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7/27/2019 O regime brutal da Crocia Catlica
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O regime brutal da Crocia Catlica
Pacelli e os dirigentes da secretaria de Estado estavam convencidos, assim como os
governos por toda a Europa, de que uma guerra entre a Alemanha e a Unio Sovitica
era apenas uma questo de tempo. Diante da possibilidade de a Europa cair sob o poderde Stalin, com provas abundantes da inteno sovitica de suprimir as igrejas crists, a
campanha balcnica de Mussolini, ela outubro de 1940, foi encarada por alguns
membros da Cria com um certo otimismo. Afinal, nesse contexto, a Iugoslvia era
considerada o ltimo baluarte antes da Itlia e o Mediterrneo. O fracasso de Mussolini
em derrotar os gregos, no entanto, significava que Hitler devia partir em seu socorro; e
para que ele tivesse acesso Grcia, era preciso persuadir a Iugoslvia a aderir ao Eixo.
O pacto entre Alemanha, Itlia e Iugoslvia foi assinado em Viena, em 25 de maro de
1941. Dois dias depois, um grupo de nacionalistas srvios tomou o poder em Belgrado,
aboliu a regncia e anunciou que a Iugoslvia seria aliada das democracias ocidentais.
Churchill declarou em Londres que os iugoslavos haviam recuperado sua "alma". Em
represlia, Hitler invadiu a Iugoslvia em 6 de abril, em conjunto com a ofensiva naGrcia. Bombardeou a cidade aberta de Belgrado, matando cinco mil pessoas. Quando a
Wehrmacht entrou em Zagreb, em 10 de abril, os fascistas croatas tiveram permisso
para proclamar a independncia da Crocia. No dia seguinte, a Itlia e a Hungria (outro
Estado fascista) juntaram foras a Hitler para a diviso do "bolo" iugoslavo. Em 12 de
abril, Hitler apresentou seu plano para a diviso da Iugoslvia, concedendo a Posio de
"ariana" a uma Crocia independente, com a liderana de Ante Pavelic, que aguardava
os acontecimentos, sob o patrocnio de Mussolini. O grupo de Pavelic, o Ustashe (do
verbo ustati, significando "rebelar-se"), opusera-se formao do reino eslavo
meridional da Iugoslvia, depois da Primeira Guerra Mundial. Sempre planejara atos de
sabotagem do refgio seguro da Itlia; fora Pavelic quem tramara o assassinato do rei
Alexandre, em 1934. Mussolini concedera a Pavelic o uso de centros de treinamentonuma remota ilha elia, alm de acesso Rdio Bati, para transmisses de propaganda
atravs do Adritico.
Foi esse o panorama da campanha de terror e extermnio realizada pelo Ustashe da
Crocia contra dois milhes de cristos ortodoxos srvios e uma quantidade menor de
judeus, ciganos e comunistas, entre 1941 e 1945. O processo de "limpeza tnica", antes
que esse tempo hediondo entrasse em voga, foi urna tentativa de criar urna Crocia
catlica "pura", por meio de converses foradas, deportaes e extermnio em massa.
Os atos de tortura e assassinato foram to terrveis que at mesmo os calejados soldados
alemes manifestaram seu horror. Mesmo em comparao com o recente derramamento
de sangue na Iugoslvia, na ocasio em que este livro foi escrito, a agresso de Pavelic
contra os srvios ortodoxos continua a ser um dos mais terrveis massacres civis da
Histria.
A importncia desses acontecimentos para esta narrativa baseia-se em trs
consideraes: o conhecimento das atrocidades pelo Vaticano, a omisso de Pacelli em
usar sua influncia para interferir e a cumplicidade que representou na Soluo Final
sendo planejada no Norte da Europa.
O legado histrico que sustentou a formao do NDH (Nezaviss na Drzava
Hrvatska), ou Estado Independente da Crocia, foi uma combinao de lealdade antigaao papado, com mais de 1.300 anos, e um senso de profundo ressentimento contra os
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srvios por injustias passadas e presentes. Os nacionalistas croatas acalentavam muito
rancor contra a ascendncia srvia, que os exclura de vrias profisses e da igualdade
de oportunidades na educao. Os srvios eram culpados, os croatas assim percebiam,
de favorecer a f ortodoxa, encorajar o cisma entre catlicos e sistematicamente
colonizar reas catlicas com srvios ortodoxos. Tanto srvios quanto croatas
encontravam uma equivalncia entre identidade tnica e religiosa srvio ortodoxocontra croata catlico. Ao mesmo tempo, os judeus na regio foram condenados por
causa da raa, alm de suas ligaes com o comunismo e a maonaria, e um suposto
estmulo prtica do aborto.
