Luiz Rijo Eletromagnetismo Com Matematica Vol1

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Eletromagnetismo

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  • Prefcio

    ELETROMAGNETISMO com MATHEMATICAR fruto de 25 anos de

    ensino das disciplinas de Eletromagnetismo e de Mtodos Eltricos e Eletro-magnticos no Curso de Ps-graduao em Geofsica do Centro de Geocin-cias da Universidade Federal do Par.

    Em virtude de Geofsica ser multidisciplinar, o universo de alunos nonosso curso de ps-graduao muito amplo, vindo de diversas reas doconhecimento: geologia, matemtica, fsica, engenharia eltrica, engenhariacivil e reas afins. Com uma platia to diversificada quanto esta, sempreum desafio iniciar, cada ano, o curso com novos alunos. Os graduados emgeologia chegam com conhecimentos modestos de matemtica e computao,e praticamente nenhum treinamento em eletromagnetismo. Os graduadosem matemtica, por sua vez, conhecem matemtica formal mas, pouca ex-perincia em computao cientifica e em eletromagnetismo. Os gradua-dos em fsica e engenharia eltrica trazem consigo alguns conhecimentos deeletromagnetismo, mas se ressentem da falta de treinamento nos aspectoscomputacionais desta matria, to necessrios s disciplinas avanadas dosmtodos geofsicos eltricos e eletromagnticos.

    O objetivo deste livro , na medida do possvel, suprir algumas dessasdeficincias. Trata-se, portanto, de um livro bsico orientado tanto para agraduao em geofsica, quanto para os alunos iniciantes ps-graduaonesta rea. Alunos de graduao em fsica, matemtica aplicada e engen-haria eltrica podem, igualmente, usufruir o livro como complemento sdisciplinas de computao cientfica.

    Sem os avanos tecnolgicos em computao (hardware e software) estelivro no teria sido concebido. Diferente dos livros tradicionais de eletromag-netismo, a nfase nos aspectos computacionais das equaes de Maxwellorientados para a soluo de problemas prticos. ai que o computador en-tra em sena e o principal ator o sistema Mathematica de computao sim-blica, numrica e grfica. O Mathematica um sistema revolucionrio quefacilita enormemente a aprendizagem e uso da matemtica tradicional. Com

    xi

  • xii PREFCIO

    ele, o trabalho, cansativo e desestimulante de efetuar clculos e mais clcu-los, assessorados por calculadoras de mo, torna-se coisa do passado, exata-mente como aconteceu, no incio da dcada de setenta, quando as primeirascalculadoras substituram as rguas de clculos. Com um detalhe, as calcu-ladoras programveis de hoje so infinitamente superiores as do passado. Olivro acompanha um CD-Rom que contm os Notebooks de todos os pro-gramas desenvolvidos no texto. Para minimizar repeties desnecessrias,muito deles esto restritos ao CD-Rom, indicados no texto pelo cone (*---

    Este programa se encontra no CD-Rom ---*) CD - ROM.

    O livro consta de dez captulos. O primeiro serve de vitrine aos de-mais. Nele, as equaes de Maxwell, nas formas integral e diferencial, soapresentadas axiomaticamente em cinco verses diferentes, da mais geral mais especializada, com vista Geofsica. A forma integral reflete as idiasoriginais de linha de fora e de fluxo de Faraday, que tanto influenciaramMaxwell. Por isso, acredito ser esta a melhor maneira de iniciar o estudo deeletromagnetismo.

    O segundo captulo traz uma sntese das ferramentas matemticas neces-sria decodificao das equaes de Maxwell. Inicia-se com as integraisde linha e de superfcie em comum acordo com as equaes de Maxwellna forma integral. A partir das integrais de linha e de superfcie se chegaaos operadores: rotacional e divergncia, fundamentais na representaodiferencial das equaes de Maxwell. A transformao de uma forma paraa outra se faz por intermdio dos Teoremas de Stokes e de Gauss. Por fim apresentada uma sntese sobre sries e transformadas de Fourier, ferramentasindispensveis para simplificar os problemas de eletromagnetismo

    O terceiro captulo de cunho histrico. De posse das ferramentasmatemticas, cada uma das equaes de Maxwell analisada cuidadosa-mente do ponto de vista histrico, fsico e matemtico. No final do terceirocaptulo espera-se que o leito se sinta vontade para usar inteligentementeas equaes de Maxwell e solucionar, de modo eficiente, problemas de eletro-magnetismo. A maneira como os trs primeiros captulos devem ser explo-rados depende do gosto de cada um. Talvez, alguns prefiram iniciar com oscaptulos dois e trs e voltar ocasionalmente ao primeiro captulo. Entre-tanto, acredito que uma viso panormica das equaes de Maxwell servede motivao para a preparao da base matemtica, objeto do segundocaptulo. De qualquer modo, os trs primeiros captulos devem ser lidos erelidos mais de uma vez para consolidar os princpios bsicos do eletromag-netismo. Eles no so difceis, mas so sutis. Por isso, no comeo precisoperseverana, persistncia e muito trabalho. Vencida a primeira etapa, os

  • xiii

    demais captulos seguiro tranqilamente sem nenhum problema.O quarto captulo se destina s primeiras aplicaes em eletrosttica.

    Neste caso as equaes de Maxwell se dissolvem na equao de Laplace.Iniciando com as coordenadas cartesianas, as sries de Fourier desempenhampapel fundamental na resoluo dos problemas deste captulo.

    A simetria cartesiana muito rgida e muito particular. Para se exploraroutras simetrias, notadamente, cilndrica e esfrica, preciso, antes de tudo,complementar a base matemtica iniciada no captulo dois. O objetivo destequinto captulo exatamente este. Oferecer uma introduo s funesespeciais (Bessel, Airy, Sturve, Polinmios de Legendre, funo erro, integralde Dalson, entre outras), s sries de Fourier-Bessel e Fourier-Legendre e stransformadas de Hankel e Laplace.

    O sexto captulo continua com a eletrosttica mas desta feita nos sistemasde coordenadas cilndrica e esfrica.

    Os problemas analisados no quarto e sexto captulos so do tipo cls-sico e tm pouca importncia na prtica, embora possuam valor acadmico,principalmente como motivao aos problemas mais interessantes que viroem seguida. Para solucionar problemas realmente prticos necessrio in-terveno do computador. ai que a nova tecnologia computacional entraem sena. Entretanto, preciso, primeiro, complementar, um pouco mais,o acervo de matemtica iniciado nos captulos dois e cinco. O stimo cap-tulo trata exatamente deste ponto. L ser apresentada uma introduo matemtica numrica, com nfase nos mtodos dos elementos finitos e nosmtodos das equaes integrais de elementos de volume e de elementos defronteiras, essenciais para a computao cientfica.

    No oitavo captulo, problemas de eletrosttica impossveis de serem re-solvidos pelos mtodos tradicionais dos captulos quatro e seis so agorafacilmente solucionados com a metodologia apresentada no stimo captulo.

    Tudo que foi feito at aqui apenas a preparao do terreno para os doisltimos captulos. So neles que a metodologia desenvolvida nos captulosanteriores mostrar toda sua beleza, utilidade e eficcia. Os problemasde eletromagnetismo aplicados geofsica se enquadram, normalmente, emduas categorias. Os mais simples, cujas fontes externas de corrente sofunes senoidais e os mais complexos, em que as fontes externas so pulsode corrente. No primeiro caso se diz que o problema se encontra no domnioda freqncia e no segundo caso, no domnio do tempo. O nono captulotrata dos problemas no domnio da freqncia.

    O dcimo, e ltimo, captulo abrange os problema no domnio do tempo.Comumente um problema no domnio do tempo equivale a vrios problemasno domnio da freqncia. A sntese feita por meio das transformadas de

  • xiv PREFCIO

    Fourier e de Laplace.Os dez captulos esto divididos em quatro categorias: a primeira for-

    mada pelos trs captulos iniciais e formam a base conceitual do eletromag-netismo; a segunda categoria formada pelos captulos 2, 5 e 7 que fornecemas ferramentas matemticas; a terceira categoria abrange os captulos 4, 6 e 8que nada mais so do que laboratrios de testes das ferramentas matemticasdesenvolvidas nos captulos 2, 5 e 7 e por fim, a ltima categoria, constitudados captulos nove e dez. O captulo dez o fecho do livro e engloba tudoque foi visto nos demais captulos.

    O diagrama a seguir mostra a interdependncia dos dez captulos. Con-forme o gosto do leitor h vrios caminhos para se chegar aos captulos novee dez. Eu proponho o caminho natural, passando por todos os captulos,embora longo o mais eficaz. As duplas setas sugerem que os captulos 1, 2e 3 devem ser relidos mais de uma vez.

    Cap. 5

    Cap. 4 Cap. 6

    Cap. 7 Cap. 9

    Cap. 8

    Cap. 10Cap. 2

    Cap. 1 Cap. 3

    Figura 1: Diagrama da interdependncia dos captulos.

    Os dez captulos formam material suficiente para dois semestres. Noprimeiro semestre vem-se os captulos de 1 a 6. No segundo semestre, osquatro ltimos captulos.

    Os pr-requisitos para a leitura do livro so bastante modestos. Umcurso bsico de clculo vetorial e de lgebra linear suficiente. Conheci-mento de eletromagnetismo no necessrio, entretanto, o leitor com al-guns conhecimentos bsicos de eletricidade e magnetismo se sentir mais vontade. Conhecimento prvio do sistema Mathematica tambm no essencial, todavia preciso ter familiaridade com o computador e algumasnoes preliminares de programao (Matlab, Pascal, Fortran, C++ etc).

    Os exerccios no final de cada captulo servem de treinamento e fixaodas idias desenvolvidas no texto e tambm complementam alguns tpicosomitidos no livro. Os exemplos dos programas que acompanha o CD-Rom apenas uma pequena amostra do que pode se feito. D asas sua imaginaoe explore novos horizontes. No h limite para isso!

  • Captulo 1

    Equaes de Maxwell

    1.1 Introduo

    Eletromagnetismo a parte da Fsica que lida com os fenmenos eltricos,magnticos e ticos. Eletromagnetismo o resultado, na forma de umateoria unificada, de vrios sculos de experimentos com esta classe de fen-menos. Em meados do sculo XIX, graas s investigaes de Ampre eFaraday, j se conhecia, experimentalmente, a inter-relao entre a elet-ricidade e o magnetismo. Faltava, entretanto, uma teoria que unificassetodos estes conhecimentos. Na poca, vrias teorias foram propostas. Entreelas, destacam-se a de Weber [2] a de Maxwell [30], [48], [84]. Esta l-tima prevaleceu, por sua elegncia, simplicidade e praticabilidade. De modoque hoje, eletromagnetismo universalmente reconhecido como sinnimo deTeoria Eletromagntica Maxwelliana. Um dos grandes triunfos da teoriade Maxwell reconhecer que os fenmenos ticos tambm so de origemeltrica e magntica.

    Evidncias cientficas e aplicaes tecnolgicas do eletromagnetismo per-meiam por toda parte. Cobrem, por exemplo, desde os delicados sinais eltri-cos do corao e do crebro humano (e dos outros animais, evidentemente)s nfimas radiaes de fundo em microondas provenientes do Big Bang. Istosem falar nas aplicaes tecnolgicas do dia-a-dia: rdio, TV, telefonia celu-lar, computadores, sensoriamento remoto, radar, motores eltricos, usinashidreltricas, instrumentos ticos, raios X, eletrocardiografia, tomografia,prospeco geofsica de gua subterrnea, explorao eletromagntica dedepsitos minerais, perfis eltricos de poos de petrleo, geofones etc, etc...,para citar apenas alguns poucos exemplos. O eletromagnetismo tambmest por trs de muitos fenmenos naturais: a aurora boreal, o eletrojato

    1

  • 2 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    equatorial, raios e troves, as cores do arco-ris, o azul do cu, a luz das es-trelas e o luar... E, por fim, sem o eletromagnetismo no haveria a Internet.

    praxe nos textos elementares, o eletromagnetismo ser apresentado deacordo com o seu desenvolvimento histrico. Inicia-se com a eletrosttica,seguida pela magnetosttica, galvanismo, eletricidade e por fim as equaesde Maxwell acompanhadas de algumas aplicaes simples como em [20], [29],[39], [44], [58], [60], [61],[63],[67] e [81]. Nos textos de nvel intermediriose faz o inverso, inicia-se axiomaticamente com as equaes de Maxwell ea partir delas se desenvolve todo o eletromagnetismo ([4], [13], [27], [69],[75] e [78]). Nos livros mais avanados, usa-se a formulao covariante dasequaes de Maxwell baseada no princpio da relatividade restrita de Ein-stein ([6], [33], [37], [51] e [66]).

