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ISSN 00347272 63 O papel do auditor odontológico The role of dental auditor Urubatan Vieira de Medeiros Doutor pela USP Professor Titular do Departamento de Odontologia Pre- ventiva e Comunitária da Uerj/UFRJ Mara Sílvia Dalcolmo Fernandes Miranda Especialista em Odontologia do Trabalho pela Universi- dade São Leopoldo/SP Auditora Petrobrás/Uniodonto Resumo O aumento do número de profissionais dentistas, a maior concorrência por pacientes e a queda no desem- bolso direto geram respostas estratégicas dos profissio- nais no formato de empresas cooperativas ou na criação das sociedades civis de natureza empresarial. Com base em revisão de literatura, este estudo apresenta o papel do auditor odontológico como ator indispensável a todas as modalidades assistenciais, definindo suas caracterís- ticas, seu perfil, áreas de atuação, interfaces e conflitos, tendo como eixo de análise a abordagem de sua atua- ção junto ao sistema de atenção à saúde. Concluiu-se que o Dentista Auditor desempenha importante papel em todo o processo de auditoria e que necessita ser perma- nentemente treinado e capacitado. Palavras-chave: Odontologia do Trabalho; audi- toria odontológica; auditor. Abstract The growth in the number of Dentists, increased com- petition for patients and the drop on direct disburses bring about strategic responses from the professionals creating dental cooperatives or dental groups companies. Based on a literature review, this paper shows the role of the den- tal auditor as an indispensable agent to all kinds of assis- tance, defining their characteristics, their profiles, their are- as of work, and their conflicts, the main point of the analysis being the discussion of their operation within the health care system. We conclude that the Dentist Auditor plays an important role in the auditing process and that they need to be permanently trained to perform their duties. Keywords: Dentistry at work; dental auditing; auditor. Introdução Introdução Introdução Introdução Introdução O mercado de planos privados de assistência à saúde tem sido bastante discutido nos últimos anos no Bra- sil. Apesar da criação de um sistema de saúde com aces- so universal, tem ocorrido o crescimento do número de indiví- duos com planos privados de saúde. O mercado de planos odontológicos tem crescido em para- lelo ao mercado de planos de saúde, embora os estudos sobre o setor odontológico deem pouca atenção a presença e desem- penho destas empresas no mercado. Algumas variáveis estru- turais explicam a dinâmica e o crescimento do mercado de pla- nos de saúde odontológico no Brasil. Dentre elas, destacam- se: a mudança no perfil profissional e da profissão odontológi- ca, o sofrível acesso da população aos serviços de saúde bucal, o baixo gasto das famílias com despesas por desembolso dire- to para a assistência odontológica e o significativo peso dos gastos com planos privados de assistência à saúde. Esses pla- nos de saúde, tanto privados quanto públicos devem ser ge- renciados de forma eficiente. Uma das ferramentas de qualidade mais eficientes para apri- morar um sistema de gestão é a auditoria. Esta, quando bem aplicada, diagnostica não conformidades no sistema avaliado. É importante destacar que estas avaliações devem ser executa- das por profissionais capacitados, que apresentem além do conhecimento técnico-científico, atributos pessoais como im- parcialidade, prudência e diplomacia, entre outros. As coloca- ções e ações por parte destes profissionais devem ser embasa- das por princípios científicos da especialidade a ser avaliada. O parecer emitido deve ser construtivo, no sentido de auxiliar a melhoria contínua do sistema de qualidade sobre os serviços da empresa, a partir de auditorias operacionais (16). As auditorias operacionais, quando bem conduzidas, po- dem proporcionar importantes informações à direção da em- presa ou do Sistema de Saúde. Elas irão verificar se o que deve ser feito está realmente sendo feito (11), tendo como objetivo principal fornecer dados para que a direção analise criticamen- te o seu sistema de qualidade e tome as decisões, determinan- do ações ou disposições sobre os resultados não conformes, diminuindo ou eliminando-os. Consequentemente, garante-se a continuidade operacional (sobrevivência) na área de negóci- os, frente às empresas concorrentes (10). Com a evolução do mercado de planos odontológicos, é natural a diversificação da abordagem e da atuação da Audito- ria Odontológica. Assim surgiu a necessidade de profissionais ARTIGO ORIGINAL Rev. bras. odontol., Rio de Janeiro, v. 67, n. 1, p.63-8, jan./jun. 2010