Pacelli endossara com entusiasmo o nacionalismo croata e confirmara a percepo da
Histria pelo Ustashe, em novembro de 1939, quando unia peregrinao nacional foi a
Roma para promover a causa de um mrtir franciscano croata, Nicola Tavelic. O primaz
croata, arcebispo. Alojzije Stepinac, representou os Peregrinos e fez um discurso para o
papa. Na resposta, Pacelli um epteto que fora aplicado aos croatas pelo papa Leo X:
"Posto avanado do cristianismo" era como se os srvios, religiosos ortodoxos de
um antigo cisma de Roma, no tivessem o direito de se intitular cristos. "A esperanade um futuro melhor parece sorrir para vocs", declarou Pacelli com unia terrvel
ironia, "um futuro em que as relaes entre a Igreja e o Estado em seu pas sero
reguladas em ao harmoniosa em benefcio de ambos(12).
As fronteiras do novo Estado abrangiam a Crocia, a Eslovnia, a Bsnia
Herzegovina e uma grande parte da Dalmcia. De uma populao de cerca de 6.700.000
habitantes, 3.300.000 eram croatas (e, portanto, catlicos), 2.200.000 srvios ortodoxos
750 mil muulmanos, 70 mil protestantes e cerca de 45 mil judeus. A existncia da
minoria germnica protestante no representava qualquer problema para a liderana do
Ustashe; tambm no, o que parece estranho, o grande enclave de muulmanos. Mas os
srvios ortodoxos se defrontaram com "solues radicais", assim como os judeus, que
foram de imediato marcados para a eliminao.
Em 25 de abril de 1941, Pavelic determinou a proibio de todas as publicaes,
particulares e pblicas, em alfabeto cirlico (usado pelos srvios ortodoxos). Em maio, a
legislao anti-semita foi promulgada, definindo os judeus em termos racistas. Eles
foram inclusive proibidos de casar com arianos. Foi iniciado o movimento para a
"arianizao" da burocracia governamental, as profisses liberais e o capital judeu. No
mesmo ms, os primeiros judeus foram deportados de Zagreb para um campo de
concentrao em Danica(13). Em junho, as escolas primrias srvias ortodoxas foram
fechadas.
Nessa situao nova e perigosa para os srvios, surgiu uma questo: se a vida se
tornava insuportvel por causa da f ortodoxa, por que no procurar a converso ao
catolicismo? Semanas depois da fundao do Estado croata, os sacerdotes catlicos
estavam acolhendo os srvios ortodoxos na Igreja catlica. Em 14 de julho de 1941, no
entanto, antecipando sua poltica de converso seletiva e o objetivo eventual de
genocdio, o ministro da Justia da Crocia determinou aos bispos da nao que "o
governo croata no tenciona aceitar dentro da Igreja catlica padres ou professores, em
suma, os intelectuais inclusive os ricos comerciantes e artesos ortodoxos, porque
normas especficas para eles sero promulgada mais tarde. Tambm no podemos
permitir que eles prejudiquem o prestgio do catolicismo"(14). O destino tcito dessessrvios ortodoxos, excludos de antemo do iminente programa de converso
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Converso forada dos srvios ortodoxos f catlica romana
Civis srvios forados a se converter ao catolicismo pela Ustae em Glina
http://2.bp.blogspot.com/-gEEjYPrBFNg/TytMbghWaJI/AAAAAAAAFCQ/ndWu-Wwuzzs/s1600/Convers%C3%A3o+for%C3%A7ada+dos+s%C3%A9rvios+ortodoxos+%C3%A0+f%C3%A9+cat%C3%B3lica+romana.jpghttp://1.bp.blogspot.com/-D4mSHLyh8gk/TytLbAdpj4I/AAAAAAAAFCI/xTyS8TPbV_Y/s1600/Civis+s%C3%A9rvios+for%C3%A7ados+a+se+converter+ao+catolicismo+pela+Usta%C5%A1e+em+Glina.jpghttp://2.bp.blogspot.com/-gEEjYPrBFNg/TytMbghWaJI/AAAAAAAAFCQ/ndWu-Wwuzzs/s1600/Convers%C3%A3o+for%C3%A7ada+dos+s%C3%A9rvios+ortodoxos+%C3%A0+f%C3%A9+cat%C3%B3lica+romana.jpg7/27/2019 O regime brutal da Crocia Catlica
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Em 14 de maio, num lugar chamado Glina, centenas de srvios foram levados a urna
igreja para assistirem a uma missa obrigatria de ao de graas pela criao do NDH.
