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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO
PUC-SP
Jonathan Barros Vita
Valorao aduaneira e preos de transferncia: pontos de conexo
e distines sistmico-aplicativas.
DOUTORADO EM DIREITO
SO PAULO SP
2010
PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO
PUC-SP
Jonathan Barros Vita
Valorao aduaneira e preos de transferncia: pontos de conexo
e distines sistmico-aplicativas.
DOUTORADO EM DIREITO
Tese apresentada Banca
Examinadora da Pontifcia
Universidade Catlica de So Paulo,
como exigncia parcial para a
obteno do ttulo de Doutor em Direito
Tributrio, sob a orientao do
professor doutor Paulo de Barros
Carvalho.
SO PAULO SP
2010
Banca Examinadora
_________________________
_________________________
_________________________
_________________________
_________________________
AGRADECIMENTOS
Inicialmente, agradeo aos meus pais Roosevelt e Ivone: por todo o
apoio nesta intensa caminhada acadmica.
Ao meu eterno mentor Paulo de Barros Carvalho.
A partir deste ponto, sem distines hierrquicas, agradeo ao
amigo nordestino, debatedor de brilho e advogado Robson Maia.
A Samuel Gaudncio e Napoleo Casado: amigos, companheiros de
IBET e de Joo Pessoa para So Paulo.
A Sales Gaudncio, cuja amizade e apoio acadmico demonstra que
os grandes amigos so aqueles que so amigos de toda a famlia.
A Philippe Gail: amigo de longos debates e frutferas parcerias.
A Charles Mcnaughton: pelos sempre calorosos debates.
A Tcio Lacerda Gama: professor, amigo e cientista crtico, tambm
participante ativo da minha qualificao e, tambm, como professor assistente no
mestrado e doutorado.
A Maria Leonor Leite Vieira: incentivadora e artfice da publicao do
meu primeiro livro.
A Paulo Ayres Barreto e Aires Fernandino Barreto pelas
oportunidades e palavras de incentivo, especialmente na viabilizao do lanamento
do meu livro, dos quais estendo meus agradecimentos ao IDEPE Instituto Geraldo
Ataliba.
Ao professor Schoueri, pela sempre calorosa acolhida no IBDT e
sempre percucientes observaes.
Ao membro da banca de qualificao e companheiro de inmeros
projetos acadmicos Cludio Finkelstein.
Ao meu editor Vincius.
Reitero os agradecimentos aos professores das disciplinas do
Mestrado da PUC, que auxiliaram a formao que culmina com este trabalho de
flego: Roque Carrazza, Heleno Torrs e Celso Campilongo.
A Maria Rita Ferragut, eterna professora assistente do direito
tributrio.
Querida amiga, coordenadora e participante da minha banca de
mestrado professora Fabiana Del Padre Tom.
Aos colegas de Conselho Municipal de Tributos de So Paulo,
representados pela presidente Natlia Denardi e o amigo Alberto Macedo.
Aos membros da comisso especial de direito tributrio da OAB
federal em nome de seu presidente Allemand.
Ao meu scio e conselheiro federal da OAB Carlos Fbio.
Ao IBET E COGEAE, FAAP E EPD, especialmente em nome de:
Priscila Souza, Fabiana Lopes Pinto e Alexandre Nioshika e Renata Elaine Silva e
Wagner Menezes.
Ao membro da minha banca de mestrado, advogado Roberto
Quiroga.
Florence, Neiva e os amigos que fazem parte do Barros Carvalho
Advogados.
Carla Gonalves, que passei a admirar e compartilhar projetos e
observaes no mundo do direito tributrio.
A Srgio Bencio: amigo e incentivador desde o mestrado.
Aos Colegas de mestrado j citados em outras oportunidades e
aqueles do doutorado que tanto me apoiaram esta caminhada, especialmente,
Marcelo Diniz, Marcelo Rohenkol, Aldo de Paula Jnior, Rodrigo Fontes, Andr
Lemos Jorge e Alessandro Rostagno cada um de sua forma.
Aos meus amigos italianos Riccardo Casadei, Alessandro Turina,
Andrea Ballancin, Roberto Franze, sem olvidar dos professores Giuseppe Marino,
Claudio Sacchetto, Carlo Garbarino e Pasquale Pistone.
Aos professores belgas Jaques Malherbe e Edoardo Traversa.
Eugenia Finkelstein, pelos projetos em conjunto.
A Filipe, estudioso do direito tributrio e revisor deste trabalho.
A Fernanda Priorelli, que sem sua reviso no teria sido possvel a
entrega da minha qualificao.
Ao advogado Jayme Vita Roso, exemplo de pessoa humana e figura
familiar.
Aos meus amigos e demais familiares.
RESUMO
Primeiramente, deve ser elucidado que a forma de abordagem cientfica deste
trabalho direcionada pelo acoplamento entre Teoria da Linguagem e Teoria dos
Sistemas. Este texto dividido em trs partes, cada uma com captulos prprios que
delimitam: os instrumentos tericos utilizados como ponto de partida; os
instrumentos e estruturas que guardam relao de pertinncia com o trabalho
atravs de uma pesquisa no direito brasileiro e comparado; e a elucidao dos
institutos a serem estudados com suas especificidades e pontos de conexo. A
primeira parte trata de enumerar os fundamentos da Lgica Jurdica e da Teoria da
Linguagem adotados e seus contrapontos e complementos na Teoria dos Sistemas,
resultando no terceiro captulo que a consolidao do suporte terico final
utilizado. Segunda parte trata de definies trazidas pelo direito brasileiro, em
especial utilizando-se da estrutura da Regra-matriz de Incidncia Tributria,
focalizando nas manifestaes do vocbulo tributo e na base de clculo tributria.
Ainda, existe um captulo dedicado aos problemas do direito internacional acoplados
aos problemas derivantes da integrao com o direito interno, em especial com o
direito tributrio. Parte final, de trs captulos, foi destinada a definir e demonstrar a
aplicao de cada um dos institutos estudados, que sejam: valorao aduaneira e
preos de transferncia. Captulo final trata das interaes entre estes dois institutos
em suas estruturas, funes e relaes, apontando convergncias e perspectivas.
Palavras-chave: Direito Tributrio; Regra-Matriz de Incidncia Tributria; Imposto
sobre a renda; imposto de importao; imposto sobre circulao de mercadorias;
PIS/COFINS importao; valorao aduaneira; preos de transferncia; direito
internacional; base de clculo tributria.
ABSTRACT
Firstly, it shall be explicated that the scientific approach of this work has as premises
the coupling between Linguistics Theory and Systems Theory. This essay is divided
into three parts, each one with its own chapters, which can be divided into: the
theoretical instruments as starting point; the instruments and structures which have
pertinence with this work thru a research into national and comparative law texts; and
the clearing of the studied legal institutes with its specificities and connecting points.
The first part deals with the fundaments of Legal Logics and Linguistics Theory
adopted and its counterweights and complements in Systems Theory, resulting in
the third chapter which is the consolidation of the theoretical support used in this
work. Second part defines the institutes of Brazilian law, specially, using the Matrix
Rule of Tax Incidence, focusing into the manifestation of the word tax and into the
taxable basis. Also, there is a chapter dedicated to the problems of the international
law coupled to the problems deriving from the integration with the internal law,
specially, with tax law. Last Part, with three chapters, was meant to define and
demonstrate the application of each one of the studied institutes, which are: customs
valuation and transfer pricing. Final chapter deals with the interaction between these
two institutes in their structures, functions and relationships, pointing out
convergences and perspectives.
Key words: tax law; matrix-rule of tax incidence; Income tax; import taxes; sales tax;
PIS/COFINS over import tax; international law; transfer pricing; customs valuation;
taxable basis.
SUMRIO
INTRODUO. 17
TOMO I ESTABELECENDO UM SISTEMA DE REFERNCIA TERICO.
TTULO I ESTRUTURAS DE FILOSOFIA E TEORIA GERAL DO DIREITO.
CAPTULO I TEORIA DA LINGUAGEM.
1.1. Sobre o conhecimento, linguagem e objeto do conhecimento. 23
1.2. O sistema de referncia e a verdade. 24
1.3. Flusser e a Teoria da Linguagem: entrecruzamentos. 28
1.3.1. Homem, pensamento e frase. 28
1.3.2. Lngua, linguagem e fala. 30
1.3.3. Teoria da traduo. 32
1.3.4. Relaes entre linguagem jurdica e linguagem social. 34
1.4. Direito, linguagem e mtodo. 35
1.5. Ordenamento e sistema jurdico. 38
1.5.1. Definio do conceito de sistema: entre a Cincia do Direito
e o direito positivo.
38
1.5.2. Distino entre ordenamento e sistema. 41
1.5.3. Sobre o direito positivo e normas jurdicas. 45
1.5.4. Diferenciao entre normas jurdicas e morais. 50
CAPTULO II TEORIA DOS SISTEMAS DE NIKLAS LUHMANN.
2.1. Elementos introdutrios Teoria dos Sistemas autopoiticos de
Niklas Luhmann.
53
2.2. A estruturao bsica da Teoria dos Sistemas e sua forma de
abordagem neste trabalho.
55
2.3. A respeito da distino entre sistema do direito, o ambiente e a
sociedade.
60
2.4. Codificao. 64
2.5. Programao. 70
2.6. Contingncia, condicionalidade e recondicionalizao. 75
2.7. Tempo normativo e do sistema. 78
2.8. Acoplamentos estruturais: definio e espcies. 82
2.8.1. Definio. 82
2.8.2. Acoplamentos estruturais entre economia e direito. 87
2.8.3. Acoplamentos estruturais entre poltica e direito. 92
CAPTULO III DESENVOLVIMENTO DE TEMAS APLICADOS DE TEORIA
GERAL DO DIREITO E DOGMTICA CLSSICA.
3.1. Evento, fato e fato jurdico 99
3.1.1. Fatos jurdicos e fatos contbeis. 103
3.1.2. Fatos simples e fatos complexos. 111
3.2. Unidade do direito, harmonizao e integrao entre sistemas
jurdicos: entre a Teoria dos Sistemas e o Construtivismo Lgico-
Semntico.
114
3.2.1. Unidade do direito: entre definio e conceito. 114
3.2.2. Unidade do direito positivo e da Cincia do Direito: uma
relao com Flusser.
