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a nova carta das localiza- ções cerebrais; de kleist A ideia de que a cada função corres- ponde, no cérebro, uma certa zona encar- regada de efectivar essa função, pertence, em primeiro lugar, ao italiano Gall, fun- dador do que chamou a organologia e hoje se chama frenologia, pretensa ciência pela qnal se reconheceriam, segundo o autor, as» diversas disposições intelectuais e morais do homem e dos animais pela configuração das suas cabeças». A frenologia ensinava que ao maior ou menor desenvolvimento duma dada zona cerebral correspondia uma maior on menor disposição intelectual dada; daqui nasceu a relação entre a «bossa» cra- neana e a função ou disposição psíquica, e assim se pretendeu chegar ao conhecimento dos homens pelo exame das suas bossas. A frenologia, baseada em dados exces- sivamente arbitrários, não podia subsistir, e o próprio Gall assistiu à derrocada do seu fantástico sistema. Porém, e por muito fantástica que a frenologia pareça, o certo é que abriu uma nova era na história dos estudos cerebrais, chamando a atenção dos investigadores para este facto hoje indis- cutível : a determinadas zonas cerebrais correspondem determinadas funções, e vice versa, cada função tem, no cérebro, uma determinada zona que lhe está adstricta (1). Uma multidão de neurologistas e ana- tomistas se lançou então ao trabalho de localizar as funções no cérebro. Justo é que citemos, entre os mais célebres, Dax, Pierre Marie, Broca, Wernicke, Grasset, Déjerine, Head, von Monakow, Goldstein e ultimamente Kleist. Foi principalmente durante e depois da grande guerra de 1914-1918 que esta ques- tão das localizações cerebrais progrediu extraordinariamente, visto que o princípio (1) Isto, é claro, esquematicamente. PASSA À fundamental em que se fundam todos os métodos para o estabelecimento das loca- lizações, consiste . em pesquizar quais as funções perturbadas num indivíduo que apresenta lesões ou destruições desta ou daquela zona do cérebro. A guerra forne- ceu inúmeros feridos em condições vanta- josas para esta pesquiza, e representou assim, no domínio da neurologia, como em tantos outros, o importante papel dum vasto campo de experiência. Toda a importância foi dada à camada exterior do bloco encefálico, ao córtex ou manto cerebral, e é sobre êle que se mar- cam zonas e pontos que a experiência ou o exame anátomo-clínico autorizam a julgar correspondentes a determinadas funções. A delimitação destas zonas sobre um es- quema representativo do córtex total cons- titue uma carta das localizações cerebi^ais, e o leitor, naturalmente, deseja saber como se levantam tais cartas. Não é coisa que possa explicar-se em meia dúzia de linhas, nem em meia dúzia de páginas, sobretudo a um leigo em maté- ria de anatomia, histologia e embriologia, ciências que, associadas à clínica neuro- lógica e psiquiátrica, teem fornecido os preciosos elementos de que os autores se servem. Podemos contudo dar uma ideia rápida e superficial do método base: o método anátomo-clínico. Suponhamos que um indivíduo sofre nm acidente com fractura do crâneo por cima da orelha esquerda, e suponhamos que foi imediatamente socorrido. Dias depois, esse ferido apresenta uma paralisia do membro superior direito, de que não cura, e depois de morto, por qualquer razão, é autopsiado. Verifica-se então, que uma porção da parte média da circunvolução frontal ascendente esquerda está destruída por uma esquírola PÁGINA IS

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a nova carta das localiza­ções cerebra is ; de k le i s t

A ideia de que a cada função corres­p o n d e , no cé rebro , u m a cer ta zona encar­r e g a d a de efect ivar essa função, pe r tence , em pr imei ro luga r , ao i ta l iano Gall , fun­dador do que chamou a organologia e hoje se c h a m a frenologia, p r e t e n s a ciência pe la qna l se reconhecer iam, segundo o au tor , as» d iversas disposições in te lec tua is e morais do homem e dos animais pela configuração das suas cabeças» . A frenologia ens inava que ao maior ou menor desenvo lv imento d u m a dada z o n a cerebra l cor respondia u m a maio r on m e n o r disposição in te lec tua l dada; daqu i nasceu a re lação en t re a «bossa» cra-n e a n a e a função ou disposição ps íquica , e assim se p r e t e n d e u chegar ao conhec imento dos h o m e n s pelo exame das suas bos sa s .

