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MODELAGEM MOLECULAR DE NOVOS DERIVADOS DE NEOLIGNANAS COM ATIVIDADE ANTI-LEISHMANIOSE. Dra. Rita Cristina Azevedo Martins. Pesquisadora do Departamento de Química do Centro de Ciências Exatas e Naturais da Universidade Federal do Pará – UFPA. CEP 66075-110 - Caixa postal 479 PABX +55 91 3201-7000 - Belém - Pará - Brasil e-mail: [email protected] Josenaide Pereira do Nascimento. Curso de Química Bacharelado, Departamento de Química do Centro de Ciências Exatas e Naturais da Universidade Federal do Pará – UFPA. Bolsista PIBIC/UFPA. CEP 66075-110 - Caixa postal 479 PABX +55 91 3201-7000 - Belém - Pará – Brasil e-mail: [email protected] RESUMO Descritores moleculares baseados no estudo de SAR para vinte e dois derivados de neolignanas com atividade anti-leishmaniose estão sendo apresentados neste trabalho. Os cálculos de DFT foram empregados para uma série de compostos utilizando uma energia funcional B3LYP com o conjunto de base 6-31G*. Os estudos de SAR sugerem que efeitos estéricos podem apresentar uma forte influência sobre a atividade observada. As análises de componente principal e discriminante foram empregadas para reduzir os descritores moleculares e obter a relação entre estes descritores e a atividade biológica. Estas análises também são utilizadas para auxiliar os estudos de SAR. O conjunto de moléculas foi classificado de acordo com seu grau de atividade. Estas análises mostraram que as cargas no átomo C7, C9 e C16 e a eletronegatividade (χ) fornecem valiosas informações e tem uma função significativa sobre a atividade das neolignanas, portanto são responsáveis pela separação entre derivados ativos e inativos. Os resultados deste trabalho sugerem que a atividade anti-leishmaniose destes derivados pode estar relacionada com as propriedades eletrônicas e estéricas e podem ser utilizados para auxiliar o planejamento de novos derivados neolignanas com atividade anti-leishmaniose mais pronunciada. ABSTRACT Quantum chemical molecular descriptors based SAR study of twenty-two neolignan derivatives, with antileishmaniasis activity, is presented in this work. The DFT calculations was employed to the series of compounds by using a B3LYP energy functional with the 6- 31G* basis set. SAR studies suggest that steric effects can be a influency strong over observed activity. The principal component analysis – PCA, and stepwise discriminant analysis – SDA were employed to reduce dimensionality and obtain the relationship between the molecular descriptors and biological activity. The set of molecules was classified into two groups according to their degree of biological activity. These analyses showed that the charge

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MODELAGEM MOLECULAR DE NOVOS DERIVADOS DE NEOLIGNANAS COM ATIVIDADE ANTI-LEISHMANIOSE.

Dra. Rita Cristina Azevedo Martins. Pesquisadora do Departamento de Química do Centro de Ciências Exatas e Naturais da

Universidade Federal do Pará – UFPA. CEP 66075-110 - Caixa postal 479 PABX +55 91 3201-7000 - Belém - Pará - Brasil

e-mail: [email protected]

Josenaide Pereira do Nascimento. Curso de Química Bacharelado, Departamento de Química do Centro de Ciências Exatas e Naturais da

Universidade Federal do Pará – UFPA. Bolsista PIBIC/UFPA. CEP 66075-110 - Caixa postal 479 PABX +55 91 3201-7000 - Belém - Pará – Brasil

e-mail: [email protected]