    Como o objetivo primordial deste livro apresentar uma introduo aosaspectos computacionais do eletromagnetismo orientados para a Geofsica,acredito que a melhor abordagem aquela que segue a tendncia dos tex-tos de nvel intermedirio. Assim, neste primeiro captulo, as equaes deMaxwell sero apresentadas axiomaticamente, constituindo o ponto de par-tida de tudo que ser visto no restante do livro. O trs prximos captulostratam do simbolismo matemtico e da interpretao fsica das equaes deMaxwell. Os seis captulos seguintes preparam o embasamento para os trsltimos, nos quais as equaes de Maxwell sero aplicadas a vrios proble-mas prticos de eletromagnetismo. Tudo isso com a assistncia do programaaplicativo Mathematica.

    1.2 Representaes das Equaes de Maxwell

    A primeira dificuldade que os iniciantes em eletromagnetismo enfrentam amultiplicidade de representaes das equaes de Maxwell. Com um poucode exagero pode-se at afirmar que cada livro texto de eletromagnetismo trazdiferente representao destas equaes, nem sempre equivalentes. Algumasso mais gerais, outras mais especializadas, dependendo dos objetivos decada autor. Os livros dedicados aos fsicos apresentam formulaes maisgerais com vista aos fundamentos da teoria eletromagntica e sua inter-relao com outras reas da Fsica terica. Os de Engenharia Eltrica, poroutro lado, trazem verses especializadas das equaes de Maxwell voltadass diversas aplicaes tecnolgicas nas reas das telecomunicaes, gerao edistribuio de energia eltrica. Os livros de geofsica, por sua vez, adaptamas equaes de Maxwell s premissas impostas pelos fenmenos naturais epelas propriedades eltricas e magnticas das rochas.

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 3

    Neste primeiro captulo sero discutidas sucintamente cinco diferentesrepresentaes das equaes de Maxwell. instrutivo, do ponto de vistapedaggico, iniciar com a representao mais geral possvel e, por meio deum processo gradativo de simplificaes sucessivas, deduzir a formulaomais conveniente para as aplicaes a serem tratadas no texto. Digo in-strutivo pedagogicamente, porque desta maneira torna-se muito mais fcilacompanhar o significado fsico de cada uma das equaes de Maxwell, almde servir de motivao para o desenvolvimento das ferramentas matemticasnecessrias ao entendimento do eletromagnetismo e de suas aplicaes.

    Os leitores que j tm algum conhecimento de eletromagnetismo notero dificuldades em acompanhar este primeiro captulo. Aqueles que estoiniciando podem comear pelo segundo e terceiro captulos e voltar poste-riormente ao primeiro. O processo de aprendizagem de eletromagnetismo lento e requer pacincia e persistncia. Por isso, aconselhvel que os trsprimeiros captulos sejam lidos e relidos duas ou trs vezes, mesmo por aque-les que j tm algum conhecimento da matria. Ler e reler significa estudarcom afinco. Os fundamentos do eletromagnetismo so bastante sutis e porconseqncia devem ser estudados com muita dedicao. Isto, com certeza,facilitar a leitura do restante do livro. Garanto que valer a pena o esforo,pois alm de ser fundamental nesse mundo tecnolgico em que vivemos, ateoria eletromagntica belssima na sua essncia.

    No texto ser usado o Sistema Internacional (SI) de Unidades [metro(m), quilograma (kg), segundo (s) e ampre (A)]. Alm de ser o sistemaadotado nas aplicaes prticas, ele tambm tem a virtude de realar osaspectos fsicos e matemticos da teoria eletromagntica nos moldes em queesta ser apresentada aqui neste livro1.

    1.2.1 Campos microscpicos - E e BO conceito de campo eletromagntico fundamental em eletromagnetismo.Um campo eletromagntico, em uma regio de R3, um ente formadopor dois campos vetoriais2 E e B que satisfazem as equaes de Maxwelle cujas fontes so o campo escalar3 e o campo vetorial J . As duas con-

    1Alm do sistema SI existem outros sistemas de unidades, como o CGS e o sistemaLorentz-Heaviside, comuns em livros mais avanados de eletromagnetismo. A interpre-tao fsica do eletromagnetismo depende do sistema de unidades adotado. Os exercciosno final do captulo ajudam a entender isso.

    2Campo vetorial uma aplicao (funo) de uma regio de R3 em R3. Simbolica-mente, f : R3 R3.

    3Campo escalar uma aplicao (funo) de uma regio de R3 em R. Simbolica-mente, f : R3 R.

  • 4 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    stantes eletromagnticas 0 e 0 fazem parte da fsica e do balanceamentodimensional das equaes de Maxwell no SI. No segundo captulo ser vistodetalhadamente o que significam campo escalar e campo vetorial do ponto devista fsico-matemtico. Os dois campos vetoriais que especificam o campoeletromagntico so: o campo eltrico E (V/m, volts por metro) e o campode densidade de fluxo magntico B(T , tesla)4. As fontes de corrente soformadas pela densidade de carga eltrica (C/m3, coulomb por metrocbico) e pela densidade de corrente eltrica J (A/m2, ampres por metroquadrado). As constantes eletromagnticas so a permissividade eltrica novcuo 0 = c2/0 (farad por metro) e a permeabilidade magntica no vcuo0 = 410

    7 (henry por metro), sendo a constante c = 299792458 m/s avelocidade da luz no vcuo.

    A interpretao fsica do eletromagnetismo realada quando se es-crevem as equaes de Maxwell na forma integral [69]. Maxwell usou esteexpediente para construir sua teoria [48]. Por isso, vamos iniciar nosso es-tudo escrevendo as equaes de Maxwell desta forma. Mas antes precisoesclarecer alguns conceitos geomtricos em R3.

    Visualizemos, ento, as duas superfcies orientadas ilustradas na Figura1.1, denominadas de superfcies de Gauss.

    A superfcie esquerdo uma superfcie fechada e a do lado direito umasuperfcie aberta. A superfcie aberta possui uma fronteira, isto significa queexiste na borda da superfcie uma curva fechada na forma de um aro. A su-perfcie fechada, ao contrrio, no tem fronteira, ela, simplesmente, encerracompletamente uma regio do R3, formando, ela mesma, a fronteira de umaregio tridimensional. Uma superfcie orientada significa que ela possuidois lados, um interno e outro externo5. Alm de orientadas vamos exigirque elas sejam suaves6, isto , em cada ponto da superfcie existe um vetorunitrio n, normal ao plano tangente superfcie nesse ponto, orientadopositivamente de dentro para fora. A borda da superfcie aberta tambm orientada e a sua orientao, identificada pelo vetor tangente t, positivaquando percorrendo a borda, o lado esquerdo fica para dentro da curva. De-

    4Veremos mais adiante que o campo E e o campo B so bem diferentes do ponto devista fsico. O primeiro um campo de fora e o segunda um campo de fluxo. Por isso,usamos dois tipos diferentes de letras para represent-los.Muitos autores, especialmente os fsicos e os geofsicos especializados em geomagnetismo,

    preferem denominar o campo B de campo magntico em vez de densidade de fluxo mag-ntico e represent-lo pelo smbulo B.

    5Nem todas superfcies so orientveis, um exemplo famoso a faixa de Mbius [50],[63].

    6Na realidade, suave por partes, unio de superfcies suaves.

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 5

    V

    y

    z V

    x(a) (b)

    x

    S

    y

    z

    S

    Figura 1.1: Superfcies de Gauss: (a) superfcie fechada orientada, (b) su-perfcie aberta orientada.

    nominamos de S a superfcie aberta e de S a sua borda, isto , a fronteirade S. Do mesmo modo denominamos de V a regio do R3 encerrada pelasuperfcie fechada V . Assim, o smbolo identifica as fronteiras, seja dasuperfcie aberta S ou da regio fechada V . Cabe salientar que estas super-fcies so objetos matemticos e portanto virtuais, sem nenhum significadofsico, a priori. Desse modo, quando digo visualizar me refiro visualizar namente, de olhos vendados. Tente isto! Embora virtuais, estas superfcieisdesempenham o papel de sensores para se detectar o campo eletromag-ntico. Se, primeira vista, tudo isto parece abstrato, no se desanime.Tudo ser devidamente esclarecido nos segundo e terceiro captulos.

    De posse das superfcies orientadas que acabamos de idealizar, as equaesde Maxwell, em sua formulao mais geral, se escrevem da seguinte maneira,Z

    V0E nds =

    ZVdv, (1.1)Z

    S

    B0 tdl

    t

    ZS

    0E nds =ZSJ nds, (1.2)Z

    VB nds = 0, (1.3)Z

    SE tdl +

    t

    ZSB nds = 0. (1.4)

    A primeira equao representa a lei de Coulomb, a segunda, a lei deAmpre, a terceira, a lei de Gauss e a quarta, a lei de Faraday. No terceiro

  • 6 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    captulo ser analisado, detalhadamente, o porqu dessas denominaes. Es-tas equaes so absolutamente gerais, so vlidas tanto no vcuo quantoem qualquer tipo de meio (isotrpicos, biisotrpicos, anisotrpicos, bian-isotrpicos, lineares, lineares simples e no-lineares)7. Os campos E e Bso conhecidos como campos microscpicos. A razo desta denominao porque eles so expressos em termo de foras (efeitos) e no em termos dasfontes (causas).

    As integrais acima so de trs tipos: integral de linhaRC f tdl, integral

    de superfcieRS g nds e integral de volume

    RV pdv. Boa parte do captulo

    dois ser dedicada a estas integrais. recomendvel parar por alguns instantes e apreciar atentamente as

    quatro equaes8 que acabamos de apresentar. Elas formam um conjuntoharmonioso e de belssima simetria. Equaes matemticas no so apenasarranjos embaralhados de smbolos. Muito pelo contrrio, elas normalmentetransmitem mensagens codificadas de como a natureza funciona. Uma vezentendidas, revelam beleza e simplicidade dos segredos da natureza. Paraapreciar isto, preciso saber decodificar a mensagem contida em qualquerequao e reconhecer precisamente o papel de cada um dos seus smbolos. Noprximo captulo veremos como decodificar as equaes de Maxwell. Comorecompensa, teremos o prazer de apreciar a simplicidade e coerncia destasequaes e ao mesmo tempo preparar o terreno para o restante do livro.

    Observando-se atentamente as equaes (1.1 - 1.4), verifica-se que elasformam dois pares de duas equaes. O primeiro par formado pela lei deCoulomb e pela lei de Ampre. O segundo par, pela lei de Gauss e pelalei de Faraday. No primeiro par, (1.1 - 1.2), o campo eltrico E aparecemultiplicado por 0 nas integrais de superfcie e o campoBdividido por 0na integral de linha. Estas combinaes 0E e B/0 no so meras oper-aes algbricas. Formam novos campos vetoriais cujas dimenses so C/m2

    (coulomb por metro quadrado) e A/m (ampre por metro), respectivamente.As fontes de corrente esto no lado direito do primeiro par de equaes. Nosegundo par no existem fontes e as integrais de linha e de superfcies atuamdiretamente nos campos E e B. Note que os campos B/0 e E tm algoem comum, eles aparecem nas integrais de linha nas leis de Ampre e deFaraday. Analogamente, 0E e B aparecem nas integrais de superfcies nalei de Coulomb e na lei de Gauss, respectivamente. Dessas observaes v-seque o segundo par de equaes tem a mesma estrutura do primeiro par, com

    7Mais adiante veremos o que significam meios isotrpicos, biisotrpicos, anisotrpicos,bianisotrpicos, lineares, lineares simples e no-lineares.

    8Na realidade so oito equaes: uma da lei de Coulomb, trs da lei de Ampre, umada lei de Gauss e trs da lei de Faraday.

