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  • Universidade do Estado do Par Centro de Cincias Sociais e Educao Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Educao/Mestrado

    MARIA DE JESUS LOPES DA SILVA

    FORMAO CONTINUADA E A PRTICA EDUCATIVA DOS PROFESSORES (AS) DA EDUCAO DE JOVENS

    E ADULTOS DO MUNICPIO DE COLARES-PA

    Belm-PA 2008

  • Maria de Jesus Lopes da Silva

    FORMAO CONTINUADA E A PRTICA EDUCATIVA DO (AS) PROFESSORES (AS) DA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS

    DO MUNICPIO DE COLARES-PA

    Dissertao apresentada como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Educao pela Universidade do Estado do Par. rea de concentrao: Educao, Formao de professores e Educao de Jovens e Adultos. Orientadoras: Profa. Dra. Albne Lis Monteiro.

    Belm 2008

  • Dados internacionais de catalogao e publicao (CIP). Biblioteca do Centro de Cincias Sociais e Educao, UEPA,

    Belm - PA.

    SILVA, Maria de Jesus Lopes da. A Formao continuada e a pratica educativa dos professores(as) da educao de jovens e adultos do municpio de Colares-Pa/ Profa. Dra. Albne Lis Monteiro. Belm/PA, 2008. 132f.

    Dissertao (Mestrado) Universidade do Estado do Par, Belm, 2008.

    1. Formao continuada. 2. Educao de Jovens e Adultos. 3. Saberes escolares. 4. Saberes cotidianos. I. SILVA, Maria de Jesus Lopes da. ll. Ttulo.

  • Maria de Jesus Lopes da Silva

    FORMAO CONTINUADA E A PRTICA EDUCATIVA DOS (AS) PROFESSORES(AS) DA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS

    DO MUNICPIO DE COLARES-PA

    Dissertao apresentada como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Educao pela Universidade do Estado do Par. rea de concentrao: Educao, Formao de professores e Educao de Jovens e Adultos. Orientadoras: Profa. Dra. Albne Lis Monteiro.

    Data da Avaliao: _____/_____/_____

    Banca Examinadora:

    ________________________________ - Orientadora Prof Albne Lis Monteiro Dra. em Educao(Currculo) PUC/SP Universidade do Estado do Par

    _______________________________

    Examinadora Prof Maria do Perptuo S. G. de Souza Avelino de Frana Dra. em Educao UNICAMP/SP Universidade do Estado do Par

    _____________________________

    Examinadora Prof Ivany Pinto Nascimento Dra. em Psicologia da Educao pela PUC/SP Universidade Federal do Par

  • me, Luzanira da Silva, que embora tenha freqentado pouco a escola, uma Mulher de muita sabedoria. uma Mulher que aprendeu no e com o mundo a sobreviver em uma sociedade discriminatria e excludente. E foi com essa sabedoria que me orientou a estudar, ser tolerante, paciente e seguir no caminho do bem. Essa a mulher que tenho como exemplo de vida.

  • AGRADECIMENTOS

    A sabedoria divina, que iluminou esta caminhada importante da minha vida.

    minha orientadora, professora Dra. Albne Lis Monteiro, pelas contribuies terico-metodolgicas e leitura cuidadosa deste trabalho.

    s professoras, formadores (as) e educandos(as) que me receberam carinhosamente no lugar deles e colaboraram com a realizao deste estudo.

    Aos professores do PPGED, que colaboraram com a minha formao acadmica.

    professora Dra. Ivanilde Apoluceno de Oliveira, por ter despertado em mim o desejo pela pesquisa e pelas contribuies terico-metodolgicas a minha formao acadmica e prtica educativa.

    irm, Maria Emilia e Maria Leila, que mesmo longe estiveram perto contribuindo para a concretizao deste estudo.

    Ao marido, Elienae, pelo incentivo e apoio constante na realizao desta dissertao. Pelos momentos de estudo, dilogo, reflexes, planejamentos, compreenso, citosina e amor.

    s amigas Sabrina Borges, Sayda Rosa e Izaura Oliveira por fazerem parte da minha trajetria acadmica.

    amiga Ana Carolina pela presena e interesse em querer ajudar, nos momentos de dificuldade.

    Ao amigo Srgio Corra, pelas reflexes tericas - metodolgicas significativas ao projeto que gerou esta dissertao.

    A amiga Roseane Gomes, pelas conversas de reflexes que foram importantes para a minha formao acadmica.

    Ao NEP, por ser um espao de formao permanente e contribuir significativamente na minha formao profissional e humana.

    Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Cincia e Tecnologia SEDCT- pelo apoio financeiro que ajudou a concluir este trabalho. A todos (as) que direta e indiretamente ajudaram na construo desta dissertao.

  • Os educadores so como as velhas rvores. Possuem uma face, um nome, uma estria a ser contada. Habitam um mundo em que o que vale a relao que os liga aos alunos, sendo que cada aluno uma entidade sui generis, portador de um nome, tambm de uma estria, sofrendo tristezas e alimentando esperanas. E a educao algo pra acontecer nesse espao invisvel e denso, que se estabelece a dois (ALVES, 2004, p.19).

  • RESUMO

    SILVA, Maria de Jesus Lopes da. A Formao Continuada e a Prtica Educativa dos Professores da educao de Jovens e Adultos do Municpio de Colares Pa. 2008.132f. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade do Estado do Par, Belm, 2008.

    Esta dissertao tem como foco principal a formao continuada e a prtica educativa dos professores da Educao de Jovens e Adultos, cujo problema de investigao consistiu em saber como a formao continuada realizada para os(as) professores(as) da EJA tm contribudo para a prtica educativa. O estudo traz uma anlise da concepo de educao que fundamenta esse processo formativo como tambm a concepo de formao continuada. Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa descritiva, pois procurou descrever as prticas formativas e educacionais, evidenciando os sujeitos, os espaos, os saberes, as relaes, os hbitos e os gestos. O lcus do estudo foi a Secretaria de Educao do municpio de Colares, pertencente mesorregio do nordeste paraense e microrregio do salgado. Os procedimentos metodolgicos para coletar os dados foram: entrevista semi-estruturada acompanhada de um instrumental de observao in loco, pela necessidade de acompanhar de perto a prtica educativa dos professores da EJA. Entre outras constataes, destaco que as professoras, mesmo enfrentando dificuldades de ordem estrutural e pedaggica, procuram ser sensveis aos problemas dos(as) educandos(as) e reconhec-los(as) como possuidores de saberes; procuram trabalhar as reas do conhecimento, de forma interdisciplinar. Portanto, uma prtica que se caracteriza como inovadora, apresentando, entretanto, alguns traos da pedagogia tradicional. A concepo de educao que orienta a formao define-se por uma base freireana, porm identifiquei ser inconsistente, com ausncia de fundamentos terico-metodolgicos da pedagogia libertadora. Embora com alguns problemas, a formao continuada influenciou, sobretudo, no aspecto prtico de orientao para um trabalho pedaggico apoiado na cultura local dos educandos.

    Palavras-chave: Formao Continuada. Educao de Jovens e Adultos. Prtica Educativa

  • ABSTRACT

    SILVA, Maria de Jesus Lopes da. A Formao Continuada e a Prtica Educativa dos Professores da educao de Jovens e Adultos do Municpio de Colares Pa. 2008.132f. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade do Estado do Par, Belm, 2008.

    This dissertation has as main focus the continued formation and the educative practical of the professors of Adult and Young Education, whose problem of inquiry consisted in to know as the continued formation carried for the professors of the EJA has contributed for the educative practical. The study brings an analysis of the educations conception that bases this formative process as well as the conception of continued formation. It is about a study of descriptive qualitative approach, therefore it looked for to describe the practical educational formative and, evidencing the citizens, the spaces, to knowledge, the relationships, the habits and the gestures. The lcus of the study was the Educations Department of the city of Colares, in the middle region of northeast of Par and the micro region of the Salgado area. The methodological procedures to collect the data had been: half-structuralized interview followed of observation in locu, for the necessity to follow of close the educative practical of the EJAs professors. Among others verifications, I point out that the teachers, although facing difficulties of structural and pedagogical order, look for to be sensible to the problems of the students and to recognize them as owner of the knowledge; they look for to work the areas of the knowledge in the of interdisciplinary form. Therefore, it is a practical that it is characterized as innovative, presenting, however, some traces of the traditional pedagogy. The educations conception that guides the formation is defined for a freireana base, however, I identified to be inconsistent, with absence of theoretical and methodologies bases of the liberating pedagogy. Although with some problems, the continued formation influenced, especially, in the practic aspect of orientation for a pedagogical work supported in the local culture of the students.

    Key - words: Continued Formation. Adults and Young Education. Educative Practical

  • SUMRIO 1. INTRODUO 11 1.1. O interesse pela temtica: as marcas que me conduziram 11 1.2. A temtica 14 1.3. O caminho metodolgico 25 2. FORMAO CONTINUADA: APORTE TERICO-METODOLGICO 33 2.1. As concepes de formao continuada 37 2.2. A formao continuada dos professores (as) da educao de jovens e

    adultos 43

    3. O PROGRAMA DE FORMAO CONTINUADA DOS PROFESSORES DA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICPIO DE COLARES-PA

    49 3.1. Fundamentos terico-metodolgicos 51 3.2. Concepo de educao que orienta o processo formativo 51 3.3. Concepo de formao continuada 56 3.4. Prtica formadora 58 3.4.1. Tempo, espao e financiamento 58 3.4.2. Currculo da formao continuada 61 3.4.3. A experincia formativa do ncleo de educao popular Paulo Freire

    NEP: diferencial terico-metodolgico

    71 3.4.4. Avaliao da formao continuada 76 4. A INFLUNCIA DA FORMAO CONTINUADA NA PRTICA

    EDUCATIVA DOS PROFESSORES DA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICPIO DE COLARES-PA

    82 4.1. O cenrio scio-educativo 82 4.1.1. As carncias 86 4.1.2. A diversidade cultural 86 4.2. A prtica educativa 87 4.2.1. Currculo: interao entre os saberes 87 4.2.2. A interdisciplinaridade 108 4.3. Metodologia 112 4.3.1. Relao professor-aluno 113 4.3.2. Recursos didticos e tcnicas de ensino 115 4.3.3. Planejamento 118 4.3.4. Avaliao 121 CONSIDERAES 124 REFERNCIAS 128 GLOSSRIO 134 APNDICES 136

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    INTRODUO

    preciso pensar a formao de professores (as) na perspectiva de um projeto de formao cultural, o qual permitir aos professores, na sua prtica educativa, condies de resolver os desafios da sociedade, podendo intervir nela a partir de um conjunto de valores filosficos, epistemolgicos, antropolgicos, polticos, ticos e estticos (GHEDIN, 2003, p. 398).

