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Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária ANO XXIX – Nº 338 – AGOSTO 2017 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Supremo Tribunal Federal – Nº 21/91 Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91 Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94 Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92 Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010 Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL Milena Sanches Tayano dos Santos COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza CONSELHO EDITORIAL Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca, Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins, Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez COMITÊ TÉCNICO Enoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Ailana Ribeiro, Amauri Cesar Alves, Cláudio Jannotti da Rocha, Daniela Wagner, Enoque Ribeiro dos Santos, George Resende Rumiatto de Lima Santos, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Jorge da Silva Wagner, Jorge Luiz Souto Maior, Luís Rodolfo Cruz e Creuz, Márcia Regina Lobato, Patricia Oliveira Lima Pessanha, Roberto das Graças Alves, Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Sergio Pinto Martins ISSN 2179-1643

ISSN 2179-1643 Revista SÍNTESE - bdr.sintese.com 338_miolo.pdf · No clássico filme político do cineasta grego Costa-Gavras Seção Especial de ... O governo francês de Vichy,

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Revista SÍNTESETrabalhista e Previdenciária

Ano XXIX – nº 338 – Agosto 2017

ReposItóRIo AutoRIzAdo de JuRIspRudêncIASupremo Tribunal Federal – Nº 21/91

Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94

Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0

Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9

Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98

dIRetoR eXecutIvo

Elton José Donato

geRente edItoRIAl

Milena Sanches Tayano dos Santos

cooRdenAdoR edItoRIAl

Cristiano Basaglia

edItoRA

Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza

conselho edItoRIAl

Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca,

Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins,

Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez

comItê técnIcoEnoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora,

Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas

colAboRAdoRes destA edIçãoAilana Ribeiro, Amauri Cesar Alves, Cláudio Jannotti da Rocha, Daniela Wagner,

Enoque Ribeiro dos Santos, George Resende Rumiatto de Lima Santos, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Jorge da Silva Wagner, Jorge Luiz Souto Maior,

Luís Rodolfo Cruz e Creuz, Márcia Regina Lobato, Patricia Oliveira Lima Pessanha, Roberto das Graças Alves, Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Sergio Pinto Martins

ISSN 2179-1643

1989 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos trabalhistas e previdenciários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Nota: Continuação da Revista IOB Trabalhista e Previdenciária

v. 1, n. 1, jul. 1989

Publicação periódica Mensal

v. 29, n. 338, Agosto 2017

ISSN 2179-1643

1. Direito trabalhista – periódicos – Brasil

CDU: 349.2(81)(05) CDD: 7340

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

Carta do Editor

A Reforma Trabalhista que há muito se falava realmente aconteceu. A Lei nº 13.467/2017 foi publicada no Diário Oficial, dia 14.07, e fez significativas al-terações no texto da CLT, cuja vigência se dará em 120 dias após sua publicação.

Entre elas, haverá a possibilidade do fracionamento das férias em até três períodos, caberá a prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho, a jornada de trabalho de 12 horas será aplicada aos contratos, a gestante poderá trabalhar na atividade insalubre e as convenções coletivas prevalecerão sobre as leis trabalhistas em determinadas matérias.

Diante disso, para elucidar alguns pontos controvertidos acerca do tema, o assunto especial desta edição da Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária aborda a “Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista”, com a publicação de im-portantes artigos de autoria dos ilustres mestres do Direito: Jorge Luiz Souto Maior, Sergio Pinto Martins, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Enoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Amauri Cesar Alves e Roberto das Graças Alves, Luís Rodolfo Cruz e Creuz e Daniela Wagner, Márcia Regina Lobato, Cláudio Jannotti da Rocha e Ailana Ribeiro e, ainda, Patricia Oliveira Lima Pessanha.

Na Parte Geral, selecionamos para você, leitor, Acórdãos na Íntegra dos prin-cipais Tribunais, além de importantes artigos, Seções especiais, clipping jurídico, resenha legislativa, bibliografia complementar e tabelas práticas.

Na Seção de artigos contamos com a colaboração dos seguintes autores: Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson fazendo um estudo acerca “Da Flexibilização das Relações de Trabalho”; e Jorge da Silva Wagner analisando as “Provas Periciais – Inspeção Judicial – Honorários Periciais e Assistentes Técnicos”.

Por fim, entre as Seções Especiais destacamos o artigo publicado na Se-ção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, de autoria do Dr. George Resende Rumiatto de Lima Santos, intitulado “Reconhecimento do Tempo de Serviço para Fins Previdenciários: a Sentença Trabalhista e a Exigência Normativa de Início de Prova Material”.

Desejamos a você uma excelente leitura!

Milena Sanches Tayano dos Santos

Gerente Editorial

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Lei nº 13.467/2017 – A RefoRmA TRAbALhisTA

DouTRinAs

1. Sem uma Seção Especial de Justiça para a “Reforma” TrabalhistaJorge Luiz Souto Maior ........................................................................................... 9

2. Contribuição Sindical e a Reforma TrabalhistaSergio Pinto Martins .............................................................................................. 17

3. Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017): Modificações Quanto ao Regime das Férias na Relação de EmpregoGustavo Filipe Barbosa Garcia .............................................................................. 23

4. A Dispensa Coletiva na Lei nº 13.467/2017 da Reforma TrabalhistaEnoque Ribeiro dos Santos.................................................................................... 26

5. A Reforma Trabalhista à Luz dos Direitos Fundamentais – Análise da Lei nº 13.467, de 13 de Julho de 2017Ilse Marcelina Bernardi Lora ................................................................................. 33

