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CENTRO DE SAÚDE E TECNOLOGIA RURAL
CAMPUS DE PATOS – PB
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA
JOSÉ RÔMULO SOARES DOS SANTOS
MALFORMAÇÕES EM PEQUENOS RUMINANTES
PATOS-PB
2012
JOSÉ RÔMULO SOARES DOS SANTOS
MALFORMAÇÕES EM PEQUENOS RUMINANTES
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Medicina Veterinária da Universidade Federal
de Campina Grande como requisito parcial para a
obtenção do título de Doutor em Medicina
Veterinária.
Orientador: Prof. Dr. Franklin Riet-Correa
PATOS-PB
2012
FICHA CATALOGADA NA BIBLIOTECA SETORIAL DO
CSTR / UFCG - CAMPUS DE PATOS – PB de acordo com a AACR2
S237c Santos, José Rômulo Soares dos 2012
Malformações em pequenos ruminantes /José Rômulo Soares dos Santos – Patos - PB: CSTR, UPGMV, 2012.
54f. Inclui bibliografia
Orientador: Franklin Riet-Correa Tese (Doutorado em Medicina Veterinária – Centro de Saúde e
Tecnologia Rural, Universidade Federal de Campina Grande).
1 – Malformações. 2 – Mutação genética. 3 - Plantas tóxicas. 4 – Pequenos ruminantes. I - Título
CDU: 615.9:619
JOSÉ RÔMULO SOARES DOS SANTOS
MALFORMAÇÕES EM PEQUENOS RUMINANTES
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Medicina Veterinária da Universidade Federal
de Campina Grande como requisito parcial para a
obtenção do título de Doutor em Medicina
Veterinária.
Aprovada em 20/12/2012
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Franklin Riet-Correa - Orientador
Universidade Federal de Campina Grande – Campus de Patos-PB
Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária
Prof. Dr. Suedney de Lima Silva
Universidade Federal da Paraíba – Faculdade de Veterinária – Areia-PB
Prof. Dr. Fabio de Souza Mendonça
Universidade Federal Rural de Pernambuco
Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal
Prof. Dr. Gildenor Xavier Medeiros
Universidade Federal de Campina Grande – Campus de Patos-PB
Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária
Prof. Dr. Eldinê Gomes de Miranda Neto
Universidade Federal de Campina Grande – Campus de Patos-PB
Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária
“DedicoestetrabalhoaoprofessorFranklinRietCorreaAmaralporsemearnosemiáridosertanejoparaibanoasementedabuscapelo
conhecimento,equeelabroteefloresçaentreascactáceasparaobemmaiorqueéasaúdeanimaleaconsolidaçãodaMedicinaVeterinária.”
AGRADECIMENTOS
Aos animais fonte de estudo e figuras que devem ser zeladas pelos seres humanos,
principalmente pelos médicos veterinários.
A Lucas e Rafaela, anjos amados eternos na minha vida, o meu pedido de perdão por
todos esses 8 anos em pós graduação e de tempo que deixei de me dedicar melhor a vocês.
A minha querida Ariana, um anjo que me fez enxergar coisas simples e importantes
que poucos dão importância.
Minha eterna gratidão e desculpas pelos transtornos ao grande amigo Flávio, que foi
essencial na execução deste trabalho.
Aos Guerreiros Flávio, Sara, Almir e Eldinê, por não medirem esforços na dedicação
com o cotidiano do Hospital Veterinário. Gostaria que houvesse mais pessoas tão
comprometidas quanto vocês. A Sara, especialmente, pela forma única e idônea de pensar na
saúde dos Ruminantes.
Ao professor Gil, exemplo de educador, que me fez enxergar que a educação está além
de transmitir conhecimento e elaborar e corrigir provas.
Ao professor Danilo, em nome do qual agradeço a UAMV e o Governo Federal, pela
liberação e pelo estimulo na realização desse sonho.
Aos amigos inesquecíveis que fiz no doutorado Fabrício, Luciano, Diego, Allan,
Glauco, Eduardo, Lisanka, Talita e Luiza, meu respeito e minha consideração.
A Nevinha e Dal, grandes amigos, em nome dos quais agradeço a todos os
funcionários.
A Marta, Bela e Jade, graduandas da Medicina Veterinária, e grandes amigas.
Enfim, a todos MUITO OBRIGADO!
RESUMO
Esta tese inclui uma revisão de literatura e dois artigos. O primeiro capítulo é uma revisão que
abrange princípios gerais da teratologia, a epidemiologia, o diagnóstico, a clínica e a patologia
das malformações em pequenos ruminantes. No artigo que corresponde ao segundo capítulo,
foi estudado a teratogenicidade de Mimosa tenuiflora. Quinze ovelhas, distribuídas em dois
grupos foram introduzidas em área invadida pela planta. O Grupo 1, com seis ovelhas
prenhes, foi introduzido na área experimental 20 dias após o acasalamento. O Grupo 2,
formado por nove ovelhas não prenhes e um carneiro, foi introduzido na área experimental no
início do experimento. A cada 15 dias eram realizados exames ultrassonográficos para
acompanhamento da gestação. No Grupo 1, três ovelhas abortaram, cada uma um feto sem
malformações. Outra ovelha pariu dois cordeiros, um com hiperflexão na articulação inter-
falangeana proximal no membro torácico direito e outro sem malformações. Outra ovelha
pariu um cordeiro com hiperflexão dos dois membros pélvicos na região da articulação tarso-
metatársica. No grupo 2, uma ovelha abortou um feto sem malformações e cinco pariram
cordeiros normais. Três das ovelhas desse grupo não emprenharam durante todo o período
experimental, mostrando retornos repetidos ao cio, sugerindo perda embrionária. Concluiu-se
que M. tenuiflora, além de causar malformações causa, também, mortalidade embrionária e
abortos em ovelhas. No terceiro capitulo, o artigo relata os achados clínicos e patológicos de
um caprino com lisencefalia e hipoplasia cerebelar. No exame físico, esse caprino de 30 dias,
apresentava incoordenação e incapacidade de ficar em pé, decúbito esternal permanente,
ataxia, ausência do reflexo de ameaça, tremores de intenção e nistagmo. Após 11 dias de
internamento o caprino foi eutanasiado e necropsiado. Na necropsia, o cérebro não
apresentava giros e sulcos e o cerebelo estava reduzido de tamanho. Histologicamente, em
todo o córtex cerebral, a substância cinzenta estava mais espessa e a substância branca mais
fina que o normal. Os neurônios estavam distribuídos de forma aleatória na substância
cinzenta. No cerebelo, as camadas estavam desorganizadas, com localização heterotópica das
células. Os achados macroscópicos e histológicos são característicos de lisencefalia e
hipoplasia cerebelar. Lisencefalia é uma doença rara na medicina veterinária e não tinha sido
descrita em caprinos.
Palavras-chave: aborto, malformações congênitas, mortalidade embrionária, mutações
gênicas, plantas tóxicas, teratógenos.
ABSTRACT
This thesis includes a review and two papers. The first chapter is a review about general
principles of teratology and epidemiology, diagnosis, clinical signs and pathology of
malformations in small ruminants. The second chapter is a paper that studied the
teratogenicity of Mimosa tenuiflora. Fifteen sheep, divided into two groups, were introduced
into an area invaded by the plant. Group 1 consisted of six pregnant ewes that were introduced
into the experimental area 20 days after mating. Group 2 consisted of nine non pregnant sheep
and a ram introduced into the area at the start of the experiment. Every 15 days each sheep
was examined by ultrasound to control pregnancy. In Group 1, three sheep aborted single
fetuses without malformations. One sheep delivered two lambs, one with hyperflexion of the
proximal inter-phalangeal joint of the right forelimb and another without malformations.
Another sheep delivered a lamb with a hyperflexion of both hindlimbs in the region of the
tarsal-metatarsal joint. Only one sheep delivered a normal lamb. In Group 2, one sheep
aborted a fetus without malformations and five delivered normal lambs. Three sheep of this
group returned to estrus repeatedly and did not get pregnant during the mating period,
suggesting embryonic loss. It is concluded that M. tenuiflora cause malformations, embryonic
mortality and abortion in sheep. In the third chapter, the paper relates a case of lissencephaly
and cerebellar hypoplasia in a goat. The goat presented sternal recumbence, absent menace
response, intention tremors, ataxia, and nystagmus. It was euthanized and necropsied after
been hospitalized during eleven days. At necropsy, the surface of the brain was smooth,
cerebral sulci and gyri were absent, and the cerebellum was reduced in size. Histologically, in
all cerebral cortex, the grey matter was thicker and the white matter was thinner than normal.
The neurons were arranged randomly in the grey matter. In the cerebellum, the layers were
disorganized and there was heterotopy of the cells. The histologic and gross lesions are
characteristic of lissencephaly associated with cerebellar hypoplasia. Lissencephaly is a rare
disease in veterinary medicine and had not been reported previously in goats.
Keywords: Abortions, congenital malformations, embryonic mortality, genic mutations,
poisonous plants, teratogens.
LISTA DE FIGURAS
CAPÍTULO II
Figura 1. Cordeiro mostrando hiperflexão na articulação inter-falangeana proximal
no membro torácico direito, na intoxicação por Mimosa tenuiflora...........................
41
Figura 2. Cordeiro mostrando hiperflexão dos membros pélvicos na região da
articulação tarso-metatársica, na intoxicação por Mimosa tenuiflora.........................
42
CAPÍTULO III
Figura 1. Caprino com lisencefalia e hipoplasia cerebelar. (A) Vista dorsal
mostrando ausência de giros e sulcos na superfície telencefálica e hipoplasia
cerebelar. (B) Corte transversal. A substância cinzenta está mais espessa que o
normal (paquigiria) e a substância branca mais fina. A substância branca não se
invagina na substância cinzenta. (C) Cerebelo mostrando disgênese cortical
caracterizada por ninhos de neurônios granulares com raras células de Purkinje na
periferia da substância branca (H-E, 10x). (D) Córtex frontal. Uma desorganização
dos neurônios corticais é observada na substância cinzenta. Os neurônios estão
distribuídos aleatoriamente da camada molecular superficial até a camada cortical
mais profunda, sem padrão de organização laminar (H-E, 10x).................................
50
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 09
Referências............................................................................................................. 10
CAPÍTULO I – Malformações em pequenos ruminantes – Revisão de Literatura 11
Abstract.................................................................................................................... 12
Resumo..................................................................................................................... 13
1.Introdução.................................................................................................................. 13
2.Princípios da teratogenicidade e patogênese geral................................................ 14
3.Etiologia das malformações................................................................................ 17
3.1 fatores intrínsecos............................................................................................. 17
3.2 fatores extrínsecos............................................................................................. 18
4.Epidemiologia............................................................................................................ 25
5.Achados clínicos e patológicos ............................................................................... 26
6.Diagnóstico................................................................................................................ 27
7.Controle e profilaxia.................................................................................................. 28
8.Considerações finais.................................................................................................. 29
9.Referências................................................................................................................ 29
CAPÍTULO II – Malformações, abortos e mortalidade embrionária em ovinos
causada pela ingestão de Mimosa tenuiflora (Leguminosae)......................................
35
Abstract............................................................................................................... 36
Resumo................................................................................................................. 37
Introdução............................................................................................................. 38
Material e Métodos............................................................................................... 38
Resultados............................................................................................................. 40
Discussão.............................................................................................................. 41
Referências............................................................................................................ 42
CAPÍTULO III – Lisencefalia e hipoplasia cerebelar em caprino............................ 45
Abstract................................................................................................................. 46
Resumo................................................................................................................. 46
Referências............................................................................................................ 51
CONCLUSÕES............................................................................................................ 54
9
INTRODUÇÃO
A exploração de caprinos e ovinos é a principal atividade pecuária no semiárido
brasileiro e tem importância cultural e socioeconômica histórica no desenvolvimento da
região Nordeste. Os rebanhos caprino e ovino na região nordeste são expressivos,
constituindo uma população de 10.160.737 de caprinos e de 6.717.980 ovinos. Muitos
entraves existem na pecuária Nordestina: o período de estiagem; a disponibilidade de
alimentos e as doenças. Entre os problemas patológicos de pequenos ruminantes, as
malformações representam 23% das causas de mortes neonatais em cordeiros (Nóbrega Junior
et al. 2005), e 7,62% em cabritos (Medeiros et al. 2005). No Nordeste brasileiro estimam-se
perdas anuais de 273.120 cabritos e 259.582 cordeiros por malformações. Esses dados foram
estimados considerando 56% de fêmeas em idade de reprodução, uma taxa de natalidade de
1,6 para caprinos e 1,0 para ovinos e 30% de mortalidade perinatal (Riet-Correa et al. 2007).
