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O FUNDAMENTO COMUNICACIONAL DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA SALA DE AULA ONLINE
Marco Silva - UNESA
Introdução
A avaliação da aprendizagem na sala de aula online requer rupturas com o
modelo tradicional de avaliação historicamente cristalizado na sala de aula presencial.
Se o professor não quiser subutilizar as potencialidades próprias do digital online, ou, se
não quiser repetir os mesmos equívocos da avaliação tradicional, terá que buscar novas
posturas, novas estratégias de engajamento no contexto mesmo da docência e da
aprendizagem e aí redimensionar suas práticas de avaliar a aprendizagem e sua própria
atuação.
O modelo tradicional de avaliação da aprendizagem está marcado por
procedimentos arbitrários vinculados à medida cumulativa de resultados obtidos em
testes pontuais definida pelo docente sobre trabalho e as atitudes do discente. Mede-se a
atuação do discente como se mede extensão, quantidade e volume, em escalas,
atribuindo-lhe graus numéricos.
Segundo Hoffman (2004a, p. 25), “a avaliação na escola vem sendo um ato
penoso de julgamento de resultados”. Uma prática de “registro de resultados acerca do
desempenho do aluno em um determinado período” ou uma “uma prática de provas
finais e atribuição de graus classificatórios”. Para ela, uma concepção consciente ou
inconsciente sedimentou-se numa prática coletiva angustiante baseada em históricas
exigências burocráticas e enraizada feição autoritária.
Essa autora notabilizou-se no cenário acadêmico e no escolar pelo seu
engajamento no “fenômeno da avaliação”. As conclusões de sua pesquisa sugerem
fortemente a opção pela “avaliação mediadora”, sua orientação teórico-prática para
superar o modelo tradicional de avaliação na perspectiva de “uma prática de avaliação
construtivista e libertadora”. Essa orientação se sustenta nos fundamentos autonomia,
dialógica, participação e colaboração para superar o modelo baseado na arbitrariedade
da avaliação baseada em provas, conceitos, boletim, recuperação e reprovação.
“Dar nota é avaliar, fazer prova e avaliar, o registro das notas denomina-se
avaliação”. Essa formulação da autora revela a visão reducionista em que se encontra
colocada a avaliação da aprendizagem na escola e na universidade. Avaliar é julgar o
resultado do trabalho do aprendiz após o tempo da aprendizagem. Avaliar é emitir uma
apreciação final dissociada do processo da aprendizagem, porém intimamente vinculada
aos fantasmas do controle e do autoritarismo que marcam historicamente a educação.
Esse modelo ainda perdura em nosso tempo. Traz para a sociedade do
conhecimento e para a cibercultura (Lemos, 2002a) a velha marca do autoritarismo e da
arbitrariedade que não condizem com a dinâmica de aprendizagem em emergência.
Doravante teremos a perspectiva da interatividade sustentando as comunidades
de aprendizagem em redes online que valorizam autonomia, dialógica, participação e
colaboração. O velho modelo de avaliação perderá a centralidade no novo contexto
sociotecnico. Isso abrirá espaço para a construção de novas práticas de aprendizagem e
de avaliação em sintonia com a dinâmica do nosso tempo.
Este texto sugere um engajamento comunicacional capaz de contribuir para a
necessária redefinição da aprendizagem e da avaliação. Lança mão da potencialidade
comunicacional própria do ambiente digital online e aponta sugestões de
encaminhamento para a docência, para a aprendizagem e, em particular, para a
avaliação interativa.
Fundamentos da avaliação mediadora
Nesse segmento coloco em destaque uma abordagem extremamente favorável à
avaliação que se baseia na autonomia do aprendiz, na dialógica professor e alunos, na
participação de cada aprendiz e na colaboração de todos na construção da comunicação,
do conhecimento e da avaliação da aprendizagem. Trata-se da abordagem da
pesquisadora já citada, Jussara Hoffman (2004a, 2004b, 2004c). Sua abordagem foi
construída a partir da sala de aula presencial e para a sala de aula presencial. Vale a
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pena conhecer a sua alternativa ao modelo tradicional. Trata-se de sugestão
consistentemente oportuna porque está em sintonia com o nosso tempo e com o que há
de muito arejado em educação cidadã. Vejamos, em síntese, os fundamentos dessa
abordagem e verifiquemos se ela pode contribuir para a construção de práticas
condizentes com as especificidades da educação online.