    1.1. O interesse pela temtica: as marcas que me conduziram

    As primeiras inquietaes para realizar esse estudo sobre A formao continuada dos professores da educao de jovens e adultos esto relacionadas minha trajetria escolar no ensino fundamental, que representou uma trajetria de vivncias de prticas discriminatrias e excludentes. Ao rememorar as lembranas da minha trajetria escolar vm tona as vivncias de uma escola excludente, na medida em que ela reforava por meio de suas prticas educativas a discriminao em funo das diferenas de raa, gnero, dialetos, culturas, esttica, na medida em que ela no respeitava os ritmos diferentes para aprender e tantas outras formas de discriminao que direta ou indiretamente estavam presentes nas prticas da escola e refletiam na reprovao e afastamento dos alunos.

    Portanto, as prticas de excluso que marcaram a minha trajetria escolar estavam, em grande medida, em funo das origens socioculturais e educacionais. A essas diferenas, a maioria dos (as) professores (as) mostravam-se apticos e insensveis. Suas prticas eram, na maioria, distanciadas dos educandos porque no os percebiam como sujeitos de histria, sentimentos, objetivos, necessidades e tambm na medida em que no respeitavam as diferenas sociais, culturais, educacionais dos educandos.

    Evocar essas lembranas uma tarefa difcil, exatamente porque mexe com as emoes, sentimentos, ressentimentos, mas tento olhar para elas como um aprendizado para a minha formao, em face da pluralidade de sentidos formativos que emanam dessas experincias escolares.

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    A trajetria Universitria que vivenciei como graduanda do curso de Formao de Professores1 da Universidade do Estado do Par - UEPA tambm contribuiu para que eu enveredasse por essa temtica na dissertao, em face de vivenciar um curso deficiente em alguns aspectos, como a falta de incentivo pesquisa e extenso, em que predominava o ensino. Pela ausncia de uma discusso crtica a respeito da educao e das questes relacionadas a ela, por parte de alguns professores que, limitavam-se a uma formao tcnica, voltada para um fazer tcnico. Uma formao pautada, na prtica da maioria, no paradigma behaviorista assentada num cientificismo cartesiano-newtoniano. Neste paradigma os professores so formados para serem funcionrios no - reflexivos do Estado e para executar atividades meramente instrumentais. A formao descontextualizada social e politicamente e o professor assume-se neutro em relao ao status quo e as questes que favorecem a sua manuteno (KINCHELOE, 1997).

    Por no estar satisfeita com o que o curso e a Universidade ofereciam, no pretendia passar quatro anos em sala de aula sem vivenciar experincias pedaggicas, sem pesquisar, sem produzir, pois acreditava que o ensino, somente, na forma em que se caracterizava, no era suficiente para quem pretendia se formar educadora comprometida com uma educao de qualidade e, consequentemente, com a construo de uma sociedade mais justa, igualitria, tica e humana. Por esta razo comecei, dentro da prpria Universidade, a buscar outras maneiras de ampliar a minha formao e a fazer outras leituras do contexto socioeducativo partindo da leitura de outros textos e de outras realidades.

    Com o apoio do Programa de Iniciao Cientfica da referida instituio, em 2002, comecei uma pesquisa intitulada A Incluso de Jovens e Adultos no Sistema Regular de Ensino , na qual pude me aproximar dos referenciais terico-metodolgicos da Educao de Jovens e Adultos em uma perspectiva de Educao Popular, bem como conhecer a histria da EJA no Brasil e sua luta para constituir-se como um campo de direitos, alm de debater sobre a formao necessria aos professores para trabalhar com essa modalidade de ensino, a partir do estudo de autores que compreendem a educao de jovens e adultos como uma forma de incluso social e educacional.

    1 Hoje, esse curso encontra-se extinto na Universidade do Estado do Par.

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    Outro fator que me aproximou da temtica dessa dissertao foi participao, em 2002, no Programa de Alfabetizao de Jovens e Adultos (PROALTO): processo social para a libertao, atual Ncleo de Educao Popular Paulo Freire (NEP), que funciona no Centro de Cincias Sociais e Educao (CCSE-UEPA), no qual atuo como educadora - pesquisadora em espaos no escolares, onde tenho a possibilidade de trabalhar a minha formao, pois as aes socioeducativas nos proporciona fazer leituras de temticas variadas sobre EJA, culturas, saberes, diferenas, identidades, formao de professores, currculo, entre outros temas, e uma diversidade de vivncias que me faz refletir sobre a importncia de uma formao decente, tica, humana e inclusiva, com vistas transformao social.

    A insero no ncleo significou a oportunidade de desenvolver aes de ensino, pesquisa e extenso de forma articulada e interdisciplinar. Ou seja, encontrei nesse espao a consolidao do trip: ensino-pesquisa-exteno que essencial Universidade e que deveria ser oportunizado a todos os alunos. O Ncleo passou a representar na minha vida o lugar de aprender e ensinar. Lugar de reflexo constante e de vivncias pedaggicas que contribui para a minha formao pessoal, profissional e, sobretudo, humana. Efetivamente, um espao de formao profissional orientado para a pesquisa. Nesse paradigma, o professor inerentemente poltico e preocupado com o contexto social, questiona o status quo e rejeita a formao para o ajustamento.

    A lgica que norteia o paradigma da formao para a pesquisa se assenta em: Atitudes de compromisso com a democratizao das escolas e da sala de aula, de dilogo e participao e de sensibilidade para o pluralismo e a diversidade (VEIGA, 1998, p.79).

    Alm dessas questes que me impulsionaram ao estudo das questes relativas EJA e formao do professor, outros fatores favoreceram o desenvolvimento dessa temtica, como, por exemplo, a iniciativa da Secretria de Educao do Municpio de Colares, que busca desenvolver com os professores de EJA formaes continuadas com o objetivo de prepar-los melhor para a prtica educativa. A aproximao que estabeleci com o Municpio de Colares, seus moradores, professores, e educandos, me possibilitou conhecer alguns de seus problemas educacionais, sociais, culturais, polticos e econmicos, alm da

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    diversidade cultural, dos saberes cotidianos que servem de base para orientar a vida diria dos sujeitos.

    No Programa de Mestrado da Universidade do Estado do Par, tive a possibilidade de ampliar em nvel terico, epistemolgico as discusses sobre a formao de professores, formao continuada e a educao de Jovens e Adultos, temas que debato neste estudo, bem como as questes correlacionadas a elas: diversidade, cultura, identidade, multiculturalismo, saberes, educao popular, gnero, etnias, diferenas, meio ambiente, questes que se colocam para ns como centrais e que devem ser problematizadas no mbito da educao de modo a nos orientar a intervir com responsabilidade nos rumos que a sociedade vem tomando em face dos processos de globalizao poltica, econmica e cultural que atuam de forma dramtica sob a vida da maioria das pessoas e a construir as bases para uma sociedade mais humana e solidria.

    Estas so algumas marcas que me conduziram para a realizao desta dissertao, logo, espero que os escritos que seguem possam de, alguma forma, proporcionar reflexes e novas prticas nas reas de debate em que este estudo est situado.

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    1.2. A temtica

    A educao nos sculos XIX e XX foi influenciada pelo mtodo cartesiano, em que matria e mente eram separados e o conhecimento dividido em campos especializados. Essa organizao do pensamento refletiu em uma mentalidade reducionista por parte da comunidade cientfica, na qual o ser humano possui uma viso fragmentada do saber (BEHRENS, 2005).

    A formao de professores2 absorve esse modelo cartesiano na medida em que a define como um processo que ocorre a partir da construo do conhecimento assentado na reproduo do saber, conforme se observa na afirmativa de Behrens (2005, p. 23):

    A viso fragmentada levou os professores e os alunos a processos que se restringem reproduo do conhecimento. As metodologias utilizadas pelos docentes tm estado assentadas na reproduo, na cpia e na imitao. A nfase no processo pedaggico recai no produto, no resultado, na memorizao do contedo, restringindo-se em cumprir tarefas repetitivas que muitas vezes, no apresentam sentido ou significado para quem as realiza.

    Esse modelo est assentado nas concepes essencialistas e positivistas de ser humano e de mundo, denominadas de pedagogia tradicional, escolanovista e tecnicista tidas como reprodutivistas e alienantes. Sem adentrar em uma anlise das referidas pedagogias, apresento a seguir a viso de ser humano que elas trazem, a partir do estudo de Oliveira (2006):

    Pedagogia tradicional A referida pedagogia traz como pressuposto filosfico a viso

    essencialista de ser humano, entendendo-o com uma essncia imutvel: O ser humano constitudo de uma essncia imutvel, a racionalidade, cabendo a educao conformar-se sua essncia (OLIVEIRA, 2006, p. 104).

    Pedagogia escolanovista Apesar desta pedagogia contribuir para mudanas no mbito pedaggico,

    apontando para mudanas no itinerrio educativo, criticada pelos progressistas por ser a-historica e desvinculada do contexto poltico e econmico da sociedade(OLIVEIRA, 2006).

    2 Ao longo de todo este trabalho, o termo professor inclui professor e professora, o mesmo se dando

    com o termo educando.

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    Nesta pedagogia o ser humano visto como:

    Projeto de seus atos, considerando como indivduo nico situado no tempo e no espao [...]. Cada indivduo compreendido a partir de suas diferenas individuais, de suas capacidades e potencialidades individuais (OLIVEIRA, 2006, p. 106).

    Pedagogia tecnicista

    Segundo Oliveira (2006) a pedagogia tecnicista no traz expresso uma viso de ser humano, mas tem como pressuposto filosfico o positivismo e assenta-se nos mtodos e tcnicas de ensino, na busca de uma eficincia tcnica e de uma produtividade no ensino (P, 109).

