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130 BRAZILIAN KEYNESIAN REVIEW, 3(2), p.130-149, 2 nd Semester/2017 O Brasil bateu no piso? Carlos Pinkusfeld Bastos 1 Gabriel Ferraz Aidar 2 1. Introdução Após oito trimestres seguidos de retração desde o início de 2015, o Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) parou de cair em 2017, registrando modestas taxas de crescimento nos três primeiros trimestres de 2017. A variação acumulada alcançou taxa negativa de 4,24% no segundo trimestre de 2016, enquanto no terceiro trimestre de 2017 ainda permanece negativa, 0,17%, ainda que apontando para o agregado do ano um tendência de pequeno crescimento. A pergunta se a economia bateu no seu “piso” ou mesmo qual o sentido de tal conceito, ou ideia, só pode ser discutida uma vez que se estabeleçam claramente os parâmetros teóricos de tal debate. Certamente, para a abordagem marginalista, a ideia do piso, aliás de uma convergência de piso e teto para a posição de pleno emprego dos fatores de produção, é a tendência normal da economia, a ser alcançada quando todas as rigidezes e intervenções que interfiram no funcionamento normal dos “mecanismos de mercado” sejam eliminadas. O presente texto adotará como perspectiva teórica a determinação do nível de produto e emprego segundo o Princípio da Demanda Efetiva, inclusive assumindo sua validade como determinante do crescimento de longo prazo. Partindo-se deste referencial, tal piso não é teoricamente garantido, dependendo do desempenho dos componentes autônomos da demanda efetivamente dispendida por agentes privados e governo dentro da economia de um país e da demanda do resto do mundo através das exportações. A utilização dos fatores de produção, no curto prazo e a capacidade produtiva no longo, ou seja, a oferta agregada efetiva e potencial, responderiam a tais decisões de demanda. Assim, a avaliação de tendências da economia depende de uma série de condições histórico, sociopolíticas, institucionais nacionais e internacionais. Dadas essa multiplicidade de fatores a serem examinados, numa primeira aproximação, é interessante anotar o que nos diz a experiência histórica. O episódio mais recente de aguda queda cíclica se deu na chamada Grande Recessão que teve como origem a crise do subprime dos EUA, cujo período mais grave se inicia após a quebra do Lehman Brothers em 15 de setembro de 2008. Neste caso, a queda não foi tão pronunciada, graças a uma maciça intervenção pública, principalmente para o socorro dos sistemas financeiros internacionais. De maneira geral, as recuperações econômicas, principalmente na Europa, foram bastante lentas. Mesmo nos EUA a velocidade de recuperação foi inferior às reversões cíclicas do pós guerra 3 . O caso mais dramático de queda profunda do PIB per capita se deu na Grécia. Este fato, entretanto, é explicado por imposições de política econômica aplicadas pela chamada “Troika” (FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu), ou seja, foi resultado de uma condição sociopolítica, ou, mais especificamente, geopolítica, muito particular 4 . 1 Professor do IE/UFRJ, [email protected] 2 Doutorado do IE/UFRJ, [email protected] 3 Ver Bivens (2016) 4 Na Zona do Euro, diferentemente de países como o Brasil, por exemplo, a liquidez dos títulos públicos é garantida por uma entidade supranacional (Banco Central Europeu) o que inviabiliza com que os

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OBrasilbateunopiso?

CarlosPinkusfeldBastos1

GabrielFerrazAidar2

1.Introdução

Apósoito trimestres seguidosde retraçãodesdeo iníciode2015,oProduto InternoBrutoBrasileiro(PIB)paroudecairem2017,registrandomodestastaxasdecrescimentonostrêsprimeirostrimestresde2017.Avariaçãoacumuladaalcançoutaxanegativade4,24%nosegundo trimestre de 2016, enquanto no terceiro trimestre de 2017 ainda permanecenegativa, 0,17%, ainda que apontando para o agregado do ano um tendência de pequenocrescimento.Aperguntaseaeconomiabateunoseu“piso”oumesmoqualosentidodetalconceito, ou ideia, só pode ser discutida uma vez que se estabeleçam claramente osparâmetrosteóricosdetaldebate.

Certamente, para a abordagem marginalista, a ideia do piso, aliás de umaconvergênciadepisoe tetopara aposiçãodeplenoempregodos fatoresdeprodução, é atendêncianormaldaeconomia,aseralcançadaquandotodasasrigidezeseintervençõesqueinterfiramnofuncionamentonormaldos“mecanismosdemercado”sejameliminadas.

O presente texto adotará como perspectiva teórica a determinação do nível deprodutoeempregosegundooPrincípiodaDemandaEfetiva,inclusiveassumindosuavalidadecomodeterminantedocrescimentodelongoprazo.Partindo-sedestereferencial,talpisonãoé teoricamente garantido, dependendo do desempenho dos componentes autônomos dademandaefetivamentedispendidaporagentesprivadosegovernodentrodaeconomiadeumpaís e dademandado restodomundoatravésdas exportações.Autilizaçãodos fatoresdeprodução,nocurtoprazoeacapacidadeprodutivanolongo,ouseja,aofertaagregadaefetivaepotencial,responderiamataisdecisõesdedemanda.

Assim, a avaliação de tendências da economia depende de uma série de condiçõeshistórico,sociopolíticas,institucionaisnacionaiseinternacionais.Dadasessamultiplicidadedefatoresaseremexaminados,numaprimeiraaproximação,éinteressanteanotaroquenosdizaexperiênciahistórica.

OepisódiomaisrecentedeagudaquedacíclicasedeunachamadaGrandeRecessãoquetevecomoorigemacrisedosubprimedosEUA,cujoperíodomaisgraveseiniciaapósaquebra do Lehman Brothers em 15 de setembro de 2008. Neste caso, a queda não foi tãopronunciada, graças a uma maciça intervenção pública, principalmente para o socorro dossistemas financeiros internacionais. De maneira geral, as recuperações econômicas,principalmente na Europa, foram bastante lentas. Mesmo nos EUA a velocidade derecuperaçãofoiinferioràsreversõescíclicasdopósguerra3.OcasomaisdramáticodequedaprofundadoPIBpercapitasedeunaGrécia.Estefato,entretanto,éexplicadoporimposiçõesde política econômica aplicadas pela chamada “Troika” (FMI, Comissão Europeia e BancoCentral Europeu), ou seja, foi resultado de uma condição sociopolítica, ou, maisespecificamente,geopolítica,muitoparticular4.

1ProfessordoIE/UFRJ,[email protected]/UFRJ,[email protected](2016)4NaZonadoEuro,diferentementedepaísescomooBrasil,porexemplo,aliquidezdostítulospúblicosé garantida por uma entidade supranacional (Banco Central Europeu) o que inviabiliza com que os

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Outro caso, ainda mais dramático de queda pronunciada do PIB por um prazo detemporelativamenteextenso5éodaRússia.Entre1993e1998,segundodadosdoWEO/FMI,oPIBdessepaíscaiu30%.Deve-seanotarocenárioparticularmentedramático,caracterizadopeloconturbadofimdoregimecentralmenteplanejadoeosurgimentodeumaeconomiademercadonaRússia,umprocessoque incluiu“reorganização” territorialeeliminaçãodaáreadecomérciocomospaísesdaEuropaOriental.Mesmoassim,cercadeumadécadadepoisdadesintegração da antiga URSS, a Rússia começa a empreender uma vigorosa recuperação,aindaquepartindodeníveisdeprodutomuitobaixos.

