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ACTA MED PORT 2: 49, 1980 RESPOSTAS ENDÓCRINO-METABÓLICAS AO JEJUM, EXERCÍCIO FÍSICO E TRAUMA * Afonso Camilo Fernandes Instituto de Química Fisiológica, Faculdade de Medicina de Lisboa RESUMO Descrevem-se as alterações metabólicas relacionadas com o fornecimento de nutrientes energéticos aos diferentes tecidos verificadas no jejum, durante o exercício físico e após traumatismo acidental ou cirurgia e analisam-se os prováveis mecanismos reguladores não hormonais e hormonais. Não se faz uma revisão exaustiva nem uma discussão da vasta literatura existente sobre este assunto, mas uma súmula de conhecimentos sobre um tema relacionado com aspectos clínicos importantes tais como as correcções por via entérica ou parentérica de situações de desnutrição ou de estados catabólicos graves que acompanham diversas patologias. Diferentes estados nutricionais, o exercício físico e alguns tipos de trauma deter minam no homem normal adaptações metabólicas destinadas a garantir o adequaao fun cionamento dos seus órgãos. Tais adaptações são desencadeadas por mecanismos neuro -endócrinos. As regulações da actividade enzimática e da permeabilidade das membranas constituem meios directos de intervenção no metabolismo energético e no equilíbrio hidro-electrolítico, que são os sectores metabólicos particularmente em jogo naquelas situações. O metabolismo energético —definível como o conjunto de fenómenos químicos implicados no fornecimento de combustíveis biológicos aos diferentes tecidos, na trans ferência de equivalentes redutores para a obtenção de energia e nos meios de transporte e armazenamento desta desempenha papel primordial que condiciona o anabolismo e todas as outras actividades celulares. É sobre alguns aspectos do metabolismo energético e da sua regulação que nos vamos debruçar. AS RESERVAS DE ENERGIA O nosso organismo pode usar, para fins energéticos, glícidos, lípidos e proteínas. Reservas destes combustíveis permitem que o fornecimento de substratos oxidáveis aos diferentes tecidos não dependa directamente da ingestão e absorção de alimentos. Glicose e ácidos gordos podem ser armazenados constituindo macromoléculas (res pectivamente glicogénio e triglicéridos) que têm como principal função a reserva daque Trabalho subsidiado pelo 1. N. 1. C. Recebido para publicação: 2 de Novembro 1979

Metabolismo Jejum e Exercico

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  • ACTA MED PORT 2: 49, 1980

    RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS AO JEJUM, EXERCCIOFSICO E TRAUMA *Afonso Camilo Fernandes

    Instituto de Qumica Fisiolgica, Faculdade de Medicina de Lisboa

    RESUMO

    Descrevem-se as alteraes metablicas relacionadas com o fornecimento denutrientes energticos aos diferentes tecidos verificadas no jejum, durante o exercciofsico e aps traumatismo acidental ou cirurgia e analisam-se os provveis mecanismosreguladores no hormonais e hormonais. No se faz uma reviso exaustiva nem umadiscusso da vasta literatura existente sobre este assunto, mas uma smula deconhecimentos sobre um tema relacionado com aspectos clnicos importantes taiscomo as correces por via entrica ou parentrica de situaes de desnutrioou de estados catablicos graves que acompanham diversas patologias.

    Diferentes estados nutricionais, o exerccio fsico e alguns tipos de trauma determinam no homem normal adaptaes metablicas destinadas a garantir o adequaao funcionamento dos seus rgos. Tais adaptaes so desencadeadas por mecanismos neuro-endcrinos. As regulaes da actividade enzimtica e da permeabilidade das membranasconstituem meios directos de interveno no metabolismo energtico e no equilbriohidro-electroltico, que so os sectores metablicos particularmente em jogo naquelassituaes.

    O metabolismo energtico definvel como o conjunto de fenmenos qumicosimplicados no fornecimento de combustveis biolgicos aos diferentes tecidos, na transferncia de equivalentes redutores para a obteno de energia e nos meios de transportee armazenamento desta desempenha papel primordial j que condiciona o anabolismoe todas as outras actividades celulares.

    sobre alguns aspectos do metabolismo energtico e da sua regulao que nosvamos debruar.

    AS RESERVAS DE ENERGIA

    O nosso organismo pode usar, para fins energticos, glcidos, lpidos e protenas.Reservas destes combustveis permitem que o fornecimento de substratos oxidveisaos diferentes tecidos no dependa directamente da ingesto e absoro de alimentos.

    Glicose e cidos gordos podem ser armazenados constituindo macromolculas (respectivamente glicognio e triglicridos) que tm como principal funo a reserva daque

    Trabalho subsidiado pelo 1. N. 1. C.

    Recebido para publicao: 2 de Novembro 1979

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    les substratos. Pelo contrrio, os amino-cidos constituem protenas cujas funes primordiais sero outras que no a de os fornecerem para fins energticos (as protenasdas miofibrilhas tm funes contrcteis, por exemplo).

    Em termos de calorias resultantes da oxidao de um grama de substrato seco, ovalor calrico dos glcidos e das protenas inferior aos dos lpidos (cerca de 4 kcal/gcontra 9 kcal/g *). Atendendo a que a acumulao intracelular de glicognio ou deprotenas implica a reteno de gua e electrlitos para manuteno da isotonicidade,o valor calrico por grama de tecido com reserva glicdica ou proteica ainda menor.Os lpidos so armazenados num meio extra-aquoso, pelo que cerca de 90 % do pesodo tecido adiposo corresponde de facto a substratos oxidveis. A possibilidade dearmanezamento de combustveis lipdicos acompanha a diferenciao dos seres vivosno sentido de uma maior mobilidade.