    Para se contrapor a esses paradigmas de formao conservadora e cartesiana, surge o paradigma da cincia denominado de paradigma emergente ou ps-moderno, que consiste em uma mudana de postura epistemolgica diante dos fenmenos estudados.

    uma cincia que busca enfrentar os desafios da cincia contempornea de forma mais aberta e dinmica, tentando compreender que a natureza algo que se torna cada vez mais fugaz e mutante, num mundo que est em constante transformao. Este paradigma considera o saber como o resultado de um processo entre os saberes, ao considerar que o saber no nico e nem inflexvel. Caracteriza-se por buscar compreender a realidade a partir da teia de relaes que a constitui (SANTOS, 2006).

    O conhecimento nesse paradigma se pretende como no dualista, um conhecimento que se funda na superao das distines natureza/cultura, natural/artificial, vivo/animado, observador/observado, subjetivo/objetivo, coletivo/individual, animal/pessoa (SANTOS, 2006).

    O referido paradigma prima por uma viso do todo, busca a superao da reproduo para a produo do conhecimento, da fragmentao do saber s inter-relaes dos saberes, sejam cientfico, cotidiano, mtico ou religioso. Conforme Behrens (2005, p. 23), o paradigma emergente se configura como uma cincia que supere a fragmentao em busca do todo e que contemple as conexes, o contexto e as inter-relaes dos sistemas que integram o planeta.

    No que tange formao de professores, a crise de paradigmas influencia a ampliao das discusses nessa rea, com o objetivo de construir novos parmetros para pensar a formao de professores, visto que a sua fundamentao, muitas vezes, se pauta nos princpios da racionalidade tcnica.

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    Tal temtica tem alcanado grande expressividade entre os temas mais debatidos no mbito da educao brasileira e cresce a cada dia o nmero de pesquisadores3 que enveredam pelos meandros deste tema, ao problematizar as questes concernentes a ele, como, por exemplo, a prtica educativa dos professores a didtica, a poltica de valorizao do magistrio, a profissionalizao, a fundamentao terica, a autonomia, a concepo de educao, entre outros.

    Veiga (2002), sobre a formao de professores, critica o paradigma voltado para o desenvolvimento das competncias e do desenvolvimento tcnico-profissional, ao reduzi-la a uma formao pragmtica, simplista e prescritiva. A referida autora apresenta duas perspectivas voltadas para a formao do professor: a primeira refere-se ao professor como tecnlogo do ensino e a segunda, ao professor como agente social.

    O tecnlogo do ensino definido mediante a lgica do poder constitudo, sua formao limita-se s demandas do mercado globalizado. Para melhor definir a posio do tecnlogo do ensino, seria mais adequado dizer que ele parece ser a figura dominante no mbito das reformas da educao (VEIGA, 2002).

    No trecho abaixo, a autora expressa que a formao tem centrado em uma prtica em que o fazer est desprovido de qualquer fundamentao terica, ou seja, uma prtica basista.

    A formao centra-se no desenvolvimento das competncias para o exerccio tcnico - profissional, baseada no saber fazer para o aprendizado do que se vai ensinar. Os conhecimentos so mobilizados a partir do que fazer. Essa perspectiva de formao centrada nas competncias restrita e prepara, na realidade, o prtico, o tecnlogo, isto , aquele que faz, mas no conhece os fundamentos do fazer, que se restringe ao micro-universo escolar, esquecendo toda a relao com a realidade social mais ampla que, em ltima instncia, influncia a escola e por ela influenciada. Essa concepo confere ao trabalho do professor um carter muito ligado atividade artesanal, restringindo competncias a um saber prtico (VEIGA, 2002, p. 72).

    Essa assertiva expe a realidade da formao do professor pautada em uma prtica, muitas vezes, desprovida de base terica significativa e reduzida escola como nico espao de construo do saber. Uma formao que pouco

    3 possvel visualizar esse crescimento em eventos, como o EPENN. Neste, no ano de 2005, por exemplo, foram 239 trabalhos aprovados (ANAIS DO EVENTO: VOLUME 2 E 3). Em 2007, no mesmo evento foram aprovados 314 trabalhos (ANAIS DO EVENTO). Esse crescimento relaciona-se, tambm, ao grau de importncia atribudo formao dos professores para a elevao da qualidade da prtica educativa e, de forma conseqente, para a elevao da qualidade da educao brasileira.

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    considera o contexto cultural dos professores e nem parte dele para realizar a prtica, reduzindo-a um fazer artesanal.

    Segundo Kincheloe (1997) essa prtica de formao dos professores est assentada no paradigma artesanal tradicional, que considera os professores como artesos que apreendem com a experincia, sem, contudo, precisar da teoria. Ou seja, nesse paradigma teoria - prtica so duas dimenses que no se relacionam.

    A segunda perspectiva apresentada por Veiga (2002) para a formao a do professor como agente social. Ao contrrio da formao na viso do tecnlogo do ensino, a formao nessa perspectiva do agente social defende uma discusso global que contempla desde a formao inicial e continuada at as condies de trabalho, salrio, carreira e organizao da categoria.

    A formao de professores como agentes sociais ocorre em um processo formativo orgnico e unitrio, um dos pilares fundamentais da formao terica de qualidade, que implica recuperar, nas reformulaes curriculares, a importncia do espao para anlise da educao como disciplina, seu campo de estudo e status epistemolgico; busca, ainda, a compreenso da totalidade do processo de trabalho docente. (ANFOPE apud VEIGA, 2002, p. 82,83).

    Em relao formao continuada, surge com o intuito de equacionar os problemas relativos formao dos professores, que so, conforme Nunes (2000), Candau (1996), as limitaes terico-metodolgicas da formao inicial, a prtica educativa assentada em um paradigma tecnicista, a globalizao que impe novas exigncias formao dos professores, mas no so, somente, essas questes que exigem processos de formao continuada para os professores.

    A idia de trabalhar formaes continuadas para os professores est, tambm, assentada na necessidade de ampliar a formao do professores a partir do dilogo com as temticas que so centrais e imprescindveis para uma educao critica apoiada nas questes de gnero, etnia, identidade, diferenas, cultura, multiculturalismo, interculturalidade, educao em direitos humanos, ecologia, entre outros. Esses temas macros precisam, contemporaneamente, ser discutidos no mbito da formao dos (as) professores (as), considerando o complexo e heterogneo contexto educacional, social e cultural em que esto inseridos.

    Pautar essa discusso dentro dos processos formativos dos professores ser possvel construir outras lgicas de formao e, conseqentemente, garantir

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    prticas educativas mais criativas, ticas, polticas e humanas contribuindo para a formao de cidados ativos e participativos.

    No que tange formao de professores para atuar no mbito da EJA, uma das perguntas mais comum : Qual a formao necessria para o professor da EJA? No h uma resposta pronta e acabada para essa questo. No existe uma receita passo-a-passo para orientar o professor da EJA. O que h so algumas pistas que orientam o professor a realizar uma prtica respeitosa, tica e coerente com a realidade sociocultural dos seus educandos.

    Entre essas pistas est prpria compreenso de formao do professor que precisa ser entendida como um processo contnuo de reflexo sobre a prtica, conforme ressaltam Freire (2006) e Nvoa (1991). Ou seja, um processo que demanda por parte do professor reflexo-ao-reflexo permanentemente sobre o ato educativo - prxis.

    Outra pista importante o professor procurar conhecer a trajetria da EJA ao longo da histria, seus desdobramentos, bem como os entendimentos, as concepes que foram atribudas a ela.

    A Educao de Jovens a Adultos definida por Furter (1994, p. 32) a partir do valor axiolgico da sociedade capitalista:

    Na escala axiolgica da sociedade capitalista, a educao no formal menos do que educao formal, posto que a primeira concebida como complementar de, supletiva de, j que no tem valor em si mesma; pelo contrrio, o saber que se lhe reconhece radica em que ela capacita, ou seja, em que instruo e, no, educao. Em contrapartida, a educao formal vale por si, porque prepara o homem integral, o cidado.

    Gadotti (2007, p. 29) corrobora com esse entendimento quando afirma que a educao de jovens e adultos4 , na maioria das vezes, definida pelo que ela no :

    Por isso falamos de educao assistemtica, no-formal e extra-escolar. A educao no-formal seria menos que a educao formal, posto que a primeira concebida como complementar de, supletiva de, que no tem valor em si mesma.

    4 Esses jovens e adultos so, na maioria, sujeitos trabalhadores das classes populares. Homens e

    mulheres, trabalhadores, empregados e desempregados; filhos, pais e mes; moradores urbanos de periferias, de favelas e vilas. Campesinos, ribeirinhos, pescadores. Sujeitos sociais e culturais, marginalizados das esferas socioeconmicas e educacionais, privados do acesso cultura letrada e aos bens culturais e sociais.

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    No fragmento anterior, tem-se a educao de adultos pensada como sendo uma educao que no valorizada, fato esse apontado por Furter (1994) e Gadotti (2007) quando expressaram o que a educao no , por se tornar um apndice da educao que busca atender as demandas do mercado de trabalho.

    A assertiva evidencia a viso de inferioridade e preconceito que lanada para a educao de adultos, a qual ao se diferenciar de forma institucional, programtica e pedagogicamente, como um tipo especializado de educao oferecida aos marginalizados da escola, se firma como algo que existe fora do sistema escolar de educao.

    uma educao emergente e no regulamentada como importante do ponto de vista educacional e social. E nem poderia ter essa conotao, valorativa e de reconhecimento, haja vista que, aos marginalizados da educao, no lhes permitido o direito de ter uma educao regulada, visto que na sociedade capitalista dependente, igualdade social de oportunidades aos bens sociais reflete uma ameaa, uma desestabilidade ao status quo de uma minoria da populao.

    Brando (1994, p.33) evidencia o desprestgio da educao de adultos, que apenas instrui e no prepara o homem integral:

    A educao de adultos realizou-se como estgio de emergncia que ressocializou tardiamente o sujeito adulto popular no escolarizado. Deu-lhes fragmentos de saber para que ele se converta em um cidado educado, ainda que nunca formado pela educao e, muito menos, transformado atravs dela.