6. Reforma Trabalhista e o Novo “Direito do Capital”Amauri Cesar Alves e Roberto das Graças Alves ................................................... 47

7. A Reforma Trabalhista e Sua Aplicação nos Contratos em VigorLuís Rodolfo Cruz e Creuz e Daniela Wagner ...................................................... 75

8. Os Limites das Negociações Coletivas Contemporâneas Frente à Reforma TrabalhistaMárcia Regina Lobato ........................................................................................... 87

9. A Desnaturação do Direito do Trabalho sob o Véu da “Reforma Trabalhista”Cláudio Jannotti da Rocha e Ailana Ribeiro ........................................................ 102

10. Reforma Trabalhista: o Princípio da Intervenção Mínima na Autonomia da Vontade Coletiva: Realidade Ou Engodo?Patricia Oliveira Lima Pessanha .......................................................................... 111

Parte Geral

DouTRinAs

1. Da Flexibilização das Relações de TrabalhoRocco Antonio Rangel Rosso Nelson .................................................................. 116

2. Provas Periciais – Inspeção Judicial – Honorários Periciais e Assistentes TécnicosJorge da Silva Wagner ......................................................................................... 129

JuRispRuDênciA TRAbALhisTA

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Superior do Trabalho ............................................................................ 141

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Trabalhista ............................................................. 152

JuRispRuDênciA pReviDenciáRiA

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ................................................................................... 168

2. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 171

3. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 177

4. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 181

5. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .............................................................. 185

6. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .............................................................. 189

7. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .............................................................. 193

8. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .............................................................. 198

9. Tribunal Regional Federal da 5ª Região .............................................................. 203

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Previdenciária ........................................................ 208

Seção Especial

com A pALAvRA, o pRocuRADoR

1. Reconhecimento do Tempo de Serviço para Fins Previdenciários: a Sentença Trabalhista e a Exigência Normativa de Início de Prova MaterialGeorge Resende Rumiatto de Lima Santos .......................................................... 218

Clipping Jurídico ......................................................................................................... 237

Tabelas Práticas .......................................................................................................... 239

Resenha Legislativa ..................................................................................................... 243

Bibliografia Complementar ............................................................................................ 244

Índice Alfabético e Remissivo ....................................................................................... 245

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preencher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastrodeauto-res e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Sem uma Seção Especial de Justiça para a “Reforma” Trabalhista

JORgE LuIz SOuTO MAIORJuiz do Trabalho, Titular da 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí/SP, Professor da FAC, Direito, USP.

No clássico filme político do cineasta grego Costa-Gavras Seção Especial de Justiça (1975), o ambiente histórico-geográfico é o do período da ocupação de parte da França pelas forças alemãs durante a Segunda Guerra Mundial, o que, inclusive, foi favorecido por um acordo que, supostamente, serviria para vencer o inimigo interno, os comunistas.

No filme, militantes da resistência jovem parisiense, após serem violenta-mente atacados por militares alemães quando faziam uma passeata, tiram como tarefa assassinar um militar alemão e concretizam o atentado.

O governo francês de Vichy, que serve aos interesses nazistas, temendo uma reação violenta das forças da ocupação, resolve se antecipar aos fatos.

O Ministro da Justiça francês propõe a seus pares que, como recompensa pelo assassinato, se ofereça aos alemães o sacrifício da vida de seis franceses. Para isso, segundo o Ministro, bastaria que se valessem do Estado de exceção já vigente e se superassem alguns obstáculos jurídicos, o que estaria plenamente justificado pela excepcionalidade da situação.

Propõe, então, que se criasse uma lei que estabelecesse a pena de morte e que pudesse ser aplicada de forma retroativa, atingindo as situações de pessoas que já estavam na prisão aguardando julgamento.

Sugere, também, a formação de um órgão especial da Justiça para que se pudesse conferir a necessária agilidade à condenação e se procedesse a imediata execução da sentença.

A proposta recebe o repúdio do Ministro do Interior, cuja tese de doutorado era exatamente sobre a irretroatividade da lei penal. Mas como no Estado de exce-ção as teses jurídicas são esquecidas, prevalece a vontade do Ministro da Justiça.

A ideia, para ser levada adiante, necessita da aprovação do Comando Militar alemão; no entanto, mesmo este se assusta com a proposta. Em reunião para tratar do assunto, integrantes do Comando Militar chegam a reconhecer que aquele pro-jeto significava a admissão de execuções políticas, e se preocuparam porque isso

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chocaria o mundo, com o problema adicional de que poderiam ser acusados de terem sido os autores da ideia.

Reconhecem, também, que a lei romperia com a tradição jurídica francesa, que proibia a retroatividade punitiva da lei penal, e que abalaria a ideia de separa-ção de poderes, estabelecida desde Montesquieu, prevendo, ainda, que possibilita-ria a condenação de inocentes.

Mas como seria uma lei feita por franceses, aplicada por franceses, não se opuseram e aproveitaram, inclusive, para fixar o prazo de uma semana para que a promessa fosse cumprida.

A lei, então, foi rapidamente redigida e aprovada pelo Conselho de Ministros (sendo assinada também pelo Ministro do Interior), deixando-se um artigo ainda em branco (exatamente o que dizia respeito à retroatividade da lei), o qual seria escrito, posteriormente, por uma comissão de Magistrados, especialmente escolhidos tam-bém para a tarefa de criarem uma Corte Especial de Justiça.