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 7

    a ressalva que as fontes de corrente s aparecem no primeiro par. A falta desimetria no lado direito dos dois pares de equaes deve-se ao fato de nohaver na natureza cargas magnticas isoladas. Todas essas observaes queacabamos de fazer sero minuciosamente analisadas no quarto captulo dolivro.

    importante citar que em muitos textos de eletromagnetismo as quatroequaes de Maxwell no seguem a mesma seqncia apresentada aqui. comum encontrar as leis de Faraday e Ampre grafadas em primeiro lugare as de Coulomb e de Gauss por ltimo. Ou ainda, a lei de Coulomb e a leide Gauss vm em primeiro lugar e as de Faraday e Ampre logo em seguida.H muitas outras combinaes em voga. Na verdade h 4! = 24 maneirasdiferentes de permutar as equaes de Maxwell! Por mera curiosidade euj fiz uma pesquisa e identifiquei 24 livros textos de eletromagnetismo, umpara cada uma dessas permutaes. A seqncia apresentada acima, almde sua simplicidade e elegncia facilita a interpretao fsico-matemtica dasequaes de Maxwell e corrobora com as formulaes mais avanadas destasequaes9. Curiosamente ela coincide com a seqncia cronolgica no desen-volvimento do eletromagnetismo. Todavia, do ponto de vista computacionalno importa a ordem seqencial das equaes.

    1.2.2 Campos macroscpicos D e HComo j foi dito antes, a representao das equaes de Maxwell (1.1 - 1.4),em termo dos campos microscpicos E e B, absolutamente geral. Ela tema vantagem de ser compacta10 e de desvendar a fsica do eletromagnetismonuma linguagem matemtica simples e elementar. Elas so to simples e toconcisas que as propriedades eltricas do meio passam por despercebidas. Asconstantes dimensionais 0 e 0 representam o vcuo e portanto nada dizema respeito de qualquer meio fsico. Assim, a questo saber onde as in-formaes sobre o meio interveniente se manifestam.nas equaes. fcildescobrir. Basta observar que as fontes de corrente e J correspondem totalidade das fontes, externas e internas. No vcuo apenas fontes exter-nas so permitidas. Em qualquer outro meio, cargas eltricas (livres e de

    9No espao-tempo tetradimensional, o primeiro par forma uma nica equao tenso-rial. O segundo par equivale a uma segunda equao tensorial, [51], [66]. No espaotridimensional, as duas equaes tensoriais se desacoplam nas quatro equaes vetoriaisapresentadas no texto.Usando-se uma linguagem matemtica mais sofisticada as quatro equaes vetoriais

    podem ser reduzir a uma nica equao no espao-tempo tetradimensional, [6], [62].

    10Veja a nota de rodap anterior.

  • 8 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    polarizao) constituem efetivamente fontes internas. Em outras palavras,os meios, com exceo do vcuo, so constitudos por cargas eltricas quese deslocam na presena de campos eletromagnticos. Estes deslocamentospodem se dar a grandes distncias (na escala atmica) ou serem infinita-mente pequenos. No primeiro caso, as fontes so chamadas de livres (livrespara se deslocar) e no segundo caso so denominadas fontes de polariza-o. Veremos no quato captulo que essas fontes de polarizao do origemaos campos eletromagnticos mascroscpicos D (C/m2, coulomb por metroquadrado) chamado de densidade de fluxo eltrico e H (A/m, ampre pormetro) denominado de campo magntico.

    Com estes novos campos, veremos que as equaes de Maxwell podemser reescritas da seguinte maneira,Z

    VDnds =

    ZVfdv (1.5)Z

    SH tdl

    t

    ZSDnds =

    ZSJf nds, (1.6)Z

    VBnds = 0, (1.7)Z

    SE tdl +

    t

    ZSBnds = 0, (1.8)

    em que f e Jf so, respectivamente, a densidade de cargas eltricas livres ea densidade de correntes eltricas livres. Note que apenas o primeiro par deequaes foi re-arrumado e o segundo no, devido ausncia de fontes. importante deixar claro que este sistema de equaes de Maxwell, (1.5 - 1.8), absolutamente equivalente ao primeiro sistema (1.1 - 1.4). interessanteobservar a equivalncia entre as dimensionalidades dos campos D e 0E eanalogamente entre os campos H e B/0.

    1.2.3 Meio simples, D = E e B = H - integralAs equaes (1.5 - 1.8) so muito gerais para as aplicaes tecnolgicas doeletromagnetismo. A razo disto que as propriedades eltricas e mag-nticas dos meios ainda no se fazem transparecer nestas equaes. Soexatamente as propriedades intrnsecas do meio o elo entre os campos mi-croscpicos E e B e os campos macroscpicosH e D. O inter-relacionamentoentre estes campos se faz por intermdio de relaes chamadas constitutivase obviamente elas dependem das caractersticas eltricas e magnticas decada meio. Em geral, as relaes constitutivas so bastante abrangentes e

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 9

    complexas [37]. Entretanto, nos meios ditos simples as relaes constitutivasse reduzem relaes de proporcionalidade do tipo D = E e B = H [27].Em muitos casos de interesse prtico, os meios se comportam como meiossimples. o caso, por exemplo, dos meios geolgicos11.

    As constantes eltricas e so denominadas, respectivamente, depermissividade eltrica e permeabilidade magntica do meio. A unidadedimensional de F/m, (farad por metro) e de H/m (henry por metro).O termo constante embora corriqueiro, no apropriado, pois e no so constantes propriamente ditas e sim campos escalares definidos emregies de R3. Apenas no vcuo elas so constantes e coincidem numerica edimensionalmente com 0 e 0, respectivamente.

    Levando em considerao as relaes constitutivas para meios simples,as equaes (1.5 - 1.8) se reduzem aZ

    VEnds =

    ZVfdv, (1.9)Z

    SH tdl

    t

    ZS

    Ends =ZSJf nds, (1.10)Z

    VHnds = 0, (1.11)Z

    SE tdl +

    t

    ZSHnds = 0. (1.12)

    importante atentar que esta verso das equaes de Maxwell muitomais restritiva do que as duas anteriores. Isto , elas no so equivalentesquelas. Com efeito, esta nova verso s vlida para meios simples, en-quanto que as anteriores so verdadeiras em qualquer situao.

    1.2.4 Meio simples, D = E e B = H - diferencialNo obstante a forma integral das equaes de Maxwell, (1.9 - 1.12) ser,no meu entendimento12, a formulao mais conveniente de se introduzir oeletromagnetismo, ela, a bem da verdade, no totalmente apropriada parase resolver problemas prticos de eletromagnetismo. A razo disto queestes so mais fceis de serem resolvidos na forma de equaes diferenciais.Assim, preciso transformar as equaes de Maxwell da forma integral para11No terceiro captulo discutiremos um pouco mais sobre relaes constitutivas mais

    complexas.12A forma integral no s facilita compreender a fsica do eletromagnetismo como serve

    de motivao para o desenvolvimento do aparato matemtico necessrio para se trabalharcom o eletromagnetismo.

  • 10 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    a forma diferencial. Heuristicamente, isto alcanado tornando as super-fcies S e V , da Figura 1.1, arbitrariamente pequenas e usar ferramentasmatemticas apropriadas para proceder o limite. Os captulos dois e trssero dedicados precisamente a esta questo. Dito isto, vamos adiantaras equaes de Maxwell na representao diferencial que correspodem sequaes (1.9 - 1.12) na forma integral,

    E = f , (1.13)

    H Et

    = Jf , (1.14)

    H = 0, (1.15)

    E + Ht

    = 0. (1.16)

    Aqui tambm, a primeira equao denominada de lei de Coulomb, asegunda chamada lei de Ampre, a terceira, representa a lei de Gausse finalmente a quarta a lei de Faraday. Como ja foi dito, nos segundoe terceiro captulos veremos como transformar as equaes de Maxwell daforma integral, (1.9 - 1.12), para a forma diferencial, (1.13 - 1.16) e comoprmio, teremos oportunidade de desvendar a fsica do eletromagnetismo.

    Se as funes que caracterizam os meios ( e ) forem contnuas e oscampos E e H forem diferenciveis as duas formas - integral (1.9 - 1.12) ediferencial (1.13 - 1.16) - sero absolutamente equivalentes do ponto de vistamatemtico. Se falhar qualquer uma dessas hipteses, as equaes (1.9 -1.12) deixam de ter sentido matemtico e por conseqncia perdem sentidofsico tambm. Ento, o que fazer neste caso? Recorrer s equaes na formaintegral, visto que elas funcionam independentemente da continuidade dee e de E e H serem ou no diferenciveis. Em verdade, basta que essasfunes sejam contnuas por partes13 para que a forma integral das equaesde Maxwell funcione perfeitamente.

    Fazendo-se as superfcies S e V tenderem para zero, veremos, no ter-ceiro captulo, que nas regies onde h descontinuidade de dois meios as

    13A grosso modo, funes contnuas por partes so aquelas com um nmero finito dedescontinuidades limitadas. No segundo captulo veremos uma definio mais precisa.

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 11

    equaes de Maxwell na forma integral, (1.19 - 1.22), se reduzem a

    n1E1 2E2

    = s, (1.17)

    nH1H2

    = Js, (1.18)

    n1H1 2H2

    = 0, (1.19)

    nE1E2

    = 0. (1.20)

    em que n o vetor unitrio normal superfcie que separa os dois meios e se Js so as densidades superficiais de cargas e correntes, respectivamente. Ossubscritos 1 e 2 indicam os meios limtrofes superfcie de descontinuidade,como ilustra a Figura ??.

    Observando atentamente as equaes (1.17 - 1.20) nota-se que elas lem-bram as equaes (1.13 - 1.16). De fato, basta substituir o operador nabla pelo vetor n, fazer /t igual a zero, substituir Jf e f por Js e s econsiderar no lugar dos campos a sua diferena. Na literatura, as equaesde Maxwell (1.17 - 1.20) so denominadas de condies de fronteiras entredois meios de propriedades eltrica e magntica distintas.

    De todo que foi dito, chegamos seguinte concluso. A forma integraldas equaes de Maxwell o ponto de partida para a deduo das equaesna forma diferencial e das condies de fronteiras. Estas como j foi dito,so as equaes que efetivamente so usadas na soluo de problemas deeletromagnetismo. Assim, a partir de agora vamos nos concentrar apenasna forma diferencial das equaes de Maxwell e nas condies de fronteiras.Neste captulo, no precisamos mais das equao de Maxwell na forma in-tegral. Por enquanto, elas j fizeram a sua parte.

    1.2.5 Domnio do tempo: E (t) e H (t)

    As equaes (1.13 - 1.16) ainda so bastante gerais para os objetivos destelivro. Precisamos, por exemplo, identificar qual o termo que representa aantena transmissora de energia eletromagntica. Em geofsica, esta questo de suma importncia, uma vez que o uso do transmissor fundamentalpara a comunicao com a terra.

    A densidade de corrente Jf pode ser decomposta em duas partes. Uma,denominada de JTx, que energiza a antena do transmissor e a outra parte,Ji, que flui dentro do meio onde o campo eletromagntico se propaga. Estasegunda parte, chamada de correntes induzidas,.so de dois tipos: corrente

  • 12 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    Meio 2

    Meio 1s

    s

    m

    m

    1

    2

    1

    2

    Figura 1.2: Descontinuidades de e entre dois meios separados por umasuperfcie suave.

    de deslocamento e correntes de conduo ou hmicas. Os meios onde as cor-rentes de deslocamto sobressai s micas, so chamados de dieltricos. Casocontrrio, so chamados de condutores. Nos bons condutores a permissividaeltrica praticamente igual a 0, enquanto que as correntes de conduosatisfazem a lei de Ohm, Ji = E, em que a condutividade do meio emsiemens por metro (S/m).