    Um homem normal, de 70 kg, ter aproximadamente 150 g de glicognio muscular, 75 g de glicognio heptico, 6 kg de protenas (sobretudo musculares) e 15 kgde gordura (triglicridos no tecido adiposo). Os combustveis circulantes tm importncia quantitativa muito inferior dos armazenados nos tecidos (cerca de 0,1 %apenas).

    UTILIZAO DE SUBSTRATOS OXIDVEISNa figura 1 esto representadas as principais vias de utilizao de substratos para

    a obteno de energia.

    glic oli se

    via dasfosfopentoses

    NADPH

    oxidao

    Kc IDOS

    Figura 1 Esquema das principais vias oxidativasda glicose, glicerol, corpos cetnicos, cidos gordose amino-cidos. A sntese de ATP dar-se- por fosforilao dependente do substrato ou por fosforilao

    oxidativa

    1 kcal=1 Ca14,2 kJ

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS

    As necessidades energticas dos diferentes tecidos variam quer quantitativamente(calorias consumidas por unidade de tempo), quer qualitativamente (tipo de substratosutilizveis) e ambos os aspectos podem variar para o mesmo tecido em diferentessituaes.

    O crebro, em circunstncias habituais, utiliza exclusivamente a glicose comocombustvel. O fornecimento de oxignio tambm indispensvel j que s o metabolismo aerbio permite um ganho mximo de energia correspondente oxidaocompleta da glicose at dixido de carbono e gua (formao de 38 molculas deATP por molcula de glicose).

    O crebro adulto consome cerca de 144 g de glicose por dia (100 mg/min) o quecorresponde utilizao de ~ a 1,4 das calorias fornecidas pela alimentao no mesmotempo. Tais gastos so praticamente independentes da glicmia (desde que no haja hipoglicmia grave), da insulinmia e da actividade cerebral (haver apenas uma ligeiradiminuio do consumo na idade avanada e uma diminuio mais marcada em situaesde coma) .~ Um corte brusco do fornecimento de glicose ou oxignio ao crebro implicaa paragem quase imediata das respectivas funes. A quantidade de glicognio cerebral insignificante como reserva energtica.

    O tecido muscular pode utilizar vrios combustveis: cidos gordos, corpos cetnicos, glicose, lactato, piruvato e, inclusivamente, alguns amino-cidos. Com nveis sanguneos normais de cidos gordos, glicose, insulina e oxignio h uma utilizao preferencial de cidos gordos e de corpos cetnicos sendo menor a contribuio da glicosepara o metabolismo oxidativo total do msculo. Em repouso, a oxidao da glicose serresponsvel por menos de 10 % do consumo de oxignio.~

    A menor utilizao da glicose em presena de cidos gordos e corpos cetnicos atributvel: a) a uma menor captao e fosforilao, b) inibio alostrica da fosfofrutoquinase devida ao aumento da concentrao intracelular de citrato secundrio oxidao de corpos cetnicos e cidos gordos, c) e inibio, por modificao covalente,do complexo desidrogenase pirvica derivada do acrscimo da concentrao intracelularde acetil-CoA secundrio ao mesmo factor.3

    No exerccio muscular a energia para as primeiras contraces inicialmente fornecida pelo ATP intracelular existente que rapidamente reconstituido pela transfernciade energia da creatina-fosfato para o ADP. Entretanto, comea a produo glicolticade ATP, anaerbia, sendo a glicose inicialmente fornecida pela glicogenlise muscular.A produo de lactato ser elevada. Com o aumento do dbito sanguneo muscular, omaior fornecimento de oxignio permitir a oxidao completa da glicose e dos cidosgordos.

    O tecido heptico, no homem com uma alimentao rica em protenas, usa sobretudo os esqueletos carbonados dos amino-cidos como combustveis.~ S nas situaesem que necessrio desviar aqueles para a gliconeognese passa a utilizar a oxidaodos cidos gordos como fonte principal de energia (tambm necessria para a prpriagliconeognese).

    A medula ssea, os eritrocitos, os glbulos brancos, a medula renal, e talvezmais alguns tecidos, tm necessidade imperiosa de glicose como combustvel. Para asua utilizao so, tal como o tecido nervoso, insulino-independentes. Neles, a glicUse a nica ou principal via de obteno de ATP. Juntamente com o msculo, quandofunciona em condies anaerbias, aqueles tecidos so os principais produtores de cidolctico que ser lanado na circulao para utilizao pelo fgado e pelo rim comosubstrato glicoformador (gliconeognese).

    Passam-se a analisar as particularidades do metabolismo energtico em diferentessituaes sendo primeiramente referidas as alteraes no jejum de diferentes duraes.

  • 52 AFONSO C. FERNANDES

    ESTADO PS-ABSORO

    Este estado pode ser definido como o perodo aps o jejum nocturno, antes datomada da primeira refeio. Ser modelo das alteraes metablicas que ocorrem apsum curto perodo de jejum (no superior a 12-14 h).

    Do ponto de vista metablico, a situao caracteriza-se essencialmente pelo recursos reservas hep~ticas de glicognio para manuteno da glicmia, e pela diminuio doconsumo de glicose por parte do msculo e do tecido adiposo.

