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NATÁLIA CRISTINA BELCHIOR
SORVETE
Monografia apresentada ao Departamento de Ciência dos Alimentos Universidade Federal de Lavras como parte das exigências do curso de Engenharia de Alimentos, para a obtenção do título de Engenheiro de Alimentos.
Orientador
Prof. Jaime Vilela de Resende
LAVRAS
MINAS GERAIS - BRASIL
2009
NATÁLIA CRISTINA BELCHIOR
SORVETE
Monografia apresentada ao Departamento de Ciência dos Alimentos Universidade Federal de Lavras como parte das exigências do curso de Engenharia de Alimentos, para a obtenção do título de Engenheiro de Alimentos.
APROVADA em __ de _________ de _____.
Prof._______________
Prof. ______________
Prof. Dr. Jaime Vilela de Resende
UFLA
(Orientador)
LAVRAS
MINAS GERAIS – BRASIL
2009
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, Dan Dureya e Sirlei, pelo exemplo de vida e conduta, pelo apoio e incentivo aos estudos que fizeram com que eu chegasse a minha formação.
Aos amigos e colegas de universidade que participaram dessa jornada comigo.
Ao professor Jaime Vilela de Resende pela orientação e ensinamentos.
SUMÁRIO
RESUMO
BELCHIOR, NATÁLIA CRISTINA. SORVETE. UFLA, 2009. Xp. (Monografia – Graduação em Engenharia de Alimentos).
De acordo com a Portaria n°379 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o sorvete está inserido no grupo dos Gelados Comestíveis, que abrange os produtos alimentícios obtidos a partir de uma emulsão de gorduras e proteínas, com ou sem adição de outros ingredientes e substâncias, ou de uma mistura de água, açúcares e outros ingredientes e substâncias que tenham sido submetidas ao congelamento, em condições tais que garantam a conservação do produto no estado congelado ou parcialmente congelado, durante o armazenamento, o transporte e a entrega ao consumidor
Muitas das informações disponíveis sobre a origem do sorvete estão, ainda, sob a esfera do folclore, indicando que esse produto não foi inventado ou criado, mas desenvolvido através dos séculos, até chegar ao produto que se conhece atualmente. No Brasil, o sorvete surgiu em 1834, quando o navio
norte-americano, vindo de Boston aportou no Rio de Janeiro, carregando 217 toneladas de gelo. Essa carga foi adquirida por dois comerciantes, que a revenderam em sua confeitaria, na forma de sucos e sorvetes artesanais a base de frutas tropicais, utilizando o nome de “gelados”. Em 1941 foi inaugurada a primeira indústria de sorvetes do país, a Kibon.
Inicialmente, os ingredientes para fabricação de sorvetes eram leite, creme, açúcar e estabilizantes. Atualmente é utilizada uma grande gama de ingredientes, como, emulsificante, gordura vegetal hidrogenada, pedaços de frutas, aromatizante, e corante. Os diferentes ingredientes que compõem o sorvete exercem funções relativas à qualidade do produto, como corpo, textura, cremosidade, cor, aroma e sabor.
Os ingredientes podem ser agrupados em produtos lácteos e produtos não lácteos. Os produtos lácteos formam os ingredientes básicos que fornecem gordura e sólidos não gordurosos do leite (SNGL). Entre os produtos não lácteos encontram-se adoçantes, estabilizantes/emulsificantes, frutas, nozes, essências e água.
Um sorvete de alto padrão requer uma mistura com matérias primas de boa qualidade, além de uma adequada execução das várias etapas do processo produtivo como, pasteurização, homogeneização, maturação, incorporação de ar e congelamento.
1. INTRODUÇÃO
O sorvete, segundo a Portaria n°379 da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária – ANVISA está inserido no grupo dos Gelados
Comestíveis, que abrange os produtos alimentícios obtidos a partir de uma
emulsão de gorduras e proteínas, com ou sem adição de outros ingredientes e
substâncias, ou de uma mistura de água, açúcares e outros ingredientes e
substâncias que tenham sido submetidas ao congelamento, em condições tais
que garantam a conservação do produto no estado congelado ou
parcialmente congelado, durante o armazenamento, o transporte e a entrega
ao consumidor.
A verdadeira história sobre a origem dos gelados comestíveis se
perde no tempo. Existem relatos de que os chineses, 25 a.C, produziram uma
espécie de preparado, à base de suco de frutas e neve que eram consumidos
durante o inverno. Há também registros de que na Europa, por volta do
século I, escravos eram constantemente enviados aos Alpes, no intuito de
coletar neve a fim de misturá-la a néctares de frutas e outros produtos.
Com a Revolução Industrial e com o aparecimento de técnicas
modernas de congelamento, surgiram as primeiras sorveterias artesanais na
Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, em 1834, foi elaborado, no Rio de
Janeiro, o primeiro gelado comestível que utilizava gelo transportado em
navios vindos de Boston.
O sorvete é considerado um importantíssimo complemento alimentar
e apresenta, juntamente com os produtos à base de leite, ingredientes
funcionais relacionados à saúde. Associa um sabor irresistível a um alimento
rico em proteínas, cálcio e vitaminas, apesar de ser altamente calórico e rico
em gorduras.
A forma com que o consumidor percebe o sabor e a textura do
sorvete está baseada na estrutura desse alimento, considerada como um dos
seus principais atributos. Vários passos no processo de fabricação do
sorvete, incluindo pasteurização, homogeneização, maturação, congelamento
e armazenamento contribuem para o desenvolvimento da sua estrutura.
O sorvete é um produto de boa aceitação sensorial pelo consumidor,
tendo no Brasil uma boa perspectiva para crescimento comercial,
considerando que o clima é apropriado para este consumo. Embora o clima
seja um fator positivo para o aumento do consumo de sorvete no Brasil, é
relevante o fato de que o consumo de sorvete está diretamente ligado a renda
per capita da população, o que poderia ser uma das explicações para o
consumo reduzido no Brasil quando comparado a um país desenvolvido
onde o clima não é propício durante o ano todo. Além disso, no Brasil, o
sorvete está muito associado ao verão, como uma guloseima refrescante e
não como um alimento nutritivo, com variedades de sabores e formulações,
que permitem seu consumo nas mais diversas ocasiões em qualquer época do
ano. ALMEIDA et al. (2001) lembra que na Europa, por exemplo, o
marketing está voltado para o “prazer” de se consumir um sorvete,
independente do momento ou época do ano. A mentalidade brasileira é um
aspecto que o setor sorveteiro precisa trabalhar mais, pois seu mercado tem
um grande potencial de crescimento e há muito espaço a ser conquistado
com produtos inovadores.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1 História do Sorvete
Muitas das informações disponíveis sobre a origem do sorvete estão,
ainda, sob a esfera do folclore, indicando que esse produto não foi inventado
ou criado, mas desenvolvido através dos séculos, até chegar ao produto que
se conhece atualmente (Baccarin, 2000).
Indícios mais antigos sobre o aparecimento do sorvete datam de 250
a.C., sugerindo que os chineses misturavam polpa de frutas à neve para
preparar uma bebida apreciada pelos imperadores (Mikilita, 2002).
Consta que no ano 62 d.C, o imperador Nero, em Roma, enviava
escravos às montanhas dos Alpes em busca de neve e gelo, os quais seriam
utilizados para resfriar bebidas e para a preparação de um alimento à base de
suco de frutas e mel. No século XIII, por volta de 1292, Marco Pólo, ao
retornar de sua viagem à China, teria trazido para a Itália receitas de bebidas
com a mistura de gelo e suco de frutas (Mikilita, 2002).
A lenda continua com as receitas de sorvete que Catarina de Médici
levou para a França, no século XVI, em 1533, quando se casou com
Henrique II. Na Inglaterra, Carlos I foi presenteado com o cozinheiro De
Mirco vindo da corte francesa, o qual preparava sorvete cremoso, a base de
leite. O rei teria recompensado seu cozinheiro com uma pensão vitalícia,
com a condição de que não divulgasse a receita, mantendo, assim, o sorvete
como uma prerrogativa real (Mikilita, 2002).
Os italianos foram os primeiros europeus a desenvolver receitas de
sorvetes sendo que, a partir de 1500, o produto começou a ser difundido por
toda a Europa. Foi nos últimos dois séculos que esse alimento teve um
grande avanço tecnológico e uma maior expansão de seu consumo (Mikilita,
2002).
Nos Estados Unidos da América - EUA o sorvete teria sido servido em
um jantar, pelo governador Bladen de Maryland, no início dos anos de 1700.
