Upload
others
View
1
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Sophie Kinsella
LOUCA POR COMPRAS
ESPERA UM BEBÉ
Tradução
Carmo Vasconcelos Romão
KENNETH PRENDERGAST
Prendergast de Witt Connell
Conselheiros de Finanças
Forward House
High Holborn, 394 Londres WC1V 7EX
Mrs. R. Brandon
Maida Vale Mansions, 37
Maida Vale
Londres NW6 0YF
30 de julho de 2003
Cara Mrs. Brandon
Foi um grande prazer conhecê-la a si e a Mr. Brandon, e estou ansioso
por assumir o papel de conselheiro de finanças da sua família.
Neste momento, estou a estabelecer a situação bancária e uma cader-
neta de poupança para o seu filho que ainda não nasceu. Em devido
tempo, poderemos discutir que investimentos a senhora e seu marido
desejarão fazer em nome do bebé.
Estou ansioso para conhecê-la melhor nos próximos meses; por favor,
não hesite em contactar-me para falarmos de qualquer assunto, por
menor que seja.
Atenciosamente,
Kenneth Prendergast
Especialista em Investimentos de Família
KENNETH PRENDERGAST
Prendergast de Witt Connell
Conselheiros de Finanças
Forward House
High Holborn, 394 Londres WC1V 7EX
Mrs. R. Brandon
Maida Vale Mansions, 37
Maida Vale
Londres NW6 0YF
1 de agosto de 2003
Cara Mrs. Brandon
Obrigado pela sua carta. Em resposta às suas perguntas: sim, poderá
fazer um levantamento da conta do bebé – ainda que, naturalmente,
eu não esperasse que fosse usado!
Atenciosamente,
Kenneth Prendergast
Especialista em Investimentos de Família
KENNETH PRENDERGAST
Prendergast de Witt Connell
Conselheiros de Finanças
Forward House
High Holborn, 394 Londres WC1V 7EX
Mrs. R. Brandon
Maida Vale Mansions, 37
Maida Vale
Londres NW6 0YF
7 de agosto de 2003
Cara Mrs. Brandon
Obrigado pela sua carta.
Fiquei intrigado ao saber da «mensagem psíquica» que recebeu recen-
temente do seu filho ainda não nascido. Entretanto, creio que seja
impossível fazer levantamentos nesta fase, ainda que, conforme diz,
«o bebé o deseje».
Atenciosamente,
Kenneth Prendergast
Especialista em Investimentos de Família
UM
Muito bem. Nada de pânico. Vai correr tudo bem. Claro que
vai.
Claro que vai!
– Pode levantar a blusa, Mistress Brandon? – A técnica de
ecografia olha-me com ar agradável e profissional. – Preciso de
aplicar um pouco de gel na sua barriga antes de começarmos o
exame.
– Sem dúvida! – respondo sem mover um músculo. – O
problema é que... estou um bocadinho... nervosa.
Encontro-me deitada numa cama no hospital Chelsea and
Westminster, tensa de ansiedade. A qualquer minuto, Luke e eu
veremos o nosso bebé no ecrã pela primeira vez desde que era
apenas uma minúscula bolinha. Ainda não acredito. Na verdade,
ainda não ultrapassei totalmente o facto de estar grávida. Dentro
de dezanove semanas, eu, Becky Brandon, née Bloom... serei
mãe. Mãe!
Luke é o meu marido, a propósito. Estamos casados há
pouco mais de um ano e este é um genuíno, cem por cento, bebé
de lua de mel! Viajámos imenso na lua de mel, mas cheguei
praticamente à conclusão de que o bebé foi concebido quando
estávamos num resort incrível no Sri Lanka, chamado Unawa-
tuna, todo cheio de orquídeas, bambus e paisagens lindas.
Unawatuna Brandon.
SOPHIE KINSELLA
14
Miss Unawatuna Orquídea-Bambu Brandon.
Hum. Não sei muito bem o que diria a minha mãe.
– A minha mulher teve um pequeno acidente na primeira
fase da gravidez – explica Luke sentado ao lado da cama. – De
modo que está um pouco ansiosa.
Aperta a minha mão, para me dar apoio, e retribuo o gesto.
O meu livro de gravidez, Nove Meses da Sua Vida, diz que deve-
mos incluir o parceiro em todos os aspetos da gravidez, de con-
trário ele pode sentir-se magoado e isolado. Por isso incluo Luke
o máximo que posso. Tipo: ontem à noite incluí-o enquanto via
o meu novo DVD, Braços Tonificados Durante a Gravidez. De
repente, ele lembrou-se de que precisava de fazer um telefonema
de negócios mesmo a meio e perdeu grande parte, mas o facto é
que não se sente isolado.
– A senhora teve um acidente? – A técnica fez uma pausa
e deixou de digitar no computador.
– Caí de uma montanha durante uma tempestade enquanto
andava à procura da minha irmã que não via há muito – explico.
– Nessa altura não sabia que estava grávida. E acho que talvez
tenha magoado o bebé.
– Percebo. – A técnica olha para mim com delicadeza. Tem
cabelo castanho quase grisalho, apanhado num nó, com uma
caneta enfiada. – Bem, os bebés são umas coisinhas resistentes.