118
3.2.3. Unidade do cdigo e do programa. 121
3.2.4. Eliso e unidade do direito. 122
3.2.5. Interaes entre sistemas jurdicos, harmonizao e direito
internacional.
127
3.2.5.1. Harmonizao no contexto da sociedade global. 131
3.2.5.2. Harmonizao, semitica e compatibilidade. 133
3.3. Revogao e soluo de antinomias. 136
3.3.1. A respeito da soluo de antinomias. 136
3.3.1.1. Antinomias reais e aparentes: um falso problema. 139
3.3.1.2. A forma de soluo de antinomias no sistema de
direito positivo brasileiro.
141
3.3.2. A respeito da revogao. 144
3.3.2.1. Revogao tcita: uma impossibilidade sob o
ngulo do Construtivismo Lgico-Semntico.
147
3.3.2.2. Revogao e declarao de inconstitucionalidade. 149
3.3.3. Distino entre revogao e soluo de antinomias. 151
3.4. Alguns desenvolvimentos da Teoria dos Sistemas. 153
3.4.1. Onda de choque e distino centro/periferia. 153
3.4.2. Tridimensionalidade e estrutura molecular dos sistemas
comunicacionais.
155
3.4.3. Validade e codeshifting. 158
3.4.3.1. Validade, vigncia e eficcia: elementos
fundamentais das teorias clssicas.
158
3.4.3.2. Desenvolvimento da validade a partir de novas
aplicaes da Teoria dos Sistemas.
162
TTULO II ESTRUTURAS DE DIREITO DOGMTICO.
CAPTULO IV DO DIREITO TRIBUTRIO.
4.1. Tributos em uma perspectiva sistmica. 168
4.2. Definio do conceito de tributo. 172
4.2.1. Distino entre tributo e outros institutos jurdicos
obrigacionais.
178
4.3. Classificao dos tributos. 181
4.4. Esquematizao da Regra-Matriz de Incidncia Tributria. 187
CAPTULO V CRITRIO QUANTITATIVO DA REGRA-MATRIZ DE INCIDNCIA
TRIBUTRIA: PROPOSTAS TERICAS.
5.1. Critrio quantitativo do conseqente da regra-matriz de
incidncia tributria: (re)introduo ao tema.
194
5.2. Alquotas: (re)definio e classificaes. 196
5.3. Base de clculo: (re)definio e funes. 201
5.4. Parametrizao, comparabilidade e equalizao de operaes:
ferramentas tericas. 206
5.4.1. Parametrizao e comparabilidade de transaes. 207
5.4.2. Equalizao de transaes. 212
CAPTULO VI FUNDAMENTOS DE DIREITO INTERNACIONAL.
6.1. Consideraes preliminares sobre direito internacional. 217
6.1.1. Monismo e dualismo. 226
6.1.2. Direito nacional e direito internacional. 230
6.1.3. Distino entre direitos nacionais de pases distintos. 234
6.1.4. Unidade entre direitos nacionais e direito internacional:
simetria e bi-implicao de qualificaes.
239
6.2. Validade dos tratados internacionais. 247
6.2.1. Espcies e classificao de veculos introdutores: tratados,
convenes e modelos.
247
6.2.2. Procedimento de produo de tratados e sua internalizao
no direito brasileiro.
255
6.2.2.1. Produo de tratados no mbito internacional. 255
6.2.2.2. Internalizao dos tratados no direito brasileiro. 259
6.2.3. Revogao, soluo de antinomias, hierarquia e tratados
internacionais: Treaty override.
268
6.3. Validade e vigncia dos tratados internacionais: casos
complexos.
280
6.4. Aspectos controvertidos da interpretao dos tratados
internacionais.
285
6.5. Direito tributrio internacional e direito internacional tributrio. 294
6.5.1. Critrio espacial da regra-matriz de incidncia tributria e
direito tributrio internacional: elementos de conexo e
estraneidade.
297
TOMO II DOGMTICA ESPECFICA E ELEMENTOS COMPARATIVOS
ENTRE OS INSTITUTOS ESTUDADOS.
TTULO III ESPECIFICIDADES DE DIREITO DOGMTICO TRIBUTRIO.
CAPTULO VII VALORAO ADUANEIRA.
7.1. Definio, aspectos funcionais e sistmicos da valorao
aduaneira.
308
7.1.1. Direito tributrio e direito aduaneiro: interseco entre
classes.
308
7.1.2. Digesto histrico do comrcio internacional e da valorao
aduaneira no Brasil e no mundo.
310
7.1.3. Definio do conceito de valorao aduaneira. 315
7.1.4. Fundamentos sistmicos da valorao aduaneira. 322
7.2. Tributos envolvidos com a valorao aduaneira no Brasil. 325
7.2.1. Imposto sobre importaes. 327
7.2.2. Imposto sobre exportaes. 335
7.2.3. Imposto sobre produtos industrializados na importao. 342
7.2.4. Imposto sobre a circulao de mercadorias na importao. 346
7.2.5. PIS e COFINS incidentes sobre importaes de
mercadorias.
352
7.3. Requisitos e princpios da valorao aduaneira. 357
7.3.1. Aspectos relevantes da valorao aduaneira e a forma e
contedo do lanamento tributrio na prxis brasileira.
368
7.4. Mtodos de determinao do valor aduaneiro. 375
7.4.1. Consideraes introdutrias. 375
7.4.2. Valor de transao (artigo 1 do AVA). 381
7.4.2.1. Ajustes ao valor de transao (artigo 8 do AVA). 392
7.4.3. Valor de transao de mercadorias idnticas s importadas
(artigo 2 do AVA).
402
7.4.4. Valor de transao de mercadorias similares s importadas
(artigo 3 do AVA).
406
7.4.5. Mtodo dedutivo ou decomposio do valor de revenda
(artigo 5 do AVA).
409
7.4.6. Mtodo computado ou verificao do custo ou valor de
insumos e de fabricao (artigo 6 do AVA).
414
7.4.7. Mtodos residuais (artigo 7 do AVA). 416
CAPTULO VIII PREOS DE TRANSFERNCIA.
8.1. Definio, aspectos funcionais e sistmicos dos preos de
transferncia.
424
8.1.1. Estudo semntico da expresso preos de transferncia. 424
8.1.2. Preos de transferncia no direito tributrio. 427
8.1.3. Os preos de transferncia e seus reflexos na
contabilidade, no direito societrio, no direito econmico e nos
controles de fluxos de capitais internacionais.
431
8.1.4. Fices, presunes, preos de transferncia e definio do
conceito de renda.
437
8.1.5. Aspectos sistmicos dos preos de transferncia. 441
8.1.6. Bi-implicao de qualificaes e preos de transferncia:
fatores complexos.
444
8.2. Tributos envolvidos com os preos de transferncia no Brasil. 449
8.2.1. Imposto sobre a renda e contribuio social sobre o lucro
lquido.
450
8.2.1.1. Pessoas fsicas, imposto sobre a renda e preos de
transferncia.
450
8.2.1.2. Imposto sobre a renda das pessoas jurdicas e
contribuio social sobre o lucro lquido.
455
8.2.2. Tributos indiretamente envolvidos com os preos de
transferncia no Brasil.
463
8.2.2.1. ISS. 470
8.2.2.2. ICMS. 477
8.2.2.3. IPI. 482
8.2.2.4. CIDE royalties. 484
8.2.2.5. PIS e COFINS incidentes sobre as importaes de
mercadorias e servios.
487
8.2.2.6. PIS e COFINS. 491
8.2.2.7. IOF. 493
8.2.2.8. Adicional ao Frete para Renovao da Marinha
Mercante.
496
8.3. Requisitos e princpios para aplicao dos preos de
transferncia.
498
8.3.1. Operaes e fluxos financeiros passveis de controle pelos
preos de transferncia.
500
8.3.1.1. Operaes de importao ou exportao de bens,
servios ou direitos.
502
8.3.1.2. Juros. 507
8.3.1.3. Intangveis, royalties e servios de assistncia
tcnica, cientfica, administrativa ou assemelhados.
512
8.3.1.4. Aplicao dos preos de transferncia em
operaes nacionais: uma alterao possvel das
operaes objeto de controle.
517
8.3.2. Safe Harbor. 519
8.3.3. O princpio arms lenght: entre o Modelo OCDE de
Conveno para evitar a dupla tributao e a legislao brasileira.
527
8.3.4. Pessoas vinculadas. 540
8.3.5. Pases, dependncias ou regimes com tributao
favorecida, sigilo societrio ou que no identificam o beneficirio
efetivo de rendimentos.
561
8.4. Mtodos de determinao da base de clculo tributria dos
tributos incidentes sobre a renda.
580
8.4.1. Notas introdutrias: entre os mtodos e ajustes contidos
nos Guidelines da OCDE e os positivados pela legislao
nacional.
601
8.4.2. Apurao dos preos mdios: fundamentos pressupostos. 602
8.4.2.1. Comparabilidade, equalizao e similaridade: entre
transaes e seus objetos.
602
8.4.2.2. Teoria das Provas e preos de transferncia. 627
8.4.2.2.1. Secret comparables. 647
8.4.3. Importaes. 650
8.4.3.1. Preos independentes comparados. 651
8.4.3.2. Preo de revenda menos lucro. 653
8.4.3.3. Custo de produo mais lucro. 667
8.4.4. Exportaes. 674
8.4.4.1. Preo de venda nas exportaes. 676
8.4.4.2. Preo de venda por atacado no pas de destino,
diminudo do lucro.
677
8.4.4.3. Preo de venda a varejo no pas de destino,
diminudo do lucro.
682
8.4.4.4. Custo de aquisio ou de produo mais tributos e
lucro.
685
8.4.5. Mtodos aplicveis aos juros ativos e passivos. 689
8.4.6. Mtodos aplicveis s operaes ativas e passivas com
intangveis, royalties e servios de assistncia tcnica, cientfica,
administrativa ou assemelhados.
692
CAPTULO IX ENTRELAAMENTOS POSSVEIS ENTRE OS INSTITUTOS DA
VALORAO ADUANEIRA E DOS PREOS DE TRANSFERNCIA.
9.1. Valorao aduaneira e preos de transferncia: aspectos
introdutrios.
699
9.2. Anlise a partir da estrutura dos dois institutos. 710
9.2.1. Distino estrutural primria: veculos introdutores. 710
9.2.2. Princpios aplicveis. 716
9.2.2.1. Arms lenght: entre a valorao aduaneira e os
preos de transferncia.