Dolly Madison, esposa do presidente americano James Madison, servia essa
sobremesa nos jantares da Casa Branca, o que ajudou a popularizar o sorvete
naquele país (IDFA, 2009).
A primeira máquina de fabricar sorvetes surgiu em Nova Jersey - EUA,
quando Nancy Johnson, em 1843 inventou um congelador manual revestido
de gelo adicionado de sal, no qual a mistura era agitada até o congelamento.
A Figura 1 representa um modelo desse equipamento, o qual foi patenteado
em 9 de setembro de 1843 (IDFA, 2009).
A comercialização do sorvete estava limitada aos locais de fabricação,
até que em 1851, Jacob Fussel promoveu o transporte desse produto para
áreas distantes, onde estavam os consumidores, nascendo o negócio de
vendas por atacado de sorvete em Baltimore - EUA (Baccarin, 2000; IDFA,
2009).
Figura 1: Modelo da primeira máquina de fabricação de sorvete
Fonte: San Diego Historical Society Museum. Curatorial Colletions, 2002.
No primeiro ano do século XX, August Gaulin, em Paris, inventou o
homogeneizador, destinado a aprimorar a textura suave do sorvete. Com o
surgimento da refrigeração mecânica, o primeiro congelador horizontal foi
inventado por H.H. Miller em Canton, Ohio - EUA. Em 1926, o primeiro
equipamento contínuo foi desenvolvido por Clarence Vogt, em Louisiville,
Kentucky - EUA (IDFA, 2009).
Em 1896, em Nova York - EUA, o imigrante italiano Ítalo Marchiony
inventou o cone de waffle para sorvete (IDFA, 2009).
No Brasil, o sorvete surgiu em 1834, quando o navio norte-americano,
vindo de Boston aportou no Rio de Janeiro, carregando 217 toneladas de
gelo. Essa carga foi adquirida por dois comerciantes, que a revenderam em
sua confeitaria, na forma de sucos e sorvetes artesanais a base de frutas
tropicais, utilizando o nome de “gelados”. Em 1941 foi inaugurada a
primeira indústria de sorvetes do país, a Kibon (Mikilita, 2002).
O ano de 1941 foi histórico e representou o início da sorveteria
industrial, em altos volumes de produção e utilizando-se a tecnologia do frio.
De 1942 até 1980 a indústria de sorvetes apresentou crescimento constante,
tendo hoje à disposição do consumidor uma imensa variedade de produtos
como bolos gelados, torta de frutas, cones de biscoitos e outras combinações
(BACCARIN, 1982)
2.2. Definição e Classificação
Segundo Portaria n° 379, de 26 de abril de 1999, da ANVISA, são
definidos como gelados comestíveis os produtos alimentícios obtidos a partir
de uma emulsão de gorduras e proteínas, com ou sem adição de outros
ingredientes e substâncias, ou de uma mistura de água, açúcares e outros
ingredientes ou substâncias que tenham sido submetidas ao congelamento,
em condições tais que garantam a conservação do produto no estado
congelado ou parcialmente congelado, durante a armazenagem, o transporte
e a entrega ao consumo (Brasil, 1999).
De acordo com Matthias et al. (2005), os gelados comestíveis são
alimentos obtidos por congelamento, sob contínua agitação, a partir de uma
mistura pasteurizada e homogeneizada antes do congelamento, composta de
ingredientes lácteos ou não, açúcares, corantes, aromatizantes, estabilizantes,
emulsificantes, entre outros aditivos, visando atender aos padrões definidos
para sólidos totais e overrun (incorporação de ar) e assegurar a conservação
do produto.
O sorvete pode ser considerado um sistema complexo de partículas
coloidais constituído de glóbulos de gordura, bolhas de ar e cristais de gelo
dispersos numa fase não congelada. A fase não congelada do sorvete é
constituída de micelas de caseína suspensas em uma solução congelada e
concentrada de açúcar, sais, proteínas solúveis do leite e polissacarídeos de
alto peso molecular (Goff, 1997).
Para a legislação brasileira, os sorvetes podem ser classificados segundo
a composição básica ou quanto ao processo de fabricação e apresentação.
Classificação quanto à composição básica:
Sorvetes de creme, que são os produtos elaborados basicamente com leite e
ou derivados lácteos e ou gorduras comestíveis, podendo ser adicionado de
outros ingredientes alimentares;
Sorvetes de leite, que são os produtos elaborados basicamente com leite e ou
derivados lácteos, podendo ser adicionados de outros ingredientes
alimentares;
Sorvetes, que são os produtos elaborados basicamente com leite e ou
derivados lácteos e ou outras matérias-primas alimentares e nos quais os
teores de gordura e ou proteína são total ou parcialmente de origem não
láctea, podendo ser adicionados de outros ingredientes alimentares;
Sherbets, que são produtos elaborados basicamente com leite e ou derivados
lácteos e ou outras matérias primas alimentares e que contêm apenas uma
pequena proporção de gorduras e proteínas, as quais podem ser, total ou
parcialmente, de origem não láctea, podendo ser adicionados de outros
ingredientes alimentares;
Gelados de frutas, ou sorbets, que são os produtos elaborados basicamente
com polpas, sucos ou pedaços de frutas e açúcares, podendo ou não ser
adicionados de outros ingredientes alimentares;
Gelados, que são produtos elaborados basicamente com pedaços de frutas e
outras matérias-primas, podendo ou não ser adicionados de outros
ingredientes alimentares.
Classificação quanto ao processo de fabricação e apresentação:
Sorvete de massa ou cremoso: são misturas homogêneas ou
não de ingredientes alimentares, batidas e resfriadas até o
congelamento, resultando em massa aerada.
Picolés: são porções individuais de gelados comestíveis de
várias composições, geralmente suportadas por uma haste,
obtidas por resfriamento até congelamento da mistura
homogênea ou não, de ingredientes alimentares, com ou
sem batimento.
Produtos especiais gelados: são os gelados mistos
constituídos por qualquer das modalidades de gelados
comestíveis relacionados neste regulamento, em
combinação com alimentos não gelados, representados por
porções situadas interna e ou externamente ao conjunto,
tais como: sanduíche de sorvete, bolo de sorvete e torta
gelada.
O sorvete pode ou não conter gordura de leite, podendo ser
classificado em premium (altamente gorduroso), light (baixa quantidade de
gordura), e outros produtos correlatos (Matthias et al., 2005).
A classificação dos gelados comestíveis, com base nos valores
mínimos exigidos para seus ingredientes, está apresentada no Quadro 1.
Quadro 1: Classificação dos gelados comestíveis em função dos valores
mínimos de seus componentes em g/100g de produto final.
Fonte: Adptado da Portaria no379/99/ANVISA (Brasil, 1999).
2.3. Ingredientes utilizados no sorvete e suas funções
Inicialmente, os ingredientes para fabricação de sorvetes eram leite,
creme, açúcar e estabilizantes. Atualmente é utilizada uma grande gama de
ingredientes, considerando características como custo, propriedades de
manipulação (viscosidade, ponto de congelamento e aeração), aroma, corpo,
textura, valor nutricional, cor e palatabilidade do produto final (SOLER;
VEIGA, 2001).
O sorvete apresenta a seguinte composição básica conforme Quadro 2.
Quadro 2: Componentes do sorvete por g/100g do produto final
FONTE: Goff (1997)
Na elaboração do sorvete, além do enriquecimento nutricional, os
diferentes componentes - produtos láteos, açúcar, estabilizante,
emulsificante, gordura vegetal hidrogenada, aromatizante, e corante -
exercem funções relativas à qualidade do produto, como corpo, textura,
cremosidade, cor, aroma e sabor. Outros componentes também podem ser
adicionados à calda e no produto final, como extrato de malte e pedaços de
frutas, caracterizando assim, o sabor final do sorvete (Arbuckle, 1977;
Mosquim, 1999).
Um sorvete de alto padrão requer uma mistura com matérias primas de
boa qualidade, ou seja, a seleção dos ingredientes deve considerar a
qualidade dos produtos lácteos, a perecebilidade dos produtos, efeitos do
batimento sobre a mistura, efeitos do processamento sobre o sabor, custos
dos sólidos, entre outros.
A formulação é definida com base nas regulamentações nacionais
(Tabela 1), no tipo de produtos de leite e equipamentos disponíveis, no
público alvo, no tipo de concorrência que o produto irá enfrentar, no efeito
da combinação proposta de sólidos sobre a qualidade e operações de
congelamento e, finalmente, nos custos.
Os ingredientes podem ser agrupados em produtos lácteos e produtos
não lácteos. Os produtos lácteos formam os ingredientes básicos que
fornecem gordura e sólidos não gordurosos do leite (SNGL). Entre os
produtos não lácteos encontram-se adoçantes, estabilizantes/emulsificantes,
ovos, frutas, nozes, essências, produtos especiais e água (Marshall &
Arbuckle, 1996).