Vamos espreitar, sim?
Pronto. Chegara o momento pelo qual estive obcecada
durante semanas. Cautelosamente, levanto a blusa e olho para
a barriga inchada.
– Não se importa de empurrar os colares para o lado? –
acrescenta. – Tem aqui uma bela coleção!
– São pingentes especiais. – Junto-os, chocalhando-os.
– Este é um símbolo asteca da maternidade e este é um cristal
de gestação... e este é um guizo para acalmar o bebé... e esta é
uma pedra do parto.
– Uma pedra do parto?
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
15
– Apertamo-la num ponto especial da palma da mão e ela
afasta as dores do parto – explico. – Os maoris usam-na desde
os tempos antigos.
– Hum, hum. – A técnica ergue uma sobrancelha e espreme
um pouco de gelatina transparente na minha barriga. Franze
um pouco a testa, pressiona a coisa do ecógrafo sobre a minha
pele e, instantaneamente, uma imagem turva, a preto e branco,
aparece no ecrã.
Não consigo respirar.
É o nosso bebé. Dentro de mim. Lanço um olhar a Luke e
vejo-o a olhar fixamente para o ecrã, hipnotizado.
– Ali estão as quatro divisões do coração... – A técnica movi-
menta o aparelho. – Agora estamos a ver os ombros... – Aponta
para o ecrã e olho, obediente, semicerrando os olhos, ainda que,
para ser sincera, não veja o ombro, apenas curvas indistintas.
– Está ali o braço... a mão... – A voz torna-se hesitante,
franze a testa.
Faz-se silêncio na pequena sala. Sinto uma súbita aflição.
Por isso ela franze a testa. O bebé só tem uma mão. Eu sabia.
Invade-me uma avassaladora onda de amor e proteção. Sinto
as lágrimas nos olhos. Não importa que o nosso bebé tenha ape-
nas uma mão. Vou amá-lo do mesmo modo. Vou amá-lo ainda
mais. Luke e eu vamos levá-lo a qualquer parte do mundo para
que tenha os melhores tratamentos e vamos criar um fundo de
investigação, e se alguém sequer se atrever a olhar para o meu
menino...
– ... e a outra mão. – A voz da técnica interrompe os meus
pensamentos.
– A outra mão? – ergo os olhos, engasgada. – Tem duas
mãos?
– Pois... tem. – A técnica parece espantada com a minha
reação. – Olhe, pode vê-las aqui. – Aponta para a imagem e, para
meu espanto, consigo aperceber-me dos dedinhos ossudos.
Dez.
SOPHIE KINSELLA
16
– Desculpe. – Engulo em seco, limpando os olhos com o
lenço de papel que me entrega. – É um enorme alívio.
– Tanto quanto posso dizer, parece-me tudo muito bem
– diz num tom tranquilizador. – E, não se preocupe, é normal
ficar emocionada durante a gravidez. São as hormonas que por
aí andam.
Francamente. As pessoas levam a vida a falar das hormonas.
Como o Luke ontem à noite, quando desatei a chorar durante
um anúncio na televisão em que aparecia um cãozinho. Não são
as hormonas, estou perfeitamente normal. Só que o anúncio é
mesmo muito triste.
– E aqui têm. – A técnica toca mais uma vez no teclado,
fazendo sair da impressora a tira de imagens a preto e branco que
me entrega. Olho para a primeira e consigo ver a nítida silhueta
de uma cabeça. Tem um narizinho, uma boca e tudo o mais.
– Bom, está tudo bem. – Faz girar a cadeira. – Só preciso
que me digam se querem saber o sexo do bebé.
– Não, obrigado – responde Luke com um sorriso. – Já con-
versámos muito sobre isso, não foi, Becky? E chegámos à con-
clusão de que, se soubermos, vamos estragar um pouco a magia.
– Muito bem – diz a técnica a sorrir. – Se decidiram assim,
nada direi.
«Nada dirá»? Significa que já viu qual é o sexo. Poderia
contar-nos neste preciso momento!
– Não decidimos bem, pois não? – intervenho. – Não é defi-
nitivo.
– Bom... decidimos sim, Becky. – Luke parece perplexo.
– Não te lembras? Falámos do assunto uma noite inteira e con-
cordámos que queríamos que fosse surpresa.
– Ah, pois, é verdade. – Não consigo afastar os olhos da
imagem obscurecida do bebé. – Mas podíamos ter agora a nossa
surpresa! E também seria mágico!
Pronto, talvez não seja exatamente assim. Mas será que
Luke não estará também ansioso por saber?
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
17
– É realmente isso que queres? – Quando ergo os olhos
vejo uma expressão de desapontamento no rosto dele. – Queres
ficar já a saber?
– Bem... – hesito. – Não, se tu não quiseres.
A última coisa que quero é aborrecer Luke. Tem sido tão
doce e amoroso desde que fiquei grávida! Recentemente ando
com desejos de todo o tipo de combinações. Por exemplo, outro
dia tive um desejo súbito de ananás e de um casaco de malha cor-
-de-rosa. E Luke levou-me às compras especialmente para isso.
