Upload
trinhnhu
View
215
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
2 Pneumologia Paulista | Janeiro 2018
SOCIEDADE PAULISTA DE PNEUMOLOGIA E TISIOLOGIABIÊNIO 2018/2019
Diretoria
Presidente: Roberto Rodrigues JúniorVice-Presidente: Frederico Leon Arrabal FernandesSecretário Geral: Willian Salibe Filho1ª Secretária: Roberta Pulcheri RamosDiretor de Finanças: José Gustavo Barian RomaldiniDiretor de Assuntos Científicos: Rodrigo Abensur AthanazioDiretora de Divulgação: Eloara V. M. Ferreira Alvares da Silva CamposDiretora de Assuntos do Interior: Suzana Erico Tanni MinamotoDiretor de Informática: Marcos Naoyuki Samano
COMISSÕESDefesa Profissional: Lilian Serrasqueiro Ballini Caetano
Ensino: Gustavo Faibichew Prado
Promoções: Evelise Lima
Assuntos da Grande São Paulo: Adriano Cesar Guazzelli
Publicações: Regina Célia Carlos Tibana
DEPARTAMENTOS
Cirurgia Torácica:Luis Carlos LossoAlessandro MarianiAndré Miotto
Endoscopia Respiratória:Diego Henrique RamosFelipe Nominando Diniz OliveiraViviane Rossi Figueiredo
Pediatria:Karina Pierantozzi VerganiAdyleia Aparecida Dalbo Contrera ToroClaudine Sarmento da Veiga
Fisioterapia Respiratória:Luciana Dias ChiavegatoAdriana Claudia LunardiLara Maris Nápolis Goulart Rodrigues
CONSELHO FISCAL:Efetivos:Ricardo Mingarini TerraMaria Raquel SoaresMaria Vera Cruz de Oliveira Castellano
Suplentes:Silvia Carla S RodriguesLiana Pinheiro SantosCiro Botto
CONSELHO DELIBERATIVO
Regina Maria de Carvalho PintoOliver Augusto NascimentoMônica Corso PereiraJaquelina Sonoe Ota ArakakiJosé Eduardo Delfini CançadoRafael StelmachRoberto StirbulovAna Luisa Godoy FernandesMário Terra FilhoEliana Sheila Pereira da Silva MendesJorge NakataniAlberto CukierCarlos Alberto de Castro PereiraMiguel BogossianFrancisco Vargas SusoManuel Lopes dos SantosNelson Morrone
Pneumologia Paulista | Janeiro 2018 3
REGIONAIS
Regional do ABCPresidente: Mônica Silveira LapaSecretária: Franco Chies Martins
Regional de Araraquara / Bauru / BotucatuPresidente: Marcos Abdo ArbexSecretário: José Eduardo Bergami Antunes
Regional de CampinasPresidente: Paulo Roberto TonidandelSecretário: Mauricio Sousa de Toledo Leme
Regional de MaríliaPresidente: Gisele César de Rossi AgostinhoSecretária: Maria de Lourdes Marmorato Botta Hafner
Regional de Ribeirão PretoPresidente: Luis Renato AlvesSecretária: Andrea de Cassia Vernier Antunes Cetlin
Regional de SantosPresidente: Alex Gonçalves MacedoSecretário: Thiago Fernandes Leomil
Regional de São José dos CamposPresidente: José Eduardo de OliveiraSecretária: Márcio Adriano Leite Bastos
Regional de São José do Rio PretoPresidente: Leandro Cesar SalvianoSecretário: Clélia Margarete Trindade Borralho
SUB-COMISSÕES
Câncer - Ilka Lopes Santoro
Circulação - Jaquelina Ota
Doenças Intersticiais - Regina Célia Carlos Tibana
D.P.O.C. - Flavio Arbex
Epidemiologia - André Nathan
Infecções Respiratórias e Micoses - Mauro Gomes
Pleura - Roberta Sales
Doenças Ambientais e Ocupacionais - Ubiratan de PaulaSantos
Tabagismo - Aldo Agra de Albuquerque Neto
Terapia Intensiva - Ricardo Goulart
Tuberculose - Marcia Telma Guimarães Savioli
Função Pulmonar - Marcelo Macchione
Imagem - Gustavo de Souza Portes Meirelles
Doença Pulmonar Avançada - Ricardo Henrique deOliveira Braga Teixeira
Exercício e Atividade Física - André Luis Pereira deAlbuquerque
4 Pneumologia Paulista | Janeiro 2018
Apresentação
Caro (a) sócio (a),
Iniciamos 2018 com o objetivo de manter a missão do Pneumologia Paulista de contribuircom a atualização dos médicos pneumologistas, por meio da publicação de casos clínicosmensais.