    Tem-se ento uma idia de educao de jovens e adultos que se desenvolve como possibilidade de instru-los no sentido de torn-los cidados educados, mas essa mesma educao no os formaria de forma integral e nem transformaria suas vidas. Nesse sentido, a educao de jovens e adultos assume um carter compensatrio e o saber necessrio uma distribuio desigual e hierarquizada.

    Na dcada de 1960, em meio poltica repressiva que o Brasil vivenciava, surgiu no cenrio nacional uma nova proposta para a educao de adultos que se contrapunha a adotada pelo sistema educacional. Essa proposta ganhou expressividade por meio do educador Paulo Freire, que, ao participar do 2 Congresso Nacional de Educao de Adultos, realizado em 1958, props um

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    Programa Permanente de Alfabetizao para o enfrentamento da problemtica do analfabetismo, entendendo a EJA a partir de uma viso das causas do analfabetismo, como educao de base articulada com as reformas de base (GATOTTI, 2007).

    Embora as discusses sobre a EJA tenham iniciado na dcada de 1950 (BRANDO, 1994), chega-se ao sculo XXI tentando encontrar solues para o enfrentamento dos mesmos problemas educacionais, sociais e culturais que marcam a histria da EJA desde a sua gnese, razo pela qual pesquisadores de vrios pases lanam diversos olhares para esse campo e tentam problematiz-lo com o intuito de configur-lo em face das suas especificidades.

    Entre os motivos que ocasionam diversos olhares para a EJA destacam-se: as polticas de ateno a educao de jovens e adultos, didtica na EJA, a formao do educador da EJA, as concepes que norteiam a educao de jovens e adultos; a formao terico-metodolgica dos professores para trabalhar com essa modalidade de ensino; a ausncia de um currculo prprio para a EJA, pensado a partir das suas especificidades e realidades; a falta de recursos materiais e pedaggicos e estruturao adequada das escolas; a ausncia de polticas efetivas de formao continuada para os professores da EJA, entre outras questes.

    No que tange aos processos formativos contnuos para os professores da EJA observo que, da forma como est estruturado e como colocado em prtica, pouco favorece mudanas significativas na prtica educativa. De acordo com Candau (1996), a formao continuada segue um modelo clssico, ou seja, pontual, dicotomizada, alheia s realidades educacionais, sociais e culturais dos professores inseridos no processo formativo.

    Nas experincias que venho acumulando em formaes continuadas com professores de jovens e adultos, das quais participei como formadora ou apenas como ouvinte, permitiram-me observar que em alguns processos formativos h a predominncia desse modelo clssico, que tem proporcionado poucas mudanas significativas na ao dos professores. Muitos deles trabalham sem contextualizao, sem a corporeificao da palavra pelo exemplo, poucos consideram as marcas culturais dos jovens e adultos e partem delas para desenvolver a prtica. Poucos refletem de maneira crtica a prtica. Tudo isso tende a refletir na educao dos jovens e adultos que, na maioria, continuam no sabendo ler e escrever, e, quando sabem, restringem-se a leituras limitadas, superficiais, e

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    sofrem com prticas preconceituosas de todas as ordens: social, econmica, fsica, cultural, as quais culminam com a excluso escolar, problema que acompanha a educao de jovens e adultos desde o incio da sua histria e que foi confirmado pelas autoras Silva e Castro (2004) no estudo que realizaram sobre a incluso e permanncia dos jovens e adultos na escola regular do Municpio de Belm.

    A questo que me inquieta como mudar essa realidade, oferecendo aos jovens e adultos condies de no apenas de insero, mas tambm de permanncia na escola. Talvez uma das primeiras iniciativas, mas no a nica, seja cuidar da formao continuada dos professores da EJA. Como desenvolver a formao continuada de professores para trabalhar com jovens e adultos? Esses professores so sujeitos que tm realidades diversas, experincias para socializar, saberes cotidianos diferentes. Nesse contexto, ser possvel chegar com tudo pronto? Todos esses contextos plurais no proporcionariam uma formao significativa? As questes culturais locais que esto em volta dos professores, os saberes, o que fazer com eles? Ao que tudo indica, essas questes tendem a ficar secundarizadas.

    Trazer essas questes para a formao continuada possibilitaria dar-lhe um novo sentido. Por meio da problematizao com os professores, possvel saber o que eles pensam sobre essas questes, como as percebem no cotidiano deles, como as tratam na sala de aula e como seria possvel trabalhar os contedos escolares a partir delas.

    As Secretarias de Educao Estaduais, Municipais, as escolas, os formadores, as entidades no governamentais, todos precisam priorizar e debater as questes concernentes a formao continuada para que se possa melhorar a qualidade da formao dos professores, avanar na educao dos jovens e adultos e, por conseguinte mudar os indicadores que colocam o Brasil em 69 lugar no ndice de Desenvolvimento Humano IDH, (ARAJO, 2006).

    As discusses tm que ser feitas a partir de outros olhares que contemplem os saberes cotidianos, da cultura local que se constituem em uma temtica extremamente contempornea e relevante. Estabelecer dilogos, entre os saberes, importante, visto que essa conversa entre saberes enriquece o trabalho educativo. Por exemplo, a cincia do homem branco precisa conversar com a cincia do indgena (TERENA, 2004), com a cincia dos ribeirinhos, dos quilombolas e dos povos das florestas. Essa uma tarefa desafiadora para a maioria dos

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    professores que na prtica educativa ainda no conseguiram estabelecer um dilogo entre os saberes e continuam a trabalhar na perspectiva da fragmentao e da especializao.

    Essa discusso importante porque a formao continuada precisa ter como pano de fundo os saberes culturais que nascem do cotidiano dos professores de jovens e adultos, considerando que o cotidiano um espao rico de saberes, onde a formao continuada acontece.

    O cotidiano, na perspectiva de Pais (2003, p.31) definido como:

    Uma rota de conhecimentos. Quer isto dizer que o quotidiano no pode ser uma parcela isolvel do social. Mas o prprio social, que se revela por meio do cotidiano.

    Pretendo evidenciar que o cotidiano pode e precisa ser considerado no processo de formao continuada de professores, por ser um espao no qual o social se revela, permitindo perceber os valores, os saberes, as crenas, as atitudes, as reaes e as representaes que os sujeitos fazem da realidade social em que vivem.

    Neste campo de discusso apontei o seguinte problema de investigao: Como a formao continuada realizada para os Professores da Educao de Jovens e Adultos, por meio da Secretaria Municipal de Educao, do Municpio de Colares-Pa, tem contribudo para a prtica educativa dos professores? O qual permitiu vislumbrar se a formao continuada, de fato, se revela em um contnuo e se uma ao que promove mudanas na prtica educativa dos professores de jovens e adultos do Municpio.

    Esse problema seguiu acompanhado de algumas questes norteadoras:

    Qual a concepo que orienta a formao continuada oferecida pela Secretaria Municipal de Educao de Colares-Pa?

    Em que essa formao continuada tem contribudo para o desenvolvimento da prtica educativa dos professores da EJA?

    As temticas da formao continuada emergem das necessidades formativas dos professores da EJA?

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    Essas temticas so trabalhadas a partir dos saberes culturais cotidianos dos professores envolvidos no processo formativo?

    O objetivo geral foi definido da seguinte maneira: Analisar como a formao continuada realizada para os professores da Educao de Jovens e Adultos, por meio da Secretaria Municipal de Educao de Colares-Pa, contribuiu para o desenvolvimento da prtica educativa dos professores.

    Os objetivos especficos foram: Identificar a concepo que orienta a formao continuada, oferecida aos professores da EJA pela Secretaria Municipal de Educao de Colares-Pa; Observar como a formao continuada tem contribudo para o desenvolvimento da prtica educativa dos professores da EJA; Verificar se as temticas da formao continuada emergem das necessidades formativas dos professores; Identificar se essas temticas esto sendo trabalhadas a partir dos saberes culturais cotidiano dos professores envolvidos no processo formativo e se h interao entre saberes.

    Encontrei alguns autores que problematizam a formao de professores com outros olhares, relacionando com questes recorrentes e na tessitura desta dissertao dialogo com seus escritos por considerar que so discusses atuais, de fato, uma tendncia na problematizao da formao de professores: Canen (2005), Candau (1996), Oliveira (1994), alm dos autores que fazem a abordagem do cotidiano: Pais (2003), Costa et al. (2003), Macedo (2000).

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    1.3. O caminho metodolgico

    A definio de um caminho metodolgico que oriente o desenvolvimento de uma investigao quase sempre um processo conflituoso para o pesquisador, que precisa definir de maneira cuidadosa o percurso metodolgico que nortear a investigao. Dominar as tcnicas, as estratgias, ser coerente, tico e responsvel com a coleta dos dados e mais ainda com o processo de anlise no uma tarefa fcil e exige por parte do pesquisador domnio, segurana e conhecimento.

    Penso que esse processo torna-se mais complexo porque o fenmeno a ser investigado dever ser olhado sob vrios pontos de vista, analisado na sua totalidade, diferenciando-se de pesquisas tradicionais que compreendem o conhecimento como estvel, nico, inflexvel, absoluto, fechado e auto-suficiente (MORIN, 2003).

    Ao contrrio dessa compreenso, acredito na multiplicidade de saberes e com base nessa idia que enveredo pelo contexto social e cultural dos professores em processo de formao, desvelando as teias, as redes, as inter-conexes, as relaes, os seus saberes e a cultura que os caracteriza como seres humanos culturais e histricos.

    Para tanto, considero que esta construo est assentada na abordagem qualitativa, visto que permite o afloramento das significaes, das representaes, dos valores, das crenas, dos desejos que emanam das relaes sociais, conforme Minayo e Sanches (1994).

    Esta pesquisa constitui-se tambm em um estudo descritivo, pois permitiu a descrio dos sujeitos, dos espaos, das relaes, dos hbitos, gestos e tudo que for possvel captar e que venha contribuir para o seu desenvolvimento (LUDKE e ANDR, 1986). tambm um estudo de observao in-loco pela necessidade de acompanhar de perto, a prtica educativa dos professores da EJA no intuito de observar como a formao continuada est refletindo na prtica educativa dos professores de jovens e adultos.