Além da mortalidade perinatal, as anomalias congênitas estão relacionadas à perdas
embrionárias e abortos levando a dimuição da eficiência reprodutiva dos rebanhos caprino e
ovino e causando perdas econômicas importantes (Dantas et al. 2012).
Individualmente, a maioria das malformações ocorre raramente. Quando aparecem
repetidamente em um dado rebanho ou área geográfica tornam-se alvo de investigação. No
entanto, boa parte dos defeitos não é relatada e poucos são os registros de sua ocorrência. O
estudo das malformações não é simples, principalmente no que se refere ao estudo genético.
A falta de informação adequada, a inadequada descrição anátomo-patológica das
malformações, a inadequada análise genética e a falha na interpretação dos achados que
contribuem para o entendimento e associação entre os processos embriológicos, patológicos e
de natureza genética constituem deficiências com relação ao estudo dos defeitos congênitos
nos animais domésticos (Leipold et al. 1983).
Devido a essa falta de informação há dificuldade no estudo das anomalias e
determinação das possíveis causas, de forma que o diagnóstico é um desafio na prática
veterinária. São poucos os dados sobre a ocorrência de defeitos congênitos em pequenos
ruminantes no Brasil, a não ser por estudos com Mimosa tenuiflora (Pimentel et al. 2007,
Dantas et al. 2012, Santos et al. 2012) e poucos relatos de casos individuais como
perossomus elumbis em ovinos (Castro et al. 2008) e epidermólise bolhosa em caprinos
(Medeiros 2012). Para diminuir as perdas reprodutivas dos rebanhos caprino e ovino é
importante o estudo das malformações.
10
Esta tese inclui três capítulos: o primeiro é uma revisão de literatura sobre
malformações em pequenos ruminantes; o segundo é um artigo, que se intitula
“malformações, abortos e mortalidade embrionária em ovinos causada pela ingestão de
Mimosa tenuiflora (Leguminosae)”; e o terceiro é um artigo intitulado “lisencefalia e
hipoplasia cerebelar em caprino”.
REFERÊNCIAS
Castro M.B., Szabó M.P.J., Moscardini A.R.C. & Borges J.R.J. 2008. Perosomus elumbis em
um cordeiro no Brasil. Ciência Rural, Santa Maria, 38(1):262-265
Dantas A.F.M., Riet-Correa F., Medeiros R.M.T., Lopes J.R., Gardner D.R., Panter K. &
Mota R.A. 2012. Embryonic death in goats caused by the ingestion of Mimosa tenuiflora.
Toxicon 59 (5) 555-557.
Leipold, H.W.; Huston, K.; Dennis, S.M. Bovine congenital defects. Advances in Veterinary
Science and Comparative Medicine, v. 27, p. 197-271, 1983.
Medeiros J.M., Tabosa I.M., Simões S.V.D., Nóbrega Júnior J.E., Vasconcelos J.S. & Riet-
Correa F. 2005. Mortalidade perinatal em caprinos no semi-árido da Paraíba. Pesquisa
Veterinária Brasileira. 25(4): 201-206.
Medeiros G.X. Riet-Correa F., Barros S.S., Soares M.P., Dantas A.F.M., Galiza G.J.N.,
Simões S.V.D., Borges A.S. 2012. Dystrophic epidermolysis bullosa in goats. Journal of
Comparative Pathology, In Press, Corrected Proof, Available online 1 November 2012.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcpa.2012.09.002.
Nóbrega Júnior J.E., Riet-Correa F., Nóbrega R.S., Medeiros J.M., Vasconcelos J.S., Simões
S.V.D. & Tabosa I.M. 2005. Mortalidade perinatal de cordeiros no semi-árido da Paraíba.
Pesq. Vet. Bras.. 25(3): 171-178.
Pimentel L.A., Riet Correa F., Gardner D., Panter K.E., Dantas A.F.M., Medeiros R.M.T.,
Mota R. A. & Araújo J.A.S. 2007. Mimosa tenuiflora as a cause of malformations in
ruminants in the Northeastern Brazilian semiarid rangelands. Vet. Pathol. 44(6):928-931.
Riet-Correa F., Medeiros R.M.T., Tokarnia C.H. & Döbereiner J. 2007. Toxic plants for
livestock in Brazil: economic impact, toxic species, control measures and public health
implications, p.2-14. In: Panter K.E., Wierenga T.L. & Pfister J.A. (ed.). Poisonous plants:
global research and solutions. CAB International, Cambridge. EUA.
Santos J.R., Dantas A.F.M. & Riet-Correa F. 2012. Malformações, abortos e mortalidade
embrionária em ovinos causada pela ingestão de Mimosa tenuiflora (Leguminosae). Pesq.
Vet. Bras. 32(11):1103-1106.
11
CAPÍTULO I
Malformações em pequenos ruminantes - Revisão de Literatura
O presente trabalho foi formatado, segundo as normas da revista Pesquisa Veterinária
Brasileira (Anexo 2).
12
Malformações em pequenos ruminantes. Revisão de literatura1
José Rômulo Soares dos Santos2 e Franklin Riet-Correa2
ABSTRACT. Santos J.R.S., & Riet-Correa F. 2012. [Malformations in small ruminants.
Review.] Malformações em pequenos ruminantes. Revisão de literatura. Pesquisa Veterinária
Brasileira 00(0):00-00. Hospital Veterinário, CSTR, Universidade Federal de Campina
Grande, Campus de Patos, 58708-110 Patos, PB, Brazil. E-mail: [email protected]
In this paper the general pathogenesis, etiology, epidemiology, clinical signs,
pathology, diagnosis and control of malformations in sheep and goats are reviewed.
Congenital malformations can be defined as any morphologic or functional defect of an organ
or system at birth. These malformations can occur during the development of the embryo or
the fetus. Their origin can be intrinsic (chromosomic or genic alterations) or extrinsic
(infectious, physical or chemical agents). The frequency of congenital malformations in sheep
and goats is variable depending on the causal agents involved (hereditary or environmental),
breeds, geographical areas, and season of occurrence. When malformations occur as
outbreaks, it is possible that the cause is non-hereditary and when it occurs sporadically, can
be inherited. Besides the epidemiology, the clinical signs and the pathology aid in the
diagnosis. All organs and systems are susceptible to malformations, but the musculoskeletal
system, nervous system and urogenital system are more frequently involved. The lack of
information is the main obstacle in diagnosis of the causes of congenital malformations,
especially sporadic malformations, which in most cases are not reported. In Brazil, there are
few data on the occurrence of congenital defects in small ruminants, especially goats, except
for studies with Mimosa tenuiflora and few individual case reports as perossomus elumbis in
sheep and epidermolysis bullosa in goats. To report the malformations associated with a
detailed epidemiological investigation is important for the identification of the causes and to
allow their control.
INDEX TERMS: Congenital malformations, genic mutation, poisoning plants, teratology.
1 Enviado para publicação em….. Aceito em ...... 2 Hospital Veterinário, Centro de Saúde e Tecnologia Rural (CSTR), Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Campus de Patos, 58708-110 Patos, PB, Brasil. *Autor para correspondência: [email protected]
13
RESUMO. Neste trabalho é realizada uma revisão da etiologia, epidemiologia, patogenia,
sinais clínicos, patologia, diagnóstico e controle das malformações em caprinos e ovinos.
Malformações congênitas podem ser definidas como todo defeito morfológico ou funcional
em um órgão ou sistema presente ao nascimento. Esses defeitos podem ocorrer nas fases de
desenvolvimento embrionário ou fetal podendo ser de origem intrínseca (alterações
cromossômicas ou genicas) ou extrínseca (agentes infecciosos, físicos e químicos). A
frequência das malformações congênitas em caprinos e ovinos é variável, dependendo dos
agentes causais envolvidos (hereditária ou ambiental), das raças, áreas geográficas e estação
do ano. Quando malformações ocorrem em forma de surtos, suspeita-se que a origem é não-
hereditária e quando ocorre de forma esporádica, pode ser de origem hereditária. Além da
epidemiologia, os achados clínicos patológicos dão suporte para o diagnóstico. Qualquer
sistema ou órgão é susceptível à ocorrência de malformações, mas os sistemas músculo-
esquelético, sistema nervoso e o sistema urogenital são mais frequentemente envolvidos. A
falta de informação é o principal entrave no rastreamento das possíveis causas das
malformações congênitas, principalmente as malformações esporádicas, que na maioria das
vezes não são relatadas. No Brasil, há poucos dados sobre a ocorrência de defeitos congênitos
em pequenos ruminantes, principalmente caprinos, a não ser por estudos com Mimosa
tenuiflora e poucos relatos de casos individuais como perossomus elumbis em ovinos e
epidermólise bolhosa em caprinos. O relato do aparecimento de malformações associada a
uma detalhada investigação epidemiológica é fundamental para a identificação das causas das
malformações e permite a tomada de medidas eficientes para o seu controle.
TERMOS DE INDEXAÇÃO: Malformações congênitas, teratologia, mutação gênica, plantas
tóxicas.
1. INTRODUÇÃO
Na antiguidade, acreditava-se que influências extrínsecas como “maus espíritos” ou dietas
podiam influenciar sobre desenvolvimento embriológico dos seres humanos e animais. No
século XIX, Etienne Geoffroy de Saint Hilaire estudou anomalias e criou o termo teratologia.
Na Europa, entre os anos 1950 e 1960, a teratologia ganhou atenção da comunidade científica
mundial devido aos efeitos deletérios da hipovitaminose A em embriões de ratos e porcos e
aos efeitos da talidomida, um sedativo utilizado durante a gravidez em seres humanos, que
resultou em malformações de membros em recém-nascidos. Até então, os defeitos congênitos
eram, na sua grande maioria, atribuídos a herança genética e a partir daí, a teratologia se
14
estabeleceu como ciência ligada à embriologia (Leipold et al. 1983, Sinowartz 2010). Hoje,
malformações congênitas são definidas como todo defeito morfológico estrutural ou funcional
na constituição de algum órgão ou sistema presente ao nascimento. Esses defeitos podem
ocorrer nas fases de desenvolvimento embrionário ou fetal e podem ser de origem intrinseca
(alterações cromossômicas ou genéticas) ou extrínseca (agentes infecciosos, físicos e
químicos) (Sinowarts 2010). Podem ser letais, semiletais ou compatíveis com a vida (Leipold
et al. 1983).
2. PRINCÍPIOS DA TERATOGENICIDADE E PATOGÊNESE GERAL
A patogênese dos defeitos congênitos é pouco entendida, mas é evidente que cada doença
ocasionada por um agente teratogênico específico ou gene tem sua própria patogênese. Seis
princípios regem a teratologia:
2.1. O GENÓTIPO DETERMINA A SUSCEPTIBILIDADE
A herança genética não é responsável por induzir uma malformação causada por um
teratógeno, mas existe uma considerável variação na suscetibilidade a teratógenos entre
genótipos. Em animais domésticos, o tipo e a incidência das malformações variam entre
espécies e entre raças. Por exemplo, ovelhas prenhes são mais resistentes aos efeitos
teratogênicos da Conium maculatum do que vacas (Keeler 1984).
2.2. O TERATÓGENO DEVE CHEGAR AO CONCEPTO
Todos os produtos químicos livres no plasma materno tem acesso ao concepto através
da placenta (Keeler 1984, McEvoy et al. 2001).