Essamuitosucintadiscussãosobrealgumaspoucasexperiênciashistóricasnoslevamapensar se não haveria, como um “inverso” do clássico limite político ao pleno emprego deKalecki(1943);algumlimitepolítico,ousocial,àdebacleeconômica.

Como ilustrado, os casos mais dramáticos contaram com mudanças políticos-institucionais significativas. É de se supor que quando isso não ocorre, há uma inérciainstitucional maior, ou seja: uma não ruptura da institucionalidade pré-crise, acaba sendofavorávelàexistênciadeumpisoquecontribuaparaevitarquedaspersistentesdoproduto,aindaqueemnadajustifiquemumaretomadavigorosa.Combasenoarcabouçodademandaefetiva,essepisonaturalmentedeveestarassociadoaodesempenhodealgumcomponenteautônomodademandae,emespecial,domesticamente,aogastopúblico.

É esta hipótese teórica que pretendemos analisar no restante desta nota.Basicamente, busca-se apontar que a aparente estabilização do produto, seria resultado deuma inércia institucional, ou a operação de instrumentos de incentivo à demanda,relativamente“automáticos”ouaomenosnãodiscricionários.Ironicamente,umadaspoucasbasesdesustentaçãodeumgovernocomíndicesdeaprovaçãoextremamentereduzidos,qualseja, a melhoria de indicadores macroeconômicos, é resultado, como veremos, de fatoresinstitucionaisquesãoalvodecríticasepropostasdereformaspeloprópriogoverno.

A demonstração de tal hipótese se fará com a apresentação de dadosmacroeconômicos partindo de um nível mais agregado possível e depois a análise decomponentes de demanda e de desempenho da oferta, com algum grau de desagregaçãosetorial.Finalmente,examinamososcondicionantesdocomportamentodoscomponentesdademandaefetivaesuasperspectivasnomédioprazo.

2.Quadrogeraldodesempenhodoníveldeatividade

Após oito trimestres de queda contínua, o PIB trimestral sai do “vermelho”apresentando taxas positivas de crescimento nos três primeiros trimestres de 2017, comopode-seobservarnosGráficos1e2.Nãosedevedesprezaradimensãodaquedadoprodutoexperimentadaentre2015e2016.Elaéamaior combinaçãohistóricanoBrasile semostraaindamaisdramáticaemtermosderendapercapitaumavezqueobservamosquede2014atéoprimeirosemestrede2017,oPIBpercapitasereduziuem10,4%.

bancoscentraisnacionaisatuemparagarantiraliquidezdosmercadosdetítulosdomésticos.ParaumadescriçãodessarelaçãonoBrasil:Resende(2009)ePimenteleSerrano(2016).5Valeanotarquenãoestamoslevandoemconsideraçãoeventosquerefletemefeitosdevastadoresdeguerrasouepidemias.

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Gráfico1:SérieEncadeadadoPIB(semaj.sazonal)–4ºtri/2013=100

Fonte:IBGE.ElaboraçãoPrópria

Gráfico2:Variação(%)doPIB–ContasNacionaisTrimestrais

Fonte:IBGE.ElaboraçãoPrópria

Curiosamente,apesardodadodoprimeiro trimestre sermaisexpressivoemtermosde crescimento contra o trimestre anterior que o do segundo e terceiro (e não quandocomparadocontraomesmotrimestredoanoanterior)nogeralpode-seconsiderarqueestesapresentam um desempenho que poderia ser consideradomelhor. Em relação ao segundotrimestre foi a primeira vez, desde o início de 2014, que a variação do PIB foi positiva nacomparaçãointeranual,fatoestequeserepetenoterceirotrimestrede2017.

Inicialmente, amaior taxadoprimeiro trimestrede2017éobtidaquando calculadacontra o trimestre anterior, que por sua vez foi um período de forte retração da atividadeeconômica.Contraomesmotrimestrenoanode2016oresultadoaindafoinegativo.Outro

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tri/trianterior tri/mesmotrianoanterior últimos4tri/4trianteriores

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fator importantediz respeitoaoscomponentesdademanda:noprimeiro trimestrede2017,foraasexportações,todososcomponentesdedemandativeramcontração.Ainda,emrelaçãoa este trimestre, Lara, Serrano e Summa (2017) mostram que a acumulação de estoques,possivelmenteindesejados,podeexplicarumdesempenhomenospiorpeloladodademanda.Conformeargumentamos autores, o crescimentodos estoquesnoprimeiro trimestredesteanofoimuitosuperioràmédiahistórica.Noentanto,ocomportamentodoscomponentesdademandaefetivanãopareceucorroboraroacúmulodeestoquesnoiníciodoano.Ouseja:nãopareceu ter havido uma elevação da demanda agregada que justificasse umaelevação/correçãodosestoquesdesejados.

Jánosegundoeterceirostrimestresde2017,alémdeumdesempenhomelhorcontraomesmoperíododoanoanterior,oprincipalcomponentedademandaagregada,oconsumo,teve uma taxa positiva de variação, com crescimento no terceiro trimestre, tomando-se oíndice encadeado, de 2,22%. Especificamente, o primeiro trimestre de 2017 apresentou aprimeiravariaçãopositivadesde2014e,adicionalmente,nessetrimestreavariaçãonegativados estoques tendem a mostrar que houve uma correção em relação ao crescimento notrimestre anterior. Tomando em conjunto os três trimestres observa-se uma quaseestabilidade,comcrescimentoanualde0,6%.

Gráfico3:Contribuições(%)ParaoCrescimento–trimestre/trimestreanterior6

Fonte:IBGE.ElaboraçãoPrópria

Em resumo, dos dados do PIB tiramos uma trajetória de recuperação frenteprincipalmenteaomergulhorecessivodosegundosemestrede2016.Algunsindicadorespelolado da oferta confirmam a hipótese de fim da queda e leve recuperação da atividadeeconômicaem2017.OGráfico4apresentaodesempenhodasatividades,indústriaeserviços,queperfazemmaisde90%daoferta.

6Utilizou-seamesmametodologiautilizadaemSumma,LaraeSerrano(2017).

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PIBaPreçosdeMercado Dem.Efetiva Estoques

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Gráfico4:Atividade–ÍndicedeBaseFixa(comaj.sazonal)

Fonte:IBGEeBCB.ElaboraçãoPrópria

Tanto serviços como indústria contam uma história semelhante ainda que nãocoincidente em sua temporalidade: a indústria foi o primeiro setor a entrar no terrenonegativoemtermosdetaxasdevariaçãoetambémademorarmaisaencontrarseuvalormaisbaixo:34meses.Aquedaentrepicoevalechegouaquase20%,maspartirde2016,osetorapresenta uma leve tendência de recuperação, ainda assimmuito limitada: entre o vale dealcançadoemfevereirode2016enovembrode2017,arecuperaçãoatingiuapenas6%.