726
9.2.3. Elementos subjetivos. 742
9.2.4. Objetos dos institutos: Teoria das Classes e diferenciao
na abertura semntica da norma jurdica que permite a aplicao
dos institutos.
753
9.2.5. Bi-implicao de qualificaes: comparao entre ambos
em sua potncia de aplicao.
762
9.3. Estudos sobre a frmula operativa. 767
9.3.1. Aspectos sistmicos da operacionalizao dos institutos no
sistema social.
767
9.3.2. Elemento temporal. 772
9.3.3. Comparaes entre os mtodos dos institutos. 780
9.3.3.1. O artigo 1 e ajustes do artigo 8 do AVA e o Safe
Habor.
792
9.3.3.2. Os mtodos do valor de transao de mercadorias
idnticas ou similares s importadas (2 e 3 mtodos de
valorao aduaneira) e o CUP, o PIC e o PVEx.
796
9.3.3.3. O mtodo dedutivo (4 mtodo de valorao
aduaneira) e o RPM, o PRL, o PVV e o PVA.
803
9.3.3.4. O mtodo do valor computado (5 mtodo de
valorao aduaneira) e o CPM, o CPL e o CAP.
811
9.3.3.5. Os mtodos residuais da valorao aduaneira e os
mtodos primrios e secundrios dos preos de
transferncia na legislao brasileira e nos Guidelines da
OCDE.
818
9.4. Anlise funcional e finalstica da valorao aduaneira e dos
preos de transferncia.
826
9.5. (Re)analisando problemas e solues: anlise de convergncias
e perspectivas de harmonizao entre os institutos no plano nacional
e internacional.
837
9.5.1. Textualidade: unidade, redundncia e evoluo. 840
9.5.2. O tempo e o objeto dos institutos. 848
9.5.3. Aplicao dos mtodos dos institutos: paralelismo e
convergncia.
851
9.5.4. A experincia internacional. 858
9.5.5. O status atual e as perspectivas brasileiras. 860
9.5.6. Trocas de informao internacionais. 866
9.5.7. Deveres instrumentais e uso de tecnologias. 871
CONCLUSES. 875
BIBLIOGRAFIA. 885
INTRODUO
Os problemas derivantes do comrcio internacional na sociedade
complexa so de polidricos esquemas com pontos de vista em vrios diferentes loci
no sistema jurdico representados por vises de segundo nvel internas e externas.
A comunicao interna ao sistema jurdico, com o seu cdigo
lcito/ilcito tende a apreender os fenmenos de forma geogrfica, na dicotomia
centro/periferia do sistema, lembrando que tal distino realizada em um complexo
tridimensional, ou seja, existem vrios pontos prximos de um dado ponto de
irritao das estruturas, permitindo que a reao do sistema se d por diferentes
tipos destas estruturas (no contexto da idia a ser elucidada posteriormente da onda
de choque).
Igualmente, as irritaes do ambiente so reproduzidas no sistema
por estruturas que podem ser diversificadas, em parte pelo problema da seleo
darwiniana1 interna ao sistema, alm do ponto da conjugao lgica entre
antecedente e conseqente normativo, ou entre objeto dinmico e imediato (um para
um, uni-unvoca; um para vrios, uni-plurvoca; vrios para um, pluri-unvoca; e
vrios para vrios, pluri-plurvoca).
No caso do direito, tais combinaes so sempre presentes, pois
cada hiptese normativa acaba por ter necessariamente critrios de ingresso em
dado conjunto e, no caso, um mesmo objeto cognitivo (multifacetado e complexo)
pode ter critrios que o enquadrem em diversas hipteses normativas.
Aqui, o problema est nos dois plos, tanto nos critrios do fato,
como na conseqncia jurdico tributria especfica da (re)qualificao de tais fatos.
O direito possui um problema interessante do ponto de vista
metodolgico, j que existe uma confuso de suporte fsico entre o objeto e a cincia
1 DARWIN, Charles. A origem das espcies. So Paulo: Martin Claret, 2005.
18
que o estuda, fazendo necessrio que se estude a partir das premissas do giro
lingstico, escola filosfica que enfrentou tais dicotomias.
Tanto o direito positivo como a Cincia do Direito so formados por
linguagem, logo, a nica maneira de diferenciar os dois tratar de formas de
linguagem diversas (prescritiva e descritiva) ou dizer que h uma distino entre os
cdigos de cada um desses sistemas.
Um faz parte de um plexo cognitivo, de percepo do cientista da
realidade jurdica ao seu redor; o outro possui limitaes de contato com a realidade,
pois as cria mediante suas prprias estruturas.
Obviamente, no caso do direito h um ntido problema na delimitao
da distino entre teoria e prtica, j que a internalizao dos fenmenos ambientais
realizada atravs das estruturas do direito e, portanto, quando o direito age, cria-se
realidade atravs da comunicao jurdica/linguagem.
O mtodo emprico dialtico, dentro do contexto positivista, acaba
por permitir estas idas e vindas observando o sistema jurdico em uma perspectiva
externa ao direito, das irritaes do ambiente para as internalizaes do sistema.
Logo, a pesquisa cientfica, no caso, tanto descreve como tenta
construir comunicaes que potencializem as irritaes no discurso jurdico, criando-
as para que o direito continue o seu movimento autopoitico.
Como finalidade mediata tem-se a reflexo sobre as interaes entre
vrios sistemas jurdicos, alm da sobreposio de institutos jurdicos, assim como
ocorre em vrios casos no direito interno, por aspectos conglobantes (como no caso
do direito penal) ou mesmo por qualificaes distintas em ramos do direito positivo
(no caso de eliso geral ou fiscal).
Portanto, no direito positivo (ordem jurdica total), ou entre direitos
positivos (ordens jurdicas parciais), existem sempre sobreposies qualificativas, ou
19
seja, o direito reconhece uma dada irritao do mundo como vrios objetos
imediatos diferentes, do que, tais qualificaes devem ser coordenadas.
Resumindo, tende-se a focalizar, na pesquisa, o fato de que os
institutos apresentados possuem ligao com o direito tributrio, em especfico com
alguns tributos, alm de requalificar, por exemplo, valores de direito civil dos
balanos contbeis.
Para tanto, outras etapas finalsticas imediatas so necessrias,
como a definio e qualificao jurdica, dentro de um contexto de homogeneidade,
de tais institutos, utilizando ferramentas cngruas entre elas, em especial, estruturas
de teoria geral do direito, Lgica Jurdica e Teoria dos Sistemas.
Em outro prisma, a identificao de cada um desses institutos alm
de sua classificao entre eles um dado necessrio, para que se tenha como
igualar ou sobrepor os fatos e conseqncias jurdicas de um dado de realidade
(evento/irritao).
Estas observaes, portanto, fazem parte da primeira parte do
trabalho, que delimita as ferramentas tericas a serem utilizadas, tentando, aqui,
justificar o uso destas, que sejam, as teorias da linguagem e dos sistemas acopladas
entre si, como j realizado em outros trabalhos deste autor.
Na segunda parte do trabalho, as estruturas do direito dogmtico
brasileiro e internacional so colocadas em movimento, elucidando como o direito
tributrio percebido no direito brasileiro e como se d a conformao da definio
do conceito de tributo e quais as conseqncias para os temas estudados.
Ainda, necessrio se faz elucidar como funcionam as estruturas do
direito internacional e sua forma de interao no direito brasileiro, ou seja, como o
direito positivo brasileiro reage/internaliza o sistema jurdico internacional e como
estas estruturas convivem entre si.
20
Obviamente, o tema deste trabalho faz com que sejam necessrias
mais elucidaes sobre o papel da base de clculo tributria, aprofundando os
estudos iniciados na forma operativa: Regra-matriz de incidncia tributria.
Adentrando na parte das especificidades temticas, terceira e ltima
parte, deve ser ressaltado que o trabalho no pretende esgotar cada um dos
institutos, que sejam, valorao aduaneira e preos de transferncia, mas, sim,
focalizar sobre a Teoria dos Sistemas e Teoria da Linguagem estes institutos, alm
de verificar suas interaes dentro do ineditismo necessrio que peculiar de uma
tese de doutoramento.
Neste contexto, novamente o problema da unidade do direito e sua
diferenciao da economia coloca-se como tema fundamental que perpassa este
trabalho, j que a operatividade entre os temas revela estes dois sistemas operando
sobre premissas diversas, tendo como fundamento comum a idia de
comparabilidade de operaes, realizada/pressuposta pelo sistema econmico em
detrimento do sistema jurdico.
Logo, verifica-se que o problema das causas de cada um desses
fenmenos (re)qualificativos de valores de transao diversos do pretendido na
literalidade da comunicao jurdica do contribuinte/negociante, so refeitos em
todas essas estruturas citadas, dando um carter de homogeneidade ao processo
intelectual a ser desenvolvido neste trabalho.
A economia, portanto, realiza programa de propsito especfico para
o direito, sendo pressuposta por este, com esta necessria comparabilidade entre as
mais diversas operaes comerciais ou realizando as simulaes tpicas dos
programas de propsito especficos da economia, perfazendo, ao cabo destes
processos, um espelhamento cruzado, atravs de uma irritao recproca entre
direito e economia, permitindo que este internalize todas estas operaes por suas
prprias estruturas e perfaa a base de clculo tributria.
Portanto, nestes pontos se tem o ncleo das preocupaes deste
estudo, em que h uma enorme defasagem entre a tcnica e a teoria, j que as
21
operaes transnacionais, alm das locais, so de complexidade crescente, mas
sem soluo/marco terico satisfatrios.
O problema , conforme j explicitado, coordenar vises e dar uma
uniformidade a tais estudos que partem de pontos referenciais distintos (legislaes
internas de cada um dos pases, normalmente) e de formas distintas de analisar o
problema, como no direito tributrio, direito civil, direito econmico, economia,
administrao, contabilidade.
Logo, a viso de conjunto inexistente na doutrina, pois seria
impossvel produzir um tratado sobre comrcio internacional com as prxis de cada
um dos pases, do que, obviamente, tendentemente sero estudados os autores que
falam sobre a rea internacional alm daqueles que tratam do direito interno
brasileiro.