2.3. AS MALFORMAÇÕES INDUZIDAS PELOS TERATÓGENOS SÃO
DOSE-DEPENDENTE
O efeito teratogênico é dose-dependente e a incidência, o tipo e a severidade da
malformação dependem da composição do principio ativo, do estágio da gestação em que
ocorre a ingestão e da quantidade do teratógeno ingerido (Panter et al. 1998, McEvoy et al.
2001, Welch et al. 2011). Fatores que determinam a dose de teratógenos que chegam ao
concepto incluem: a quantidade do princípio ingerido; a quantidade resultante da degradação
no rúmen e intestino; a quantidade absorvida na circulação materna; a quantidade resultante
do metabolismo; a quantidade que passa a placenta e atinge a circulação do concepto; a
quantidade que atinge o local do insulto; e o período gestacional.
15
2.4. UM TERATÓGENO PODE PRODUZIR MORTE AO INVÉS DE
MALFORMAÇÕES
A alta incidência de abortos e reabsorção embrionária podem sinalizar problemas com
princípios teratogênicos. Princípios ativos teratogênicos ingeridos em altas doses durante a
gestação podem resultar em embrioletalidade ou mortalidade fetal (Keeler 1984, Panter et al.
1994, Bernardi 2002, Welch et al. 2011). Quando a embrioletalidade ocorre até a fase de
implantação, em torno do 16º dia, é dita mortalidade embrionária precoce, aqui o ciclo estral
não é afetado, podendo o animal ter cios repetidos e não emprenhar. Quando a
embrioletalidade ocorre entre a fase de implantação e o 34º dia em ovinos e 35º dia em
caprinos, período em que termina a organogênese, é dita mortalidade embrionária tardia e há
alteração no ciclo estral. Quando há mortalidade fetal, segue-se o aborto. Algumas plantas
como Astragallus spp. e Oxytropis spp., além de causar deformações podem causar, também,
morte fetal e aborto em caprinos e ovinos (Panter et al. 1994).
2.5. O CONCEPTO DEVE SER EXPOSTO NO PERÍODO DE
DESENVOLVIMENTO EM QUE É SUSCEPTÍVEL
O embrião em desenvolvimento consiste em grupos de células que estão em
crescimento e se diferenciam em diferentes taxas ao longo de períodos de tempo diferentes,
mas de uma forma estritamente controlada e sequencial. Portanto, um dos princípios mais
importantes da teratologia é que a susceptibilidade a um teratógeno varia de acordo com o
estágio de desenvolvimento do embrião ou feto, no momento da exposição (Keeler 1984,
McEvoy et al. 2001). Para um teratógeno produzir uma malformação especifica, ele deve
exercer sua influência em determinado momento da gestação. A susceptibilidade aos agentes
ambientais ou genéticos diminui com o avanço da idade do feto (Sinowartz 2010). Nem todos
os teratógenos atuam na mesma fase de desenvolvimento. Alguns são prejudiciais, apenas, em
um estágio inicial de desenvolvimento. A Veratrum californicum é um exemplo bem
conhecido; quando ingerida durante uma janela embriológica (no 14° dia de gestação) causa
ciclopia em cordeiros (Welch et al. 2011). Outros teratógenos afetam estádios de
desenvolvimento tardios como a tetraciclina, por exemplo, que causa manchas nos dentes e
outras estruturas ósseas após esses tecidos rígidos terem se formado (Sinowartz 2010).
Nas primeiras semanas até a implantação do embrião, em torno do 16º dia de gestação,
insultos normalmente não resultam em defeito no desenvolvimento. As malformações aqui
são de origem intrínseca (mutação genica ou cromossômica) e vem desde a fase de zigoto.
16
Nesse período o embrião é mais resistente a agentes teratogênicos. Agentes que perturbam a
fase de clivagem podem comprometer os estágios de mórula ou de blastocisto, ou interferirem
com a aposição normal do concepto à mucosa uterina, afetando a implantação do embrião na
mesma e podendo induzir embrioletalidade e perda embrionária precoce (Sinowatz 2010,
McEvoy et al. 2001).
Em ovinos, o período de suscetibilidade máxima às malformações começa quando a
organogênese é iniciada, entre o 16º e o 34° dias dia de gestação (Robinson 1951) e entre o
16º e 35º dia em caprinos, quando começa a fase fetal (Panter et al. 1990, Sinowatz 2010).
Os sistemas nervoso, esquelético e urogenital e os órgãos dos sentidos apresentam um
período de susceptibilidade maior, estendendo-se da organogênese à fase fetal (Bernardi 2002,
Schild 2007, Sinowarts 2010). Na fase fetal, algumas estruturas que sofreram diferenciação
normal sofrem deformações (Bernardi 2002). A artrogripose e a fenda palatina são tipos de
deformações que resultam da intoxicação por certos alcaloides, que produzem redução nos
movimentos fetais. Normalmente, os movimentos fetais são de flexão e extensão da cabeça,
do pescoço e dos membros. O movimento fetal restrito dos membros resulta na fixação
artrogripótica e a pressão da língua no palato duro, quando o pescoço fica em uma posição
constantemente fletida, inibe o fechamento do palato (Panter et al. 1987, Panter et al. 1990).
Os primeiros movimentos fetais ocorrem normalmente a partir do 34º e 35º dia de gestação
em ovinos e caprinos, respectivamente, o que coincide com o final do período embrionário e
início do período fetal. Entre os 38 e 40 dias de gestação em caprinos deveria ocorrer a fusão
do palato (Panter et al. 1990). Além do período de exposição, deve-se levar em consideração
o grau de lesão produzido pelo agente teratogênico. Um determinado teratógeno pode levar a
diferentes graus de anormalidades, dependendo do período de organogênese em que o animal
for exposto e da lesão produzida (Panter et al. 1998, Welch et al. 2011).
2.6. TERATÓGENOS EXERCEM SEUS EFEITOS POR MECANISMOS
ESPECÍFICOS
Teratógenos diferentes podem induzir o mesmo defeito metabólico provocando assim
deformidades similares. Por exemplo, o alcalóide quinolizidínico anagirina, em Lupinus spp.,
e o alcalóide piperidínico coniina, em Conium maculatum, provocam malformações ósseas
semelhantes, como artrogripose e fenda palatina, em fetos caprinos e ovinos (Keeler 1984).
17
3. ETIOLOGIA DAS MALFORMAÇÕES
As malformações congênitas ocorrem em consequência de fatores intrínsecos (genéticos) ou
extrínsecos (infecciosos, tóxicos e mecânicos) ou pela interação de ambos, agindo em um ou
mais estágios do desenvolvimento fetal. Além disso, muitas malformações ocorrem de forma
esporádica sem causa conhecida (Radostitis et al. 2007, Schild 2007, Sinowartz 2010). Os
agentes que conhecidamente causam defeitos congênitos são apresentadas a seguir:
3.1 FATORES INTRÍNSECOS
As malformações genéticas podem resultar em amplo espectro de distúrbios que pode
variar de malformações graves até a presença de distúrbios metabólicos em animais que
podem ter nascido aparentemente normais, mas que desenvolvem mais tarde o defeito, como
doenças do armazenamento (Radostitis et al. 2007, Smith & Sherman 2009).
O desenvolvimento normal é controlado por uma interação entre o genoma de um
embrião e seu ambiente. A susceptibilidade a um teratógeno depende do genótipo do embrião
e do modo como interage com fatores ambientais adversos. Isso é melhor explicado pela
diferença na susceptibilidade entre genótipos. Um exemplo, já mencionado, é a diferença na
susceptibilidade a Conium maculatum entre ovinos e bovinos (Keeler 1984). Além disso,
diferenças na susceptibilidade a teratógenos têm sido encontrados em diferentes linhagens de
determinadas espécies (Sinowarts 2010).
Malformações de origem genética são decorrentes de mutações, ou seja, modificações
do DNA. Modificações que alteram os cromossomos são denominadas mutações
cromossômicas. Antes da fase de implantação, o embrião é resistente à agentes teratogênicos,
mas susceptível a aberrações cromossômicas e mutações genicas. Se as modificações ocorrem
num loco gênico específico, alterando uma ou mais bases do gene, elas são denominadas
mutações gênicas. As mutações podem ocorrer em qualquer célula, tanto em células da
linhagem germinativa como em células somáticas. No entanto, apenas as mutações nas células
germinativas podem passar de uma geração à seguinte, sendo, portanto, as responsáveis pelas
doenças hereditárias (Thompson et al. 1993, Thompson et al. 2008).
3.1.1. MUTAÇÕES CROMOSSÔMICAS
As mutações cromossômicas são geralmente associadas com malformações múltiplas.
Alterações cromossômicas podem decorrer de mudanças quantitativas no número de
cromossomos (poliploidia ou aneuploidia), decorrentes de falha durante a mitose e/ou meiose.
Radiações e teratógenos químicos podem causar quebras e deleções na estrutura dos
18
cromossomos. A importância da anormalidade cromossômica nos defeitos congênitos em
animais pecuários não tem sido estudada extensamente (Mine 2000, Otto 2006, Radostitis et
al. 2007, Schild 2007).
3.1.2. MUTAÇÃO GÊNICA
A maioria dos defeitos congênitos hereditários conhecidos é transmitida por genes
recessivos autossômicos, que resultam no nascimento de animais malformados, cujos
progenitores são normais. Os genes recessivos são a mais importante forma de transmissão
hereditária de enfermidades. Estes genes são transmitidos de geração em geração pelos
indivíduos heterozigotos e, deste modo, perpetuam-se nas raças das diferentes espécies
animais (Radostitis et al. 2007, Schild 2007).
Os genes dominantes manifestam-se na primeira geração, em cruzamentos de animais
portadores heterozigotos com indivíduos homozigotos normais, sendo que as enfermidades
transmitidas desta forma são mais facilmente controladas. Genes dominantes ou recessivos
podem apresentar penetrância e/ou expressividade variável. No caso de penetrância
incompleta o número de animais com a malformação é menor do que o número esperado de
animais afetados, portanto, há animais que têm o gene dominante ou são homozigotos para
genes recessivos e não evidenciam a malformação. Na expressividade variada o fenótipo dos
indivíduos apresenta graus diferentes da malformação, podendo haver, inclusive, casos
subclínicos. Outras formas de transmissão hereditária estão representadas pela
sobredominância e pela herança poligênica. A herança por sobredominância resulta em:
indivíduos normais, com malformação e portadores que não apresentam o defeito e têm
fenótipo superior para características produtivas (neste caso há risco de que sejam utilizados
como reprodutores). A herança poligênica caracteriza-se por defeitos transmitidos por vários
pares de genes (Mine 2000, Otto 2006, Radostitis et al. 2007, Schild 2007, Banerjee 2010).
3.2 FATORES EXTRÍNSECOS
Dentre os fatores ambientais que podem causar defeitos congênitos destacam-se
fatores físico-mecânicos, deficiência nutricional, infecções virais e intoxicações por fármacos
e plantas. O feto é um indicador biológico sensível da presença de algumas influências
nocivas no meio ambiente. Defeitos de origem genética ocorrem de forma esporádica e
defeitos congênitos não hereditários que ocorrem como surtos, levam a suspeitar de uma
possível origem infecciosa ou tóxica (Delatour 1983, Keeler 1984). Quando os defeitos
ocorrem em forma de surtos, repetidamente, há um considerável interesse devido às perdas
19
econômicas que estão envolvidas com esse problema. A susceptibilidade a teratógenos é
maior no período de organogênese e diminui com a idade fetal e o tipo de lesão vai depender
da natureza e gravidade (tamanho da dose e duração da aplicação) do estímulo nocivo (Keeler
1984, Panter et al. 1990).
3.2.1. FATORES FÍSICO-MECÂNICOS
Anomalias comuns como luxações de quadril e deformações do crânio têm sido
atribuídas a fatores mecânicos que impõem uma pressão intra-uterina anormal sobre o feto.
Este fenômeno é muitas vezes relacionado à uma quantidade reduzida de fluido na cavidade
amniótica ou à malformações uterinas na mãe (Radostitis et al. 2007).