Depois que os srvios estavam l dentro, um bando do Ustashe entrou, com faces e
machados. Pediram a todos os presentes que apresentassem o certificado de converso
ao catolicismo. Apenas dois tinham os documentos exigidos. Foram soltos. As portas
foram trancadas e os outros foram massacrados.
Quatro dias depois do massacre de Glina, Pavelic, que se intitulava Poglavnikou
Fhrer foi a Roma para assinar (por presso de Hitler) um tratado com Mussolini,
concedendo Itlia distritos e cidades croatas na costa da Dalmcia. Nessa mesma
visita, Pavelic teve uma audincia "devocionista" com Pio XII, no Vaticano. O Estado
Independente da Crocia recebeu assim o reconhecimento de fato da Santa S. O abade
Ramiro Marcone, do mosteiro beneditino de Montevergine, foi designado para legado
apostlico em Zagreh. No h provas de que Pacelli e a secretaria de Estado tivessem
conhecimento das atrocidades que j haviam comeado na Crocia na primavera de
1941. Parece evidente que o rpido reconhecimento do fato (o Vaticano evitava o
reconhecimento de novos Estados em tempo de guerra) devia-se mais posio daCrocia como um bastio contra o comunismo do que urna aceitao sua poltica
brutal. De qualquer forma, sabia-se desde o incio que Pavelic era um ditador totalitrio,
fantoche de Hitler e Mussolini, que promulgara urna srie de leis racistas e anti-semitas,
e que se empenhava na converso compulsria de ortodoxos ao cristianismo catlico.
Acima de tudo, Pacelli tinha noo de que o novo Estado era como disse Jonathan
Steinberg, "no o resultado de um heroico levante do povo de Deus, mas uma
decorrncia da interveno externa". O Estado Independente da Crocia, como o
mundo inteiro sabia resultara da violenta e ilegtima invaso e anexao do reino da
Iugoslvia (que mantinha relaes diplomticas com o Vaticano) por Hitler e Mussolini;
e agora Pacelli apertava a mo de Pavelic, concedia-lhe a bno papal.
Demoraria algum tempo para que a Santa S soubesse das atrocidades. Mas os
detalhes do massacre dos srvios e da virtual eliminao dos judeus e dos ciganos eram
conhecidos desde o inicio pelo clero e pelo episcopado catlico croata. Na verdade, o
Clero muitas vezes teve uma participao destacada(17).
A contagem final quase desafia a credibilidade. Pelos clculos confiveis mais
recentes, 487.000 srvios ortodoxos e 27.000 ciganos foram massacrados entre 1941 e
1945 no Estado Independente da Crocia. Alm disso, cerca de 30.000 de uma
populao de 45.000 judeus foram mortos: de 20 000 a 25.000 nos campos de
extermnio do Ustashe e outros 7.000 deportados para as cmaras de gs(18). Como foipossvel que, apesar do relacionamento de poder autoritrio entre o papado e a Igreja
local um relacionamento de poder que Pacelli se empenhara em consolidar, no
houvesse nenhuma tentativa do Vaticano para impedir s matanas, as converses
foradas, a apropriao de bens ortodoxos? Como foi possvel, quando as atrocidades se
tornaram do conhecimento de todos no Vaticano. Como vamos demonstrar que Pacelli
no dissociasse no mesmo instante a Santa S das aes do Ustashe, condenando os
criminosos?
Notas(enumeradas conforme no livro):
13 -Dirio de Osborne citado em Chadwick,Britain and the vatican...,p.206.14 - Tittmann's papers citado em Chadwick,Britain and the vatican...,p.207.15 - Chadwik,Britain and the vatican...,p.208-209.