Elucidando, as implicaes recprocas necessrias entre a utilizao
de cada um destes itens como forma de, globalmente, regular/revestir em linguagem
jurdica cada uma das transaes deve ser realizada de maneira holstica,
implicando necessidade de que os dois institutos tenham sua aplicao coordenada
entre si, sob pena de a aplicao de um implicar afastamento dos demais, algo
incompatvel com as premissas adotadas.
Uma observao final necessria no plano da metodologia utilizada
na elaborao formal deste trabalho, com a ausncia de citaes e o baixo nmero
de notas de rodap sendo propositais, pois a viso apresentada leva em conta as
doutrinas tradicionais para se afirmar, buscando, a partir da infirmao delas agregar
os novos pontos de vista.
Neste contexto, com uma mera observao da bibliografia de
pesquisa deste trabalho, pode ser visto que outros autores foram pesquisados, mas
suas contribuies no foram aproveitadas ou, se foram, uma traduo imperfeita foi
reproduzida a partir do ponto de vista do autor deste texto evitando, ainda, que no
existam dois corpos de linguagem no trabalho: a linguagem do autor e a linguagem
do escritor originrio.
TOMO I ESTABELECENDO UM SISTEMA DE
REFERNCIA TERICO.
23
TTULO I ESTRUTURAS DE FILOSOFIA E TEORIA GERAL
DO DIREITO.
CAPTULO I TEORIA DA LINGUAGEM.
1.1. Sobre o conhecimento, linguagem e objeto do conhecimento.
Conhecimento a forma de ver o mundo atravs de um prisma que
cria o mundo, a linguagem, logo, conhecimento tudo aquilo percebido e
expressado, pois o que no pode ser expresso dentro de uma forma no pode ser
conhecido.
O ato de conhecer pressupe uma reduo de complexidades, uma
limitao, sendo o produto conhecimento expresso e, ao mesmo tempo, expresso
em sinais captados pelos sentidos humanos.
A forma supracitada a linguagem, logo, no existe conhecimento
sem linguagem, nem linguagem sem conhecimento, o conhecimento o que
impulsiona e cria o mundo e criado pelo mundo.
A linguagem que organiza o caos do ato de conhecer, forma, a
estrutura sobre a qual as limitaes humanas e sensoriais so expressas.
Aparentemente, nesses paradoxos que informaes so criadas,
propagadas, tendo na assimetria a criao de um conjunto, o mundo pulsante, o
mundo real.
Tal realidade torna-se linguagem e formada de linguagem,
recordando que as limitaes sensoriais e a pragmtica comunicativa acabam por
usar a linguagem como recurso para comunicao entre as pessoas e criaes
coletivas do estado de coisas, o mundo coletivizado.
24
Os sentidos e as percepes so atos de conhecer, atos de reflexo
intelectiva, geradores de irritaes sofridas pelo ser, que so percebidas a posteriori,
ou seja, tais irritaes somente so irritaes a partir da percepo.
O conhecimento o objeto de tais percepes humanas, aprisionado
na forma que a linguagem, ele o antes e o depois, ainda que no se possa
definir o antes, pois, para a mente humana, somente existe o depois, versado
atravs do processos de percepo e dos sentidos.
Este conhecimento possui um objeto, lembrando que a forma desta
expresso ironicamente respondida com a afirmao que o objeto do
conhecimento o conhecimento e no o objeto ao qual tal conhecimento se refere.
Parcialmente desvelando a aparente tautologia, o objeto um dado
que est vinculado a uma criao intelectiva posterior, logo, o objeto pode estar
dentro da mente do sujeito que realiza tal processo.
Dentro de tal contexto necessria a distino entre o objeto em si,
percebido, em sentido amplo; e o objeto em sentido estrito, o contedo de uma
forma da conscincia.
Objeto forma, est dentro do ncleo das especulaes, um dado
sobre o qual se realizam reflexes/processos internos, e sobre o qual so criados
processos externos.
Processos tais que geram uma forma de humanizao do mundo, j
que o mundo somente existe a partir de tal processo e tal processo bi-reflexivo que
cria o mundo enquanto estado de coisas, j que tal processo somente surge atravs
de linguagem.
1.2. O sistema de referncia e a verdade.
25
Sistema de referncia um conjunto de afirmaes/premissas sobre
os quais se assentam outros raciocnios que geram um conjunto hermtico/concludo
de frases/percepes de realidade.
O sistema de referncia a base do conhecimento, como a
realidade moldada e direcionada para uma percepo ou para a construo de um
raciocnio que siga as linhas do pensar surgido na mente do cientista.
Tal sistema o conjunto de regras de aproximao do dado objeto,
o conjunto de referncias, como de espao e tempo ou CNTP (condies normais de
temperatura e presso) da fsica, a exemplo, um direcionamento a atividade de
conhecer um dado de mundo atravs de um ponto especfico, criado para dar rigidez
ao conhecimento apresentado.
O conhecimento deve sempre vir acompanhado de uma srie de
regras, pois cada lngua, cada usurio, acaba por ter seus prprios fundamentos da
forma de conhecer ou se aproximar de um dado de mundo.
Logo, existe a necessidade de que se coloquem amarras em um
conhecimento que se quer propagar, pois ele tem a tendncia de ser deslocado
pelas mnimas rajadas de vento/crticas como um balo no meio de um furaco.
O conhecimento sempre relativo, no somente pelo aspecto das
tradues/modos de realidade de cada uma das lnguas, mas tambm pelo aspecto
j exaustivamente citado das inmeras formas de aproximao e da inexistncia de
uma verdade absoluta.
Em outras palavras, tudo relativo lngua, aos olhos pelos quais o
sujeito visualiza o conhecimento, o conhecimento entendido, aqui, como objeto do
ato bi-reflexivo de percepo.
Neste contexto, encaixa-se a definio do conceito de verdade,
recordando que, basicamente, existem cinco correntes sobre a verdade: a da
26
verdade por correspondncia; verdade pragmtica; a verdade dogmtica; a verdade
lgica; e a verdade por consenso.
A verdade por correspondncia seria a clssica verdade que surge a
partir da observao, se algo existe ou acontece, aquilo verdade.
A verdade pragmtica a verdade que existe a partir de um ponto do
sistema, que enumera e seguido emanando verdades que so tomadas como
ponto de partida dentro de um dado contexto social, como o STF, a exemplo, dentro
do sistema jurdico.
A verdade dogmtica semelhante quela pragmtica, com a
distino de que a base para a sua propagao a f.
A verdade lgica parte da aferio de estruturas, as quais so
consideradas valores de verdade, o que, com a utilizao das regras lgicas da
identidade, no contradio e terceiro excludo, gera um conhecimento universal e
preciso, ainda que, no plano fenomnico, tal conhecimento possa no ter eco.
A ltima e mais acertada nas sociedades modernas, ainda que a
verdade lgica e pragmtica permanecem vlidas, refere-se ao conceito platnico de
doxa e episteme, opinio e conhecimento, verdade pessoal que reproduzida e
depois coletivizada, como nas reviravoltas tericas similar aquela de Coprnico, a
exemplo (conforme autores da linha de Rorty, Lyotard e Baiou2).
Dentro deste contexto, vrias so as teorias criadas, com pequenas
distines, no qual reproduzido no plexo do problema da verdade por vrios outros
autores, o que implica que a verdade algo coletivizado, dentro de uma perspectiva
moderna, a verdade um consenso criado por uma linguagem comumente aceita,
ou mesmo que verdade ideologia como para Bakhtin3.
2 SCAVINO, Dardo. La filosofia actual: pensar sin certezas. Santiago del Estero: Paids Postales, 1999. 3 FIORIN, Jos Luiz. Introduo ao pensamento de Bakhtin. So Paulo: Editora tica, 2006.
27
Para Flusser4, a verdade um dos aspectos da lngua, logo, o
absoluto no encontra ressonncia j que tal assertiva sobre a realidade est
contida em uma das lnguas ou em um dos tipos de lngua (flexionais, aglutinantes e
isolantes).
Logo, toda a verdade relativa ao estado de coisas vertidos em
linguagem, a lngua como filtro e realidade, como forma, de mundo e como mundo
em si mesma, a lgica reinante como regra formal.
Logo, para tal teoria somente existem relativizaes, que so
mascaradas atravs das tradues, que so verses, posicionamentos sobre um
dado coletivo e inatingvel que a faceta da realidade.
Obviamente a expresso verdade absoluta no pode utilizada dentro
do paradigma lingstico, no somente pela distino de verdade interna e verdade
coletiva, mas, ainda, pela abertura para a revoluo do conhecimento, para a
adaptao do sistema a discursos mais convincentes.
Ainda, para Flusser5, a verdade absoluta no contexto da
correspondncia seria uma operao de identidade ou no entre duas frases, sendo
que isto mascararia algo no articulvel, no compressvel, e, portanto inexistiria
esta verdade absoluta.
A linguagem se presta a manipulaes retricas e comprovaes
lgicas que permitem uma segurana e consenso no conhecimento, mas, ao mesmo
tempo, permite uma contestao segura, at estimulada.
Logo, o conhecer acaba por ser contextualizado, ser manipulado, a
verdade criada a partir da discrdia, o conhecimento somente o a partir da
investigao e contraposio.
4 FLUSSER, Vilm. Lngua e Realidade. 3 Ed. So Paulo: Annablume, 2007. 5 FLUSSER, Vilm. Lngua e Realidade. 3 Ed. So Paulo: Annablume, 2007.
28
Lembre-se que, em todas as teorias citadas, tem-se como pano de
fundo utilizado a no aceitao da verdade como um dado de fato, mas a realizao
da verdade como construo no ontologicamente existente.
1.3. Flusser e a Teoria da Linguagem: entrecruzamentos.
Dentro dos temas caros a Flusser6, destacam-se a idia de lngua,
conscincia, traduo, homem, pensamento, frase entre outros, os quais sero
desenvolvidos para elucidar o sistema de referncia adotado.
1.3.1. Homem, pensamento e frase.
O homem o ncleo sob o qual se assenta a vida e a realidade
construda de maneira assimtrica, externamente, a partir de um processo bi-
reflexivo interno, que o pensamento/fraseamento.
O que ocorre externamente internalizado, mas somente existe aps
esta internalizao, o homem o produto e produtor de uma srie de smbolos
concatenados dentro de regras de construo.
Tudo ocorre a posteriori dos acontecimentos, o homem pensa e cria
realidade, mas o pensamento estruturado, objetivizado, por meio de uma frase.