Superados todos os dilemas jurídicos e morais, ou seja, mandando-se “às favas os pruridos da consciência”, como preconizou entre nós Jarbas Passarinho ao justificar a necessidade de assinatura do AI-5, concluiu-se a criação da tal lei. A dificuldade que se apresentou na sequência (que é a trama central do filme) foi a de escolher um juiz que concordasse em aplicar aquela lei e conduzir um processo cujo resultado, condenação e execução do culpado, deveria se dar em dois dias.

O argumento utilizado para tentar convencer os Magistrados que foram cha-mados para uma conversa a respeito era o de que, embora se pudesse ter alguma razão de natureza jurídica ou humanista para ser contra a lei, havia interesses supe-riores do Estado que deveriam prevalecer, dada a possibilidade de um mal maior. Enfim, depois de inúmeras recusas, um Magistrado aceitou cumprir o papel e as execuções se realizaram.

Se algum roteirista expusesse a situação atual brasileira em um filme, seria possível que aqueles que ainda não querem ver enxergassem as semelhanças do Estado de exceção instaurado na França ocupada pelos nazistas com a nossa reali-dade, uma realidade em que o poder econômico internacional, com lógica colonial, ocupou a vida política nacional e a classe política governamental, buscando uma sustentação para assumir o poder e se manter em tal posição, dialogando com as constantes ameaças do capital de que pode ir embora a qualquer momento, o que agravaria o problema do desemprego, promete realizar uma reforma trabalhista que potencializará os seus ganhos de capital.

Mas o PL da reforma trabalhista, para atender a esse propósito, precisa con-trariar vários princípios jurídicos constitucionais e trabalhistas como os do não re-trocesso social, da melhoria da condição social dos trabalhadores, da proteção, da primazia dos Direitos Humanos, da função social da propriedade, dos valores

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sociais do trabalho e da livre iniciativa, da vinculação da economia aos ditames da justiça social1.

O capital internacional até se assusta com a proposta, mas, como seria uma lei brasileira, aplicada por brasileiros, não só aceita a oferta como também fixa um prazo para que se concretize.

Além disso, para que se efetive dentro do prazo estabelecido, ditado também pela pressão de novo pleito eleitoral marcado para 2018, não há como se elaborar e aprovar a lei nos moldes dos padrões do Estado Democrático de Direito, respeitan-do-se, inclusive, a separação de Poderes.

O projeto de lei, então, é redigido a portas fechadas diretamente pelo setor interessado em seus resultados imediatos, sem qualquer participação daqueles que serão atingidos pelas novas regras, e se busca garantir a efetividade do atropelo do processo legislativo por meio de um ajuste prévio entre o Poder Executivo e a maioria de representatividade que este detém no Poder Legislativo, e que se reforça, ainda, por ameaças da Lava Jato que se renovam a todo instante.

Vale reparar que o projeto de lei, inclusive, da mesma forma como se deu na citada lei francesa, para não atrasar a tramitação, está sendo aprovado com vários trechos em branco, ou, mais precisamente, com diversos artigos que, como se assu-me, deveriam ser suprimidos, e com outros cuja redação precisaria ser alterada, mas todos esses “acertos”, por um acordo já feito (conforme publicamente anunciado), serão feitos fora do processo Legislativo, ou seja, serão executados pelo chefe do Executivo, por meio de medida provisória.

Com o auxílio de parte da grande mídia, essa realidade, já conhecida por todos, é vendida como se fosse meramente uma necessária modernização da le-gislação trabalhista, para superar a CLT de 1943 (que nem existe mais), dinamizar a economia e conferir emprego para 14 milhões de desempregados. Mas essa fra-ção da sociedade brasileira, que está controlando tal processo em acordo com os interesses do mercado financeiro e, mais propriamente, portanto, com o capital estrangeiro, tem atacado a legislação trabalhista desde quando ela começou a existir ainda no período da Primeira República. Essa legislação, ademais, vem sendo flexi-bilizada desde 1965 e é, pode-se dizer sem receio, a mais desrespeitada do mundo, e tudo isso sem qualquer efeito benéfico para a economia nacional e a melhoria da condição social dos trabalhadores, o que revela que não é, propriamente, de mo-dernização que falam, até porque inúmeras efetivas medidas modernizantes, como a redução da jornada e a eliminação da prática de horas extras, por exemplo, que representariam claras política públicas de geração de empregos e de diminuição dos custos sociais com acidentes do trabalho, sequer são postas em questão.

Fato é que as reformas estão sendo promovidas em nítido ambiente de Estado de exceção, para atender a uma demanda exclusiva de setores específicos

1 Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog/os-201-ataques-da-reforma-aos-trabalhadores>.

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do mercado financeiro, e quanto mais se intensifica o artificialismo para negar a crise política evidentemente instaurada, mais se aprofunda na lógica do Estado de exceção.

Senão vejamos.

Após a divulgação, em 01.05.2017, de pesquisa feita pelo Datafolha reve-lando que 64% dos brasileiros compreendiam que a reforma trabalhista privilegia os interesses empresariais2, e apontando, também, que 71% eram contra a reforma previdenciária3, o jornal Folha de S. Paulo, em editorial do dia 02.05.2017, intitula-do “Dores da Democracia”, veio a público para defender que os governos não de-vem atender os desejos da maioria da população se assim exigirem as necessidades econômicas4.

