência de Porto Alegre, a adoção de procedimentos compartilhados para definir regras de participação e critérios de seleção das prioridades (critérios objetivos, transparentes e impessoais) estabeleceu uma racionalidade política de acesso aos recursos públicos contrária à reprodução do modelo de gestão autoritária, patrimonialista-clientelar do Estado brasileiro. O confronto entre as demandas particulares, numa instância pública comum de co-gestão, onde faz-se necessário argumentar as demandas e as escolhas, é tendencialmente favorável à transparência e à preservação do interesse público como conteúdo da res publica. Outro fator importante - oriundo do efeito-demonstração que pode assumir a participação continuada - diz respeito à credibilidade que o OP conquistou junto à opinião pública da cidade e no contexto nacional e internacional. De fato, a legitimidade do OP, em que pese o número restrito de participantes proporcionalmente aos eleitores

19 Os que têm renda familiar até 2 salários mínimos representam 51,37% no OP, contra 26,9% na população total da cidade. Contrariamente os que possuem renda familiar de mais de 12 salários mínimos somam 3,5% no OP e 22,4% na população total da cidade (Fedozzi, 2007). 20 O grupo com escolaridade primária representa 61,3% nas assembléias de base; baixam para 49,9% entre os delegados e para 38,5% no Conselho do OP. Já o grupo com escolaridade superior representa 16% nas assembléias de base, sobe para 20,1% entre os delegados e chega a 28,2% no COP (Cidade, 1998).

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(cerca de 3% de forma direta nas assembléias anuais), ampliou-se com a continuidade administrativa e com os resultados em termos redistributivos e inclusivos. Em pesquisa realizada no ano 2000 com amostra representativa dos eleitores da cidade21, 59% dos entrevistados consideraram o OP “importante porque aumenta a participação popular”, mais de 25% também avaliaram a iniciativa positiva, “porque aumenta a eficiência do governo” (outros 9,5% consideraram o OP “demagogia” e 4,5% declararam que ele “não acrescenta nada à administração da cidade”) (respostas múltiplas) (Labors/UFRGS, 2000). Essa credibilidade do OP junto à opinião pública foi ampliada segundo recente pesquisa do Banco Mundial (2006), como pode ser visto na Figura 2. Nessa enquete, cerca de 20% dos eleitores disseram já ter participado do OP.

FIGURA 2 - Percepções públicas do OP por percentual de população (%). Porto Alegre, 2006,

Fonte: BIRD, 2008, p. 6.

A representatividade do OP também foi testada com a alternância do poder local ocorrida a partir de 2005. Após quatro gestões consecutivas, a derrota do PT, em 2004, estabeleceu um cenário inédito na trajetória do OP. O tema foi amplamente debatido durante a campanha eleitoral e o fato de a coligação vitoriosa ter sido a única entre os opositores ao PT a assumir publicamente a manutenção do OP22, considerando-o “uma conquista da cidade”, demonstra a força simbólica assumida por esta forma de democracia participativa. A continuidade das práticas participativas frente à alternância de poder é um dos fortes indicadores da eficácia dos modelos de gestão participativa em termos de resultados políticos, sociais, culturais e simbólicos. A força simbólica conquistada pelo OP junto à parcela significativa da opinião pública de Porto Alegre e também em nível nacional e internacional criou um novo patamar políico

21 Amostra com 603 eleitores por levantamento aleatório estratificado (LABORS -IFCH/UFRGS, 2000). 22 No processo eleitoral de 2004, além da posição firmada nos meios de comunicação, os candidatos José Fogaça (então de oposição ao PT) e Raul Pont (PT) compareceram em reuniões do COP e assumiram o compromisso com a manutenção do Orçamento Participativo.