Os dados de serviços e comércio, até pela superposição estatística, apresentamcomportamento semelhante. Demoraram mais a começar a cair, a partir de um pico deatividade (Outubro e Novembro de 2014 para o comércio e serviços respectivamente), eregistraram uma duração entre pico e vale mais curta: 28 meses para serviços e 26 paracomércio. A recuperação do comércio a partir do vale é semelhante a da indústria numperíodobemmais curtode tempo, resultadoqueé consistente comosdadosagregadosdemelhoria do consumo no segundo e terceiro trimestres. Já em relação aos serviços não sepodefalarclaramentenemdeumatendênciadeleverecuperação;osdadosdisponíveisatéomomento da entrega deste artigo apontam apenas uma estabilidade, sendo que após ocrescimentodoprimeirosemestre,ostrêsúltimosmesesencerradosemsetembrotrouxeramumavariaçãonegativa.

Comovariávelchave,nãoapenaspeloseuimpactonoconsumocomotambémpelosseusfortesimpactossociaisepolíticos,éimportanteanalisaravariávelemprego.Existemduasfontes de dados relevantes: o Cadastro Geral de Empregado e Desempregado (CAGED) e aPNADcontínua.Oprimeiroreportadadosdomercadoformalenquantoosegundocobretodasasocupações,incluindoasatividadesinformais.

OGráfico5,mostraquenoacumuladodedozemesesosaldodecriaçãodeempregoschegouao seu valeemmarçode2016.Apartir deentãoa tendência édemelhora, porémpermanecendo o acumulado no terreno negativo. Este saldo só entra no terreno positivo apartir de abril de 2017, entretanto, em valores historicamente bastante baixos. Para se terumabasedecomparação:amédiadessesseismesessequencialmentepositivosde2017 foi

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IndústriaGeral IndicedevolumedeServiços

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deaproximadamente35.000postosdetrabalho,enquantoqueem2014,quandoaeconomiajáapresentavaclarossinaisdedesaceleração,noúltimoperíodoemqueoempregocresceupersistentementeporseismeses,amédiaentreabrileoutubrodaqueleanosfoimaisqueodobrodaregistradaem2017.

Gráfico5:Emprego–CAGEDePNADContínua

Fonte:MinistériodoTrabalho/CAGEDeIBGE.ElaboraçãoPrópria

Os dados da PNAD contínua confirmam o quadro do emprego formal descrito pelaCAGED.Marçode2017éumpontodeinflexãoapartirdeumpicodedesempregode13,7%eatéOutubroestevalorrecuoupara12,4%.OdadorelevantequeaPNADnostráséumacertapiora das condições estruturas do mercado de trabalho, ou seja, um crescimento daparticipação de trabalho sem carteira e por contra própria no total do emprego, sendointeressantenotarqueatendênciajáéperceptíveldesde2014.Aparticipaçãodossegmentos“empregador”, “conta própria” e “trabalhador familiar auxiliar”, todos sem carteira detrabalho, aumentou de 41,4% da força de trabalho, em outubro de 2014, para 44,4% emnovembrode2017.

Finalmente,quantoaomercadodetrabalhoaoutravariávelrelevanteéosalárioreal.Tantonoindicadordosaláriorealdenovasadmissões(CAGED)quantonoindicadormaisgeralfornecido pela PNAD Contínua (rendimentomédio real de todos os trabalhos), há aumentodessavariávelem2017.Assim,pelodadodaCAGED,namédiaentrejaneiroasetembrodesteanoversusomesmoperíododoanterior,háaumentode4%dorendimentoreal.JáamédiaparaomesmoperíododaPNADapontacrescimentode2,1%dorendimentoreal.

2.Componentesdademandaagregada

2.1Exportações

Na introdução deste texto anotamos que procuraríamos analisar a dinâmica daeconomia segundo os componentes da demanda efetiva, especificamente os gastosautônomos,quepoderiaminterromperatrajetóriaderetraçãodaeconomiainiciadaem2014eque seaprofundaapartirde2015. Indicamos tambémque,numaeconomia cujoníveldeproduto é determinado pela demanda efetiva, em princípio não haveria um piso dado pelaoferta.Noentanto,historicamente,verifica-sequemesmoprofundasdepressõesencontram

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pontosdeviradaquerefletemalgumtipoderesistênciahistórico/institucionalàdeterioraçãosocialadvindadaquedadoníveldeatividade.

Umcomponentededemandaquepodeterumpapelmuitoimportanteemqualquerrecuperaçãosãoasexportaçõesenestecasoparticularnãosepode falarexclusivamentedealgumacaracterísticainstitucionaldoméstica.Emverdade,ascondições,oumelhor,mudançasnascondições internacionais,podemterumefeitocontrárioaopçõesdepolíticaeconômicacontracionistas,comoocorreuem20037.Poroutrolado,umasériedeelementosdenaturezainstitucional, de estrutura e mesmo de política econômica podem ter efeito sobre estavariável. No primeiro caso, poderíamos elencar uma eventual mudança na inserçãogeoeconômica ou geopolítica como entrada em algum acordo de comércio bilateral oumudanças relevantes na estrutura legal do comércio exterior; no segundo, uma eventualmaturação de algum projeto de mudança produtiva associado a umamelhoria da inserçãoexterna.OcasoclássicodeumeventodessanaturezafoiamaturaçãodosinvestimentosdoIIPNDnadécadade1980quetrouxeumaimportantemelhoradascontasexternasapartirde1984.Finalmente,emrelaçãoàdecisãodepolíticadeeconômicadoméstica,avariávelqueseassociadiretamenteaocomércioexterioréataxadecâmbioefetiva(podendoserlevadoemconsideração,inclusive,algumsubsídioàexportação).Nestecaso,nocurtoprazo,objetodestanota, uma desvalorização cambial poderia ter efeitos sobre exportação em setores cujoscustossalariaisfossemmaisrelevantes(intensivosemtrabalho)e,obviamente,desdequeosdados empíricos de elasticidade de comércio exterior respeitassem a condição deMarshallLerner8.

Numaperspectivamacroeconômica,entretanto,comoésabido,asexportações tem,em relação ao crescimento, um duplo papel: por um lado, afetam diretamente a demandaagregadaeporoutro, aomelhorar as contas externas, reduzema restriçãoexterna abrindoespaço para uma maior expansão de gastos domésticos sem forte deterioração da contacorrente(MedeiroseSerrano,2001).