RESUMO Descritores moleculares baseados no estudo de SAR para vinte e dois derivados de neolignanas com atividade anti-leishmaniose estão sendo apresentados neste trabalho. Os cálculos de DFT foram empregados para uma série de compostos utilizando uma energia funcional B3LYP com o conjunto de base 6-31G*. Os estudos de SAR sugerem que efeitos estéricos podem apresentar uma forte influência sobre a atividade observada. As análises de componente principal e discriminante foram empregadas para reduzir os descritores moleculares e obter a relação entre estes descritores e a atividade biológica. Estas análises também são utilizadas para auxiliar os estudos de SAR. O conjunto de moléculas foi classificado de acordo com seu grau de atividade. Estas análises mostraram que as cargas no átomo C7, C9 e C16 e a eletronegatividade (χ) fornecem valiosas informações e tem uma função significativa sobre a atividade das neolignanas, portanto são responsáveis pela separação entre derivados ativos e inativos. Os resultados deste trabalho sugerem que a atividade anti-leishmaniose destes derivados pode estar relacionada com as propriedades eletrônicas e estéricas e podem ser utilizados para auxiliar o planejamento de novos derivados neolignanas com atividade anti-leishmaniose mais pronunciada.

ABSTRACT Quantum chemical molecular descriptors based SAR study of twenty-two neolignan derivatives, with antileishmaniasis activity, is presented in this work. The DFT calculations was employed to the series of compounds by using a B3LYP energy functional with the 6-31G* basis set. SAR studies suggest that steric effects can be a influency strong over observed activity. The principal component analysis – PCA, and stepwise discriminant analysis – SDA were employed to reduce dimensionality and obtain the relationship between the molecular descriptors and biological activity. The set of molecules was classified into two groups according to their degree of biological activity. These analyses showed that the charge

on atom C7, C9, and C16 and electronegativity (c) provide valuable information and have a significant role in the assessment of the activity of neolignans hence are responsible for the separation between active and inactives derivatives. The results of this work suggest that the activity anti-leishmaniose of these derivatives can be related with the eletronic and steric properties and can be used to assist the planning of new neolignan derivatives with more pronounced anti-leishmaniose activity.

INTRODUÇÃO

A Leishmaniose é uma doença endêmica nas áreas tropicais e subtropicais. No Brasil, representa um dos maiores problemas de saúde pública, não só pela freqüência com que ocorre, mas, principalmente, pelas dificuldades terapêuticas, deformidades e seqüelas que acarreta. [1-3]

Em humanos a doença é causada por protozoários da família Trypanosomatidae, gênero Leishmania e espécie Leishmania chagasi. Seu ciclo evolutivo é caracterizado por apresentar duas formas: a amastigota, que é obrigatoriamente parasita intracelular em vertebrados, e a forma promastígota, que se desenvolve no tubo digestivo dos vetores invertebrados, dependendo da espécie e virulência da cepa, acomete pele, mucosas e vísceras.

A Leishmaniose Tegumentar (LT) é causada nas Américas por diversas espécies de Leishmania, sendo, L. amazonensis e L. Viannia braziliensis duas das mais importantes. No Pará, a LT se encontra em expansão devido à ocupação de novas áreas relacionadas à atividade agrícola. A leishmaniose visceral (LV), conhecida também por calazar, esplenomegalia tropical, febre dundun, etc, já está ocorrendo em centros urbanos de médio e grande porte, em área domiciliar ou peri-domiciliar. É um crescente problema de saúde pública no país e em outras áreas do continente americano, sendo uma endemia em franca expansão geográfica. É uma doença crônica, sistêmica, caracterizada por febre de longa duração, perda de peso, astenia, adinamia, anemia, dentre outras manifestações. Quando não tratada, pode evoluir para óbito, em 1 ou 2 anos, após o aparecimento da sintomatologia. [4]