O Papel Do Auditor Odontologico

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ISSN 00347272

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O papel do auditor odontológico

The role of dental auditor

Urubatan Vieira de Medeiros

Doutor pela USPProfessor Titular do Departamento de Odontologia Pre-ventiva e Comunitária da Uerj/UFRJ

Mara Sílvia Dalcolmo Fernandes Miranda

Especialista em Odontologia do Trabalho pela Universi-dade São Leopoldo/SPAuditora Petrobrás/Uniodonto

Resumo

O aumento do número de profissionais dentistas, amaior concorrência por pacientes e a queda no desem-bolso direto geram respostas estratégicas dos profissio-nais no formato de empresas cooperativas ou na criaçãodas sociedades civis de natureza empresarial. Com baseem revisão de literatura, este estudo apresenta o papeldo auditor odontológico como ator indispensável a todasas modalidades assistenciais, definindo suas caracterís-ticas, seu perfil, áreas de atuação, interfaces e conflitos,tendo como eixo de análise a abordagem de sua atua-ção junto ao sistema de atenção à saúde. Concluiu-seque o Dentista Auditor desempenha importante papel emtodo o processo de auditoria e que necessita ser perma-nentemente treinado e capacitado.

Palavras-chave: Odontologia do Trabalho; audi-toria odontológica; auditor.

Abstract

The growth in the number of Dentists, increased com-petition for patients and the drop on direct disburses bringabout strategic responses from the professionals creatingdental cooperatives or dental groups companies. Basedon a literature review, this paper shows the role of the den-tal auditor as an indispensable agent to all kinds of assis-tance, defining their characteristics, their profiles, their are-as of work, and their conflicts, the main point of the analysisbeing the discussion of their operation within the healthcare system. We conclude that the Dentist Auditor plays animportant role in the auditing process and that they need tobe permanently trained to perform their duties.

Keywords: Dentistry at work; dental auditing; auditor.

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

O mercado de planos privados de assistência à saúdetem sido bastante discutido nos últimos anos no Bra-sil. Apesar da criação de um sistema de saúde com aces-

so universal, tem ocorrido o crescimento do número de indiví-duos com planos privados de saúde.

O mercado de planos odontológicos tem crescido em para-lelo ao mercado de planos de saúde, embora os estudos sobreo setor odontológico deem pouca atenção a presença e desem-penho destas empresas no mercado. Algumas variáveis estru-turais explicam a dinâmica e o crescimento do mercado de pla-nos de saúde odontológico no Brasil. Dentre elas, destacam-se: a mudança no perfil profissional e da profissão odontológi-ca, o sofrível acesso da população aos serviços de saúde bucal,o baixo gasto das famílias com despesas por desembolso dire-to para a assistência odontológica e o significativo peso dosgastos com planos privados de assistência à saúde. Esses pla-nos de saúde, tanto privados quanto públicos devem ser ge-renciados de forma eficiente.

Uma das ferramentas de qualidade mais eficientes para apri-morar um sistema de gestão é a auditoria. Esta, quando bemaplicada, diagnostica não conformidades no sistema avaliado.É importante destacar que estas avaliações devem ser executa-das por profissionais capacitados, que apresentem além doconhecimento técnico-científico, atributos pessoais como im-parcialidade, prudência e diplomacia, entre outros. As coloca-ções e ações por parte destes profissionais devem ser embasa-das por princípios científicos da especialidade a ser avaliada.O parecer emitido deve ser construtivo, no sentido de auxiliar amelhoria contínua do sistema de qualidade sobre os serviçosda empresa, a partir de auditorias operacionais (16).

As auditorias operacionais, quando bem conduzidas, po-dem proporcionar importantes informações à direção da em-presa ou do Sistema de Saúde. Elas irão verificar se o que deveser feito está realmente sendo feito (11), tendo como objetivoprincipal fornecer dados para que a direção analise criticamen-te o seu sistema de qualidade e tome as decisões, determinan-do ações ou disposições sobre os resultados não conformes,diminuindo ou eliminando-os. Consequentemente, garante-sea continuidade operacional (sobrevivência) na área de negóci-os, frente às empresas concorrentes (10).