Tabela 1: Regulamentação para composição química de sorvetes
Componente Brasil1 EUA2
Sólidos totais ≥ 28 ≥ 19
Sólidos do leite - ≥ 20
Gordura láctea ≥ 2,5 ≥ 10
Proteínas do leite ≥ 2,5 -
Estabilizante - ≤ 0,51 Regulamentação Brasileira: Portaria no 379 do Diário Oficial da União de
29 de Abril de 1999 (Brasil, 1999).2 Padrão Federal Americano: Code of Federal Regulations.
A quantidade de sólidos na mistura (gorduras, carboidratos, proteínas e
conteúdos minerais), em base seca, formam os sólidos totais (ST) do sorvete.
Um aumento em ST, dentro de certos limites, implica no aumento do valor
nutritivo, da viscosidade e da resistência associadas ao corpo e textura do
sorvete. Este aumento pode também provocar a diminuição do percentual em
água congelada e freqüentemente permite-se um overrun mais alto, uma
textura macia, melhor corpo, e melhor estabilidade da qualidade do produto
final (STOGO, 1997). Mas um elevado conteúdo de ST (acima de 42%)
acarretará em produto pesado (Marshall & Arbuckle, 1996).
2.3.1. Ingredientes Lácteos:
2.3.1.1. Gordura
O teor de gordura é o primeiro aspecto a ser definido quando se escolhe
uma formulação de sorvete e, posteriormente, a quantidade dos demais
ingredientes (Costa & Lustoza, 2000).
O tipo de gordura, sua composição e ponto de fusão têm influência
decisiva sobre as características organolépticas e estabilidade do sorvete
durante sua conservação. A presença da gordura no sorvete contribui para o
desenvolvimento de uma textura suave, além de melhorar o corpo do
produto e aumentar sua resistência a fusão (Amiot, 1991).
A tabela 2 apresenta uma classificação dos sorvetes com base no seu teor
de gordura.
Tabela 2: Classificação do sorvete segundo o teor de gordura
Classificação Teor de Gordura (%)
Sherbet 2-4
Regular 6-10
Premium 10-16
Super Premium >16
Fonte: Costa & Lustoza (2000).
A gordura está presente no leite em forma de glóbulos, com diâmetro
que varia entre 2 a 10m: o tamanho é influenciado pela espécie, raça e
período de lactação. O glóbulo de gordura possui um núcleo rodeado por
uma película ou membrana. Esta película, que é dupla, possui uma parte
interna estável e composta por uma camada de moléculas de fosfolipídios
(lecitina) e outra parte externa composta de lipoproteínas, enzimas,
aglutininas e cargas elétricas (Amiot, 1991).
No leite existe uma quantidade suficiente de membranas para recobrir a
maior parte da superfície da gordura. A homogeneização reduz o tamanho
dos glóbulos e aumenta a superfície. As proteínas do leite, principalmente a
caseína, interagem com a superfície da gordura atuando como agentes
emulsificantes e mantendo a gordura em suspensão (Borszcz, 2002).
A gordura contribui para a estrutura do sorvete durante o congelamento
e aeração formando uma rede tridimensional parcialmente coalescida de
glóbulos homogêneos que, junto com as bolhas de ar e cristais de gelo
(Figura 2), é responsável pela rigidez, bem como pela resistência ao
derretimento e textura macia do produto congelado (Bolliger et al, 2000).
Segundo Mosquim (1999) as propriedades físicas da gordura são muito
importantes em relação ao comportamento do preparado durante o
congelamento e para a estruturação do sorvete. A proporção gordura
líquida/cristalizada no início do congelamento do preparado e a maneira de
sua cristalização, durante a batedura, influenciam na desestabilização da
emulsão e, conseqüentemente, na estrutura do produto final. A
desestabilização do glóbulo de gordura, no congelador, é vital para a
formação da estrutura do sorvete. A gordura livre deve ser suficiente para
recobrir a bolha de ar formada durante a batedura.
Com o aumento da gordura no sorvete, os SNGL devem ser diminuídos
a fim de se evitar a arenosidade, que se deve a cristalização da lactose no
sorvete final. Aumentando o conteúdo gorduroso do sorvete diminui o
tamanho dos cristais de gelo devido a interrupção do espaço disponível para
a formação destes (Marshall & Arbuckle, 1996).
Figura 2: Representação esquemática do sorvete
Fonte: (Goff et al, 1999)
Um alto conteúdo em gordura pode limitar o consumo, aumentar o valor
calórico e o custo; tornando-se, portanto, interessante uma diminuição deste
teor (Aime et al, 2001). Estudos mostram que glóbulos de gordura
concentrados na superfície das células de ar durante o congelamento do
sorvete, principalmente de fonte láctea, melhoram o sabor (Marshall &
Arbuckle, 1996).
A diferença mais facilmente observada entre o sorvete de pouca e o de
muita quantidade de gordura é a sensação de frio. Os sorvetes com baixo
teor de gordura parecem mais frios ao degustá-los, enquanto que os com alto
teor de gordura reduzem a sensação bucal de frio, possuem alta sensação
lubrificante na boca e são macios e cremosos (Costa & Lustoza, 2000).
A gordura utilizada para a fabricação de sorvetes pode ser fornecida
pelos ingredientes lácteos (creme de leite, manteiga, butter oil ou leite em pó
integral) ou ser de origem vegetal (derivada da soja, algodão, cacau, girassol,
coco, palma, babaçu, que podem ser usados individualmente ou em mistura).
No Brasil, como no Reino Unido e parte da Europa, a gordura mais
utilizada é a de origem vegetal. As gorduras vegetais para uso em sorvetes
devem ser parcialmente hidrogenadas (com ponto de fusão em torno de 34º -
38ºC), com propriedade de cristalizar-se rapidamente, o que evita a
aglomeração de pequenos glóbulos de gordura e formação de glóbulos
maiores.
As gorduras vegetais hidrogenadas, são preferidas do ponto de vista
tecnológico porque uma grande parte é cristalizada durante a maturação, o
que produz um sorvete com melhores características sensoriais e de boa
estabilidade durante o armazenamento (VARNAM &
SUTHERLAND,1994).
Em outros países, como os Estados Unidos da América, o creme de leite
é a principal fonte de gordura (Costa & Lustoza, 2000; Goff, 1997).
2.3.1.2. Sólidos não gordurosos do leite
Os sólidos não gordurosos do leite (SNGL) ou extrato seco
desengordurado (ESD) correspondem aos sólidos totais do leite desnatado,
constituídos por lactose (55%), proteínas e minerais (37%) e vitaminas
hidrossolúveis (8%) (Soler &Veiga, 2001).
O ESD do leite possui alto valor nutritivo, contribuindo para o sabor
final do gelado comestível. É imprescindível ao melhoramento do corpo e
textura do produto e, por não conferir aroma e sabor intensos, pode ser usado
para aumentar a palatabilidade do sorvete. (Mosquim, 1999).
As principais fontes de ESD do leite são o leite fresco desnatado, o
leitelho fresco, o leite em pó desnatado, o leite em pó integral, o leite
condensado, o leite condensado superaquecido, o leite condensado
açucarado, o leite evaporado e o soro de queijo em pó (Soler & Veiga,
2001).
A lactose é o carboidrato do leite. O poder adoçante e a sua solubilidade
são menores, comparados com outros açúcares. A lactose intervém na
textura do sorvete, dá sabor doce, mas como é pouco solúvel, quando está
em excesso pode cristalizar e produzir alterações na textura, dando origem a
um produto com textura arenosa, que produz uma desagradável sensação na
boca ao degustar o sorvete (Amiot,1991).
O leite em pó é rico em lactose, principalmente leite em pó desnatado.
Portanto seu uso é limitado devido aos defeitos que a lactose produz no
sorvete (Borszcz, 2002).
As proteínas do ESD do leite, em razão de seu elevado valor biológico,
aumentam o valor nutritivo do sorvete e sua capacidade de retenção de água,
o que torna o produto suave e facilita a incorporação de ar (Mosquim, 1999).
O efeito funcional do ESD do leite deve-se às proteínas do leite, em
especial à caseína, que durante a homogeneização, cobrem a superfície dos
glóbulos de gordura, evitando uma possível separação durante o batimento e
o congelamento. Essas proteínas também se depositam na superfície das
bolhas de ar estabilizando-as, podendo ainda absorver parte da água livre
(Soler & Veiga, 2001).