    Adler e Adler (1998 apud Flick, 2004, p. 147), consideram que:

    A observao faz-se importante porque alm das competncias da fala e da escuta, empregadas nas entrevistas, a observao outra habilidade

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    diria metodologicamente sistematizada e aplicada na pesquisa qualitativa. Rene no apenas as percepes visuais, mas tambm aquelas baseadas na audio, no tato e no olfato.

    Ainda sobre a observao, Flick (2004) revela que as pesquisas qualitativas enfatizam que as prticas somente podem ser acessadas por meio da observao, e que as entrevistas e as narrativas tornam acessveis apenas os relatos das prticas e no as prprias prticas.

    Constitui-se, tambm, em um levantamento bibliogrfico das temticas principais deste estudo, as quais so: formao de professores, formao continuada e educao de jovens e adultos, saberes, cultura, currculo, planejamento, entre outras.

    O lcus da pesquisa foi a Secretaria Municipal de Educao e trs escolas do Municpio de Colares.

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    Figura1: Mapa do Municpio de Colares-Pa5 Fonte: O liberal (Par - anurio 2008).

    Colares pertence mesorregio do nordeste paraense e microrregio do salgado. uma ilha com cerca de 250km, cuja sede est situada s margens da Baa do Maraj, distando 100 km da capital do Estado do Par, Belm.

    Estabelece limites ao norte com a baa do Maraj, ao sul, com o Municpio de Santo Antnio do Tau, a leste, com Vigia e a oeste, com a Baa do Sol.

    5 1. Colares. 2. Mocajuba. 3. Jucarateua. 4.Guajar. 5. Candeuba. 6.Maracaj. 7. Piquiatuba. 8. Itabocal. 9.

    Fazenda. 10. Itajura. 11. Ururi. 12. Arace. 13. Araci da Laura. 14. Genipaba da Laura. 15. Arari. 16. PA 238.

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    O acesso ao Municpio se d por meio das rodovias BR-316, PA-140 e 238 at a localidade de Penha - Longa, onde a travessia feita por meio de uma balsa.

    O municpio de Colares foi criado em 29 de dezembro de 1961 por meio da lei 2.460 possui uma populao estimada em 10.981 habitantes, sendo 3.332 localizados na zona urbana e 7.549 na zona rural (O LIBERAL, 2008).

    A histria desse municpio est associada colonizao da cidade de Vigia, pois antes de ser independente pertencia aquele Municpio e o seu povoamento est relacionado com a vinda dos jesutas, para a catequizao dos ndios tupinambs.

    Como o Municpio no conseguiu se manter depois de ser desmembrado de Vigia, foi extinto, e somente restaurado em 4 de abril de 1883, pela lei 1.152. Em 1901, Colares foi reintegrado a Vigia e, em 1961 conseguiu sua emancipao definitivamente (O LIBERAL, 2008).

    Em relao s atividades econmicas, predomina no municpio as atividades ligadas pesca, a agricultura, com destaque para o cultivo da mandioca, um dos principais alimentos dos habitantes e o artesanato. H tambm, alm dessas atividades econmicas, o setor de servios e comrcio que vem crescendo gradativamente na cidade. As primeiras atividades econmicas so vistas como pertencentes ao mundo rural, o qual por sua vez visto como lugar de atraso e pouco valor. Enquanto que aquelas ligadas ao comrcio so relacionadas ao meio urbano, lugar de desenvolvimento e modernizao. Essa viso dualista entre campo e cidade resultado da poltica capitalista que em nome do desenvolvimento e da modernizao, destri e exclui povos e culturas.

    Sobre as manifestaes culturais, ganha destaque as de cunho religioso como o crio de Nossa Senhora do Rosrio que ocorre em Colares, o crio de So Sebastio na localidade de Jaarateua e o crio de So Tom em Mocajuba que ocorre no ms de Setembro e as manifestaes populares, como por exemplo, os folguedos populares, o carimb, os bois bumbs e grupos de pssaros.

    Em relao aos informantes entrevistados foram: 04 professoras que moram no prprio municpio, na faixa etria entre

    27 e 36 anos. O fato de serem somente professoras em funo da predominncia de mulheres na educao de Jovens e Adultos do Municpio. Desse total de professoras, duas trabalham com a 2 etapa (3 e 4) e duas, com a 1 etapa (1 e

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    2), sendo que uma das turmas da 1 etapa foi fechada pela Secretaria de Educao, que alegou, segundo a professora da turma, o nmero insuficiente de alunos para mant-la em exerccio, razo pela qual a observao na turma ficou prejudicada. Quanto formao, as professoras possuem apenas o Ensino Mdio e esto trabalhando na EJA h pelo menos uns quatro anos, com exceo de uma professora que tem dois anos de experincia na EJA;

    02 formadores, sendo 01 do sexo masculino, com 28 anos, que tem formao superior completa em Pedagogia e especializao em Matemtica pela Universidade Federal do Par, e 01 do sexo feminino, com 57 anos e formao superior em Pedagogia pela Universidade Federal do Par. Ambos so moradores locais e desenvolvem atividades profissionais na Secretaria de Educao de Colares.

    04 educandos jovens e adultos, sendo 03 do sexo feminino e 01 do sexo masculino. Alm de estudar, eles desenvolvem atividades produtivas ligadas agricultura (plantio de mandioca, milho, cupuau, murici, bacuri, verduras, ervas medicinais,); ao extrativismo (aa); pesca (no Rio Maraj); e ao artesanato regional (colares, cestos, tipiti, abanos, rede de pescar). Por questes ticas, os sujeitos da pesquisa no tero seus nomes verdadeiros revelados e sero identificados por cdigos6.

    Como critrio de escolha dos sujeitos professores e formadores levei em considerao o gnero e o fato de pertencerem ao quadro de profissionais da Secretaria Municipal de Educao e terem experincia com a educao de Jovens e Adultos h pelo menos um ano. Em relao aos educandos, o critrio adotado foi o gnero e estarem freqentando regularmente a escola.

    Quanto coleta dos dados, foi feita a partir de entrevista semi-estruturada, acompanhada de um instrumental de observao, com o intuito de reunir o mximo de informaes que pudessem responder ao problema levantado nesta dissertao. A coleta foi feita por meio do recurso de gravador, mquina fotogrfica, roteiro de questes para observao e caderno de anotao.

    Para analisar os dados gerados, aproximei-me do mtodo de anlise do contedo que consiste em um conjunto de tcnicas de anlise das comunicaes [...] procura conhecer aquilo que est por traz das palavras sobre os quais se

    6 Os cdigos de identificao dos sujeitos para professor so P1, P2, P3 e P4. Para formador so F1

    e F2 e para educandos Educ. 1, Educ.2, Educ.3 e Educ.4.

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    debrua (BARDIN, 1977, p. 43 e 44) e se assenta no pressuposto de uma concepo crtica e dinmica da linguagem e o seu ponto de partida a mensagem, seja verbal, gestual, silenciosa, figurativa ou documental, que necessariamente expressa um significado.

    O mtodo procura extrair os sentidos do texto, aquilo que expresso e que o pesquisador consegue interpretar. A pergunta que se faz nesse mtodo de anlise : o que este texto quer dizer? Busquei, ento, extrair do contedo das falas, dos gestos e das aes os significados que foram possveis captar.

    Os procedimentos de organizao dos dados para anlise foram feitos da seguinte maneira: No primeiro momento, os dados foram transcritos seguindo as questes do instrumental de entrevista e, em seguida, agrupados, de acordo com os sentidos (semntica), na forma de unidades e eixos temticos para, posteriormente, serem analisados.

    As unidades e eixos temticos, construdos com base nos dados, foram os seguintes:

    Unidade temtica I: Programa de formao continuada de Colares-Pa para os professores de Jovens e Adultos.

    Eixos temticos: Concepo de Educao: Fundamentos Terico-Metodolgicos Concepo de formao continuada Prtica Formadora (tempo, espao, financiamento, Currculo e avaliao) A Experincia Formativa do Ncleo de Educao Popular Paulo Freire

    NEP.

    Unidade Temtica II: A influncia da formao continuada na prtica educativa do professor de educao de jovens e adultos do Municpio de Colares-Pa.

    Eixos temticos:

    Aproximao com o lcus da pesquisa: O cenrio scio-educativo

    Prtica educativa (currculo escolar, metodologia, recursos didticos, relao professora-aluno, planejamento e avaliao) Entre as sees que compem esta dissertao, destaco: Formao

    Continuada: aporte terico-metodolgico. Nesta, proponho uma reflexo, contextualizando historicamente no Brasil o debate sobre a formao continuada,

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    suas concepes, conceitos, pressupostos terico-metodolgicos e objetivos. Fao tambm uma abordagem da formao continuada voltada para os professores da EJA, procurando evidenciar a sua importncia para a efetivao de uma educao coerente com a realidade socioeducacional dos jovens e adultos.

    Na seo seguinte, O processo de formao continuada dos professores da Educao de Jovens e Adultos do municpio de Colares-Pa, apresento o processo de formao continuada vivenciado pelos professores do Municpio de Colares, a partir da fala dos sujeitos e das observaes realizadas in loco, evidenciando como a mesma vem sendo realizada pela secretaria de educao alm de apontar as problemticas terico-metodolgicas que interferiram na qualidade das formaes.

    A prxima seo, A influncia da formao continuada na prtica educativa dos professores da educao de Jovens e Adultos do Municpio de Colares-Pa, tambm foi tecida a partir das vozes dos sujeitos e das observaes in loco, de modo a evidenciar como a prtica educativa dos professores da EJA se desenhou a partir das formaes continuadas.

    Quanto sustentao terica para fundamentar cada uma das temticas propostas neste estudo, utilizo no campo da formao de professores e formao continuada Veiga (2002), Scheibe (2002), por tecerem em seus discursos uma formao dos professores para alm do tcnico-instrumental e problematizarem a forma como a prtica educativa se realiza: tcnica, pragmtica e simplista; Candau (1996), pela contribuio no campo da formao continuada, ao evidenciar as diversas formas que a mesma vem sendo historicamente definida e praticada; Canen (2005), porque o dilogo com a autora se d, sobretudo, a partir dos escritos que tece em relao formao e ao multiculturalismo; Nvoa (1991), porque aborda a formao continuada por meio da idia de reflexo sobre a prtica a partir da prtica; entre outros que acreditam e concebem a formao de professores em uma perspectiva contempornea.