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que delimita as estratégias partidárias postulantes ao governo municipal. Isso significa protagonismo das classes subalternas historicamente excluídas do jogo político no país. O fato de o OP gozar de apoio internacional, tanto no campo das esquerdas (tais como o Fórum Social Mundial) como das agências multilaterais de financiamento, tais como o Banco Mundial e o BID, além da UE e da ONU, exerce pressão positiva para sua continuidade. A globalização, nesse caso, parece jogar a favor do OP de Porto Alegre. Ressalte-se, entretanto, que essa condição de prestígio alcançada pelo OP não significa sua definitiva institucionalização. Certamente o OP não é politicamente inexorável, pelo menos na forma que assumiu historicamente. A força indutora do Estado (ou seu contrário, a omissão dos governantes) e a volumosa carência em infra-estrutura urbana e serviços (apesar da inversão de prioridades que ocorreu) determinam considerável margem de manobra para a ação governamental (por fora ou por dentro do OP) e também criam condições propícias para ações pragmáticas das comunidades em busca de soluções para suas demandas, ainda que nas formas não-democráticas do clientelismo, da troca de favores ou da influência pessoal. 5.2 - Efeitos sociais Para além da racionalização democrátca favoráveis às condições institucionais necessárias à promoção da cidadania, já comentados, o OP tem proporcionado a universalização do acesso aos bens e serviços urbanos. Essa uiversalização do direito à cidade, combate a forte tendência à espoliação urbana e à exclusão social que acompanharam o modelo de modernização conservadora do país, beneficiando, assim, camadas sociais historicamente alijadas dos processos decisórios da gestão local. Em Porto Alegre, desde seu surgimento, os setores prioritários escolhidos para os investimentos orçamentários, pela ordem (conforme a média ponderada segundo a pontuação recebida pelo critério “prioridade das regiões” da metodologia do OP) foram: 1) habitação, incluindo-se regularização fundiária; 2) pavimentação de vias; 3) saneamento básico; 4) educação e 5) saúde (Gaplan/PMPA, 2006). Em 2006, a habitação foi escolhida pela sexta vez consecutiva como primeira prioridade23. Trata-se de temas geralmente não prioritários em gestões tradicionais da democracia representativa no Brasil e que demonstram o vínculo do OP com as lutas dos movimentos sociais de bairro que o precederam no período 1979-1984. O efeito redistributivo do OP é demonstrado pela relação entre a renda das regiões e o volume de investimentos per capita (conforme os Planos de Investimentos - PI´s). “A associação é positiva entre maior pobreza (percentagem de mães com primeiro grau incompleto, percentagem de domicílios e núcleos irregulares, percentagem de habitantes com menos de quinze anos) e o montante de investimentos per capita em cada região. Espacialmente, há associação negativa entre a renda das regiões24, as obras e os investimentos, isto é, quanto maior o posto de uma região em termos de 23 Embora a regularização das ocupações e das áreas de subabitação seja de difícil resolução devido à complexidade jurídica e técnica em instâncias que, por vezes, independem do município, esse tema encontrou incompreensões e resistências na Administração Popular que perduram até os dias de hoje, pois não há uma estrutura administrativa, jurídica e políticas a altura dessa prioridade do OP (Ver artigo sobre Avaliação do OP, FEDOZZI In: VERLE e BRUNET (2002). 24 Renda nominal média em salários mínimos por chefe de família.

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renda, menor o posto que ela ocupa no número de obras por mil habitantes e em investimentos per capita” (período 1989-2000) (exceto Partenon e Humaitá-Navegantes) (Marquetti, 2002, p. 142-145)25. O potencial redistributivo dos OP´s foi atestato em recente estudo do Banco Mundial realizado no Brasil. Comparando grupo de municípios que adotaram o OP e municípios que não o fizeram em suas gestões locais, o estudo concluiu que:

“os OP´s impactaram na redução dos índices da pobreza nos municípios onde o OP foi implementado por mais de uma década. Esse impacto ocorreu apesar da redução do PIB per capita nestes governos municipais, sugerindo que o OP pode ter contribuído para um impacto redistributivo de longo prazo. Além disso, o impacto no acesso à água tratada e saneamento básico é positivo para todos os governos municipais que adotaram o OP” (BIRD, 2008, p. 10).