No Brasil, a principal espécie de vetor responsável pela transmissão da Leishmania chagasi, é a Lutzomyia longipalpis, díptero pertencente à Classe Insecta, Gênero Lutzomyia. Este mosquito é de tamanho pequeno, cor de palha, grandes asas pilosas dirigidas para trás e para cima, cabeça fletida, aspecto giboso do corpo e longos palpos maxilares. Seu habitat é o domicílio e o peridomicílio humano, onde se alimentam do sangue de cão, pessoas, outros mamíferos e aves. As fêmeas têm hábitos antropofílicos, pois necessitam de sangue para o desenvolvimento dos ovos. Durante a alimentação, introduzem no hóspede, através da saliva, um peptídeo que se considera um dos mais potentes vasodilatadores conhecidos. [4]

No hospedeiro vertebrado, o parasito infecta macrófagos, que não são apenas células hospedeiras, mas, sobretudo, efetoras do sistema imune, capazes de eliminar agentes impróprios ao organismo quando adequadamente ativadas. Podem destruir Leishmania quando ativados por IFN-g, com de óxido nítrico (ON), pela conversão de L-arginina em L-citrulina, uma reação que é catalisada por uma enzima indutora conhecida como óxido nítrico sintetase (iONs). Este mecanismo parece constituir um dos principais efeitos microbicidas de macrófagos murinos, implicado também na eliminação de vírus, bactérias, fungos, protozoários, etc. [5]

Os antimoniais pentavalentes são a primeira escolha para o tratamento da LT, principalmente, o antimoniato de N-metilglucamina (glucantime®).[6]. A droga é altamente tóxica para formas de Leishmania sp., pois interfere nos processos bioenergéticos dos amastigotas, ligando-se a enzimas envolvidas na fosforilação oxidativa dentro da mitocôndria. [7] No entanto, além do seu custo e do longo tratamento, apresenta diversos

efeitos colaterais que o paciente muitas vezes não suporta, [8] além disso, já se observa importante resistência parasitária. Chan-Bacab & Peña-Rodriguez em 2001 [7] reuniram cerca de 97 grupos de metabólitos secundários isolados de vegetais que apresentaram atividade anti-Leishmaniose comparada ou superior a apresentada pela terapia com os antimoniais, mas com alta citotoxicidade in vivo e, algumas, apresentando diminuição significativa da atividade atribuída a transformações metabólicas. [9]

As neolignanas constituem uma nova classe de substâncias normalmente encontradas nos vegetais da família Miristicacea e de outras famílias de plantas primitivas. [10] São compostos orgânicos derivados do acoplamento oxidativo de alilfenóis e propenilfenóis entre si ou cruzados [11] apresentando atividades biológicas variadas como atividade antifúngica, [12] anti-Trypanosoma, [13] antibacterina, [14] anti-PAF, [15] e anti-Schistosoma. [16]

Barata e colaboradores [17] e Santos em 1991 [15] realizaram sínteses e testes de atividade biológica de derivados e análogos de neolignanas potencialmente ativas. Os testes biológicos indicaram atividades anti-Schistosomose, [17] anti-Leishmaniose e anti-Escherichia coli. [18] Essas observações suscitaram o interesse no estudo da relação entre estrutura química e atividade biológica (Structure-Activity Relationship – SAR) de derivados de neolignanas, que têm despertado vastos interesses entre os pesquisadores, em especial brasileiros, [19-26] pela sua associação à atividade anti-Leishmaniose.

Costa e colaboradores [19-26] têm reportado estudo de relação estrutura e atividade a um conjunto de derivados de neolignanas com atividade anti-leishmaniose. Estes indicam que a atividade anti-Leishmaniose desenvolvida pelas neolignanas está fortemente relacionada com os descritores eletrônicos, devido à presença de grupos carboxilas como substituintes nos anéis fenilas A e B, em função de uma provável ligação de hidrogênio entre os oxigênios do grupo carbonil, ligados nas posições meta e para do anel A e B das neolignanas e os grupos aminas (–NH) do grupo guanidil da argenina, que se encontram a uma distância de 2,0Å. Estes estudos adotam a hipótese da interação entre os derivados de neolignanas e o resíduo de argenina da adenosina–kinase da L. donovani. Neste sentido, os autores utilizam para este estudo uma conformação estendida para os derivados neolignanans, denominada de conformação D [20-26] como a conformação ativa.