As proteínas do soro ajudam a tornar o sorvete mais compacto e macio,
prevenindo a formação de um corpo frágil e textura áspera e aumentam a
viscosidade e a resistência ao derretimento. O excesso de proteínas do soro
pode resultar em sabor salgado, além de aumentar o risco da cristalização da
lactose durante a estocagem e diminuindo o ponto de água livre (Soler
&Veiga, 2001; Goff, 2001).
A emulsificação e a capacidade de formar espuma são propriedades
ativas de superfície das proteínas. Estas características tornam as proteínas o
principal agente estabilizante de emulsão em uma mistura de sorvete (Soler
& Veiga, 2001).
Mosquim (1999) sugere que se deve empregar, ao máximo, o ESD na
formulação do sorvete em razão de seu baixo custo, mesmo sendo um dos
principais responsáveis pelos defeitos de aparência e sabor do produto,
evitando-se a cristalização da lactose e o sabor salgado. Quando em baixa
concentração, o produto apresenta-se sem coesão e com pouca incorporação
de ar, incapaz de manter o seu formato no cone com a elevação da
temperatura.
No sorvete, a proteína determina a capacidade de batimento, proporciona
características físicas e sensoriais de corpo e textura e apresenta
propriedades funcionais tais como a interação com outros estabilizantes,
estabilização de uma emulsão graxa depois da homogeneização, contribuição
para a formação da estrutura do gelado e capacidade de retenção de água
(Early, 2000).
Além de intervir na textura do gelado (pois se inter-relacionam com a
água dando textura suave e boa consistência), contribui com o valor nutritivo
e, devido aos grupos laterais hidrofóbicos que contém, formam parte da
membrana que encobre os glóbulos de gordura (Early, 2000; Amiot, 1991).
2.3.2. Ingredientes não-lácteos:
2.3.2.1. Açúcar
O açúcar, um dos principais componentes do sorvete, além de aumentar
a aceitação do produto aprimorando o sabor e aroma, apresenta outra função
que é a de aumentar a viscosidade e o teor de sólidos da mistura, o que
melhora o corpo e a textura do sorvete, tornando-o cremoso. A ausência do
adoçante provoca sensação de redução da intensidade do sabor e muitas
vezes acentua sabores e/ou aromas indesejáveis (Soler &Veiga, 2001).
Agentes edulcorantes são adicionados à mistura do sorvete na proporção
de 9 a 12% do peso para melhorar a textura e a palatabilidade do produto
(Goff, 1997).
A doçura do sorvete é obtida por meio da sacarose, dos adoçantes
derivados de milho e em uma concentração menor, da lactose (Costa &
Lustoza, 2000).
A sacarose, um dissacarídeo obtido da glicose e frutose, é o principal
adoçante utilizado na fabricação de sorvetes em razão do excelente sabor que
confere ao produto, além de fornecer corpo, sensação tátil bucal e aumentar
a viscosidade do sorvete. A adição da sacarose provoca a diminuição do
ponto de congelamento, afetando a velocidade de formação e o tamanho dos
cristais (MARSHALL & ARBUCKLE, 1996). Em sorvetes, a utilização em
níveis de aproximadamente 15% permite a obtenção de bons resultados com
relação à intensidade de doçura. Entretanto, este valor depende muito das
características regionais e do sabor do sorvete a ser fabricado. Por exemplo,
sorvetes de chocolate e frutas requerem uma maior concentração de sacarose
(KILARA, 1997).
Os açúcares derivados do milho, tem sido cada vez mais utilizados nas
formulações de sorvetes, seja substituindo total ou parcialmente os açúcares
comumente utilizados. Os xaropes de milho são menos doces que a sacarose,
contribuem para tornar o corpo do sorvete mais firme e mastigável, fornece
melhores características de derretimento, isto é , apresenta capacidade de
retardar o derretimento, representam uma fonte econômica de sólidos para a
mistura e aumenta a vida de prateleira do produto (Mikilita, 2002).
A lactose é um açúcar redutor composto de glucose e galactose (açúcar
do leite). A doçura da lactose a 1% é somente 0,15 - 0,20 vezes a da
sacarose. Conferem “flavor”, sensação tátil bucal e viscosidade a vários
alimentos. Devido a sua baixa solubilidade, em altas concentrações, pode
resultar em cristalização durante a estocagem prolongada. A cristalização da
lactose e a formação de cristais com tamanho acima de 10 mm são
responsáveis pela arenosidade em sorvetes. Em sobremesas geladas é
usualmente empregada em níveis de 1,5 – 7,0 % (KILARA, 1997).
Os açúcares, incluindo a lactose oriunda dos componentes lácteos do
sorvete, contribuem para a redução do ponto de congelamento, de forma que
no produto final apenas 72% da água se encontra congelada. O restante da
água encontra-se em uma solução de alta concentração de açúcar (Costa &
Lustoza, 2000).
Porém, o excesso de açúcar pode causar defeitos no sorvete como por
exemplo, o decréscimo do ponto de congelamento, que produz um produto
pegajoso e pesado, além de mascarar o sabor.
A Tabela 3 mostra os açúcares mais utilizados na elaboração do sorvete,
apresentando uma comparação do seu efeito sobre o sabor doce, tomando
como índice a sacarose.
Tabela 3: Decréscimo do poder adoçante nos gelados
Carboidrato Peso Molecular
Médio
PAr
Sacarose 342 1,0
Xarope de glicose 42 ED 445 0,3
Xarope de milho 42%
frutose
190 1,0
Dextrose 180 0,8
Frutose 180 1,7
Açúcar invertido 180 1,3
Lactose 342 0,2
Sorbitol 182 0,5
Glicerol 92 0,8
Etanol 46 -
Fonte: Early (2000).
Par – Poder adoçante relativo (Índice da sacarose 1)
2.3.2.2. Estabilizantes
Estabilizante é definido pela Portaria Nº 540/97 – MS (Brasil, 1997)
como substância que torna possível a manutenção de uma dispersão
uniforme de duas ou mais substâncias imiscíveis em um alimento.
Os estabilizantes são também chamados de espessantes, aglutinantes e
hidrocolóides. São compostos macromoleculares que se hidratam
intensamente e formam soluções coloidais; com isso, controlam a
movimentação da água, devido à formação de pontes de hidrogênio e à
formação de uma rede tridimensional que impede a mobilidade da água
(Early, 2000; Timm, 1989).
A utilização dos estabilizantes no sorvete tem por objetivo evitar o
crescimento de cristais de gelo, ou recristalização, causado pelas flutuações
de temperatura durante sua conservação. Os estabilizantes também
melhoram as propriedades de batimento, aumentam a viscosidade da calda,
contribuem para o melhoramento do corpo e textura do produto final,
melhoram as propriedades de derretimento, evitam a separação do soro,
facilitam a incorporação e a distribuição de ar durante a fabricação do
sorvete, promovem melhor estabilidade durante o armazenamento e não têm
efeito no ponto de congelamento (Borszcz, 2002). Porém, o uso excessivo de
estabilizante pode acarretar em características indesejáveis de derretimento
ou ainda em produto final com corpo pesado (Marshall & Arbuckle, 1996).
Entre os estabilizantes mais utilizados na indústria de sorvetes estão a
goma guar, a carboximetilcelulose (CMC), as carragenas, a gelatina e a
pectina e as suas combinações. Esses aditivos e as possíveis combinações
entre eles possuem efeitos diferenciados sobre a viscosidade da mistura e nas
características de derretimento do sorvete (Costa; Lustoza, 2000; Soler;
Veiga, 2001).
A escolha do estabilizante depende de fatores como o preço, do tipo de
processo de fabricação e das qualidades de corpo e textura esperados para
produto final (Costa; Lustoza, 2000). Geralmente são utilizados dois ou mais
estabilizantes em combinação em misturas comerciais já formuladas (Goff,
2001).
O teor utilizado de estabilizante é de 0,2 a 0,3%, variando em razão de
suas propriedades, da quantidade de sólidos da mistura e do tipo de
equipamento utilizado no processamento (Soler; Veiga, 2001).
2.3.2.3. Emulsificante
Denomina-se emulsificante qualquer substância capaz de ajudar na
formação de uma mistura estável entre substâncias imiscíveis como gordura
e água (Costa; Lustoza, 2000).
Os emulsificantes são substâncias tensoativas e cada molécula de um
emulsificante contém uma porção hidrofílica e outra lipolítica, que se
localizam na interface entre a água e a gordura. Como conseqüência, agem
reduzindo a tensão interfacial ou a força que existe entre as duas fases da
emulsão, estabilizando a mistura (preparado) e facilitando a formação de
emulsões (pequenas gotas em suspensão) e de espuma (ar em suspensão)
(Goff, 2001; Mosquim, 1999).