5.3 - Efeitos culturais e associativos

Assim como a oportunidade de praticar a justiça distributiva, o espaço comum de (con)vivência criado pelo OP - em sua heterogeneidade, pluralidade, diversidade de conflitos e de solidariedades – pode ser favorecedor de ganhos de consciência social e de auto-estima dos indivíduos e grupos socialmente excluídos (elementos subjetivos da cidadania). No caso de Porto Alegre, a descentração da perspectiva sócio-moral dos indivíduos em relação aos outros (considerando-se o conceito de justiça crescente) revela que a participação vem promovendo mudanças relativas na cultura política compatíveis com a consciência de cidadania crítica, necessária à transformação social. A construção dessa nova consciência social exige, porém, longo tempo de participação OP (8 anos ou mais). Além disso, o capital escolar mostra-se interveniente nas aprendizagens relativas à consciência de cidadania crítica. Após 8 anos de participação, 1/3 dos indivíduos apresentaram uma consciência social compatível com o estágio de “pré-cidadania”, isto é, com descentração da perspectiva sócio-moral ainda egocêntrica e, portanto, situada aquém dos patamares mínimos necessários à consciência social autônoma, crítica e transformadora (Fedozzi, 2008). Sabe-se que a mudança da consciência social é a mais difícil de ser alcançada em todas as culturas. Certamente esse é um dos maiores desafios dos OP´s. Não obstante esses limites há fortes indícios sobre aprendizagens múltiplas oportunizadas pelo OP relacionadas ao funcionamento da administração pública, à realidade sócio-urbana, à ação coletiva para definir prioridades, às competências discursivas, à noção de direitos como base da noção de cidadania. O aspecto do reconhecimento social dos indivíduos, em especial das camadas excluídas, têm sido relatado como um fator de alto valor ofertado pela interação social vivida no OP. Também pode-se indicar efeitos no tecido associativo e nas formas de ação coletiva, especialmente em algumas regiões da cidade, conforme estudos sobre este tema (Baiochi, 2001; Abers, 2000; Avritzer, 2000). Todavia, esse aspecto ainda ressente-se de base empírica suficientemente ampla e profunda capaz de sustentar com segurança quais os impactos do OP na rede associativa. Os dados históricos sobre o 25 Trata-se de estudo inédito para mensuração de efeitos redistributivos do OP. Não obstante, o fato de não abarcar os recursos previstos “para toda a cidade” e adotar como parâmetro o orçamento previsto e não o orçamento executado obriga a relativizar seus resultados e considerá-los em termos provisórios.

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associativismo dos participantes demonstram que a maioria possui algum tipo de vínculo com organizações sociais, com destaque para as Associações de Moradores, por suas atividades de caráter territorial, foco principal do OP. Mas, há tendência de diminuição do percentual da participação em entidades entre o público total do OP: o percentual caiu de 75,9%, em 1995, para 57,3%, em 2005. Além disso, tornou-se quase inexistente a presença dos Conselhos Populares, organizações autônomas surgidas no período anterior ao OP e cuja importância foi destacada na parte inicial do presente artigo. É possível que parcela do público vinculado a organizações possa estar advindo não mais do associativismo tradicional (Associação de Moradores), mas, sim, de movimentos específicos e de ONG´s, ligadas aos temas da habitação, da cultura, dos portadores de deficiência, do movimento negro, entre outros (representando 15,6%). Convém lembrar que o novo contexto internacional vem modificando o caráter de alguns segmentos associativos, ao delegar para entidades da sociedade civil funções de prestação de serviços financiados pelo Estado. Essa terceirização comunitária se apresenta especialmente na política de subsídio às creches mantidas pelas Associações de Moradores ou outros tipos de entidades assistenciais, hoje, em mais de duas centenas. Além disso, em alguns casos de administração dos recursos e bens materiais repassados para entidades sociais, há indícios de práticas de indiferenciação entre o que é “público” e o que é “privado”. Essa nova relação entre Estado e Sociedade Civil é uma realidade internacional e requer análise apurada de suas implicações quanto à autonomia das organizações sociais. Considerações finais

Os OP´s não podem ser vistos como panacéias para resolver os problemas fundamentais da democracia e da vida social contemporânea. Não obstante, possuem potenciais – não imanentes - que podem ajudar a aprofundar a democracia por meio do fortalecimento da esfera pública, do exercício da cidadania ativa, do controle social sobre o Estado e da preservação dos interesses públicos (res publica), bem como do combate à desigualdade social e da construção de consciência crítica transformadora. Efetivamente, a esfera local propicia - na vida cotidiana e na interação entre governantes e atores da sociedade civil - oportunidades de ação, de construção de habilidades e de aprendizagens coletivas e individuais que podem adquirir caráter universalizante, tanto materiais como normativos. Não obstante, contra a quimérica possibilidade real da instância local para resolver problemas estruturais do capitalismo acumulados em séculos, faz-se necessário lembrar que a participação local, assim como a descentralização, não significa per se mais democracia e/ou aumento da igualdade material e subjetiva da cidadania. Não por acaso, na disputa em torno das reformas do Estado e do conteúdo das políticas públicas, é comum o consenso entre forças progressistas e conservadoras quanto à revalorização do poder local e à descentralização do Estado, como é o caso brasileiro desde a Nova República (Mello, 1993; Ribeiro & Santos, 1994; Arretche, 1996). A análise de experiências concretas de descentralização na América Latina e no Brasil, por exemplo, revela o caráter ambíguo dessa relação entre gestão local, democracia e