    Em relao temtica da educao de Jovens e Adultos, dialogo com os seguintes autores: Brando (1994), Freire (1982), Gadotti (2007), Soares (2006) e Oliveira (2004), em virtude das contribuies terico-metodolgicas que trazem para esse campo de estudo e atuao.

    Quanto discusso epistemolgica das questes relacionadas com os saberes cotidianos, com a cultura local, ser mediada pelas abordagens feitas por

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    Pais (2003), com a anlise que faz dos paradigmas sociolgicos da vida cotidiana; Heler (2000), na discusso que tece do cotidiano e compreende o ser humano na vida cotidiano como ser individual e ser genrico; Brando (2002), com a educao como cultura: Costa et al. (2003), saberes culturais; saberes e formao de professores; Oliveira (1994), a relao entre os saberes e Canen (2005), por discutir a formao de professores, a interculturalidade e o cotidiano escolar.

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    FORMAO CONTINUADA: APORTE TERICO-METODOLGICO

    A prtica docente implica certa sabedoria que vai se constituindo na gente, medida que a gente vai constituindo a experincia de ensinar e de aprender (FREIRE, 2004, p. 146).

    O modelo de cincia que predominou nos sculos XIX e XX foi a da razo absoluta, fechada e auto-suficiente (MORIN, 2005). De acordo com essa razo, a concepo de educao pauta-se na individualidade, no predomnio do saber cientfico, verdadeiro, rigoroso e metdico. A cincia no aceita um conhecimento que no esteja justificado pelos fundamentos da razo.

    Essa compreenso de conhecimento est relacionada ao paradigma da cincia moderna, que nega o carter racional a todas as formas de conhecimento que no se pautarem pelos seus princpios epistemolgicos e pelas suas regras metodolgicas (SANTOS, 2006, p. 21).

    Nesse paradigma, a escola compreendida como o espao privilegiado do saber cientfico, verdadeiro e inquestionvel. A escola dentro desse paradigma o local onde se aprende a cultura dominante, que qualifica para o mercado de trabalho e atua conforme as leis do capital.

    Sob o enfoque da cincia moderna, o professor compreendido pela tica produtivista e capitalista e tem como objetivo ser transmissor (a) do saber cientfico e atuar sob a gide do sistema. Conforme Mizukami et al. (2003, p. 11), a formao de professores vista pela tica da racionalidade tcnica, como aplicao de regras advindas de teorias e da tcnica prtica pedaggica.

    Em nvel nacional e internacional, a formao de professores constitui, no contexto atual, uma das temticas que mais atrai pesquisadores. Em eventos, como congressos, simpsios, encontros e seminrios, o maior nmero de trabalhos escritos e aprovados concentra-se no GT de formao de professores, conforme se evidencia nos anais de 2005 e 2007 do Encontro de Pesquisa do Norte e Nordeste - EPENN.

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    A inteno no , somente, mostrar nmeros, mas evidenciar que o GT de formao de professores est entre os que mais realiza pesquisas e, conseqentemente, produzem. Esse crescimento nas produes do campo em questo reflete o quanto a referida temtica, luz de questes, como condies de trabalho dos professores, prtica educativa, qualidade da formao, fundamentao terica, profissionalizao, autonomia, entre outras, tem sido amplamente problematizada.

    Uma pesquisa realizada por Brzezinski et al. (2006) aponta o crescimento das pesquisas sobre formao do professores no Brasil. No perodo de 1997 a 2002, foi realizada uma pesquisa sobre a Formao de Profissionais da Educao por meio da Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao (ANPEd), com a finalidade de mapear as teses e dissertaes dos 50 programas de ps-graduao do Brasil e identificar as temticas mais pesquisadas pelos discentes de tais programas.

    Entre os resultados da pesquisa, identificou-se que do total de 8.085 dissertaes e teses, defendidas nos 50 Programas de Ps-Graduao de Educao credenciados pela Capes, 1.769 tratam do tema Formao de Profissionais da Educao. Desse total de trabalhos, foram selecionadas como amostra 742 dissertaes e teses. Das 742, a categoria Trabalho Docente foi a mais investigada, com uma produo de 268 (36%) trabalhos, seguida pela Formao Inicial, com 165 (22%) e, na seqncia, a categoria Formao Continuada, com 115 (15%) trabalhos (BRZEZINSKI, 2006). De acordo com a autora, a categoria Formao Continuada, no perodo de 1997 a 2002, deu um salto quantitativo, ao superar as 36 pesquisas realizadas sobre a mesma temtica nos anos de 1990 a 1996.

    As vrias razes para pesquisar esse tema, conforme aludi esto relacionadas emergncia de consolidar uma prtica educativa com qualidade e mudar os indicadores que apontam para um Brasil com um ensino de baixa qualidade, conforme indicadores apresentados pelo Instituto Nacional Ansio Teixeira sobre a situao do Brasil no ndice qualidade do ensino. O Pas aparece em 87 lugar, um dos piores desempenhos, ressalta o documento. Entre os 16 pases da Amrica Latina, o Brasil em relao qualidade do ensino est em 10 lugar no ranking (BRASIL, 2005, p. 33).

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    No tocante s discusses sobre a problemtica da formao dos professores (as), alerto que discuto de forma tangencial as questes mais gerais que esto correlacionadas a ela, como, por exemplo, as polticas pblicas.

    Para Neto e Maciel (2004), as polticas pblicas para formao de professores no Brasil, que vm sendo implementadas desde a dcada de 1980, representam as aes de um projeto hegemnico neoliberal, que, em nome do jargo qualidade total, prope medidas simplistas, aligeiradas e imediatistas para a formao de professores, que se vem obrigados a se qualificar, pelo fato de o Estado estar oferecendo facilidades para essa qualificao.

    O termo qualidade total da educao foi formulado na dcada de 1980 nos Estados Unidos e na Gr-Bretnia, incorporado, posteriormente, s polticas educacionais brasileiras, as quais foram formuladas a partir das perspectivas neoliberais para a educao escolar, que pensada como uma empresa produtiva, ou seja, o que h uma viso mercadolgica da educao. O ethos da qualidade total produz, de maneira pedaggica, o indivduo econmico, pressuposto do modelo de mercado (NETO, MACIEL, 2004, p. 53).

    De acordo com esses autores, a maioria das formaes dos professores tem sido desenvolvida de acordo com essa lgica de mercado. uma formao para atender os anseios de uma sociedade em desenvolvimento e de consumo. Em face disso, a formao oferecida aos professores tem por base a tcnica, ser instrumental e descontextualizada.

    Neto e Maciel (2004) contestam as formaes que se configuram como aligeiradas, simplistas, fragmentadas. necessrio compreend-las como um investimento pessoal, profissional, institucional, poltico, pblico, social e econmico. Acrescento mais, precisam, sobretudo, serem compreendidas dentro de uma dimenso de formao humana, esttica e tica.

    Essa formao de professores, para atuar na sociedade capitalista, tem sido questionada em virtude de sua limitao tcnica. So necessrios professores preparados para atuar na sociedade contempornea globalizada e resolver os problemas concernentes a ela. Isso ser possvel se a formao estiver pautada na articulao entre o conhecimento, a pesquisa e a prtica, para proporcionar condies necessrias formao e ao desenvolvimento da educao nacional (NETO, MACIEL, 2004). Surgem com esse fim as iniciativas de formaes contnuas que sero problematizadas ao longo desta seo.

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    No que concerne formao continuada, parto das teorizaes do termo e seus desdobramentos enquanto uma poltica que visa qualidade da educao por meio de um processo contnuo de formaes que precisa contribuir de maneira eficiente para equacionar as dificuldades que os professores enfrentam no seu cotidiano escolar e efetivar uma prtica educativa com qualidade.

    Segundo Filho (2003), em seus escritos sobre a memria da formao continuada, as iniciativas desse tipo de formao tm sua origem no final dos anos 1960, quando o Estado de So Paulo, em convnio com o MEC/Prontel, a Secretaria de Educao de So Paulo, e a Fundao Padre Anchieta -TV2 Cultura, levou ao ar o primeiro programa de aperfeioamento de professores que utilizava um sistema de multimeios. A idia era melhorar a qualidade do ensino por meio da combinao da mdia televisiva e a mdia impressa.

    O objetivo dessa programao era oferecer ao maior nmero de educadores a oportunidade de participar de um processo de atualizao pedaggica. Entretanto, a programao no estava isenta de crticas. A principal crtica foi em relao ao distanciamento entre a programao e os reais problemas que os educadores estavam enfrentando no dia-a-dia da escola.

    Isso mostra que a primeira iniciativa de formao continuada, segundo Filho (2003), para melhorar a qualidade da educao, j inicia distante dos professores e de suas necessidades educacionais.

    Penso que, para comear caminhando rumo ao acerto, o primeiro passo de um projeto de formao continuada fazer um mapeamento dos problemas tericos e metodolgicos enfrentados pelos professores no cotidiano escolar, para ento se efetivar. Se um programa de formao continuada no atende aos anseios, aos problemas pedaggicos vivenciados pelos professores na prtica educativa, a tendncia fracassar. Isso no significa dizer que a formao continuada deve ser vista como a soluo de todos os problemas enfrentados pelos professores, mas que seja um processo que venha somar com os conhecimentos j vivenciados e construdos na formao inicial, cotidiana, social e cultural dos sujeitos.

    A formao continuada, enquanto um tema novo que, aos poucos, ascende e cresce, tem atrado vrios pesquisadores que se lanam a pesquisar sobre o tema na tentativa de compreender melhor o que designa o termo e quais seus reais objetivos, para produzir outra maneira de formar os professores e ampliar os referenciais nesse campo.