Estamos mais interessados aqui em examinar o primeiro efeito. Assim, temos queatentar para quatro efeitos: a evolução do quantum, preço, composição e câmbio.O efeitosobreademandadecorredoaumentodarendaemmoedalocal,esecundariamentenosetorcuja expansão da exportação ocorreu, ou seja, o efeito multiplicador das exportações. Talimpacto sobre a demanda resulta de uma combinação de fatores: aumento na demandaexterna(sejapelocrescimentodarendadosimportadorese/ouganhosdecompetitividadedopaísexportador),variaçãodepreçosinternacionaisevariaçãodocâmbio.OGráfico6mostraquenoperíodonoBrasil,estascondiçõesnemsempreforamcoincidentes.

7 Bastos e Lara (2015)mostram como a expansão das exportação de commodities, a partir de 2003,contrabalançaram as políticas contracionistas domésticas neste mesmo ano, ainda que tenham sidoincapazesdeevitarumaexpressivareduçãodataxadecrescimentodoPIB.Otextoexploraahipótesequeapercepçãoequivocadaemrelaçãoasmedidascontracionistas,decertaforma“mascaradas”poreventonãoesperadointernacional,sejamumdosmotivosparaadoçãodaspolíticasmacroeconômicas,queserevelaramdesastrosasem2015.8 No curto prazo deve-se lembrar que a combinação de aumento do volume das exportações devecompensaraeventualreduçãodosseuspreços,queastornariammaiscompetitivas,aconhecidaCurvaJ.NummédioprazoFreitas,FerrarieFilho (2013)mostramque mudançascambiaispoderiamtornarcompetitivos setores com maior elasticidade renda os quais, endogenamente, elevariam suaparticipaçãono totaldasexportaçõesdada suamaior taxade crescimento. Entretanto, este seriaumcaso de médio prazo, qual seja o estabelecimento de setores industriais que passariam a ser maiscompetitivosnomercadointernacional.Talprocessodemelhoriadainserçãointernacionalestariaforadoescopodeumaanálisedeconjuntura.

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Gráfico6:ExportaçõesTotais(Brasil)–Índice(2006=100paraquantume2008=100paravalor)

Fonte:IPEADATA.Elaboraçãoprópria

A queda de preço das exportações brasileiras (medidas em reais) fez com que essecomponente autônomo contribuísse negativamente para a demanda agregada entre osegundo semestre de 2014 e primeiro semestre de 2015. A forte desvalorização do câmbionominal a partir de 2015 acabou por provocar uma expansão das exportaçõesmedidas emreais fazendo delas um componente de expansão da demanda autônoma, embora semcompensarnamesmaproporçãoaquedadademandainternadevidoasuabaixaparticipaçãono PIB. A partir de 2016, o aumento das exportações em reais é puxado, dessa vez, poraumentodoquantum,influenciadopelasafraagrícola,erecuperaçãodospreços.Essesefeitospositivos, contudo, foram contrabalanceados por uma valorização do câmbio, reduzindo oritmodoimpactopositivoexercidopelosetorexterno.

Osbensmanufaturadostêmumcomportamentobastanteestável (quealiásperduradesde 2009), comumapequena redução a partir do final de 2014 e uma tambémmodestarecuperação a partir de 2016, e relativa estagnação em 2017. Ou seja, a desvalorizaçãocambial em termonominais que ocorreu de formamais pronunciada entre julho de 2014 eJaneirode2016 (82,2%)não foi capazdecompensaradeterioraçãodos termosde trocanoperíodo o que, combinado com uma expansão medíocre do quantum de exportações,principalmente de manufaturados, resultou numa queda da receita com as exportações,reforçandoasfortesmedidasrecessivaspós2015.

EssesdadossãoconsistentescomopapelrelevantedasexportaçõesparaoresultadodoPIBdoprimeirotrimestrevistosanteriormente(Gráficos1,2e3).Entretanto,cabeindagarse tal desempenho, ou seja, uma manutenção de taxas de crescimento, ou mesmo suaaceleração,emreais,compõeumcenário,plausível.

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Básicos(quantum)-mm12 Manufaturados(quantum)-mm12

Total(quantum)-mm12 Valor(US$)-mm12

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Inicialmente, independenteda avaliaçãode curtoprazoquanto ao efeitodo câmbiosobreexportações9,émuitopoucoprovávelqueoBancoCentralinicieumarodadadereduçãodejurosapontodeestimularumapersistentedesvalorizaçãocambial.Aatualadministraçãodo BACEN além de colocar a política anti-inflacionária como meta a ser ferrenhamenteperseguida, tem que contar com uma gestão de política econômica em relação a preçosadministrados bastante agressiva repassando de forma direta choques de custos10. Logo, édifícil esperar que desvalorizações cambiais estejam num horizonte plausível de políticaeconômica11 e assim o crescimento em reais da renda dos exportadores impactando ademandadoméstica.Também,umaelevaçãopersistentesejadademandaexternaemtermosde quantumdas commodities ou de seus preços, não parece em linha comas previsões deevoluçãodaeconomiamundial12.

Gráfico7:ProduçãoxExportaçõesdeVeículos–2014=100(comaj.sazonal)

Fonte:FuncexeIBGE.Elaboraçãoprópria.

Chama a atenção no Gráfico 7, a recente elevação das exportações dematerial detransporte sem crescimento equivalente da produção, o que aponta para a exportaçãoestabilizandoaproduçãodadoumconsumodomésticodeprimido.Este comportamentodas

9 Comomencionado anteriormente no curto prazo para que esse efeito seja positivo em termos debalançodepagamentoénecessárioquealgumascondiçõesdenaturezaempíricassejamsatisfeitas.10EstapolíticadivergebastantedaadotadanogovernoDilmaRousseffquandoospreçosadministradosforam usados sistematicamente para conter a inflação (Summa e Braga, 2014). A “correção” de taispreçosdefasadosfoiumdosfatoresquecontribuiuparaadepressãoeconômicainiciadaem2015.11Umanota“positiva”dobaixocrescimentoéumanaturalmelhoranabalançacomercialeassimdastransaçõescorrentes.EstefatoassociadoapersistentepolíticamonetáriaexpansionistadosEUAdeixamqualquerpossibilidadedeumacrisecambialpraticamenteinexistente.Mesmoumapossívelmoderadaelevaçãodaprime rate americana, quepoderáocorrer em2018, nãopareceque terá capacidadedealterarsubstancialmenteasituaçãodefinanciamentoexterno.12SegundooTradeanddevelopmentReportde2017daUNCTAD“Worldtradeislikelytopickupthisyear from its very sluggishperformance in2016,but therearedoubts about the sustainabilityof theexportsurgefromemergingmarketsthatunderliesthisimprovement.Givenweakworldwidedemand,globaltradeisunlikelytoserveasabroadstimulusforgrowth,otherthanforparticularcountriesthatbenefitfromspecialcircumstances.”(p.V)

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ProduçãodeVeículosautomotores,reboquesecarrocerias

ExportaçõesdeVeículosautomotores,reboquesecarrocerias

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exportações não parece decorrer de nenhum ganho expressivo de competitividade e nemcambial13,ouseja,parecederivardeestratégiasdasgrandesfirmasoligopolistasdosetorcujasustentaçãonolongoprazocareceriadeumatendênciasustentadadeexpansão.