Com a evolução do mercado de planos odontológicos, énatural a diversificação da abordagem e da atuação da Audito-ria Odontológica. Assim surgiu a necessidade de profissionais

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com perfis diferenciados, quealiassem além do conhecimen-to técnico (graduação em Odon-tologia, experiência cl ínica,princípios éticos), uma visãogerencial e formação holística,abrangendo conhecimentos emadministração (auditoria, ges-tão, finanças, legislação, estatís-tica, informática), conhecimen-tos dos aspectos socioeconô-micos culturais e mercadológi-cos, além do conhecimento dossistemas operacionais adota-dos pelas operadoras (16).

Dentre os mecanismos quecontribuem para a auditoriapode-se citar a legislação, o Mi-nistério da Saúde-ANVISA-ANS,os conselhos de classe, a progra-mação, a central de regulação eos protocolos técnicos. De acor-do com COLEMAN et al. (2), exis-te um conjunto de atividades re-troalimentadoras:• • • • • Auditoria analítica: conjunto deatividades desenvolvidas paracontrole;• • • • • Auditoria operativa: conjuntode atividades desenvolvidaspara avaliação de aspectos espe-cíficos e do sistema de saúde.

Constituem-se objetivos daAuditoria Operacional medir odesenvolvimento da sua ativida-de em relação aos seus objetivose rendimento esperado (efetivi-dade), melhorar o emprego derecursos, através de redução decustos e aumento da produção(economia e eficiência), analisarse os procedimentos estão ade-quados às circunstâncias atuaisnas quais as atividades se de-senrolam, assegurar a confiabi-lidade dos dados para promovera aderência às políticas de ges-tão prescritas (8).

Segundo MELLO (7), a audi-toria operacional inicia-se coma reunião da equipe técnica quevai elaborar o roteiro de ativida-des, prossegue com a oficializa-

ção ao prestador sobre realiza-ção da auditoria e a programa-ção de auditoria clínica. Os ins-trumentos utilizados são a aná-lise dos prontuários, contratos,manuais e o sistema de infor-mação. Seus resultados são de-monstrados através de elabora-ção de relatório contendo osdados gerais, a descrição dasnão conformidades encontra-das, os motivos, as providênci-as e os responsáveis e a identi-ficação dos auditores.

Numa auditoria analítica, ha-verá o levantamento de dados,acesso a documentações e regis-tros, avaliação dos alertas iden-tificados pela central de regula-ção e a identificação de eventoscríticos: relatórios da central deregulação e sistema de proces-samentos de contas. Os instru-mentos trabalhados serão o Re-latório de Auditoria Operacional,as entrevistas com usuários, obanco de dados de atendimen-tos, os prontuários e o cadastrode serviços. Seus resultados,como na auditoria operacional,também são demonstrados coma elaboração do relatório conten-do dados gerais, motivos, situa-ção, recomendações, data e locale identificação dos auditores.

As atividades básicas de au-ditoria englobam: conhecer nor-mas, contratos, tabelas, rotinas;fazer análise prévia de procedi-mentos ambulatoriais de custoelevado, internações; realizarauditoria externa, análise decontas médico/odontológicahospitalares; participar nos pro-jetos de informática em apoio àgestão do plano de saúde; asses-soria no processo de credencia-mento, no processo de negocia-ção e na elaboração de contra-tos; participar da definição eacompanhamento de indicado-res, do processo de pesquisa desatisfação dos clientes, do desen-

volvimento e análise de estudosepidemiológicos, da elaboraçãodo relatório anual do plano e deseu planejamento estratégico,abrindo grande espaço no mer-cado de trabalho (16).

O mercado de trabalho parao auditor apresenta formas deinserção nos serviços assistenci-ais odontológicos de autogestão,nas empresas prestadoras comoOdontologia de grupo, Segura-dora e Administradora, podendoainda prestar serviços de consul-toria/auditoria autônomos.

De acordo com WEYNE (16),o papel do auditor em relação aousuário é realizar o levantamen-to epidemiológico, verificar ade-quação do produto no nível so-cioeconômico e faixas etárias,estudar a distribuição geográfi-ca das moradias para melhor pa-rametrizar a rede de atendimen-to, monitorar controles de utili-zação, implantar programas deprevenção, avaliação do nível dequalidade do trabalho prestadopela rede operacional, índice desatisfação do usuário e ser a in-terface de comunicação entre osvértices deste relacionamento.Com relação ao prestador, seupapel consiste em selecionar arede, adequá-la às necessidadesdos usuários no que tange a nú-mero de serviços credenciados,bem como as especialidades ne-cessárias, participar das comis-sões de credenciamento/descre-denciamento, monitorar a ade-quação e resguardar para queseja cumprida a tabela de proce-dimentos, acompanhar do fluxode pagamento à rede operacio-nal, fazer avaliação constante docontrole de produção e qualida-de dos serviços prestados, reali-zar visitas periódicas aos servi-ços credenciados, avaliar o índi-ce de satisfação da rede operaci-onal e instituir um canal de co-municação com a mesma. Emrelação à empresa: realizar o