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    Conforme j evidenciei anteriormente, a formao continuada uma tendncia e constitui-se fundamental para a prtica educativa. Nunes (2000, p. 43) tambm enveredou por essa temtica na sua tese e assevera que um dos motivos pelos quais se investe na formao contnua, est relacionada prtica dos professores, isto :

    necessidade urgente de transformar a prtica pedaggica do professor face s diversas crticas que este recebe quanto qualidade de seu trabalho e ineficincia em resolver determinados problemas pedaggicos que enfrenta no processo educativo.

    Nesse sentido, a urgncia de transformao da prtica dos professores relaciona-se s crticas que sofrem quanto qualidade do seu trabalho educativo e que o parmetro para investir na formao continuada a existncia de uma prtica caracterizada por uma experincia profissional problemtica e conflituosa, que precisa ser revista e redimensionada na direo de estabelecer um ensino de qualidade.

    Nunes, assim como Nvoa (1991), Marin (2004), Candau (1996), tambm destaca em seus estudos a importncia da formao continuada. O discurso o mesmo. Formao continuada para reparar a formao terico-metodolgica dos professores, com a finalidade de melhorar a prtica educativa, porm, cada um desses autores apresenta suas contribuies, que esto situadas no campo terico e prtico, para tentar superar os problemas relacionados a formao continuada.

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    2.1. As Concepes de formao continuada

    A urgncia de melhorar a prtica educativa dos professores e, conseqentemente, a qualidade do ensino leva o MEC e as Secretarias Estaduais e Municipais de Educao a pensar processos de formao continuada para os professores com magistrio, ensino mdio ou, ainda, para aqueles que no tiveram uma formao inicial superior adequada, com consistncia terica e metodolgica para o exerccio da docncia.

    No contexto do desenvolvimento dessas formaes, emerge uma questo importante e que tem requerido ampla discusso por parte dos que enveredam por ela, que apontar os referenciais dessa formao.

    Autores, como Nunes (2004) e Arouca (1996), afirmam que a formao continuada de professores emerge e se desenvolve assentada no referencial da educao permanente.

    Para Furter (1987, p. 136-137), a educao permanente :

    Uma concepo dialtica da educao, como um duplo processo de aprofundamento, tanto da experincia pessoal quanto da vida social global, que se traduz pela participao efetiva, ativa e responsvel de cada sujeito envolvido, qualquer que seja a etapa da existncia que esteja vivendo.

    Arouca diz que a educao permanente se define como um processo ininterrupto que se d por meio da experincia pessoal e coletiva traduzindo-se pelos atos educativos vivenciados no cotidiano, conforme expresso no trecho abaixo:

    A educao permanente um processo ininterrupto de aprofundamento tanto da experincia pessoal como da vida coletiva, que se traduz pela dimenso educativa que cada ato, cada gesto, cada funo, qualquer que seja a situao em que nos encontramos, qualquer que seja a etapa da existncia que estejamos vivendo (1996, p. 69).

    Freire tambm tratou a formao permanente do professor como prioridade e estabeleceu, durante sua administrao na Secretaria de Educao de So Paulo, seis princpios bsicos para o programa de formao permanente dos professores, que so descritos a seguir:

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    O educador o sujeito da sua prtica, cumprindo a ele cri-la e recri-la; A formao do educador deve instrumentaliz-lo para que ele crie e recrie a sua prtica atravs da reflexo sobre o seu cotidiano; A formao do educador deve ser constante, sistematizada, porque a prtica se faz e se refaz; A prtica pedaggica requer a compreenso da prpria gnese do conhecimento, ou seja, de como se d o processo de conhecer; O programa de formao de educadores condio para o processo de reorientao curricular da escola; O programa de formao de educadores ter como eixos bsicos: A fisionomia da escola que se quer, enquanto horizonte da nova proposta pedaggica; A necessidade de suprir elementos de formao bsica aos educadores nas diferentes reas de conhecimento humano; A apropriao, pelos educadores, dos avanos cientficos do conhecimento humano que possam contribuir para a qualidade da escola que se quer (2006, p. 80).

    A compreenso desses autores, acerca da formao permanente do professor, aponta para a idia de uma educao global e intensa que ocorre durante toda a trajetria de vida, sem interrupo e considera as experincias pessoais e sociais do ser humano. um processo continuum e sistematizado que visa ao amadurecimento da prtica educativa na medida em que o professor, ao refletir sobre sua ao a faz e refaz mais consciente, visando formao de educandos conscientes e crticos. A formao permanente se far por meio, preponderantemente, da reflexo critica sobre a prtica (FREIRE, 2006, p. 39).

    Entretanto, na literatura do campo da formao continuada, evidencia-se que essa compreendida, pela maioria, como reciclagem dos professores, sendo, portanto, oposta idia de formao postulada pela educao permanente.

    A idia de uma formao como reciclagem refletiu em um movimento de resistncia por parte de vrios professores e pesquisadores, entre os quais destaco Candau (1994), Marin (2004), Nunes (2000), visto que o termo reciclar significa, conforme Candau (2004, p. 141), refazer o ciclo, voltar e atualizar a formao recebida, ou seja, no h uma continuidade na formao dos professores.

    Candau (2004) ressalta que esses processos de reciclagem dos professores sempre foram feitos por meio de cursos, seminrios, simpsios, congressos, encontros presenciais e a distncia, em um dado perodo de tempo, promovidos pelas Secretarias de Educao ou em convnio com as Universidades, tendo como lcus de realizao as prprias Universidades. No dizer da autora, essa uma perspectiva clssica de formao continuada de professores, que tambm destacada por Nunes (2004), ao reconhecer que as nomenclaturas, historicamente,

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    foram denominadas de: Reciclagem, treino, aperfeioamento e capacitao. Essa formao na viso da autora apresentada de forma desarticulada:

    No conjunto das nomenclaturas - reciclagem, treinamento, aperfeioamento, capacitao, as linhas de aes centram-se, predominantemente, na oferta de cursos cuja programao, realizao e avaliao j nos revelava a ineficincia de seus resultados, pois ficavam restritos ao oferecimento de catlogos de cursos trabalhados de forma isolada, fragmentados, de curta durao, espordicos e por isso, sem continuidade, desvinculados das reais necessidades formativas dos professores, propostos quase sempre pelas equipes de tcnicos e de gerncia acadmica, ao que parece, longe de constiturem-se em projetos articulados de formao contnua de professores(NUNES, 2000 p. 55).

    Nessa perspectiva, a idia de formao continuada est distante dos referenciais da educao permanente, visto que essa compreende um processo de formao total do ser humano que se d em um continuum e se alarga por toda a vida.

    Ao abordar a educao permanente para construir uma definio, Furter (1987) procura desconstruir as imagens, as concepes equivocadas que historicamente foram atribudas em torno desse tipo de educao. A definio da educao permanente, a partir da idia de educao extra-escolar, educao complementar, educao destinada aos Jovens e adultos e educao popular, na viso do autor incoerente e confusa e no expressa a idia de educao permanente.

    Esse tipo de educao, segundo Furter (1987, p. 137), pode ser compreendida a partir de trs pontos fundamentais:

    1 qualquer atividade humana, qualquer aspecto da prxis, presta-se a uma formao; 2 a educao uma atividade de um sujeito e no um conjunto de instituies; 3 a educao sumamente ligada a nossa maneira de viver o tempo e os tempos: consiste em aprender como organizar a sua vida no tempo, seja qual for idade cronolgica de algum.

    Isso significa que a educao permanente no reduzida a momentos da vida humana. Ela assume carter formativo porque se processa em todas as atividades desenvolvidas pelo ser humano no seu cotidiano social e cultural. A

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    educao permanente ser, portanto, a maneira de se preocupar pedagogicamente com a vida cultural de uma nao (FURTER, 1987).

    A partir dessa compreenso, possvel inferir que a formao continuada no comunga dos referenciais da educao permanente, visto que a primeira, conforme as pesquisas da rea, se consolida de maneira desarticulada, momentnea e por meio de processos pontuais.

    Em oposio concepo clssica de formao continuada, Candau (2004) tece algumas consideraes, entre elas, o deslocamento da formao continuada da universidade para a escola.

    No espao escolar, o professor descobre, apreende, desaprende, reestrutura o conhecimento e, portanto, se forma; alm disso, h o reconhecimento das diferenas profissionais existentes entre os professores participantes das formaes e o reconhecimento e valorizao do saber docente, entendido como plural, porque constitudo dos saberes profissionais, curriculares e dos saberes da experincia.

    Assim, como Candau (2004), concordo que importante a mudana de lcus da formao, que antes era feita exclusivamente na universidade, para a escola, por consider-la espao riqussimo de formao, como tambm imprescindvel para o reconhecimento dos saberes dos professores.

    Porm, ressalto que, entre esses saberes, ns formadores temos que valorizar os saberes da experincia, os saberes culturais cotidianos dos professores que esto no processo formativo. Saberes esses que de maneira geral so ignorados nas formaes continuadas, ao se valorizar mais os saberes cientficos, os saberes profissionais, disciplinares e curriculares (TARDIF, 2002).

    A formao continuada vem se configurando como:

    Predominantemente em eventos pontuais - cursos, seminrios, oficinas, palestras, que de modo geral, no respondem s necessidades pedaggicas mais imediatas dos professores e nem sempre se constituem num programa articulado e planejado como tal (BRASIL, 1999, p.41).

    Esse tem sido o modelo de formao continuada mais comum, a realizao de cursos e palestras pontuais para dar uma resposta, para dizer que esto sendo feitas, mas que, na realidade, no se coadunam com as reais necessidades dos professores.

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    Gentili (1999, p. 34) tambm se posiciona em relao a esse modelo de formao que na sua viso se caracteriza como pacotes de treinamento:

    No contexto dos processos de modernizao conservadora, as polticas de formao de docentes vo se configurando como pacotes fechados de treinamento(definidos sempre por equipes de tcnicos, experts e at consultores de empresas) planejadas de forma centralizada, sem participao dos grupos de professores envolvidos no processo de formao, e apresentando uma alta transferibilidade(ou seja, com grande potencial para serem aplicados em diferentes contextos geogrficos e com diferentes populaes).

    contra esse modelo de formao continuada pontual, fragmentada, descontextualizada, que, historicamente, est estruturado e idealizado no imaginrio das pessoas que me posiciono, com a inteno de apontar parmetros para redefini-la de modo que possa proporcionar mudanas significativas nas prticas educativas dos professores e na aprendizagem dos educandos jovens e adultos, visto ser esse um dos objetivos da formao continuada.