A frase e o pensamento so formas de organizao, uma objetiva,
certa ou errada, externa, dependendo da lngua (frase), e uma subjetiva, o
pensamento, que uma pulso desconexa e ordenada ao mesmo tempo, interna,
seguindo as ordens do sujeito pensante (homem).
Os sentidos enviam informaes que so geradas/traduzidas por
meio de uma srie regular, ordenada, sendo pensados e externalizados
estruturadamente atravs de frases dentro das regras de construo de um dado
sistema.
6 FLUSSER, Vilm. Lngua e Realidade. 3 Ed. So Paulo: Annablume, 2007.
29
Retomando, o homem o meio atravs do qual os dois lados da
mesma moeda coexistem, frase e pensamento, objetividade e subjetividade, o
homem pensa em forma de frases, ordenando os impulsos trazidos por meio dos
seus sentidos.
O homem/eu se utiliza de suas ferramentas materiais, o intelecto,
sentidos, esprito e trabalha os dados brutos que surgem interna e externamente por
meio de uma forma de realidade, a lngua.
A lngua vem formada por palavras potenciais (que podem ser), pelo
caos, transformadas atravs do intelecto em palavras ordenadas, cosmos, frases,
pensamentos estruturados.
A lngua o caos e as regras, o dado bruto e o dado filtrado pelo
intelecto.
A conscincia passa pelo prisma da reflexo e aprendizado na
organizao das frases e pensamentos, pois o homem um animal que possui a
caracterstica de processar ordenadamente as suas pulses e gerar outputs para o
mundo que o agride.
Logo, conscincia o que surge a partir dessa noo de si mesmo e
de seu entorno, a capacidade de se utilizar da matria bruta e a tornar um produto
acabado.
A centralizao da realidade individual de Heidegger7 acaba por ser
uma nota relativa ao centro de significao de uma palavra e a escolha de qual
realidade est sendo retratada por um dado sujeito, a palavra como catalisador da
escolha, a realidade escolhida, dentro das realidades possveis.
7 HEIDEGGER, Martin. Conferncias e escritos filosficos. So Paulo: Nova Cultural, 1989.
30
dizer, a exemplo, se um sujeito utiliza expresses estranhas na sua
comunicao cotidiana, ser interessante notar que sua realidade escolhida difere
da comum realidade coletivizada.
1.3.2. Lngua, linguagem e fala.
Linguagem repertrio, forma de expresso, espcie, um conjunto
sistematizado de signos funcionando como meio de comunicao de idias.
Lngua realidade, o conjunto, caos e ordenao, tendo como
elementos constituintes um conjunto de significantes e regras de um dado contexto
social, espacial e temporal que criao e criado pela lngua.
Fala o ato do indivduo de por em prtica uma determinada lngua,
uma forma de ver o mundo, um ato de expresso que se personifica em uma
forma de linguagem, a verbal.
A fala a concretizao de uma dada lngua, porm , tambm,
anterior lngua, mas sem regras e sem sentido estruturado, caractersticas da
lngua enquanto idioma e tomada como realidade a posteriori, j ordenada.
Obviamente, tais conceitos so interligados por vrias formas no
hierarquizadas, como a fala, que o ato de expresso de uma linguagem baseada
em uma lngua, a exemplo.
Outro dizer que fala o aspecto dinmico da lngua compondo
apenas uma espcie de linguagem possvel.
Terceiro, dizer que a lngua uma das formas de linguagem
possvel.
Tais formas de visualizao das interaes entre estes institutos so
comprobatrias de uma heterarquia e um sistema aparentemente cclico, em que o
31
que seria a priori tomado como a posteriori, j que somente constitudo em um
momento futuro.
O presente destas interaes inexistente e a forma de visualizao
depende de onde se coloca o observador.
Complementarmente, a construo do fato dentro do universo
heideggeriano8 (que, neste sentido, assemelha-se a Flusser9) constri-se de
maneira arbitrria (ainda que, futuramente, consiga o consenso necessrio para a
produo da lngua), em que o ato de emisso de fala centraliza mltiplas
realidades, reconduzindo a uma realidade singular.
dizer, assim como no momento das experimentaes/ruptura de
Marcel Duchamp no qual passou a arte de definida atravs de sua esttica, bom
gosto subjetivo, para uma definida arbitrariamente pelo ato de dizer que algo era
arte, denota-se um paralelo entre o giro lingstico e Heidegger10, j que o real
aquele criado pelas palavras.
Logo, medida que a linguagem se torna mais complexa e mutvel,
as possibilidades do real aumentam, paradoxalmente ao fato que vrias opes
coletivizadas j foram tomadas, ou seja, o universo em expanso apresenta um
nmero menor de possibilidades futuras, j que suas possibilidades passadas (que
so o primeiro fator de multiplicao) j foram escolhidas.
A frmula matemtica desta idia seria a (possibilidades passadas) x
b (possibilidades presentes + possibilidades futuras), sendo as possibilidades
passadas iguais a 1, j que ocorreu a tomada de deciso no passado, no deixando
a forma aberta, infinita, tambm, no seu termo antecedente.
Como conseqncia aplicada, o universo est em expanso espacial
aps o chamado big bang, momento inicial da criao do universo, mas,
8 HEIDEGGER, Martin. Conferncias e escritos filosficos. So Paulo: Nova Cultural, 1989. 9 FLUSSER, Vilm. Lngua e Realidade. 3 Ed. So Paulo: Annablume, 2007. 10 HEIDEGGER, Martin. Conferncias e escritos filosficos. So Paulo: Nova Cultural, 1989.
32
paradoxalmente, esta expanso contraposta a uma retrao do nmero/espao de
possibilidades deste universo para o futuro.
O sistema jurdico e sua construo normativa individual so
idnticos a realidades paralelas, um multiverso, em que cada um sujeito possui seu
prprio universo, que opera, paralelamente a outros universos, dizer, o conceito de
norma nico, mas a definio denotativa desse sistema, semanticamente,
mltipla e depende de cada centralizao de realidade produzida pelos operadores
do sistema, cada um utilizando a lngua como construtora de realidade.
Obviamente, este sistema de multiverso possui realidades paralelas
alinhadas em muitos pontos, o que explica, a partir de uma viso hetero-referente
desses universos individuais, uma realidade coletiva que chamada de
consenso/status quo.
Como exemplo da distino entre a lngua do direito e as outras
lnguas sociais, deve ser recordado que na linguagem jurdica inexiste o tempo
presente, somente o futuro e o passado, j que os fatos jurdicos somente existem
como o a posteriori que re(produz) o a priori, utilizando o pretrito perfeito, mas
dentro de limites e linhas postos no verbo em seu infinitivo.
Logo, duas tradues so possveis nesta leitura de Flusser, a
traduo entre realidades (centralizao do ncleo semntico daquela estrutura
lingstica) e a traduo em si entre lnguas.
1.3.3. Teoria da traduo.
O conceito de traduo pode ser definido como transferncia de
realidade e sentido de uma lngua/realidade para outra por meio de um processo de
comparao de repertrios e estruturas, produzindo uma verso na segunda lngua
escolhida, no mesmo sentir de Flusser11.
11 FLUSSER, Vilm. Para uma teoria da traduo. In: Revista brasileira de filosofia. So Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, Vol. XIX, Fascculo 73, jan.-mar. 1969.
33
Verifica-se, logo, que esta operao extremamente funcional para
o direito, pois, verificando a partir da comparao entre a linguagem natural e
jurdica, dos fatos sociais e os jurdicos, existe uma distino de estrutura e
repertrios, recordando que o do direito somente aquele autorizado por lei.
Esta linguagem jurdica, portanto, normativa, hipottico condicional,
tcnica, a qual se diferencia da linguagem social, atcnica, no normativa, no
estruturada.
Ainda, existe uma traduo entre sistemas diversos de referncia por
meio da simplificao, em que um dado de mundo no necessita de todos os seus
caracteres componentes para expressar uma realidade singularizada em uma dada
lngua, para transmitir uma mensagem.
Forma distinta desta aquela que ocorre de um ramo didaticamente
autnomo do direito para os demais, j que existiria uma traduo, pois as lgicas
internas ao sistema e os princpios servem como diferenas entre estados de lngua,
requerendo traduo.
dizer, um mesmo fato para uma norma deve ser traduzido para as
demais seguindo o repertrio dela, como no caso de uma infrao tributria que se
torna um crime contra a ordem tributria, lembrando que tal crime somente advm
do direito tributrio e no da conduta humana existente no plano da facticidade.
Outrossim, deve ser dito que o direito sempre traduz, pois compara
estruturas e significantes e os (re)produz dentro do direito.
ltimo exemplo de forma de traduo no direito aquela que se
aproxima do sentido comum para a palavra traduo e est ligada a traduo entre
textos internacionais para textos de direito nacional, como os tratados e suas
verses possveis no momento de sua internalizao.
34
Logo, concluindo, pode ser dito que operar o direito sempre
traduzir, pois da realidade/lngua da sociedade traduz-se para o direito que perfaz
uma distinta realidade/lngua da inicial.
1.3.4. Relaes entre linguagem jurdica e linguagem social.
Interessante notar que uma traduzida pela outra, so realidades
distintas, possuem repertrio e regras de construo e transformao prprias.
Neste caso, um o caminho mais radical, o de proclamar a lngua
jurdica como forma de construo de realidades, que se contrape linguagem
social.
Utilizando-se a definio do conceito de Flusser12 para lngua, em
que ela realidade, sendo o direito criador de realidade e representante dela
mesma, no se subsumiria ao conceito de parte de um todo, mas sendo uma
realidade autnoma das demais, necessitaria ser considerada como uma lngua em
si mesma.
Em outro giro, mais simplista, a linguagem social no possui fora
coercitiva, no possui o cdigo lcito/ilcito do direito, criada de maneira livre, ou
seja, no necessita de agentes competentes (em sentido jurdico).
A linguagem social utilizada como uma falsa base para as
manifestaes denticas, j que o dentico e sua linguagem correspondente so
uma lngua em si mesma, portanto criadora de realidade.
A troca entre uma e outra lngua surge dentro do processo de
desenvolvimento recproco, da abertura cognitiva, da evoluo lingstica da
sociedade.
12 FLUSSER, Vilm. Lngua e Realidade. 3 Ed. So Paulo: Annablume, 2007.
35
A linguagem social no tcnica e possui uma maior multiplicidade
de palavras, alm de graus de ambigidade e vaguidade superiores.