Hoffman (2004a, p. 91) define dois modelos de avaliação e os coloca em
confronto por suas diferenças. De um lado, o modelo que ela chama de “avaliação
liberal”; do outro, a avaliação “libertadora”.
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A avaliação liberal A avaliação libertadora
ação individual e competitiva,
concepção classificatória,
intenção de reprodução das classes
sociais,
postura simplificadora e diretiva do
professor,
valorização da memorização,
exigência burocrática periódica.
ação coletiva e consensual,
concepção investigativa, reflexiva,
proposição de conscientização das
desigualdades sociais e culturais,
valorização da compreensão,
consciência crítica de todos sobre o
cotidiano.
A oposição dos dois modelos serve à autora para revelar de que lado ela se
posiciona para propor a linha de sugestões que ela intitula “avaliação mediadora”. Com
essa proposta, ela se engaja na superação da postura autoritária da avaliação tradicional
em favor de uma prática de avaliação que se inspira no processo dialógico e cooperativo
que proporciona autonomia e participação ao atores da aprendizagem, seguindo a linha
de engajamentos sugerida pelo educador Paulo Freire.
A autora nos remete à forte influência que passou a exercer sobre a educação
brasileira a partir da década de 1960 o teórico americano da avaliação Ralph Tyler. Este
autor semeou entre nós sua proposta conhecida como “avaliação por objetivos”, que é
adotada até hoje nos cursos de formação de professores e nas práticas de avaliação da
aprendizagem nas escolas e universidades.
Hoffman sintetiza essa influência nos seguintes termos:
“no início do processo, o estabelecimento de objetivos pelo professor (na
maioria das vezes relacionados estreitamente a itens de conteúdo
programático) e a determinados intervalos, a verificação, através de testes,
do alcance desses objetivos pelos alunos. Quanto inserida no cotidiano, a
ação avaliativa restringe-se à correção de tarefas diárias dos alunos e
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registro dos resultados. Assim, quando se discute avaliação, discutem-se,
de fato, instrumentos de verificação e critérios de análise de desempenho
final” (2004a, p. 34).
Seu empenho na superação desse modelo é assim sintetizado:
“uma ação avaliativa mediadora envolveria um complexo de processos
educativos (que se desenvolveriam a partir da análise das hipóteses
formuladas pelo educando, de duas ações e manifestações) visando
essencialmente ao entendimento. Tais processos mediadores objetivariam
encorajar e orientar os alunos à produção de um saber qualitativamente
superior, pelo aprofundamento às questões propostas, pela oportunização
de novas vivências, leituras ou quaisquer procedimentos enriquecedores ao
tema em estudo” (2004a, p. 61).
Juntamente com a perspectiva libertadora, essa autora também situa sua proposta
na psicogenética de Jean Piaget para sustentar a opção pela autoria construtiva do
aprendiz. Conhecer não é assimilar e repetir, mas construir em interlocução ou interação
com mundo, organizando a experiência de modo a tornar-se compreensível para o ator
do conhecimento.
Situada na confluência dessas opções teóricas, a “avaliação mediadora” requer o
acompanhamento crítico do processo de participação do aprendiz, a oportunização de
novos e diversos desafios que permitam sua expressão livre e o registro de sua atuação e
das suas descobertas como diálogo freqüente entre os participantes. Todos em interação
são sujeitos do seu conhecimento e partícipes da sua própria avaliação.
Avaliar na perspectiva da construção do conhecimento requer “duas premissas
básicas: a confiança na possibilidade de os educandos construírem suas próprias
verdades e a valorização de suas manifestações e interesses”. Para isso, se faz
necessário “o acompanhamento permanente do professor que incitará o aluno a novas
questões a partir de suas respostas formuladas”. A ele caberá então a iniciativa de
“dinamizar oportunidades de auto-reflexão” tendo claro que nesse processo “os erros e
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as dúvidas dos alunos são considerados como episódios altamente significativos e
impulsionadores da ação educativa” (2004a, p. 18).