    Ao contrrio da compreenso de formao continuada apresentada anteriormente, Nvoa (1991, p. 30), em seus escritos, apresenta outra compreenso de formao continuada:

    A formao continuada deve alicerar-se em uma reflexo na prtica e sobre a prtica, atravs de dinmicas de investigao-ao e de investigao-formao, valorizando os saberes de que os professores so portadores.

    Essa idia de refletir sobre a prtica a partir da prpria prtica tambm foi discutida por Freire (2006), ao falar que o momento principal da formao dos professores o da reflexo crtica sobre a prtica:

    pensando criticamente a prtica de hoje ou de ontem que se pode melhorar a prxima prtica. O prprio discurso terico, necessrio a reflexo crtica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prtica (FREIRE, 2006, p.39).

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    Moita (1995, p. 115) evidencia a formao por meio das interaes em um processo de vida, conforme observo no excerto:

    Ningum se forma no vazio. Formar-se supe troca de experincia, interaes sociais, aprendizagens, um sem fim de relaes. Um percurso de vida assim um percurso de formao, no sentido de que um processo de formao.

    Por meio da concepo de Moita, entendo a formao para alm das concepes que lhes so atribudas, conforme j foi verificado anteriormente. A formao um continuum na vida do ser humano e ocorre em diversos momentos da vida por meio das interaes e da socializao de experincias.

    Para Ghedin (2003, p. 398): preciso pensar a formao de professores (as) na perspectiva de um projeto de formao cultural, o qual permitir aos professores, na sua prtica educativa, condies de resolver os desafios da sociedade, podendo intervir nela a partir de um conjunto de valores filosficos, epistemolgicos, antropolgicos, polticos, ticos e estticos, oferecendo uma viso de mundo, de sociedade e de homem/mulher que permita retomar a dimenso da utopia no modo como somos e fazemos a educao no presente.

    Creio que essa a perspectiva de formao continuada que precisa ser defendida nos discursos e aes. Isso se h o desejo de avanar na formao dos professores, caso contrrio, eles continuaro sendo vistos pela tica do tecnlogo do ensino, conforme Vieira (2002, p. 73): a formao do professor est reduzida ao exerccio tcnico-profissional, reduzindo-se a uma formao pragmtica, simplista e prescritiva.

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    2.2 A formao continuada de professores da Educao de Jovens e Adultos

    No campo da educao de jovens e adultos7, a formao continuada voltada para os professores tem se caracterizado como uma iniciativa em expanso. O Governo, as Secretarias de Educao Estaduais e Municipais, as Universidades, entre outros, tm colocado a formao contnua como uma ao prioritria, no mbito das polticas de incentivo formao do professor da EJA. Mas, por que tanto interesse com a formao continuada para os professores da EJA? Penso que uma das respostas est relacionada com a prpria trajetria da educao de jovens e adultos que luta para se configurar e adquirir status de educao. Busca desconstruir os preconceitos que historicamente foram atribudos a ela, muitas vezes, definida como um tipo de educao no-formal, extra-escolar, educao que no (FURTER, 1994), como se no formasse o indivduo. Outra resposta para essa pergunta est relacionada, tambm, com a necessidade de construir uma educao para jovens, adultos e idosos partindo do seu lugar, das suas marcas culturais, das suas especificidades, das identidades, das realidades socioculturais em que esto inseridos, posto que, em muitos casos a educao direcionada para estes sujeitos no uma educao que os valoriza a partir de suas marcas culturais, mas uma educao que parte de outras culturas, de outros lugares, reforando assim a excluso de jovens, adultos e idosos do sistema educacional.

    Beisiegel (1982) destaca que, no Brasil, a educao de jovens e adultos traz, na construo da sua histria, para se consolidar como tal, as marcas do descaso educacional, social, econmico, poltico e cultural. A EJA h muitos anos vem lutando para se configurar como uma educao que merece, sobretudo, ser respeitada e que possui especificidades, as quais so determinantes para pensar uma educao comprometida com esses sujeitos.

    A maneira como a EJA, ao longo da sua trajetria, foi pensada traz tambm uma idia do perfil do professor dessa modalidade, que, no geral, a idia de que no necessria muita instruo para ensinar essas pessoas. Soares (2006, p. 287) alerta para a importncia de estender a formao do educador da EJA para

    7So na maioria sujeitos trabalhadores das classes populares. Homens e mulheres, trabalhadores (as) empregados (as) e desempregados (as); filhos, pais e mes; moradores urbanos de periferias, de favelas e vilas. Campesinos, ribeirinhos, pescadores. Sujeitos sociais e culturais, marginalizados das esferas socioeconmicas e educacionais, privados do acesso cultura letrada e aos bens culturais e sociais.

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    alm dos cursos de pedagogia, com o objetivo de evitar os comentrios: qualquer um que saiba ler pode alfabetizar, caracterizando essa como uma educao sem valor que, portanto, no precisa de pessoas com formao acadmica, com formao especfica para tal fim.

    Para desconstruir essas compreenses, faz-se necessria a reflexo sobre o perfil do (a) professor/educador (a) da EJA. Gadotti (2007, p. 32) prope essa reflexo quando levanta a questo: Quem o (a) educador/professor (a) de jovens e adultos?

    O educador do prprio meio facilita a educao de jovens e adultos. Contudo, nem sempre isso possvel. preciso formar educadores provenientes de outros meios no apenas geogrficos, mas tambm sociais. Todavia, no mnimo, esses educadores precisam respeitar as condies culturais do jovem e do adulto analfabeto. Eles precisam fazer o diagnstico histrico-econmico do grupo ou comunidade onde iro trabalhar e estabelecer um canal de comunicao entre o saber tcnico (erudito) e o saber popular.

    O (a) professor/educador(a) de jovens e adultos precisa assumir uma postura de educador(a) popular, que, como tal, um animador cultural, articulador, orientador, sensvel, dialgico, flexvel, solidrio, amoroso, tico, poltico, ou seja, um educador freireano.

    Para a Cmara de Educao Bsica, das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao de Jovens e Adultos, essa formao precisa contemplar alm das exigncias formativas de cunho terico-metodolgico, que imprescindvel a qualquer professor, a complexidade dessa modalidade:

    O preparo de um docente voltado para a EJA deve incluir, alm das exigncias formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas complexidade diferencial desta modalidade de ensino. Assim esse profissional do magistrio deve estar preparado para interagir empaticamente com esta parcela de estudantes e de estabelecer o exerccio do dilogo. Jamais um professor aligeirado ou motivado apenas pela boa vontade ou por um voluntariado idealista e sim um docente que se nutra do geral e tambm das especificidades que a habilitao como formao sistemtica requer (PARECER n: 11/2000, p. 58).

    Historicamente, o professor da EJA, hoje com algumas excees, tem apenas o ensino fundamental e o ensino mdio. Essa uma realidade mais presente no

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    campo do que nas grandes cidades que esto, paulatinamente, procurando resolver a questo e apresentar um novo perfil do professor de jovens e adultos.

    possvel visualizar pequenas mudanas nessa rea, basta observar as vrias iniciativas que surgem em espaos diversos como, por exemplo, as universidades, que por meio dos Ncleos e Grupos de Educao Popular8, esto ampliando as discusses nesse campo, no que concerne s questes de cunho terico e metodolgico na busca de reconfigurar a Educao de Jovens e Adultos.

    Os eventos em educao, como o EPENN, so outros espaos que oportunizam a socializao de pesquisas e debates. O GT Educao de Jovens e Adultos do EPENN em 2005, por exemplo, contou com 30 trabalhos apresentados e, em 2007 foram 64. Esses nmeros evidenciam o crescimento das produes nos ltimos anos e demarcam a EJA avanando nas pesquisas e discusses. Todas essas iniciativas buscam a reconficurao da EJA, evitando assim continuar sendo tachada como um lote vago, terra sem dono, onde tudo se pode e em que qualquer um pe a mo (ARROYO, 2004).

    Embora Arroyo (2005) afirme que educao de jovens e adultos um campo ainda no consolidado nas reas de pesquisas, formaes, polticas pblicas e diretrizes educacionais, vejo por meio desses vrios espaos uma somatria de possibilidades de fazer esse campo evoluir nos aspectos tericos e metodolgicos e, assim, se consolidar como uma rea que precisa, sobretudo, ser reconhecida e tratada com respeito. Alm do reconhecimento de que os sujeitos jovens e adultos envolvidos so pessoas importantes, de potencialidades, mas com vrias especificidades e limitaes, que vo desde as questes educacionais s questes de sade. Portanto, os professores para assumir a EJA precisam de uma formao, ao mesmo tempo, geral e especfica.

    Em face dessas questes, iniciativas de formao continuada, tanto em nvel nacional como local, tm surgido com propsitos bastante comuns para esse campo. A poltica de formao continuada, entre outros objetivos, preocupa-se com o perfil do professor da EJA. Passar de um professor de educao bsica com pouca instruo para um professor com educao superior e muitos conhecimentos terico-

    8 Entre os Ncleos de Educao Popular que tematizam a educao de jovens e adultos e trabalham a

    formao dos professores destaco, o Ncleo de Educao Popular Paulo Freire-NEP, localizado no Centro de Cincias Sociais e Educao da Universidade do Estado do Par; O Ncleo de Educao de Jovens e Adultos NEJA da Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG; O Servio de Educao de Jovens e Adultos SEJA de Porto alegre; O Ncleo de Educao de Jovens e Adultos e formao de professores da Faculdade de Educao de So Paulo NEA.

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    metodolgico ou de um professor que no consegue na prtica fazer uso dos conhecimentos tericos para um professor que saiba na prtica relacionar teoria e prtica constitui objetivos dos processos formativos contnuos.

    Entre os programas de formao continuada voltados para a EJA, destaco o Ncleo de Educao de Jovens e Adultos - NEJA da Universidade Federal de Minas Gerais que trabalha com a pesquisa e a formao de professores (as) e seus objetivos giram em torno da articulao das diversas iniciativas de formao de educadores de Jovens e Adultos na UF