A radiação ionizante é um potente teratógeno em todas as espécies. A resposta
depende da dose e fase de desenvolvimento em que o embrião é exposto à radiação. Embora
a dose de radiação ionizante, em um exame de raios-X de diagnóstico, seja mínima, deve-se
evitar em fêmeas grávidas por causar quebras das cadeias de ADN e mutações. A radiação
ionizante tem sido associada a uma variedade de defeitos congênitos, incluindo microcefalia,
fenda palatina, malformações esqueléticas e anomalias do sistema nervoso (Sinowarts 2010).
A hipertermia também é capaz de induzir defeitos congênitos nas diversas espécies
animais. A indução experimental de hipertermia em gestantes acarreta deformidades
congênitas, o que não parece ter equivalente de ocorrência natural. As anormalidades mais
graves ocorrem após a exposição no inicio da gestação (18-25 dias em ovelhas). As
malformações vistas são artrogripose e atrofia dos membros de cordeiros. A hipertermia em
ovelhas, entre o 30° e o 80° dia de gestação, causa retardo no crescimento fetal (Radostitis et
al. 2007).
3.2.2. FATORES NUTRICIONAIS
Há muitos defeitos congênitos em animais que, reconhecidamente, são causados por
deficiências de nutrientes específicos na alimentação da mãe. Na deficiência de iodo, o bócio
e o aumento na mortalidade neonatal ocorrem em todas as espécies. A deficiência pode ser
também devido à deficiência primária ou induzida por nitrato ou pela ingestão de Brassica
spp. A ataxia enzoótica dos cordeiros ocorre tanto por uma deficiência primária de cobre
quanto por uma deficiência secundária, em que a disponibilidade de cobre é comprometida
por outros minerais como molibdênio, enxofre e ferro. Na hipovitaminose D, ocorre
raquitismo neonatal (Radostitis et al. 2007).
20
A deficiência congênita de cobalto é referida como redutora do vigor em cordeiros ao
nascimento e como causa de aumento da mortalidade perinatal devido a um defeito na função
imunológica. A má nutrição materna pode resultar em aumento da mortalidade neonatal e
deve ser suspeitada como gênese de deformidades (Radostitis et al. 2007).
3.2.3. AGENTES INFECCIOSOS
Vários vírus causam malformações em caprinos e ovinos. A teratogênese viral
depende da penetração e replicação do vírus, da fase de gestação em que a infecção ocorre, da
patogenicidade do vírus (por exemplo: cepas do vírus da diarreia viral bovina citopatogênicas
versus não-citopatogênicas) e do estado imunológico do feto no momento da infecção. As
infecções virais podem causar morte pré-natal, nascimento de neonatos inviáveis portadores
de malformações ou nascimento de neonatos viáveis, mas com crescimento retardado ou
função anormal (cegueira). A idade gestacional no momento da infecção é a principal
influência. Durante o início de desenvolvimento, a zona pelúcida funciona como uma barreira
contra infecções virais, mas quando ela se rompe no blastocisto, os embriões tornam-se
vulneráveis à infecção viral. A barreira placentária previne infecções virais em algum grau,
mas muitos vírus podem atravessá-la. Portanto, infecções virais maternas em estágios críticos
do desenvolvimento podem ser uma causa grave de malformações (Sinowarts 2010).
O Virus Akabane ao infectar ovelhas e cabras prenhes pode causar malformações nos
conceptos, podendo causar artrogripose, microencefalia e hidrocefalia. Em ovelhas, a
susceptibilidade para os defeitos congênitos é maior entre 30 e 50 dias de gestação (Kurogi et
al. 1977, Pugh 2002, Smith & Sherman 2009). O vírus do Vale Cachê é conhecido por causar
malformações similares às provocadas pelo vírus Akabane em cordeiros. O período de
susceptibilidade para os defeitos congênitos situa-se entre 36 e 45 dias de gestação
(Radostitis et al. 2007). Infecções com o vírus Wesselsbron e o vírus da Febre do Vale Rift
são relatadas como causadoras de anomalias do sistema nervoso central em ovinos (Pugh
2002, Radostitis et al. 2007, Smith & Sherman 2009).
Na infecção natural em ovelhas pelo vírus da língua azul (entre o 50° e o 80° dia de
gestação) pode ocorrer morte e reabsorção fetais, ou nascimento de animais mortos ou
enfraquecidos, e, ainda, hidrocefalia ou hidranencefalia, bem como, artrogripose. Vacinação
em ovelhas com vírus atenuado entre o 35º e o 45º dia de gestação provoca elevada
prevalência de porencefalia nos cordeiros. Defeitos similares podem ser produzidos pelo
vírus Chuzan e Aino (Osburn 1972, Pugh 2002, Tsuda et al. 2004, Smith & Sherman 2009)
21
A infecção pelo vírus da enfermidade da fronteira entre o 16 e o 90º dia de gestação
das ovelhas, pode resultar em morte embrionária precoce, aborto, natimortos e nascimento de
cordeiros defeituosos ou pequenos e fracos, com crescimento retardado e nascimento de
cordeiros persistentemente infectados ou cordeiros com hipomielinogênese, hidranencefalia e
displasia cerebelar (Sawyer et al. 1991, Pugh 2002, Smith & Sherman 2009)
3.2.4. FATORES QUÍMICOS
Dentre os fatores ambientais que podem causar defeitos congênitos destacam-se as
intoxicações por plantas e por fármacos (Delatour 1983). Qualquer substância química que
tem o potencial de alterar a função celular, ou que é citotóxica tem potencial teratogênico. Os
mecanismos que levam à teratogênese podem variar desde a inibição de sistemas de enzimas
específicas (por exemplo anidrase carbônica) à interferência com o metabolismo do ADN
(Sinowartz 2010). Por exemplo, os alcalóides esteroidais presentes na V. californicum (Keeler
1978, Panter et al. 1994) interferem no desenvolvimento do tubo neural, afetando as células
do neuroepitélio embrionário que secretam catecolaminas. A inibição da liberação de
catecolaminas interrompe a migração normal e o desenvolvimento das células embrionárias,
causando ciclopia (Sim et al. 1985). Contudo o mecanismo de muitos teratógenos é
desconhecido (Sinowartz 2010).
Várias drogas terapêuticas, em níveis de exposição definidas e em estágios críticos de
desenvolvimento, podem também ser potencialmente teratogênicas. Alguns benzimidazóis
(parabendazol, cambendazol, oxfendazol, netobimina) são teratogênicos importantes para
ovinos, causando anormalidade esquelética, renal e vascular, quando administrados entre o
14° e o 24° dia de gestação (Pugh 2002, Radostitis et al. 2007). Outras drogas como cortisona,
estradiol, bismuto, selênio e sulfonamidas podem, também, induzir o aparecimento de
malformações congênitas (Delatour 1983).
A concentração de determinadas drogas e seu potencial teratogênico para
determinadas espécies, ainda não está claro. Por exemplo, a talidomida é altamente
teratogênica em humanos, coelhos, e primatas, mas não em roedores de laboratório. A
utilização de alguns antibióticos durante a gravidez tem sido associada com defeitos
congênitos, a estreptomicina em dose alta pode resultar em surdez do ouvido interno; a
tetraciclina pode atravessar a barreira placentária e causar amarelamento dos dentes e, em
doses elevadas, interferir com a formação de esmalte, quando administrada no final gestação
(Sinowartz 2010).
22
Os defeitos congênitos podem ser causados, também, pela ingestão, durante a
gestação, de plantas tóxicas como: Veratrum californicum, Lupinus spp., Conium maculatum,
Nicotiana spp., Astragalus spp., Oxytropis spp., Trachymene spp., e Mimosa tenuiflora
(Keeler 1984, Panter et al. 2000, 1994, Cheeke, 1998, Gardner et al. 1998, James et al. 2004,
Pimentel et al. 2007). Algumas dessas plantas contêm como princípio tóxico alcalóides
esteroidais, quinolizidínicos ou piperidínicos, que tem efeito teratógeno (Keeler 1984, Panter
et al. 1994, Gardner et al. 1998).
A Veratrum californicum está relacionada ao aparecimento de ciclopia congênita e
deformidade do crânio de cordeiros quando ingerida no 14º dia de gestação por ovelhas, com
anormalidades de membros se ingerida entre o 27º e o 32° dia de gestação e com estenose
traqueal se ingerida entre o 31° e o 33° dia de gestação (Panter et al. 1994). Também é descita
como tóxica em caprinos, bovinos (Gardner et al. 1998), coelhos, hamsters, ratos e
camundongos (Keeler 1984). Essa planta contém alcalóides esteroidais: ciclopamina,
cicloposina e jervina. Desses três, ciclopamina é o que apresenta maior concentração na planta
(Keeler 1978, Panter et al. 1994). Esses compostos além de serem responsáveis por
malformações congênitas também causam perdas embrionárias em ovelhas. Quando V.
californicum é ingerido por ovelhas prenhes entre 14º e 21º dias de gestação, poderá ocorrer
alta incidência de morte embrionária e reabsorção (Panter et al. 1994, Gardner et al. 1998).
Em ovelhas prenhes que se alimentam da planta entre 27 e 41 dias de gestação, a frequência
de mortalidade embrionária diminui, mas pode ocorrer alta incidência de perdas neonatais,
especificamente entre os dias 27 e 33 de prenhez (Keeler et al. 1985). Além de interferir nas
células do neuroepitélio embrionário que secretam catecolaminas e inibir a migração normal e
o desenvolvimento das células embrionárias, a jervina de V. californicum interfere no
metabolismo das cartilagens, responsável pela estenose traqueal e encurtamento dos ossos
metacarpo, metatarso e tíbia, comprometendo o desenvolvimento dos precursores
condrogênicos no desenvolvimento dos condrócitos (Campbell et al. 1987).
No gênero Lupinus, alguns alcalóides como os quinolizidínicos (anagirina) e
piperidínicos (amodendrina) são responsáveis pela ação teratogênica em bovinos (Keeler
1984). L. formosus contém alta concentração de amodendrina e é responsável por causar
malformações esqueléticas acentuadas e fenda palatina em bovinos, caprinos e possivelmente
em ovinos (Panter et al. 1990). Essa substância tem potencial teratogênico maior que a
anagirina, que causa malformações ósseas (doença do bezerro torto) (Keeler 1976). Esses
alcalóides produzem redução nos movimentos fetais, desencadeando malformações ósseas
nos animais susceptíveis, como foi comprovado em cabras prenhes (Panter et al. 1990). Os
23
animais podem apresentar flexão ou hiperextensão dos membros e coluna vertebral e
anormalidades secundárias das costelas. A intoxicação em ovelhas ou cabras quando ingerem
Lupinus spp., entre 30 a 60 dias de gestação, pode resultar em múltiplas contraturas
congênitas (artrogripose, escoliose, xifose, lordose e fenda palatina). O aparecimento de fenda
palatina foi descrito em caprinos e ovinos que ingeriram Lupinus spp entre 35 e 41 dias de
gestação (Panter & Keeler 1992).
A Conium maculatum contém alcaloides piperidínicos (Keeler 1984), dos quais,
coniina, y-coniceína e n-metilconiína são conhecidos por serem teratogênicos para suínos,
bovinos, ovinos e caprinos (Keeler et al. 1980, Panter et al. 1990). Ovelhas prenhes são mais
resistentes aos efeitos teratogênicos da C. maculatum do que bovinos (Keeler 1984). A
administração de C. maculatum fresco, contendo y-coniceína, para ovelhas ou cabras prenhes
resulta em efeitos tóxicos e teratogênicos (Keeler et al. 1980). Quando ingerido por ovelhas
no período de 30 a 60 dias de gestação causa artrogripose, escoliose, torcicolo e fenda
palatina. A infusão dos alcaloides puros, y-coniceína e n-metilconiína, dentro da vesícula
amniótica de cabras causa intoxicação e morte fetal em alguns casos. Quando a infusão ocorre
entre 35 e 41 dias de gestação verificam-se severos defeitos esqueléticos e fenda palatina em
caprinos. Os níveis tóxicos de y-coniceína e n-metilconiína aparentemente podem perdurar de
forma crescente na circulação fetal até o 50º dia de gestação, cerca de 10 dias após o final da
administração. Isso sugere que a ingestão de C. maculatum em um único dia ou por alguns
dias pode expor o feto a dosagens suficientes para a intoxicação, mesmo que já tenha passado
o período de maior susceptibilidade, desencadeando malformações (Panter & Keeler 1992).