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16 - Carta de Osborne a McEwan, 31 de julho de 1942.17 - Carta de Osborne a McEwan, 25 de agosto de 1942.18 - Carta de Osborne a McEwan, 18 de setembro de 1942.
A Crocia e o conhecimento do Vaticano
Desde o incio, o arcebispo de Zagreb, Alojzije Stepinac (beatificado por Joo Paulo II na
Crocia, em 3 de outubro de 1998), estava de pleno acordo com os objetivos gerais do novo
Estado croata. Empenhou-se em fazer com que fosse reconhecido pelo papa. Visitou
Pavelic em 16 de abril de 1941. Ouviu o novo lder declarar que "no teria tolerncia com a
Igreja ortodoxa srvia", registrou Stepinac em seu dirio, "porque em sua opinio no era
urna Igreja, mas unia organizao poltica". Isto proporcionou a Stepinac a impresso de
que "Poglavnik era um catlico sincero" (19). Nessa mesma noite, Stepinac ofereceu um
jantar a Pavelic e aos principais lderes do Ustashe, a fim de celebrar a volta de todos do
exlio. Em 28 de abril, no prprio dia em que 250 srvios foram massacrados em Bjelovar,
uma carta pastoral de Stepinac foi lida em todos os plpitos catlicos, conclamando o clero
e os fiis a colaborarem no trabalho do lder.
Por que esforo de ingenuidade Stepinac deixou de compreender o que a colaborao
podia envolver? No incio de junho de 1941, o general alemo plenipotencirio para a
Crocia, Edmund Glaise von Horstenau, declarou que, segundo relatrios confiveis de
observadores militares e civis alemes, "o Ustashe, num processo de loucura
desvairada"(20). No ms seguinte, Glaise relatou o embarao dos alemes, que "com
seis batalhes de infantaria" observavam impotentes "a fria cega e sangrenta do
Ustashe.
Padres, invariavelmente franciscanos, assumiram um papel de destaque nos
massacres (21). Muitos costumavam andar armados e executavam seus atos assassinos
com o maior zelo. Um certo padre Bozidar Bralow, conhecido pela metralhadora que
era sua constante companheira, foi acusado de realizar uma dana em tomo dos
cadveres de 180 srvios massacrados em Alipasin-Most. Muitos padres franciscanos
mataram, atearam fogo a casas, saquearam aldeias e devastaram os campos frente de
bandos do Ustashe. Em setembro de 1941, um reprter italiano escreveu sobre um
franciscano que vira ao sul de Banja Luka exortando um bando do Ustashe com seucrucifixo.
No arquivo do Ministrio do Exterior em Roma h um registro fotogrfico de
atrocidades: mulheres com seios cortados, olhos arrancados, genitlias mutiladas; e os
instrumentos da carnificina, faces, machados e ganchos de aougueiro(22).
E qual foi a atitude e reao das foras italianas na regio? Sob alguns aspectos, foisimilar reao das tropas da Organizao das Naes Unidas na Iugoslvia na histria
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mais recente (embora com diferenas bvias) de impotncia e consternao.
Constrangido por sua aliana com a Alemanha nazista e as circunstncias da guerra
mundial, o Exrcito italiano tinha um raio de ao limitado. Mesmo assim, calcula-se
que em 1 de julho de 1943 os italianos j haviam oferecido proteo a 33.464 civis em
sua esfera influncia iugoslava, dos quais 2.118 eram judeus(23). Falconi especulou a
humanidade dos italianos sob esse aspecto pode ter sido em parte uma decorrncia depresso do Vaticano, embora os indcios so superficiais e vagos". A pesquisa e
avaliao de Jonathan Steinberg sobre a relutncia italiana em participar da deportao e
extermnio descartariam essa possibilidade. Num comovente sumrio do complexo
fenmeno italiano de humanitarismo na Iugoslvia, entre 1941 e 1943, Steinberg
assevera: Um longo processo, iniciado com a reao espontnea de jovens oficiais
isolados, na primavera de 1941, que no suportaram ficar de braos cruzados
observando os carniceiros croatas retalharem srvios e judeus, homens, mulheres e
crianas, culminou em julho de 1943 com uma espcie de conspirao nacional para
frustrar a brutalidade muito maior e mais sistemtica do Estado nazista. (...) Baseava-
se em certas suposies sobre o que significava ser italiano"(25).