Hoffman elucida a sua “avaliação mediadora” em alguns pontos.
Liberdade de expressão garantida. “Uma avaliação contínua exige muitas tarefas
com oportunidades de expressão do aluno. A primeira sugestão é que o aluno
tenha várias oportunidades de expressar os seus conhecimentos a respeito de um
estudo ou noção, e que essas várias expressões sejam observadas pelo professor,
durante a sua evolução. Essa é uma questão básica.”
Mediação a partir de atividades interativas. “Todo o conhecimento que o aluno
desenvolve é construído na relação consigo, com os outros e com o objeto do
conhecimento – tudo ao mesmo tempo. Ou seja, o aluno nunca aprende sozinho.
[...] Portanto, em primeiro lugar, a interpretação de muitas tarefas de
aprendizagem, sejam elas orais, escritas são fruto da interação dos alunos; em
segundo, a mediação, por meio de atividades interativas, questionadoras e
desafiadoras, e não apenas por meio de uma nova explicação do professor ou de
um estudo individual do aluno.”
A atuação do professor. “Lançar em um grupo as questões que ele considera
pertinentes para que, na heterogeneidade da sala de aula, na diversidade de
pensamentos, de fazeres e de saberes, seus alunos possam discutir essas
questões, refazer exercícios, trocar idéias uns com os outros e, de fato, formar
um grupo com a possibilidade de ampliar suas idéias. Essas tarefas são
observadas e interpretadas, e se transformam em estratégias pedagógicas
interativas.” Para responder sobre a evolução do aprendiz ele precisa caminhar
junto com ele, passo a passo. O professor não pode se postar no final do
caminho e dizer se o aluno chegou lá. “É preciso acompanhá-lo durante todo o
caminho.” http://www.mec.gov.br/SEED/tvescola/Avaliacao/entrevistas03.shtm
(Acessado em 20/07/2005)
São pontos esclarecedores, que não deixam dúvida quanto ao valor da opção
crítica da autora frente ao modelo tradicional de avaliação. Assim formulados, são
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valiosas sugestões de engajamento na modificação de práticas avaliativas
historicamente sedimentadas.
A emergência dessa abordagem é bem-vinda à sala de aula presencial e também
à sala de aula online. A primeira poderá desvencilhar-se do peso sufocante da tradição
que certamente remete a muito antes de Ralph Tyler. A segunda ainda carece de
pesquisa e de publicações a respeito da avaliação da aprendizagem adaptada à sua
especificidade, contudo poderá lançar mão da “avaliação mediadora” que certamente
têm suas sugestões grande sintonia com as potencialidades do suporte digital online.
No mundo digital, nós podemos tornar a informação infinitamente modificável
porque lidamos com um meio onde ela é facilmente manipulável. No ambiente digital
online estamos aptos a interferir na informação livremente e a engendrar comunicação
porque o pólo da emissão é liberado (Lemos, 2002b).
O ambiente digital online é manipulável no ponto da transmissão e sugere um
novo e sem precedente paradigma para a comunicação na mídia. O fato de ambientes
digitais online serem manipuláveis significa algo realmente extraordinário: usuários da
mídia podem dar forma a sua própria prática de informar e de comunicar. Isso significa
que informação manipulável pode ser comunicação interativa (Feldman, 1997, p. 4).
A sala de aula como ambiente digital online tem, portanto, uma especificidade
muito própria, em nada semelhante à sala de aula baseada na pedagogia da transmissão.
Nesse contexto, podemos dizer que felizmente as disposições informacionais e
comunicacionais do computador online estão em sintonia com os indicadores de
qualidade em educação e com os fundamentos da “avaliação mediadora”. Liberdade de
autoria, multiplicidade de acessos e de conexões, diálogo, troca de informações e de
opiniões, participação, intervenção e autoria colaborativa são princípios essenciais em
educação cidadã.
No entanto, muitos cursos online estão alheios ao movimento das tecnologias
digitais na internet. Prevalece nas salas de aula o ambiente informacional baseado na
apresentação para a recepção. Prevalece a pedagogia baseada na transmissão para a
recepção solitária e contemplativa que cumpre tarefas e tem sua avaliação no final.