    O fgado fornecer glicose em quantidades correspondentes s necessidades dos tecidos que no podem prescindir de tal substrato. Em termos quantitativos, o fgadoter de lanar em circulao cerca de 150 mg de glicose/min.5

    A glicose produzida pelo fgado provm quer da glicogenlise, quer da gliconeognese. Neste estado ps-absoro, porm, a contribuio relativa destes dois processos muito diferente: 75 % e 25 %, respectivamente. O glicognio resultou do armazenamento de glicose aps a ingesto de alimentos. A gliconeognese tem como substratos: a) o lactato e o piruvato, que resultam da oxidao incompleta da glicose emtecidos perifricos, e contribuem com 40 % a 60 % para a gliconeognese; b) o gliccrol,libertado sobretudo pelo tecido adiposo na sequncia da liplise dos triglicridose que contribui com cerca de 8 %; c) os amino-cidos glicoformadores, libertadospelo tecido muscular, e que contribuem com 60 % a 40 %. Destes amino-cidos, a alanina o que tem participao quantitativamente mais significativa, dele dependendo 20 %a 50 % da gliconeognese. Os aproveitamentos pela gliconeognese heptica dolactato e piruvato por um lado, e da alanina por outro, esto incluidos respectivamentenos ciclos de Cori e glicose-alanina. A energia para a gliconeognese heptica sobretudo fornecida pela oxidao dos cidos gordos.

    Mas outros aspectos caracterizam igualmente o metabolismo heptico no estadops-abs~ro. A utilizao de glicose diminui, pois a glicmia tem valores baixos,ainda que normais, o que condiciona quer uma menor entrada de glicose para o hepato~ih deoendente apenas do gradiente de concentraes quer uma menor fosforjlizao devida ao elevado 1Cm da glicoquinase. A gliclise diminui devido inibiod~ piruvato-quinase, entre outros factores em consequncia dos mais elevados nveisde cidos gordos e alanina.

    A captao de cidos gordos livres pelo fgado aumenta, acompanhando o crescimento da sua prpria concentrao no sangue, que o nico factor de que depende.Este aumento deve-se ao maior fornecimento de cidos gordos livres pelo tecido adiposo.Da fraco, de valor independente do estado de nutrio, dos cidos gordos livrescirculantes captados pelo fgado (cerca de 14 do total), uma parte oxidada at CO2e outra esterificada com formao de triglicridos e sntese ulterior de lipoprotenas demuita baixa densidade que iro para o sangue. A fraco esterificada ser tanto menorquanto mais prolongado for o jejum. A fraco oxidada estar relacionada com o fornecimento de energia e com a cetognese.

    No tecido adiposo, a menor captao de glicose, implicando uma diminuio dagliclise e por isso uma reduo na produo de glicerol-3-fosfato, conduz a uma inibioda sntese dos triglicridos com o consequente aumento da disponibilidade de glicerole cidos gordos que so lanados na circulao.

    Os cidos gordos livres sero utilizados sobretudo pelo fgado e pelo tecidomuscular, e o glicerol pela gliconeognese heptica, como j foi descrito.

    No tecRio muscular, a protelise estar aumentada para fornecimento de amino-cidosglicoformadores ao fgado. Para fins energticos o msculo usar sobretudo corposcetnicos e cidos gordos, captando apenas quantidades mnimas de glicose (Fig. 2).

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLTCAS

    o. 1. 1.

    Figura 2 Estado ps-absoro A produo heptica de glicose tG). Contribuies relativas: 1) dagliconeognese [GNG) e da glicogenlise (GL)),2) dos diferentes substratos glicoformadores para agliconeognese (amino-cidos fA-a) sobretudoalanina tALA) lactato tLAC), piruvato [PIR)e glicerol [Gli)). A captao heptica de glicoseest diminuida [ .~ ) e a de cidos gordos [AGL)est aumentada t t ). A produo de corpos cetnicos moderada f CC). A glicose produzida ir serdistribuida essencialmente pelos rgos insulino inde

    pendentes [011)

    ADAPTAO AO JEJUM DE MDIA DURAO

    O esgotamento das reservas hep~ticas de glicognio e a manutenio das necesi~das perifricas de glicose implicam uma activao da g1iconeog~ncse para que ofgado continue a fornecer quantidades suficientes de glicose. Estas so as prin ipaiscaractersticas da situao metablica no jejum de mdia durao, isto , de 12-14 horasa 3-4 semanas.

    Como ~ foi referido, o fgado contm cerca de 75 g de glicognio no homemalimentado. Ora suportando a glicogenlise 75 % das necessidades em glicose do organismo na situao de jejum de curta durao, o glicognio heptico esgotar-se- emmenos de 24 h. Uma reserva de cerca de 10 g ser, todavia, poupada para assegurara gliclise em situaes de emergncia.4

    A estimulao da gliconeDgnese parece depender sobretudo de um aumentoda captao de alanina pelo fgado acompanhado de um maior fornecimento de amino-cidos pelo msculo custa de uma menor sntese e maior degradao de protenas.5A dependncia em que o aumento da gliconeognese se encontra do fornecim~nto deamino-cidos evidenciada pelo aumento da excreo urin~ria de azoto (cerca de 90 %como ureia sintetizada no fgado).

    A cetognese tambm estimulada devido a complexo conjunto de factores:a) o aumento da concentrao de cidos gordos no sangue consequente maior liplieque ocorre no tecido adiposo conduz a uma maior captao de cidos gordos pelofgado; b) uma maior frac9 de cidos gordos captados pelo fgado oxidada;c) pelas razes apontadas em a) e b), h um aumento da produo de acetil-CoA;

    150 mg/min)75%

    AGI..

