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Wilson Britto
Colaboração
Melina Castro
KathmanduA história de uma liderança natural,
a liderança invisível
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Britto, Wilson Kathmandu : a história de uma liderança natural, a liderança invisível / Wilson Britto; colaboradora Melina Castro. -- Cuiabá, MT : Entrelinhas, 2013.
Bibliografia. ISBN 978-85-7992-049-3
1.Filosofia2.Liderança3.Gestãoempresarial4. Psicologia 5. Qualidade de vida no trabalho 6.FicçãobrasileiraI.Título.
Av. Senador Metello, 3773 | Jardim Cuiabá CEP 78030-005 | Cuiabá/MT
Telefax: 65 3624 5294 / 3624 8711 | [email protected] www.entrelinhaseditora.com.br
©TodososdireitosdestaediçãoreservadosparaEntrelinhasEditora.
DadosInternacionaisdeCatalogaçãonaPublicação(CIP)(CâmaraBrasileiradoLivro,SP,Brasil)
Índicesparacatálogosistemático: 1.Filosofia:Gestãoempresarial:Qualidadedevida
notrabalho:Literaturabrasileira158.7
13-00176 CDD-158.7
Editora
Maria Teresa Carrión Carracedo
Produção Gráfica
Ricardo Miguel Carrión Carracedo
Diagramação • Capa
Maike Vanni
fotos da caPa
Capa:TemplobudistaBoudhanathStupa-Nepal|think4photop|Shutterstock4ªCapa:MonteEverest,nafronteiraentreoNepaleoTibete | Ignacio Salaverria | Shutterstock
fotos das Entradas dE caPítulo
Melina Castro
rEvisão
Henriette Marcey Zanini
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Reconhecimento
Estaobranãoseriapossívelsenãocontassecomasideias,reflexões,pensamentos,falasdeoutrasmentescomo:osfilósofos,pensadores
eeducadoresLao-Tsé,Confúcio,Heráclito,Sócrates,Platão,Aristóteles,Djalal-Ud-DinRumi,RenéDescartes, ImmanuelKant,Arthur Scho-penhauer,FriedrichHegel,FriedrichNietzsche,RalphWaldoEmerson,SörenKierkegaard,SigmundFreud,DouglasMcGregor,AbrahamMas-low, Marshall Dimock, Alan Watts, Osho, Max de Pree, Michael Useem, WilliamJames,HowardGardner,RamCharam,PaulTaffinder,JimKou-zes,BarryPosner,IchakAdizes,DonaldoSchüler,MatthewMay,JohnClarke, Cleary Thomas, Jagdish Sheth, Barry Posner, James O’Toole, Michael Korda, Kami Tharkay – Ajïbar.
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Aforismos [ Pensamentos-síntese sobre pontos profundos desta obra ]
“ALiderançaéumdosfenômenosmaisobservadosemenoscompreendido”.(James McGregor Burns)
“Seusplanos?OEverest;avidanãoliga”.
“Porbaixodotapetededesenhosharmoniososháumatramadesordenadadefios”.
“Oindivíduoétodaumavidaenãooseuresultado”. (Friedrich Nietzsche, em A vontade de poder)
“Lidere,masnãoespereirparaocéucomorecompensa;liberte-sedospreconceitosidealistas”.
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“Quantomaispoderesvocêdelega,maisvocêadquire”.
“Liderançanãoéprivilégio,é(quase)umaobrigação”.
“Aúnicamaneiradesetornarumlíderéserverdadeiroconsigomesmo.Asubmissãoéinimigadaliderança.Elapermitequeosoutrosnosdefinam”.
“Umhomempodeserumaestreladeprimeiragrandezaemqualidades,forçadevontadeeperseverança,mastãoequilibradoquegiracomo
sistemaaquepertence,semnenhumafricçãoouperdadeenergia.Outropodeterasmesmasgrandesqualidades,ouaindamaisapuradas,masoeixonãolhepassaprecisamentepelocentroeeledesperdiçametadedasuaforçaemmovimentosexcêntricosqueoenfraquecemeperturbamoambiente”.(Michael Korda, em O poder: como conquistá-lo,comoutilizá-lo)
“HáfatosnaHistóriaquesãotãochocantesquenãodáparaserapenastestemunha”.
“Liderança?Quesejaelevadacomoumtemacentraldavida:liderançaédoaroexcessoderiquezaexistencial”.