Aproveitando a abertura, o relator da “reforma” trabalhista na Câmara, Depu-tado Rogério Marinho, no dia 17.05.2017, em audiência pública no Senado Federal, confessou que a “reforma” era fruto de uma “ruptura do processo democrático”5.

Depois, foi o próprio chefe do Executivo em exercício, em mais uma das tantas reuniões que fez com representantes do capital, no dia 24.05.2017, quem garantiu que, crise política à parte, o Congresso continuaria trabalhando para fazer avançar as reformas, com o que, claro, assentiram os empresários6.

Na sequência, em 30.05.2017, o mesmo senhor, em novo discurso feito para empresários, desta feita no Fórum de Investimentos Brasil 2017, apontando que não há plano “B” para o Brasil no que tange ao cenário político, reiterou que o governo continuaria comprometido com as reformas trabalhista e previdenciária7.

No mesmo evento, acompanhando o chefe do Executivo, compareceram o Presidente do Senado Federal Eunício de Oliveira e o Presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia, sendo que este último, após defender a posição, que pode ser lida como um apelo ou uma proposta de ajuste de interesses, de que o Brasil não precisava de mudança na Presidência da República, deixou bastante claro que a Câmara dos Deputados está comprometida com a agenda do mercado financeiro8.

E quando a crise política chegou ao ponto do insustentável, já tendo como certa a denúncia do Presidente pelo Procurador Geral da República, o governo, com

2 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880028-para-60-dos-brasileiros-novas- -leis-trabalhistas-beneficiam-os-patroes.shtml>.

3 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880026-71-dos-brasileiros-sao-contra- -reforma-da-previdencia-mostra-datafolha.shtml>.

4 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/05/1880242-dores-da-democracia.shtml>.5 Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-reforma-trabalhista-ja-era>.6 Disponível em: <http://epocanegocios.globo.com/Brasil/noticia/2017/05/temer-avalia-em-reuniao-com-em-

-presarios-que-congresso-continua-trabalhando.html>.7 Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,se-de-fato-nos-queremos-futuro-melhor-nao-

-ha-plano-b-diz-temer,70001818812>.8 Disponível em: <http://www.valor.com.br/politica/4985710/agenda-da-camara-e-do-mercado-sustenta-rodrigo-

-maia>.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA .............................................................................................................13

o objetivo claro de ganhar uma sobrevida, veio novamente a público para anunciar que dará prioridade à aprovação da reforma trabalhista no Senado antes de receber a denúncia9.

Está mais do que evidente, portanto, que, para levar adiante a promessa feita ao setor econômico, instaurou-se um autêntico Estado de exceção no Brasil, o que, por outro lado, gera uma inquestionável ilegitimidade de todo esse processo legis-lativo, maculando, pois, a validade jurídica de eventual lei que dele advenha, isto, é claro, se preservados os marcos teóricos e institucionais do Estado Democrático de Direito.

E, uma vez que se trata de direitos trabalhistas, a ilegitimidade em questão é ainda mais notória, pois que ultrapassa os limites internos.

Com efeito, como o capitalismo se desenvolve mundialmente, há um marco regulatório internacional visando à preservação de patamares mínimos de explora-ção do trabalho para impedir uma concorrência destrutiva entre os diversos países.

Além disso, e mais importante, o fundamento básico de legitimidade da le-gislação do trabalho, reconhecido no Tratado de Versalhes (1919), na parte em que se tratou da constituição da Organização Internacional do Trabalho – OIT, é o do diálogo entre representantes do Estado, do capital e do trabalho, garantindo-se, pois, a participação direta dos trabalhadores na elaboração da regulamentação.

A participação atuante dos trabalhadores na formulação dos novos arranjos sociais demonstra, claramente, o reconhecimento da importância dos trabalhadores para o desenvolvimento do modelo capitalista de produção.

Essa característica participativa da legislação do trabalho representa, inclusi-ve, o ponto básico na formação das democracias sociais. A abertura dada à partici-pação direta dos trabalhadores na formulação das normas jurídicas para a solução dos problemas relativos à relação capital-trabalho representa, por si, uma reviravol-ta na história da humanidade no que se refere ao exercício concreto da ideia demo-crática. Os trabalhadores, que durante muito tempo foram excluídos do conceito de cidadania, como se verificou por ocasião da própria Revolução Francesa, foram, então, ao final da Primeira Grande Guerra, dentro da lógica de um pacto, integrados ao centro de positivação do poder.

É bastante relevante verificar que à época sequer havia, em muitos países, o direito amplo de voto ou era uma experiência recente, fruto da luta operária, ou ainda estava em construção ou para ser construído. Na Alemanha e na Áustria, o sufrágio universal completo, sem restrições e incluindo as mulheres, só foi instituído em 1919 (na Alemanha, para os homens acima de 25 anos, em 1867 e na Áustria, para os homens acima de 24 anos, em 1907); na Bélgica isso se concretizou em 1948 (para os homens desde 1894); no Canadá, em 1921 (para os homens, com

9 Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2017/06/09/temer-prioriza-reforma-tra-balhista-antes-de-denuncia-da-pgr-previdencia-fica-para-depois.htm>.