A nicotina encontrada em Nicotiana spp. foi discutida como possível teratógeno,
entretanto, Keeler et al. (1984) demonstraram que as malformações esqueléticas eram devidas
ao alcalóide piperidínico, anabasina, extraído em concentrações elevadas de N. glauca e nos
talos da N. tabacum. A ingestão de N. glauca por ovelhas e cabras prenhes causa fenda
palatina e malformações esqueléticas. Quando é ingerida durante o período de 37 a 39 dias em
ovelhas e 34 a 41 dias de gestação em cabras, pode resultar em morte e reabsorção
embrionárias (Panter et al. 2000). A fenda palatina ocorre entre 35 e 41 dias de gestação em
cabras prenhes e possivelmente as malformações esqueléticas ocorram entre os dias 40 e 60
de gestação (Panter e Keeler 1992).
Astragalus spp. e Oxytropis spp. (locoweeds) são plantas conhecidas por serem
teratogênicas, mas seu principio tóxico ainda permanece desconhecido. O alcaloide
indolizidínico swainsonina presente nesses gêneros é responsável por uma doença do
armazenamento de oligossacarídeos conhecida por locoism em ovinos, bovinos e equinos,
24
mas não tem sido demonstrado que esse alcaloide apresenta efeitos teratogênicos, responsável
pelo aborto e malformações (Panter et al. 1994, Gardner et al. 1998, Cook et al. 2009). As
principais malformações observadas em ovinos que ingerem algumas espécies de Astragalus e
Oxytropis são rotação lateral dos membros torácicos, contração de tendões, flexura e
hipermobilidade de cartilagens e flexão do carpo. Muitos cordeiros recuperam-se dessas
alterações parcialmente (James et al. 1967). Algumas espécies além de causar deformidades
podem causar embrioletalidade e abortos (Keeler 1984, Panter et al. 1994).
Trachymene spp. causam uma condição em ovinos denominada de “cordeiros das
pernas curvadas”. Trachymene cyanantha e Trachymene ochracea, nativas da Austrália,
apresentam ação teratogênica para ovinos, causando um crescimento desigual das placas
epifisárias durante a fase fetal. Mas pode ocorrer também intoxicação de neonatos que
ingeriram leite de ovelhas. Quando ovelhas ingerem a planta após o 35º dia de gestação
ocorre malformações dos membros dos cordeiros. Os animais apresentam principalmente
malformações dos membros torácicos tais como desvio, deformações e desgaste irregular dos
cascos dos membros afetados (Dowling & Mckenzie 1993). O princípio tóxico responsável
pelas malformações é desconhecido (Keeler 1984).
No Nordeste brasileiro, a jurema preta (Mimosa tenuiflora) causa malformações em
caprinos (Pimentel et al. 2007) e ovinos (Santos et al. 2012). Pimentel et al (2007) testaram os
efeitos do consumo de M. tenuiflora durante todo o período gestacional em cabras e
verificaram malformações em 75% das crias, encontrando queilosquise, opacidade de córnea,
dermóide ocular, estenose segmentar do cólon e escoliose. Medeiros et al (2008)
demonstraram o efeito teratogênico da M. tenuiflora ao reproduzir malformações em 84%
dos filhotes de ratas que receberam ração contendo 10% de sementes, entre 6o e o 21o dia de
gestação. Os autores encontraram defeitos como fenda palatina, escoliose, esterno bífido,
aplasia de esternebras, hipoplasia do osso nasal, etc. Além de malformações, M. tenuiflora é
descrita como causa de mortalidade embrionária em caprinos (Dantas et al. 2012) e ovinos
(Santos et al. 2012). O princípio ativo de M. tenuiflora é, ainda, desconhecido, mas alcaloides
derivados da triptamina foram isolados em folhas e sementes (Gardner et al. 2011). O período
de gestação, no qual ocorre a ação da planta e as malformações não é conhecido, mas
acredita-se que a época de maior susceptibilidade seja durante os primeiros 60 dias de
gestação (Riet-Correa et al. 2009).
25
4. EPIDEMIOLOGIA
A frequência das malformações congênitas não tem uma proporção fixa uma vez que podem
ser causadas por diferentes agentes (hereditários ou ambientais) e pode variar entre as raças,
áreas geográficas e estações do ano. Malformações hereditárias ocorrem de forma esporádica
(Dennis & Leipold 1972); enquanto que as malformações não hereditárias podem ocorrer
como surtos, devendo ser levado em consideração uma possível origem infecciosa ou tóxica
(Delatour 1983, Keeler 1984). Quando as malformações ocorrem em formas de surto,
repetidamente, em um dado rebanho ou área geográfica, há um considerável interesse em se
investigar a causa, devido às perdas econômicas que estão envolvidas. Pelo contrário, boa
parte das malformações que ocorrem, individualmente, de forma esporádica, acabam não
sendo estudadas (Radostitis et al. 2007, Schild 2007, Sinowartz 2010). Além disso, muitos
defeitos são identificados apenas durante a necropsia, que nem sempre é realizada em animais
a campo, tornando ainda mais complicado o estudo da frequência das malformações
(Marcolongo-Pereira et al. 2010).
A falta de informações adequadas, a inadequada descrição anátomo-patológica, a
inadequada análise genética e a falha na interpretação dos achados que contribuem para o
entendimento e associação entre os processos embriológicos, patológicos e hereditários
constituem deficiências com relação ao estudo dos defeitos congênitos nos animais
domésticos (Leipold et al. 1983). Devido a essa falta de informação há dificuldade no estudo
dessas anomalias e da determinação das possíveis causas, de forma que o diagnóstico é um
desafio na prática veterinária. No Brasil, são poucos os dados sobre a ocorrência de defeitos
congênitos em pequenos ruminantes, principalmente caprinos, a não ser por estudos com
Mimosa tenuiflora (Pimentel et al. 2007, Dantas et al. 2012, Santos et al 2012) e poucos
relatos de casos individuais, como perossomus elumbis em ovinos (Castro et al. 2008), ou
coletivos, como epidermólise bolhosa em caprinos (Medeiros et al. 2012).
A frequência de malformações congênitas é estimada entre 0,2% e 2% dos ovinos
nascidos (Schild 2007). Em levantamento realizado em ovinos nos Estados Unidos de um
total de 21.031 cordeiros da raça Rambouillet nascidos, foram observados 26 animais
defeituosos em um período de 15 anos. Neste trabalho os autores concluíram que a ocorrência
de 4,2% de natimortos e 3% de aborto foram as causas de perdas econômicas mais
importantes (Saperstein et al. 1975). Em outro estudo, de 4.408 nascimentos de cordeiros,
1,6% apresentavam defeitos congênitos graves (Hughes et al. 1972).
No Rio Grande do Sul é observada uma taxa de prevalência de 0,5% de malformações
congênitas em ovinos, incluindo as malformações esporádicas, as enfermidades hereditárias e
26
os defeitos congênitos produzidos por causas ambientais (Schild 2007). Marcolongo–Pereira
et al. (2010) encontraram uma frequência de 0,36% de malformações em ovinos na região sul
do Rio Grande do Sul. No Laboratório Regional de Diagnóstico, em Pelotas, Rio Grande do
Sul, de um total de 821 ovinos examinados entre 1978 e 2008, as malformações congênitas
representaram 0,24% (Schild et al. 2009). No Rio Grande do Sul, as malformações
representaram entre 0,5% e 0,8% das causas de mortalidade perinatal em cordeiros (Mendez
et al. 1982, Oliveira e Barros 1982), o que representa entre 0,1% e 0,3% dos cordeiros
nascidos. Na região nordeste, as malformações representam 23% das causas de mortes
neonatais em cordeiros (Nóbrega Junior et al. 2005), e perfazem 7,62% em cabritos
(Medeiros et al., 2005). Assis (2011) encontrou uma frequência de 4,99% caprinos e 1,87%
ovinos com anomalias congênitas. Dantas et al (2010) estudando malformações em
ruminantes no semiárido brasileiro, no período de 2000 a 2008, encontraram em 418 ovinos,
5,01% de malformações, sendo 4,3% associadas à intoxicação por M. tenuiflora e 0,71%
malformações esporádicas. Em 495 caprinos a frequência de malformações foi de 2,41%,
sendo 1,81% causadas por intoxicação por M. tenuiflora e 0,6% de malformações
esporádicas.
Uma expressão da prevalência de defeitos congênitos é de pouquíssimo valor, a
menos que esteja relacionada ao tamanho da população sob-risco, mas os registros não
costumam incluir esses dados fundamentais. Além disso, a maioria dos registros disponíveis é
retrospectiva e se baseia no número de casos encaminhados em um laboratório ou hospital.
5. ACHADOS CLÍNICOS E PATOLÓGICOS
A maioria das malformações congênitas é facilmente reconhecida ao nascimento. Em alguns
casos os defeitos são reconhecidos somente após um cuidadoso exame clínico-patológico
(Saperstein et al. 1975). As lesões podem ser identificadas macroscópica ou histologicamente
ou por ambas as formas (Leipold et al. 1983). Qualquer sistema ou órgão é susceptível à
defeitos congênitos, mas alguns são mais frequentemente afetados do que outros. O sistema
músculo-esquelético, o sistema nervoso e o sistema urogenital são frequentemente envolvidos
em malformações congênitas (Leipold et al. 1983), talvez devido ao seu prolongado período
de desenvolvimento embrionário.
No Brasil, em caprinos e ovinos, diversas malformações esporádicas ou causadas por
diversos agentes incluem acefalia, dicefalia, artrogripose, microftalmia, dermóide ocular,
fenda palatina, atresia anal, hipomielinogênese devido à carência de cobre em ovinos,
epidermolise bolhosa e condrodisplasia (Schmidt & Oliveira 2004, Medeiros et al. 2005,
27
Nóbrega Júnior et al. 2005, Dantas 2010). Anomalias da mandíbula (agnatia, braquignatia e
prognatia) são descritos em caprinos e ovinos em municípios da Bahia (Magalhães et al.
2008). Algumas malformações em caprinos e ovinos aparecem combinadas, como o caso da
fenda palatina e artrogripose em casos de intoxicação por M. tenuiflora. A artrogripose pode
afetar somente os membros anteriores ou os membros posteriores (bimélica), como também
pode afetar os quatro membros (tetramélica) (Medeiros et al. 2005, Nobrega Junior et al.
2005, Pimentel et al. 2007, Dantas et al. 2010). Os animais afetados, geralmente, nascem em
partos distócicos, frequentemente mortos. Quando nascem vivos tem dificuldade de se manter
em pé ou alimentar-se e podem morrer. Outras alterações esqueléticas são malformações de
coluna vertebral como cifose, escoliose e torcicolo. Perosomus elumbis ou agenesia do
segmento caudal da coluna vertebral associada à artrogripose e atrofia muscular dos membros
pélvicos foi descrita em ovino neonato no estado de São Paulo (Castro et al. 2008).
6. DIAGNÓSTICO
O diagnóstico dos defeitos congênitos é complexo e o desafio depois de identificar a
anormalidade é determinar sua causa. As considerações epidemiológicas oferecem melhores
indícios na hora de se diagnosticar a causa, se a malformação é de origem hereditária ou
ambiental. A frequência com que uma determinada malformação ocorre em um rebanho pode
ser um indicativo importante para a determinação de sua origem. Quando malformações
ocorrem em forma de surtos, de modo geral, existe um agente causal ambiental (vírus,
plantas, medicamentos, agentes físicos, etc.). A epidemiologia dessas malformações,
combinada com achados clínicos patológicos, bem como o histórico da existência e exposição
aos teratógenos, dá suporte para o diagnóstico. Para o diagnóstico de defeitos congênitos que
ocorrem em consequência de agentes ambientais é necessário conhecer-se o estado nutricional
das fêmeas prenhes e a ocorrência de infecções virais no rebanho. O conhecimento do manejo
utilizado no rebanho, da aplicação de medicamentos em determinados períodos da gestação e
o reconhecimento das áreas onde os animais permanecem durante a gestação são dados
fundamentais para a determinação da etiologia destas enfermidades (Marcolongo-Pereira et al.