Está prestes a dizer qualquer coisa quando o telemóvel dele
começa a tocar. Tira-o do bolso, mas a técnica ergue a mão.
– Desculpe, mas não pode usar aqui o telemóvel.
– Com certeza. – Luke franze a testa ao ver a identidade de
quem lhe quer falar. – É o Iain. O melhor será ligar-lhe depois.
Não preciso de perguntar qual Iain. Trata-se de Iain Whee-
ler, o superchefe de marketing do Grupo Arcodas. Luke tem
uma empresa de relações públicas, a Brandon Communications,
e o Arcodas é o novo grande cliente do Luke. Foi uma coisa do
outro mundo ter conseguido conquistá-lo, o que deu um impulso
fantástico à empresa – permitiu-lhe contratar mais um monte
de funcionários e está também a pensar abrir várias sucursais no
resto da Europa.
Portanto, está tudo bem com a Brandon Communications.
Mas, como sempre, Luke mata-se a trabalhar. Nunca o vi dar
tanta atenção a alguém. Se o Iain Wheeler telefona, ele devolve-
-lhe a chamada sempre, o máximo cinco minutos depois, até
mesmo a meio da noite. Diz que o trabalho é mesmo assim, que
o Arcodas é o seu mega cliente e que é para isso que lhe pagam.
Só posso dizer que, se por acaso o Iain Wheeler ligar
enquanto eu estiver em trabalho de parto, aquele telemóvel vai
janela fora.
– Têm aqui um telefone fixo que eu possa usar? – pergunta
Luke à técnica. – Becky, se não te importas...
– Tudo bem. – Aceno com a mão.
SOPHIE KINSELLA
18
– Vou dizer-lhe onde fica – diz a técnica, levantando-se.
– Volto num instante, Mistress Brandon.
Desaparecem os dois pela porta, que se fecha com um esta-
lido pesado.
Fico sozinha. O computador continua ligado. A coisa do
aparelho das ecografias está ao lado do monitor.
Poderia estender a mão e...
Não. Não sejas idiota. Nem sei usar o aparelho. E, além
disso, estragaria a surpresa mágica. Se o Luke quer que espere-
mos, muito bem, vamos esperar.
Mudo de posição na cama e examino as unhas. Posso espe-
rar pelas coisas. Claro que posso. É fácil…
Ai, meu Deus. Não posso. Até dezembro, não. E tenho-o
ali na minha frente... e não está aqui ninguém... vou só esprei-
tar um bocadinho de nada. Muito depressa. E não vou dizer
nada ao Luke. Teremos ainda a surpresa mágica no nascimento
– só que não será bem uma completa surpresa para mim. Pois
não.
Inclinando-me, consigo agarrar o manípulo do ecógrafo.
Encosto-o no ao gel que cobre a minha barriga e imediatamente
a imagem turva reaparece no ecrã.
Consegui! Agora só preciso mexê-lo ligeiramente para che-
gar ao bocadinho crucial...
Concentrada, franzindo a testa, desloco o aparelho sobre o
meu abdómen, inclinando-o para um lado e para o outro, esti-
cando a cabeça para espreitar o ecrã. É muito mais fácil do que
pensara! Talvez devesse arranjar emprego como técnica de eco-
grafia. Obviamente tenho jeito.
Ali está a cabeça. Uau, é enorme! E aquilo deve ser...
A minha mão fica imóvel e prendo a respiração. Acabo de
ver. Vi o sexo do meu bebé!
É um menino!
A imagem não é tão boa como a da técnica, mas mesmo
assim é inconfundível. Luke e eu vamos ter um filho!
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
19
– Olá – digo alto para o ecrã com a voz ligeiramente embar-
gada. – Olá, rapazinho!
E agora não consigo impedir que as lágrimas rolem pelas
faces. Vamos ter um menino maravilhoso! Posso vestir-lhe jardi-
neiras lindas, comprar um carrinho de pedais, e Luke pode jogar
críquete com ele, e vamos chamar-lhe...
Ah, meu Deus, que nome lhe vamos dar?
Pergunto a mim mesma se Luke gostaria de Birkin. Assim
eu poderia conseguir uma mala Birkin1 para levar as fraldas.
Birkin Brandon. Bem fixe.
– Olá, bebezinho – digo a cantarolar em voz suave para a
grande imagem redonda da cabeça no ecrã. – Queres chamar-te
Birkin?
– O que está a senhora a fazer? – A voz da técnica obriga-
-me a dar um salto. Está parada à porta com Luke, pasmada.
– Este equipamento pertence ao hospital! Não devia tocar-lhe.
– Desculpe – digo, limpando os olhos. – Mas precisava de
espreitar mais uma vez. Luke, estou a falar com o nosso bebé.
É simplesmente... incrível.
– Deixa-me ver! – Os olhos de Luke iluminam-se e ele
atravessa rapidamente a sala, seguido da técnica. – Onde?
Não me importo que Luke veja que é um menino e dê
cabo da surpresa. Tenho de partilhar com ele este precioso mo-
mento.
– Olha, ali está a cabeça! – aponto. – Olá, querido!