    Como foi dito acima, as equaes (1.13 - 1.16) so ainda muito genri-cas para os nossos objetivos. Para simplific-las vamos supor que as pro-priedades e no variam com o tempo. Esta hiptese bastante razovel,principalmente em geofsica. Assim, podemos, finalmente, escrever,

    E = f , (1.21)

    H Et E = Jtx, (1.22)

    H = 0, (1.23)

    E + Ht

    = 0. (1.24)

    em que a densidade de corrente Jf foi desdobrada em Jtx + E.Normalmente nos meios condutivos a permissividade praticamenteAs

    equaes de condies de fronteiras (1.17 - 1.20) no precisam ser modifi-cadas. Mas, preciso que se faa uma resalva. Embora a condutividade no aparea diretamente nas equaes de condies de fronteiras, ela in-diretamente interfere no comportamento do campo eltrico E na interface

  • 1.2. REPRESENTAES DAS EQUAES DE MAXWELL 13

    de dois meios de condutividades diferentes. Descontinuidade nas condutivi-dades geram cargas nas interfaces dos meios e por conseqncia a compo-nente normal do campo eltrico descontnua na interface, mesmo sendocontnuas a permissividade eltrica e a permeabilidade magntica dos doismeios. Descontinuidade em resulta em acmulo de cargas na interface dedescontinuidade. O termo s em (1.17) tambm leva em conta essas cargas,mesmo que seja contnua. Em geofsica os efeitos das descontinuidadesna condutividade so muito mais proeminentes do que os da permissividadeeltrica e da permeabilidade magntica. Ademais, se as condutividades dosdois meios forem finitas, como o caso em geofsica, a densidade de correntede superfcie Js identicamente nula.

    Dito isto, vamos repetir as equaes (1.17 - 1.20),

    n1E1 2E2

    = s, (1.25)

    nH1H2

    = 0, (1.26)

    n1H12H2

    = 0, (1.27)

    nE1 E2

    = 0. (1.28)

    A exemplo de e , a condutividade eltrica geralmente no varia como tempo, embora em alguns casos isolados isto pode acontecer. Via de regra,as correntes Jtx injetadas no transmissor variam com o tempo. Quando avariao temporal de Jtx do tipo pulsos de corrente costuma-se dizer queo problema est no domnio do tempo. No caso particular em que JTx, Ee H so independentes do tempo, as equaes de Maxwell se desacoplamem equaes mais simples dando origem magnetosttica. No caso extremode haver somente cargas estacionrias, apenas o campo eltrico sobrevive eneste caso tudo se resume eletrosttica.

    1.2.6 Domnio da freqncia: E () e H ()

    A riqueza do eletromagnetismo est na variao temporal das correntes e doscampos eltrico e magntico. Entretanto, na maioria dos problemas prticosde eletromagnetismo a variao temporal de JTx (t) bem simples. Senoidal,por exemplo. Alm de sua simplicidade, a variao senoidal pode ser usadapara reconstituir qualquer pulso de corrente. Por isso, a variao senoidaldesempenha papel importantssimo em eletromagnetismo. Em virtude dalinearidade das equaes de Maxwell, se JTx (t) senoidal, os campos eltricoe magntico tambm o so. Nesse caso se diz que eles esto no domnio

  • 14 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    da freqncia ou que os campos so harmnicos [27]. Para distinguir umdomnio do outro, vamos usar letras maisculas em negrito, sem seta, paraexpressar as correntes Jtx e os campos E e H no domnio da freqncia.Para distinguir a densidade de cargas livres nos dois domnios usaremos,simplesmente, os smbolos f no domnio do tempo e f () no domnio dafreqncia.

    No terceiro captulo ser visto que no domnio do tempo a derivada comrelao ao tempo equivalente a multiplicar pelo fator i, no domnio dafreqncia. Aqui, significa freqncia angular (radianos por segundo) e i a constante imaginria (i2 = 1). Veremos tambm como transformar asequaes de Maxwell de um domnio para o outro.

    Feitas essas observaes, as equaes de Maxwell (1.21 - 1.24), no domniode freqncia, tm a seguinte aparncia,

    E = f () , (1.29)H ( + i )E = JTx, (1.30)

    H = 0, (1.31)E+ iH = 0. (1.32)

    Analogamente, as relaes de fronteiras (1.25 - 1.28) se transformam em

    n ( 1E12E2) = qs () , (1.33)n (H1H2) = 0, (1.34)

    n (1H1 2H2) = 0, (1.35)n (E1E2) = 0. (1.36)

    Para concluir, oportuno observar que as equaes de Maxwell no domniodo freqncia so bem mais simplificadas que todas outras anteriores nodomnio do tempo. Isto ser visto detalhadamente no quaro cappulo.

    1.3 Sumrio

    Na segunda metade do sculo XIX foram propostas vrias teorias para ex-plicar numa nica abordagem os fenmenos eltricos, magnticos e ticos,at ento conhecidos. Entre todas elas, a de Maxwell a mais popularpor sua simplicidade e versatilidade, tanto do ponto de vista terico comoprtico. Inicialmente, Maxwell props vinte equaes que posteriormente,aps a sua morte, aos 48 anos, foram reescritas por Heaviside em oitoequaes que deram origem as quatro equaes vetoriais universalmente

  • 1.3. SUMRIO 15

    Cam

    po

    s Micro e Macroscpicos

    Domn

    io do Tempo

    Dom

    nio da Freqncia

    Meios Simples

    Figura 1.3: Diagrama das simplificaes sucessivas das equaes de Maxwell.

    conhecidas como equaes de Maxwell. Estas equaes podem ser repre-sentadas tanto na forma integral como diferencial. A forma integral maisconveniente para visualizar o contedo fsico das equaes. Por outro lado,a representao diferencial mais vantajosa para se fazer os clculos

    Neste primeiro captulo, fizemos um vo panormico sobre as equaesde Maxwell. Nos dois prximos captulos aterrissaremos para apreciar osdetalhes.

    No vo panormico foram apresentadas cinco verses das equaes deMaxwell. A primeira verso tratou apenas dos campos microscpicos Ee B, sem levar em considerao nenhuma informao, a priori, sobre aspropriedades eltricas e magnticas dos meios intervenientes. Na segundaverso os meios j se fazem presentes por meio dos campos macroscpicosD eH, embora ainda de modo camuflado. Estas duas verses so absolutamenteequivalentes e so demasiadamente gerais para os nossos objetivos. Por isso,na Figura 1.3, o crculo correspondente a estas duas verses abrange todosos demais crculos ligados s verses mais especializadas.

    As equaes da terceira verso so bem mais restritivas, porque elass funcionam em meios lineares simples, enquanto que as das duas versesanteriores so vlidas para quaisquer tipo de meio. Nesta terceira versoas equaes de Maxwell so apresentadas tanto na forma integral como na

  • 16 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    forma diferencial. Nos meios em que as fontes so contnuas as duas for-mulaes so equivalentes. Se isto no acontece, a forma integral continuavlida mas a diferencial no. preciso nesse caso complementar as equaesna forma diferencial com as condies de fronteira, as quais nada mais sodo que o limite das equaes de Maxwell na forma integral na vizinhanade pontos de descontinuidade das fontes internas do meio. Assim, para seresolver um problema tpico de eletromagnetismo usam-se as equaes deMaxwell na forma diferencial complementadas pela condies de fronteiraonde o meio apresenta descontinuidades em suas propriedades eltricas e oumagnticas.

    Na quarta verso, alm das propriedades e , a condutividade tam-bm entra em jogo. Isto se deve separao das correntes livres Jf emcorrentes induzidas, Ji = E, no meio e nas correntes JTx no transmissor.Em muitas aplicaes as correntes no transmissor so do tipo pulsos de cor-rentes. Usa-se o termo domnio do tempo quando a energizao deste tipo.Em virtude desta particularidade a quarta verso mais simplificada que asanteriores, em que a variao temporal geral.

    Na ltima verso, a mais simplificada de todas, as equaes de Maxwelltambm envolve o tempo, porm de maneira bastante especial. O tempo,agora, varia de forma senoidal com uma freqncia fixa, e por isso se diz queas equaes esto no domnio da freqncia. O mais interessante de tudoisso que em muitos casos a soluo de um problema no domnio do tempose reduz a vrios problemas simples no domnio da freqncia.

    Sinceramente, possvel que o leitor, principalmente os iniciantes aoeletromagnetismo, no tenha absorvido completamente todas as nuanasdiscutidas neste primeiro captulo. Mas, eu espero que o leitor esteja agorasuficientemente motivado para juntos descobrirmos os segredos do eletro-magnetismo. Afinal de contas o propsito deste primeiro captulo servirde motivao para o desenvolvimento dos dois prximos captulos. L, tenhocerteza que tudo ficar transparente, claro como o dia!

    1.4 Exerccios

    1. No Sistema Internacional de medidas usa-se os smbolos L (metro),M(quilograma), T (segundo) e A (ampre) para representar as unidadesde comprimento, massa, tempo e corrente, respectivamente. Sabendo-se que fora massa vezes acelerao (segunda lei de Newton), quecampo eltrico fora por unidade de carga e que corrente carga porunidade de tempo:

  • 1.4. EXERCCIOS 17

    Verifique que a representao dimensional de campo eltrico E MLT3A1 (volt/m),

    Use a lei de Faraday (1.4) para mostrar que a representaodimensional da densidade de fluxo magntico B MT2A1

    (tesla),

    Use a lei de Coulomb (1.1) para mostrar que a representaodimensional de 0 M1L3T 4A2 (farad/m)

    Use a lei de Ampre (1.2) para mostrar que a representao di-mensional 0 MLT

    2A2 (henry/m)

    Use estes resultados e conclua que as representaes dimensionaisde 0E e B/0 so, respectivamente, L

    2T A (coulomb/m2) eL1A (ampre/m).

    O objetivo desse exerccio convencer o leitor que os campos vetoriais0E e B/0 so fisicamente diferentes dos campos E e B. Esta difer-ena crucial para o entendimento do significado fsico das equaesde Maxwell.

    2. Em analogia com as equaes (1.13 - 1.16), justifique que na formaodiferencial as equaes (1.1 - 1.4) correspondem a

    0E = , (1.37)

    B0 0E

    t= J , (1.38)

    B = 0, (1.39)

    E + Bt

    = 0,. (1.40)

    Sugesto: em matemtica e especialmente em fsica muito impor-tante ser hbil no reconhecimento de padres, analogias, simetrias etc.Use a sua criatividade!

    3. Repita o exerccio 1 usando no lugar das equaes (1.4), (1.1) e (1.2)as equaes (1.40), (1.37) e (1.38).

    4. No sistema de unidades CGS centmetro, grama, segundo, ues (unidadeeletrosttica) e uem (unidade eletromagntica) as equaes de Maxwell

  • 18 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    (1.1 - 1.4) se escrevem assim:ZV

    E nds = 4ZVdv, (1.41)Z

    SB tdl 1

    c

    t

    ZSE nds = 4

    c

    ZSJ nds, (1.42)Z

    VB nds = 0, (1.43)Z

    SE tdl + 1

    c

    t

    ZSB nds = 0. (1.44)

    em que V e S so as mesma superfcies ilustradas na Figura ??.

    O smbolo c representa a velocidade da luz no vcuo. O campo E denominado campo eltrico e o campo B comumente chamado decampo magntico. A unidade de campo eltrico gauss. E a do campomagntico? Analise cuidadosamente as equaes (1.41 - 1.44) antes deresponder a esta questo.

    5. Com base no exerccio anterior quais as unidades dos campos macroscpi-cos D e H no sistema CGS?

    6. Em analogia com o sistema SI justifique que no sistema CGS, asequaes de Maxwell na forma diferencial correspondentes s equaes(1.41 - 1.44) so

    E = 4, (1.45)

    B 1c

    E

    t=

    4

    cJ, (1.46)

    B = 0, (1.47)

    E + 1c

    B

    t= 0. (1.48)

    7. Mostre que no vcuo e na ausncia de fontes externas, as equaes deMaxwell (1.45 - 1.48), no sistema de unidades CGS se reduzem a

    E = 0, (1.49)

    B 1c

    E

    t= 0, (1.50)

    B = 0, (1.51)

    E + 1c

    B

    t= 0. (1.52)

  • 1.4. EXERCCIOS 19

    Note a perfeita simetria, a menos de um sinal. (lei de Coulomb lei de Gauss; lei de Ampre lei de Faraday).