Muito se falou nos anos do ps-guerra sobre a santidade pessoal do arcebispo Stepinac, o
primaz catlico romano da Crocia e seus eventuais protestos contra as perseguies e
massacres. Contudo, mesmo que seja considerado inocente de qualquer tolerncia com o dio
racial assassino, evidente que ele e o episcopado endossaram um desprezo pela liberdade
religiosa equivalente cumplicidade com a violncia. Stepinac enviou uma longa carta a
Pavelic sobre as questes dos massacres e converses. O escritor Hubert Butler traduziu o
texto para o ingls de uma cpia datilografada que obteve em Zagreb, em 1946. Cita as
opinies de outros bispos, todos a favor, inclusive uma carta do bispo catlico de Mostar, um
certo dr. Miscic, expressando o anseio histrico de que o episcopado croata aceitasse asconverses em massa ao catolicismo.
O bispo comea com a declarao de que "nunca houve urna ocasio to boa quanto agora
para ajudarmos a Crocia a salvar incontveis almas". Fala com entusiasmo sobre as
converses em massa. Mas acrescenta que deplora "a viso restrita" das autoridades, que
perseguem at os convertidos e os "tratam como escravos". Relaciona massacres conhecidos
de mes, moas e crianas com menos de oito anos, levadas para as montanhas e "jogadas
vivas nas ravinas mais profundas". Em seguida, ele faz uma espantosa declarao: "Na
parquia de Klepca, 700 cismticos das aldeias vizinhas foram chacinados. O subprefeito de
Mostar, sr. Baile, um muulmano, disse publicamente (como um servidor pblico, deveria ter se
calado) que s em Ljubina 700 cismticos foram jogados numa fossa"(26).A carta revela a confuso moral implcita no comportamento dos bispos, que
aproveitaram a derrota da Iugoslvia diante dos nazistas para aumentar o poder e
influncia do catolicismo nos Blcs. Um bispo depois de outro endossa a promoo de
converses, ao mesmo tempo em que admite que no faz sentido cismticos em ravinas.
Os bispos no queriam se dissociar do regime, hesitavam em condenar e excomungar
Pavelic e seus companheiros, por causa da relutncia em perder as oportunidades
proporcionadas pela "boa ocasio" de consolidar uma base de poder catlico nos
Blcas. A mesma relutncia em perder a oportunidade para uma predominncia catlica
no Leste contagiou o Vaticano e, em ltima anlise, o prprio Pacelli. Na verdade, fora
essa mesma relutncia em perder uma nica oportunidade de "evangelizao" que
levara Pacelli, em 1913-14, a pressionar pela Concordata Srvia, na esperana de criar
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uma base de ritual latino na cristandade do Leste, apesar das repercusses e perigos
inevitveis.
Pacelli estava melhor informado sobre a situao na Crocia do que em qualquer
outra parte da Europa, fora da Itlia, durante a segunda Guerra Mundial. Seu delegado
apostlico, Marcone, circulava entre Zagreb e Roma vontade. Havia sempre aviesmilitares sua disposio para voar at o novo Estado da Crocia. Os bispos, alguns dos
quais integravam o parlamento da Crocia, comunicavam-se livremente com o
Vaticano. Podiam sempre fazer visitas ad limina ao papa em Roma(27). Durante estas
visitas, o pontfice e outros membros da Cria tinham toda a liberdade para fazer
perguntas sobre as condies na Crocia, e sem dvida no deixavam de indagar.
Pacelli tinha meios pessoais alternativos de informao, inclusive as transmisses
dirias da BBC, que eram sempre monitoradas e traduzidas para ele por Osborne, o
representante de Londres no Vaticano. Havia um noticirio freqente da BBC sobre a
Crocia. A notcia seguinte, transmitida em 16 de fevereiro de 1942 era tpica: "As
piores atrocidades esto sendo cometidas na jurisdio do arcebispo [Stepinac]. Osangue de irmos corre em abundncia. Os ortodoxos esto sendo convertidos fora
ao catolicismo, mas no ouvimos a voz do arcebispo se opondo a isso, informa-se que
ele est participando de desfiles nazistas e fascistas(28).
Um fluxo de diretivas aos bispos croatas, partindo da congregao para as igrejas
orientais da Santa S, que cuidava em particular dos catlicos de ritual oriental na
regio, indica que o Vaticano sabia das converses foradas a partir de julho de 1941.