No sorvete existem dois tipos de emulsão: uma emulsão gordura em
água e uma emulsão ar em calda, parcialmente congelada (Timm, 1989).
No sorvete, os emulsificantes são usados para promover a uniformidade
durante o batimento, reduzir o tempo de batimento da calda, controlar a
aglomeração e o reagrupamento da gordura durante a etapa de congelamento
(estabiliza a emulsão de gordura), melhorar a capacidade de retenção de ar
na mistura, facilitar a distribuição dessas bolhas de ar na mistura e aumentar
o volume ou “overrun”, produzindo um sorvete com corpo e textura cremosa
típica dos sorvetes. Os emulsificantes também reduzem os efeitos negativos
causados pela flutuação da temperatura e aumentam a resistência ao
derretimento (Arbuckle, 1977; Mosquim,1999).
Seu uso resulta em células de ar de tamanho menor e melhor distribuídas
nas estruturas internas do sorvete, favorecendo a obtenção de uma textura
lisa no produto final, visto que os cristais de gelo e as células de ar são
reduzidos. Promovem, também, a aglomeração dos glóbulos de gordura,
facilitando o enrijecimento do sorvete, sendo essa habilidade o fator mais
importante a ser considerado na seleção de um emulsificante (Costa &
Lustoza, 2000). Porém o uso excessivo de emulsificante pode resultar em
derretimento muito lento e alterações nas características desejáveis de corpo
e textura (Marshall & Arbuckle, 1996).
A falta de emulsificante favorece a separação de gordura durante a
maturação e torna a gordura livre durante a bateção, pela ruptura dos
glóbulos.
Os emulsificantes mais comuns utilizados na produção de misturas de
sorvetes são de dois tipos principais: mono e di-glicerídeos e os ésteres como
o Polisorbato 80 (Goff, 1997). Comercialmente são fornecidas muitas
combinações de estabilizantes e emulsificantes para aplicações específicas.
A quantidade máxima de emulsificantes por peso não deve exceder
0,2%, caso contrário o produto final apresentará defeitos de corpo, textura e
derretimento (Soler; Veiga, 2001).
Juntos os estabilizantes e os emulsificantes constituem menos de 1% do
peso do sorvete (Goff, 2001).
2.3.2.4. Outros Sólidos
Além dos estabilizantes e emulsificantes, são considerados outros
sólidos o cacau em pó, os sólidos das frutas, os aromatizantes, a gema de
ovo, entre outros produtos.
O cacau e o chocolate são utilizados na forma de pós, considerando-se
como cacau o produto sem a adição de açúcar e como chocolate a mistura de
cacau e açúcar, podendo conter ou não manteiga de cacau, adicionado ou
não de leite. Esses produtos são utilizados na formulação de sorvete na
proporção de 3 a 4% da mistura (Mosquim, 1999).
As frutas e sucos de frutas, em virtude da sua sazonalidade e para que
possam estar disponíveis durante o ano todo, são submetidas a processos de
congelamento, pasteurização, desidratação, concentração, entre outros. São
utilizados, especialmente, na forma de frutas congeladas, desidratadas, sucos
integrais e congelados (Costa; Lustoza, 2000).
Materiais sólidos como frutas, nozes, doces e crocantes são adicionados
ao sorvete quando a massa é retirada da produtora, sendo possível a adição
de frutas e nozes à mistura antes, em algumas produtoras contínuas, desde
que sejam uniformemente moídas ou picadas (Soler & Veiga, 2001).
Os aromatizantes geralmente estão disponíveis na forma de produtos
prontos formulados, os quais são adicionados na mistura do sorvete na etapa
de congelamento. Aromas de chocolate são usualmente adicionados à
mistura depois do processo, ao passo que aromas líquidos são adicionados
no tanque da mistura, antes do congelamento (Soler & Veiga, 2001).
Mosquim (1999) cita outros sólidos na fabricação de sorvetes, como o
café solúvel e baunilha, as bebidas alcoólicas e o iogurte.
Um dos objetivos em modificar as formulações do sorvete é produzir um
produto com melhor estrutura física e características organolépticas.
2.3.2.5. Água e Ar
A água está presente no sorvete na fase líquida, sólida e como uma
mistura dos dois estados físicos (Marshall & Arbuckle, 1996).
O ar encontra-se disperso através da emulsão água-gordura. A
quantidade de ar no sorvete é importante devido sua influência na qualidade,
conferindo um produto macio. A incorporação de ar no produto deverá
obedecer aos padrões regulamentados na legislação de cada país. A
manutenção da quantidade uniforme de ar e sua qualidade é essencial no
controle da boa qualidade (Marshall & Arbuckle, 1996). O ar no sorvete
fornece uma textura leve e influencia as propriedades físicas do derretimento
e dureza. Entretanto, não apenas a quantidade de ar incorporado (“overrun”),
mas também a distribuição do tamanho das bolhas de ar influencia nesses
parâmetros. A produção de sorvete de alta qualidade requer cuidadoso
controle do “overrun” e da distribuição do tamanho das células de ar (Sofjan
& Hartel, 2004).
O overrun ou aumento do volume pela incorporação de ar, é uma das
etapas mais importantes da fabricação de sorvetes, já que influencia
diretamente a qualidade e o rendimento da mistura. Atualmente, estuda-se a
possibilidade de incorporação de outros gases, como nitrogênio líquido e gás
carbônico (Mosquim, 1999; Soler; Veiga, 2001).
A interface entre ar e material disperso na fase aquosa é estabilizada por
um filme fino de material não congelado e glóbulos de gordura parcialmente
misturados (Marshall & Arbuckle, 1996).
2.4. Processamento
Uma vez que os requisitos de composição relacionados com qualidade e
quantidade estejam definidos, a mistura esta pronta para o processamento
(Marshall & Arbuckle, 1996).
As etapas do processo de fabricação de sorvete, de um modo geral,
seguem o fluxograma apresentado na Figura 3.
Figura 3: Fluxograma do processo de fabricação de sorvete
Fonte: Adaptado de Goff, 2002.
2.4.1. Dosagem e preparo da mistura dos componentes
Para obtenção de um bom sorvete é importante que se utilize
ingredientes de qualidade e que haja um correto balanceamento entre os
componentes, tais como, a quantidade de sólidos totais, gordura, açúcar,
estabilizante, emulsificante e aromatizantes (Arbuckle, 1977).
O principal propósito da etapa de preparo da mistura é o de garantir que
todos os ingredientes estejam dissolvidos ou em suspensão, sem a formação
de grumos de ingredientes em pó ou de estabilizantes, bem como assegurar
uma correta proporção dos mesmos (Mikilita, 2002).
Inicialmente os ingredientes são selecionados, pesados e misturados para
se obter a mistura do sorvete, também denominada de mix. Os ingredientes
são escolhidos pelo fabricante com base na expectativa de qualidade e custo
(Goff, 2002).
Essa operação envolve um pré-aquecimento da mistura, sob agitação,
para assegurar a dispersão das partículas de gordura e a emulsificação dos
ingredientes (Mikilita, 2002).
Inicia-se a operação com a adição de ingredientes líquidos (água, leite)
em um tanque de mistura, no qual são aquecidos sob agitação e,
posteriormente, os ingredientes lácteos sólidos (leite em pó, soro de leite)
são adicionados. Os demais ingredientes sólidos, como ovos em pó, cacau
em pó e estabilizantes devem ser previamente misturados com parte do
açúcar para facilitar sua dissolução, sendo adicionados à uma temperatura de
45º a 50º C, sob agitação. Somente após esses procedimentos é que são
acrescentados os demais ingredientes como o xarope de milho, gorduras e o
restante do açúcar (Costa & Lustoza, 2000; Gonçalo, 2002).
Componentes termolábeis como os agentes flavorizantes devem ser
adicionados durante a etapa de maturação.
A produção da mistura do sorvete está diretamente relacionada com as
condições locais, as quais variam de um país a outro. Nos Estados Unidos a
mistura do sorvete é produzida, geralmente, por empresas de produtos
lácteos e transportadas para as fábricas de sorvete. Na Europa, a mistura é
produzida nas próprias fábricas.
2.4.2. Pasteurização
A pasteurização tem por objetivo eliminar todos os microrganismos
patogênicos do leite, garantindo assim a qualidade microbiológica do
produto. Segundo Goff (2001), patógenos como o Mycobacterium
tuberculosis, a Salmonella spp., o Staphyloccoccus aureus e a Listeria
monocytogenes, entre outros, podem estar presentes no sorvete, oriundos dos
seus ingredientes lácteos.