“Cemanos?Representammuitopouconoâmbitodascoisasquerealmenteinteressam,quesãoascoisas‘primeiras’e‘últimas’”.
“Cadacoisavaleaquiloquesepagouporela”. (Friedrich Nietzsche, em A vontade de poder)
“Queosúltimossejamrealmenteosúltimos”.
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Uma história 13
Alpinistas 29
Everest: uma metáfora 77
Ar rarefeito 97
Deusdeplantão 121
A harmonia oculta 149
O manso 173
Seguidores 213
Mudanças 245
Resultados 263
Fracassos 291
Opreçodaliderança 307
Humano, demasiado humano 343
Referências 363
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Dud
h K
hola
Phaplu(2.400 m)
Nunthala (2.250 m)
Kharikhola (2.250 m)
Puiyan (Chutok)(2.800 m)
Lukla (2.800 m)
Phakdingma (2. 500 m)
Namche bazar(3.440 m)
Thame(3.480 m)
Khumjung(3.790 m)
Dhole (4.040 m)
Lhabarma (4.320 m)
Luza (4.370 m)
Machherma (4.410 m)
Thore (4.390 m)
Khamassa (4.340 m)
Thare (4.300 m)
Konar(4.000 m)
Pangboche(3.958 m)
Pheriche(4.240 m)
Na (4.410 m)
Dingboche(4.350 m)
Chhukung(4.730 m)
High camp(5.700m)
Dughla (4.620 m)
Lobuche (4.930 m)
Cho La (5.420 m)
Dzonglha(4.843 m)
Gorak Shep (5.160 m)
Everest Base Camp(5.400 m)
Gokyo (4.750m)Leiyasa
Pareshaya Gyab(4.970 m)
Phang (4.470 m)
Shyangboche (3.760 m)
Phunki (3.250 m)
Thengboche (3.867 m)
Mingbo(4.530 m)Deboche
To Tashi Lapsa
Kharte
Kangtega (6.685 m)
Ama Dablang (6.856 m)
Island Peak (Imja Tse) (6.165 m)
Khumbi la (5.761 m)
Gokyo Peak (5.483 m) Lobuche Peak(6.119 m)
Cholatse(6.440 m)
Kala Patar (5.545 m)
Pumori (7.145 m)
Khumbutse (6.640 m)
Nuptse (7.873 m)Lhotse (8.516 m)
Mount Everest (8.848 m)
Percurso de Lukla ao Acampamento
Base do Everest
AcaminhadaatéabasedoEverestfoiinspiradanolivroA morada dos deuses,
deCarlosTramontina(2004).
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Uma história
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Kathmandu
ViajaríamosparaoNepalcomumpropósitobemdefinido: realizarumretiroespiritualnomonastérioKopan,emKathmandu.Masha-
víamostomadoconhecimentodeumroteirorealizadoporumaempresadeturismoquenospossibilitariarealizarumaexcursãoatéabasedoEve-rest.Houveumamudançadeplanos.AochegaraoNepal,permaneceríamostrêsdiasemKathmandu—
suacapital—earredores,paraconheceraregião.Emseguida,partiría-mosemumaexcursãodedozediasatéabasedoEverest.Contaríamoscomapresençadeumguiasherpaeseusajudantesnessaaventura.Retor-naríamosaKathmanduapósesses15primeirosdiasepassaríamosduassemanasnomonastérioKopan.Nossa visita de três dias àKathmandu revestia-se de um interesse
turístico.Porém,opercursodedozediasatéabasedoEverest,utilizandoomontanhismocomoumametáforaparaosterritóriosmentaisqueha-bitamos,visavanos“aproximar”dostriunfosedascatástrofesdaregião,pararefletirsobrealgunstemascentraisdavida.Sempre se nutre uma grande reverência pelos picos doHimalaia,
como Sublime matemático.Sublimematemático: tudonanaturezadian-tedoqualoshomenssetornampequenos,impotentes,masaomesmotempoassumemumagrandiosidadeemtermosdeuniãocom“omaiselevado”.Admiramosseuspicos:Everest,K2,Lhotse,Makalu... Jamaispensamosemescalá-los.Masqueríamoschegaraosseuspésecontem-plarsuagrandeza.