    8. Mostre que no SI as equaes de Maxwell (1.37 - 1.40), no vcuo e naausncia de fontes externas tm a seguinte forma:

    E = 0, (1.53)

    cB 1c

    E

    t= 0, (1.54)

    cB = 0, (1.55)

    E + 1c

    cBt

    = 0. (1.56)

    e portanto, so simtricas tambm. Para os fsicos, a presena desimetria um dos dotes essenciais da natureza.

    9. Continuando o exerccio anterior, mostre que na presena de fontes asequaes de Maxwell no SI podem ser escritas assim:

    E = ( 0c)1 (c) , (1.57)

    cB 1c

    E

    t= ( 0c)

    1 J , (1.58)

    cB = 0, (1.59)

    E + 1c

    cBt

    = 0. (1.60)

    Qual a unidade SI do termo ( 0c)1?

    10. Mostre que no SI, a razo entre E () e H () a mesma de ( 0c)1.

    11. Verifique que no sistema natural de unidades de Heaviside-Lorentz, emque c = 1 = 0 (adimensional), as equaes de Maxwell so expressasassim:

    E = , (1.61)

    B Et

    = J , (1.62)

    B = 0, (1.63)

    E + Bt

    = 0. (1.64)

  • 20 CAPTULO 1. EQUAES DE MAXWELL

    12. Justifique com base nos exerccios acima que o sistema CGS e o sistemade Heaviside-Lorentz podem ser vistos como casos especiais do SI.

    13. Sabendo-se que E = 0, mostre que num meio homogneo a leide Gauss est contida na lei de Faraday.

    Sugesto: use as equaes (1.31 - 1.32).

    14. Em analogia ao exerccio anterior e sabendo-se que E = 0, serque a lei de Coulomb est contida na lei de Ampre?

    Sugesto: use as equaes (1.29 - 1.30).

    15. Mostre que num meio homogneo (, e constantes) e sem fontesexternas, as quatro equaes de Maxwell no domnio da freqncia(1.29 - 1.32) se resumem a

    H ( + i )E = 0, (1.65)E+ iH = 0. (1.66)

  • Captulo 2

    Clculo Vetorial

    2.1 Introduo

    impressionante que com apenas quatro equaes1 pode-se deduzir abso-lutamente tudo sobre eletricidade, magnetismo, radiao eletromagntica etica. Isto se deve ao fato que por trs das quatro equaes de Maxwell seesconde uma linguagem matemtica especificamente construda para lidarcom o eletromagnetismo. isto mesmo, a pura verdade! Boa parte doclculo vetorial foi desenvolvida, nas ltimas dcadas do sculo XIX, paradestrinchar a teoria eletromagntica deixada por Maxwell, ([30], [32], [84]).Naquela poca, o clculo vetorial ainda no existia como tal e o eletro-magnetismo foi o grande impulsionador para que ele tomasse forma e sedesenvolvesse2.

    Compreender cada termo, cada smbolo que compe as equaes deMaxwell o ponto de partida para quem almeja familiarizar-se com o eletro-magnetismo. No preciso ir muito longe, a linguagem se resume a algunspoucos itens de matemtica, dos quais destacam-se: integrais de linha e desuperfcie de campos vetoriais e integrais de volume de campos escalares ;os operadores: rotacional, divergncia e gradiente; os teoremas de Stokes,de Gauss e de Green e por fim, algumas noes bsicas sobre as sries etransformadas de Fourier3. Este captulo tem por objetivo fazer uma re-viso sucinta destes tpicos. Mais importante que o rigor matemtico a interpretao fsica de cada um destes assuntos. Por isso, a nfase ser

    1Na verdade, so oito equaes escalares reunidas em quatro equaes vetoriais.2No quarto captulo contaremos um pouco desta fascinante histria.3Outros tpicos de matemtica sero adicionados a esta lista no decorrer do livro. Por

    enquanto, estes so suficientes para a decodificao das equaes de Maxwell.

    21

  • 22 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    na concepo fsica, voltada sempre para o eletromagnetismo. Os detalhesmatemticos e operacionais ficaro a cargo do Mathematica4 que um sis-tema sofisticado de software de computao simblica, numrica e grficaque facilita imensamente o trato com questes matemticas na cincia e natecnologia.

    2.2 Campo Vetorial e Campo Escalar

    Os conceitos de campo vetorial e de campo escalar so fundamentais emeletromagnetismo. Para se saber, realmente, do que se tratam estes objetos, preciso, em primeiro lugar, caracterizar o que seja um vetor. exatamenteesta a nossa primeira tarefa.

    2.2.1 Vetores

    Definimos5 um vetor geomtrico tridimensional, ou simplesmente vetor, comosendo um terno (x1, x2, x3) de nmeros reais. Denotamos um vetor geo-mtrico por uma letra minscula em negrito. Exemplos: e = ( 1

    3, 7, ). O

    vetor x = (x1, x2, x3) tambm pode ser escrito assim x = (x, y, z).Se c um nmero real e a = (a1, a2, a3) um vetor, definimos ca como

    sendo o vetor (ca1, ca2,ca3). Dados o vetor a = (2,3, 8) e o nmero c = 9,ento ca = (18,27, 72). A constante real c denominada escalar.

    Vejamos agora como adicionar vetores. Se a e b so dois vetores, di-gamos, a = (a1, a2, a3) e b = (b1, b2, b3), ento definimos a + b comosendo o vetor (a1+ b1, a2+ b2, a3+ b3). Por exemplo, dados a = (1, , 5) eb = (

    2, 4,3), ento a+ b = (1 +

    2, + 4, 2).

    Observa-se que as seguintes regras da adio so satisfeitas:

    (a+ b) + c = a+ (b+ c),

    a+ b = b+ a,

    c(a+ b) = ca+ cb,

    Se c1 e c2 so escalares, ento (c1+c2)a = c1a+c2a e (c1c2)a = c1 (c2a) ,4Para facilitar a leitura do texto, usaremos o artigo masculino o para indicar o

    sistema Mathematica e o artigo feminino a quando se referir matemtica propriamentedita.

    5Uma definio mais ampla de vetor ser vista no oitavo captulo, com a introduodos espaos vetoriais. At l, esta definio provisria de vetor satisfaz plenamente aosnossos objetivos imediatos.

  • 2.2. CAMPO VETORIAL E CAMPO ESCALAR 23

    Seja 0 = (0, 0, 0), ento 0+ a = a+ 0 = a, a,

    Seja a = (1)a ento a+ (a) = 0.

    Os smbolos x, y e z que formam o vetor (x, y, z) so denominados decomponentes do vetor. O conjunto de todos os vetores (tridimensionais) denominado de R3, tambm conhecido como o espao tridimensional. Nocaso particular em que a terceira componente identicamente igual a zero,o vetor (x, y, 0) assume a forma bidimensional (x, y). O conjunto de todosos vetores bidimensionais denotado de R2 e geometricamente identifi-cado como o plano. Da mesma maneira, se as duas ltimas componentes dovetor so identicamente nulas, o vetor (x, 0, 0) adquire a forma unidimen-sional (x) ou simplesmente x, sem parntese. O conjunto desses vetoresunidimensionais se confunde com o prprio conjunto R dos nmeros reais,conhecido como a reta. Neste ltimo caso preciso no confundir um vetorx com a componente x e com um escalar x.

    (x, y, z)

    x

    y

    z

    x

    y

    z

    a

    (a) (b)

    Figura 2.1: Visualizao geomtrica de um vetor: (a) representao de umponto no espao (b) um segmento de reta orientado.

    Em virtude das trs primeiras regras de adio que acabamos de ver,pode-se reescrever um vetor de R3 da seguinte maneira:

    a = (a1, a2, a3) = a1 (1, 0, 0) + a2 (0, 1, 0) + a3 (0, 0, 1)

    ou mais sucintamentea = a1+ a2j+ a3k,

    em que = (1, 0, 0), j= (0, 1, 0), k = (0, 0, 1) so denotados vetores unitrios,tambm chamados de vetores cannicos.

  • 24 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    Do ponto de vista geomtrico, um vetor pode ser interpretado de duasmaneiras distintas: (a) um ponto no espao tridimensional e (b) um segmentode reta orientado, como ilustra a Figura 2.1.

    A interpretao geomtrica um recurso que facilita a visualizao dequantidades fsicas representadas por vetores. apenas uma imagem hipot-tica. O que realmente deve ser levado em considerao so as propriedadesalgbricas do vetor. Dependendo da motivao fsica que se tem no mo-mento, escolhe-se uma ou outra interpretao geomtrica. Em eletromag-netismo teremos oportunidade de usar freqentemente ambas representaes.

    2.2.2 Produto escalar e produto vetorial

    Alm das operaes de adio de vetores e produto de um vetor por umescalar h duas outras operaes com vetores que so muito importantes emeletromagnetismo. Uma denominada de produto escalar, tambm chamadode produto interno, e a outra, conhecida como produto vetorial ou produtoexterno. Vejamos, primeiro, o produto escalar6.

    Dados os vetores a = (a1, a2, a3) e b = (b1, b2, b3) define-se o produtoescalar ou produto interno de a e b da seguinte maneira:

    a b = a1b1 + a2b2 + a3b3. (2.1)

    O produto escalar satisfaz as seguintes propriedades:

    a b = b a,

    a (b+ c)= a b+ a c =(b+ c) a,

    Se c um escalar, ento (ca) b = c (a b) = a (cb) ,

    Se a = 0 o vetor nulo, ento a a =0, se no a a > 0.

    Diretamente relacionado ao conceito de produto interno destaca-se o denorma de um vetor.

    A norma ou mdulo de um vetor a =(a1, a2, a3), simbolizada por kak, o escalar:

    kak =a a =

    qa21 + a

    22 + a

    23 . (2.2)

    6Uma definio mais ampla do produto interno ser dada no oitavo captulo.

  • 2.2. CAMPO VETORIAL E CAMPO ESCALAR 25

    A norma nada mais do que o comprimento geomtrico do vetor. Note-se que kak 6= 0 se a 6= 0.

    O co-seno do ngulo entre dois vetores a e b definido pela seguinterelao:

    cos =a bkak kbk . (2.3)

    instrutivo verificar que esta identidade consistente com o conceitointuitivo de ngulo entre dois vetores interpretados geometricamente. Comefeito, tomemos dois vetores no colineares a =(a1, a2) e b =(b1, b2) noplano xy como ilustra a Figura 2.2.

    x

    y

    2a

    1a1b

    2b

    a

    b

    a

    b

    Figura 2.2: Dois vetores no colineares do plano xy.

    Observando-se a Figura 2.2 tem-se

    cos a =a1kak , sin a =

    a2kak , cos b =

    b1kbk e sin b =

    b2kbk . (2.4)

    Substituindo estas quatro expresses na identidade trigonomtrica,

    cos = cos (b a) = cos a cos b + sin a sin b,

    resulta

    cos =a1b1

    kak kbk +a2b2

    kak kbk .

    Lembrando-se que a b = a1b1 + a2b2, a expresso acima se reduz a

    a b = kak kbk cos ,

  • 26 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    e portanto, idntica frmula (2.3). Com um pouco de imaginao e visoespacial, pode-se estender o mesmo raciocnio a dois vetores co-planarestridimensionais.

    Dois vetores no nulos so perpendiculares se, e somente se7, a b = 0.De fato, como kak e kbk so ambas diferentes de zero, conclui-se de (2.3)que igual a /2. Por outro lado, se = /2, ento, a b = 0 em virtudede (2.3).

    De posse do produto interno, vejamos, agora, do que se trata o produtoexterno ou vetorial.

    O produto vetorial de dois vetores a = (a1, a2, a3) e b = (b1, b2, b3) definido pela expresso

    a b =(a2b3 a3b2, a3b1 a1b3, a1b2 a2b1) , (2.5)

    em que o vetor a b perpendicular ao plano que contm os vetores ae b, e cuja orientao segue a regra da mo direita, a ser descrita maisadiante.