Nesta edição, apresentamos um caso interessante de doença pulmonar intersticial associadaà exposição ocupacional, o que nos traz a importância da abordagem clínica com anamnesedetalhada para um diagnóstico acurado. A pneumonia de hipersensibilidade é uma das doençaspulmonares intersticiais mais comuns no Brasil e outras exposições ambientais além demofo e antígenos aviários devem ser sempre pesquisadas nestes casos.
Boa leitura a todos.
Dra. Regina Célia Carlos TibanaEditora-chefe do Pneumologia Paulista.
Pneumologia Paulista | Janeiro 2018 5
Pneumopatia em marceneiroRafael Futoshi Mizutani1, Mário Terra-Filho2; Ubiratan de Paula Santos3
1Médico Assistente da Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração (InCor) Hospital das ClínicasHCFMUSP, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, BR2Professor Associado da Faculdade de Medicina FMUSP, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, BR3Médico assistente doutor da Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração (InCor) Hospital dasClínicas HCFMUSP, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, BR
PARÂMETROS VALOR OBTIDO % PREVISTOCVF (L) 2,08 56VEF1 (L) 1,89 68VEF1/CVF 0,91 119FEF25-75% (L/s) 3,65 143FEF25-75%/CVF 175,68 261CPT (L) 3,86 63VR (L) 1,67 74VR/CPT 0,43 116DCO 17,61 60
Tabela 1. Prova de função pulmonar completa. Valores dereferência para população brasileira (23, 24)
Nota: CVF: capacidade vital forçada; VEF1: volume expiratório forçado noprimeiro segundo; FEF25-75%: fluxo expiratório forçado médio entre os fluxos25% e 75%; CPT: capacidade pulmonar total; VR: volume residual; DCO:capacidade de difusão de monóxido de carbono.
Figura 1. Tomografia computadorizada de tórax de alta resolução. Imagensobtidas no plano do arco aórtico (A), carina (B), veias pulmonares (C) e dasbases pulmonares (D) demonstram opacidades em vidro fosco difusas,entremeadas por áreas de parênquima relativamente preservado, formandoatenuação em mosaico e presença de reticulados periféricos com predomínioem bases.
Caso Clínico
Paciente do sexo masculino, caucasiano, 74 anos,apresentou-se com dispneia progressiva aos esforços deinício há dois anos, associado à tosse com expectoraçãohialina. Havia perdido 11 kg desde o início dos sintomas.Negava febre e outros sintomas. Refere nunca ter fumado.Antecedente pessoal de hipertensão arterial sistêmica.
Havia trabalhado na manutenção de ônibus comocarpinteiro e marceneiro por sete anos e após comomarceneiro por 18 anos, com exposição a pó de madeira,verniz, tintas, selantes e solventes. Aposentou-se há 10anos, porém continuou realizando a atividade como hobby,em sua casa, até a avaliação inicial. Negava outrasexposições ocupacionais ou no domicilio.
Ao exame clínico, IMC de 29,0 kg/m2 e saturaçãoperiférica de O2 (SpO2) de 95% em ar ambiente; auscultapulmonar com murmúrios vesiculares presentes eestertores grossos em bases, sem outras alterações norestante do exame.
Tomografia computadorizada de tórax de alta resolução(TCAR) com presença de opacidades reticulares finas eáreas em vidro fosco, entremeadas por áreas deparênquima relativamente preservado, formandoatenuação em mosaico, associados à bronquiectasias ebronquiolectasias de tração, leve distorção arquiteturale redução volumétrica, simétrica e sem predomínio delocalização (Figura 1). Função pulmonar completamostrou distúrbio ventilatório restritivo com redução dacapacidade de difusão de monóxido de carbono (DCO)(Tabela 1).