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Oportunamente, Hoffman enfatiza a importância do fundamento “interatividade”
em sua “avaliação mediadora”. Ela critica com veemência a pedagogia da transmissão e
a informação de conteúdos inquestionáveis. No lugar desse constrangimento, ela
vislumbra aprendizes autônomos, com capacidade de autoria nas próprias decisões,
inventivos, descobridores e participativos, agindo em cooperação e reciprocidade.
A avaliação nesse contexto é a reflexão transformada em ação. Ação que nos
impulsiona a novas reflexões. Educador e aprendizes estarão em situação de reflexão
permanente na trajetória de construção do conhecimento. A ação avaliativa exerce uma
função dialógica e interativa, num processo através do qual educandos e educadores
aprendem sobre si mesmos e sobre o mundo no próprio ato da avaliação.
A sala de aula online, equipada com interfaces como chat, blog, fórum e
portfolio, permite autonomia, dialógica, interatividade e tudo aquilo que Hoffman
(2004b, p. 125) destaca como “linhas mestras” perseguidas pela prática avaliativa:
“oportunizar aos alunos muitos momentos para expressar suas idéias e retomar
dificuldades referentes aos conteúdos introduzidos e desenvolvidos;
realizar muitas tarefas em grupo para que os próprios alunos se auxiliem nas
dificuldades (princípio da interação entre iguais), mas garantindo o
acompanhamento de cada aluno a partir de tarefas avaliativas individuais em
todas as etapas do processo;
ao invés de simplesmente assinalar certo e errado nas tarefas dos alunos e
atribuir conceitos ou notas a cada tarefa realizada, fazer anotações significativas
para professor e aluno, apontando-lhes soluções equivocadas, possibilidades de
aprimoramento;
propor a cada etapa tarefas relacionadas às anteriores, numa gradação de
desafios coerentes às descobertas feitas pelos alunos, às dificuldades
apresentadas por eles, ao desenvolvimento do conteúdo;
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converter a tradicional rotina de atribuir conceitos classificatórios às tarefas,
calculando médias de desempenho final, em tomada de decisão do professor
com base nos registros feitos sobre a evolução dos alunos nas diferentes etapas
do processo, tornando o aluno comprometido com tal processo.”
Necessário se faz explicitar como tais linhas mestras podem ser efetuadas na sala
de aula online. Esse é o tema do próximo segmento.
Pressupostos comunicacionais da avaliação da aprendizagem online
Os professores e alunos acostumados ao primado da transmissão na educação e
na mídia de massa têm agora de criar alternativas à pedagogia da transmissão e seu
modelo de avaliação da aprendizagem. Têm que desenvolver sua imaginação criadora
para atender às novas demandas sociotécnicas de autonomia, multiplicidade de
conexões, dialógica, colaboração e interatividade.
Em sala de aula online docente e discentes podem subutilizar as potencialidades
do ambiente digital e da internet se não compreenderem o conceito complexo da
interatividade. Por esse termo entenda-se a modalidade comunicacional que ganha
centralidade na era digital e na cibercultura. O conceito exprime a disponibilização
consciente de um mais comunicacional de modo expressamente complexo presente na
mensagem e previsto pelo emissor, que abre ao receptor possibilidades de responder ao
sistema de expressão e de dialogar com ele. Entendida assim, a interatividade representa
um salto qualitativo em relação ao modo de comunicação de massa que prevaleceu até o
final do século XX e cuja lógica unívoca agora se encontra ameaçada, num contexto em
que também se espera a superação do constrangimento da recepção passiva.
O tratamento aprofundado da interatividade permite reunir diversas sugestões de
atuação capazes de redimensionar a prática docente e discente entendida como
pedagogia da transmissão. Com essas sugestões o professor e os alunos poderão rever
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sua autoria na construção da aprendizagem e da avaliação, transformando o ambiente de
comunicação e tornando possível a transição de um modelo centrado na seqüência
linear, que encadeia unidirecionalmente graus, idades e pacotes de conhecimento, a
outro descentrado e plural, cuja chave é o encontro do texto e o hipertexto.