Em contrapartida, a linguagem jurdica tcnica, com repertrio
restrito e busca diminuio das incertezas, com processos de definio
razoavelmente estabelecidos, dando uma uniformidade maior no seu discurso.
1.4. Direito, linguagem e mtodo.
Alguns pontos de partida devem ser esclarecidos para que a ligao
entre estes trs itens fundamentais da cincia sejam conectados entre si.
Direito, objeto cultural entendido como o um fenmeno lingstico
que constri realidades prprias, dentro de um conjunto de fundamentos que so a
unidade do sistema.
Os objetos culturais so reais, susceptveis a experincia, sendo
passveis de valorao positiva ou negativa, sendo apreendidos mediante o ato
gnosiolgico da compreenso pelo mtodo emprico dialtico.
Os pontos que formam a unidade deste sistema esto baseados em
uma estrutura que a norma, estrutura lgica que conjuga um antecedente e um
conseqente por meio de um functor dentico, em uma implicao contingente.
Da contingncia e generalidade surge a unidade do sistema jurdico,
o seu cdigo lcito/ilcito, que cria assimetrias e realiza a comunicao jurdica,
sustentada pela linguagem.
A experincia de tais objetos se d atravs do contato com as tintas
no papel, no caso do direito, a linguagem jurdica veiculada por meio de
instrumentos competentes como o dirio oficial, que veicula os textos que so
ordenados mentalmente na forma de normas.
36
Direito norma e norma linguagem, logo, direito linguagem,
silogismo bsico e eficaz na demonstrao de que o direito e linguagem so
interconectados.
O direito como objeto do mundo e existe atravs da linguagem,
que a forma de criao de realidades, de existncia do mundo, j que a linguagem
que est frente dos acontecimentos, que so, somente, alcanados a posteriori,
quando captados de maneira eficaz por um eixo lingstico-comunicativo.
Obviamente, qualquer objeto de estudo, no caso, o direito, acaba
tendo de ser aproximado mediante um mtodo que a forma do conhecer em
sentido cientfico.
Em outras palavras, a linguagem o meio pelo qual o cientista
visualiza o direito, por esta ser o direito, em determinadas condies.
A relao entre linguagem e direito de gnero/espcie, esta sendo
determinada atravs da estrutura e do cdigo.
Obviamente, dentro de uma viso externa ao sistema, o direito cria
suas prprias realidades, e, dentro de uma viso interna, somente existe o direito,
no existindo uma realidade distinta para ele.
Logo, o mtodo de visualizao do direito parte do prprio direito, a
cincia sendo contida dentro do seu prprio mundo, uma viso de segunda ordem
interna ao sistema.
Em outras palavras, o mtodo de aproximao do direito o
emprico dialtico medida que a realidade interna e os seus reflexos e impulsos
so visualizados dentro do sistema, uma assimetria que permite a sua insero no
contexto dos sistemas comunicativos/lingsticos sociais.
Primeiro passo, reciclando as idias apresentadas, dizer que cada
um dos elementos conectados no subsiste, enquanto cincia jurdica, sem o outro,
37
ou seja, o direito no existe sem linguagem e no pode se aproximar da linguagem,
nem do direito, nem da linguagem do direito, sem mtodo/forma de cognio
estruturada.
Segundo enunciar alguns fatos, como o de que uma das formas de
visualizar o direito a partir de uma perspectiva semitica, ou seja, cincia que
estuda a linguagem, o que demonstra que o mtodo variado ainda que o objeto
seja uno.
Em outro giro, outra forma de descrio do mtodo, dizer que ele
uno e ao mesmo tempo plural, pois para conhecer um objeto de estudo de nada
adianta ter apenas uma viso, que sempre deturpada, falha e arreflexiva por
natureza.
Logo, o mtodo um posicionamento/reposicionamento frente ao
objeto constante, quer seja por meio da semitica, lgica, da filosofia, o que infere
que o mtodo aplicado na construo e investigao do objeto, que dplice e
uno ao mesmo tempo, pois se estuda a linguagem que a forma de expresso
(nica) do direito.
Sob este ngulo, importante mencionar a contribuio do professor
Barros Carvalho13 que, reinterpretando Vilanova14, apresentou uma teoria chamada
de Construtivismo Lgico-Semntico.
Esta teoria apresenta um foco especfico que perfaz um importante
entrecruzamento entre aspectos lgicos (sintticos), o chamado Giro Lingstico e
uma forte investigao semntica das estruturas e palavras dispersas no corpo do
direito positivo.
13 O exemplo mais acabado de tal teoria foi posto em sua ltima obra: CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributrio: linguagem e mtodo. 2 edio. So Paulo: Noeses, 2008. 14 VILANOVA, Lourival. Estruturas lgicas e o sistema no direito positivo. So Paulo: Noeses, 2006.
38
Neste plano, portanto, vrias das consideraes realizadas, daqui
em diante, revelam tal preocupao metodolgica e tomam como pressupostas as
consideraes sobre este mtodo.
1.5. Ordenamento e sistema jurdico.
1.5.1. Definio do conceito de sistema: entre a Cincia do Direito e o direito
positivo.
Sistema um conjunto de elementos agrupados segundo uma
espcie de homogeneidade e que interagem entre si, interrelacionam-se.
Logo, a concepo de sistema o de um agrupamento que cria
relaes em seu interior, ou seja, os elementos no so fotografados em um dado
momento histrico e a descrio destes elementos desta classe basta para a
configurao do ser sistema.
O ser sistema ter interao, ter adaptabilidade, mutabilidade,
relao entre elementos, sem relao entre elementos, sem interao, no existe a
possibilidade de ser sistema.
Refora-se que o direito positivo um sistema autopoitico,
autoreferencial, fechado operativamente e aberto cognitivamente.
Quando se trata de direito positivo, pode ser afirmado que esta
unidade sinttica, mas no semntica, e o fato de ser sistema possui como eixo de
relao o seu cdigo lcito/ilcito, alm das relaes internas entre textos jurdicos
para conformao da ordem jurdica.
Em outro giro, o direito positivo estruturado sob a forma de
programas/normas jurdicas que possuem como estrutura a forma hipottico
condicional, em que um fato implica (causalidade jurdica) uma relao jurdica entre
sujeitos que tem como objeto direitos e deveres correlatos, observados a partir da
assimetria de tal relao.
39
Recorda-se que se utiliza da forma dada pela sinttica para
determinar que o objeto da relao jurdica o objeto em si de uma dada frase, ou
seja, as frases possuem sujeito, verbo e objeto, do que, na relao jurdica existe o
sujeito (ativo ou passivo), o modal e o verbo (na conformao do verbo de uma
proposio) e o objeto (direto ou indireto, no caso do direito, direto).
Neste sentido, os sujeitos e verbos variam entre a relao e sua
conversa, enquanto o objeto no.
Conseqentemente, direito positivo sistema, j que possui um
fundamento comum (a distino entre os cdigos) e interao entre os seus
elementos pelas relaes de hierarquia/heterarquia/circularidade e, enfim, pela sua
autopoiesis que fundamenta a mobilidade/mutabilidade das estruturas jurdicas.
A cincia do direito, tambm, j que pauta-se na descrio de um
objeto comum (o direito positivo) organizando-se de forma interativa, realizando
operaes/reinterpretaes de teorias e de direito positivo em si, autoimplicando-se
reproduzindo reflexes para uma maior consistncia.
Logo, a cincia do direito possui os dois caracteres de ser sistema, a
homogeneidade de seus elementos (tendo o direito positivo como ponto de
observao) e a interao entre eles (relaes entre doutrina implicando o direito
que implica a doutrina, a exemplo; ou relao entre doutrinas; relao entre normas).
Como primeira forma de analisar a interao entre esses dois
sistemas, deve ser dito que a cincia do direito o sistema cientfico observando o
direito, que pode observar, atravs da abertura cognitiva, com suas prprias
estruturas, a cincia do direito.
Em outro giro, o direito positivo reflete as irritaes do ambiente
atravs de uma srie de estruturas/programas/normas, utilizando como elemento de
motricidade, a exemplo, a pressuposio de um sistema com relao aos demais ou
40
os acoplamentos estruturais, em que os dois sistemas, analogicamente, so
irritados, mas processam as informaes digitalmente.
Logo, o direito observa a cincia que observa o direito e se adapta,
evolui, como na plataforma darwiniana15, ou seja, a partir de uma variao, h uma
seleo e uma estabilizao.
Recorda-se, como ressalva sobre a distino entre a evoluo no
sistema darwiniano16 e sua forma de aplicao nesta teoria, que as evolues nos
sistemas sociais no so condicionadas pelo ambiente, j que so, sempre, internas,
no so, portanto, provocadas pelo entorno, j que inexiste entorno com inputs e
outputs.
E tais elementos so mais fortemente apontados como caminhos
racionais ou compatveis com o sistema por meio de uma anlise que tem como
fundamento um estudo mais rigoroso e que visa dar uma maior consistncia
anlise do direito positivo.
Como segunda forma de visualizar o problema com relao a
coexistncia e bi implicao entre cincia do direito e direito positivo, deve ser dito
que estes so dados necessrios para o desenvolvimento de cada uma delas.
Utilizando a forma de Robles17, os dados brutos implicam cincia que
produz um sistema que implica nos novos dados brutos, que implica uma nova
cincia.
Lembra-se que no se trabalha, no entanto, com a concepo deste
autor de que a cincia do direito faz direito, de que ela no seria descritiva de um
objeto, no caso, o direito positivo.
15 DARWIN, Charles. A origem das espcies. So Paulo: Martin Claret, 2005. 16 DARWIN, Charles. A origem das espcies. So Paulo: Martin Claret, 2005. 17 ROBLES, Gregrio. O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito. Barueri SP: Manole, 2005.
41
Retomando, obviamente, no pode existir cincia do direito sem
direito positivo, se se utiliza da forma lgica da bi implicao para descrever a
relao entre eles, do que somente verdadeira a expresso se ambos os
elementos so verdadeiros (no caso, existentes).
1.5.2. Distino entre ordenamento e sistema.
Como forma de distino entre ordenamento e sistema, vrias so as
teorias construdas no plano da doutrina de Teoria Geral do Direito, do que uma
indistino seria, ao mnimo uma tentativa de igualar, juridicamente, as definies
destes conceitos/classes.