Neste trabalho realizamos um estudo sobre a Relação Estrutura e Atividade Biológicas (SAR) dos 22 novos derivados de neolignanas. Empregando a Teoria de Densidade Funcional (Density Function Theory - DFT) para calcular das propriedades moleculares, e as Análises de Componente Principal e Discriminante para obter estatisticamente a relação entre as propriedades moleculares e a atividade biológica. Objetivamos desta forma avaliar e prever as alterações na estrutura química dos derivados em estudo, proporcionando a síntese uma nova série de derivados de neolignanas com indicação química de atividade anti-Leishmaniose.

MATERIAIS E MÉTODOS

DADOS BIOLÓGICOS Selecionamos 22 derivados de neolignanas (dados em fase de publicação) avaliados

segundo o mesmo protocolo farmacológico, [27] cujas atividades foram medidas com uma concentração de 80µg/mL, descrito como percentual de inibição e classificadas em dois conjuntos distintos: moléculas ativas, moléculas inativas (com 0% de atividade) e atividade não determinadas (ND) (Tabela 1).

Tabela 1. Estrutura dos derivados de neolignanas e seus respectivos percentual de atividade biológica

Derivados Atividade X Y R1 R2 R3 R4 R5 R6 1 40.0 O O H H H H H H

2 5.8 O O H Cl H SCH3 H H

3 0 O O OCH3 OCH3 H H Cl H

4 49.9 O O OCH3 OCH3 CH3 OCH3 H OCH3

5 50.0 O O OCH3 OCH3 CH3 H propenil H

6 37.2 S O H H H Cl H H

7 0.0 S O H CH3 H H Cl H

8 70.2 S O H H CH3 H H H

9 ND S O H H CH3 H NH2 H

10 28.8 S O H H CH3 H NH2 H

11 94.1 S O H H CH3 H Cl H

12 ND S O OCH3 OCH3 CH3 H CH3 H

13 100 S O OCH3 OCH3 CH3 H CH3 H

14 ND S O OCH3 OCH3 H H NH2 H

15 22.0 S O OCH3 OCH3 CH3 H Cl H

16 0 SO O H H CH3 H Cl H

17 0 SO2 O H H CH3 H Cl H

18 0 SO2 O H H CH3 H CH3 H

19 45.2 S OH H H CH3 H Cl H

20 0 S OH OCH3 OCH3 CH3 H CH3 H

21 0 S OH OCH3 OCH3 CH3 H Cl H

22 0 S * H H CH3 H Cl H

* Este derivado apresenta o seguinte substituinte O

O

CONSTRUÇÃO E MINIMIZAÇÃO DAS ESTRUTURAS

X

R3

Y

R1

R2

R4

R5R6

12

3

45

6

7 8 9 1011

12

13

14

15

As etapas de construção, otimização da geometria, minimização da energia aplicando o método semi-empíricos, o Hamiltoniano Austin Model 1 (AM1) [28] inserido no programas HyperChem 7.5. [29] Todas as estruturas serão calculadas na forma neutra, no vácuo sem qualquer restrição geométrica.

CÁLCULOS COMPUTACIONAIS

Neste trabalho foi utilizado o método DFT/B3LYP, com o conjunto de base 6-31G*, no GAUSSIAN, [30] para determinação de descritores eletrônicos como o potencial de ionização (IP), afinidade eletrônica (EA), electronegatividade (χ), dureza (η), moleza (S), índice eletrofilico (ω) e cargas (Q). Os descritores hidrofóbicos como o ClogP, e os estéricos como a Refratividade molar (MR), Volume molar (V) e Área molecular (A) foram obtidos através do programa HyperChem (7.5) para todos os 22 derivados de neolignanas, com atividade anti-Leishamaniose.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