    Ao contrrio do produto interno que um escalar, o produto vetorial um vetor8. O produto vetorial fundamental no estudo do eletromag-netismo. Por isso, apresentaremos agora uma discrio geomtrica paraesclarecer a definio (2.5). Sejam a e b dois vetores no nulos no plano xyque formam entre si um ngulo 6= 0, como ilustra a Figura 2.3. Substi-tuindo os valores dos senos e co-senos fornecidos pelas expresses (2.4) naidentidade trigonomtrica:

    sin = sin (b a) = sin b cos a sin a cos b,

    resulta

    sin =a1b2

    kak kbk a2b1

    kak kbk ,

    ou, simplesmente,a1b2 a2b1 = kak kbk sin . (2.6)

    O lado direito desta expresso corresponde rea do paralelogramoilustrado na Figura 2.3 e o lado esquerdo idntico terceira componente do

    7A locuo se, e somente se, significa que dadas duas hipteses p e q, p implica qe q implica p. Em outras palavras, p e q so condies necessrias e suficientes para queambas sejam verdadeiras. Definies, normalmente, satisfazem a condio se, e somentese.

    8Na realidade trata-se de um pseudovetor no jargo da matemtica mais avanada,[66]. Aqui no preciso distinguir vetor, de pseudovetor.

  • 2.2. CAMPO VETORIAL E CAMPO ESCALAR 27

    produto vetorial (2.5). Em outras palavras, a rea do paralelogramo cujoslados so os vetores a e b igual a norma do vetor (0, 0, a1b2 a2b1). Note-se que a orientao do ngulo no sentido de a para b. Se o sentido fosseinvertido, de b para a, o lado esquerdo da equao (2.6) teria sinal contrrioe por conseqncia o vetor correspondente rea do paralelogramo tornar-se-ia (0, 0,a1b2 + a2b1). Em resumo, o produto vetorial de dois vetores ae b, no nulos, no plano xy, que formam um ngulo 6= 0 entre si umvetor igual a (0, 0, a1b2 a2b1). Portanto, o produto vetorial de dois vetoresco-planares no plano xy um vetor situado no eixo z, ou seja, perpendicularao plano xy, e cuja orientao positiva ou negativa conforme o ngulo seja de a para b ou de b para a, respectivamente.

    x

    y

    2a

    1a1b

    2b

    a

    b

    a

    b

    Figura 2.3: Representao grfica da norma do produto vetorial dos vetoresa e b no plano xy.

    Se em vez do plano xy, os vetores a e b estivessem assentados no planoxz, a rea do paralelogramo seria, usando o mesmo raciocnio anterior, iguala (0, a3b1 a1b3, 0). Ento, o produto vetorial seria um vetor, de normaigual a a3b1 a1b3, na direo do eixo y orientado de acordo com o sentidodo ngulo formado pelos dois vetores. Analogamente, se os dois vetoresa e b estivessem no plano yz o produto vetorial seria (a2b3 a3b2, 0, 0) .Sabendo-se que um vetor qualquer pode ser decomposto em trs vetoresortogonais aos planos cartesianos, segue da definio (2.5) que o produtovetorial nada mais que a composio desses trs casos particulares9. Feitasessas consideraes, podemos concluir que o produto externo de dois vetores

    9Contrrio ao produto escalar, cuja definio pode ser estendida facilmente para vetoresde Rn (veja a pgina 32), o produto vetorial de dois vetores uma operao restrita avetores d R3. No h sentido falar de produto vetorial de vetores do R4, por exemplo. Por

  • 28 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    no colineares um terceiro vetor perpendicular ao plano que contm osdois primeiros e cuja norma igual rea do paralelogramo formado porambos. O sinal do produto vetorial depende da orientao do ngulo entre osdois vetores dados. Uma maneira prtica de determinar o sinal do produtovetorial a chamada regra da mo direita, ilustrada na Figura 2.4.

    y y

    x

    z

    x

    z

    a

    a

    a b

    a bbb

    Figura 2.4: Ilustrao da regra da mo direita

    A regra da mo direita nos diz que o dedo polegar da mo direita indicaa direo e o sentido do produto vetorial a b, enquanto os demais dedosacompanham a rotao do primeiro para o segundo vetor.

    A expresso (2.5) que define o produto vetorial de difcil memorizao.Um artifcio prtico para se ter de cor a frmula do produto vetorial desenvolver formalmente o seguinte "determinante",

    a b = (a1, a2, a3) (b1, b2, b3) =

    j ka1 a2 a3b1 b2 b3

    . (2.7)

    O Mathematica simplifica extraordinariamente a manipulao simblicae numrica de vetores. Um vetor no Mathematica simplesmente uma listade trs expresses simblicas ou numricas entre chaves { }, no lugar dostradicionais parnteses ( ) usados na matemtica. A lista de manuais elivros bsicos que tratam de vetores, com nfase no Mathematica, muito

    essa e outras razes, ainda mais fundamentais, o clculo vetorial inadequado para lidarcom o eletromagnetismo avanado. Neste caso, ele substitudo pelo clculo tensorial oupelo clculo das formas diferenciais. H quem diga que o eletromagnetismo ilumina asformas diferenciais e estas iluminam o eletromagnetismo, [62].

  • 2.2. CAMPO VETORIAL E CAMPO ESCALAR 29

    vasta, dos quais destacamos: [22], [46], [16],[54], [68], [64], [86]. Para umarpida introduo ao Mathematica consulte o Apndice B no final do livro.

    Vejamos, agora, alguns exemplos de operaes com vetores com o Math-ematica.

    Exemplo 2.1: A adio simblica dos vetores (a1, a2, a3) e (b1, b2, b3) muito simples. De fato, basta teclar os comandos:

    In[1]:= (*--- Adio de vetores ---*)

    Clear[a1, a2, a3, b1, b2, b3]

    a = {a1, a2, a3};

    b = {b1, b2, b3};

    a + b

    Out[4]:= {a1 + b1, a2 + b2, a3 + b3}

    A adio de2, ,2e3, 13 , 1

    feita da mesma maneira:

    In[5]:= (*--- Adio de vetores ---*)

    a = {2, Pi, Sqrt[2]};

    b = {-3, 1/3, 1};

    a + b

    In[7]:= {1, 1/3 + , 1 +2}

    O produto do vetor simblico (a1, a2, a3) pelo escalar c:

    In[8]:= (*--- Multiplicao de um vetor por um escalar ---*)

    Clear[a1, a2, a3, c]

    a = {a1, a2, a3};

    c a

    Out[10]:= {c a1, c a2, c a3}

    O produto do vetor2, ,5pelo escalar c = 7:

    In[11]:= (*--- Multiplicao de um vetor por um escalar ---*)

    a = {2, Pi, Sqrt[5]};

    c = -7

    Out[13]:= {14,7,75}

    O produto escalar de a = (a1, a2, a3) e b = (b1, b2, b3) executado como comando a.b:

    In[14]:= (*--- Produto interno ---*)

  • 30 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    Clear[a1, a2, a3, b1, b2, b3]

    a = {a1, a2, a3};

    b = {b1, b2, b3};

    abOut[17]:= a1 b1 + a2 b2 + a3 b3

    O produto interno de5, 23 ,

    2e2,1, 13

    :

    In[18]:= (*--- Produto interno ---*)

    a = {5, 2/3, Pi Sqrt[2]};

    b = {2, -1, 1/3};

    abOut[20]:= 28/3 +

    2/3

    A norma do vetor a = (a1, a2, a3) a raiz quadrada do produto escalara a. Ento:

    In[21]:= (*--- Norma do vetor a ---*)

    Clear[a1, a2, a3]

    a = {a1, a2, a3};

    Sqrt[a a]

    Out[23]:= a21 + a22 + a

    23

    A norma do vetor a =5, 23 ,

    2:

    In[24]:= (*--- Norma do vetor a ---*)

    a = {5, 2/3, Pi Sqrt[2]};

    Sqrt[a a]

    Out[25]:= 229/9 + 22

    Para se transformar as componentes do vetor a da clula In[24] daforma simblica para valores decimais, basta executar o comando N[a]. Por-tanto,

    In[26]:= (*--- Valor numrico do vetor a ---*)

    N[a]

    Out[26]:= {5, 0.666667, 4.44388}

    O comando N[a] registra seis dgitos significativos, como padro. Paraaumentar ou diminuir o nmero de dgitos significativos usa-se o comandoN[a, n], sendo n o nmero de dgitos desejados. Exemplos:

  • 2.2. CAMPO VETORIAL E CAMPO ESCALAR 31

    In[27]:= (*--- Valor numrico do vetor a ---*)

    N[a, 25]

    Out[27]:= {5.0000000000000000000000000, 0.6666666666666666666666667

    4.442882938158366247015881}

    In[28]:= (*--- Valor numrico do vetor a ---*)

    N[a, 2]

    Out[28]:= {5.0, 0.67, 4.4}

    O valor numrico de kak calculado com o comando:

    In[29]:= (*--- Valor numrico da norma do vetor a ---*)

    N[Sqrt[aa]Out[29]:= 6.72188

    O produto vetorial de a = (a1, a2, a3) e b = (b1, b2, b3) executadoteclando o comando Cross[a, b]:

    In[30]:= (*--- Produto vetorial ---*)

    Clear[a1, a2, a3, b1, b2, b3]

    a = {a1, a2, a3};

    b = {b1, b2, b3};

    Cross[a, b]

    Out[33]:= {-a3 b2 + a2 b3, a3 b1 + a1 b3, -a2 b1 + a1 b2}

    O produto vetorial de3, 15 ,7e, 4, 35

    :

    In[34]:= (*--- Produto vetorial ---*)

    a = {3, 1/5, Sqrt[7]};

    b = {Pi, 4, 3/5};

    Cross[a, b]

    Out[35]:= {3/25 47,9/5 +

    7, 12 /5}

    O produto vetorial de3.0, 15 ,

    7e, 4, 35

    :

    In[37]:= (*--- Produto vetorial ---*)

    a = {3.0, 1/5, Sqrt[7]};

    b = {Pi, 4, 3/5};

    Cross[a, b]

  • 32 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    Out[39]:={-10.463, 6.51187, 11.3717}

    O Mathematica trata nmeros inteiros e nmeros decimais (ponto flu-tuante) de forma diferente. Expresses com nmeros inteiros so tratadassimbolicamente, enquanto que os nmeros decimais so representados porexpresses numricas aproximadas. Os dois ltimos resultados servem deilustrao deste fato. Em In[37], as componentes dos vetores a = {3,1/5, Sqrt[7]} e b = {Pi, 4, 3/5} so todas do tipo simblico e as com-ponentes do vetor do resultado Out[36] tambm so do tipo simblico. Poroutro lado, em In[37], a primeira componente do vetor a = {3.0, 1/5,Sqrt[7]} do tipo ponto flutuante e portanto o resultado Out[39] se apre-senta numericamente. A regra simples. Se um ou mais dos nmeros de umadada expresso for do tipo decimal (ponto flutuante), os demais nmeros dotipo simblico sero automaticamente transformados em nmeros decimais.

    At o momento, nos restringimos aos vetores tridimensionais (os vetoresuni e bidimensionais so casos particulares dos tridimensionais). perfeita-mente possvel generalizar o conceito de vetores geomtricos. Faremos issono oitavo captulo. Veremos, por exemplo, que se pode construir vetorescom n componentes. So os chamados vetores do Rn. Pode-se, tambm,a partir dos conjuntos R2 e R3 construir outras classes de vetores. ocaso, por exemplo, do conjunto de pares do tipo ((x, y) , z), sendo a primeiracomponente um par de nmeros reais e a segunda componente um nmeroreal. Esse conjunto simbolizado por R2 R e conhecido como o produtocartesiano de R2 por R. importante notar que R2 R e R3 so conjuntodistintos. Analogamente, pode-se construir o conjunto R3 R formado depares do tipo ((x, y, z) , t) . Este conjunto importantssimo em eletromag-netismo. No confundir os conjuntos R3 R e R4. O segundo representaum espao tetradimensional e o primeiro no10.

    Um vetor tambm pode ser construdo com nmeros complexos em vezde nmeros reais. Todas as operaes acima definidas para vetores reais sonaturalmente estendidas para vetores com entradas complexas, com exceode o produto escalar, que no caso complexo o produto do primeiro vetorpelo conjugado do segundo, resultando num nmero real. O produto escalar sempre um nmero real. O conjunto de vetores complexos tridimensionais

    10O espao R4 fundamental em eletromagnetismo avanado. Enquanto que, no eletro-magnetismo mais bsico (como o deste livro) o espao R3R o que normalmente se usa.A razo que no eletromagnetismo avanado, tambm conhecido como eletrodinmica,no se distingue fisicamente a componente tempo (na verdade, tempo vezes a velocidadeda luz) das trs componentes espaciais, constituindo assim o chamado espao-tempo. Noeletromagnetismo elementar, tempo e espao so tratados separadamente.