Pela legislação brasileira (ANVISA, 1999), os gelados e os preparados
para gelados comestíveis, elaborados com produtos lácteos ou ovos devem
ser pasteurizados a 70°C por 30 minutos, quando o processo for batelada e
80ºC por 25 segundos, quando o processo for contínuo, ou tiver condições
equivalentes de tempo e temperatura ao que se refere no poder de destruição
de microrganismos patogênicos. A tabela 4 apresenta os binômios de tempo
e temperatura recomendados para a pasteurização de misturas de sorvete
(Costa & Lustoza, 2000).
Tabela 4: Binômios de tempo e temperatura aplicados no tratamento térmico
de misturas de sorvete
Sistema Tempo Temperatura (oC)
LTLT (baixa temperatura por longo
tempo)
30 min. 68,5ºC
HTST (alta temperatura por curto
tempo)
25 s 79,5ºC
Vacreação (temperatura mais alta
durante o tempo mais curto)
1 a 3 s 90ºC
UHT (ultra-alta temperatura) 4 s 138ºC
Fonte: Mosquim (1999).
O motivo pelo qual o binômio tempo e temperatura são mais elevados
que o do leite fluído deve-se à adição dos ingredientes, principalmente o
açúcar e a gordura, que dificultam a transferência de calor e fornecem uma
capa protetora aos microrganismos (Borszcz, 2002)
No sistema em batelada empregado em pequenas escalas de produção,
todos os ingredientes da mistura são vagarosamente aquecidos em um tanque
equipado com uma camisa de vapor. Como a temperatura deve ser baixa e a
da superfície da camisa de vapor tipicamente alta, o processo leva,
obrigatoriamente, vários minutos para aquecer a mistura próximo de 60º C.
A agitação da massa torna-se necessária a fim de facilitar a transferência de
calor da superfície da camisa de vapor para o produto (Mikilita, 2002).
O processo de pasteurização contínua é facilmente controlado, de modo
que para todos os lotes é aplicado o mesmo tratamento térmico. O tratamento
térmico a temperaturas mais elevadas reduz o consumo de espessantes em 25
- 30% em comparação ao sistema LTLT (baixa temperatura por longo
tempo) (Mosquim, 1999).
Além de eliminar os microrganismos patogênicos, o tratamento térmico
produz a fusão dos emulsificantes, ativa os estabilizantes em solução
coloidal, melhorando o efeito dos emulsificantes e estabilizantes pela ação
das proteínas do soro. Ao desnaturar a proteína do soro, a parte lipofílica da
molécula que se encontra no interior da estrutura é quebrada. Nestas
condições, a tensão superficial da interface gordura/água é reduzida, agindo
assim como agentes emulsificantes. A pasteurização também modifica a
capacidade de retenção de água da proteína do soro, que alcança valores
similares aos da caseína, aumentando em 3 vezes sua capacidade de
retenção. A desnaturação protéica tem efeito positivo sobre a qualidade do
sorvete, obtendo um produto mais cremoso, com textura e consistência mais
suaves e uniformes. Porém, o que limita as condições de tempo/temperatura
mais severas são as alterações de sabor e aroma (Early, 2000).
Em geral as condições de pasteurização ideais irão depender de fatores
como: composição da mistura, ingredientes utilizados, quantidade de cada
produto, equipamento, entre outros. Isto faz com que cada fabricante adote
temperatura e tempo adequados para cada processo, em função da legislação
para o processo de pasteurização.
2.4.3. Homogeneização
A homogeneização tem por finalidade diminuir o tamanho dos glóbulos
de gordura, favorecendo a formação de um produto mais homogêneo,
cremoso e facilitando a ação dos agentes emulsificantes e estabilizantes
sobre a superfície das partículas (Porto, 1998).
A redução e a uniformização das partículas de gordura se processam no
equipamento homogeneizador, em que a calda é admitida em um cilindro e
um pistão força a sua passagem por meio de um orifício bem pequeno, sob
condições controladas de pressão e temperatura (Sibèr, 1999).
A homogeneização reduz o diâmetro dos glóbulos de gordura a menos
de 2 micra (2x10-6 mm), o que impede a sua separação durante as etapas de
maturação e congelamento (Mosquim, 1999).
A homogeneização ocorre somente quando a gordura está líquida, em
temperaturas superiores a 50º C. A temperatura recomendada para essa etapa
está na faixa entre 68º a 77º C, uma vez que temperaturas inferiores tendem
a elevar a viscosidade da mistura em razão da aglutinação dos glóbulos de
gordura (Mosquim, 1999).
Além da temperatura de homogeneização, a pressão a ser empregada
também varia de acordo com a composição da mistura, em especial, com o
teor de gordura.
Quando o teor de gordura for superior a 14%, a homogeneização deve
ser processada em equipamentos providos de dois estágios, nos quais os
aglutinados de gordura são desfeitos no segundo estágio, com o rompimento
das ligações protéicas, reduzindo a viscosidade da mistura (Costa; Lustoza,
2000; Mosquim, 1999).
Os homogeneizadores são bombas de êmbolo que movimentam uma
quantidade constante de líquido, através de orifícios muito finos de uma ou
duas válvulas, como mostra a figura 4.
Figura 4: Diagrama de conjunto de válvulas de um homogeneizador de uma
válvula e duas válvulas.
Fonte: Arbuckle (1977).
A etapa da homogeneização depende de vários fatores, tais como:
a) Temperatura - a eficiência da homogeneização melhora quando a
calda é homogeneizada a uma temperatura entre 70 – 80ºC (Early, 2000;
Amiot, 1991).
É importante observar que, quando a pasteurização se processa a
temperaturas acima de 76ºC em sistema de batelada, é conveniente que se
resfrie a calda a 65ºC para reduzir a intensidade do sabor de queimado,
especialmente quando a homogeneização não se completa em 30 minutos
(Arbuckle, 1977).
b) Pressão do homogeneizador - a pressão deve ser suficiente para se
obter um produto de qualidade. A utilização de pressão excessiva no
processo tende a aglomerar as moléculas de gordura, enquanto que uma
pressão insuficiente impossibilita a obtenção de uma boa dispersão da
matéria gordurosa.
c) Composição da calda - a eficiência da homogeneização dependerá do
teor de gordura adicionado. Quanto menor o teor de gordura, maior será a
pressão, e vice-versa (Early, 2000).
2.4.4. Resfriamento rápido
Após a pasteurização e a homogeneização a mistura é resfriada a uma
temperatura de 4º C, em um período curto de tempo, para evitar a
multiplicação de microorganismos que possam ter sobrevivido à
pasteurização (Mosquim, 1999).
Essa etapa também é realizada para prevenir a viscosidade excessiva, o
que impediria o derretimento suave do produto final (Soler; Veiga, 2001).
Nos processos de fabricação artesanais, o resfriamento da mistura é
efetuado no mesmo equipamento onde se realiza a pasteurização. Estes
equipamentos possuem tinas com paredes duplas nos quais, durante a
pasteurização, a água quente passa em volta da parede externa da tina, sendo
substituída, depois, por água fria durante o resfriamento (Gonçalo, 2002).
Em processos industriais mais sofisticados, o resfriamento é realizado
em placas trocadoras de calor, em que a mistura aquecida pela pasteurização
passa por um lado da placa e a água fria pela outra, ocasionando o
resfriamento da mistura a uma temperatura de 4º C (Gonçalo, 2002).
Segundo Marshall & Arbuckle (1996), este procedimento faz com que se
inicie a cristalização da gordura, entretanto, a mistura ainda não está pronta
para o congelamento até este ponto do processo.
2.4.5. Maturação
Após ser pasteurizada, homogeneizada e resfriada, a mistura é mantida à
temperatura de até 4º C, sob agitação lenta e constante em um tanque ou tina
de maturação (Mikilita, 2002).
O objetivo dessa etapa é o de promover a completa hidratação do
estabilizante, o aumento dos glóbulos de gordura pela proteína e a
cristalização da gordura. O tempo de repouso combinado com a baixa
temperatura da mistura é o que se denomina de envelhecimento ou
maturação (Costa & Lustoza, 2000).
Com os processos de pasteurização e homogeneização, a estrutura física
dos sólidos suspensos é alterada sendo que novas e diferentes membranas de
glóbulos de gordura são formadas e os colóides hidrofílicos são hidratados.
A essa temperatura a gordura presente passa por um processo de
cristalização, entretanto a mistura ainda não está pronta para ser congelada
(Soler & Veiga, 2001).