A evolução das técnicas estatísticas tem permitido análises mais detalhadas sobre as propriedades moleculares para o estudo de SAR e sobre tudo contribuem para desenvolver análise quantificada da relação estrutura atividade em várias dimensões, como por exemplo, os estudos de QSAR-2D, QSAR-3D e QSAR-4D, os quais derivam modelos com milhares de variáveis. A análise de regressão utilizada na metodologia de SAR envolve a determinação de uma relação funcional (freqüentemente linear) entre uma variável dependente (atividade biológica) e uma ou mais variáveis independentes (descritores), podendo ser descrita por uma regressão linear simples ou múltipla [31]. Os resultados deste estudo, em geral, indicam as propriedades ou descritores que apresenta influência significativa sobre a atividade biológica. A análise de regressão é melhor utilizada quando o número de variáveis é pequeno, visto que a significância estatística do coeficiente de regressão diminuí com o aumento do número de variáveis independentes [31]. Portanto, para as metodologias que geram um grande número de variáveis independentes (descritores), é necessário utilizar métodos estatísticos mais robustos, como a análise de componente principal (Principal Component Analysis, PCA), técnica de mínimos quadrados parciais (Partial Least Square, PLS) e análise de discrimante (Stepwise Discriminant Analysis, SDA), entre outros, neste trabalho nós utilizamos a análise de componentes principais e análise de discriminantes inserido no programa Statistics [32].

Análise de Componentes Principal (Principal Component Analysis - PCA) A análise de componentes principais (PCA) consiste essencialmente em reescrever as

coordenadas das amostras em outro sistema de eixo mais conveniente para a análise dos dados. Em outras palavras, as n-variáveis originais geram, através de suas combinações lineares, n-componentes principais, cuja principal característica, além da ortogonalidade, é que são obtidos em ordem decrescente de máxima variância, ou seja, a componente principal 1 detém mais informação estatística que a componente principal 2, que por sua vez tem mais informação estatística que a componente principal 3 e assim por diante [33].

Este método permite a redução da dimensionalidade dos pontos representativos das amostras, pois embora a informação estatística presente nas n-variáveis originais seja a mesma dos n-componentes principais, é comum obter em apenas 2 ou 3 das primeiras

componentes principais mais que 90% desta informação. O gráfico da componente principal 1 versus a componente principal 2 fornece uma janela privilegiada (estatisticamente) para observação dos pontos no espaço n-dimensional [34].

A análise de componentes principais também pode ser usada para julgar a importância das próprias variáveis originais escolhidas, ou seja, as variáveis originais com maior peso (loadings) na combinação linear dos primeiros componentes principais são as mais importantes do ponto de vista estatístico.

Análise Discriminante Stepwise (Stepwise Discriminant Analysis - SDA) A análise discriminante é uma técnica multivariada que tem como objetivo principal

gerar funções discriminantes usando variáveis que separam grupos distintos. Neste trabalho, nós consideramos dois grupos: derivados ativos (1, 2, 4, 5, 6, 8, 10, 11, 13, 15 e 19) e derivados inativos (3, 7, 16, 17, 18, 20, 21 e 22) Tabela 1. A análise discriminante é um método de discriminante linear baseado no teste de Fisher (F test) para significância das variáveis. A cada etapa uma variável é selecionada baseada em sua significância e após cada etapa as variáveis mais significativas são extraídas formando o conjunto de dados para investigação [35].