2010).
Os defeitos congênitos que ocorrem esporadicamente em um único animal constituem
o maior problema. Há, usualmente, pouca dificuldade em definir a condição clinicamente,
mas pode ser impossível determinar a causa. Quando anormalidades individuais ocorrem
espontaneamente, a determinação da sua causa é, muitas vezes, um desafio, mesmo quando
se empregam todos os métodos de exame. Defeitos congênitos hereditários transmitidos por
28
genes recessivos apresentam-se em baixa frequência nos rebanhos e, geralmente, expressam-
se em gerações alternadas. Nesse caso, o conhecimento da genealogia do rebanho é de
utilidade para a determinação da etiologia. Se houvesse registros adequados sobre a
reprodução, seria razoavelmente fácil verificar a possível participação da hereditariedade. A
determinação atualizada dos agentes reconhecidos como teratógenos surgiu principalmente
de estudos epidemiológicos sequenciais, o mesmo acompanhamento deveria ser aplicado no
aparecimento de casos individuais, que não são na maioria das vezes relatados. A introdução
de um determinado reprodutor ou sêmen em um rebanho, anterior ao aparecimento da
malformação, é um indicativo de transmissão hereditária, quando as demais causas podem ser
descartadas, e pode permitir a identificação de animais descendentes portadores. Em geral é
impossível determinar a etiologia de casos esporádicos de defeitos congênitos, porém,
quando o número de animais acometidos aumenta, passa a ser indispensável uma tentativa de
se estabelecer a causa. A não notificação desses casos esporádicos, aliada ao não estudo
dessas malformações permite que esses portadores continuem transmitindo esses possíveis
genes (Radostitis et al. 2007, Schild 2007, Marcolongo-Pereira et al. 2010) .
7. CONTROLE E PROFILAXIA Uma das formas de se evitar malformações congênitas hereditárias transmitidas por genes
recessivos é não fazer uso de consanguinidade nos rebanhos, entretanto, os genes
indesejáveis permanecem nos animais portadores e perpetuam-se nas diferentes raças
animais. Ao aparecer casos esporádicos de malformações, estes devem ser notificados para
instituições de pesquisa e então tentar fazer o estudo genético (Schild 2007). Testes de
progênie são indicados, como forma de controle, para reprodutores, fundamentalmente para
aqueles utilizados em centrais de inseminação artificial, cujo sêmen é distribuído em larga
escala. O cruzamento de um touro com 40 filhas permite a comprovação, com 99% de
segurança, de que o mesmo não é portador de genes recessivos indesejáveis se todos os
descendentes deste cruzamento forem normais (Radostitis et al. 2007).
Defeitos congênitos devidos à agentes teratogênicos podem ser controlados a partir do
conhecimento dos fatores que levam a ocorrência desses defeitos, evitando uso de
medicamentos durante a gestação, controlando infecções virais e mantendo um bom estado
nutricional para os animais em gestação. Por exemplo, sugere-se como medidas de controle e
prevenção evitar que cabras e ovelhas prenhes sejam colocadas para pastejar em áreas com M.
tenuiflora na fase de organogênese ou de desenvolvimento embrionário, principalmente
durante os primeiros 60 dias de gestação (Riet-Correa et al. 2009).
29
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No estudo das malformações o principal entrave é a falta de informação. O relato do
aparecimento de malformações associada a uma detalhada investigação epidemiológica é
fundamental para a identificação das causas das malformações e permite a tomada de medidas
eficientes para o seu controle. Algumas informações são essenciais na investigação
epidemiológica como: frequência com que os defeitos ocorrem; condição nutricional das mães
e dos neonatos acometidos e alterações nas fontes comuns do alimento; histórico sobre
enfermidades das mães dos neonatos acometidos; histórico do uso de fármacos nas fêmeas
durante a gestação; área geográfica onde as fêmeas se encontram; presença de plantas tóxicas;
estação do ano em que ocorreram as agressões; e se houve introdução de animais no rebanho.
Essas informações podem auxiliar para determinar se a etiologia é hereditária ou não e
direcionar a busca da origem do problema.
9. REFERÊNCIAS
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35
CAPÍTULO II
Malformações, abortos e mortalidade embrionária em ovinos causada pela
ingestão de Mimosa tenuiflora (Leguminosae)
O presente trabalho foi publicado na Pesquisa Veterinária Brasileira (Anexo 2). Pesq.
Vet. Bras. 32(11):1103-1106, novembro 2012. http://www.pvb.com.br/pdf_artigos/01-11-
2012_10-44Vet%201291_2722%20LD.pdf
36
Malformações, abortos e mortalidade embrionária em ovinos causada pela
ingestão de Mimosa tenuiflora (Leguminosae)1
José Rômulo Soares dos Santos2, Antônio F.M. Dantas2 e Franklin Riet-Correa2
ABSTRACT.- Santos J.R.S., Riet-Correa F. & Dantas A.F.M. 2012. [Malformations,
abortion, and embryonic death in sheep caused by the ingestion of Mimosa tenuiflora.]
Malformações, abortos e mortalidade embrionária em ovinos causada pela ingestão de
Mimosa tenuiflora. Pesquisa Veterinária Brasileira 00(0):00-00. Hospital Veterinário, CSTR,
Universidade Federal de Campina Grande, Campus de Patos, 58708-110 Patos, PB, Brazil. E-
mail: [email protected]
To determine the teratogenicity of Mimosa tenuiflora, 15 sheep, divided into two
groups, were introduced into an area invaded by the plant. Group 1 consisted of six pregnant
ewes that were introduced into the experimental area 20 days after mating. Group 2 consisted
of nine non pregnant sheep and a ram introduced into the area at the start of the experiment.
The experiment began in October 2009, during the dry season, when M. tenuiflora was
seeding. During this period the M. tenuiflora plants were pruned to 40cm tall and the branches
with leaves and seeds were provided to the experimental sheep in the same area. After
prunning M. tenuiflora began to sprout even in the dry season, and the sheep were free to
graze the plant. They also received concentrate ration in amount equivalent to 1% of their
body weight. After the first rains in mid-January 2010, when the herbaceous layer appeared,
the pregnant sheep were confined in stalls, and M. tenuiflora was cut in the field and given to
the sheep until the end of the experiment. Every 15 days each sheep was examined by
ultrasound to control pregnancy. In Group 1, three sheep aborted single fetuses without
malformations. One sheep delivered two lambs, one with hyperflexion of the proximal inter-
phalangeal joint of the right forelimb and another without malformations. Another sheep
delivered a lamb with a hyperflexion of both hindlimbs in the region of the tarsal-metatarsal
joint. Only one sheep delivered a normal lamb. In Group 2, one sheep aborted a fetus without
malformations and five delivered normal lambs. Three sheep of this group returned to estrus
repeatedly and did not get pregnant during the mating period, suggesting embryonic loss.
1 Recebido em 9 de março de 2012. Aceito para publicação em 4 de agosto de 2012.
2 Hospital Veterinário, Centro de Saúde e Tecnologia Rural (CSTR), Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Campus de Patos, 58708-110 Patos, PB, Brasil. *Autor para correspondência: [email protected]
37
Thirty two ewes and one ram, that stayed in a paddock neighbor to the experimental paddock
and were used as control group, delivered normal lambs. It is concluded that M. tenuiflora
cause malformations, embryonic mortality and abortion in sheep.
INDEX TERMS: Mimosa tenuiflora, abortion, malformations, embryonic death, poisoning
plants.
RESUMO.- Para determinar a teratogenicidade de Mimosa tenuiflora, 15 ovelhas,
distribuídas em dois grupos, foram introduzidos em área invadida pela planta. O Grupo 1,
com seis ovelhas prenhes, foi introduzido na área experimental 20 dias após o acasalamento.
O Grupo 2, formado por nove ovelhas não prenhes e um carneiro, foi introduzido na área
experimental no início do experimento. O experimento começou no mês de outubro de 2009,
período de estiagem, quando M. tenuiflora estava sementando. Nesse período as plantas foram
rebaixadas a 40 cm de altura e os galhos com folhas e sementes foram disponibilizados para
os ovinos na mesma área onde M. tenuiflora foi rebaixada. M. tenuiflora começou a rebrotar
ainda na estação seca antes do período de chuvas. No período de rebrota, as ovelhas ficavam
livres para pastar M. tenuiflora e recebiam concentrado em quantidade equivalente a 1% do
peso vivo. Após as primeiras chuvas, em meados de janeiro do ano seguinte, quando o estrato
herbáceo apareceu, essas ovelhas foram confinadas em baias, onde M. tenuiflora foi fornecida
até o fim do experimento. A cada 15 dias eram realizados exames ultrassonográficos para
acompanhamento da gestação. No Grupo 1, três ovelhas abortaram, cada uma um feto sem
malformações. Outra ovelha pariu dois cordeiros, um com hiperflexão na articulação inter-
falangeana proximal no membro torácico direito e outro sem malformações. Outra ovelha
pariu um cordeiro com hiperflexão dos dois membros pélvicos na região da articulação tarso-
metatársica. No grupo formado pelas ovelhas que foram acasaladas na área experimental, uma
ovelha abortou um feto sem malformações e cinco pariram cordeiros normais. Três das
ovelhas desse grupo não emprenharam durante todo o período experimental, mostrando
retornos repetidos ao cio, sugerindo perda embrionária. Trinta e duas ovelhas e um carneiro,
que permaneceram numa área vizinha a área experimental e foram utilizados como controle,
pariram cordeiros normais. Conclui-se que M. tenuiflora, além de causar malformações causa,
também, mortalidade embrionária e abortos em ovelhas.
TERMOS DE INDEXAÇÃO: Mimosa tenuiflora, aborto, malformações, mortalidade
embrionária, plantas tóxicas.
38
INTRODUÇÃO
Diversas plantas, incluindo Astragalus lentiginosus, Conium maculatum, Lupinus spp,
Nicotiana glauca, Nicotiana tabacum, Oxytropis spp. e Veratrum californicum, causam
anomalias craniofaciais e malformações do sistema músculo-esquelético em ruminantes,
como artrogripose, braquignatia, ciclopia e palatosquise (Keeler 1990, Cheeke 1998, Gardner
et al. 1998, Panter et al. 2000, 2011, James et al. 2004). Os principais teratógenos descritos
em plantas são alcaloides indolizidínicos, piperidínicos e quinolizidinicos (Keeler 1984,
Panter et al. 1994).
No nordeste do Brasil, a ingestão de Mimosa tenuiflora (jurema preta) tem sido
associada a malformações congênitas, incluindo anomalias ósseas craniofaciais,
malformações oculares e artrogripose em ovinos, caprinos e bovinos (Medeiros et al. 2005,
Nóbrega Júnior et al. 2005, Dantas et al. 2010). Pimentel et al. (2007) testaram os efeitos do
consumo de M. tenuiflora durante todo o período gestacional em cabras gestantes e
verificaram malformações, semelhantes às observadas nos casos espontâneos, em 75% das
crias. Medeiros et al. (2008) demonstraram o efeito teratogênico de M. tenuiflora ao
reproduzir malformações (fenda palatina, escoliose, esterno bífido, aplasia de esternebras,
hipoplasia do osso nasal) em 84% dos filhotes de ratas que receberam ração contendo 10% de
sementes, entre o 6º e o 21º dia de gestação.
Casos espontâneos de anomalias congênitas são descritos em ovinos criados
extensivamente no semiárido associados ao consumo de M. tenuiflora (Dantas et al. 2010); no
entanto, a ocorrência de defeitos congênitos em ovinos relacionados ao consumo dessa planta
não foram, ainda, confirmados experimentalmente. Assim, o objetivo desse trabalho foi
reproduzir malformações fetais em ovelhas prenhes que ingeriram M. tenuiflora durante a
gestação.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado nas dependências do Hospital Veterinário, da Universidade
Federal de Campina Grande, situado no município de Patos e também na Fazenda Caicú,
município de São José de Espinharas, Paraíba. Na fazenda foi demarcada uma área, de três
hectares (área experimental), 80% invadida por Mimosa tenuiflora. Nos outros 20% havia
Croton sonderianus (marmeleiro) e Caesalpinia bracteosa (Catingueira). A área está situada
na longitude S37°29´17´´, latitude W6°45´21´´ com altitude de 228 m.