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 33

    simbolizado por C3.De posse do conceito de vetores, vamos retornar ao nosso ponto de par-

    tida e esclarecer o que significa campo escalar e campo vetorial. No primeirocaptulo, as equaes de Maxwell foram apresentadas em termo de campoescalar (densidade de carga, condutividade, permissividade eltrica e perme-abilidade magntica) e campos vetoriais (campo eltrico, campo magntico,densidade de fluxo eltrico, densidade de fluxo magntico, densidade de cor-rente). Nunca demais lembrar que os conceitos de campo escalar e campovetorial so vitais em eletromagnetismo. Tudo que ser visto daqui parafrente depender direta ou indiretamente desses dois tipos de campo. Ditoisto, vamos s definies.

    Um campo escalar uma funo de R3 em R. Isto , a cadaponto (vetor) de uma regio R3 associa-se um nmero (nico) real. Umexemplo de campo escalar a densidade de carga eltrica de uma regiodo espao tridimensional.

    Um campo vetorial f uma funo de R3 em R3. Isto significaque a cada ponto de uma regio R3 associa-se um vetor (nico) de R3.Exemplos de campos vetoriais so o campo eltrico E e o campo magnticoH, definidos numa regio do espao tridimensional. Campo eltrico ecampo magntico podem ser complexos. Neste caso, eles so funes de R3 em C3. Quando se deseja enfatizar que os campos eltrico e magnticovariam com o tempo apropriado usar funes de I R3 R em R3ou em C3. A cada ponto do espao tridimensional associa-se um vetor quevaria tambm no tempo (ou na freqncia).

    No texto, campo escalar e campo vetorial so simbolizados, indistinta-mente, por letras maisculas e minsculas. No caso de campo vetorial a letra sempre em negrito, no caso do campo escalar a letra do tipo normal.

    2.3 Integrais de Linha, de Superfcie e de Volume

    A motivao fsica de integral de linha vem da mecnica. Mais especifi-camente, do conceito de trabalho realizado por uma fora ao deslocar umcorpo ao longo de um percurso no espao tridimensional.

    Por sua vez, a idealizao da integral de superfcie est relacionada aoconceito de fluxo de um fludo atravs de uma superfcie contida no espaotridimensional. Integrais de volume associam-se a campos escalares.

    Em eletromagnetismo, integrais de linha e de superfcie no correspon-dem exatamente a trabalho e a fluxo, no mesmo sentido da mecnica. Mesmoassim, a viso mecanicista destas integrais muito til e facilita entender

  • 34 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    os fenmenos eletromagnticos. Grosso modo, ela est por trs das idiasseminais de linhas de fora e de fluxo de Faraday, que tanto influenciaramMaxwell.

    2.3.1 Integral de linha de um campo vetorial

    Em mecnica, quando um corpo deslocado sob a ao de uma fora, se dizque a fora ou o agente que exerceu a fora realizou trabalho.

    O leitor j deve ter visto, no curso elementar de Fsica, que se sob aao de uma fora f constante (em mdulo, direo e sentido), um corpoexperimenta um deslocamento d, no mesmo sentido dessa fora, o trabalhow realizado por f dado por

    w = f d.

    Quando a direo do vetor que representa a fora f forma um ngulo com a direo do deslocamento d, a fora que efetivamente contribui paradeslocar o corpo a componente tangencial ft de f ao longo da direo ded, ou seja, tangente direo do deslocamento, Figura 2.5.

    d

    f

    Figura 2.5: Deslocamento d de um corpo sob a ao de uma fora f .

    Se o deslocamento no se faz em linha reta, mas ao longo de um per-curso curvilneo, o trabalho obtido substituindo o percurso por uma linhapoligonal constituda de trechos lineares arbitrariamente pequenos. A linhapoligonal construda unindo-se pontos da curva, dois a dois seqencial-mente, como ilustra a Figura 2.7. A seguir, faremos essas idias heursticasum pouco mais precisas do ponto de vista matemtico.

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 35

    (b)

    y

    z

    x(a)x

    1p y

    z t^

    t^ 2p

    t^

    Figura 2.6: (a) Grfico de uma curva simples e suave, (b) grfico de umacurva no-simples.

    x

    1p y

    z

    t^

    t^

    t^ 2p

    (x , y , z )nn n

    ln

    Figura 2.7: Aproximao de uma curva suave por um caminho poligonal.

    Uma curva uma aplicao11 (t) = (x (t) , y (t) , z (t)) definida numintervalo da reta, t0 t t1 e tomado valores em R3. Uma curva sim-ples aquela cujo grfico12 no se intercepta em ponto algum, como o daFigura 2.6a. Caso contrrio, a curva dita no-simples, Figura 2.6b. Umacurva simples chamada suave quando as funes componentes x (t) , y (t) ez (t) so diferenciveis no intervalo [t0, t1]. Isso significa que em cada pontoonde a curva diferencivel existe um vetor t tangente, como ilustrado naFigura 2.6a. A varivel independente t comumente chamada de parmetroe a funo (t) denominada curva parametrizada pelo parmetro t. Umamesma curva pode adimitir vrias parametrizaes, ([11], [50]). Uma curva

    11A palavra aplicao sinnimo de funo, mapeamento entre dois conjuntos.12O grfico de uma curva o trao de sua imagem em R3. No confundir uma curva

    com seu grfico. A curva uma funo e o grfico simplesmente a sua representaogeomtrica no espao.

  • 36 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    orientada uma curva onde se especifica um sentido de percurso. A orien-tao da curva dita positiva quando coincide com a do intervalo [t0, t1],caso contrrio dita negativa13. Um caminho C a unio de uma ou maiscurvas suaves e orientadas. Um caminho pode deixar de ser suave nos pon-tos de juno de duas curvas contguas. Em outras palavras, um caminho uma funo suave por partes.

    De acordo com a Figura 2.7, o trabalho em cada um dos trechos line-ares da poligonal que aproxima o percurso suave igual ao produto dacomponente tangencial ft da fora f , pelo comprimento do elemento ln.Somando-se a contribuio de todos os segmentos da poligonal, tem-se

    w 'NXn=1

    ft (xn, yn, zn)ln.

    Considerando-se o nmero N de segmentos da poligonal um inteiro ar-bitrariamente grande e fazendo o valor mximo de ln suficientemente pe-queno, podemos escrever

    w = limN

    maxln0

    NXn=1

    ft (xn, yn, zn)ln =

    ZCft (x, y, z) dl,

    sendo o caminho C o limite da poligonal. Ademais, quando o valor mximode ln aproxima-se de zero, a componente tangencial ft tende para f te por conseqncia podemos reescrever a integral do trabalho, da seguintemaneira,

    w =

    ZCf (x, y, z) tdl. (2.8)

    Como foi dito antes, usamos o conceito de trabalho apenas como moti-vao para especificar integrais do tipo (2.8). Integrais desse tipo so denom-inadas de integrais de linha de um campo vetorial f ao longo de um caminhoC, independentemente do significado fsico do campo vetorial. Integrais delinha so muito comuns em matemtica, fsica, engenharia e geofsica. Elasso fundamentais em eletromagnetismo. Mais do que isto, elas formam umdos pilares mestres do eletromagnetismo.

    Dados o caminho C e o campo vetorial f , contnuo em C, como procederpara calcular a integral (2.8)? Para responder a essa questo, preciso,

    13A orientao do intervalo [t0, t1] dita positiva quando se d de t0 para t1, e ditanegativa quando se d no sentido contrrio.

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 37

    x

    y

    z

    t^

    l

    r

    + rr

    l + ll

    r

    Figura 2.8: Visualizao dos incrementos r e l e do vetor tangenteunitrio bt.primeiro, determinar o vetor tangente unitrio t e efetuar o produto internof t. exatamente isto o que faremos agora. Observando a Figura 2.8, quemostra um pequeno segmento do grfico de um curva, podemos escrever

    r

    l=x

    l+y

    lj+z

    lk, (2.9)

    em que l representa o incremento do comprimento de arco que liga doispontos quaisquer do grfico.

    Substituindo x, y e z por

    x = x (l +l) x (l) ,y = y (l +l) y (l) ,z = z (l +l) z (l) ,

    e fazendo l tender para zero, verifica-se facilmente que r/l em (2.9)tem como limite o vetor tangente unitrio. Mais precisamente,

    t =dx

    dl+

    dy

    dlj +

    dz

    dlk. (2.10)

    Substituindo esta expresso de t em (2.8), resultaZCf (x, y, z)

    dx

    dl+

    dy

    dlj+

    dz

    dlk

    dl.

    Finalmente, reescrevendo o campo vetorial f em termos de suas funescomponentes fx (x, y, z)+ fy (x, y, z)j+ fz (x, y, z) k e sabendo-se que dx, dy

  • 38 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    e dz so equivalentes aos diferenciais dxdl dl,dydl dl e

    dzdl dl, a integral acima se

    reduz a ZCfxdx+ fydy + fzdz. (2.11)

    Esta a frmula que se usa no clculo de integrais de linha. Na ver-dade, ela ainda precisa passar por uma ligeira transformao, antes de serefetivamente utilizada nos clculos. O segredo empregar a parametrizaot, do caminho, para transform-la em uma integral ordinria no intervalot0 < t < t1. Consegue-se isto, fazendo dx = dxdt dt, dy =

    dydt dt e dz =

    dzdt dt.

    Com efeito, podemos escrever

    Integral de linha :=Z t1t01

    fx (t)

    dx

    dt+ fy (t)

    dy

    dt+ fz (t)

    dz

    dt

    dt. (2.12)

    O sinal da integral positivo se a orientao do caminho for idntica ado sistema de coordenadas, caso contrrio, o sinal ser negativo14.

    A no ser em casos muito simples, o clculo de integrais de linha por meioda integral.(2.12) demasiadamente laborioso e cansativo. precisamenteaqui que o Mathematica faz uma grande diferena. Ele transforma clculostrabalhosos, enfadonhos e desestimulantes em uma emocionante e prazerosaviagem.

    Na linguagem do Mathematica, a integral (2.12) traduzida ipsis litterisna funo 15 integralDeLinha[x, y, z, t, fx, fy, fz, t0, t1] a seguir,em que x, y, z so as coordenadas de um ponto arbitrrio na curva; t o parmetro de parametrizao; fx, fy, fz so as componente do campovetorial f(x, y, z) e t0 e t1 representam os extremos do intervalo de definiodo parmetro t.

    14Em muitos livros de clculo, a integral de linha (2.8) de um campo vetorial definidaintuitivamente a partir do conceito de trabalho em mecnica, exatamente como foi feitoaqui. Com esta difinio, a frmula computacional (2.12) obtida de modo natural. Noentanto, nos livros mais avanados, especialmente os de geometria diferencial, a definio dada de trs para frente. Em outras palavras, a integral de linha de um campo vetorial definida axiomaticamente pela expresso (2.11) e a interpretao fsica (2.8) vem emsegundo plano, como um mero detalhe. Mais a frente, veremos por qu feito assim.15Tambm chamada de procedimente.

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 39

    In[1]:= (*--- integralDeLinha[ ] calcula integrais de linha ---*)

    integralDeLinha[x_, y_, z_, t_, fx_, fy_, fz_, t0_, t1_]:=

    Module[{ },

    Integrate[fx D[x, t] + fy D[y, t] + fz D[z, t], {t, t0, t1}]

    Assim, para se calcular a integral de linha suficiente fazer a parame-trizao do caminho e acionar a procedimento IntegralDeLinha[...]16,e pronto! Aqueles que j tiveram oportunidade de calcular integrais delinha pelos mtodos tradicionais, ficaro surpresos e gratificados com a sim-plicidade do Mathematica em encarar este tipo de clculo. Sem exageiro,podemos dizer que o mtodo convencional de clculo de integrais de linha coisa do passado, tais como a rgua de clculo e o carto perfurado Holler-itrh17. Vejamos, agora, alguns exemplos interessantes.