RESULTADOS RELAÇÃO ESTRUTURA E ATIVIDADE BIOLÓGICA Os resultados dos nossos estudos de Relação Estrutura e Atividade, medidos com uma

concentração de 80µg/mL, inferem que, os derivados de neolignanas apresentam em suas estruturas químicas, componentes mínimos necessários para a interação fármaco-receptor, o que na química medicinal denominamos de grupos farmacofóricos. Desta forma podemos observar que: 1) A substituição bioisostérica do heteroátomo de O pelo S, tende a ressaltar a atividade anti-leishmaniose. 2) A presença da carbonila no carbono C7 atribuindo um caráter sp2, torna a molécula mais rígida, posicionando o átomo de oxigênio da carbonila para uma possível interação eletrostática ou ligação de hidrogênio (Fig.2). 3) a presença dos grupos metoxilas como substituintes nos anéis A também ressaltam a atividade anti-leishmaniose, porém, não indicam que sua ausência provoque a inatividade das neolignanas, o que pode ser observado nos compostos 1, 8, 10, 11 e 19, (Tabela 1) os quais não apresentam grupos metoxilas como substituintes no anel A, porém responderam a atividade anti-leishmaniose. No entanto, para o anel B é interessante observar que a natureza dos substituintes parece interferir na atividade anti-leishmaniose das neolignanas, como por exemplo, o composto 10 (AB = 28,8%) que tem de um grupo polar, como a amina, e apresenta menor atividade quando comparado com o composto 8 (AB = 70,2), (Fig.3) indicando que substituintes lipofilícos (apolares) nesta posição, contribuem para a elevação da atividade anti-leishmaniose das neolignanas. 4) A presença da metila no carbono C8 (Fig. 4) parece ter uma importância fundamental para a atividade observada, pois a presença deste grupo obriga uma definição do centro quiral deste carbono (R ou S), pois sabemos que a configuração e a conformação são de fundamental importância na interação com o receptor, determinando a atividade e inatividade de um composto. [36], pioneiros na definição do diferente perfil farmacológico de substâncias quirais, propuseram que o reconhecimento molecular de um ligante com um único centro assimétrico pelo biorreceptor envolveria a participação no mínimo três pontos, pois neste caso o reconhecimento da antípoda correspondente pelo

mesmo sítio receptor não seria eficaz devido à perda de um ou mais pontos de interação complementar [36].

Derivado 11 Derivado 19 AB = 94 % AB = 45,20 %

Figura 2. Estrutura Molecular dos compostos 11 e 19.

Derivado 10 Derivado 8 AB = 28,80 % AB = 70,20 %

Figura 3. Estrutura Molecular dos compostos 10 e 8.

Derivado 6 Derivado 13 AB = 37,20 % AB = 100 %

Figura 4. Estrutura Molecular dos compostos 6 e 13.

Portanto a análise dos descritores e os estudos de SAR sugerem que efeitos estéricos podem apresentar uma forte influência sobre a atividade observada, ressaltamos ainda que, atividade experimental dos derivados em estudo foi obtida com a mistura racêmica e medidas com uma concentração de 80µg/mL. Desta forma, inferimos que os resultados de inatividade dos compostos (3, 7, 16 17, 18, 20, 21 e 22) (Tabela 1) possam ser justificados pelo arranjo espacial dos grupos farmacofóricos na interação com o sítio de ação e/ou pela concentração utilizada na análise de atividade.

ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DESCRITORES MOLECULARES

Análise de Componentes Principal (Principal Component Analysis - PCA)

7 A B 7 A B

A

B

B A

A B 8

A B

8

Para análise das componentes principais várias combinações foram testadas, a melhor separação foi obtida com quatro variáveis das 23 inicialmente testadas. O resultado dos cálculos de PCA apresenta duas componentes principais que descrevem 93,91% da variância do conjunto de dados. A componente principal 1 (PC1) explica 63,36% da variância, e a componente principal 2 (PC2) explica 30,55% da variância do conjunto de dados (Tabela 5). Os coeficientes das variáveis de PC1 e PC2 são mostrados pelas Equações 1 e 2, respectivamente. Estas equações destacam a influência dos paramentos eletrônicos sobre a atividade anti-leishmaniose dos derivados de neolignanas em estudo.

Tabela 5. Valores de coeficientes das variáveis de PC1 e PC2 e o percentual de variância.