– Onde está a cara? – Luke parece um pouco perturbado.
– Não sei. Do outro lado. – Aceno ligeiramente ao de leve
com a mão. – Olha a mamã e o papá! E amamos-te muito,
muito...
– Mistress Brandon – interrompe a técnica. – A senhora
está a falar com a sua bexiga.
1 Mala de mão da Hermés, cujo nome é uma homenagem à atriz Jane Birkin. É um símbolo
de riqueza já que os seus preços variam entre os 5500 e os 110 000 euros. (N. da T.)
SOPHIE KINSELLA
20
* * *
Ora, como iria eu saber que era a minha bexiga? Parecia um bebé.
Quando entramos na sala do obstetra, ainda sinto as faces a
arder. A técnica fez-me um discurso enorme sobre os danos que
poderia ter causado a mim mesma ou à máquina, que poderia ter
partido, e só conseguimos livrar-nos dela quando Luke prometeu
uma grande doação para o laboratório.
E ela disse que, como eu nem chegara perto do bebé, era
muito improvável que tivesse visto o sexo. Humpf!
Mas, quando me sento diante do Dr. Braine, o nosso obs-
tetra, começo a sentir-me animada.
O Dr. Braine é um homem muito tranquilizador. Tem ses-
senta e poucos anos, cabelo grisalho e bem cortado, um fato de
riscas e um leve perfume a loção de barba antiquada. E pôs neste
mundo milhares de bebés, inclusivamente Luke! Para ser franca,
não consigo imaginar a Elinor, a mãe de Luke, a dar à luz, mas
acho que deve ter acontecido, seja lá como foi. E, assim que
descobrimos que estava grávida, Luke disse que precisávamos
de descobrir se o Dr. Braine ainda exercia, porque era o melhor
do país.
– Meu rapaz! – Aperta calorosamente a mão do Luke.
– Como estás?
– Muito bem. – Luke senta-se ao meu lado. – E como vai
o David?
Luke estudou com o filho do Dr. Braine e pergunta sempre
por ele quando nos encontramos.
Faz-se silêncio enquanto o Dr. Braine pensa na pergunta.
É a única coisa que acho um bocado irritante nele. O tipo reflete
acerca de tudo o que se lhe diz, como se fosse da maior impor-
tância, quando, na verdade, nada daquilo é mais do que uma
observação aleatória para manter a conversa. Na nossa última
consulta, perguntei-lhe onde comprara a gravata e ele refletiu
durante cerca de cinco minutos, depois telefonou à mulher para
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
21
se certificar e foi uma autêntica saga. E eu que nem gostava
daquela estúpida gravata.
– O David está ótimo – diz por fim acenando com a cabeça.
– Manda cumprimentos. – Segue-se outra pausa enquanto exa-
mina a ecografia. – Muito bom – comenta por fim. – Está tudo
em ordem. Como se sente, Rebecca?
– Ah, estou bem! – respondo. – E feliz, porque o bebé está
ótimo.
– Continua a trabalhar a tempo inteiro, pelo que vejo. – O
Dr. Braine olha para a minha ficha. – Não será demasiado exi-
gente para si?
A meu lado, Luke disfarça uma fungadela. É mesmo mal-
-educado!
– Bom... – Tento pensar na melhor maneira de dizer as
coisas. – O meu trabalho não é assim tão exigente.
– A Becky trabalha no The Look – explica Luke. – Sabe,
doutor, aqueles armazéns novos em Oxford Street.
– Ah! – A expressão do Dr. Braine esmorece. – Percebo.
Sempre que digo às pessoas o que faço, elas desviam o olhar,
embaraçadas, mudam de assunto ou fingem que nunca ouviram
falar do The Look. O que é impossível, porque todos os jornais
o mencionam há semanas. Ontem o Daily World chamou-lhe o
«maior desastre de venda a retalho da história britânica».
O único lado bom de trabalhar numa loja falida é que isso
significa poder ter todo o tempo necessário para ir ao médico ou
frequentar as aulas pré-natais. E, se não voltar a toda a pressa,
ninguém sequer repara.
– Tenho a certeza de que as coisas vão melhorar em breve
– diz ele, encorajando-me. – Bom, têm mais alguma per-
gunta?
Respiro fundo.
– Na verdade, tinha uma pergunta, doutor Braine – hesito.
– Agora que os resultados dos exames estão bons, o doutor diria
que é seguro... o doutor sabe...
SOPHIE KINSELLA
22
– Sem dúvida nenhuma – garante o Dr. Braine entendendo
perfeitamente. – Muitos casais abstêm-se de ter relações sexuais
no início da gravidez...
– Não estou a falar de sexo! – exclamo surpreendida. – Estou
a falar de fazer compras!
– Fazer compras? – pergunta o Dr. Braine perplexo.
– Ainda não comprei nada para o bebé – explico. – Não
queria estragar as coisas. Mas, se tudo parece estar bem, posso
começar esta tarde!
Não consigo evitar parecer entusiasmada. Esperei tanto tempo
para começar a fazer as compras do bebé. E acabei de saber de
uma nova e fabulosa loja de bebés chamada Bambino, na King’s
Road. Na verdade, tirei a tarde de folga especialmente para lá ir!