A frenologia, ba seada em dados exces­s ivamen te a rb i t r á r ios , não podia subsis t i r , e o p rópr io Gall ass is t iu à der rocada do seu fan tás t ico s is tema. P o r é m , e po r mui to fan tás t ica que a frenologia pareça , o cer to é que abr iu u m a nova era n a h i s tó r ia dos e s t u d o s ce rebra i s , c h a m a n d o a a tenção dos inves t i gado re s p a r a es te facto hoje indis­cut ível : a de t e rminadas zonas cerebra is co r r e spondem d e t e r m i n a d a s funções, e vice versa, cada função t em, no cérebro , u m a de t e rminada zona que lhe es tá ads t r i c ta (1).

U m a mul t i dão de neuro log i s t a s e ana­t o m i s t a s se lançou en tão ao t r aba lho de local izar as funções no cérebro . J u s t o é que c i temos , en t re os mais cé lebres , Dax , P i e r r e Marie , Broca , W e r n i c k e , Gras se t , Dé je r ine , H e a d , von Monakow, Golds te in e u l t i m a m e n t e Kle is t .

F o i p r inc ipa lmen te du ran t e e depois da g rande g u e r r a de 1914-1918 que es ta ques­tão das local izações cerebra is p r o g r e d i u e x t r a o r d i n a r i a m e n t e , v is to que o pr incípio

(1) Isto, é claro, esquematicamente.

PASSA À

fundamenta l em que se fundam todos os métodos p a r a o es tabe lec imento das loca­l izações, cons is te . em pesquizar quais as funções p e r t u r b a d a s num indivíduo que ap re sen t a lesões ou des t ru ições des ta ou daque la zona do cérebro . A gue r r a forne­ceu inúmeros feridos em condições v a n t a ­jo sa s p a r a e s t a pesquiza , e r ep re sen tou assim, no domínio da neurologia , como em t an to s ou t ros , o i m p o r t a n t e pape l dum vas to campo de exper iência .

T o d a a impor tânc ia foi dada à c a m a d a exter ior do bloco encefálico, ao córtex ou manto cerebral, e é sobre êle que se m a r ­cam zonas e pon tos que a exper iência ou o exame anátomo-cl ínico au to r i zam a j u l g a r co r responden tes a de t e rminadas funções . A del imi tação des t a s zonas sobre u m es­quema rep resen ta t ivo do cór tex to ta l cons­t i tue u m a carta das localizações cerebi^ais, e o le i tor , n a t u r a l m e n t e , deseja saber como se l e v a n t a m ta is c a r t a s .

Não é coisa que possa explicar-se em meia dúzia de l inhas , nem em meia dúz ia de pág inas , sob re tudo a um leigo em maté ­r ia de ana tomia , his tologia e embriologia , ciências que, associadas à clínica neu ro ­lógica e ps iqu iá t r ica , t eem fornecido os prec iosos e lementos de que os au to res se se rvem. Podemos con tudo dar u m a ide ia r á p i d a e superficial do método b a s e : o mé todo anátomo-cl ínico.

Suponhamos que um indiv íduo sofre n m acidente com fractura do crâneo por cima da ore lha esquerda , e suponhamos que foi imed ia t amen te socorr ido. Dias depois , esse ferido ap resen ta u m a paral is ia do m e m b r o super ior d i re i to , de que não cura , e depois de m o r t o , por qua lquer r azão , é au tops i ado . Verifica-se e n t ã o , que u m a porção da p a r t e média da c i rcunvolução frontal a scenden te e squerda es tá de s t ru ída p o r u m a esquíro la

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