Variáveis PC1 PC2 χχχχ 0.333 -0.365

Q7 0.319 0.450 Q9 0.257 -0.584

Q16 0.340 0.377 Variância 63,36 % 30,55%

Variância Total 93,91%

PC1 = 0,333 χ + 0,319 Q7 + 0,257 Q9 + 0,340 Q16 (1)

PC2 = - 0,365 χ + 0,450 Q7 - 0,584 Q9 + 0,377 Q16 (2)

O gráfico da relação das duas componentes principais (PC1 x PC2) é mostrado na Figura 6, onde podemos observar que os derivados estão separados em dois grupos, os ativos (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 13 e 15) e os inativos (16, 17, 18, 19, 20, 21 e 22). Vale ressaltar que o derivado 19, do grupo dos ativos, foi classificado como inativo, enquanto que os derivados 3 e 7, do grupo dos inativos, foram classificados como ativos pela a análise de PCA. Este resultado é compatível com os nossos estudos de SAR, visto que, os compostos 3 e 7, segundo o mesmo estudo, apresentam requisitos estruturais compatível com derivados ativos, enquanto que o composto 19 apresenta em C7 uma hidroxila, como substituinte, o que pelo estudo de SAR pode contribuir para a diminuição da atividade, como pode ser observado na Figura 7.

Figura 6. Gráfico da relação das duas componentes principais (PC1 e PC2) para as variáveis responsáveis pela separação dos derivados ativos e inativos de neolignanas.

S

OH

ClCH3

O

O

H3CO

H3CO

Cl

S

O

ClH3C

Derivado 19 Ab= 45,2

Derivado 3 Ab = 0,0

Derivado 7 Ab = 0,0

Figura 7. Estrutura dos derivado 19 classificado como inativo e derivados 3 e 7 classificado como ativos segundo a análise da PC1 e PC2.

Análise Discriminante Stepwise (Stepwise Discriminant Analysis - SDA)

A SDA tem como objetivo determinar as funções discriminantes usando a medida das variáveis que separam grupos distintos. Desta forma foram considerados dois grupos distintos denominados: grupo de moléculas ativas (1, 2, 4, 5, 6, 8, 10, 11, 13 , 15 e 19) e moléculas inativas (3, 7, 16, 17, 18, 20, 21 e 22).

Os descritores selecionados por essa análise foram às cargas dos átomos Q7 e Q9. Estes por sua vez descrevem o percentual de classificação correto para o grupo das ativas que foi de 90,91% enquanto que para o grupo das moléculas inativas o percentual foi de 75%, resultando num percentual total de acerto de 84,21% o que pode ser observada pela matriz de classificação (Tabela 6).

Tabela 6. Matriz de classificação obtida por DAS para os derivados de neolignanas ativos, e inativos, avaliados contra atividade Leishmaniose.

Grupo classificado Grupo verdadeiro

Percentual Inativos Ativas Inativas 75,00 % 6 2 Ativas 90,91 % 1 10 Total 84,21 % 7 12

A análise desta matriz nos permite avaliar que entre as oito derivados pertencentes ao grupo dos inativos dois derivados 3 e 7 foram classificados como ativos, enquanto que entre os onze derivados pertencente ao grupo dos ativos um o 19 foi classificado como inativo. Este resultado é compatível com os nossos estudos de SAR e PCA, como justificado anteriormente. Os resultados desta análise ainda podem ser observados pelas Equações 3 e 4, as quais apresentam as funções discriminantes e os respectivos coeficientes das variáveis componentes.

Inativos = – 9,97 + 56,41 Q7 –1,38 Q9 (3) Ativos = – 13,65 + 68.82 Q7 – 4,21 Q9 (4)

Cargas Atômicas Parciais As cargas são propriedades eletrônicas que possuem grande influência no

comportamento químico e físico de uma molécula, e podem indicar as cargas dos átomos que tem importância na atividade biológica de uma molécula, indicando regiões de possíveis

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interações entre fármaco e receptor, como também regiões de possíveis ataques nucleofílicos e eletrofílicos.