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Nossoguiasherpa,KamiTharkay,tambémconhecidocomoAjïbar,oEstranho,eraumprofissionalexperiente.Profundoconhecedordemon-tanhismo e um estudioso do tema liderança.HaviaescaladoopicodoEverestpormaisdeumavezesededicava,agora,aconduzirexpediçõesnorte--americanaseinglesas,principalmente,formadasporexecutivos,líderesempresariaisquefaziamusodaescaladacomoummétodovoltadoàto-madadedecisões.Existemexpediçõesespecialmentepreparadasparautilizarospercur-
sosatéasombradoEverestcomumavisãodirecionadaparaoaprimo-ramentoda liderançaereflexõessobreo tema.A ideiadeutilizarumaexcursãoatéabasedoEverest,comtodososseuspercalços,voltadaparaoaprimoramentodaliderançanoscativou.Porém,nestecaso,nossosin-teressesiammaisalém.Percorrer trilhas em direção aos picos doHimalaia proporciona a
oportunidade de inúmeras reflexões sobre o tópico liderança em seusaspectosmaisamplos:poderiamosvalesmisteriososdoNepaloferecerumnovodiscernimentosobreonossopotencialdeliderança?Poderiamsuscitarrespostasparaindagaçõesmaisprofundassobreotema?Eoquesignificaalcançarumpontoelevado?Oqueconquistamosapósteratin-gidoo topo?Ofatoéquevocênuncaconquistaumamontanha.Vocêpermanecenocumeporalgunsbrevesminutose,então,oventoapagaamarcadesuaspegadas.Masporque,apesardisso,aspessoascontinuamescalando?Emnossaviagem levávamoscomodiáriodebolsopequenas agen-
das,destinadasaanotarnossasimpressõessobreavidalocale,sobretudo,nossaspercepções.Comoestesdiáriosse tornarammotivopararelatarumahistória sobre liderança, ao certonão sabemos.Há, demodoge-ral,umaadmiraçãosobreavidadaquelesconsiderados“grandeslíderes”:Alexandre—oGrande,GenghisKhan,Napoleão,Ghandie,maisrecen-temente,MartinLutherKingeMandela,comoexemplos.Masnãopre-tendíamosescreverumlivrosobreliderança.Estetema,paranós,estariaesgotado.Aslivrariasestãorepletasdeobrasrelatandoopapeldolíder,seuperfil,suaeficácia...Justificaria?Pudemos constatar em nossa convivência comAjïbar, o Estranho,
queeleerarealmenteumestudiosoeprofundoconhecedordotemali-derança.Foipossívelcompreenderatravésdesuasfalasque,praticamen-
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te,tudoquepodeserditosobreliderançaresideemtrêsgrandespontos:o Poder — Vontade de Poder —, o Caráter Empírico e o Talento.Tópicosbemexploradospelafilosofia.Ajïbarentendiaqueaquelequevemaestemundocomumamaior
dosedesses trêselementos torna-se líder,querqueira,quernão.Lide-rançaéumaherança“espiritual”—eledizia—,benditaoumaldita,poisliderança não é um privilégio, é “quase” uma obrigação. E, de acordo com a influênciados“valores”estabelecidospeloshomensno“jogodopoder”eaceitospelolíder,esteadotaemsuavidaummodelodeliderança.PudemosaindaentenderqueomodelodeliderançaadotadoporAjï-
bar—liderança natural que se aproxima dos princípios taoístas—diferetradi-cionalmentedoqueévalorizado,enaltecido,nostratadossobreliderançaemtermosdeOcidente.Muitodoqueseestimaemnossasorganizações,noquetangeàliderança,deixadeterseuvalorsobaóticadeumalide-rançanatural.MuitodoqueconcerneàliderançanoOcidente,quersejacontingencial,quersejamoralouvirtuosa,paraAjïbar,deixadesê-lo.Emse tratando de um confronto entre a liderança natural e demais modelos ocidentais,oqueéadequadosetornainapropriado,oqueéretosetornatortuoso.Tudoporquecontrariaoqueénaturalnavida.
Um novo olhar sobre o tema liderança
Aliderançaéumveioexcessivamenteexplorado.Dezenas,centenasdelivrossobreestecampocontinuamentesãolançados.Cadaautorpro-curaumamaneiranovadeexplorarotema.Temaesgotado.Cadaumnailusãodedarasuacontribuição.