Os documentos focalizam a insistncia do Vaticano para que os convertidos em
potencial ao catolicismo fossem rejeitados quando ficar patente que procuram o batismo
pelas razes erradas (...) estas razes erradas (os documentos insinuavam, sem chegar a
dizer expressamente) sendo o terror e a tentativa de evitar a morte.
Em 14 de agosto, o presidente da Unio para a comunidade israelita de Alatri escreveu para
o secretrio de Estado mi pedindo ajuda em nome de milhares de judeus croatas, "residentes
em Zagreb e em outros centros da Crocia, que foram presos sem razo, privados dos seus
bens e deportados". Descrevia como seis mil judeus foram despejados numa ilha rida e
montanhosa, sem meios de proteo contra o tempo, sem alimentos nem gua. Todas as
tentativas de socorr-los foram "proibidas pelas autoridades croatas"(29). A carta suplicava
uma interveno da Santa S junto aos governos italiano e croata. No h qualquer resposta
ou ao da Santa S.
Notas(enumeradas conforme no livro):
19 Falconi, Carlo ; O silncio de Pio XII p. 273
20 - Citado em J. Steinberg, All or Nothing, p.181.
21 - Ver Falconi, Silence, p.298.
22 - J. Steinberg, All or Nothing, p.30.
23 -Ibid., p.132.
24 - Falconi, Silence, p.318.
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25 - J. Steinberg, All or Nothing, p.133.
26 - Citado em H. Butler, The Sub-Prefect Should Have Held His Tongue, ed. R.F.
Foster(Londres, 1966), p. 175.
27 - Falconi, Silence, p.303.
28 -Ibid., p.304.
29 - ADSS, viii, 250ff.
Em 30 de agosto de 1941, o nncio papal na Itlia, monsenhor Francesco Borgongini
Duca, escreveu para Maglione, retratando uma curiosa conversa com o adido cultural
croata no Quirinal e dois franciscanos croatas. Eles falavam sobre os 100.000 ortodoxos
convertidos ao catolicismo. O nncio indagou sobre os protestos que ouvira a respeito
de "perseguies infligidas pelos catlicos aos ortodoxos". O adido, "com muitos
acenos de cabea dos padres", tentou desmentir essas histrias, insistindo em que,
"como o papa continua a dizer ao clero e aos fiis, os catlicos devem seguir osensinamentos de Nosso Senhor e propagar a f por meio da persuaso, no da
violncia"(30).
No ms seguinte, o embaixador especial de Pavelic, padre Cherubino Seguic, foi a
Roma para descobrir o que se dizia sobre o regime e acabar com os " rumores"
desfavorveis. Em suas memrias defensivas, ele se queixa da "insinuao de calnia"
que se ouvia em Roma sobre a Crocia e garante que "tudo distorcido ou inventado.
Somos apresentados como um bando de brbaros e canibais". Ele conversou com
Giovanni Montini (o futuro Paulo VI), que "pediu informaes detalhadas sobre os
acontecimentos na Crocia. Falei tudo. Ele ouviu com muito interesse e ateno. As
calnias haviam chegado ao Vaticano e deviam ser denunciadas de uma maneira
convincente" (31) . Portanto, as atrocidadesou "calnias"eram do conhecimento
comum em Roma no vero de 1941. A Santa S tinha canais pelos quais Pacelli podia
verificar tudo e influenciar os acontecimentos.
O delegado apostlico Ramiro Marcone, escolhido por Pacelli como seu representante
pessoal na Crocia, era um amador que deu a impresso de passar corno um sonmbulo
por toda essa cena sangrenta. Um monge beneditino de 60 anos, ele no tinha qualquer
experincia de diplomacia e passara grande parte de sua ida adulta dando aulas de
Filosofia no Colgio de Santo Anselmo, em Roma. Sua rea de atuao era o claustro e
a sala de aula. Seu tempo na Crocia foi consumido em grande parteno comparecimento a cerimnias, jantares e desfiles pblicos, sendo fotografado sempre
ao lado de Pavelic. Era evidente que fora escolhido para apaziguar e encorajar.