Diga-se que alguns autores mais antigos como Hart18, ou mesmo
Aftalin,19 no tratam como tpico da diferenciao entre estes dois conceitos, por
terem ferramentas analticas distintas como repertrio para o estudo do direito
positivo.
Como forma de diferenciao, deve ser dito que ambas as
expresses denotam sistema, do que so formas diversas com linguagens diversas
de conformao.
O sistema jurdico formado pela interpretao normativa sob a
forma unificadora de norma, ou seja, um rearranjo de cincia do direito, em que se
eliminam as contradies e se estrutura sintaticamente o direito, linguagem
descritiva que possui como fundo uma linguagem prescritiva.
O ordenamento jurdico pode ser considerado como o dado bruto, ou
seja, o texto jurdico da forma em que foi legislado, que sistema pelo fato de
possuir: homogeneidade finalstica, que seja, a regulao de condutas humanas e o
tipo de linguagem que, tambm, homogneo, linguagem prescritiva.
18 HART, Herbert L. A. O Conceito de Direito. 2 Ed. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1994. 19 AFTALIN, Enrique R.; RAFFO, Julio; VILANOVA, Jos. Introduccin al derecho. 3 Ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2004.
42
Portanto, necessrio se faz a descrio das categorias S1, S2, S3 e
S4, de acordo com a delimitao de Barros Carvalho, em vrias de suas obras20.
S1 seria o subsistema em sua concretute, as marcas de tinta no
papel, um conjunto de elementos que possuem um suporte fsico, signos
concatenados.
S2 seria o subconjunto de significaes extradas da leitura de cada
um desses textos, enunciados jurdicos que apenas do significado a cada um dos
termos construdos a partir do suporte fsico.
S3 o subconjunto de normas jurdicas, proposies jurdicas
estruturadas sintaticamente sob a forma condicional, em que se recombinam os
enunciados jurdicos.
S4, por fim, o subconjunto das normas jurdicas rearranjadas em
suas relaes de coordenao e subordinao, a conformao clara de sistema
jurdico com maior preciso e estruturada de acordo com regras de construo e
coordenao do ser sistema.
Logo, tem-se que os dois primeiros representariam os elementos
formadores do ordenamento e os dois ltimos representariam os elementos do
sistema jurdico.
Sumarizando, para Barros Carvalho21, a distino entre ordenamento
e sistema jurdico delimitada pelo fato que ordenamento o conjunto de textos de
direito positivo, caracterizados pela homogeneidade, no caso atravs da linguagem
prescritiva e do fim de regular condutas, e pelas suas interaes as caractersticas
necessrias de ser sistema.
20 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributrio: linguagem e mtodo. 2 edio. So Paulo: Noeses, 2008. 21 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributrio: linguagem e mtodo. 2 edio. So Paulo: Noeses, 2008.
43
Sistema do direito construo da cincia do direito, j que formado
por normas jurdicas, forma estruturada de combinao dos enunciados prescritivos
sob um eixo sinttico comum, labor realizado pelo cientista do direito.
Logo, ordenamento jurdico do direito positivo, enquanto sistema
jurdico cincia do direito.
Para Gregrio Robles22, a distino operada da mesma maneira,
ou seja, ordenamento como conjunto de textos de direito positivo e o sistema jurdico
formado por normas e proposies jurdicas sobre o objeto direito positivo.
Como distino clara teoria de Barros Carvalho23, com a qual se
concorda, no ponto, tem-se que Robles24 no considera que os textos de direito
postitivo/ordenamento seriam um sistema.
Segunda distino, com a qual, tambm, no se concorda, o fato
que Robles25 inclui a doutrina no sistema jurdico dando carter normativo e
operacional a ela.
Dentro destas distines, este autor acaba por dar valor a
consistncia, tratamento de informaes e reflexividade, ou seja, ele diz que o
ordenamento reflexo e gera reflexos no sistema e vice-versa, ou seja, a partir de
um ordenamento elabora-se um sistema, aperfeioamento do ordenamento, que o
faz, por estas crticas, se aperfeioar e, aps tal aperfeioamento, retoma-se o
mesmo processo de realimentao.
Para Alchourrn e Bulygin26, ordenamento seria um conjunto de
sries de sistemas jurdicos compostos por normas jurdicas (tomadas em sentido
22 ROBLES, Gregrio. O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito. Barueri SP: Manole, 2005. 23 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributrio: linguagem e mtodo. 2 edio. So Paulo: Noeses, 2008. 24 ROBLES, Gregrio. O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito. Barueri SP: Manole, 2005. 25 ROBLES, Gregrio. O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito. Barueri SP: Manole, 2005.
44
lato, norma /lei), do que se pode partir de uma noo similar a de sincronia e
diacronia de Guastini27.
Elucidando, a distino entre sistema e ordenamento surge a partir
da distino entre anlise esttica, ou seja, a fotografia do conjunto de normas em
um dado momento histrico e a sucesso destes conjuntos de normas e a viso
dinmica de um ordenamento, entre sincronia e diacronia.
Dentro de tal contexto, deve se falar em esttica e dinmica jurdica
no utilizando as expresses kelsenianas28 de princpio esttico e dinmico do
ordenamento que tratam da forma de fundamentao de uma dada ordem jurdica,
mas sim as categorias descritas em seu livro e, parcialmente reproduzidas por
Guastini29 em sua obra.
Falar em esttica jurdica falar de categorias estruturais do direito,
como a forma de norma, com a determinao de todos os seus elementos
constituintes, validade, descrevendo o direito posto dentro de uma perspectiva de o
direito de um dado momento histrico.
Falar em dinmica jurdica observar as formas de relacionamento
entre normas no sistema, tratar de hierarquia, tratar de revogao e modificao
do ordenamento.
Uma forma utilizada comumente de tratar de esttica e dinmica do
direito a analogicamente utilizada, tambm, por Guastini30, em que h uma
diferenciao entre sincronia e diacronia como formas de distino de ordenamento
jurdico.
26 ALCHOURRN, Carlos E.; BULYGIN, Eugenio. Anlisis lgico y Derecho. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1991. 27 GUASTINI, Riccardo. Distinguiendo. Estdios de teoria y metateora del derecho. Barcelona: Gedisa, 1999. 28 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003. 29 GUASTINI, Riccardo. Distinguiendo. Estdios de teoria y metateora del derecho. Barcelona: Gedisa, 1999. 30 GUASTINI, Riccardo. Distinguiendo. Estdios de teoria y metateora del derecho. Barcelona: Gedisa, 1999.
45
A sincronia jurdica seria a observao do direito de um dado tempo,
paralela a esttica jurdica, j a diacronia seria a substituio de uma ordem de
normas por outra, a verificao da substituio de sistemas de normas.
Logo, para este autor, existe uma indistino entre sistema e
ordenamento jurdico, j que ambos tem como fundamento a concepo de norma
jurdica, e o ordenamento, formalmente, um sistema jurdico, pois formado de
normas jurdica.
No que diz respeito ao ponto de vista sincrnico, o ordenamento o
conjunto de normas em um dado tempo (um sistema de normas).
Este sistema permanentemente substitudo (a partir de qualquer
modificao/extino/invalidao/revogao de normas jurdicas) por um novo
ordenamento/sistema jurdico, sendo a mutabilidade/sucesso de ordenamentos
sincrnicos a definio do conceito diacrnico de ordenamento jurdico.
1.5.3. Sobre o direito positivo e normas jurdicas.
Obviamente, no percurso de construo de uma teoria do direito, a
homogeneidade objetal surge como ponto de vrias teorias, sendo uma delas a
teoria normativista.
O direito positivo formado de normas jurdicas (proposies) que
so juzos reconstrutivos de textos legais (enunciados), com fora coercitiva e
sentido dentico completo, podendo ser voltados para a realidade, reconstruda em
enunciados vetorizados em proposies, ou como hipteses de incluso em classes.
Vrias podem ser as definies para tal conceito, j que uma srie de
pontos de vista so produzidos dentro da realidade polidrica de tal importante
esquema.
Seguindo esta idia, todas as formas de comunicao
reconhecidas/auto-produzidas pelo sistema social jurdico so estabelecidas por
46
meio da condicionalidade, que seja, a necessria implicao entre um antecedente a
um conseqente e a posterior definio do cdigo (lcito ou ilcito).
Neste contexto, a norma jurdica, em sua plurissignificao pode ser
tomada como texto de direito positivo (suporte fsico), como enunciado prescritivo,
como idia que formada na mente do intrprete, como esquema interpretativo,
como estrutura hipottico condicional, entre outros.
Complementarmente a estas idias, cita-se que um ponto
fundamental para as teorias que tomam como ponto de partida anlises lingsticas
do fenmeno jurdico utilizam a clssica distino entre enunciados e proposies.
Os enunciados seriam idias formadas a partir da leitura de um dado
fragmento de texto com sentido para o leitor, enquanto proposies seriam juzos
interpretativos sobre os enunciados, lembrando que a combinao entre enunciados
e proposies segue a mxima de: um por um; um por vrios; vrios por um; e
vrios por vrios.
Recorda-se que no plano jurdico valida a distino entre a
enunciao enunciada e o enunciado enunciado, mas com a ressalva que, antes de
tudo so enunciados prescritivos, do que a distino entre eles no dada
legalmente.
A esta afirmao objetam vrios lingistas31 que impossvel,
tambm no texto jurdico, distinguir os enunciados enunciados da enunciao
enunciada, pois eles se recortam e no possuem um ponto necessrio de diviso,
pois, neste sentido, a contextualizao e a mltipla interpretao constituidora, como
em Heidegger, perfazem formas de viso distintas, reposicionamentos distintos a
respeito do objeto (texto) permitindo diferentes vises sobre cada um dos termos,
vendo marcas da enunciao ou um enunciado em si.
31 Exemplos em: FIORIN, Jos Luiz (org.). Introduo lingustica I. Objetos tericos. So Paulo: Editora Contexto, 2007.
47
Neste sentido, dizer que prevalece um sobre o outro acaba por inferir
que um seria superior ao outro.
Ainda, neste sentido dizer que se h uma antinomia entre uma
exposio de motivos ou ttulo de uma dada lei, h a soluo entre eles na
aplicao/criao da norma jurdica correspondente quele enunciado prescritivo.
dizer, quando existe a contraposio de um artigo numerado de
uma lei a uma exposio de motivos, a exemplo, pode prevalecer qualquer um dos
dois, j que no existe, no sistema positivo brasileiro uma forma de resolver estas
antinomias entre enunciao enunciada e enunciados enunciados prescritivos.