Aindanofrontexterno,cabeespecular,sobreumaexpectativarealistafavorávelquedecorredapossívelexpansãodaproduçãodepetróleoeelevaçãodoseupreço14.Dequalquerforma,nestecaso,oefeitocomposiçãodasexportaçõestemqueserlevadoemconsideração.É sabidoqueo setor temumbaixo impactoemempregoenaatual conjunturapolíticanãoestá claro se a Petrobras irá investirmais em termos de criação de nova capacidade e se oinvestimento das operadoras internacionais, que vem crescendo recentemente suaparticipação, terão conteúdo importado muito elevado, que represente vazamentos dademandaparaoexterior.

Emresumo,noquedizrespeitoàdemandaexternanãosepodeesperar,apartirdosdados e perspectivas correntes, que exerça uma força de empuxo expressiva em termos decrescimentodoproduto.

2.2Consumo:saláriosecrédito

Atépela suadimensão, um componente central a ser examinadoéo consumo, queinclusivecomovimosnaseçãoanterior,tevecrescimentonosegundoeterceirotrimestresde2017. Para examinar o consumo é preciso dividi-lo em dois componentes: o induzido quedependedafolhasalarial(elevaçãotantodoempregocomodosalário)maistransferênciasdogovernoedoautônomo,ouseja,doconsumoacrédito.

Já observamos que a folha salarial se elevou e aqui encontramos um daqueleselementosinstitucionaisquecertamentecolaborouparaaeconomiachegaraumpisodeníveldeproduto.Estepiso foidecorrentedeuma inércia institucionalsoba formadereajustedosaláriomínimoregidopelopicorealdoanoanterioreumganhodocrescimentorealdoPIBdedois anos anteriores15. Em 2017, o reajuste de 6,48% (considerando o INPC de 2016)representou um aumento médio real significativo neste ano, uma vez que a inflaçãoacumulada em12meses gira em torno de 2,70%, resultado que teve como fator positivo apolíticadevalorizaçãocambialdoBCB,explicitandoarelaçãoentreessavariável,saláriorealeconsumo.Ouseja,comopode-seobservarnoGráfico8,aindaqueoPIBnãocresça,comumainflação que se reduz o ganho de salário médio dá um efeito positivo sobre o consumoinduzido16,principalmentenumprimeiromomentodesaláriorealdepico.

Emtermosderendaextramercado,atravésdastransferênciasdaprevidência,comoserá visto mais a frente, o reajuste do salário mínimo tem um segundo efeito sobre oconsumo.Porémaelevaçãodosaláriomínimo,perse,temefeitoonceandforallemtermosdeconsumo.Exerceriaumefeitodinâmicocasofossecapazdeafetaromercadodetrabalhoatravésdeumaquecimentodomesmoquelevassearodadasdereajusterealdosalárioouoinvestimento, componente que serámelhor explorado abaixo.Ou seja, se pode representar

13Ataxadecâmbiorealapósumciclodedesvalorizaçãoiniciadaem2015voltouaosíndicesde2014,valores reconhecidos como não exatamente “competitivos” pela maioria dos autores. Talvez umareferência.14Arecentematuraçãodosinvestimentosemexploraçãonacamadadopré-saleaumentodaproduçãodaPetrobrasreforçamahipótesedeaumentodaprodução.JáopreçodobarrildePetróleoBrent,tevecrescimentode35%noperíodoentreosmesesdenovembrode2017e2016.15 Conforme Lei no 13.152/2015, aprovada ainda no governo Dilma. Caso não seja alterada, esta Leidefiniráosreajustesaté2019.16Sobreoimpactodosaláriomínimosobreaestruturadesalários,verMedeiros(2015).

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um piso para o produto, o comportamento em 2017 do salário mínimo não pode serentendidocomoumcomponentededinamizaçãodademandaem201817.

Gráfico8:SalárioMínimoRealxRendimentomédioreal(PMEantiga)

Fonte:IBGEeIPEADATA.Elaboraçãoprópria.

Quantoaexpansãocreditícia,atéoutubrode2017,pode-seobservarnoGráfico9umamodestarecuperaçãofrenteaosresultadosde2016,noquetangeàconcessãodecréditoàspessoasfísicas,masestagnaçãonocréditoàspessoasjurídicas.

Gráfico9:ConcessãodeCrédito–R$Bilhões(apreçosdeNov/17)

Fonte:BCB.Elaboraçãoprópria

Esse resultado é esperado posto que nenhum elemento, o qual poder-se-ia elencarcomorelevanteparaumamaisforteexpansãodocrédito,sefezpresentenoperíodo.

17Nopróximoano,oreajustelevando-seemcontaainflaçãode2017ficará,provavelmente,abaixodainflaçãoesperadapara2018.

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PJ PF 12per.Mov.Avg.(PJ) 12per.Mov.Avg.(PF)

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Pelo lado da oferta, ou das condições de acesso ao crédito, nenhuma inovaçãofinanceira de monta (como a expansão do crédito consignado em 2004) ou reduçãosubstancialdospreadfoipercebida.

Pelo ladodademanda,apesardeumarecuperaçãodafolhasalarial,estanãopareceterumadimensãocapazdealavancarumnovociclodeexpansãocreditícia.Aliás,essepareceter sido exatamente uma das questões que explicaram a desaceleração durante o segundogovernoDilma Rousseff: o estancamento da expansão de crédito e com isso a redução dastaxas de crescimento do consumo autônomo. Ainda que as razões para tal comportamentonãoestejamaindatotalmentecompreendidas,certamentealgumasdasrazõesquepodemserlistadassão:a)aaltataxadejurospagapelostomadoresdecréditodepessoasfísicas,inferiorà taxa de crescimento de sua renda; b) o decrescimento da taxa de geração de empregosformais e consequentementeda folhade salário (emboraesta variação continuassepositivaaté2015)tornandoodiferencialdecrescimentorendaejurosmaisnegativo;ec)elevaçãodainadimplência18.

Assim, umamoderada retração da demanda por crédito em2015 (partindo de umabase já deprimida) não foi capaz de provocar uma desalavancagem que pudesse indicar oiníciodeumnovocicloexpansivodecrédito.Valeanotarque,nestecaso,avariávelemníveltemrelevânciasobreovalordataxa:valoresmuitobaixosdecomprometimentodarendaporcrédito(ourelaçãocréditoPIB)numprimeiromomentopodemgarantirumataxadeexpansãomuito elevada do crédito, o que é menos provável numa economia cuja relação deendividamentosobrePIB(ourendadotrabalho)émaiselevada.

Um dado que acompanha esse quadro de moderada evolução positiva é própriainadimplênciadaspessoas físicasapresentouumamelhoraentrenovembrode2016e2017,caindode4,1%para3,8%dototaldasoperações,segundodadosdoBancoCentral.