    A-o5 LAC Gil(ALAI Pir

  • 54 A~ONSO C. FERNANDES

    d) a utilizao de acetil-CoA pelo ciclo de Krebs est diminuida tanto pela falta deoxalacetato, desviado para a gliconeognese,~ como pela inibio competitiva dopalmitil-CoA sobre a sintetase do citrato ;8 a competio estabelece-se com o prprio oxalacetato que se encontra em menor concentrao, estando aquele acetil-CoAem maior concentrao, j que a captao heptica de cidos gordos livres est aumentada. A disponibilidade em oxalacetato para activar o ciclo de Krebs ser baixa apesar doaumento da sua sntese devido estimulao da carboxilase do piruvato pelo acetil-CoA.

    A maior quantidade de acetil-CoA segue assim, sobretudo, a via cetognica, predominantemente atravs da sntese do 3-hidroxi-~3-metil-glutaril-CoA, e os corpos cetnicos formados, quase no sendo utilizados no fgado por falta do adequado apetrechamento enzimtico, so lanados em circulao causando a cetonmia (e cetonria) dojejum, a qual implica uma acidose metablica tolervel.

    As alteraes metablicas nos tecidos adiposo e muscular do-se no mesmo sentidoque as descritas no estado ps-absoro, mas so mais marcadas (Fig. 3).

    c

    G li

    Figura 3 Jejum de mdia durao A produoheptica de glicose depender quase exclusivamenteda gliconeognese. A captao heptica de substraxosglicoformadores est aumentada. A produo decorpos cetnicos superior verificada no estado

    ps-absoro

    ADAPTAO AO JEJUM PROLONGADO

    Aps 3 a 4 semanas de jejum verifica-se uma significativa diminuio das necessides perifricas de glicose, o que se deve essencialmente adaptao do crebro utilizao de corpos cetnicos com fins energticos. O consumo de glicose pelo crebro poderbaixar para valores da ordem dos 20-30 mg/min.1

    De um ponto de vista teleolgico, o significado destas alteraes estar relacionadocom a poupana de protenas para evitar a morte, a qual sobreviria mais cedo por faltadaquelas do que pelo esgotamento real de combustveis.

    De facto, a partir da ~ semana de jejum, a excreo urinria de azotobaixa cerca de 65 %, atingindo 5 g ou menos por dia.6 Este facto reflecte umamarcada diminuio da mobilizao de amino-cidos a partir das protenas musculares. Se a pr~telise se mantivesse ao ritmo a que ocorre no jejum de mdia durao,

    G (~5O mg/ mm)

    A-o5 (ALA)PIR LAC

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS

    sobreviria a morte por incapacidade funcional dos musculos respiratrios, da qualresultaria deficiente ventilao e impossibilidade de tossir eficazmente com as consequentes atelectasias, infeces pulmonares e, finalmente, insuficincia respiratria terminal.

    Cr-se que a diminuio da protelise muscular no devida a uma aco hormonaldirecta mas sim cetonmia do jejum. Desconhece-se contudo o mecanismo ntimo detal inibio.~

    Na situao de jejum prolongado, a produo de glicose pelo fgado baixa de150 g para cerca de 40 g/dia.12 Est demonstrado que tal baixa se deve no a umadiminuio da capacidade gliconeognica heptica mas apenas ao menor fornecimentode amino-cidos glicoformadores. Cerca de 34 da glicose fabricada pelo fgadopassar a ter como precursores o lactato, o piruvato e o glicerol.

    Compensando parcialmente a baixa da gliconeognese heptica, d-se uma estimulao da gliconeognese renal, passando o rim a fornecer cerca de metade da glicosecirculante.

    A gliconeognese renal, que tem como precursores predominantes os amino-cidos,contribui tambm para a possibilidade de compensao da acidose metablica do jejum jque a amoniognese a acompanha e a excreo do io amnio importante paraaumentar a capacidade renal de excreo de valncias cidas.

    Da anlise da adaptao metablica situao de jejum prolongado, ressalta oduplo papel desempenhado pelos corpos cetnicos: como combustveis para o crebro,poupando glicose, e como sinal para a poupana de protenas musculares, limitandoa disponibilidade em amino-cidos para a gliconeognese (Fig. 4).

    C~REBRO

    R~M

    (ALA) LACFigura 4 Jejum prolongado Contribuies relativas da gliconeognese heptica e renal para ofornecimento de glicose aos rgos insulino independentes. O crebro passa a utilizar corpos cetnicosdiminuindo o consumo de glicose. A captaoheptica de substraxos glicoformadores no esj

    inibida

    A REGULAO HORMONAL DA PRODUO E UTILIZAODE SUBSTRATOS ENERGTICOS

    J se referiram alguns dos principais mecanismos de regulao enzimitica dasalteraes metablicas adaptativas que se acabam de descrever.

    25% 50% 25%A.c? PIR Cli

  • 56 AFONSO C. FERNANDES

    No que se refere regulao hormonal, o balano biormonal insulina-glicaginadesempenha papel primordial, ainda que seguramente no exclusivo.5 13 14 15 A insulina est sobretudo relacionada com a estimulao da utilizao de nutrientes emsituaes em que eles abundam. Da glicagina depende, pelo contrrio, a estimulaoda produo endgena de glicose.