De uma maneira geral a temática gira em termos do desenvolvimen-todoslíderescomodiferencialcompetitivo;comofecharalacunaentreosresultadosprometidosealcançados;formularvisõesinspiradoras;to-madaeimplantaçãodedecisões.Taisobrasprocuramdarrespostasparaalgunspontosbásicosetradicionaissobreoassunto,taiscomo:oqueéliderança?Éumdomdenascença ou adquirido?Como se tornarumbomlíder?Pode-seserumempreendedorsemserlíderouvice-versa?
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Nãodevemos tambémesquecerdosmodismos:o líder servidor,olíderespiritual,JesusCristo,oGrandeLíder...Todotematemasuaim-portância,masmuitosepecaquandoomesmoéabordadodeumama-neira rasa. Aciênciaofereceasuacontribuição,apsicologiaajuda,masvaiaté
o intelecto.Não contempla grandes respostas.Fala-se doperfil, papel,cargodaliderançaesuasresponsabilidades.Porém,nãosecogitafalardovalor existencial da liderança, o porquê se vem líder a este mundo;nãosecogitafalar de um autêntico “servir”:servirnãonosentidomoral,nãonosentidoreligiosoounosentidodevisarsomenteresultados;nãosecogitafalardovalor circunstancial do “momento”emliderança.Descartes,emumadesuasobras,aofalarsobreasemoçõesesclarece
queoqueosantigoshaviamensinadoeratãopoucacoisa,e,namaio-ria,tãopoucodignodeserapreciado,quenãohaveriaoutramaneiradeeleseaproximardaverdadeanãosersedistanciandodoscaminhosqueeleshaviampercorrido.Assim,teriaqueescrevercomosesetratassedeumamatériaquenuncaninguémhouvessetocado.Nãochegaríamosaesteextremo.Porém,julgamosseroportunotrabalharessahistóriasobreotemaliderançaprocurandoaomáximonosdistanciardaquelestópicosexauridos,pordemaisesgotados.Justifica-semaisumaobrasobrelide-rança?Sobessasconsiderações,sim!PesquisasnaáreadaPsicologiaesclarecemoquetodosnóssabemos
intuitivamente:diantedemomentosdeincerteza,diantededesafiosoudificuldades incomuns, as pessoas necessitam de ajuda para entenderquestõessobreoqueévitalouimportante,oquefazer,queorientaçãotomar,eoquenãodevemfazer.Emtaismomentos,afiguradeumlídersefaznecessária: tomadadedecisões,mudançasbem-sucedidasreque-rem liderança.
Em uma obra sobre liderança tomamos conhecimento da seguinte questãopostapeloautor:“Posso aprender a ser um líder?”. Resposta: “Sim, basta aprender suas técnicas”.Acreditamosquequalquerumpodeaprenderastécnicasdeliderançaeser,atécertoponto,bem-sucedido.Háinúme-rashabilidadesdeliderançaquepodemserensinadas.Entretanto,poucoseaprendesobre liderançana“saladeaula”.A liderançarequeralgunsdonsdenascençaquepodem,sim,seraprimorados.Umgrandemúsico,esportista,artista,estrategista,empresário,homemdeciência...desdeque
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tenhanascidocomumtalentopoderá,pormeiodeorientaçãoadequada,aprimorarseudom.Masnenhummestrefarádeummúsicomedíocreumgrandemúsico.Omesmoocorrecomaliderança.A liderança requer al-gumas características humanas que afastam um enorme contingente de seu caminho.Emoutraobra,dizseuautor:“Inicialmente,aprendaoquesignifica
liderança.Esteprimeiropassoémuito simples: entender o que é liderança”.Emseguida recomenda: “Concentre-seno seucomportamento, expe-rimente artifícios e dicas simples,mormente voltadas para postura devoz,formadesesentar,gestosensaiados.Façacontatovisual,diga‘sim’quandoforoquepensa,diga‘não’quandotambémforoquepensa...”Conheçaprimeiroseuspontosfortes,ajasobreseuspontosfracos,mo-nitoreseucomportamento,aprendacomoserrosdeoutroslíderes...As-sumariscos,tenhaconvicçãoprofunda,sejaimprevisível,crieentusias-mo...”etc.,etc.,etc.Listas,maquiagens,existem,masnãovãoàraizdaliderança.Giram
deumaformageralsobreosmesmostemas:dasaçõesimportantes,doscomportamentosimportantes,dosconselhosimportantes,dosmodelosimportantes...Mas não se aborda aquilo que a pessoa traz de nascença e que não pode ser modificado; não se aborda a essência existencial da liderança. Muito do quesedizsobreliderançaéapresentadosoboformatodequadroseta-belas,indicandoosdonsqueoaprendizdelíderdevepossuir–dezenasdetópicosconsideradosnecessáriosaoexercíciodaliderança.Todaessaconversasemprerepetidaé,decertaforma,infantilesuperficial...eche-gamaténossasmãoscomobest-seller. Emsetratandodotemaliderança,nossãofornecidasaindainúmeras