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acompanhamento e monitoriza-ção das receitas e despesas, co-nhecimento da intenção dosusuários e prestadores de ser-viços, programar a auditoria se-letiva e também a investigató-ria, acessar informações quepossibilitem visão abrangentedo sistema e as responsabilida-des do plano. Assessoramentonas áreas: planejamento estra-tégico; administração de recur-sos humanos e capital intelec-tual; centro de documentação;teleatendimento; marketing; in-formática e tecnologia da infor-mação; contabilidade e prepara-ção de relatórios para ANS.

O MINISTÉRIO DA SAÚDE (9),visando ampliar o acesso da po-pulação brasileira às ações depromoção, prevenção e recupe-ração da saúde bucal e objeti-vando melhorar os indicadoresde saúde do país, elaborou o Pla-no de Reorganização das Açõesde Saúde Bucal da Atenção Bási-ca, com a inclusão de profissio-nais de Odontologia nas equipesde Saúde da Família, como prin-cipal estratégia adotada no pri-meiro nível de atenção.

De acordo com princípios ediretrizes que norteiam a Odon-tologia moderna, faz-se necessá-rio a divulgação, a inserção, oacompanhamento, o monitora-mento e a avaliação dos serviçosprestados em saúde bucal noâmbito do Sistema Único de Saú-de (SUS), conforme normas epadrões de biossegurança naprática odontológica e no con-trole de riscos operacionais, con-siderando a atual capacidadeinstalada de equipamentos deOdontologia e as modalidadesinovadoras de reorganização daatenção odontológica (9).

Nesse sentido, é fundamentala conscientização dos profissio-nais quanto ao significado dasaúde bucal, no contexto da saú-

de integral no SUS, e a importân-cia da garantia da qualidade daassistência prestada ao usuárioe da segurança do profissional naexecução da atividade (9).

As atividades de auditoria sãode responsabilidade dos profis-sionais do Sistema Nacional deAuditoria do SUS (SNA), integra-das nos três níveis de atuação,federal, estadual e municipal, embusca do redirecionamento nasações de assistência na área deOdontologia. Aplica-se seu mis-ter, para avaliação e constataçãodos fatos e das situações encon-tradas no processo de audita-gem, para adequação e direcio-namento nas tomadas de deci-sões. Verifica-se certo ineditismona abordagem das práticas deauditoria nas cirurgias bucoma-xilofaciais, tema cujo desenvol-vimento tem sido permanente-mente cobrado ao DENASUS, oque finalmente se concretiza (9).

Por sua vez, segundo SANTOS(13), a Lei 8.689, de 27 de julhode 1993, tratou do Sistema Naci-onal de Auditoria (SNA), em seuartigo 6º, nos seguintes termos:“Art. 6º. Fica instituído, no âmbi-to do Ministério da Saúde, o Sis-tema Nacional de Auditoria deque tratam o inciso XIX do artigo16 e o parágrafo 4 do artigo 33 daLei 8.080/90, competindo-lhe aavaliação técnico-científica, con-tábil, financeira e patrimonial doSUS, que será realizada de formadescentralizada.”

O Sistema Nacional da Audi-toria (SNA), instituído pela lei ci-tada anteriormente e regulamen-tado pelo decreto 1651, de 28 desetembro de 1995, desdobra-senos três níveis de gestão quecompõem o SUS – Federal, Esta-dual e Municipal. Ele se revestedas atividades de auditoria, su-plementando outras instânciasde controle e subsidiando o pro-cesso de planejamento das ações

de saúde, sua execução, gerênciatécnica e avaliação qualitativados resultados obtidos (8). Temcomo objetivos: auxiliar o geren-ciamento, contribuir para o pla-nejamento e replanejamento dasações de saúde, orientar organi-zações auditadas, monitorar pro-cessos, sistemas e serviços deforma preventiva, monitoramen-to de processos (normas e even-tos), com o objetivo de verificara conformidade dos padrões es-tabelecidos e de detectar situa-ções de alarme que requeiramuma resposta avaliativa detalha-da e profunda, resultados dasações, avaliar serviços e sistemasde saúde, objetivando verificarsua adequação aos critérios eparâmetros de eficácia, eficiên-cia e efetividade estabelecidospara o SUS (8).