Sinto o olhar de Luke sobre mim, volto a cabeça e vejo que
me olha incrédulo.
– Querida, «começar» como? – pergunta.
– Ainda não comprei nada para o bebé! – digo para me
defender. – Sabes que não.
– Mas então... Não compraste um roupão Ralph Lauren
em miniatura? – Luke conta pelos dedos. – E um cavalinho de
baloiço? E um fatinho de fada cor-de-rosa com asas?
– Essas coisas são para quando a criança andar – replico com
dignidade. – Não comprei nada para o bebé.
Francamente. Luke não será bom pai se não souber a dife-
rença.
– E o que faremos se for um menino? – pergunta. – Vesti-
mos-lhe o fatinho de fada cor-de-rosa?
Para falar verdade pensava vesti-lo eu mesma. Já o experi-
mentei e estica bastante! Não que o vá admitir a Luke.
– Sabes, estou surpreendida contigo, Luke. – Ergo o queixo.
– Não te julgava preconceituoso.
O Dr. Braine acompanha a nossa conversa, surpreendido.
– Parece-me que não querem saber o sexo do bebé, pois
não? – intervém.
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
23
– Não, obrigado – afirma Luke, decidido. – Queremos man-
ter a surpresa, não é assim, Becky?
– Ah... sim. – Aclaro a garganta. – A não ser que o doutor
julgue que seja bom sabermos por razões médicas urgentes.
Olho intensamente para o Dr. Braine, que não capta a men-
sagem.
– De modo algum. – Sorri de orelha a orelha.
Raios!
Passam mais vinte minutos até sairmos do consultório em três
dos quais o Dr. Braine me examina e, nos restantes, ele e Luke
recordam um qualquer jogo de críquete da escola. Tento ser edu-
cada e ouvir, mas não posso evitar remexer-me de impaciência.
Quero ir à Bambino!
Por fim, a consulta acaba e saímos para a movimentada rua
de Londres. Uma mulher passa com um antiquado carrinho de
bebé Silver Cross, que examino discretamente. Não há dúvida de
que quero um carrinho assim, com aquelas rodas fantásticas que
balançam. Só que quero um acabamento em rosa-choque. Vai
ficar fabuloso. As pessoas chamar-me-ão a Miúda do Carrinho
de Bebé Rosa-Choque. Se for menino, mando pintá-lo com
um spray azul-claro. Não... azul-esverdeado. E toda a gente vai
dizer...
– Falei com o Giles, da imobiliária, hoje de manhã – disse
Luke interrompendo os meus pensamentos.
– Ah sim? – Levanto os olhos, entusiasmada. – E há alguma
coisa?
– Nada.
– Ah! – Lá se vai o entusiasmo.
De momento, moramos numa cobertura incrível que Luke
possui há anos. É fantástica, mas não tem jardim e, com tapetes
beges imaculados por tudo quanto é sítio, não é exatamente o
lugar perfeito para um bebé. De maneira que a pusemos à venda
SOPHIE KINSELLA
24
há umas semanas e começámos a procurar uma bela casa para
a família.
O problema é que o apartamento foi comprado imedia-
tamente. O que – modéstia à parte – se deveu inteiramente à
minha brilhante decoração. Pus velas em toda a parte, uma gar-
rafa de champanhe na casa de banho e um monte de toques «de
estilo», como programas de ópera e convites para acontecimen-
tos sociais chiques (emprestados pela Suze, a minha amiga ele-
gantérrima.) E o casal Karlsson fez imediatamente uma oferta!
E pagam em dinheiro!
O que é fantástico, mas… e onde vamos morar? Não vimos
uma única casa de que tenhamos gostado; agora o agente explica
que o mercado está muito «seco» e «pobre» e se já pensámos em
alugar?
Eu não quero alugar. Quero ter uma linda casa nova para
levar o meu bebé.
– E se não encontrarmos? – Olho para Luke. – E se ficar-
mos na rua? Será inverno! Vou estar incrivelmente grávida.
Tenho uma imagem súbita de mim a percorrer Oxford
Street enquanto um coro canta «Toca o sino pequenino».
– Querida, não vamos ficar na rua! Mas o Giles disse que
talvez devêssemos ser mais flexíveis nas nossas exigências. – Luke
faz uma pausa. – Acho que ele se referia às tuas exigências, Becky.
É muito injusto! Quando mandaram um formulário para a
procura de imóveis, o papel dizia: «Por favor, seja o mais especí-
fico possível nos seus desejos.» Foi o que fiz. E agora reclamam!
– Parece que podemos esquecer o quarto de sapatos – acres-
centa.
– Mas... – Detenho-me ao ver a expressão dele. Uma vez
vi um quarto de sapatos no Lifestyle of the Rich and Famous2 e
desde então morro de desejo de ter um. – Mas pronto – digo
humildemente.
2 Série de televisão americana que foi para o ar entre 1984 e 1995. (N. da T.)
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
25
– E talvez tenhamos de ser mais flexíveis em relação à loca-
lização.