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restrições, desde 1888); nos EUA, em 1920 (sendo que desde 1800, o sufrágio uni-versal já era previsto, em todos os Estados, para homens adultos brancos, e a partir de 1828 também para homens adultos negros); na França, em 1945; no Japão, em 1946 (para os homens, desde 1925); na Inglaterra, em 1928 (sendo que o sufrágio universal para os homens acima de 21 anos foi fixado em 1918 e para as mulheres, no mesmo ano, a idade foi fixada em 30 anos, com redução para 21 anos apenas em 1928); e na Suécia, em 1921 (para os homens, com 24 anos desde 1909, com redução para 23 anos, em 1921)10.

Efeito político sintomático da participação dos trabalhadores na guerra veri-ficou-se na Itália, em 1919, quando o sufrágio universal masculino foi estabelecido para maiores de 21 anos e para os homens maiores de 18 anos que tivessem servido na guerra. Para as mulheres, o sufrágio universal foi instituído somente em 1945.

Como se vê, a experiência democrática foi fruto direto da organização polí-tica dos trabalhadores e, neste sentido, a sociedade em geral deve muito mais aos movimentos trabalhistas do que ao mero espírito libertário dos ideais burgueses, que, em verdade, limitaram a participação política a uma classe determinada de pessoas. Na França, berço da ordem liberal, por exemplo, como visto, essa restrição à democracia restou clara na própria Declaração de 1789, quando a participação política foi restrita aos “cidadãos franceses” com idade acima de 25 anos e que pudessem pagar um imposto direto equivalente a três dias de trabalho para terem o direito ao voto, havendo, ainda, os “grandes eleitores” para os quais o imposto direto era equivalente a dez dias de trabalho. O sufrágio universal masculino foi instituído em 1815, mas com exclusão expressa dos operários.

Resta evidente, portanto, que a “reforma” trabalhista que se tenta emplacar no Brasil, elaborada sob coerção econômica e à sorrelfa por um setor específico da sociedade, impulsionada por meio de acordos elaborados entre representantes do Executivo, do Legislativo e do capital, buscando, unicamente, precarizar as condi-ções de trabalho para possibilitar uma maior exploração do trabalho humano, sem qualquer tipo de diálogo com os trabalhadores e os profissionais ligados ao mundo do trabalho, não possui qualquer lastro de legitimidade e poderá, inclusive, caso aprovada, ser denunciada em Cortes internacionais.

Essa “reforma”, vale repetir, não é meramente uma adaptação aos ditos “no-vos tempos”. Trata-se, em verdade, de uma alteração profunda da correlação entre o capital e o trabalho no Brasil, modificando mais de 200 comandos regulatórios, sendo que todos, precisamente todos, atendem aos interesses econômicos, o que fere, explicitamente, o pacto internacional da regulação trabalhista, o ajuste consti-tucional nacional e a tradição jurídica trabalhista, assim como a diversos preceitos ligados aos Direitos Humanos.

10 Fonte: Leex-Iuperj. Disponível em: <http://www.candidomendes.br/leex/Inter/Cronolog1.htm>. Acesso em: 14 fev. 2011.

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Assim, a grande dificuldade que se vislumbra para que essa reforma atinja os seus objetivos é a mesma que se verificou na França ocupada durante o Estado de exceção, que é a de encontrar juízes dispostos a aplicar uma lei ilegítima, in-constitucional, que fere as tradições jurídicas trabalhistas e que despreza o pacto da consagração dos Direitos Humanos.

É verdade que a própria “reforma” projeta a minimização desse problema por meio da obstrução do acesso à justiça, da regulação de institutos de quitação extrajudicial, do incentivo à arbitragem e da restrição da atuação jurisprudencial do TST, que se veria quase impedido de editar novas súmulas, uma vez que a “reforma” busca transformar em lei quase todos os entendimentos jurídicos empresariais.

O problema é que mesmo esses mecanismos podem ter sua validade judi-cialmente discutida e, desse modo, persiste o problema de se manter sob controle o momento da aplicação da lei.

Mas o desafio dos autores e atores da “reforma” é bem mais complexo do que aquele verificado no caso franco-alemão, pois o que se pretendeu naquela situa- ção foi o sacrifício de seis vidas e isso poderia ser feito, em dois dias, por atuação de um único juiz, cuidadosamente escolhido, atuando em uma Corte especialmente criada para tanto. Já no caso brasileiro atual, o que se almeja é uma generalização de condutas nas relações de trabalho e na atuação sindical, o que, dentro do pres-suposto econômico da tal segurança jurídica, requereria uma submissão quase unâ-nime de mais de 3.000 juízes e juízas do trabalho, o que bem se sabe, conhecendo a formação e o comprometimento social desses profissionais de todo o corpo de profissionais que atuam na Justiça do Trabalho, incluindo servidores e servidoras, advogadas e advogados, procuradoras e procuradores do trabalho, é uma tarefa irrealizável.

Claro que passa pela cabeça dos elaboradores do desmonte trabalhista a criação de uma Seção Especial de Justiça para a aplicação da lei da “reforma”, mas para isso o Estado de exceção não seria o bastante.

Então, se é bem maior o desafio imposto àqueles que lançaram todas as suas fichas na “reforma” trabalhista, maiores também são os riscos a que estão expostos todos os cidadãos, pois, não querendo deixar cair por terra os esforços empreen-didos até aqui, se conceba a possibilidade de ultrapassar todo e qualquer limite e com isso, sem que seja viável a estratégia de cooptação, se passe a um estágio de perseguição e destruição pessoal de todos os Magistrados e Magistradas que não renunciam ao seu dever institucional de fazer valer a ordem jurídica a partir dos pilares constitucionais e dos tratados internacionais de Direitos Humanos.