Entretanto, antes de reunir as sugestões, vale a pena detalhar alguns aspectos
desenvolvidos no livro Sala de aula interativa (Silva, 2002) que nos convidam a
concordar sobre a necessidade de investimentos em aprendizagem e avaliação
interativas.
Em primeiro lugar, o professor precisará dar-se conta do movimento próprio das
tecnologias digitais em sintonia com a cibercultura e com o perfil comunicacional dos
aprendizes. Estes aprenderam com o controle remoto e com a lógica unívoca da mídia
de massa e, doravante, aprenderão com o mouse, com a tela tátil e com as “janelas”
móveis e tridimensionais que permitem bem mais do que meramente assistir.
Prevalece o ensino centrado no falar-ditar do mestre que continua guardião da
cultura e transmissor de pacotes fechados de informações. Transmite para arquivar o
que deposita nas mentes dos aprendizes. Como se quisesse cristalizar na recepção a
crença de que quanto mais se transmite mais se apropria do conhecimento.
A modificação dessa atitude comunicacional supõe técnicas específicas, mas
requer ao mesmo tempo a percepção crítica de uma mudança sociotécnica em curso. Em
sintonia com nosso tempo o professor disponibiliza aos aprendizes a participação na
construção do conhecimento e da própria comunicação entendida como colaboração da
emissão e da recepção.
Diferentemente de transmitir para o receptor massificado, o professor aprende
com a dinâmica das tecnologias digitais e com a conectividade online e libera ao
aprendiz a comunicação personalizada, operativa e colaborativa.
O professor e alunos constroem uma rede e não uma rota. Ele define um
conjunto de territórios a explorar. E a aprendizagem e a avaliação se dão na exploração
– ter a experiência de participar, de colaborar, de criar, de co-criar – realizada pelos
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aprendizes e não a partir da sua récita, do seu falar-ditar. Isso significa modificação em
seu clássico posicionamento na sala de aula.
O professor disponibiliza a experiência do conhecimento dispondo teias, criando
possibilidades de envolvimento, oferecendo ocasião de engendramentos, de
agenciamentos, estimulando a intervenção dos aprendizes como co-autores de suas
ações.
Disponibilizar possibilidades de múltiplas experimentações e de múltiplas
expressões. Isto é precisamente o que tem à mão o designer de software, o webdesigner:
oferecer uma montagem de conexões em rede que permite múltiplas recorrências.
Assim também nós, professores, podemos modificar nossa prática comunicacional no
sentido do hipertexto e como sistematizadores de experiências.
No ambiente de aprendizagem online, nós precisaremos propor conteúdos de
aprendizagem como obra aberta na qual a imersão, a navegação, a exploração e a
polifonia possam fluir na lógica da completação, ou seja, de modo a permitir ao
aprendiz completar e não meramente contemplar. Todos os participantes poderão
contribuir com a dinâmica conectiva e colaborativa.
Para isso, temos que atentar para cuidados essenciais. Podemos compartilhar
sugestões de encaminhamento para a efetivação da aprendizagem e da avaliação
interativas na sala de aula online.
Podemos criar ambientes hipertextuais portadores de: intertextualidade,
conexões com outros sites ou documentos; intratextualidade, conexões no
mesmo documento; multivocalidade, multiplicidade de pontos de vista;
usabilidade, ambiente simples e de fácil navegabilidade intuitiva e de
transparência nas informações; mixagem, integração de várias linguagens (sons,
texto, imagens dinâmicas e estáticas, gráficos, mapas); hipermídia, integração de
vários suportes midiáticos abertos a novos links e agregações.
Podemos viabilizar a interatividade síncrona (comunicação em tempo real) e
assíncrona (comunicação a qualquer tempo, quando emissor e receptor não
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precisam estar no mesmo tempo comunicativo).
Podemos criar atividades de pesquisa que estimulem a construção do
conhecimento a partir de situações-problema, onde o sujeito possa contextualizar
questões locais e globais do seu universo cultural.
Podemos criar ambiências para avaliação formativa, onde os saberes sejam
construídos num processo de negociações, onde a tomada de decisões seja uma
prática constante para a ressignificação processual das autorias e co-autorias.