Realizada broncoscopia, com lavado broncoalveolar(LBA) e biópsia pulmonar transbrônquica. A broncoscopianão mostrou alterações na árvore traqueobrônquica; o
LBA foi colhido do segmento lingular e a biópsia pulmonartransbrônquica realizada no lobo inferior esquerdo. O LBAobteve 100 células/mm3, com 71% de macrófagos, 24% delinfócitos, 1,6% de neutrófilos, 1,2% de eosinófilos, 1,2%de monócitos e 1% de células epiteliais. A relação CD4+/
Rafael Futoshi [email protected]
6 Pneumologia Paulista | Janeiro 2018
CD8+ foi de 3,69. A biópsia pulmonar transbrônquica nãoobteve amostra tecidual satisfatória de parênquimapulmonar para análise.
O caso foi discutido em reunião de equipemultidisciplinar, com expertise em doenças intersticiaispulmonares e ocupacionais, formada por patologistas,radiologistas torácicos e pneumologistas. Levando-se emconta os aspectos da história clínica e ocupacional,associadas às alterações encontradas na TCAR e no LBA, aconclusão diagnóstica foi de pneumonite porhipersensibilidade (PH) crônica secundária à exposiçãoocupacional nas atividades de marcenaria, onde houveexposição a poeiras de madeira, colas, vernizes, tintas,selantes e solventes, algumas contendo substânciasquímicas reconhecidas como fator de risco para PH.
O paciente foi orientado a cessar as exposições e iniciadocorticoide sistêmico na dose de 0,5 mg/kg/dia; houvemelhora clínica inicial, mas o paciente apresentou piorada dispneia e da SpO2, sendo optado por iniciar azatioprina,atingindo a dose de 2mg/kg/dia, com progressiva reduçãodo corticosteroide. O paciente mantém seguimento clínicoambulatorial em nosso serviço.
Discussão
A pneumonite por hipersensibilidade (PH) é definidacomo uma doença intersticial pulmonar decorrente dainalação de antígenos ou agentes químicos reativos(isocianatos) por um indivíduo previamente sensibilizado1.A PH é dita ocupacional se a inalação dessas substânciasocorre durante a realização de sua atividade profissional.As primeiras descrições que se assemelham ao quadro dePH ocupacional foram feitas por Bernardino Ramazzini,em 1713, ao observar o desenvolvimento de sintomasrespiratórios progressivos em trabalhadores de grãos2,mas coube a Jacky Pepys a primeira descrição clínica eetiológica em 19693, estabelecendo suas diferenças coma asma, com qual era confundida, principalmente nasformas agudas.
Fisiopatologia
Partículas de moléculas menores que 5 mm são capazes depenetrar o sistema respiratório até os bronquíolos terminaise os alvéolos. Com a exposição recorrente, são formadosanticorpos IgG específicos contra o antígeno inalado ouproteínas modificadas por agentes químicos (caso dosisocianatos), levando a uma resposta de hipersensibilidadetipo 3 (mediada por imunocomplexos) ou tipo 4 (mediadapor linfócitos T). Através de citocinas produzidas porlinfócitos T helper (Th) 1, Th2 e Th17, ocorre inflamaçãocentrada nas regiões peribronquiolares e alveolares compredomínio linfocítico e granulomas malformados,podendo levar a fibrose do parênquima pulmonar4.
Agentes causadores
Há uma quantidade crescente de antígenos descritosassociados ao desenvolvimento de PH. Os principaisantígenos são produzidos por bactérias, fungos e animais;algumas substâncias químicas de baixo peso molecular emetais também podem causar PH (Tabela 2)1,5. Aidentificação de agente(s) ou ambiente causador(es) da PHé essencial para o manejo da doença, uma vez que sua nãoidentificação confere pior prognóstico devido à perpetuaçãoda exposição ao agente causador6. Assim, sempre deve serrealizada anamnese ocupacional e ambiental detalhadados indivíduos com suspeita de PH. Uma ferramenta quepode ser utilizada para a identificação de um agentecausador é a pesquisa de precipitinas, embora poucodisponível para a maioria dos agentes7.