Segundo COLEMAN et al. (2),as competências no nível Fede-ral são: aplicação dos recursostransferidos aos estados e muni-cípios, mediante análise dos re-latórios de gestão; as ações e ser-viços de saúde de abrangêncianacional; os serviços de saúdesob sua gestão; os sistemas esta-duais de saúde e as ações, méto-dos e instrumentos implementa-dos pelo órgão estadual de con-trole, avaliação e auditoria. Omesmo autor estabelece comocompetências no nível Estadual:aplicação dos recursos estaduaisrepassados aos municípios; asações e serviços previstos noplano estadual de saúde; os ser-viços de saúde sob sua gestão;os serviços municipais e os con-sórcios intermunicipais de saú-de; as ações, métodos e instru-mentos implementados pelosórgãos municipais de controle,avaliação e auditoria. As compe-tências no nível Municipal são:as ações e serviços estabelecidosno plano municipal de saúde; osserviços de saúde sob sua ges-

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tão (públicos e privados) e as açõese serviços desenvolvidos por con-sórcio intermunicipal ao qual omunicípio esteja associado.

De acordo com o MINISTÉ-RIO DA SAÚDE (8), desta formaconstituem objeto do exame deauditoria: a aplicação dos recur-sos transferidos pelo Ministérioda Saúde a entidades públicas,filantrópicas e privadas; a gestãoe execução dos planos e progra-mas de saúde do MS, SES e SMSque envolvam recursos públicosobservando os seguintes aspec-tos: organização, cobertura assis-tencial, perfil epidemiológico,quadro nosológico, resolubilida-de/resolutividade, eficiência, efi-cácia, efetividade e qualidade daassistência prestada à saúde,

adequação dos recursos repas-

sados e sua aplicação financei-

ra; os contratos firmados pelo

Ministério da Saúde com as Se-

cretarias Estadual e Municipal e

destas com a rede complemen-

tar, para a prestação de serviços

no Sistema de Informações Am-

bulatoriais (SIA), Sistema de In-

formações Hospitalares (SIH/

SUS), execução de obras e forne-

cimento de materiais; os convê-

nios, acordos, ajustes e instru-

mentos similares e a prestação

de serviços de saúde na área

ambulatorial e hospitalar.

A auditoria para a assistência

odontológica hospitalar com-

preende a fase analítica, que per-

mite avaliar o perfil da atividade

dos serviços ou das unidades

que serão auditadas, utilizando-

se os relatórios de saída do Sis-

tema de Informações Hospitala-

res (SIH/SUS) e Sistema de In-

formações Ambulatoriais (SIA).

Entre os relatórios de saída, de-

verão ser observados para aná-

lise, o Relatório do Cadastro Na-

cional de Estabelecimentos de

Saúde (CNES) e o Relatório de

Frequência do SIH/SUS (9). Tam-

bém, a fase operativa, com verifi-

cação in loco dos serviços oferta-

dos, ações realizadas, prontuário

odontológico, Autorização de In-

ternação Hospitalar (AIH) (9).Os avanços na constituição do

SUS fazem surgir novos postosde trabalho, sob novas políticasde atenção os quais, revaloriza-dos pela procura, começam a re-definir as habilidades exigidasnesses serviços. Habilidades paraescolhas e ações coletivas e paraenfrentar as inúmeras incertezastípicas da Esfera Pública (15).

MEDEIROS & ANDRADE (6)sintetizam toda a base teóricaapresentada esclarecendo quenão é da competência do audi-tor a aplicação de quaisquer me-didas punitivas ao profissionalou instituição prestadora de ser-viço, e sim recomendar medidascorretivas em seu relatório parao fiel cumprimento da prestaçãode serviços. Seguem discutindoque o auditor tem como atribui-ção subsidiar setores de análisecom informações relevantespara o correto pagamento dascontas e de ser um elemento deligação entre os usuários e a em-presa patrocinadora do evento,agilizando a parte técnica e dan-do suporte administrativo. Fina-lizam esclarecendo que o perfiladequado para o auditor com-põe-se de: habilitação e experi-ência clínica; conhecimento téc-nico e capacidade profissional;sentido ético; mentalidade ana-lítica; independência de critério;capacidade de síntese e objeti-vidade; aptidão para comunicar-se; honestidade e idoneidade;bom-senso e cautela; discrição esigilo; habilidade interpessoalpara negociações; imparcialida-de e visão gerencial.