– Não me importo com isso! – afirmo enquanto o telemóvel
de Luke começa a tocar. Na verdade, acho que é até boa ideia.
Luke é que sempre gostou muito de Maida Vale, não eu. Há
montes de lugares onde gostaria de morar.
– Fala Luke Brandon – responde ele com ar profissional.
– Ah, olá. Já fizemos a ecografia. Está tudo ótimo. É a Jess – diz
voltando-se para mim. – Tentou falar contigo, mas tens ainda o
telefone desligado.
– Jess! – exclamo encantada. – Deixa-me falar com ela!
Jess é a minha irmã. A minha irmã. Ainda acho o máximo
dizê-lo. Durante toda a vida pensei ser filha única e afinal des-
cobri que tinha uma irmã há muito perdida! A princípio não nos
entendemos perfeitamente, mas desde que ficámos as duas presas
numa tempestade e conversámos como devia ser, tornámo-nos
amigas.
Há uns meses que não a vejo porque ela esteve na Guate-
mala, num projeto de investigação geológica ou coisa que o valha.
Mas telefonámos uma à outra e trocámos e-mails e ela mandou-
-me fotografias no cimo de um penhasco qualquer. (Vestindo
um horroroso anoraque azul em vez do casaco de pele falsa tão
fixe que lhe ofereci. Mas onde já se viu!)
– Vou voltar para o escritório – diz Luke ao telefone. – E a
Becky vai fazer compras. Queres falar com ela?
– Chiu! – sussurro, horrorizada. Luke sabe que não deve
mencionar a palavra «compras» a Jess.
Fazendo-lhe uma careta, pego no telefone e encosto-o ao
ouvido.
– Olá, Jess! Como vão as coisas por aí?
– Fantásticas! – A voz está distante e cheia de estalidos. – Só
liguei para saber como correu a ecografia.
Não posso deixar de me sentir emocionada por se ter
lembrado. Estará provavelmente algures, sobre alguma fenda
SOPHIE KINSELLA
26
suspensa de uma corda, retirando lascas da face da rocha, mas
mesmo assim lembrou-se de ligar.
– Está tudo ótimo!
– Sim, o Luke já me disse. Graças a Deus. – Pelo seu tom de
voz apercebo-me de que está aliviada. Sei que ela sente remorsos
por eu ter caído da montanha, porque fui lá para procurá-la,
porque...
De qualquer forma, é uma longa história. A questão é que
o bebé está ótimo.
– Olha, o Luke disse que ias às compras?
– Só umas coisas essenciais para o bebé – digo em tom
natural. – Por exemplo... fraldas recicladas. Na loja de artigos
em segunda mão. – Estou a ver o Luke a rir-se de mim, mas
volto-me rapidamente.
O problema é que a minha irmã Jess não gosta de gastar
dinheiro nem de arruinar a Terra com o consumismo malvado.
E acha que eu também não. Acredita que segui o caminho dela
e abracei a frugalidade.
Assim fiz, por uma semana. Encomendei uma embalagem
grande de flocos de aveia, comprei umas roupas na Oxfam e fiz
sopa de lentilhas. Mas o problema de ser frugal é o ser muito
chato! Enjoamo-nos da sopa, de não comprar revistas porque são
um desperdício de dinheiro e de colar as sobras de sabonete para
fazer uma bola grande e nauseabunda. E a aveia estava a ser tão
usada como os tacos de golfe de Luke, de modo que acabei por
deitá-la fora e comprar Weetabix.
Só que não posso contar à Jess para não dar cabo do nosso
belo laço fraternal.
– Viste o artigo sobre como fazer as toalhitas de bebé? –
pergunta entusiasmada. – Deve ser muito fácil. Já comecei a
guardar trapos. Podemos fazê-las juntas.
– Oh... pois… sim!
Jess manda-me constantemente exemplares de uma revista
chamada Bebé Frugal. Tem títulos de artigos como «Monte o
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
27
quarto do seu bebé por 25 libras!» e fotografias de bebés vestidos
com velhos sacos de farinha, coisa que me deprime só de ver. Não
quero que o meu bebé durma num cesto de plástico para roupa.
Quero comprar um bercinho com folhos brancos muito giros.
E agora ela fala-me de uma coisa chamada babygrows de
cânhamo sustentável, por isso acho melhor acabar com a con-
versa.
– Tenho de desligar, Jess. Vais à festa da mãe?
A minha mãe vai dar uma festa pelos seus sessenta anos no
fim de semana que vem. Convidou um monte de gente, haverá
uma banda e o Martin, o nosso vizinho, fará os seus truques de
magia.
– Claro! – responde Jess. – Não a perderia por nada! Vemo-
-nos lá.
– Adeus!
Desligo o telefone, volto-me e vejo que Luke conseguiu
arranjar um táxi.
– Queres que te deixe na loja de roupa em segunda mão? –
pergunta, abrindo a porta.
Ah, ah, ah.
– Bambino, na King’s Road, por favor – digo ao motorista.
– Também queres vir, Luke? – acrescento com súbito entusiasmo.
– Poderíamos ver uns carrinhos fixes e isso e depois beber um
chá num sítio simpático...