Entretanto,outracaracterísticapresentenofortecicloexpansivodecréditoapartirde2004nãopareceestarpresentenoatualmomento,alémdasquestõesrelativasaonívelinicialde endividamento e da falta de uma perspectiva de sólido crescimento de salário e renda.Também não parece haver no horizonte de curto prazo propostas para possíveis inovaçõesfinanceiras. Como se sabe, no ciclo de 2004 a concessão de crédito consignado teve papelimportante no início do ciclo e que, posteriormente, foi reforçado pela forte ampliação domercadoformaldetrabalho,eelevaçãodafolhasalarial.

O que se apresenta como panorama de curto prazo é exatamente o inverso destequadro. A reforma trabalhista, aprovada pelo Congresso em 2016, permitirá relações detrabalho mais flexíveis e mesmo a previdência (outra fonte de expansão do créditoconsignado)vemsendoalvodepropostasdereformasque limitariamosseusbenefícios.Ouseja, menos empregos formais e beneficiários da previdência implica menos consumidoreselegíveis a tomarem credito do sistema financeiro. É claro que essa é uma característicaestrutural do sistema financeiro brasileiro. Nos EUA, por exemplo, o sistema financeiro seexpandiuparafornecercréditoatomadoressubprimenummovimentoque,comomostrouacrisede2008,nãoestálivredeseuspercalços.

Édeseperguntarseosistemafinanceirobrasileirocaminhaparaamesmatrajetóriainstitucional norte americana.Nopresentemomento tal cenárionãoéprovável, eoque setemsãopráticasusaismaisrestritivasemrelaçãoàdefiniçãodetomadoreselegíveis.

Háquesenotar,noqueconcerneoconsumotambém,queapesardodiscursoqueemalguns momentos se aproxima da ideia de contração expansionista do atual governo, uma

18Esse fenômeno atingiu fortemente as empresas, como reflexo da queda do faturamento em decorrência da retração do nível de atividade.

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decisãoexpansionistadepolíticapública,aliberaçãodoresultadodoFGTS(MPno763/2016)paracontasinativas,teveoimpactoesperado,erepresentouumainjeçãodepoderdecompradecercadeR$44bilhões,segundodadosoficiais19.Nãohádisponíveldadosabertossobreodirecionamentodessedispêndio,mastendosidoessesrecursosutilizadosparapagamentodedívidasbancárias(abrindolimitedecréditoparaessaspessoasfísicas20)ouparaconsumo,seuefeitosobreépositivoemtermosdeexpansãodoprodutoviaconsumo.

Por todas as razões elencadas acima, assim como nas exportações, a expansãoautônomadademandaviaconsumoacrédito,apesardeprovavelmentejáterbatidonoseupiso, como atesta a leve recuperação de crédito tanto de estoque quanto de novascontrataçõesem2017,nãoapontacomoumelementodeforteexpansãonofuturopróximo.JáumainjeçãodepoderdecompracomonaliberaçãodoFGTS,equivalentedopontodevistamacroeconômico a transferências do setor público (embora seja um fundo privado e nãotenhareflexosobreascontaspúblicas),nãodeveserepetirnamesmaproporçãoem201821.

Gráfico10:ConcessõesdeCréditoImobiliário(Total)–R$Bilhões(apreçosdeNov/17)

Fonte:BCB.ElaboraçãoPrópria

Aconstruçãocivil,outrocomponentededemandaautônoma,pareceseenquadraremcomportamentosemelhanteaoscomponentesdescritosatéaqui.Umquadrodeestabilidadee/ou modesta recuperação, dependendo do indicador analisado, e mesmo da localizaçãogeográfica. Como o setor de construção civil é fortemente ligado à concessão de crédito éinteressanteexaminaresta variável. Comoesperado,noGráfico 10, temosuma fortequedaque se inicia em 2015 e um panorama de estagnação em 2017. Nas subseções que serão

19 https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/08/07/Qual-o-resultado-do-programa-de-saques-do-FGTS.20De fato a inadimplênciaparaPessoas Físicas se reduzem0,2p.p. duranteoperíodode saquesdoFGTS(entremaio/17ejunho/17).21 PormeiodaMPnº797/2017, o governoautorizou a liberaçãopara saquesde cotasdoPIS/PASEPparahomens(acimade65anos)emulheres(acimade62anos).OGovernoestimaumsaquedecercade R$ 15,9 bilhões, segundo anúncio oficial. Essas liberações ocorrerão até dezembro de 2017(http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2017/10/governo-inicia-calendario-de-pagamento-do-pis-pasep).EssevalorrepresentamenosdametadedosaldoliberadopeloFGTS.

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ConcessõesCréditoImobiliárioRealTotal

12per.Mov.Avg.(ConcessõesCréditoImobiliárioRealTotal)

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discutidososgastospúblicoseos investimentosprivados, veremosaindaoutros indicadoresqueapontamnomesmosentidodeestagnaçãonosgastosemconstruçãocivil, apósa fortequedade2015e2016.

Emresumo,comooconsumoacréditoe,ademais,todooquadroatéagoradescrito,na construção civil tem-se uma trajetória de estagnação com leve recuperação no segundosemestre de 2017. Especificamente neste caso, há um fator de política econômica quecontribuiuparaomaudesempenhodosetor.Umaparcelamuitoexpressiva,superiora60%dasvendaselançamentosdeimóveisestãoassociadosaoprogramaMinhaCasaMinhaVida,programaesse,quecomotodososgastosdiscricionáriosdogovernofederaltiveramumaforteredução,comoseveránasubseçãoseguinte.

2.3.GastosPúblicos

Outrocomponentedademandaautônomaquetemosqueanalisaréogastopúblico.Nestecasoexisteumagarantiainstitucionalparaqueestenãovenhaasetornarumvetorderecuperação da economia, uma vez que a nova Emenda Constitucional 95/2016 proíbe quehajaumaexpansãodototaldegastosemtermosreaisdeumanoparaooutro.Essa,aliás,éuma questão que não pode escapar ao economista que queira avaliar as perspectivas decrescimento futuro da nossa economia. No período recente, desde a estabilização do PlanoReal(quepodemosconsiderarumamudançarelevanteapontodeseestabelecerumquebraestrutural),aeconomiabrasileiravemregistrandotaxasdecrescimentoqueoscilamemtornode 3%22 com uma taxa real de crescimentomédia do gasto público federal de cerca de 6%(entre1998e2014).Seessataxacairazero,haveráumimpactonegativodiretosobreataxadecrescimento,quesóseriacompensadacasoa)houvesseumarelaçãodiretaentrevariaçãodosgastos(enãodéficit,jáqueesteéresidual,epodeatésubircomareduçãodosgastos)ejurosbásicosdaeconomiaeb)umaforteelasticidadeentrejuroseinvestimento.