    A resposta endcrino-metablica ingesto de alimentos varia com a composioda dieta, mas em circunstncias habituais, aps uma refeio mista, que inclui glcidos,a adaptao metablica determinada pelo aumento da relao insulina-glicagina. Osestmulos para a secreo de insulina devem-se presena de iniciadores da secreoem concentraes aumentadas (glicose e leucina recm-absorvidas), e de amplificadoresda resposta secretora (como algumas hormonas gastro-intestinais) 16 A estimulaocolinrgica (parassimptico) poder ser ainda responsvel por uma fase ceflica deestimulao da libertao de insulina. A inibio da secreo de glicagina deve-se acoda glicose, em presena de insulina, sobre as clulas ~ dos ilhus de Langerhans. Sea refeio for rica em amino-cidos, o efeito estimulante destes sobre a secreo deglicagina ultrapassado pelo efeito inibidor da glicose.17

    Os valores elevados da insulinmia determinaro inibies dos processos destinados mobilizao de substratos das reservas existentes inibio da glicogenlise, daliplise, da protelise e da actividade glicose-6-fosfatase e da produo de glicosepela gliconeognese. Por outro lado, haver uma estimulao da utilizao de substratospara a reconstituio de reservas e para o anabolismo proteico glicognese, lipognesee proteognese. A gliclise, o ciclo de Krebs e a via das fcvsfopentoses so tambmestimulados, sendo inibidas a cetognese e a ureognese .

    Embora se tenham atribuido insulina aces reguladoras, sobretudo w nvel dostecidos muscular e adiposo, os seus efeitos hepticos so hoje conhecidos. Pequenosaumentos da glicmia que induzem a duplicao do valor basal da insulinmia serosuficientes para diminuirem de 80 a 85 % a libertao da glicose pelo fgado, nohavendo alterao no consumo perifrico de glucose (nem dos valores da glicaginmia).Este facto poder no ser devido propriamente a maior sensibilidade heptica insulina mas apenas sujeio deste rgo a concentraes mais elevadas daquela hormona.5 A glicogenlise heptica parece ser mais sensvel inbio pela insulina quea gliconeognese.

    Em situaes de carncia nutricional, em particular na falta de glicose exgena,o~ ilhus de Langerhans respondem no sentido de ser assegurada a indispensvel produo endgena da glicose.

    No estado ps-absoro, encontramos valores, ditos basais, para as secreesde insulina e glicagina. Os nveis sanguneos de insulina so suficientemente baixospara limitarem a utilizao de glicose por parte do msculo e tecido adiposo sobretudo por no ser facilitada a entrada na clula e por parte do fgado por noinduo da glicoquinase poupando-a assim para utilizao pelos tecidos insulino-independentes. Por outro lado, permitem a mobilizao de cidos gordos e glicerol(favorecendo a liplise) e de amino-cidos (no estimulando a proteognese) e abaixa relao insulina-glicagina, que se verifica no estado ps-absoro, estimula aglicogenlise e a actividade glicose-6-fosfatase hepticas.

    Os nveis basais da glicaginmia parecem contribuir tambm para a manutenoda glicmia, uma vez que, se a secreo desta hormona for inibida no estado ps-absoro,a glicmia aparece diminuida.8 19

    Conhecem.se muitos dos mccan~,inos implicados nestes diferentes efeitos, mas sai fora do mbito destetrabalho analis-los.

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS 57

    As alteraes metablicas no jejum de mdia durao dever-se-o hipoinsulinmiaprogressiva, com acentuao dos efeitos j. descritos, e ao aumento da glicaginmia,que mximo pelas 72 horas de jejum.~ Os estmulos para a secreo de glicaginasero provavelmente os nveis sricos elevados de amino-cidos, em particular de alanina,os nveis mais baixos da glicmia nos ilhus e a hipo-insulinmia.~

    A glicagina responsvel pela activao da gliconeognese heptica quer, segundoparece, por aumentar a captao pelo fgado de substratos glicoformadores, quer porinibir a piruvatoquinase. Esta inibio enzimtica acarreta a acumulao de fosfo-enolpiruvato, favorecendo a inverso da via glicoltica ~

    Desconhece-se ainda se a liplise no tecido adiposo estimulada em condiesfisiolgicas pela glicagina. O aumento da concentrao de carnitina no hepatocito e adepleo heptica em glicognio, ambos determinados pela glicagina, so factoresque se adicionam aos j atrs referidos para a estimulao da cetognese.2

    No jejum prolongado tem-se atribuido aos glicocorticides a estimulao da gliconeognese renal.

    Mas, para alm do balano biormonal insulina-glicagina, tambm seguramenteoutras hormonas contribuem para a regulao metablica nas referidas situaes.Salientem-se os efeitos glicogenoltico, lipoltico, inibidor da secreo de insulinae activador da secreo de glicagina das catecolaminas circulantes e da estimulao simptica. Importantes sero, tambm, as aces dos glicocorticides, na ausncia dos quaisa glicagina tem menor efeito glicoformador heptico,2 e que induzem enzimasrelacionados com a gliconeognese, inibem a incorporao de amino-cidos nas protenas em tecidos que no o heptico, e diminuem a utilizao de glicose pelos tecidosperifricos insulino-dependentes.

    Mas estas hormonas, bem como as tiroideias, a hormona somatotrfica e outras,tero provavelmente efeitos significativos cujo conhecimento permitir esclarecer melhora regulao do metabolismo energtico.

    ADAPTAO METABLICA NO EXERCCIO FSICO

    O exerccio fsico essencialmente caracterizado pelo aumento muito marcadoda necessidade de combustveis por parte do msculo em contraco.