Mas pode ser também que se perceba o absurdo de se destruírem as bases do Estado Social Democrático de Direito para a satisfação de interesses pessoais tra-vestidos de preocupações econômicas sistêmicas, que de fato não existem no caso, pois a destruição de Direitos Sociais mais desatende aos interesses organizacionais do capitalismo do que o inverso, e se passe ao momento de recobrar a relevância

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do pacto humanitário, da recomposição da ordem democrática e do respeito às instituições, às leis, à Constituição Federal e aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos, que são fundamentais para que se dê continuidade à grande obra huma-na da eliminação das desigualdades e da superação das diversas formas de opressão e de discriminação.

Lembre-se que a tarefa brasileira na efetivação dos Direitos Sociais está ape-nas no começo.

E não se esqueça de que no autoritarismo qualquer um pode ser vítima. Por exemplo, no Brasil, em abril de 1969, com apoio no AI-5, o governo do Presidente Costa e Silva publicou uma lista de professores da Universidade de São Paulo consi-derados “subversivos” e que por conta disso foram aposentados compulsoriamente. Estavam dentre eles: Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, Elza Salvatori, Bento Prado Almeida Ferraz Jr., Emília Viotti da Costa, Luiz Hilde-brando Pereira da Silva, Isaías Raw, José Arthur Giannotti, Mário Schenberg, Paulo Alpheu Monteiro Duarte, João Batista Villanova Artigas, Jon Andoni Vergareche Maitrejean, Paulo Mendes da Rocha e Paul Singer, destacando-se os casos de Caio Prado Jr., que foi incluído na lista de aposentadorias compulsórias mesmo sem ainda ser professor da Universidade, tendo apenas o título de livre-docente, obtido junto à Faculdade de Direito, e dos professores Rodrigo Brotero Lefèvre e Sérgio Ferro, que ficaram arbitrariamente presos por um ano e, após liberados, em 2 de dezembro de 1971, não foram mais inscritos no programa de ensino do ano de 1972, na FAU-USP. Ou seja, não foram “aposentados” nem tiveram aulas atribuídas11.

O certo é que, como já aprendemos bem a lição de quanto os regimes dita-toriais destroem projetos de vida, os autores do Estado de exceção da reforma tra-balhista não terão à disposição uma Seção Especial de Justiça para chamar de sua!

11 Disponível em: <http://blogdaboitempo.com.br/2015/06/23/a-fau-usp-e-a-ditadura-militar/>. Acesso em: 16 jul. 2015.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Contribuição Sindical e a Reforma Trabalhista

SERgIO PInTO MARTInSDesembargador do TRT da 2ª Região, Professor Titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da USP.

A contribuição sindical era definida como “a prestação pecuniária, compul-sória, tendo por finalidade o custeio de atividades essenciais do sindicato e outras previstas em lei”1. Ela tinha natureza tributária, pois era fixada em lei e uma parte dela era destinada à Conta Especial de Emprego e Salário (art. 589, I, d, II, e, da CLT). Era considerada contribuição social, de interesse de categorias econômicas e profissionais (art. 149 da Constituição), pois era instituída por lei federal2.

O texto do inciso IV do art. 8º da Constituição está assim redigido: “A assem-bleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindi-cal respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei”. Nosso sistema de receita sindical ainda é, portanto, daqueles em que as contribuições sindicais são asseguradas pelo Estado3, principalmente no que diz respeito à contribuição prevista em lei, que é a sindical, pois no regime corporativista era necessário que o Estado assegurasse as receitas sindicais, justamente porque o sindicato era a longa manus daquele.

A contribuição confederativa não eliminou, todavia, a contribuição sindical4. A Constituição, para o caso vertente, prevê duas contribuições. Ao utilizar a expres-são “independentemente da contribuição prevista em lei” na parte final do inciso IV do art. 8º, o constituinte ressalvou a existência da contribuição sindical, que é a prevista em lei, tornando, porém, explícita a existência de uma outra contribuição destinada ao custeio do sistema confederativo: a contribuição confederativa. Assim, a Constituição de 1988 prevê uma nova contribuição que passa a ser devida ao sin-dicato para o custeio do sistema confederativo, independentemente da contribuição prevista em lei, que, hoje, é a contribuição sindical.

1 MARTINS, Sergio Pinto. Contribuições sindicais. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 43.2 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 1104.3 PERA, Giuseppe. Dallo stato corporativo alla libertá sindicale. Roma: Franco Angeli, [s.d.]. p. 15.4 A jurisprudência também entendeu da mesma forma: Ac. da SDC do TST, RO DC 71.540/93.5, J. 15.12.1993,

Rel. Min. Marcelo Pimentel, DJU I 18.02.1994, p. 1882/3; TJDFT, 3ª T.Cív., Ac. 28.201, J. 13.12.1993, Rel. Des. Estevam Maia, DJU 3 13.04.1994, p. 3759.