Foram utilizadas 15 ovelhas e dois carneiros da raça Santa Inês, todos em idade
reprodutiva. Inicialmente, as ovelhas foram submetidas a exame ultrassonográfico para
39
confirmar diagnóstico negativo de gestação e os machos foram submetidos a exames
andrológicos a fim de determinar sua capacidade reprodutiva. Posteriormente, as ovelhas
foram identificadas e vermifugadas. As 15 ovelhas foram distribuídas aleatoriamente em dois
grupos. As seis ovelhas do Grupo 1 ficaram em curral com reprodutor no Hospital
Veterinário. O reprodutor era marcado com tinta vermelha na região do tórax e abdômen para
detecção do dia de cobertura pela impregnação da tinta no dorso das ovelhas. Vinte dias após
a cobertura era realizado exame ultrassonográfico; se confirmada a gestação, a ovelha era
encaminhada à área experimental. O Grupo 2 era composto por 9 ovelhas que ficaram na área
experimental com outro carneiro, também marcado com tinta vermelha. No final do dia, as
ovelhas eram recolhidas a baia determinando-se a data de cobertura caso as ovelhas
apresentassem mancha vermelha no dorso. Após 20 dias do dia de cobertura procedia-se a
ultrassonografia.
O experimento foi iniciado no mês de outubro de 2009, período seco, quando M.
tenuiflora estava sementando e as ovelhas consumiam as sementes que estavam no chão.
Nesse período as plantas foram rebaixadas a 40cm de altura para permitir a rebrota e os
galhos com sementes e folhas remanescentes foram disponibilizados na mesma área a campo,
para o acesso das ovelhas, tempo em que se aguardava a rebrota. M. tenuiflora começou a
rebrotar no mês de novembro, ainda na estação seca. No período de rebrota, as ovelhas
ficavam livres para pastar jurema preta que era a única fonte de alimentação volumosa, e
recebiam 1% de concentrado com base no peso vivo. Após as primeiras chuvas, em meados
de janeiro, brotou o estrato herbáceo, composto principalmente por Aristida setifolia (capim
panasco), Brachiaria plantaginea (milhã), Senna obtusifolia (mata-pasto) e Sida cordifolia
(malva branca). A partir daí, as ovelhas foram confinadas em baias e M. tenuiflora foi
fornecida até o fim do experimento. Os galhos da planta eram suspensos nas paredes laterais
das baias para facilitar a sua ingestão. A alimentação durante todo o experimento era
constituída de jurema preta à vontade e ração comercial em quantidade equivalente a 1% do
peso corporal e água ad libitum. A cada 15 dias era realizada ultrassonografia para
constatação da prenhez. Durante todo o experimento os animais foram observados
diariamente para detectar a ocorrência de abortos. As ovelhas com os cordeiros que nasceram
vivos malformados foram mantidas sob observação no Hospital Veterinário.
Durante o experimento, 32 ovelhas e um reprodutor permaneceram numa área de 17
hectares, da mesma propriedade, vizinha à área experimental, na qual havia escassas plantas
de M. tenuiflora. Esse rebanho foi, também, acompanhado, servindo como grupo controle.
40
RESULTADOS
No Grupo 1, das seis ovelhas que foram introduzidas na área experimental no 20º dia de
gestação, três abortaram fetos sem malformações, aos 52, 58 e 146 dias de gestação,
respectivamente. Nas necropsias não foram encontradas sinais de viabilidade nem lesões
significativas. Outra ovelha desse grupo pariu dois cordeiros, sendo que um apresentava
hiperflexão na articulação inter-falangeana proximal no membro torácico direito (Fig.1); esta
malformação reverteu-se após duas semanas. Outra ovelha pariu um cordeiro com hiperflexão
dos membros pélvicos na região da articulação tarso-metatársica (Fig.2). Esta lesão regrediu
em 28 dias. Apenas uma ovelha desse grupo teve parto normal e pariu um cordeiro sem
malformações.
No Grupo 2, das nove ovelhas, que estavam na área experimental, seis emprenharam
durante o período seco (outubro de 2009 a janeiro de 2010), quando estavam pastejando na
área com M. tenuiflora e três não emprenharam durante o período seco, mostrando cio e
acasalando repetidamente. Uma ovelha que emprenhou abortou aos 139 dias de gestação e as
outras cinco pariram cordeiros sem malformações, quatro partos simples e um gemelar. As
três ovelhas que não emprenharam no período seco permaneceram na área experimental com
o carneiro, após o início das chuvas, em janeiro de 2010, e pariram cordeiros normais em
junho do mesmo ano. As 32 ovelhas do rebanho utilizado como controle pariram 39 cordeiros
sem malformações. Uma teve um parto duplo distócico, morrendo os dois cordeiros.
Figura 1. Cordeiro mostrando hiperflexão na articulação inter-falangeana proximal no membro torácico direito, na intoxicação por Mimosa tenuiflora.
41
Figura 2. Cordeiro mostrando hiperflexão dos membros pélvicos na região da articulação tarso-metatársica, na intoxicação por Mimosa tenuiflora.
DISCUSSÃO
Neste trabalho observou-se a ocorrência de malformações em cordeiros nascidos de ovelhas
que ingeriram Mimosa tenuiflora, confirmando seu efeito teratogênico, semelhante ao
observado em trabalhos anteriores em caprinos (Pimentel et al. 2007) e ratos (Medeiros et al.
2008). Todavia, houve malformações de membros e não foram observadas malformações da
face, as quais são relatadas em casos espontâneos associados à ingestão de M. tenuiflora
(Nóbrega Junior et al. 2005, Dantas et al 2010). Em ovinos, o período de suscetibilidade
máxima às malformações começa quando a organogênese é iniciada em torno do 16º dia de
gestação e se estende na maioria dos órgãos até o 34° dia, quando termina a organogênese e
começa a fase fetal (Sinowatz 2010). Malformações ocorrem, também, em outras fases da
gestação, quando há alteração na conformação de uma estrutura do corpo que já sofreu
diferenciação normal, após o período de organogênese (Radostits et al. 2007). É o caso da
artrogripose, que ocorre devido à diminuição dos movimentos fetais (Gardner et al. 1998).
Panter et al. (1998) sugerem que esse tipo de malformação poderia ocorrer por ação de
bloqueio neuromuscular. As malformações observadas neste experimento regrediram após 14
e 28 dias, respectivamente. Isso pode ser porque a fixação artrogripótica dos membros
resultou de mobilidade fetal restrita, mas não o suficiente pra causar uma malformação
permanente. A gravidade da lesão depende, provavelmente, do grau de interferência do
principio ativo ingerido e da duração da redução dos movimentos fetais. O efeito teratogênico
42
é dose-dependente e a incidência, o tipo e a severidade da malformação dependem da
composição do principio ativo, do estágio da gestação em que ocorre a ingestão e da
quantidade do teratógeno ingerido (Panter et al. 1998, Welch et al. 2011). Alcaloides
esteroidais estão associados com malformações causadas por Astragalus lentiginosus, Conium
maculatum, Lupinus spp, Nicotiana glauca, Nicotiana tabacum, Oxytropis spp. e Veratrum
californicum (Keeler 1990, Cheeke 1998, Gardner et al. 1998, Panter et al. 2000, 2011, James
et al. 2004). O princípio ativo de M. tenuiflora é, ainda, desconhecido, mas alcaloides
derivados da triptamina foram isolados em folhas e sementes (Gardner et al. 2011).
Quando doses altas de princípios ativos ingeridas forem capazes de causar toxicidade
materna podem resultar em embrioletalidade ou mortalidade fetal (Panter et al. 1994, Bernardi
2002, Welch et al. 2011). M. tenuiflora não tinha sido, ainda, associada com abortos, o que
ficou evidenciando neste experimento. Algumas plantas como Astragallus spp. e Oxytropis
spp., além de causar deformações podem causar, também, morte fetal e aborto (Panter et al.
1994).
No Grupo 2, três ovelhas retornaram repetidamente ao cio e acasalaram mas não
emprenharam, possivelmente devido a mortalidade embrionária, como foi observado em
trabalho com caprinos (Dantas et al. 2012). Outras plantas associadas com malformações
causam, também, mortalidade e reabsorção embrionária, como Veratrum californicum,
quando é ingerida por ovelhas prenhes durante o período de 14 a 21 dias de gestação (Keeler
1990).
M. tenuiflora pode representar um grande obstáculo ao desempenho reprodutivo em
ovinos no semiárido; portanto, é importante evitar que ovelhas consumam M. tenuiflora
durante o período de acasalamento ou gestação. Numa região onde a disponibilidade de
forragem é limitada durante o período de estiagem, a melhor alternativa é a de armazenar
forragem na forma de feno e silagem durante o período das chuvas para alimentar as fêmeas
prenhes na seca.
Agradecimentos.- Trabalho financiado pelos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia
(INCT) para o Controle das Intoxicações por Plantas (CNPq. Proc. 573534/2008-0).
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45
CAPÍTULO III
Lisencefalia e hipoplasia cerebelar em caprino
O presente trabalho foi submetido à revista Research in Veterinary Science (Anexo 4).
As normas desta publicação encontram-se no Anexo 5.
46
Lisencefalia e hipoplasia cerebelar em caprino
José R. S. Santos, Antônio Flavio M. Dantas, Clarice Ricardo M. Pessoa, Tatiane R. Silva,
Daniel Pedrosa, Franklin Riet-Correa1
From the Universidade Federal de Campina Grande, Hospital Veterinário, Patos,
Paraíba, Brasil (Pimentel, Dantas, Riet-Correa). 1Corresponding Author: Franklin Riet-Correa, Veterinary Hospital, CSTR, Campina
Grande Federal University, Patos Campus, Patos, Paraíba 58700-000, Brazil.
ABSTRACT - A case of lissencephaly and cerebellar hypoplasia is reported in a goat. The
goat presented sternal recumbence, absent menace response, intention tremors, ataxia, and
nystagmus. The goat was euthanized and necropsied after been hospitalized during eleven
days. At necropsy, the surface of the brain was smooth, cerebral sulci and gyri were absent,
and the cerebellum was reduced in size. Histologically, in all cerebral cortex, the grey matter
was thicker and the white matter was thinner than normal. The neurons were arranged
randomly in the grey matter. In the cerebellum, the layers were disorganized and Purkinje
cells were observed within the molecular and granular layer. The histologic and gross lesions
are characteristic of lissencephaly associated with cerebellar hypoplasia. Lissencephaly is a
rare disease in veterinary medicine and had not been reported previously in goats.
Key words: agyria, brain, malformations, nervous system diseases.
Resumo. Um caso de lisencefalia e hipoplasia cerebelar é descrito em um caprino de 30 dias.
No exame físico apresentava incoordenação e incapacidade de ficar em pé, decúbito esternal
permanente, ataxia, ausência do reflexo de ameaça, tremores de intenção e nistagmo. Após 11
dias de internamento, o caprino foi eutanasiado e necropsiado. Na necropsia, o cérebro não
apresentava giros nem sulcos e o cerebelo estava reduzido de tamanho. Histologicamente, em
todo o córtex cerebral, a substância cinzenta estava mais espessa e a substância branca mais
fina que o normal. Os neurônios estavam distribuídos de forma aleatória na substância
cinzenta. No cerebelo, as camadas estavam desorganizadas, com localização heterotópica das
células. Os achados macroscópicos e histológicos são característicos de lisencefalia e
hipoplasia cerebelar. Lisencefalia é uma doença rara na medicina veterinária e não tinha sido
descrita em caprinos.
47
Palavras chaves: agiria, cérebro, malformações, doenças do sistema nervoso.