Ambasasafirmaçõessãoalvodeextensacontrovérsiaenãotemsustentaçãoempíricainequívocanasdiversasestimativasempíricasdisponíveis23.Tendoemvistaaindaomomentorecessivodocicloeconômicoquepassaaeconomiabrasileira,jácomjurosreaisemqueda,aexpectativamais concretano curtoprazoéquea reduçãoda taxade crescimentodo gastopúblicoazeroreduzaaindamaisatrajetóriadecrescimentodaeconomiaanomédioprazo.

Emumaanáliseconjuntural,éimportantesaberseogastopúblicoestátendo,ounão,um impacto claramente negativo na trajetória corrente do PIB. Nota-se na tabela 1, que apartirde2015,asdespesasprimáriasdoGovernoCentral(queexcluisomenteasestataiseosgovernosregionais)apresentafortereduçãonoseucrescimentoecresce,emtermoreais,nobiênio2015e2016,emmédia,1,3%a.a.

ChamaaatençãonaTabela1,afortecontraçãodasdespesasdiscricionárias,resultadodeumforteajustefiscaliniciadoem2015,quetiveramgrandeimpactonosinvestimentosdoPACedoMinhaCasaMinhaVida.Essecortetemforteefeitonegativonademandaagregadaenocrescimentoporsetratardeumimportantecomponentedegastoautônomonãogeradorde capacidade produtiva. Dessa forma, conjugando-se com o dado já visto relacionado àcontraçãodofinanciamentoimobiliário,acontraçãodosinvestimentospúblicosdogovernofoioutro importante fatorpreponderanteparaacontraçãodosgastosemconstruçãocivil.Nãomenos relevante foi tambémo corte nas demais despesas discricionárias, emparticular dos

22Esseéovalorde1995a2014.Ela foi superiornoperíodomaisexpansivoquevaide2004a2011,4,4%,einferiorentre1995e2003,2,3%eaindapiorpósadesaceleraçãode2011,sendoestataxade1,8%entre2012e2014.23Paraumresumodadiscussãoeaplicaçãoàeconomiabrasileira,verOrair,SiqueiraeGobetti(2016).

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MinistériosdaSaúdeeEducação,quetambémcontraíramfortementegastosdecusteioedeinvestimentonoseusetor.

Asdespesasemsubsídios,majoritariamentedestinadasasubsídiosparaoperaçõesdecrédito, também foram alvo de forte redução (comexceção de 2015, quando ocorreu forteaumento para pagamento pelo Tesouro Nacional dos saldos existentes junto aos bancospúblicos).Nessecaso,étambémumfatorque,aoencarecerocrédito,podeteralgumefeitonegativosobreosgastosautônomos.

Finalmente, asdespesas com transferências sociais (benefíciosprevidenciárioseBPCLOAS) tiveram crescimento. Esse crescimento pode ser explicado pelo aumento do saláriomínimo, como já mencionado anteriormente, e também pelo aumento das despesasdecorrentedoanúnciodareformadaprevidência,quelevoumuitaspessoasaanteciparemoseu pedido de aposentadoria. Assim, como discutido na subseção sobre o consumo, astransferênciascontribuírampositivamenteparaoincentivoaoconsumoereforçaramainérciainstitucionalquecontribuiuparaqueaeconomiabrasileiraencontrasseumpisoem2017.

Já a despesa compessoal e encargos, que se encontrava estável até 2016, teve umsubstancialaumentoem2017,quandoentraramemvigoralgunsdosreajustesaprovadospelogovernodopresidenteTemerem2016.Entretanto,paraseterumaideiamaisprecisasobreseu impactosobreoscomponentesdedemanda,serianecessárioatentarparaadistribuiçãodesses pagamentos por faixa de renda, ou seja: estando concentrados tais aumentos emcategorias cuja remuneração jáémaiselevada, éprovávelque tal impacto sejabemmenosintensoqueoquedecorreudaelevaçãocomosgastosdeprevidência

A nível federal, em síntese, como vem sendo interpretada a emenda dos tetos dogasto,comotetovirandotambémpiso,acontribuiçãodasdespesaspúblicastendeasernulaem termos de impacto sobre o produto agregado. Olhando os dados desagregados essaconvergência teto/piso ocorreu, basicamente, pela expansão do gasto de previdência, jámencionada. Novamente, restrições propostas a dispêndios previdenciários que possam aocorrer em função de mudanças constitucionais terão impacto direto sobre o consumo econsequentementesobreoproduto.

Tabela1-DespesasPrimáriasdoGovernoCentral

Var.(%)Real

2014 2015 2016 2017*

DespesaTotal 6,3% 1,9% -0,6% 0,0%BenefíciosPrevidenciários+BPCLoas 4,0% 1,4% 7,1% 6,1%PessoaleEncargosSociais 1,9% -1,7% -0,5% 7,1%AbonoeSeguroDesemprego 14,4% -19,0% 8,8% -7,5%Subsídios,SubvençõeseProagro -31,4% 997,0% -58,3% -23,4%OutrasDespesasObrigatórias 21,5% 38,5% -24,0% -8,7%PAC(excetoMCMV) 24,6% -39,7% 18,0% -35,6%MCMV 15,3% 7,3% -64,3% -61,0%Min.daSaúde 7,2% -6,9% 6,8% -4,7%Min.doDesenv.Social 4,9% -10,6% -3,1% 0,4%Min.daEducação 9,4% -17,6% -2,9% -11,9%OutrasDespesasDiscricionárias 9,9% -11,9% 20,3% -21,0%*Dadosacumuladosaténovembro/17

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2.3.Investimentoprivado

É interessante anotar que toda a discussãoque foi desenvolvida aqui não tratoudoinvestimentoprivado,porque,afinal,supondoqueestedependedasexpectativasdedemandanão haveria nenhuma razão lógica para sua elevação no curto prazo. Há é claro umcomponenteautônomodo investimentoprivadonãogeradordecapacidade,o investimentoemconstruçãocivil.Comojávistonassubseçõesrelativasaoconsumoegastopúblico,todosindicadoresapontamparaumcenáriode fortequedadosgastos,até2016,edeestagnação(maisumavezumpiso)em2017.O indicadordo IPEAdeFormaçãoBrutadeCapitalFixonaconstrução civil, disponível até junho/2017, apresentadonoGráfico11 reforçao argumentoaquiexposto.

Gráfico11:IndicadorIPEAdaFBCF–construçãocivil–índiceencadeado–Média1995=100(comaj.sazonal)

Fonte:IPEADATA.Elaboraçãoprópria.

Jáo investimentogeradorde capacidadeprodutiva, associadoaumaexpectativadedemanda, comoeraesperado,numperíodode reduçãoaceleradadonível, reagiudecaindoaindamaisqueoníveldeprodutoagregado,refletindooconhecidomecanismodoaceleradordoinvestimento.Esperaralguminvestimentoautônomo,porexemplo,advindodeprocessodeinovação tecnológica, também seria altamente problemático, tanto pela atual estruturaprodutivadaeconomiabrasileiracomomesmopelaLeideVerdoorn,queassociaa inovaçãoaoprópriocrescimentodaeconomia.