DiscussãoDiscussãoDiscussãoDiscussãoDiscussão

Vários autores em seus estu-dos, como SEIXAS (14), NORO-NHA (10) e FREITAS (3) concor-dam que as transformações ocor-ridas no sistema de saúde, espe-cialmente nas décadas de 1980 e1990, tiveram repercussões nomercado de trabalho. A Medici-na Suplementar, composta porempresas de Medicina e Odon-tologia de grupo, cooperativas,seguro-saúde, e, também, o Es-tado, passaram a intermediar aprática profissional. Os profis-sionais inseridos na prática co-tidiana enfrentam várias restri-ções, até então não vivenciadasna prática tradicional e se veemlimitados em sua autonomia,em sua prática liberal, em seuideal de serviço. Há um excessode trabalho com má remunera-ção e falta de condições de tra-balho para atender aos ideais daboa prática. Assim, o ideal deserviço é sobrepujado pelosideais de mercado, o aspectoquantitativo se sobrepõe à qua-lidade da assistência.

O presente estudo consolidoua percepção dos autores citados,de que a expansão do subsiste-ma de atenção à saúde no Brasildeveu-se a um somatório de cau-sas associadas. De um lado, aimpossibilidade de expressivaparcela da sociedade arcar comos pagamentos diretos dos cres-centes custos da assistência pri-vada; de outro lado, a incapaci-dade do sistema público de saú-de arcar com tamanho compro-misso. Do ponto de vista merca-dológico, há autores que apon-tam a influência e o poder do ca-pital. Nesse enfoque, concebe-seque os convênios e credencia-mentos expandiram a partir domomento em que a saúde mos-trou-se como um setor de poten-cial viabilização de lucros. Para

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o cirurgião-dentista, profissionalliberal até então acostumadocom a autonomia da profissão,houve uma avalanche de novi-dades advindas desse novo tipode relação. Implicações técnicas,como as limitações impostaspelo rol de procedimentos e exa-mes permitidos e pelas regras denegócio que passaram a regularos limites da atuação do dentis-ta; implicações éticas provenien-tes da complexa relação dessatríade empresa-profissional-pa-ciente e implicações trabalhistas(honorários, contratos, prazos),entre outros aspectos, passarama fazer parte das novas preocu-pações do cirurgião-dentista.

PERES (12), ALMEIDA & DA-RUGE (1), NORONHA (10), WEY-NE (16) citam que nesse novoparadigma de mercado, no qualos elementos envolvidos sãoduplicados, pela interferência daoperadora do plano de saúde edo seu auditor contratado, criam-se novos problemas no segmen-to odontológico, entre os quaiscita-se as reclamações de dentis-tas operacionais surpreendidospela falta de autorização préviapara a execução dos procedimen-tos que prescreveram, as altera-ções determinadas pelo auditorsobre a terapêutica proposta, ospagamentos de procedimentosrealizados glosados ou suspen-sos a partir dos pareceres dosseus auditores, bem como a pos-tura não ética destes auditoresfrente aos pacientes avaliados.

Nesse sentido, o trabalho deMEDEIROS & ANDRADE (6) es-clarecem que as qualidades re-queridas para um auditor são:contar com amplo nível de expe-riência em assuntos de audito-ria, formação técnica em organi-zação, sistemas contábeis, siste-mas de informação e aspectoslegais; ter critério e juízo profis-sional, para determinar os pro-

cedimentos necessários deacordo com as circunstâncias;ter lealdade com a instituiçãoque trabalha; demonstrar ho-nestidade e honradez a todaprova e em todos os seus atos;ter l iderança, indispensávelpara obter êxito; ser construti-vo e positivo em suas aprecia-ções; possuir formação huma-nística, maturidade, equilíbrioe boas relações interpessoais.