    Em repouso, o principal combustvel para o msculo constituido pelos cidosgordos livres captados da circulao. Desencadeada a contraco, o principal combustvel comear por ser a glicose resultante do prprio glicognio muscular. Aps aumentodo dbito sanguneo para o(s) msculo(s) em contraco passa a haver maior captaode substratos oxidveis a partir do sangue. A utilizao de cidos gordos e de glicosetornar-se-. continuamente crescente, mas a desta ltima s at os 90 a 1~80 mm.Aos 90 minutos a sua oxidao consumir mais oxignio que a dos cidos gordos; s4 horas de exerccio, porm, j o gasto de oxignio para oxidao dos cidos gordosser duplo do da glicose. O glicognio muscular gasta-se rapidamente aos 40 mm.de exerccio 75 a 90 % da glicose utilizada ser. captada do sangue.2 22

    O msculo usa ainda a energia resultante da oxidao das cadeias carbonadas dosamino-cidos de cadeia ramificada (valina, insoleucina e leucina), sendo os seus gruposamina utilizados para sntese de alanina a partir do piruvato. Com efeito, durante oexerccio, h aumento da sntese e da libertao da alanina para o sangue, aumentoque proporcional utilizao de glicose e concentrao intracelular do piruvato.Aqueles amino-cidos de cadeia ramificada resultaro da protelise muscular e tambmda captao a partir do sangue, para onde sero lanados pelo fgado.2

  • 58 AFONSO C. FERNANDES

    A sntese de alanina deve-se aco da transaminase glutmico-pirvica. O glutamato poder derivar da aminao redutora do ~ ceto-glutarato. Atravs desta no s removido amonaco, que acabar por ser transportado pela alanina at ao fgado ondeser utilizado na ureognese, como reoxidado o coenzima nicotinamida-adenina-dinucletido. Esta oxidao necessria para re-utilizao daquele coenzima na gliclise substituindo a que habitualmente tem lugar na reaco catalisada pela desidrogenase lcticano sentido piruvato.lactato.2 23

    Passando o msculo em exerccio a captar quantidades muito maiores de glicose(de 5-7 vezes no exerccio ligeiro e de 10-20 no exerccio moderado a intenso) exclusivamente ao fgado que cabe aumentar a produo de glicose. Durante o exerccio ligeiro e de curta durao (10 a 40 minutos), o acrscimo da libertao deglicose pelo fgado de 25 a 100 % em relao aos valores basais, mantendo-se ascontribuies relativas da glicogenlise e da gliconeognese (75 % e 25 % respectivamente). A glicmia aumentar de 20 a 30 mg/100 ml (fig. 5).

    Figura 5 Exerccio de curta durao e ligeiro A produo heptica de glicose [G) estar aumentada em 25 % a 100 %. Contribuies relativasda gliconeognese (GNG) e da glicogenlise tGL)

    No exerccio moderado a intenso, o aumento do fornecimento de glicose ser de100 a 400 %, dependendo a produo ainda mais da glicogenlise, e s em 6 a 11 %da gliconeognese. Tal facto dever-se-, provavelmente, diminuio do dbito sanguneo muscular, o que impedir o fornecimento ao fgado de substratos glicoforma.dores apesar das suas concentraes no sangue se encontrarem elevadas. No exercciomoderado a intenso, mas de curta durao, pois a glicogenlise heptica a principalfonte de glicose aos 40 minutos de exerccio intenso estaro consumidos cercade 18 g de glicognio (fig. 6).

    s 4 horas de exerccio, cerca de 3,4 do glicognio heptico estar esgotado e oprolongamento s ser possvel custa da gliconeognese, ento j no condicionadapela marcada baixa de fluxo sanguneo heptico, visto que o exerccio prolongado,sendo forosamente ligeiro em it~tensidade, no implicar grande aumento do fluxosanguneo muscular. Nesta fase a libertao de glicose pelo fgado atingir valoressuperiores em cerca de 80 % aos valores basais e s 4 horas de exerccio a contribuiorelativa da gliconeognese ter subido para cerca de 50 %. A partir das 8 horas deexerccio, rondar os 100 %. No exerccio prolongado a glicmia poder baixar de10 a 40 mg/100 ml (Fig. 7).5 22. 24

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS 59

    Da regulao hormonal das adaptaes referidas mais uma vez sobressai o papeldo binmio insulina-glicagina. Em resposta ao exerccio h uma hipo-insulinmia e umahiperglicaginmia que sero tanto mais marcadas quanto mais intenso e prolongadofor o exerccio.22 24

    A hipoinsulinmia ser provavelmente induzida por efeitos adrenrgicos (estimulao de receptores cL) que ultrapassaro a estimulao da ligeira hiperglicmia quecaracteriza o exerccio de curta durao.~~ O facto de haver aumento de captaode glicose pelo msculo em presena de nveis baixos de insulina poder significarque o efeito permissivo da insulina sobre a captao de glicose se exerce durante oexerccio mesmo para concentraes muito baixas da hormona, ou que a contracomuscular promove s por si a captao de glicose222

    A estimulao da secreo de glicagina dever-se- tambm a efeitos adrenrgicos(estimulao de receptores ~3) e ainda ao aumento da alaninmia.2~

    Catecolaminas, hormona do crescimento, glicocorticides e provavelmente aindaoutras hormonas contribuiro tambm para a adaptao metablica ao exerccio.