Pela expressão de Luke, já sei que vai dizer não.
– Tenho de voltar, minha querida. Reunião com o Iain. Da
próxima vez vou, prometo.
Não adianta ficar desapontada. Sei que ele está a traba-
lhar integralmente na conta do Arcodas. Pelo menos, conseguiu
arranjar tempo para me acompanhar à ecografia. O táxi parte e
Luke passa-me o braço pelos ombros.
– Estás com um aspeto luminoso – comenta.
– A sério? – retribuo o sorriso. Hoje sinto-me muito bem
com as minhas fabulosas calças de ganga pré-mamã, sandálias
SOPHIE KINSELLA
28
de salto alto e uma blusa sexy, de gola alta, da Isabella Oliver, que
puxei para cima, para mostrar só um pouco de barriga bronzeada.
Nunca havia notado – mas estar grávida é incrível! Claro,
a barriga cresce, mas é exatamente o que deve acontecer. E, em
comparação, as pernas parecem mais finas. E de repente ficamos
com um decote maravilhoso. (Do qual, devo dizer, Luke gosta
muito.)
– Vamos ver mais uma vez as imagens da ecografia – diz ele.
Meto a mão na mala e retiro de lá o rolo de imagens bri-
lhantes. Ficamos a vê-las os dois durante algum tempo: a cabeça
redonda, o perfil do pequenino rosto.
– Estamos a criar uma pessoa totalmente nova – murmuro
com os olhos fixos. – Dá para acreditar?
– Bem sei. – Luke estreita-me nos seus braços. – É a maior
aventura que alguma vez teremos.
– É incrível como a natureza funciona. – Mordo o lábio,
sentindo-me de novo invadida pelas emoções. – Surgiram em
mim todos estes instintos maternais. Sinto como... se quisesse
dar tudo ao nosso bebé!
– Bambino – diz o motorista, estacionando junto ao pas-
seio. Ergo os olhos das imagens da ecografia e vejo a fachada da
loja mais fantástica, novinha em folha. Toda em creme, o toldo
às riscas vermelhas, o porteiro vestido como um soldadinho de
chumbo e as montras são uma arca de tesouro para crianças.
Há lindas roupinhas de bebé nos manequins, uma caminha em
forma de Cadillac dos anos 50, uma roda gigante de verdade
sempre a girar…
– Uau! – exclamo sufocada, estendendo a mão para o puxa-
dor da porta do táxi. – Será que aquela roda gigante está à venda?
Adeus, Luke, até logo...
Já passei a entrada quando ouço Luke gritar:
– Espera! – Volto-me e leio-lhe no rosto uma leve expressão
de susto. – Becky. – Luke inclina-se para fora do táxi. – O bebé
não precisa de ter tudo.
DOIS
Como foi que, afinal, consegui adiar tanto as compras para o bebé?
Cheguei à secção de bebés da Bambino, no primeiro andar.
A alcatifa é macia, ouvem-se canções de embalar através do
sistema de som e há enormes animais de peluche a decorar a
entrada. Um funcionário vestido de Peter Rabbit entregou-me
um cesto de verga branco e, quando olho em redor, agarrando-o,
sinto o entusiasmo invadir-me.
Dizem que a maternidade nos modifica – e estão certos.
Pela primeira vez na vida não penso só em mim. Sinto-me total-
mente altruísta! Tudo para o bem-estar do meu bebé, que ainda
não nasceu.
Numa direção, há filas de berços maravilhosos e móbiles que
giram, tilintando. Noutra, avisto o brilho cromado e atraente dos
carrinhos de bebé. À minha frente, há expositores com pequenís-
simas roupinhas. Dou um passo em frente, em direção às roupas.
Vejam só aqueles lindos sapatinhos de coelho. E os minúsculos
casacos de couro almofadado... e há uma gigantesca secção de
Bebé Dior... e, oh, meu Deus, júnior Dolce...
Tudo bem. Calma. Vou organizar-me. Só preciso de uma
lista.
Retiro do meu saco o Nove Meses da Sua Vida e vou direita
ao capítulo oito, «Compras para o seu Bebé» e, ansiosa, começo
a examinar a página.
SOPHIE KINSELLA
30
Roupas
Não se sinta tentada a comprar roupas muito pequeninas
para o seu bebé. O branco é recomendado pela facilidade
de lavagem. Três babygrows simples e seis bodies serão
suficientes.
Por uns momentos olho para aquelas palavras. Decerto, não
será boa ideia seguir um livro à risca. Dizia até na introdução:
«Não quererá seguir absolutamente todos os conselhos. Cada
bebé é diferente, por isso deve guiar-se pelo seu instinto.»
O meu instinto diz-me que devo comprar um casaco de
couro.
Dirijo-me para o mostruário e observo as etiquetas dos
tamanhos: «Bebé recém-nascido», «Bebé pequeno». Como hei
de saber se terei um bebé pequeno? Até agora parece muito
pequeno, mas quem o poderá dizer? Talvez deva comprar os dois,
para maior segurança.
– É o fatinho para a neve da Baby in Urbe! – A mão com
unhas impecáveis aparece no varão à minha frente e apanha um
fatinho acolchoado, num cabide preto chique. – Estava louca
para encontrar um.