Entre as principais ocupações de risco para PH estãoos trabalhadores rurais, de processamento de alimentos,criadores de animais (especialmente de pássaros),trabalhadores de madeira, pintores (uso de isocianatos)e operadores de máquina que usam fluidos em suasoperações, produção de cortiça. A exposição a fluidos decorte contaminados por bactérias (principalmenteMycobacterium immunogenum) tornou-se a principalcausa de PH ocupacional no Reino Unido nos últimosanos8,9. Os fluidos de corte (também chamados óleos decorte) são misturas de óleos com ou sem água, geralmenteutilizados para lubrificação e resfriamento de peçasmetálicas em vários processos de indústrias ou setoresmetalomecânicos de empresas.
Quadro Clínico e classificação
A apresentação clínica é dividida nas formas aguda,subaguda e crônica, pela classificação de Richerson10.Entretanto, essa classificação leva a alguma confusão,pois sugere que haja progressão da forma aguda para asubaguda e da subaguda para a crônica, o que muitasvezes não ocorre. O HP Study Group é uma colaboraçãointernacional com esforços em sistematizar o diagnósticoe a classificação de PH. O grupo realizou um estudo comanálise de clusters para obter uma classificação commelhor correlação clínica, radiológica e funcional,dividindo os pacientes em dois clusters, o primeiro comespectro de sintomas agudos e recorrentes e o segundocom sintomas crônicos e progressivos, com doençaintersticial fibrosante (Tabela 3)11.
Critérios Diagnósticos
Há dificuldades para a elaboração de critériosespecíficos para o diagnóstico de PH, pois suaapresentação clínica é muito heterogênea, não existe umexame considerado padrão-ouro para o diagnóstico e na
Pneumologia Paulista | Janeiro 2018 7
OCUPAÇÃOFazendeiro
Criadores de animais
Trabalhadores de madeira
Trabalhadores de indústrias
Manutenção de ventilação e fontes de água
EXPOSIÇÕES DE RISCOMofo em silagem e no cultivo (tabaco, batata, grãos,uva), fungos do queijo, cogumelos, vegetais (chá,leguminosas, malte), pesticidas
Criação de pássaros, técnicos de biotério,cuidadores de animais, peleiros (peles de animais)Poeira da madeira (carvalho, cedro, pinho, mogno),mofo na madeira, colas, resinas e solventesOperadores de máquina (fluido de corte), pintores,produção de polímeros, produção e uso de resinase solventes, produção de detergentes enzimáticos
Sistemas de ventilação e ar condicionado, saunas,piscinas, banheiras aquecidas
Agente causadores (exemplos)Thermoactinomyces spp,Aspergillus spp, Penicillium spp,proteínas vegetais, piretróides(pesticida)Proteínas da ave/penas, ratos ecobaias, outrosAlternaria sp, Cryptostroma sp,Trichoderma sp, resinas epóxiMycobacterium immunogenum,Pseudomonas fluorescens,metais (Co, Zn, Zr), isocianatos,resinas epóxi, enzimas deBacillus subtilisComplexo Mycobacterium aviumintracellulare (MAC),Thermoactinomyces spp,Trichosporon cutaneum
Tabela 2. Principais ocupações de risco e agentes associados. Adaptado de Quirce et al. (1)
CLASSIFICAÇÃO DE RICHERSON (10)Tempo decorrido após exposiçãoaté sintomasSintomas predominantes
Classificação HP Study Group (11)
Sintomas e sinais
Função pulmonar
RadiografiaTomografia de tórax
AGUDOHoras (entre 2 e 9h)
Febre, calafrios,mialgia, influenza-like
SUBAGUDODias a semanas
Tosse, dispneiaprogressiva
Cluster 1 (“sintomas agudos e recorrentes”)
Dispneia, tosse, recorrência de sintomas apósexposição, calafrios, mialgia, opressão torácicaNormal
Normal ou opacidades em basesOpacidades em vidro fosco
CRÔNICOMeses a anos
Dispneia aos esforços, perda ponderal,tosseCluster 2 (“sintomas crônicos e padrãofibrosante”)Dispneia aos esforços, tosse, auscultacom estertores, baqueteamento digitalDistúrbio ventilatório restritivo e redução daDCOOpacidades em base ou difusasOpacidades em vidro fosco, fibrosepulmonar
Tabela 3. Classificações de pneumonite de hipersensibilidade (Adaptado de Lacasse et al. 11)
DCO: capacidade de difusão de monóxido de carbono
literatura há emprego de uma variedade de nomenclaturas(ex.: alveolite alérgica extrínseca, pulmão do fazendeiro,pulmão do criador de pássaros, etc.) que dificulta aformação de um banco de dados mais consistente12. Namaioria dos estudos, o padrão-ouro utilizado é odiagnóstico consensual de vários especialistas.