Lisencefalia é uma desordem no desenvolvimento do telencéfalo, caracterizada pela
ausência de circunvoluções e sulcos cerebrais (agiria), associada ao espessamento da camada
cortical (paquigiria) (De Lahunta e Glass, 2009). É uma condição que decorre de falha na
migração dos neuroblastos da zona ventricular e subventricular para o córtex cerebral, durante
o desenvolvimento embrionário (Ayala et al., 2007). É uma malformação relativamente
comum em seres humanos, resultante de mutações dos genes duplacortina (DCX), filamina-1,
LIS1, Tubulina A1A (TUBA1A) e reelina (RELN), que controlam a organização espacial e
temporal das células no córtex telencefálico (Ayala et al., 2007; Keays et al., 2007; Guerrini e
Parrini, 2010). Essa patologia é rara na medicina veterinária, relatada em cães da raça Lhasa
Apso, que apresentam predisposição racial, e gatos (Zaki, 1976; Saito et al., 2002; Hermann et
al., 2011). Outros tipos de malformações encefálicas podem ocorrer nos animais com
lisencefalia. Em cães das raças Setter Irlandês e Wire Fox Terrier são descritos casos de
lisencefalia associada com hipoplasia cerebelar (Greene et al., 1976) e em gatos associada a
microencefalia e hipoplasia de corpo caloso e cerebelo (Herrmann et al., 2011). Relatos de
malformações no sistema nervoso de caprinos são escassos (Washburn e Streeter, 2004). Este
trabalho reporta os achados clínicos e patológicos de um caso de lisencefalia associado à
hipoplasia cerebelar ocorrido em um caprino no semiárido da Paraíba, Brasil.
Um caprino macho, de 8 kg, sem padrão racial, com 30 dias de idade, foi atendido no
mês de maio de 2011, no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Campina Grande
(HV-UFCG), Campus de Patos – PB, com histórico de que desde o nascimento não conseguia
manter-se em estação. O animal era oriundo de um rebanho de 80 caprinos e ovinos de
diferentes idades, que eram criados extensivamente em pastagem nativa, onde havia
Aspidosperma pyrifolium que causa aborto (Medeiros et al., 2004) e Mimosa tenuiflora que
causa malformações (Pimentel et al., 2007). Não havia histórico de introdução recente de
animais no rebanho. Ao exame físico observou-se incoordenação e incapacidade do animal
ficar em pé, decúbito esternal permanente, ataxia, ausência do reflexo de ameaça, tremores de
intenção e nistagmo. Quando forçado a ficar em pé mostrava aumento da base de sustentação
caindo imediatamente. Na análise do líquido cefalorraquidiano não foram observadas
alterações.
O animal ficou em observação por 11 dias e como não havia melhora dos sinais
clínicos e o prognóstico era desfavorável, foi eutanasiado e necropsiado. Na necropsia,
observou-se ausência das circunvoluções e sulcos na superfície telencefálica (Figura-1A).
48
Observaram-se dois sulcos rudimentares, o sulco rinal lateral que separa o paleopálio
(rinencéfalo) do neopálio e o sulco esplenial que está na parte medial de cada hemisfério
cerebral entre a borda dorsal dos hemisférios cerebrais e o giro cingular. Além dessas
alterações, havia hipoplasia cerebelar acentuada. O verme e os hemisférios cerebrais eram
vestigiais (Figura 1A). Havia uma reduzida presença de folhas cerebelares. Não foram
observadas lesões nos demais órgãos.
Em cortes transversais seriados do encéfalo observou-se que nos córtices frontal,
temporal, parietal e occipital a substância cinzenta apresentava-se espessada (paquigiria) e a
substância branca mais delgada. A substância branca não se invaginava na substância cinzenta
(Figura 1B). O nódulo não estava presente no verme cerebelar e o quarto ventrículo estava
aumentado de tamanho.
O sistema nervoso central e os demais órgãos foram fixados em formol tamponado a
10%. Posteriormente, foram clivados e encaminhados para diafinização e embebição em
parafina. Em seguida foram realizados cortes de 5μm e corados com hematoxilina e eosina e
azul rápido de luxol para exame histológico. Nas lâminas coradas com azul rápido de luxol
não foi observada desmielinização. Nas lâminas coradas com HE observou-se que a
substância cinzenta estava mais espessada que o normal e a substância branca se apresentava
mais fina. Na substância cinzenta havia desorganização na citoarquitetura, sem a distribuição
laminar dos neurônios e organização em camadas. Os neurônios distribuíam-se aleatoriamente
sem padrão desde a camada mais superficial até a camada profunda (Figura1D). Na camada
molecular, os neurônios estavam irregularmente distribuídos. Em algumas seções havia
hipercelularidade e em outras hipocelularidade. O neocortex continha ninhos de neurônios
granulares e ilhas de substância branca heterotópica dispersas. Não havia uma delimitação
regular de transição entre a substância branca e a cinzenta. No hipocampo as células estavam
difusamente desorganizadas, muitas vezes agrupadas ou dispersas.
No exame histológico do cerebelo, disgênese cortical foi observada. O número e
tamanho das folhas estavam diminuídos. Nessas folhas havia uma desorganização das células
de Purkinje e das células granulosas, sem delimitação regular de transição entre as camadas.
A camada molecular estava diminuída. As células de Purkinje estavam irregularmente
distribuídas dentro da camada granular e da camada molecular. Na substância branca
cerebelar, havia neurônios heterotópicos distribuídos aleatoriamente, sugerindo falha na
migração neuronal. Ocasionalmente, aglomerados de neurônios granulares com raras células
de Purkinje foram observados na periferia dessa área, parecendo uma interrupção na formação
da folha cerebelar (Figura1C).
49
Figura 1. Caprino com lisencefalia e hipoplasia cerebelar. (A) Vista dorsal mostrando
ausência de giros e sulcos na superfície telencefálica e hipoplasia cerebelar. (B) Corte
transversal. A substância cinzenta está mais espessa que o normal (paquigiria) e a substância
branca mais fina. A substância branca não se invagina na substância cinzenta. (C) Cortex
frontal. Desorganização dos neurônios corticais é observada na substância cinzenta. Os
neurônios estão distribuídos aleatoriamente da camada molecular superficial até a camada
cortical mais profunda, sem padrão de organização laminar (H-E, 10x). (D) Cerebelo
mostrando disgênese cortical caracterizada por ninhos de neurônios granulares com raras
células de Purkinje na periferia da substância branca (H-E, 10x).
O diagnóstico de lisencefalia foi realizado com base nos achados macroscópicos e
histológicos. Até o momento não foram encontrados registros na literatura de casos de
lisencefalia em caprinos. A agiria e o espessamento da camada cortical do telencéfalo
decorrem de um processo de migração incompleto que resulta na desorganização estrutural do
posicionamento dos neurônios que deveriam formar ordenadamente seis camadas celulares,
para formação cortical normal (Ayala et al., 2007). Essa apresentação do telencéfalo é normal
em algumas espécies como coelhos, ratos, camundongos, pássaros e morcegos e não tem
50
significado funcional (Greene et al., 1976; Zachary, 2007). Nas outras espécies é considerada
uma anomalia congênita rara e está associada a alterações funcionais. A função depende das
conexões produzidas pelos neurônios e seus alvos. Se há posicionamento inadequado, há falha
nas conexões neurais, consequentemente as células não podem interagir normalmente,
refletindo em funções anormais e sinais clínicos (Ayala et al., 2007).
O comprometimento do córtex cerebral na lisencefalia é responsável por uma
sintomatologia inespecífica. No presente caso os sinais clínicos são característicos de lesão
cerebelar (Washburn e Streeter, 2004). Sinais como cegueira, depressão e convulsões que são
de origem cortical, descritos em cães, gatos e seres humanos não foram observados nesse
caso. Como todas as funções motoras são coordenadas pelo cerebelo, o alto grau de disfunção
cerebelar pode mascarar os sinais de origem cortical. Ataxia cerebelar não progressiva foi
descrita, também, em cão com lisencefalia associada à hipoplasia cerebelar (Greene et al.,
1976). Esses sinais manifestam-se no nascimento ou logo após, o que deve servir de base para
a suspeita de algum tipo de malformação (Greene et al., 1976).
A lisencefalia é uma anomalia limitada ao neopálio e a presença do sulco rinal lateral é
esperada tendo em vista que ele separa o neopálio do paleopálio olfatório (Summers et al.,
1994). O arquipálio hipocampal é descrito como normal em casos de lisencefalia em
mamíferos (Greene et al., 1976; Summers et al., 1994); no entanto, no presente trabalho foi
observada desorganização de neurônios também no hipocampo, semelhante ao observado em
ratos com lisencefalia (Fleck et al., 2000).
No presente caso, a lesão cerebelar e a telencéfalica são similares, sugerindo que o
mecanismo de falha no processo de migração neuronal é o mesmo para ambas as lesões, como
mencionado por De Lahunta e Glass (2009). Contudo, a lesão cerebelar, que inclui a falha na
migração neuronal e a hipoplasia cerebelar, é mais grave do que a lesão telencefálica,
sugerido que o cerebelo é mais afetado que o telencéfalo.
A presença de um único registro de caprino com malformação no rebanho e a
inexistência de lesões inflamatórias no cérebro e outros órgãos, sugere que a malformação não
teve origem infeciosa. Por se tratar de um único caso de uma malformação não descrita
anteriormente na espécie caprina é pouco provável que a mesma seja hereditária. Entretanto,
as lesões observadas neste caso são similares às observadas em outras espécies, em que a
causa é genética. Em humanos, os genes envolvidos na lisencefalia são LIS1 e DCX, mas
outros genes responsáveis por malformações associadas à lisencefalia são pouco conhecidos
(Ross et al., 2001; Keays et al., 2007). A combinação de microencefalia associada à
hipoplasia cerebelar e hipoplasia de corpo caloso tem sido associada em humanos a herança
51
autossômica recessiva devida a mutações dos genes TUBA1A e RELN (Ross et al., 2001;
Fallet-Bianco et al., 2008). O processo de desenvolvimento do córtex cerebral é único em
mamíferos (Ayala et al., 2007), sugerindo que o mecanismo da malformação seja o mesmo
para as diferentes espécies. No entanto, devemos considerar que uma mesma malformação
pode ser devida a diferentes causas (Radostitis et al., 2007). Neste caso é provável que a
origem da malformação seja devida a um erro ocasional no desenvolvimento, sem causa
aparente (esporádica). Em humanos, hipóxia intrauterina ou falha na perfusão têm sido
sugeridas como causa de lisencefalia (De Lahunta e Glass, 2009; Roessman e Hori, 1985).
Roessman e Hori (1985) afirmam que insulto anóxico durante a migração neuronal, resulta
em uma hipocelularidade e consequente desorganização das camadas do telencéfalo, causando
lisencefalia e microcefalia.
A presença da planta teratogênica Mimosa tenuiflora, na fazenda, não descarta a
possibilidade que este caso de lisencefalia foi causado pela ingestão da planta. M. tenuiflora
causa principalmente malformações ósseas, mas outras malformações como malformações
oculares e aplasia intestinal tem sido associada a ingestão dessa planta (Pimentel et al., 2007).
Embora, doenças associadas com falha na migração neuronal, como lisencefalia, são
raras em animais domésticos, elas devem ser incluídas no diagnóstico diferencial de doenças
do sistema nervoso de caprinos. Na possibilidade de ocorrência de novos casos seria
necessário investigar a possível origem genética da malformação como tem sido descrito em
outras espécies.
Declaração de interesses conflitantes
O(s) autor(es) declarou(ram) não ter potenciais conflitos de interesse em relação a
pesquisa, a autoria, e/ou publicação deste artigo.
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CONCLUSÕES
As malformações podem ocorrer na forma de surto como casos de intoxicação por
Mimosa tenuiflora ou casos esporádicos como a lisencefalia. A necessidade do estudo da
reprodução experimental das malformações associadas à Mimosa tenuiflora surgiu a partir de
investigações epidemiológicas que levaram a crer no seu potencial teratogênico. Não menos
importante o caso da lisencefalia em caprino, apesar de ser esporádico, demanda estudos no
sentido de se sua origem for gênetica, que seja identificada para que esse não se perpetue para
gerações posteriores. Só através de adequada investigação epidemiológica é que se pode
chegar a etiologia e traçar medidas eficientes para o seu controle.