PERES (12), JUHÁS (4), NORO-NHA (10) e WEYNE (16) mostramem seus estudos a legislação re-gulamentadora dos planos desaúde. Mas todos ressaltam quea mesma ocorreu com atraso emrelação ao estabelecimento domercado, gerando o tensiona-mento das relações. Diz JUHÁS(5), “O Conselho Federal deOdontologia (CFO) tem estabe-lecido normas de convivênciaentre as operadoras e os CDs,a partir do ano de 2001. Infe-l izmente, no entanto, passa-ram-se 20 anos até que o CFOse manifestasse sobre esta ma-téria e, como ocorre em outrasáreas, o mercado ditou as re-gras neste período.”

PERES (12), o MINISTÉRIODA SAÚDE (8), ALMEIDA & DA-RUGE (1), JUHÁS (4), NORONHA(10), MELLO (7) e vários outrosautores estudados citam comocondição precípua para a reali-zação de uma boa auditoria, quea atuação, a experiência, o com-portamento e a postura do au-ditor são tão importantes quan-to os conhecimentos técnicos.Os auditores devem ter um per-fil adequado para exercer suafunção, por apurarem os fatos,administrarem o tempo e aspessoas, que têm sentimentos enecessidades de vida como todoser humano. Durante o proces-so de auditoria, a comunicaçãoverbal e a percepção dos audi-tores são muito importantes.

MEDEIROS & ANDRADE (6)reforçam que o auditor, ao exe-cutar seu trabalho, precisa levarem consideração o aspecto téc-nico, que se refere à aplicaçãodos conhecimentos técnico-cien-tíficos no atendimento ao paci-ente; o aspecto ético, que visa acorreta conduta dos profissio-nais de saúde perante seus cole-gas e seus pacientes e o aspectoadministrativo, que se relacionaàs normas regulamentadorasque regem as instituições queprestam serviços.

Urge que o poder público in-tensifique os processos de mo-dernização do Estado, assumin-do como prioridade as políticaspúblicas sociais, especialmenteaquelas voltadas para a saúdebucal. Privatizando-a, faça-o dig-namente assegurando qualidadee satisfação aos prestadores econsumidores, permitindo con-dições de trabalho ideal atravésde autonomia profissional; con-dições de biossegurança; bomrelacionamento nos processosde auditoria; remuneração con-digna; boa expectativa nas rela-ções de trabalho; participaçãoefetiva e pertinente dos conse-lhos de classe e universidades e,também, ao cumprimento dasresponsabilidades da ANS, queaté o presente momento ocorreude forma incipiente.

ConclusãoConclusãoConclusãoConclusãoConclusão

De acordo com o que nospropusemos estudar e tendo aliteratura como apoio, parece-nos lícito concluir que:1. os funcionários, auditores edentistas operacionais devemser permanentemente treinadose capacitados para lidar com aevolução das tecnologias. Todoo investimento em educação dopessoal terá alto retorno;2. existe a necessidade de rees-

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truturação dos contratos dos planos de saúde, para que, além de estabelecer direitos e deveres entre aspartes, venham a prever a forma como se darão as auditorias técnicas e perícias;3. a interação entre os conceitos de qualidade e as normas legais aplicáveis ao campo da auditoriatécnica odontológica forma um modus operandi, ou seja, um modelo de auditagem;4. o dentista auditor desempenha importante papel em todos os tipos e fases da auditoria e deve possuirformação específica para realizar um trabalho adequado, que contemple tanto os interesses da empresapública ou privada, quanto dos profissionais ou serviços auditados.

1. ALMEIDA, C. A. P., DARUGE, E. Aspectoséticos e legais das auditorias e perícias deconvênios e credenciamentos. R.Cient.CRO-RJ, v. 1, n. 1, p. 22-26, jan./jul., 1999.

2. COLEMAN, G., MOREIRA, M. L., SAN-CHEZ, M. C. Auditoria, controle e progra-mação de serviços de saúde. São Paulo: Ed.Inst. Desenvolvimento da Saúde-IDS, 1998.

3. FREITAS, C. H. S. M. Dilemas no exercícioprofissional da Odontologia: a autonomiaem questão. Com. Saúde e Educação, v. 11,n. 1, p. 25-36, 2007.

4. JUHÁS, R. Auditoria em Odontologia. SãoPaulo: Ed. Clássica, 2001.

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Referências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências Bibliográficas

Recebido em: 29/10/2009

Aprovado em: 17/12/2009

Urubatan Vieira de Medeiros

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MEDEIROS, Urubatan Vieira de & MIRANDA, Mara Silvia D. Fernandes

Rev. bras. odontol., Rio de Janeiro, v. 67, n. 1, p.63-8, jan./jun. 2010