Umasupostaretomadadosinvestimentostrazidaporumamaiorconfiançacujapossedo vice-presidente Temer incutiria no mercado, mostrou-se um argumento totalmentedesprovidodebasereal,postoquesuabaseteórica,mesmodentrodaortodoxiamarginalistaédevalidadeduvidosa.Segundoestateoria,anovaadministração,aoprovocarumareduçãodoprêmioderiscoexpressonastaxasdejurosfuturas,poderiaexerceralgumefeitopositivoreduzindo de forma substancial os juros e contando com uma forte elasticidade juros doinvestimento,mesmofrenteaumaexpressivacapacidadeociosa.Noentanto,atãoesperadaretomada via melhora das expectativas e retomada dos investimentos privados não seconcretizou na conjuntura atual. Assim como em outros momentos da nossa economia, a

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recuperação esteve muito mais associada à expansão do consumo provocada seja pelaelevaçãodosaláriomínimo,sejapelainjeçãodepoderdecompradosetorpúblico(FGTS)24.

Observa-seque,após15trimestresdequedas,odadodeFormaçãoBrutadeCapitalFixo apurado pelas Contas Nacionais do IBGE apresentou variação positiva de 1,6% nacomparação entre o terceiro e o segundo trimestre de 2017. Como hipótese, a provávelreduçãodoritmodequedadosinvestimentospodeestarassociadaaalgumefeitoaceleradordecorrente da leve recuperação do nível de atividade da economia. Ao se olhar o grau deutilizaçãocomajustesazonal,observa-seumarecuperaçãodograudeutilizaçãoem2017emrelação à 2016. Há que se notar, entretanto, que essa recuperação por ter se iniciado noprimeiro trimestrede2017, podeestar associada, nesteperíodo, ao acúmulo indesejadodeestoquesjámencionados.

Gráfico12:Variação(%)FBCF–ContasNacionaisTrimestrais

Fonte:IBGE.Elaboraçãoprópria.

24CuriosamenteatéoPresidentedoBacenacreditavaqueumaondadeconfiançanoGovernoTemerfariacrescero investimentoadespeitodeumademandadeprimida,grandecapacidadeociosaejurosestabelecidospelopróprioBancoCentralbastanteelevados.EmentrevistaaoJornalFolhadeSãoPaulorevelousuasurpresacomasequêncianocomportamentodasvariáveisdedemandaquelevouaofimdo processo de queda do produto. Nessa passagem reconhece que sua “crença” estava equivocadaaindaquemantendoasuposiçãoquetal“tese” inicial fossecompartilhadaporumgrandenúmerodeeconomistas:“Háumano,todosimaginavamqueaeconomiabrasileirapoderiavoltaracrescerapartirdoaumentodeconfiança,quegerariainvestimentos,rendaeconsumo.Oempregoseriaoúltimoaserecuperar. Essa ordem está um pouco diferente”http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/08/1913221-consumo-puxa-recuperacao-lenta-da-economia-diz-presidente-do-bc.shtml

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Gráfico13:NUCI–FGV(comajustesazonal)

Fonte:FGV.Elaboraçãoprópria

3.ConsideraçõesFinais

Numaeconomiacujoníveldeprodutoédeterminadopelademandanãoexistiria,emtese, um piso de reversão cíclica numa depressão econômica. Observando, entretanto, osepisódiosmaisintensosderetraçãodoproduto,tem-sequeemalgumpontoseencontraumpiso,oquenossugeriuaexistênciadeummínimosocialmentetolerávelquedependeriadecaracterísticaspolíticoinstitucionaisdecadaeconomia.

No caso específico brasileiro foram identificados alguns componentes queresponderampelaeconomiaalcançarseupiso.Emprimeiro,lugaraexistênciadeumapolíticadereajustedosaláriomínimo,comimpactossobregastosdaprevidênciaqueestimularamosgastos de consumo. Esse efeito sobre o consumo também foi favorecido por medidasexcepcionaiscomoaliberaçãodoFGTS.

Umareversãoeconsumoedoempregotemumaefeitopositivosecundáriosobreopróprio emprego. Vale ressaltar que um crescimento desequilibrado dos setores informal eformal indica que frente a uma pequena melhora das condições gerais da economia, ostrabalhadoresprocurarambuscarqualqueratividade,pormaisprecáriaquepossaser,comoumapressãopor sobrevivêncianumaeconomianaquala rededeproteçãosocialnãoé tãodesenvolvida.

Outrofatordesustentaçãoéoprópriogastopúblicoimpactadopelainstitucionalidadedogastodaprevidência,criandoumfatoquecarregacertograudeironia:omesmogastoquepermitiu às autoridades federais apregoarem algum sucesso de política econômica éapresentadacomoumadasmaioresmazelasdaeconomiaaseremcombatidas.

Ainda que não seja um elemento institucional doméstico a partir de 2017 o setorexternoexerceuumimportantepapeldesustentaçãodademandaagregada.

Umpontodestacadonestanota,paraesteselementosdedemandaagregada,éque,adespeitodeteremtidoumpapelimportantenoestancamentodaquedadoPIBem2017,emnenhum momento, dadas as condições político-institucionais domésticas e estruturais

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internacionais,essesmesmoselementosparecemcapazesdepuxarumcicloexpansivomaisvigorosonomédioprazo.

As perspectivas das exportações dada a demanda internacional e sem mudançasestruturais relevantes da nossa inserção internacional não parecem garantir uma forteexpansãoproduto.Oefeitodeexpansãodosaláriomínimofoidenaturezaonceandforalleas propostas de precarização domercado de trabalho não autorizam que se tenha grandesexpectativasdeelevaçãosalarialalémdeseusefeitosindiretos,viamenorformalização,sobreaexpansãodecrédito.Estaporsuavezestácrescendoaritmobaixoepode-sedescartarumatendênciadeaceleraçãosejapeloprópriobaixocrescimentodafolhasalarialsejapelospreadelevadíssimodosjuroscobradosaspessoasfísicas.

Pelo lado fiscal há uma lei definindo que este não será expansionista e reformasregressivasdaprevidênciapodemterefeitosdepressivossobreoconsumoprivado.SeforadoBrasilvemsendodiscutidaanecessidadedeserepensarautilizaçãodepolíticasfiscais25aquise impôs uma regra que fará cair a participação do gasto público no PIB e assim,provavelmente, deteriorar a oferta já insuficiente de bens públicos. Por outro lado, aexperiênciabrasileiranosúltimosanosnãoparecejustificaraesperançadequeoajustefiscaleaconfiançadomercadopuxemumaretomadadosinvestimentos.

Em poucas palavras, o que a literatura internacional vem denominando como“estagnaçãosecular”nospaíses ricosparecepoderatingiremcheioaeconomiabrasileira,aqual, entretanto, tem como fatores socialmente ainda mais complicadores uma estruturasocioeconômica altamente desigual e com boa parte da população vivendo em condiçõesmuitoinferioresàquelasexistentesnospaísesdesenvolvidos.

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25VerporexemploAuerbacheGorodnichenko(2017).

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