    -2-1

    01

    2x

    -2

    0

    2y

    0

    2

    4

    6

    z

    -2-1

    01

    2x

    -2

    0

    2y

    Figura 2.9: Caminho helicoidal no espao tridimensional.

    Exemplo 2.2: Dados o campo vetorial f = 6xyx+(2y + xz)j+(xy 4z2)k e o caminho helicoidal parametrizado por (t) = (2 sin (t) , 3 cos (t),t/3) em que 0 t 21, calcular a integral de linha.16Os ts pontos representam sibolicamente os argumentos do procedimento.17Tenho certeza que a maioria dos leitores nunca viram uma rgua de clculo e, nem to

    pouco, um carto perfurado. Eu ainda guardo, saudosamente, a minha rgua de clculo,que me foi muito til na dcada de sessenta do sculo passado. Guardo tambm algunscartes perfurados, dos milhares que usei no incio da dcada de setenta.

  • 40 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    Primeiro, vamos contruir o grfico do caminho helicoidal da Figura 2.9.Para isto basta digitar os comandos:

    In[2]:= (*--- Figura 2.9, caminho helicoidal ---*)

    ParametricPlot3D[{2 Sin[t], 3 Cos[t], t/3}, {t, 0, 21},

    AxisLabel -> {"x", "y", "z"}];

    Antes de se usar o Mathematica para computar a integral de linha, ve-jamos, a ttulo de curiosidade, como seria feito o clculo pelo mtodo tradi-cional apresentado nos livros de clculo. O primeiro passo seria substituiras coordenadas parametrizadas, x = 2 sin (t) , y = 3cos (t) e z = t/3, nas ex-presses das trs componentes, fx = 6xyz, fy = (2y + xz) e fz =

    xy 4z2

    do campo f . Isto corresponde a mudana das variveis x, y, z pela varivelt. Em seguida seriam calculadas as derivadas, em relao ao parmetro t,de cada coordenada da parametrizao. Por fim, as coordenadas do campo,em funo do parmetro t, e as derivadas seriam substitudas na frmula(2.12) da integral de linha. Seguindo esses passos e aps algumas simplesmanipulaes algbricas, chegaramos seguinte integral ordinria,

    Z 210(12 sin (t) cos2 (t) t+ (6 cos (t) +

    2

    3sin (t) t+

    (6 sin (t) cos (t) 49t2)dt. (2.13)

    Cada termo dessa integral pode ser facilmente calculado pelos mtodos tradi-cionais de resoluo de integrais de uma varivel, ([3], [25]). Resolvidas asintegrais, chega-se ao valor 660.669 correspondenta integral de linha emquesto18. Como se v, esse processo manual um tanto quanto traba-lhoso e chato. Com integrais mais complicadas, o trabalho pode se tornarinsuportvel. Talvez seja por isso, que a maioria dos livros de clculos serestringem a exemplos simples, do tipo acadmico, sem nenhum interesseprtico.

    Com o auxlio do programa Mathematica, o panorama outro. De fato,o clculo de integrais de linha no passa de alguns simples comandos natela do monitor do computador. Com efeito, preciso apenas digitar asexpresses do campo vetorial e da curva parametrizada e executar a funointegralDeLinha[...]. Simples, no ? Portanto,

    18Nesse livro usamos o ponto decimal no lugar da vrgula para manter a compatibilidadede notao com o Mathematica.

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 41

    In[3]:= (*--- Integral de linha ao longo do caminho helicoidal da

    Figura 2.9 ---*)

    Clear[x, y, z, t]

    {fx, fy, fz} = {6 x y z, 2 y + x z, x y - 4 z^2};

    {x, y, z} = {2 Sin[t], 3 Cos[t], t/3};

    {integralDeLinha[x, y, z, t, fx, fy, fz, 0, 21]

    Instantaneamente, o computador nos fornece o seguinte resultado daintegral de linha, em notao simblica,

    In[6]:= 8185/12 126 Cos[21] + 17 Cos[42]/4 42 Cos[63] + 6 Sin[21]+21 Sin[42]/2 + 2 Sin[63]/3

    Para se obter o valor numrico desta expresso simblica basta evocar oseguinte comando19:

    In[7]:= (*--- Valor numrico do resultado do exemplo anterior ---*)

    N[%]

    Out[7]:= -660.669

    O sinal negativo deve-se ao fato do caminho ter sido percorrido no sentidohorrio, e portanto, contrrio ao sentido anti-horrio do sistema xyz decoordenadas.

    Exemplo 2.3: Com o campo mesmo vetorial f = 6xyx+(2y +xz)j+(xy 4z2)k e o caminho helicoidal amortecido parametrizado por(t) = (t2/50 sin (t) , t2/50 cos (t), t) em que 0 t 8, calcular a inte-gral de linha neste percurso.

    Primeiro, vamos construir o grfico do caminho helicoidal amortecido daFigura 2.10. Para isto basta digitar os comandos:

    In[8]:= (*--- Figura 2.10, caminho helicoidal amortecido ---*)

    ParametricPlot3D[{t^2/50 Sin[t], t^2/50 Cos[t], t}, {t, 0, 8 Pi},

    AxisLabel -> {"x", "y", "z"}];

    19O sinal % significa o resultado anterior. O comando N[%] calcula o valor numrico doresultado anterior.

  • 42 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    -10-5

    05x

    -10-5

    05

    10y

    0

    10

    20

    z

    -10-5

    05x

    -10-5

    05

    10y

    Figura 2.10: Caminho helicoidal amortecido.

    Agora, vejamos o clculo da integral de linha ao longo do caminho he-licoidal amortecido da Figura 2.10. Aplicando como no exemplo anterior afuno integralDeLinha[...] temos

    In[9]:= (*--- Integral de linha ao longo do caminho helicoidal

    amortecido da Figura 2.10 ---*)

    Clear[x, y, z, t]

    {fx, fy, fz} = {6 x y z, 2 y + x z, x y - 4 z^2};

    {x, y, z} = {t^2/50 Sin[t], t^2/50 Cos[t], t};

    {integralDeLinha[x, y, 6z, t, fx, fy, fz, 0, 8 Pi]

    Out[12]:= -2(-393680 - 6075 + 436209602 - 9072003 - 13492244 +

    -55296005 + 212336646)/1265625

    In[13]:= (*--- Valor numrico do resultado do exemplo anterior ---*)

    N[%]

    Out[13]:= -124451.

    Foi dito acima que uma mesma curva pode admitir mais de uma para-metrizao. Um tipo de parametrizao muito comum, principalmente noslivros de geometria diferencial, a parametrizao por comprimento de arco,conhecida por retificao da curva. Dada um curva (t) = (x(t), y(t), z(t))

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 43

    em que t0 6 t 6 t, o seu comprimento s expresso por:

    s =

    Z t1t0

    d(t)dt dt = Z t1

    t0

    q(x0)2 + (y0)2 + (z0)2dt. (2.14)

    O prximo exemplo ilustra como o valor da integral de linha independeda parametrizao do caminho..

    11.2

    1.4x

    0

    0.25

    0.5

    0.75

    1

    y

    0

    0.25

    0.5

    0.75

    1

    z

    11.2

    1.4x

    0

    0.25

    0.5

    0.75

    1

    y

    Figura 2.11: Grfico da curva parametizada (t) = (cosh t, sinh t, t) em que0 6 t 6 1.

    Exemplo 2.4: Dados o campo vetorial f = 6xyx+(2y+xz)j+(xy4z2)k e a curva (t) = (cosh t, sinh t, t) em que 0 t 1, vamos nesteexemplo calcular a integral de linha com duas parametrizaes diferentes:(t) e (s) em que s o comprimento de arco.

    Para comear, vamos traar o grfico de (t), ilustrado na Figura 2.11.Procedendo como o caso da hlice, vem:

    In[14]:= (*--- Figura 2.10, curva alfa ---*)

    ParametricPlot3D[{Cosh[t], Sinh[t], t}, {t, 0, 1},

    AxisLabel -> {"x", "y", "z"}];

    Feito o grfico, vamos, agora, computar a integral de linha com a primeiraparametrizao. Ento:

  • 44 CAPTULO 2. CLCULO VETORIAL

    In[15]:= (*--- Integral de linha ao longo da curva alfa(t) da

    Figura 2.11 ---*)

    Clear[x, y, z, t]

    {fx, fy, fz} = {6 x y z, 2 y + x z, x y - 4 z^2};

    {x, y, z} = {Cosh[t], Sinh[t], t};

    {integralDeLinha[x, y, z, t, fx, fy, fz, 0, 1] // Simplify

    Out[18]:= 1/24 (73 + 36Cosh[1] + 15Cosh[2] 4Cosh[3]36Sinh[1] + 6Sinh[2] + 12Sinh[3])

    Agora vamos recalcular a mesma integral usando a parametrizao pelocomprimento de arco. Para isso, preciso, primeiro, determinar esta novaparametrizao. Empregando-se (2.14) vem:

    s =

    Z t0

    psinh2 + cosh2 + 1d =

    2

    Z t0cosh d =

    2 sinh t,

    onde se usou a identidade cosh2 sinh2 = 1. Dai, se conclui que t =arcsinh

    s/2e por conseqncia, a parametrizao pelo comprimento de

    arco expressa assim:

    (s) =cosh

    arcsinh

    s/2

    , sinharcsinh

    s/2

    , arcsinhs/2

    ,

    em que 0 6 s 62 sinh (1).

    De posse desta nova parametrizao, vamos ao clculo da integral delinha:

    In[19]:= (*--- Integral de linha ao longo da curva alfa(s) da

    Figura 2.11 ---*)

    Clear[x, y, z, t]

    {fx, fy, fz} = {6 x y z, 2 y + x z, x y - 4 z^2};

    {x, y, z} = {Cosh[ArcSinh[s/Sqrt[2]]],

    Sinh[ArcSinh[s/Sqrt[2]]]],

    ArcSinh[s/Sqrt[2]]};

    integralDeLinha[x, y, z, t, fx, fy, fz, 0, Sqrt[2] Sinh[1]] //

    FullSimplify

    Out[22]:= (16+ e (9 + e (72 146 e+ 21 e3 + 8 e4)))/(48 e3)

    Opa! Os resultados Out[18] e Out[22] parecem bem diferentes. Calma!Eles so absolutamente idnticos, pois a diferena entre ambos zero. Comefeito,

  • 2.3. INTEGRAIS DE LINHA, DE SUPERFCIE E DE VOLUME 45

    In[23]:= (*--- Comparao dos resultados Out[12] e Out[16] ---*)

    Out[18] - Out[22] // Simplify

    {fx, fy, fz} = {6 x y z, 2 y + x z, x y - 4 z^2};

    Out[23]:= 0

    Exemplo 2.5: Uma das maneiras mais prtica e elegante de cons-truir uma curva em R3 por meio da interseo de duas superfcies noespao tridimensional. Neste terceiro exemplo, vamos construir uma curvadenominada Viviani, formada pela interseo da esfera x2 + y2 + z2 = 4com o cilindro (x 1)2 + y2 = 1 no primeiro quadrante, [14]. Em seguidavamos calcular a integral de linha do campo vetorial {fx = 4x3 2yz2,fy = 7xy

    2z, fz = yz3/7}, do ponto (2, 0, 0) ao ponto (0, 0, 2), ao longo da

    curva Viviani.

    Primeiro, preciso parametrizar a curva Viviani. Isto , devemos deter-minar (t) = (x (t) , y (t) , z (t)) em relao a um certo parmetro t, Comoas coordenadas x (t) e y (t) da Viviani coincidem com as coordenadas x (t) ey (t) do cilindro, podemos simplesmente escrever x(t) = 1+cos t, y(t) = sin t; t . Agora, para se obter a componente z (t) usa-se a equao daesfera intersectada pelo cilindro. Assim,

    z = p4 x2 y2

    = q4 (1 + cos t)2 sin2 t

    = 2 2 cos t

    = 2 sin (t/2) .

    Logo, a parametrizao da curva Viviani expressa pela curva parame-trizada, (t) = (1 + cos t, sin t, 2 sin (t/2)) em que t .

    Antes de calcular a integral de linha ao longo da Viviani, seria interes-sante dar uma olh