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Pavelic com o arcebispo Stepinac
Os equivalentes diplomticos de Marcone, do lado croata, eram Nicola Rusinovic, um
mdico que praticava num hospital romano, e seu planejado substituto, um camarista
papal no Vaticano, prncipe Erwin Lobkowicz (de origem bomia). Esses arranjos eram
semi-secretos, j que a Santa S ainda mantinha oficialmente relaes diplomticas com
o governo real iugoslavo no exlio. Em maro de 1942, apesar da abundncia de provas
apontando para os massacres, a Santa S prometia relaes oficiais aos representantes
croatas. Montini disse a Rusinovic: "Recomende gentileza a seu governo e aos crculos
governamentais, pois assim nossas relaes vo se consolidar. Desde que vocs se
comportem de maneira apropriada, a forma das relaes vai se definir
espontaneamente" (32) . Em 22 de outubro de 1942, Pacelli encontrou o prncipeLobkowicz em audincia. Segundo o prncipe, Pacelli, "em sua atitude habitual de
extrema benevolncia", disse que "esperava poder em breve me receber em
circunstncias diferentes"(33).
Enquanto isso, um pedido de socorro aos judeus perseguidos na Crocia foi enviado
Santa S pelo Congresso Mundial Judaico e a comunidade israelita sua, por meio do
monsenhor Filippe Bernadini, o nncio apostlico em Berna. Num memorando
substancial, datado de 17 de maro de 1942, menos de dois meses depois da
Conferncia de Wannsee, em que foi delineada a Soluo Final, Os representantes das
duas organizaes documentaram Perseguies aos judeus na Alemanha, Frana,
Romnia, Eslovquia, Hungria e Crocia. Queriam em particular que o papa usa-se suainfluncia nos trs ltimos pases, ligados Santa S por fortes vnculos diplomticos e
eclesisticos - na Eslovquia, por exemplo, um padre catlico**** ocupava no
momento a presidncia. A parte sobre a Crocia dizia o seguinte: "Milhares de famlias
foram deportadas para ilhas desertas ou encarceradas em campos de concentrao
todos os homens judeus foram enviados para campos de trabalho forado. tendo de
escavar esgotos, o que acarretou a morte de muitos. (...) Ao mesmo tempo, suas posas e
filhos foram enviados para outro campo, onde tambm esto sofrendo terrveis
privaes'''(34).
****monsenhor Jozef Tiso, ditador pr nazi eslovaco.
http://1.bp.blogspot.com/-Fg1sxZJzqWM/T4g5gC5cqJI/AAAAAAAAFEw/XZLXhMV7Ef4/s1600/Pavelic+com+ol+arcebispo+Stepinac.jpghttp://1.bp.blogspot.com/-Fg1sxZJzqWM/T4g5gC5cqJI/AAAAAAAAFEw/XZLXhMV7Ef4/s1600/Pavelic+com+ol+arcebispo+Stepinac.jpg7/27/2019 O regime brutal da Crocia Catlica
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O memorando, cujo manuscrito est nos Arquivos Sionista em Jerusalm, foi
publicado por Saul Friedlnder, em sua coletnea de documentos sobre Pacelli e o
Terceiro Reich. Em outubro de 1998, Gerhard Riegner, um signatrio sobrevivente do
memorando, revelou em suas memrias publicadas,Ne jamais dsesesperer(35)", que oVaticano o exclura dos onze volumes de documentos do tempo de guerra liberados -
indicando que, mais de meio sculo depois da guerra, o Vaticano ainda no se mostrava
disposto a confessar o que sabia sobre as atrocidades croatas e os primeiros estgios da
Soluo Final, e quando soube.
Os trs chefes da secretaria de Estado do VaticanoMaglione, Montini e Tardini
indicaram vrias vezes que tinham conhecimento dos protestos e pedidos de socorro,
mas suas entrevistas com Rusinovic e Lobkowicz seguiam, como Falconi observou pela
documentao disponvel, um padro invarivel de "ataque simulado, escuta paciente e
generosa rendio". Como no podia deixar de ser, os diplomatas croatas secretos no
Vaticano estavam mais do que satisfeitos com a maneira pela qual os interrogatrioseram realizados: "Esclareci tudo, desmascarando a propaganda inimiga", escreveu
Rusinovic, depois de uma reunio com Mondni. "Sobre os campos de concentrao,
expliquei que seria melhor se ele pedisse informaes delegao apostlica em
Zagreb. (... ) Jornalistas estrangeiros foram convidados a visitar os campos de
concentrao e... ao irem embora, declararam que os campos tinham perfeitas
condies de habitao e satisfaziam os requisitos de higiene." No final da entrevista,
quando Rusinovic comentou que havia agora cinco milhes de catlicos no vais,
Montini disse: "O Santo Padre vai ajud-los, pode ter certeza"(36).