obraslidandocomdiversosoutrosaspectosalémdosmencionados,mas que nada têm a ver com os problemas humanos que se perpetuam. Problemas que caberiam a uma liderança consciente se preocupar.Sentimosanecessidadedeaprimorarcritérios,outrosquenãosejam
o de popularidade, presença em cena, entusiasmo, poder, ser querido,paraselecionarbonslíderes.Umaboasociedadeéimpossívelanãoserquedesenvolvamosacapacidadedeadmirarasuperioridadedeumali-derança.Atarefadecadaserhumanoémelhorara“sipróprio”.Nãonosenti-
domoraldeum“serideal”,massimemumreencontroconsigomesmo,etercondições,pormeiodotrabalho,deexercerseudom,aqueletalen-
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topornascençaherdado.Entendemos,nestesentido,que“A”nãodevetentarsercomo“B”ouqualqueroutromodelo“idealizado”pelareligião,pelamoral,pelasconvençõessociais.“A”deveriasetornaromelhor“A”domundo.Istoelepodee“deveria” fazer.Emser“simesmo”,“A”ou“B”,nãopossuiconcorrente.Éímpar!Masnecessita,àsvezes,dealguémde“boavisão”quepossalhemostrarocaminho.Este é um dos propósitos da liderança. É o maior dos presentes que ela pode ofertar aos seus seguidores: proporcio-nar-lhes, via trabalho, as ferramentas para se tornarem mais plenamente humanos.Porém,aquelesqueestudamasobrasouparticipamdeeventosvol-
tadosparaotemaliderança,seguramenteirãoencontrarmarcos,demar-cações,superficiais:aprendendo,porexemplo,comoatingirmetas,comoinfluenciarpessoas,etc.Esseselementosrevelam,emnossoentendimen-to,umaincapacidadededistinção:liderançanãoacontecesimplesmenteporquedeterminadoresultadofoiatingido,metacumprida,feitorealiza-do,ideiaimplantadaounão.Comuméoerroemfocarascaracterísticasexternasdaliderança.Suspeitamosdeprogramasquesepropõemaensi-nar liderança num workshopdefimdesemana:palestrasmotivacionaisdi-recionadasparamudar“caráter”ouinfundir“vontade”.Nãoduvidamos,porém,quetaisexperiênciaspodemalteraraatitudedeumindivíduoemrelaçãoàsprópriascapacidades,despertaroudesenvolveralgumtalentopreexistente.Masumacarreiraextraordináriaéoresultadoinicialmentedepossuir, apessoa,os ingredientesbásicosparadesenvolver sua lide-rança.Depois, reconhecerqueaextraordinariedadeemumacarreiraéoresultadodeexperiênciasquesópodemseradquiridascomanos,atémesmo décadas: não há como treinar componentes fundamentais emquestãodedias.Écontrárioànaturezadascoisas.Outroaspectode real relevânciaao se tratardo tópico liderança se
refereaoposicionamentoe influênciadealgunspensadoresefilósofoscomoMaquiaveleNietzsche.Maquiavelemtermosde“jogos”depoder,eNietzschenoquetangeà“vontadedepoder”.Porexemplo,aposiçãodeNietzschesobreoassuntoquevirouescola—liderança contingencial: re-fere-se ao apequenamento do homem.Eleentendiaqueoapequenamentodohomemprecisariavalerdurantemuitotempocomoumúnicofim,poisprimeirosedevecriarumfundamentoamploafimdequeumaespéciemaisfortedehomempossasefirmarsobreele.Nietzscheprocuradire-cionarnossaatençãoparaavaliarmosemquemedidaatéaquitodaespécie
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fortalecidadehomemseergueusobreumníveldaespécieinferior.Con-sidera,estefilósofo,queumaespécieabsurdaedesprezíveldeidealismoéaquelaquequerteramediocridadenãomedíocre,emvezdesentirumtrunfonoser-exceção;quedeveriaficarindignadacomacovardia,afalsi-dade,apequenezeamiserabilidade.Segundoele,nãosedevequererqueissosejadiferente.Eleacreditaquesedeveaprofundarmaisofosso—adistânciaentreosforteseosfracos.Deve-seobrigaraespéciesuperiorase separar pelo sacrifício que ela deve prestar ao seu ser — entendemosnestepontoqueNietzschesereferecomosendoumarecompensapelo“sacrifício”deserlíder.Deve-se—insisteofilósofo—substituirosmedianamentefor-madosereduzirsuainfluência:meioprincipaldeconservarasdistâncias.Nietzschetrataaliderançacomoumprivilégiodosfortes.