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Nas discussões da Assembleia Nacional Constituinte que deram origem à Constituição de 1988, verifica-se que havia interesse de certos grupos em extinguir a contribuição sindical. No entanto, o inciso IV do art. 8º da Lei Maior acabou tra-tando de uma contribuição prevista em lei, que vem a ser justamente a contribuição sindical. O exame do citado preceito constitucional revela que o legislador consti-tuinte pretendia manter a contribuição sindical. Esclarece Celso Bastos que

uma interpretação otimista poderia vislumbrar aí uma tímida tentativa de preparar o terreno para uma supressão futura do próprio imposto sindical. Na medida em que funcione a contento o sistema voluntário de financiamento, ficará muito difícil às li-deranças sindicais tentarem legitimar a atual cobrança compulsória. Parece ser, pois, uma solução intermediária, com propósitos de ganhar tempo, inclusive de molde a propiciar ao sindicalismo ocasião para adaptar-se à nova sistemática.5

Isso mostra que foi interesse do constituinte prever a existência de duas con-tribuições no inciso IV do art. 8º da Constituição: uma, a sindical; a outra, a con-federativa6. O § 2º do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) determinou que, “até ulterior disposição legal, a cobrança das contribuições para o custeio das atividades dos sindicatos rurais será feita juntamente com o im-posto territorial rural, pelo mesmo órgão arrecadador”.

A contribuição sindical, entretanto, é um resquício do corporativismo de Getúlio Vargas7. Permite a organização e a manutenção de sindicatos sem a menor autenticidade, que não prestam e não têm interesse em prestar serviços aos associa-dos, apenas na manutenção da direção por certas pessoas com o objetivo de obter estabilidade no emprego. Não há necessidade de prestar serviços ou de conseguir associados para o sindicato, pois a contribuição sindical já custeia todas as suas despesas, ainda havendo sobras. É desnecessário aumentar o quadro de associados da agremiação, porque, caso contrário, haverá outras pessoas tentando participar da diretoria, o que não interessa aos pelegos e àqueles que pretendem se perpetuar no poder sindical8. Enquanto existir a contribuição sindical compulsória, decorrente de lei, que independe da vontade da pessoa de pagá-la ou não, não se estará falan-do em liberdade sindical, já que até mesmo os não sindicalizados são obrigados a pagar tal exação.

O Projeto de Lei nº 3.669/1989 pretendeu extinguir a contribuição sindical, sendo aprovado na Câmara dos Deputados, tendo por base que, a partir do primeiro

5 BASTOS, Celso; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, v. 2, 1989. p. 520.

6 Octavio Bueno Magano também entende que o constituinte cuidou de duas contribuições no inciso IV do art. 8º da Constituição (Contribuição confederativa. In: Política do trabalho, São Paulo: LTr, 1992. p. 91).

7 Certos autores criticam o nosso sistema sindical, por ainda ser um sistema corporativo, em que o Estado tudo prevê, inclusive impondo contribuições, razão pela qual Guido Zangari coloca em dúvida a condição do Brasil como país democrático (Diritto sindacale comparato del paesi ibero-americani. Milano: Giuffré, 1990. p. 189).

8 Suely Caldas mostra o caso de Sindicato de cidade do Rio de Janeiro, em que a Presidente do Sindicato está no cargo há 12 anos, recebe R$ 50.000,00 mensais e, ainda, emprega o filho como vice-presidente com salário de R$ 21.000,00 (Sindicatos precisam mudar. O Estado de São Paulo, 7 de janeiro de 2017, p. B2).

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dia do exercício seguinte ao da publicação da lei, seria feita uma redução progres-siva da citada exigência, da seguinte forma: a) 30% no primeiro ano; b) 60% no se-gundo ano; c) extinção total no terceiro ano. A ideia era que a contribuição sindical fosse completamente extinta em 1996.

O Governo do Presidente Fernando Collor também pretendia extinguir a contribuição sindical por meio das Medidas Provisórias nºs 215, de 30 de agosto de 1990, reeditada sob nº 236, de 28 de setembro de 1990; 258, de 31 de outubro de 1990 e 275, de 30 de novembro de 1990, que não foram convertidas em lei. A Medida Provisória nº 275 foi apreciada pelo Congresso Nacional. O relator, Depu-tado Mario Lima, ponderou que “a contribuição sindical compulsória é inteiramente incompatível com o conceito de liberdade sindical consagrado pelo texto consti-tucional brasileiro”9. O referido relator, após mencionar a crise financeira do país, concluiu ser o caso da extinção progressiva da contribuição sindical, acolhendo emenda aditiva apresentada pelo Deputado Euclides Scalco10. O Congresso Nacio-nal aprovou, então, o Projeto de Lei de Conversão nº 58/1990, estabelecendo a ex-tinção gradativa da contribuição em comentário em cinco anos. Esse projeto de lei foi, porém, vetado pelo Presidente da República. A Mensagem de nº 2211, de 1991, que apresenta as razões do veto presidencial, esclarece que a “contribuição sindical obrigatória onera indiscriminadamente os trabalhadores, bem como as empresas; conspira para a modernização das relações de trabalho no País; vulnera o princípio da liberdade sindical, derroga a vedação do Poder Público de interferir na organiza-ção sindical”12. Finalizando, a mensagem expressa que “o adiamento da extinção da contribuição sindical justifica o veto por contrariedade do interesse público”13. Ao que se tem notícia, o veto presidencial não foi, contudo, objeto de apreciação pelo Congresso, estando em vigor os arts. 578 a 610 da CLT.

O inciso IV do art. 8º da Constituição de 1988 recepcionou os arts. 578 a 610 da CLT, justamente a contribuição prevista em lei.

A reforma trabalhista implementada pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, alterou a redação dos arts. 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da CLT, exi-gindo autorização do empregado para que sejam feitos descontos da contribuição sindical no salário do empregado. Tornou, portanto, a contribuição sindical facul-tativa. Sob esse aspecto, então, não tem natureza tributária, mas uma contribuição facultativa, que paga quem quiser.