De acordo com Silva (1996), durante este espaço de tempo ocorrem
mudanças benéficas como, por exemplo, a solidificação da gordura,
hidratação dos sólidos, aumento da viscosidade, melhoria do corpo e textura,
uma melhor absorção do ar durante seu batimento e congelamento e o
aumento da resistência ao derretimento do sorvete. A maturação pode chegar
a 24 horas, porém deve-se evitar períodos muitos longos, para que não se
produzam alterações por microrganismos psicrotróficos.
Para que haja a cristalização da gordura, a completa adsorção de
proteínas e emulsificantes nos glóbulos de gordura e a hidratação de
proteínas e estabilizantes, a mistura necessita permanecer por um período
que varia de 1 a 24 horas, sendo que o produto final de melhor qualidade é
aquele que permanece em maturação por 4 a 12 horas ou mais (Costa &
Lustoza, 2000).
Flavorizantes e aromatizantes são adicionados nessa etapa, exceto para
sabores de chocolate em que se recomenda a adição no início do processo.
Quando se trata de frutas ou saborizantes ácidos em misturas à base de leite,
sugere-se que sejam adicionados após a maturação, evitando a
desestabilização e precipitação das proteínas lácteas (Mikilita, 2002).
2.4.6. Batimento, congelamento parcial e incorporação de ar
Segundo Mosquim (1999), o congelamento é uma das operações mais
importantes na fabricação de gelados comestíveis. Esta etapa tem a
finalidade de remoção do calor da mistura e a incorporação de ar.
Após a maturação, a calda é transferida para a produtora (batedeira). No
comércio, existem dois tipos fundamentais de congeladores: os descontínuos
(horizontal e vertical) e os contínuos (horizontal). As cubas de congelamento
descontínuas são utilizadas para o processo artesanal ou em baixa escala,
enquanto que os congeladores contínuos são utilizados para fabricação em
escala industrial. As propriedades do sorvete são diferentes segundo o tipo
de congelador utilizado, sendo o processo de congelamento mais rápido em
equipamentos horizontais contínuos, onde 50% da água se congela em
poucos minutos, além de formar grande quantidade de pequenos cristais de
gelo e obtenção de uma textura suave. A quantidade de ar incorporada
também é diferente para os dois sistemas. Em congeladores descontínuos, o
ar é simplesmente incorporado por agitação no interior da calda à pressão
atmosférica; obtém-se um overrun de 50 a 100%; nos congeladores
contínuos o ar é incorporado a uma pressão determinada pelo equipamento e
posteriormente se expande produzindo um grande número de pequenas
células de ar; neste sistema consegue-se um overrun de até 130% ou mais. O
sorvete sai da produtora à temperatura de –6ºC (Varnam & Sutherland,
1994).
A incorporação do ar é chamada de overrun, usualmente definido
como o aumento do volume do sorvete obtido a partir de um volume inicial
de calda, e é expressa em porcentagem de overrun. Este aumento de volume
é composto principalmente do ar incorporado durante o processo de
congelamento. A quantidade de ar incorporada depende da composição da
calda e de propriedades do processamento, obtendo-se características
adequadas de corpo, textura e palatabilidade necessárias ao sorvete
(Arbuckle, 1977).
Nesta etapa, vários processos ocorrem simultaneamente, sendo esta
uma das operações mais importantes da manufatura do sorvete, da qual
dependerá a qualidade e sabor do produto final. Durante o congelamento a
composição permanece inalterada, mas a estrutura física torna-se altamente
intrincada: glóbulos de gordura e amontoados de glóbulos de gordura
cobrem quase completamente as bolhas de ar e também formam uma rede
contínua através da fase aquosa. A ação de batimento e cristalização do gelo
desestabiliza a emulsão da gordura na mistura, formando aglomerados de
glóbulos de gordura. A gordura desestabilizada atua como um agente
compactante e fornece suporte para as bolhas de ar primariamente lineadas
por proteínas. A combinação de proteínas de leite e gordura, parcialmente
coalescida, fornece força e estrutura para o sorvete. As bolhas de ar se
chocam e quebram-se em menores; ocorre também a coalescência de bolhas,
até que se alcance um estado estacionário, resultando em uma distribuição de
tamanhos mais uniformes (Walstra & Jonkman, 1998).
As bolhas de ar são os elementos que apresentam os maiores
tamanhos, tendo também a maior proporção em volume (Goff, 1997).
Excesso de ar produz um sorvete fofo; pouca quantidade de ar
produz um sorvete pesado, difícil de manipular. A quantidade de ar
incorporado é definida pelos seguintes fatores:
a) Regulamentação legal - no Brasil a porcentagem máxima de ar
que se pode incorporar ao sorvete é de 110 %, isto significa que, um litro de
sorvete deve corresponder a uma massa de 475 g;
b) Conteúdo de sólidos totais - geralmente a alta quantidade de
sólidos totais na calda, aumenta a quantidade de ar incorporado ao sorvete,
comparado com a baixa quantidade de sólidos;
c) Tipo de equipamento para o congelamento - produtoras
horizontais (contínuas) incorporam maiores quantidades de ar que
produtoras verticais (batelada);
d) Quantidade de gordura - alta quantidade de gordura diminui a
quantidade de ar incorporada;
O controle do overrun é muito importante para obtenção de um
produto padronizado, de acordo com os dados especificados no rótulo como
composição nutricional e peso da embalagem; além disso, para obter-se a
rentabilidade do produto que caracteriza o perfil de manufatura.
O sorvete é retirado da máquina produtora com uma consistência semi-
sólida, com aproximadamente metade da água congelada (Mosquim, 1999).
Para certos tipos de produto como os sorvetes de flocos, de passas, de
frutas in natura ou cristalizadas ou com polpas de frutas, a adição dos
ingredientes ocorre entre a etapa de batimento e envase (Gonçalo, 2002).
2.4.7. Acondicionamento
Após o batimento é atingido o ponto de consistência esperado, o sorvete
é acondicionado em embalagens definitivas, mediante o enchimento
automático ou manual e essa operação deve ocorrer sem elevação
significativa da temperatura do produto (Mikilita, 2002).
2.4.8. Endurecimento (Congelamento final)
Na saída da produtora, o sorvete é envasado, sendo que o processo de
congelamento continua, e é conhecido como endurecimento. O
endurecimento é feito em câmaras ou túneis de congelamento à temperatura
de -20ºC a -30ºC. Nestas câmaras, o teor de água congelada do sorvete chega
de 80% a 90%. A Figura 5 mostra a variação da quantidade de água
congelada formando cristais de gelo com o abaixamento da temperatura. O
ideal é que o endurecimento seja o mais rápido possível, para se evitar a
formação de grandes cristais de gelo (Amiot, 1991; Arbuckle, 1977;
Mosquim, 1999).
O tempo de endurecimento varia de 24 a 30 horas de acordo com o
tamanho e formato da embalagem, da velocidade e temperatura do ar de
resfriamento, da temperatura de extrusão, da composição da mistura e do
overrun do produto (Mosquim, 1999).
Figura 5: Porcentagem de água congelada em função da temperatura
Fonte: Early (2000).
2.4.9. Estocagem
Essa etapa é realizada nas câmaras de armazenamento, a temperaturas
entre -30º a -35º C, com o objetivo de manter a temperatura do produto final
(Mikilita, 2002).
2.5. Estrutura
A forma com que o consumidor percebe o sabor e a textura do sorvete
está baseada na estrutura desse alimento, considerada como um dos seus
principais atributos (Goff, 1997).
Vários passos no processo de fabricação do sorvete, incluindo
pasteurização, homogeneização, maturação, congelamento e armazenamento
contribuem para o desenvolvimento da estrutura do sorvete (Goff, 1997).
O sorvete possui a estrutura de um colóide complexo (Figura 6),
formado por bolhas de ar, glóbulos de gordura, cristais de gelo e por uma
fase aquosa não congelada. A fase contínua é composta pela água, nela estão
dissolvidos a maioria dos ingredientes e a fase descontínua é composta por
ar e gordura (Sibèr, 1999; Goff,2001).
A qualidade do sorvete dependerá bastante de sua estrutura, que pode ser
dividida em aspectos coloidais (gordura e ar) e aspectos de cristalização do
gelo, e também do efeito do maior congelamento de solutos e
macromoléculas dispersas (Goff, 2001). A estrutura física do sorvete é um
sistema físico-químico complicado composto por 50% de bolhas de ar, 25%
de cristais de gelo, 5% de glóbulos de gordura e o restante de 20% de matriz
composta de açúcares, proteínas e estabilizantes (Goff, 1997). Os cristais de
gelo e bolhas de ar formam uma dispersão mais grosseira que os glóbulos de
gordura. O produto, portanto, é caracterizado fisicamente pelo tamanho e
fração volumétrica dos vários elementos estruturais (Walstra & Jonkman,
1998) (Tabela 5).