– Eu também! – digo instintivamente e apanho o último
que resta.
– Sabe que no Harrod’s a lista de espera para estes é de seis
meses? – A dona da mão é uma gravidíssima loira de calças de
ganga e blusa stretch turquesa. – Oh, meu Deus, têm toda a cole-
ção da Baby in Urbe! – E começa a empilhar as roupas de bebé
no cesto de verga branco. – E olhe! Têm sapatos Piglet. Preciso
de comprar uns para as minhas filhas.
Eu nunca sequer ouvira falar da Baby in Urbe. Ou dos sapa-
tos Piglet.
Como posso ser tão pouco fixe? Como será possível não ter
ouvido falar em nenhuma dessas marcas? Enquanto examino as
minúsculas roupinhas diante de mim, sinto um ligeiro pânico.
LOUCA POR COMPRAS ESPERA UM BEBÉ
31
Não sei o que se usa e o que não se usa. Não faço a mínima ideia
sobre moda de bebé. E só tenho cerca de quatro meses para me
atualizar.
Posso sempre perguntar à Suze. É a minha melhor e mais
antiga amiga e tem três filhos. Ernest, Wilfrid e Clementine.
Mas com ela as coisas são um pouco diferentes. A maior parte
das roupas de bebé é bordada à mão, passada de geração em
geração e cerzida pela velha empregada da mãe dela, e os bebés
dormem nos antigos berços de carvalho do solar da família.
Apanho dois pares de sapatos da Piglet, vários macaquinhos
da Baby in Urbe e um par de Jellie Wellies, pelo sim, pelo não.
Então vejo o vestidinho cor-de-rosa mais lindo do mundo. Tem
botões cor de arco-íris, cuequinhas do mesmo tecido e meias
minúsculas. É simplesmente fantástico. Mas e se tivermos um
menino?
É impossível não saber o sexo. Deve haver algum meio de
descobrir secretamente.
– Quantos filhos tem? – pergunta a jovem da blusa turquesa,
para fazer conversa, enquanto espreita para dentro dos sapatos
para ver os tamanhos.
– É o meu primeiro. – Aponto para a barriga.
– Que maravilha! Tal e qual a minha amiga Saskia. – Aponta
para uma jovem de cabelo escuro ali perto. É magra como um
palito, sem qualquer sinal de gravidez, e está a falar ao telemóvel
muito concentrada. – Acabou de descobrir. É tão emocionante!
Neste momento, Saskia fecha o telemóvel e vem na nossa
direção, com o rosto resplandecente.
– Consegui! – exclama. – Consegui a Venetia Carter!
– Oh, Saskia! É fantástico! – A jovem da blusa turquesa larga
o cesto de roupas mesmo em cima do meu pé e lança os braços
ao pescoço de Saskia. – Desculpe! – acrescenta, animada, quando
lhe devolvo o cesto. – É uma ótima notícia! A Venetia Carter!
– Também vai à Venetia Carter? – pergunta-me com súbito
interesse.
SOPHIE KINSELLA
32
Estou tão fora das coisas de bebé! Não faço a mínima ideia
de quem ou o que é a Venetia Carter.
– Nunca ouvi falar – admito.
– Com certeza que sabe. – A jovem da blusa turquesa arre-
gala os olhos. – A obstetra! A obstetra celebridade absolutamente
imprescindível!
Obstetra celebridade absolutamente imprescindível?
Começo a ficar com pele de galinha. Há uma obstetra cele-
bridade absolutamente imprescindível e eu não sabia?
– A de Hollywood! – explica a jovem da blusa turquesa.
– Faz o parto dos bebés das estrelas de cinema. Deve ter ouvido
falar. Mudou-se agora para Londres. Todas as supermodelos vão
para ela. Faz até festas para as clientes, não é fabuloso? Levam
os bebés e ganham uns sacos de brindes fabulosos...
O meu coração acelera enquanto ouço. Sacos de brindes?
Festas com supermodelos? Não acredito que estou a perder tudo
isso. Mas por que razão nunca ouvi falar da Venetia Carter?
A culpa é toda de Luke. Fez-nos ir diretamente ao velho e
bolorento Dr. Braine. Nem chegámos a pensar em mais ninguém.
– E ela é boa a... bem... fazer os partos? – pergunto, ten-
tando permanecer calma.
– Oh, a Venetia é maravilhosa – refere Saskia, que parece
muito mais intensa que a amiga. – Não é como esses médi-
cos antiquados. Liga-se realmente connosco. Amanda, a minha
patroa, fez o mais fabuloso parto holístico dentro de água, com
flores de lótus e massagem tailandesa.
Massagem tailandesa? O Dr. Braine jamais sequer mencio-
nou a massagem tailandesa.
– O meu marido não quer pagar para que eu tenha o bebé
com ela – diz a jovem da blusa turquesa. – É um forreta. Tu,
Saskia, tens uma sorte!
– Como se consegue uma consulta para ela? – As pala-
vras saem-me da boca para fora antes que possa evitar. – Tem a
morada? Ou o telefone?