    Aps o exerccio, na fase de recuperao, verifica-se haver prioridade para arenovao das reservas de glicognio hepticas e musculares custa da manuteno dagliconeognese. Os nveis de insulina aumentam rapidamente mantendo-se elevados osde glicagina.2

    Figura 6 Exerccio de curta durao, moderadoa intenso por diminuio do aporte sanguneode substratos glicoformadores ao fgado a contribuio relativa da gliconeognese para a produo

    heptica de glicose menor

    Fig. 7 Exerccio prolongado contribuies dagliconeognese e glicogenlise para a produoheptica de glicose s 4 e 8 horas de exerccio

    c (basal+100c400/.)

    G(bool+ 80/.)

  • 60 AFONSO C. FERNANDES

    ALTERAES METABLICAS PS-TRAUMA

    As alteraes metablicas aps trauma acidental ou cirurgia regrada, embora sintetizveis num modelo relativamente uniforme, constituem resposta a complexa constelao de factores, varivel consoante o caso, podendo incluir fenmenos psquicos (comoa ansiedade), dor, hipovolmia, hipxia, destruio de tecidos, jejum, imobilizao, anestesia, eventualmente infeco, etc.

    O metabolismo essencialmente energtico caracterizar-se- naquelas situaes pelaexagerada produo heptica de glicose em relao ao nvel da glicmia (que est

    20 e s necessidades aparentes ou, pelo menos, capacidade de utilizaoperifrica daquele combustvel.~~ A produo heptica de glicose far-se- sobretudo custa da gliconeognese que acompanhada de catabolismo proteico aumentado(para fornecimento de amino-cidos glicoformadores). 20 28 H ainda mobilizaodas reservas lipdicas com utilizao predominante de cidos gordos para fins energticos.2

    A situao difere da do jejum devido essencialmente hiperglicmia e ao maismarcado aumento da gliconeognese e do catabolismo proteico que no to prontamente inibido como no jejum pelo fornecimento de glicose exgena.2 No homemnormal, quer a hiperglicmia s por Si.29, quer a resposta insulnica que acarreta,provocam uma diminuio marcada da produo heptica de glicose.~

    Uma outra diferena fundamental diz respeito aos gastos energticos basais. Naadaptao situao de jejum, baixam de valores da ordem das 1800 kcal/dia paravalores da ordem das 1200 kcal/dia. Pelo contrrio, no ps-trauma, os gastos energticosbasais podem ultrapassar as 3000 kcal/dia.

    De um ponto de vista teleolgico, tem-se sugerido que a hiperglicmia compensadora do menor fluxo sanguneo cerebral no que se refere ao fornecimento deglicose ao crebro. Ao mesmas alteraes metablicas ocorrem, contudo, em casos semhipovolmia ou hipotenso. Tem-se referido, por outro lado, que a resposta catablicase relaciona com a necessidade de amino-cidos para a sntese proteica e de combustveis para a reparao tecidular e para a resposta imunolgica.~

    A intensidade das alteraes metablicas e hormonais verificadas est directamenterelacionada com a gravidade do trauma ou a complexidade da cirurgia,21 ~ sendomais marcada no trauma mais grave que na cirurgia mais complexa, certamente emrazo das diferentes circunstncias em que ocorrem.3

    O estmulo para a produo de adrenalina pela medula suprarrenal e a maior actividade simptica sero, provavelmente, desencadeantes das alteraes metablicas ps--trauma.21 26. 31 As catecolaminas activam a produo de ACTH que, por suavez, estimula a produo de glicocorticides.32 Catecolaminas e corticides induziro maior secreo de glicagina.~3 ~ A estimulao adrenrgica, por outro lado,inibir a secreo de insulina. 27 ~ Note-se que aps trauma h hiperinsulinmia, mas com valores insuficientes em relao hiperglicmia simultnea ~ e aoaumento da resistncia aco perifrica da insulina 27. 28 que atribuvel no sao antagonismo hormonal (catecolaminas, glicocorticides, glicagina,3 ACTH eSTH), mas tambm ao aumento da sinalbumina ~ srica,~ justificvel pelasecreo aumentada de insulina e pelo aumento da actividade da transidrogenase dainsulina dependente do glutatio induzido pelos glicocorticides e STH.3~

    Antagonista de aces perifricas da insulina constituido por albumina ligada cadeia fi da insulina (37).

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS 61

    Em linhas gerais, os efeitos das alteraes hormonais descritas sero os mencionados anteriormente. Saliente-se, contudo, que a cetognese estar estimulada mas queo seu aumento se relaciona inversamente com o da gliconeognese, sendo mais marcadanas formas mais ligeiras de trauma que nas mais graves.38 Esta relao inversaestar de acordo com a possibilidade de ao nvel de diferentes rgos os corpos cetnicspoderem substituir parcialmente a glicose como combustvel. J referimos que os corposcetnicos podem inibir a mobilizao de amino-cidos e, consequentemente, a gliconeognese a partir dos mesmos.