Entendemos que, até o momento, a educação e a formação de lideranças têm sido direcionadas para o proveito da sociedade, principalmente em seu aspecto eco-nômico, nãoomaior proveito possível do futuro,mas antes o proveitodopresente, da sociedade tal como está constituída. Seria possível pensar em um modelo de liderança cujo objetivo não seria o proveito da sociedade, mas antes um proveito do futuro? Julgamos que sim!Aformaatualdasociedadepassaporumafortetransformação.Épos-
sívelvisualizaremumhorizontenão tãodistanteque,emalgummo-mentodofuturo,asociedadeteráummaiorclamorparaanecessidadedenãomaisquererexistiremfunçãodesimesma,masantesapenascomomeionasmãosdeumanecessidademaishumana,maisconsciente.
O modelo de liderança contingencial ou situacional se esgota; a li-derançamoralseesgota.Anseia-seporumaliderançacomesfera de vida própria.Maisconscienteobastanteparanãoprecisardatiraniadocontin-gencial,dosdeveresimperativosdamoraledasvirtudes,livreobastanteparatranscender,iralémdobemedomal,comovigornecessárioparanãomaisdependerdeumasegurançaartificialdailusãodeserprotegidaporumdeus.Umcanteiroricoosuficienteparagerminarassementesdaquelestidoscomosereshumanos,demasiadohumanos.
Não devemos nos deixar seduzir e navegar, com o risco de naufragar, no fiasco da simplicidade em demasia existente nas teorias de liderança baseadas em conceitos pueris como carisma, sorte, níveis de testosterona, hierarquia naturais... Essas ideias excitam o mais perigoso exercício da simplicidade: tratar um tema como liderança de
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forma pueril, quando requer maturidade.Nãofaçamosconjecturas sobre grandes temas. Conhecer é alguma coisa que requer experimentar. A essência existencial da liderança, quem, conscientemente a vivenciou?Caberiaaquiumapergunta,quemsabetentadora,direcionadaàque-
lesquepossuemdireitoasemelhantesquestõesproblemáticas,àquelesqueanseiamporalgodiferenteemtermosdeliderança:nãohaveráche-gadoomomentode experimentarumcultivodo tipo contrário aodeliderançaatual?Quenãosejaocontrário,maspelomenosquetranscendaosmodelosatuais?Líderescomperfilquetranscendaaosdasliderançasatuaisexistem.
Masfaltam!Porqueelesfaltam?Possivelmenteoegoísmo,aindividu-alidade,ainsegurança,aleviandadenoviver,oamorpelopoder,dentreoutros,colaboramparaessafalta.Masafalhamaior,entendemos,consis-teemotemaliderançanãoseravaliado,estudado,questionado,ensinadoemumpatamarmaiselevado,conduzido—novamente—parasuaes-sênciaexistencial.
“Cada coisa vale aquilo que se pagou por ela. Assim é a vida. Observando a história, antiga ou recente, constataremos que um grande líder é grande porque “cus-tou” em sua formação”.1Custoutanto!Eprecisamenteporissoeleégrande,nãoporquerepresenteummilagredoacaso.Háumaherançapessoalquefavoreceàliderança,masexigeumaárduaformação.Háumaherançadosantepassadosquepagaramumpreçoparaaquiloquealguémé.Háumlegadoquetemosquedeixarparaofuturo.Comomencionamos,atéomomentoaformaçãode liderançatemsidodirecionadaparaoprovei-to da sociedade principalmente em termos econômicos, não aomaiorproveitopossíveldofuturo,masantesaoproveitodopresente.Avida,ahistória,exigeumavisãoinspiradoranestesentido.
1 NIETZSCHE, Friedrich. A vontade de poder. Trad.MarcosSinésioPereiraFernandes,FranciscoJoséDiasdeMoraes.RiodeJaneiro:Contraponto,2008.
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