O HP Study Group sugere elementos para prediçãoclínica de PH baseada em seis critérios (exposição a agentede risco; recorrência de sintomas; sintomas após 4 a 8hda exposição; perda ponderal; ausculta pulmonar comestertores; precipitinas séricas) e calculou a probabilidadedo diagnóstico para as possíveis combinações; umaprobabilidade menor de 10% praticamente exclui PH emaior que 90% pode ser suficiente para o diagnóstico12.Outros escores diagnósticos também foram criados,geralmente se restringindo a um grupo de trabalhadoresexpostos à(s) substância(s) com risco conhecido e estesescores são especialmente úteis em surtos epidêmicos,como o que ocorreu com os trabalhadores de fluido decorte8,13 (Tabela 4). Com o crescente reconhecimento da PH
como uma doença pulmonar intersticial frequente, várioscritérios diagnósticos e de classificação têm sidopropostos desde a publicação do HP Study Group14,15,16,17.Porém até o momento não existe consenso sobre oassunto.
Exames de imagem
Radiografia de tórax: é um exame pouco específico parao diagnóstico de PH e frequentemente é normal. Alteraçõessão observadas principalmente nas formas crônicas efibrosantes, como opacidades em vidro fosco, opacidadesreticulares e lineares, redução do volume pulmonar15.
TC de tórax: é um exame mais sensível que a radiografiae praticamente obrigatória para avaliação de alteraçõesdo interstício pulmonar. Os achados tomográficos maisfrequentes são16:
• Opacidades em vidro fosco: presentes principalmentenas formas subagudas e crônicas, geralmente bilaterais esimétricas.
8 Pneumologia Paulista | Janeiro 2018
ELEMENTOS DIAGNÓSTICOS PONTUAÇÃOSINTOMAS RESPIRATÓRIOS
Tosse, dispneia, sibilância ou opressão torácica associada ao trabalhoParar para recuperar o fôlego ao andar no plano em seu próprio ritmoAfastamento prévio do trabalho devido a sintomas respiratórios
SINTOMAS CONSTITUCIONAISSintomas influenza-like que pioram ao final da semana de trabalhoPerda ponderal inexplicável
FUNÇÃO PULMONARCVF < 80% do previstoCVF < 70% do previsto e/ou CPT < 80% do previstoDCO < 60% do previsto
RADIOLOGIA E EXAME CLÍNICOAlterações em radiografia de tórax (nodularidades ou opacidades em vidro fosco difusas)Alterações em TCAR (modularidades, opacidades em vidro fosco difusas, mosaico, padrão PIU)Ausculta pulmonar com estertores finos à expiração
EVIDÊNCIA DE INFLAMAÇÃONeutrófilos > 7.000 céls/mm3 ou PCR > 10 mg/LLinfócitos no LBA > 20%Biópsia pulmonar compatível com PH ou PIUPontuação total
+4+6+7
+5+7
+3+5
+10
+6+7+7
+5+8
+10Máximo 41
CVF: capacidade vital forçada; CPT: capacidade pulmonar total; DCO: capacidade de difusão de monóxido de carbono; TCAR: tomografia computadorizadade tórax de alta resolução; PIU: pneumonia intersticial usual; PCR: proteína C reativa; LBA: lavado broncoalveolar, PH: pneumonite de hipersensibilidade.
Tabela 4. Escore MWF-HP para trabalhadores expostos a fluidos de corte. Para a pontuação, utiliza-se o critério de maiorvalor dentro de um domínio, com pontuação máxima de 41. Valores de corte: caso definitivo > 26 pontos; caso possívelentre 19 e 26; caso descartado < 19. (Adaptado de Barber et al. 8).