Sacerdote croata no trabalho de converso forada dos srvios ortodoxos ao
catolicismo.
Alm disso, pode-se constatar que o Vaticano sabia da verdadeira situao na Crocia, no
incio de 1942, por uma conversa que Rusinovic teve com o cardeal francs Eugne Tisserant,
um especialista em assuntos eslavos e agora confidente de Pacelli, apesar das restries que
http://2.bp.blogspot.com/-lqGZLUVw0rY/T4g4ZFXMqDI/AAAAAAAAFEo/xr-R6oD4GgQ/s1600/Croata+sacerdote+no+trabalho+de+convers%C3%A3o+for%C3%A7ada+dos+s%C3%A9rvios+ortodoxos+ao+catolicismo.++USTASHA.jpg7/27/2019 O regime brutal da Crocia Catlica
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lhe fizera no conclave. Ele disse ao representante croata, em 6 de maro de 1942: "Sei com
certeza que os prprios franciscanos, como o padre Simic, de Knin, tm participado dos ataques
contra as populaes ortodoxas, a fim de destruir a Igreja ortodoxa. Assim como vocs
destruram a Igreia ortodoxa em Bania Luka. Sei com certeza que os franciscanos na Bsnia e
Herzegovina tem se comportado de maneira abominvel o que muito me aflige. Esses atos no
devem ser cometidos por pessoas educadas, cultas e civilizadas, muito menos por padres"(37).Durante uma reunio subseqente, em 27 de maio, Tisserant disse a Rusinovic que, segundo
os dados alemes, "350.000 srvios desapareceram" e "em apenas um campo de concentrao
h 20.000 srvios" (38).
Pacelli, no entanto, nunca deixou de se mostrar benevolente com os lderes e
representantes do regime de Pavelic. Uma lista de suas audincias, alm das que j foram
mencionadas, significativa. Em julho de 1941, ele recebeu uma centena de membros da fora
policial croata, tendo frente o chefe de polcia de Zagreb. Em 6 de fevereiro de 1942, ele
concedeu uma audincia a um grupo de jovens do Ustashe em visita a Roma. Recebeu outra
delegao de jovens do Ustashe em dezembro do mesmo ano.
E, em 1943, quando conversava com Lobkowicz, Pacelli "expressou seu prazer pela carta
pessoal do nosso Poglavnik[Pavelic]". Depois, na conversa, Pacelli disse que estava
"desapontado porque, apesar de tudo, ningum quer reconhecer o principal inimigo da Europa;
nenhuma cruzada militar comum foi iniciada at agora contra o bo1chevismo"(39).
Mas Hitler no lanara essa cruzada no vero de 1941? Nos tortuosos raciocnios de Pacelli
sobre o comunismo, o nazismo, a Crocia e a evangelizao catlica do Leste, comeamos a
compreender - embora sem perdoar - sua reticncia em relao aos massacres croatas.
Notas (enumeradas conforme no livro):
30 - Ibid., p.259
31 -Ibid., p.307
32 - Citado em Falconi,Carlo O Silencio de Pio XII, p. 333.
33 - Ibid., p.334.
34 - S. Friedlnder, Pius XII and the Third Reich: A Documentation, trad. ingl. (Londres, 1966),
p.109.
35 - G. Riegner, Ne jamais dsesprer (Paris, 1988), pp. 164-165.
36 - Citado em Falconi, Silence, p. 355.
37 -Ibid., p. 382
38 -Ibid., p. 388
39 -Ibid., pp. 344-346
Fonte: CORNWELL, John - O Papa de Hitler - A historia secreta de Pio XII, Rio de
Janeiro: Imago Ed., 2000, p. 290 - 293.
O Emissrio do Vaticano Ramiro Marcone, terceiro da direita,Alojzije Stepinac,
primeiro direita,e Ante Pavelic, parcialmente obscurecido, extrema esquerda,no
funeral em 1944 de Marko Dosen, o Presidente do Parlamento Ustasha.
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