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cidadania (Nunes, 1990; Cohn, 1994; Melo, 1993b; Arretche, 1996)26. Assim, a participação e a descentralização deixam de ser portadoras de fim democrático em si mesmo, uma vez que a elas correspondem relações de poder que transformam a instância local em territórios de disputa e de incerteza quanto aos reais efeitos da participação. Ela pode reproduzir formas tradicionais de dominação e de exclusão das classes subalternas ("rejuvenescidas" sob novos formatos e discursos) ou, contrariamente, pode favorecer um movimento de reforma democrática nas relações entre o Estado e as classes subalternas e excluídas na sociedade civil. Como visto, o tema da participação está em voga no discurso político atual que opera num contexto de crise de legitimação das formas de representação política. Além disso, a inclusão da recomendação da participação pelos organismos multilaterais de financiamento pode estar gerando motivações exógenas à posição real de agentes políticos, que não possuem convicção genuína sobre a dimensão ético-política da participação na gestão pública. Mas quando os OP´s são associadas à efetiva participação popular, com poder real de decisão sobre os recursos e sobre os conteúdos das políticas públicas, baseado em regras transparentes, universais e objetivas, construídas de forma compartilhada e assentadas em canais institucionais de funcionamento sistemático e permanente, podem significar a criação de novas instituições democráticas de co-gestão, favorecedoras das condições estruturais necessárias à promoção objetiva e subjetiva da cidadania ativa. Nessas situações os OP´s contém algumas potencialidades, tais como: 1) promover a participação ativa para além do Estado representativo, seja de corte liberal-minimalista ou estatista-populista; 2) inclusão ativa dos segmentos sociais sem capital político e cultural suficientes para ter voz ativa e exercer poder de decisão, em contextos urbanos ou rurais; 2) inverter prioridades na distribuição do fundo público em favor da eqüidade social 3) bloquear a privatização dos recursos que ocorre nas relações de clientela e de troca de favores entre a representação (Executivo e Legislativo) e a população, e 4) exercer o controle social sobre os governantes, fortalecendo a noção de res publica e da accountability. A análise sobre fatores importantes que intervém nas experiências de construção dos OP's mostra que as possibilidades de êxito dessa invenção democrática estão associadas, entre outras, à centralidade que esse instrumento ocupa no projeto político e na estratégia global de governo em interação com a cultura política, a tradição associativa e as estratégias dos atores da sociedade civil. Nesse sentido, apontou-se algumas situações que podem caracterizar os OP´s como esferas públicas de co-gestão, sem definir um “modelo” único. São elas: (1) a existência ou não de canais institucionais de participação sistemática e permanente para a viabilização específica do OP; (2) a existência de regras claras do jogo construídas de forma procedimental; (3) o nível de institucionalização político-administrativa, ou seja, o comprometimento político e a capacitação técnica para absorver essa nova forma de gestão; (4) o grau 26 A persistência das práticas patrimonialistas e clientelistas na gestão de Municípios de vários países da América Latina (Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia) - apesar dos processos de descentralização e "modernização" do Estado - foi apontada como conclusão da recente pesquisa realizada por um conjunto de instituições desses países. Segundo Nunes (1990), a continuidade de tais práticas deve-se, sobretudo, a peculiaridade do desenvolvimento desses países e, antes de constituírem relações atávicas, são coerentes com a dialética da inclusão/exclusão dos setores populares nos sistemas de poder vigentes. Para uma análise sobre o caráter conservador da "ideologia municipalista" na história do Brasil ver Melo (1993).