• Nódulos centrolobulares: geralmente mal definidosou em vidro fosco. São as principais alterações queocorrem nas formas agudas.
• Áreas de baixa atenuação: geralmente ocorrem emmeio a áreas de opacidades em vidro fosco, formando opadrão de atenuação em mosaico; ficam mais evidentesquando se realiza imagens durante a expiração(aprisionamento aéreo).
• Reticulado e distorção arquitetural: em formas crônicase fibróticas, ocorrem associados à bronquiectasias ebronquiolectasias de tração, com predomínio dedistribuição peribrônquico e subpleural; pode tambémhaver faveolamento.
Lavado broncoalveolar
O LBA é uma das ferramentas mais sensíveis nodiagnóstico de PH16. A principal característica é oaumento de células no LBA com predomínio delinfócitos (> 15%), eventualmente em porcentagemmaior que 50%16. Proporções baixas de linfócitospraticamente excluem o diagnóstico de PH16. O LBAtambém é útil para o diagnóstico diferencial das outrasdoenças intersticiais pulmonares16. Existe a descriçãoclássica de predomínio de linfócitos T CD8+, comrelação CD4+/CD8+ menor que um. Entretanto, essadistribuição ocorre em cerca de 1/3 das vezes e valoreselevados (> 3) de relação CD4+/CD8+ não excluem odiagnóstico17.
Biópsia
A biópsia pulmonar é muitas vezes necessária para odiagnóstico de PH, especialmente quando o padrão éfibrosante e há dificuldade para a diferenciaçãoradiológica de pneumonia intersticial usual (PIU)18,19.Geralmente, tenta-se obter tecido pulmonar através debroncoscopia; eventualmente, é necessária umaamostragem através de biópsia cirúrgica, caso ainda hajadúvida diagnóstica. Os achados patológicos podem serdiscretos e o patologista deve ser informado da suspeitaclínica de PH. As principais alterações histopatológicasencontradas na PH são18:
• Alterações centradas na via aérea (peribronquio-lares);
• Infiltrado intersticial com variados graus de fibrose,de predomínio linfocítico;
• Presença de granulomas epitelioides pequenos,frouxos e malformados;
• Pode ocorrer sobreposição com padrões de outrasdoenças pulmonares intersticiais fibrosantes, como PIUe pneumonia intersticial não específica (PINE).
Outros exames
Precipitinas séricas: o exame consiste na pesquisasérica de anticorpos IgG específicos, através da interaçãoentre preparados dos antígenos suspeitos e o soro doindivíduo. A imunoeletroforese é o método mais acurado6.
Pneumologia Paulista | Janeiro 2018 9
Entretanto, o exame pode ser falso-positivo em indivíduosexpostos ao antígeno testado (ocorre resultado falso-positivo em cerca de 10% de fazendeiros e 40% de criadoresde pássaros que não apresentam PH); ao mesmo tempo,um exame negativo não exclui a suspeita de PH, pois oantígeno culpado pode não ter sido testado7. Poucoscentros realizam painéis completos de antígenos suspeitospara uma determinada ocupação; até o momento, não hádisponibilidade do exame no Brasil.
Broncoprovocação específica: consiste na realizaçãode prova de função pulmonar inicial, com repetiçõesseriadas do exame após a exposição ao antígeno suspeito.Considera-se positivo quando há queda de capacidadevital forçada (CVF) maior que 15% ou, quando há quedasmenores que 15%, deve apresentar alterações clínicas oulaboratoriais avaliadas após 8h da exposição (queda deSpO2 > 3 pontos percentuais, aumento de leucócitos séricos> 20%, alteração radiológica significativa, elevação detemperatura > 0,5º C, tosse ou dispneia evidente)20. Oexame possui uma série de dificuldades técnicas e porisso é raramente realizado: necessidade de preparaçãode extratos de antígenos, cabine específica para arealização dos testes, vigilância dos pacientes submetidosao teste idealmente em ambiente intra-hospitalar por pelomenos 24h20. A sensibilidade estimada é de 72,4% eespecificidade de 84%, com maior taxa de falsos-negativosquando o antígeno suspeito não é aviário ou fúngico20.