Tabela 5: Tamanho médio de elementos estruturais em sorvetes a -5ºC
Elemento estrutural Tamanho médio (m) Fração volumétrica
Cristais de gelo 50 0,3
Bolha de ar 100 0,5
Espessura da lamela 15 -
Glóbulos de gordura 0,6 0,06
Aglomerados de
gordura
3 0,06
Cristais de lactose 15 0,005
Fonte: Walstra & Jonkman (1998).
As bolhas de ar encontram-se revestidas por glóbulos de gordura e esses
cobertos por camadas de proteínas e emulsificantes. (GOFF, 2001).
FIGURA 6 – Estrutura coloidal do sorvete congelado
FONTE: GOFF (2001).
LEGENDA: (A) bolha de ar, (C) cristal de gelo, (F) glóbulo de gordura, (S)
fase aquosa
Os aglutinados de glóbulos dão continuidade à estrutura protéica na
fase aquosa do preparado. O número de glóbulos livres deve ser suficiente
para formar a camada de gordura que recobre a bolha de ar. A quantidade de
ar incorporada em relação ao volume do produto, também denominado de
overrun, define a área superficial do ar a ser recoberta pela gordura livre e
pelos glóbulos isolados (Mosquim, 1999). Essa estrutura está demonstrada
na Figura 7.
FIGURA 7 – Glóbulos de gordura revestindo a bolha de ar no sorvete
congelado
FONTE: GOFF (2001).
Os glóbulos de gordura se concentram na superfície da célula de ar
durante o congelamento do sorvete. Aumentando a concentração de gordura,
diminui o tamanho dos cristais de gelo, devido à interrupção do espaço onde
eles se formariam (Soler; Veiga, 2001).
A estrutura do sorvete pode ser definida como uma espuma
parcialmente congelada, na qual cristais de gelo e bolhas de ar ocupam a
maior parte do espaço. Os finos glóbulos de gordura, alguns deles floculados
e rodeando as bolhas de ar, também formam a fase dispersa. Proteínas e
emulsificantes encontram-se em torno dos glóbulos de gordura. A fase
contínua consiste de uma solução não congelada de alta concentração de
açúcares (Goff, 1997).
Essa estrutura coloidal complexa está diretamente relacionada com
os ingredientes e com algumas etapas do processo de fabricação
(pasteurização, homogeneização, batedura, congelamento), descritas no item
2.4 deste trabalho (Processamento).
2.6. Características de um Sorvete ideal e defeitos em Sorvetes
2.6.1. Características de qualidade do sorvete
Um sorvete ideal deverá obedecer limites de confiança quanto aos
seguintes atributos de qualidade: sabor, corpo, textura, palatabilidade,
características de derretimento, cor, embalagem, conteúdo microbiológico e
composição (Marshall & Arbuckle, 1996). Enfim, deseja-se que um sorvete
de boa qualidade seja cremoso, suave, isento de grandes cristais de gelo e
lactose (os quais produzem sensação de arenosidade), não gorduroso, que
derreta suavemente na boca, que seja firme, ou seja, que não derreta
rapidamente quando exposto à temperatura ambiente, que tenha sabor doce e
que não produza forte sensação de frio na boca.
A utilização de ingredientes de boa qualidade, uma composição
balanceada, e cuidados durante o processamento do sorvete, são fatores de
determinaram a qualidade final do produto.
2.6.2. Defeitos em Sorvetes
Os defeitos que aparecem com mais freqüência nos sorvetes afetam
seu sabor, textura e consistência. Geralmente os defeitos de sabor aparecem
quando se utilizam ingredientes de má qualidade e quando os ingredientes
não são empregados corretamente. Produtos de má qualidade como a
gordura, provocam sabor oxidado. O sabor cozido é originado
principalmente por superaquecimento das proteínas do leite, e o sabor ácido
é típico de produtos fermentados. Excesso ou falta de açúcar, excesso de
estabilizantes e aromatizantes repercute imediatamente sobre a qualidade
degustativa do produto (Amiot, 1991).
Cristais acima de 40 mm a 50 mm em números suficientes resultam
em textura granulosa e áspera. A textura depende principalmente do número
e tamanho das partículas, sua organização e sua distribuição; o sorvete ao ser
degustado deve ser suave e produzir uma sensação agradável na boca. O
defeito que ocorre com maior freqüência é a textura grosseira e arenosa. Sua
aparição é favorecida pela utilização de uma calda mal equilibrada, um
processo inadequado de produção e má condição de conservação, por
exemplo, conservação a altas temperaturas e flutuação constante de
temperatura (Amiot, 1991).
A textura grosseira e quebradiça deve-se normalmente a um
conteúdo muito baixo de extrato seco desengordurado, insuficiência de
estabilizante, homogeneização a baixa pressão ou congelamento muito lento.
A textura arenosa é atribuída a formação de grandes cristais de lactose,
sendo favorecida por um conteúdo de extrato seco desengordurado superior
a 10-11% (Borszcz, 2002).
O sorvete de consistência defeituosa pode ser grumoso, pegajoso ou
pesado. Estes defeitos aparecem devido à calda mal equilibrada, ingredientes
cujas propriedades funcionais tenham sido modificadas ou processo de
fabricação inadequado (Amiot, 1991).
Outro defeito também encontrado é a rapidez com que o sorvete
derrete. Sorvetes que apresentam alta quantidade de sólidos totais e gordura
derretem mais rapidamente que amostras com baixo conteúdo de sólidos
totais e gordura (Borszcz, 2002). Este defeito também está relacionado com
uso excessivo de estabilizantes/emulsificantes, overrun muito alto ou ainda
processamentos severos e interações entre os componentes que promovem
formação de gel altamente estável (Amiot, 1991).
A Tabela 6 apresenta um resumo das vantagens e limitações de
vários constituintes utilizados na elaboração do sorvete.
Tabela 6 - Vantagens e limitações de vários constituintes do sorvete
(Arbuckle, 1977).
Constituintes Vantagens Limitações
Gordura do
leite
Aumenta a riqueza do sabor
Produz característica de
textura cremosa
Ajuda a dar corpo ao
sorvete
Custo
Alto valor calórico
Alto conteúdo deixa o
sorvete enjoativo
Sólidos não
gordurosos
Promovem textura
Ajudam a dar corpo
Fonte barata de sólidos
Alta concentração produz
arenosidade
Pode causar sabor a cozido e
salgado
Açúcar
Fonte barata de sólidos
Promove textura
Melhora o sabor
Doçura excessiva
Abaixa a habilidade de batimento
Requer longo tempo de
congelamento
Para o processo de
endurecimento há
necessidade de baixas
temperaturas
Estabilizantes
Efetivos para adquirir uma
textura suave
Proporcionam corpo ao
produto
Aumentam a resistência ao
derretimento
Gosto amargo
Sólidos totais Textura cremosa Pesado e corpo pastoso
Melhor corpo
Mais nutritivo
Flavor Aumenta a aceitabilidade Sabor adstringente
Cor
Promove atratividade
Ajuda na identificação do
sabor
3. CONCLUSÃO
O sorvete é um colóide complexo constituído de bolhas de ar, cristais
de gelo, glóbulos de gordura e por uma fase contínua não congelada, onde
estão presentes proteínas, açúcares e estabilizantes.
A qualidade final do produto está diretamente relacionada à sua
estrutura física. A formação e desenvolvimento dessa estrutura são
influenciadas por várias etapas do processo produtivo como, pasteurização,
homogeneização, maturação, incorporação de ar e congelamento, e também
pela formulação utilizada.
No Brasil, o mercado de sorvete possui uma boa perspectiva de
crescimento devido o clima apropriado para o consumo deste produto.
Embora o clima seja um fator positivo para o consumo de sorvete, a
mentalidade brasileira é um aspecto que o setor sorveteiro precisa trabalhar,
quebrando o “tabu” de o sorvete ser um produto associado ao verão. Um
ponto que merece a reflexão do setor sorveteiro é o estímulo ao consumo do
produto durante o inverno, lançando sorvetes especiais para serem
consumidos nessa estação do ano.
Apesar da alta complexidade que envolve a produção de sorvete,
poucos trabalhos têm sido realizados no Brasil com o intuito de elucidar os
aspectos relacionados à produção desse gelado comestível. Sendo assim,
fica-se a sugestão, de se desenvolver pesquisas relativas a esse produto, com
o intuito de se buscar novas formulações que possibilitem melhorias na
estrutura física do sorvete.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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