    Alis, verificou-se recentemente que a resposta metablica ao trauma no uniforme, sendo possvel classific-la segundo parmetros bioqumicos em hipercetonmicae normocetonmica.~ 38 A resposta normocetonmica com cetonmia s 2 horasaps o acidente inferior a 0,2 mmol/l inclui uma gliconeognese mais intensae degradao marcada das protenas musculares avalivel pela excreo aumentada de 3-metil-histidina na urina (amino-cido constituinte das protenas miofibrilhares).Tal resposta ocorre na maioria dos casos de trauma mais grave. A resposta hipercetonmica cetonmia s 2 horas aps o acidente superior a 0,2 mrnol/l ocorrepredominantemente aps leses menos graves embora se verifique tambm em algunscasos de trauma grave. Os mecanismos determinantes destes diferentes tipos de respostaesto ainda mal esclarecidos.~~

    Saliente-se que a diminuio das protenas corporais aps cirurgia ou traumaparece ser scbretudo devida a menor sntese, s se devendo tambm a maior degradaonos casos mais graves de trauma acidental em que os glicocorticides atingiro valoresmais elevados em relao insulinmia.~

    Para alm das alteraes hormonais j referidas, muito provavelmente outras interferiro no metabolismo ps-trauma. Mltiplos factores, tais como dificuldactes deordem tcnica, resultados variveis, relaes causa-efeito no aparentes, contribuempara um relativo desconhecimento do papel de hormonas como as tiroideias, atirotrfica, a somatotrfica, a prolactina.

    Apenas a ttulo de citao, refira-se que esto descritos aumentos dos nveis sricosde prolactina 40 e de somatotrofina 32. 41 aps cirurgia, bem como complexas variaes das secrees de tirotrofina e das hormonas tiroideias. Os nveis sricos datri-iodotironina reversa aumentam durante a cirurgia, mantendo ainda valores elevadosseis dias depois. Este dado sugere uma via alternativa para a monodesiodinizao perifrica da tiroxina, conduzindo ao aumento da formao de tri-iodotironina reversa nops~operatrio.4042

    CONCLUSES

    Utilizando meios diversos determinao das concentraes de substratos e hormonas no sangue perifrico (Quadro 1) e em amostras colhidas por cateterismoao nvel de diferentes rgos, determinao de produtos do catabolismo na urina,anlise qumica de tecidos, experimentao animal tem-se procurado conhecer asalteraes do metabolismo essencialmente energtico em diversas situaes e os respectivos determinantes desencadeadores ou de manuteno.

    O conhecimento dos mecanismos bioqumicos relacionados com o exerccio fsicoconfere, por exemplo, uma base segura para o estabelecimento de regras para o treinode atletas.

    A necessidade de interferir no metabolismo com intuitos teraputicos tambmrequer o seu estudo pormenorizado. Com algum xito tem-se tentado combater, utilizando

  • Quadro

    acidental ou cirurgia regradaJejum Aps trauma acidental ou cirurgia regradaAps Ingesto mdia Jejum Exerccio Exerccio

    absoro glcidos durao prolongado breve prolongado Em geral (6) (7)

    GLICOSE t N 4. N 4. N t 4. t +

    LACTATO t (1) N N t 11 t +

    PIRUVATO t (1) N N t 11 t +

    A.G.L. 4. t t t t t~GLICEROL 4. t t t t t

    -~

    ~ALANINA t (1) N 4. 4.4. t 11 N ~ +o-~

    >A.A.C.R. 4. ~ (2) 4. N (8) (8)CORPOSCETNICOS 1. ff f (4) +INSULINA 4. 4. 4. t (5) +

    GLICAGINA 4. t (3) t t ff +e fl respectivamente valores aumentados e muito aumentados em relao aos basais; .1. .1.1. respectivamente valores diminuidos e muito

    diminuidos em relao aos basais: N ~ e N 4. respectivamente valores prximos do limiar superior ou no limiar inferior dos valores basais;N valores semelhantes aos basais. AGL cidos gordos livres; AACR Amino-cidos de cadeia ramificada(1) Por menor captao heptica. (2) At ao 6.~ dia de jejum. (3) Valores mximos pelas 48-72 horas. (4) Valores mais elevados nos grupos menosgraves. (5) Mas resposta insulnica inferior previsvel pelos valores da glicmia. (6) e (7) Respectivamente grupo normocetonmico e grupohipercetonmico aps trauma acidental os sinais + indicam o grupo em que se encontram valores mais elevados. (8) At s 48 horas aps traumaos valores so semelhantes nos dois grupos. A partir dar 48 horas elevam-se no grupo normocetonmico e decrescem no hipercetonmico

    Cpmparao das concentraes sanguneas de alguns substratos e hormonas em diferentes situaes nutricionais, no exerccio fsico e aps trauma

    ocl~ofl

  • RESPOSTAS ENDCRINO-METABLICAS 63

    diversas medidas teraputicas, os estados de intenso catabolismo proteico ps~traumaque so seguramente um factor importante de morbilidade e de mortalidade. Um melhorconhecimento dos diferentes tipos de resposta hormonal e metablica ao trauma e dosrespectivos condicionantes vir certamente contribuir para elaborao de esquemasteraputicos mais eficazes e adequados ao caso individual.

    SUMMARYENDOCRINE-METABOLJC RESPONSE TO FASTING, PHYSICAL EXERCISE AND TRAUMA

    This paper describes the metabolic alterations connected with the fuel supplyto tissues occuring in starvation, during exercise and after accidental trauma ar surgeryThe probable non-hormonal and hormona! regulatory mechanisms are also analysed.The autors aim is to summarize some biochemical notions related to the correctionof malnutrition and catabolic situations after trauma or surgery.

    Agradecimentos

    Ao Professor Doutor Carlos Manso pelo estmulo para a realizao deste trabalhoe pelos comentrios e sugestes que teve a gentileza de fazer.

    Ao Sr. Chim Wing San pelo auxlio prestado na execuo das figuras e quadro.s Snrs. D. Gabriela Fontes e Celeste Fernandes pelo cuidado posto na preparao

    do manuscrito.BIBLIOGRAFIA

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