Diagnóstico diferencial
Devido às apresentações clínicas diversas de PH, devese considerar uma série de diagnósticos diferenciais. Entreos diagnósticos diferenciais para PH aguda estãoinfecções respiratórias agudas, síndrome tóxica porpoeira orgânica, febre dos fumos metálicos e outrassíndromes febris causadas por inalantes1,21. Já na PHcrônica devem ser considerados no diferencial umamultiplicidade de doenças intersticiais pulmonares. A PIUé o principal diagnóstico diferencial especialmente empacientes com doença fibrosante avançada; outrosdiagnósticos a serem considerados são a PINE fibrosante,pneumonia intersticial bronquiolocêntrica e pneumoniaintersticial por metal duro18.
Tratamento
A cessação da exposição ao agente causador é oprincipal tratamento da PH6. Isso implica em uma série dequestões trabalhistas, visto que em alguns casos, opaciente deverá passar por reabilitação profissional parauma nova função sem esta exposição. É importante tambéminvestigar e descartar outras exposições, uma vez que nemsempre é possível confirmar que a PH tenha sido causadapor um agente relacionado à sua ocupação. Identificar o
antígeno correto e evitar novas exposições pode tambémmelhorar a sobrevida em pacientes com PH crônica6.
O tratamento medicamentoso é indicado na persistênciade sintomas debilitantes mesmo após a remoção daexposição22. O uso de corticoides sistêmicos é o tratamentopadrão. Os imunossupressores podem ser utilizados comoterapia poupadora de corticoide na PH crônica22. Otransplante pulmonar é uma possibilidade em pacientesque desenvolvem doença fibrosante e que não apresentammelhora com o tratamento23.
Prognóstico
Devido às diferentes apresentações clínicas, a PH é umadoença de prognóstico variável. Há alguns marcadoresclínicos que conferem pior prognóstico, como atraso nodiagnóstico, tempo prolongado de persistência àexposição após o início dos sintomas, não identificaçãodo agente causador, recorrência de sintomas agudos,presença de fibrose pulmonar ao diagnóstico, presençade hipertensão pulmonar e número de exacerbaçõesagudas na PH crônica1.
Referências Bibliográficas
1. Quirce S, Vanderplas O, Campo P, Cruz MJ, de Blay F, et al.Occupational hypersensitivity pneumonitis: an EAACI position paper.Eur J Allergy Clin Immunol, 2016;71:765-779.
2. Ramazzini B. Diseases of workers. Wright WC, translation. NewYork, NY: Hafner, 1964;243.
3. Pepys J. Hypersensitivity diseases of the lungs due to fngi and organicdusts. Monogr Allergy 1969; 4:1-147
4. Simonian PL, Roark CL, Wehrmann F, Lanham AK, del Valle FD, etal. Th17-Polarized Immune Response in a Murine Model ofHypersensitivity Pneumonitis and Lung Fibrosis. J Immunol,2009;182(1):657-665.
5. Selman M, Buendía-Roldán I. Immunopathology, Diagnosis, andManagement of Hypersensitivity Pneumonitis. Semin Respir Crit CareMed, 2012;33:543-554.
6. Pérez ERF, Swigris JJ, Forssén AV, Tourin O, Solomon JJ et al.Identifying an Inciting Antigen Is Associated With Improved Survival inPatients With Chronic Hypersensitivity Pneumonitis. Chest 2013;144(5):1644-1651.
7. Fenoglio C-M, Reboux G, Sudre B, Mercier M, Roussel S et al.Diagnostic value of serum precipitins to mould antigens in activehypersensitivity pneumonitis. Eur Respir J, 2007;29:706-712.
8. Barber CM, Burton CM, Hendrick DJ, Pickering CAC, RobertsonAS et al. Hypersensitivity Pneumonitis in Workers Exposed toMetalworking Fluids. Am J Ind Med, 2014;57:872-880.
9. Barber CM, Wiggans RE, Carder M, Agius R. Epidemiology ofoccupational hypersensitivity pneumonitis; reports from the SWORDscheme in the UK from 1996 to 2015. Occup Environ Med 2016;0:1–3.
10. Richerson HB, Bernstein IL, Fink JN, Hunninghake GW, Novey HSet al. Guidelines for the clinical evaluation of hypersensitivity pneumonitis.J Allergy Clin Immunol, 1989;84:839-844.