As cargas Q7 e Q9, selecionadas nos estudos estatísticos, de uma maneira geral são de átomos susceptíveis a ataques nucleofílicos, pois são de natureza positiva. Enquanto que as cargas Q16 de uma maneira geral são de átomos susceptíveis a ataques eletrofilícos, pois são de natureza negativa. A natureza das cargas atômicas Q3 e Q4 do anel A e Q11, Q13 e Q15 do anel B variam de acordo com a substituição nos mesmos. A Tabela 4 mostra o comportamento de natureza eletrônica de cinco derivados, entre os quais temos ativos, inativos e não determinados.

Tabela 4. Descrição resumida de Cargas atômicas obtidas através do método DFT/B3LYP, com o conjunto de base 6-31G*, no GAUSSIAN, para derivados de neolignanas ativos, e inativos, avaliados contra atividade Leishmaniose.

Derivados AB* Q3 Q4 Q7 Q8 Q9 Q13 Q16

13 100,00 0,327 0,358 0,396 -0,344 0,171 0,172 -0,456 11 94,10 -0,133 -0,116 0,403 -0,357 0,192 -0,082 -0,452 15 22,00 0,327 0,357 0,390 -0,345 0,179 -0,081 -0,453 07 0,00 -0,177 0,195 0,405 -0,544 0,209 -0,083 -0,457 09 ND** -0,135 -0,116 0,407 -0,361 0,185 0,174 -0,454

AB*- atividade biológica medidas com uma concentração de 80µg/mL; ND** - não determinado

CONCLUSÃO

A metodologia computacional utilizada para a obtenção dos descritores globais dos derivados de neolignanas foi empregada com sucesso. Os resultados da análise estatística dos valores de desvio padrão e coeficiente de variação, de cada propriedade molecular calculada, nos permitiram observar um comportamento similar entre os derivados estudados.

A análise dos descritores e os estudos de SAR sugerem que efeitos estéricos podem apresentar uma forte influência sobre a atividade observada, ressaltamos ainda que, atividade experimental dos derivados em estudo foi obtida com a mistura racêmica e medidas com uma concentração de 80µg/mL. Desta forma, inferimos que os resultados de inatividade dos compostos (3, 7, 16 17, 18, 20, 21 e 22) possam ser justificados pelo arranjo espacial dos grupos farmacofóricos na interação com o sítio de ação e/ou pela concentração utilizada na análise de atividade.

As análises estatísticas de PCA e discriminantes mostraram que as cargas no átomo C7, C9 e C16 e a eletronegatividade (χ) fornece valiosa informação e tem uma função significativa sobre a atividade das neolignanas, portanto são responsáveis pela separação entre derivados ativos e inativos.

Como perspectivas, sugerimos a síntese e análise biológica e toxicológica de novos derivados neolignanas (não mostrados) com a separação dos isômeros (R e S) contendo diferentes grupos substituintes nos anéis A e B, com intuito de garantir a maior estabilidade do composto no meio biológico e modificar, racionalmente, as propriedades físico-químicas dos destes novos derivados na obtenção de drogas ativas e com baixa toxicidade frente à Leishmaniose.

PALAVRAS CHAVE:

Neolignanas, Leishmaniose, SAR, DFT.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Dr. Lourivaldo S. Santos do Departamento de Química da UFPA; a Dra. Bartira Rossi-Bergmann do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ, ao Dr. Lauro E. S. Barata (PQ) e Mário Aveniente (PG) do Instituto de Química da UNICAMP pelas informações farmacológicas cedidas e finalmente agradecemos ao PIBIC/UFPA, SECTAM / FUNTEC; CAPES; CNPq e FINEP pelo suporte financeiro.

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