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real de poder decisório e a efetividade das decisões para a sustentabilidade do ciclo virtuoso “sensibilização-participação-discussão-decisão-execução” . Em que pese a tendência crescente de ampliação do número de municípios que desenvolvem alguma forma autodenominada de OP em diversos continentes do mundo, os dados empíricos disponíveis, embora em fase muito preliminar, permitem inferir a probabilidade de que essas inovações, centradas no orçamento, ainda se situam fragilmente incorporadas no arcabouço democrático e, provavelmente, na cultura política dos agentes sociais, dado o número significativo de casos interrompidos durante o mandato que foram iniciados, como citado na análise sobre o Brasil. Viu-se, também, que inexiste um modelo único de OP e que as condições para a construção desses processos dependem de diversos fatores conjugados entre si (sugeridos no Anexo 1). O OP não deve ser entendido como uma "tecnologia neutra de gestão" a ser transferida mecanicamente de uma realidade para outra. Se baseado essencialmente na noção de processo sócio-político, seu caráter distingue-se da concepção de "engenharia institucional" comumente presente nas concepções de reforma do Estado. Não obstante, necessita para sua efetivação, como esfera pública de co-gestão, de novo arranjo institucional capaz de mudar a lógica do Estado. O OP´s, quando modelos co-gestivos, impõem desafios aos atores da sociedade civil, em especial os que dependem da ação estatal para o aceso universal à infra-estrutura e aos serviços. Capacitar-se para co-gerir os recursos públicos e, ao mesmo tempo, para se auto-gestionar, tem se mostrado um dasafio de difícil efetivação prática frente às tendências de tutela, de cooptação e de instrumentalização pelo Estado e pelo sistema partidário (risco ainda maior em sociedades de forte tradição autoritária, clientelista e “estadolatra” ou então em sociedades onde o sistema partidário é um forte catalizador da vida que ocorre no seio da sociedade civil). Entretanto, a autonomia - seja do Estado (Executivo e Legislativo), seja do sistema partidário - e o fortalecimento dos atores sociais subalternos que constituem a sociedade civil é condição para que os OP´s se tornem oportunidades efetivas , ainda que em escala microssocial, para desenvolver o sentido emancipatório dos processos democráticos locais.

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Anexo I - Condições favorecedoras ou limitadoras para a construção de OP´s

VVAARRIIÁÁVVEEIISS

CCOONNDDIIÇÇÕÕEESS LLIIMMIITTAADDOORRAASS

CCOONNDDIIÇÇÕÕEESS FFAACCIILLIITTAADDOORRAASS

VONTADE POLÍTICA DE COMPARTILHAR

AS DECISÕES

CENTRALIZAÇÃO DAS DECISÕES:

RELAÇÕES VERTICALIZADAS Estado - Sociedade Civil

(Sujeito) (Objeto)

CO-RESPONSABILIDADE:

RELAÇÕES EM REDE = CO-GESTÃO Estado - Sociedade Civil (Sujeito) (Sujeito)

TECIDO SOCIAL COM

TRADIÇÃO ASSOCIATIVA

BAIXA ORGANIZAÇÃO E

FRAGMENTAÇÃO SOCIAL particularismo e relação de tutela

FORTALECIMENTO DO TECIDO SOCIAL E DAS REDES CÍVICAS

Pluralismo e autonomia dos atores da sociedade civil

GOVERNABILIDADE

FINANCEIRA

BAIXA CAPACIDADE DE INVERSÃO

Desestímulo à participação e quebra de vínculos de confiança

CÍRCULO VIRTUOSO

Participação e resultados materiais e subjetivos

CAPACIDADE DE GOVERNO

FRAGMENTAÇÃO DA ESTRUTURA E DAS FORMAS DE GESTÃO PÚBLICA

Ausência de integração Intra-governamental

GESTÃO INTERSETORIAL E

MULTIDISCIPLINAR Eficiência e eficácia no processamento

técnico-político das demandas e na elaboração de projetos

ABERTURA À INOVAÇÃO

INSTITUCIONAL

RIGIDEZ INSTITUCIONAL

LEGALISMO EXACERBADO Temor "perda de controle”

DEMOCRACIA: SISTEMA ABERTO

FLEXIBILIDADE E INOVAÇÃO Criatividade dos atores envolvidos

FFoonnttee:: FFeeddoozzzzii ((22000033))

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