Podemos disponibilizar e incentivar expressões lúdicas, artísticas, com jogos,
simulações e objetos de aprendizagem (learning objects). Podemos oferecer
possibilidades de aprendizagem disponibilizando experimentações que
teceremos com os aprendizes.
Podemos mobilizar articulações entre os diversos campos de conhecimento
tomados como rede inter/transdiciplinar e, ao mesmo tempo, estimular a
participação criativa dos aprendizes, considerando suas disposições sensoriais,
motoras, afetivas, cognitivas e culturais.
Não são receita de bolo, mas proposições abertas a novas agregações de acordo
com cada apropriação, cada situação, cada ocasião. Para a finalidade desse texto, são
engajamentos que permitem a expressão da “avaliação mediadora” de Hoffman. Para
sua atualização na sala de aula online o ambiente de aprendizagem e de avaliação
deverá estar conscientemente preparado. Serão necessárias ferramentas e interfaces
adequadas. Podemos adotar, por exemplo, aquelas sugeridas por Schlemmer (2005, p.
141):
“Autoria cooperativa de formas, instrumentos e critérios de avaliação – permite
definir coletivamente, inserir, consultar, alterar e excluir formas, instrumentos e
critérios de avaliação;
Auto-avaliação – permite descrever, inserir e consultar o processo de
aprendizagem individual (desenvolvimento) segundo critérios estabelecidos;
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Avaliação do grupo – permite descrever, inserir e consultar o processo de
aprendizagem coletiva (desenvolvimento) segundo critérios coletivos
Avaliação do professor – permite descrever, inserir e consultar o processo de
aprendizagem individual (desenvolvimento) segundo critérios estabelecidos;
Histórico qualitativo – permite consultar e acompanhar atividades desenvolvidas
por cada um dos integrantes de uma determinada comunidade;
Histórico quantitativo – gera relatórios com dados estatísticos do ambiente, de
comunidades e individual.”
Estas sugestões são também proposições abertas a novas agregações de acordo
com cada apropriação, cada situação, cada ocasião. As comunidades de aprendizagem
estão convocadas ao compartilhamento de outras sugestões. Nosso tempo favorece tudo
isso. Favorece a “avaliação mediadora”, favorece a interatividade, favorece a educação
cidadã sintonizada com o espírito do tempo. Antes, tínhamos somente valorosos
mestres, como Paulo Freire e Piaget, nos convidando a ousar na aprendizagem e na
avaliação, doravante teremos a cibercultura, o suporte digital, a interatividade, as
comunidades de aprendizagem,o novo espectador e a sala de aula online.
Considerações finais
Na sala de aula presencial estamos acostumados ao baixo nível de participação
oral dos alunos, à ênfase em atividades solitárias, à aprendizagem mecânica de
conhecimento factual como principal objetivo do ensino, enfim, à distribuição em massa
das informações ditas “conhecimento”. Precisamos nos desvencilhar disso.
Precisamos ter claro que educação e avaliação interativas não são uma nova
tecnificação da sala de aula; que em primeiro lugar deve estar a função social da escola
e da universidade, que não é simplesmente a socialização das novas gerações no
contexto das novas tecnologias – a alfabetização digital entendida num sentido restrito:
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gerar mão-de-obra para o mercado de trabalho cada vez mais informatizado –, mas,
acima de tudo, a educação do sujeito na era do conhecimento e da aprendizagem.
Temos pela frente possibilidades de materialização de uma atitude
comunicacional que não apenas atente idealmente para a participação e para a dialógica,
mas que também as promova concretamente na materialidade da ação comunicativa.
Um contexto sociotecnico que favorece a substituição da prevalência do falar-ditar e da
distribuição em massa pela perspectiva da proposição complexa do conhecimento e da
participação ativa dos aprendizes.
Afinal, não podemos fugir à responsabilidade de disseminar um outro modo de
pensamento, de inventar uma nova sala de aula, presencial e online, capaz de educar, de
promover educação cidadã. Em lugar de meros instrutores ou apresentadores, sejamos
de fato educadores em nosso tempo.
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