Retomando o problema da distino entre enunciados e proposies
jurdicas, tem-se que, nitidamente, uma das supracitadas formas se enquadra nesta
categorizao, tendo como base os enunciados e partindo para as normas jurdicas
como esquemas de interpretao baseados na dualidade antecedente e
conseqente normativos, a partir da causalidade jurdica.
Tal a definio de norma jurdica em seu sentido estrito, esquema
formal que produzido pelo intrprete do direito como forma de estruturar as
comunicaes jurdicas, diferenciando-se, assim, dos enunciados prescritivos32.
Dentro de tal estrutura dual cada um dos elementos possui
caractersticas diversas, sendo o antecedente uma descrio de um fato hipottico
ou no (concreta e abstrata) ligado a um conseqente, por meio de um implicador
dentico no modalizado (dever-ser neutro), que possui dois sujeitos relacionados
entre si que possuem direitos e deveres recprocos sob a forma modalizada em
obrigatrio, permitido e proibido, sendo tal esquema geral ou individual.
Por meio de tais afirmaes consegue se visualizar as normas em
suas formas33 e recombinao entre antecedentes e conseqentes, do que podem
32 Dentro deste esquema, portanto, no se faz remisso a idia de normas jurdicas em sentido amplo, j que para ser norma deve possuir estrutura sinttica fixa, sendo que estas normas no possuem este requisito, alm de no visarem regulao de condutas e sim criao de realidades jurdicas ou qualificaes.
48
ser: gerais e abstratas; gerais e concretas; individuais e abstratas; ou individuais e
concretas, representando, respectivamente, conseqente e antecedente.
Verifica-se, a partir da linguagem constituidora da norma, em seu
antecedente, se os eventos do mundo natural foram transpostos em linguagem,
consubstanciando-se em fatos jurdicos (normas concretas), ou so descritos
conotativamente (normas abstratas); e, se os conseqentes normativos estabelecem
os seus dois sujeitos relacionados de maneira indeterminada (normas gerais) ou
especificada (normas individuais).
Sob outro ngulo, Kelsen34 trata de duas formas de normas, as
primrias e secundrias, sendo as primeiras (a depender da edio do teoria das
normas) as sancionadoras, ou seja, as que dariam a caracterstica do dentico,
acesso sano estatal; e as secundrias, dispositivas.
Hart35 tambm parte da denominao de primrias (obrigacionais) e
secundrias (metanormas), mas reelabora estas sob trs formas diversas: regra de
reconhecimento; regra de alterao e regras de julgamento.
Vilanova36 reinterpreta uma srie de autores como Kelsen37 e
Engish38 e chega a um esquema de manifestao do dentico com duas estruturas
vinculadas para dar consistncia ao dentico por meio de seu eixo comum, a
capacidade do sistema de coero.
Tal esquema o da norma em sentido completo que seria a ligao
entre duas normas jurdicas em sentido estrito, primrias e secundrias por meio de
uma disjuno excludente.
33 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurdico. 7a edio. Braslia: UNB, 1996. 34 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003. 35 HART, Herbert L. A. O Conceito de Direito. 2 Ed. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1994. 36 VILANOVA, Lourival. Causalidade e relao no direito. So Paulo: Saraiva, 1989. 37 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003. 38 ENGISCH, Karl. Introduo ao Pensamento Jurdico. 7 Ed. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1996.
49
Neste sentido, a ltima forma estrutural sinttica das normas jurdicas
o das normas em sentido completo, que denotam a juridicidade existente nas
relaes, com a possibilidade de coero estatal, em que h a ligao entre uma
norma primria, dispositiva ou sancionadora, e uma norma secundria,
sancionadora, de cunho processual.
Em outro giro, para a conformao do dentico uma norma
dispositiva (primria) ligada a uma norma sancionatria (secundria), que d a
possibilidade de, no caso de descumprimento da relao da norma primria, acionar
o estado-juiz para fazer valer a relao descumprida.
Dentro do plexo j elucidado, o conceito de norma em sentido
completo surge com fora em Vilanova39, j que este autor trata das estruturas
lgicas do sistema de direito e demonstra a forma da norma e toma como base para
o conceito de direito o de sano estatal organizada.
Dentro de tal contexto, conforme j referido, na forma de
recombinao de enunciados criam-se as normas jurdicas em sentido estrito,
unidades mnimas do dentico estruturadas sob a forma de antecedente (fato)
implicando uma conseqncia jurdica (relao entre dois sujeitos).
Sequenciadamente, surge a forma de uniformizao do direito
atravs da sano, possvel, apenas, com a interveno de um estado por meio de
procedimentos prprios.
Logo, surge a definio do conceito de norma jurdica em sentido
completo que a unio de duas normas jurdicas, uma primria (dispositiva) e uma
secundria (sancionadora/processual).
Nesta distino, sintaticamente estas normas so idnticas, mas o
fato da norma secundria o no cumprimento da relao jurdica da norma
primria, formalmente: D{[(F (SRS)] v [ - (SRS) (SRS)]}, lembrando que o
39 VILANOVA, Lourival. Causalidade e relao no direito. So Paulo: Saraiva, 1989.
50
modal disjuntor excludente trata que as duas normas so vlidas ao mesmo tempo,
mas a aplicao de uma exclu a outra.
Obviamente, a individualizao de uma norma em sentido completo
passa por processos de recombinao normativas, normalmente obtidos na chegada
ao plano S4, o da reestruturao das comunicaes normativas em termos
hierrquicos e funcionais.
Por fim, dentro desta tica o dentico somente seria manifestado
quando uma norma secundria atuasse, ou seja, a caracterstica do dentico
somente surge com a completude da norma que reflete a completude diferenciada
do sistema jurdico com relao aos demais sistemas como o moral e tico.
1.5.4. Diferenciao entre normas jurdicas e morais.
Algumas consideraes devem ser ditas com respeito s normas e
seu contedo de juridicidade, do que, no mesmo sentir de Kelsen40, porm com
sentidos trocados, tem-se que o direito formado por normas que dem acesso
jurisdio, do que a fora nica de coero, por meio do aparato estatal, que traa
a linha de distino entre as normas jurdicas e as demais normas como as morais
ou religiosas.
A identificao das normas jurdicas vlidas passa por uma srie de
conceptualizaes do que seria o sistema jurdico e qual o fundamento de uma
ordem de normas coesas.
Kelsen41 apresentou a sua verso dentro da rgida hierarquia
verticalizada e, derivante de tal conceito, o de validade, que seria a busca de
fundamento de pertencer ao sistema jurdico por se apoiar em uma regra jurdica de
superior estatura.
40 Como interpretado por VILANOVA, Lourival. Estruturas lgicas e o sistema no direito positivo. So Paulo: Noeses, 2006. 41 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003.
51
Esta uma das clssicas formas de identificao deste fenmeno,
com o desdobramento em critrios de pertinncia com o sistema.
Cita-se que o conceito de validade , muitas vezes, vinculado ao de
existncia, dado que para existir no sistema jurdico deve uma norma ser
considerada vlida.
Dentro do supracitado, os clssicos critrios de incluso na classe
das normas vlidas so:
Autoridade, ou seja, pessoa com a aptido para emitir aquele
comando normativo;
Competncia, ou seja, ter a possibilidade de legislar sobre
aquele determinado assunto; e
Procedimento previsto em lei, que a forma que deve ser
seguida para a recepo daquele dado no mundo jurdico.
Adota-se, de forma diversa uma noo de validade como uma
expresso da segurana jurdica, uma conexo tnue entre duas comunicaes
jurdicas, uma forma indiciria de pertinencialidade ao sistema jurdico.
A validade funciona como a cola da certeza do direito, todos
consideram as normas (potencialmente) vlidas at que estas so declaradas
invlidas sempre com efeitos ex tunc, j que nunca fizeram parte do sistema jurdico.
A frmula para esta tnue estabilizao das expectativas normativas
a de que as comunicaes de uma norma considerada a posteriori invlida so
juridicizadas com o cdigo no direito, por meio do mecanismo da reentrada, como
ser elucidado no item infra.
Obviamente, a distino das normas jurdicas e morais no pode ser
realizada pela forma, j que ambas podem ser (re)construdas dentro da estrutura
hipottico condicional.
52
O mesmo pode ser dito com relao ao objeto que so as condutas
dos homens em sociedade.
Logo, uma forma de diferenciao, factvel a possibilidade de
sano por meio de uma ao estatal organizada sob a forma de um processo,
conforme dada por Kelsen42.
Outra forma factvel a de demonstrar a distino entre a
organicidade e ideologizao das normas de moral frente mobilidade e
procedimentalizao da forma de colocar o direito posto, que revolucionrio por
natureza, modificvel.
Por fim, deve ser citada a forma de diferenciao dada por Luhmann
que trata da diferena por meio do cdigo, que na moral pode ser o bom/mau e no
direito lcito/ilcito, o que no leva a recorrncias nem confuses sobre o papel da
sano ou de gradaes de valor no centro de tais digresses.
42 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003.
53
CAPTULO II TEORIA DOS SISTEMAS DE NIKLAS LUHMANN.
2.1. Elementos introdutrios Teoria dos Sistemas autopoiticos de Niklas
Luhmann.
Dentro do sistema de referncia adotado neste trabalho, como j
dito, o acoplamento entre a Teoria dos Sistemas de Niklas Luhmann43 e suas
contrapartes na Teoria da Linguagem se revelam complementares, j que uma
realiza o processo de abstrao mais absoluta, demonstrando as macro estruturas
de funcionamento da sociedade de interaes no sistema jurdico e a outra
demonstra suas micro estruturas.
Neste contexto, deve ser elucidada a posio de como se visualiza a
Teoria dos Sistemas e quais os seus fundamentos, seguida por desenvolvimentos
especficos destes temas a partir de novas premissas no sistema de referncia deste
autor, deixando claras as expresses e a forma de viso do mundo que criada a
partir deste referencial terico.
Interessante notar, inicialmente, que a Teoria dos Sistemas como
concebida por Niklas Luhmann44 uma forma de sociologia do direito que utiliza
ferramentas de outras cincias para mostrar similitudes/analogias operativas entre o
funcionamento da sociedade e o funcionamento do mundo, em sua biologia,
matemtica e fsica, a exem