11. Lacasse Y, Selman M, Costabel U, Dalphin JC, Morell F et al.Classification of Hypersensitivity Pneumonitis. Int Arch Allergy Immunol2009;149:161-166.
12. Lacasse Y, Selman M, Costabel U, Dalphin JC, Ando M et al. ClinicalDiagnosis of Hypersensitivity Pneumonitis. Am J Respir Crit Care,2003;168:952-958.
10 Pneumologia Paulista | Janeiro 2018
13. Unger GF, Scanlon GT, Fink JN, Unger JB. A radiologic approach tohypersensitivity pneumonias. Radiol Clin North Am, 1973;11(2):339-356.
14. Pereira CAC, Gimenez A, Kuranishi L, Storrer K. Chronichypersensitivity pneumonitis. J Asthma Allergy, 2016;9:171-181.
15. Salisbury ML, Myers JL, Belloli, EA, Kazerooni EA, Martinez FJ etal. Diagnosis and Treatment of Fibrotic Hypersensitivity Pneumonia.Where We Stand and Where We Need to Go. Am J Respir Crit CareMed, 2017;196(6):690-699.
16. Vasakova M, Morell F, Walsh S, Leslie K, Raghu G. HypersensitivityPneumonitis: Perspectives in Diagnosis and Management. Am J RespirCrit Care Med, 2017;196(6):680-689.
17. Morisset J, Johannson KA, Jones KD, Wolters PJ, Collard HR et al(in press). Am J Respir Crit Care Med. 2017 Nov 27.
18. Silva CIS, Churg A, Müller NL. Hypersensitivity Pneumonitis:Spectrum of High-Resolution CT and Pathologic Findings. Am JRoentgen, 2007;188:334-344.
19. Meyer KC, Raghu G, Baughman RP, Brown KK, Costabel U et al.An Official American Thoracic Society Clinical Practice Guideline: TheClinical Utility of Bronchoalveolar Lavage Cellular Analysis in InterstitialLung Disease. Am J Respir Crit Care Med, 2012;185(9):1004-14.
20. Caillaud DM, Vergnon JM, Madroszyk A, Melloni BM, Murris M et al.Bronchoalveolar Lavage in Hypersensitivity Pneumonitis: A Series of139 Patients. Inflammation & Allergy - Drug Targets, 2012;11(1):15-19.
21. Grunes D, Beasley MB. Hypersensitivity pneumonitis: a review andupdate of histologic findings. Clin Pathol 2013;66:888–895.
22. Takemura T, Akashi T, Kamiya H, Ikushima S, Ando T et al. PathologicalDifferentiation of Chronic Hypersensitivity Pneumonitis from IdiopathicPulmonary Fibrosis D Usual Interstitial Pneumonia. Histopathology,2012;61:1026–1035.
23. Muñoz X, Sánchez-Ortiz M, Torres F, Villar A, Morell F et al. DiagnosticYield of Specific Inhalation Challenge In Hypersensitivity Pneumonitis.Eur Respir J, 2014;44:1658–65.
24. Antonini JM, Lewis AB, Roberts JR, Whaley DA. Pulmonary Effectsof Welding Fumes: Review of Worker And Experimental Animal Studies.Am J Ind Med, 2003;43:350-360.
25. Adegunsoye A, Oldham JM, Pérez ERF, Hamblin M, Patel N.Outcomes of Immunosuppressive Therapy in Chronic HypersensitivityPneumonitis. ERJ Open Res 2017;3:00016-2017.
26. Weill D, Benden C, Corris PA, Dark JH, Davis RD et al. A ConsensusDocument for the Selection of Lung Transplant Candidates: 2014—anUpdate from the Pulmonary Transplantation Council of the InternationalSociety for Heart and Lung Transplantation. J Heart Lung Transplant,2015;34(1):1-15.
27. Pereira CAC, Sato T, Rodrigues SC. New reference values forforced spirometry in white adults in Brazil. J Bras Pneumol,2007;33(4):397-406.
28. Neder JA, Andreoni S, Lerario MC, Nery LE. Reference values forlung function tests. II. Maximal respiratory pressures and voluntaryventilation. Braz J Med Biol Res 1999;32(6):719-27.