Sob certo aspecto, o momento foi adequado, pois os sindicatos de empre-gados e de empregadores já receberam a contribuição sindical do ano de 2017. A contribuição sindical incide sobre um dia de salário por ano (art. 580, I, da CLT). No ano de 2017, a grande maioria dos empregados já teve o desconto em março e

9 Informativo Dinâmico IOB, nº 7, janeiro de 1991, p. 108. 10 Idem, p. 107. 11 Publicada no Diário Oficial da União de 10 de janeiro de 1991, p. 595.12 Informativo Dinâmico IOB, nº 7, p. 107.13 Idem, p. 107.

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foi feito o recolhimento em abril (arts. 582 e 583 da CLT). Em relação aos emprega-dores, ela incide sobre capital registrado na Junta Comercial e é recolhida no mês de janeiro (art. 587 da CLT). Caso a contribuição sindical tivesse sido revogada no começo do ano, traria implicações no próprio exercício para a sobrevivência dos sindicatos, que ficariam privados de receita de imediato no curso do ano.

Para que a Convenção nº 87 da OIT possa ser ratificada pelo Brasil, é preciso a alteração no art. 8º da Constituição, das regras referentes a sindicato único, contri-buição sindical obrigatória, sindicato por categoria – conceitos esses não admitidos para uma plena liberdade sindical.

A Comissão de Peritos da OIT entende que, havendo imposição de contribui-ção sindical obrigatória, ocorrerá violação da Convenção nº 87 da OIT14 pelo fato de a pessoa ficar obrigada, de maneira indireta, a pagar compulsoriamente valores ao sindicato, sem ser a este filiada.

O § 14 da Recomendação nº 143 da OIT, de 1971, dispõe que, “na falta de outros meios de arrecadação das cotas sindicais, deveria ser permitido aos represen-tantes dos trabalhadores, devidamente autorizados pelo sindicato, cobrar periodica-mente as cotas sindicais nos locais da empresa”.

O Verbete nº 227 do Comitê Central de Liberdade Sindical da OIT esclarece que

a faculdade de impor obrigatoriamente a todos os trabalhadores da categoria profissio-nal interessada o pagamento de contribuição ao único sindicato... não é incompatível com o princípio de que os trabalhadores devem ter o direito de filiar-se às organiza-ções que estimem convenientes. Em tais circunstâncias, a obrigação legal de pagar cotizações ao monopólio sindical, estejam ou não os trabalhadores filiados a ele, representa uma nova consagração e consolidação do dito monopólio.15

A OIT admite apenas que haja a estipulação de uma contribuição de solida-riedade, por meio de convenção coletiva que a prever, em função da aplicação erga omnes de suas vantagens a toda a categoria, sendo paga exclusivamente pelos não associados16. Esse sistema não está coberto por normas internacionais, não sendo, porém, considerado incompatível com os princípios da liberdade sindical. Mostra o Verbete nº 324 do Comitê de Liberdade Sindical que o pagamento de uma quota de solidariedade estipulada em lei ou em convenção coletiva ajustada pelo sindicato, a qual seria paga exclusivamente pelos não associados, como condição para que te-nham as vantagens estabelecidas no instrumento coletivo, não contraria o princípio da liberdade sindical17; seu desconto, contudo, não pode ser superior a dois terços do valor devido pelos associados.

14 CÓRDOVA, Efrén. Op. cit., p. 37. 15 Comitê Central de Liberdade Sindical. 3. ed. Genebra: OIT, 1985. p. 49. 16 Recompilación de Decisiones del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración da OIT.

Genebra: OIT, verbete n. 112, 1976. p. 44/5. 17 Comitê de Liberdade Sindical. 3. ed. Genebra: OIT, 1985. p. 69/70.

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A contribuição negocial, quando instituída por lei, terá natureza privada. Não há nenhuma parte da contribuição que irá para a Conta de Emprego e Salário (art. 589 da CLT), como ocorre com a contribuição sindical. Logo, a contribuição negocial não se enquadra na previsão do art. 149 da Constituição, que trata da con-tribuição social estabelecida pela União.

A prerrogativa da fixação é da assembleia geral do sindicato, e não de outro órgão da agremiação. Nota-se, por conseguinte, que a federação, a confederação ou a central sindical não poderão fixá-la, pois não têm como órgão a assembleia geral, mas apenas a diretoria, o conselho de representantes e o conselho fiscal. Dessa forma, a contribuição negocial só poderá ser fixada pelo órgão sindical de primeiro grau, que é o sindicato, pois é o único que tem assembleia geral. Só, portanto, a assembleia geral do sindicato poderá fixar a contribuição negocial, salvo no caso em que não houver sindicato organizado no local, quando competirá à federação a exigência da contribuição. Não existindo federação, caberá à confederação a exi-gência da contribuição negocial .

Será vedado às assembleias gerais fixarem, v.g., contribuição diferenciada para associados e não associados, pois iria ferir o caput do art. 5º da Lei Fundamen-tal. É de se destacar que o fato de se impor contribuição mais elevada para os não associados implica uma forma compulsória de fazê-los associar-se ao sindicato, o que é defeso pelo inciso V do art. 8º do Estatuto Supremo.

Não poderá a fixação ser feita ou estabelecida em dissídio coletivo, pois o § 2º do art. 114 da Constituição não dá tal competência à Justiça do Trabalho para esse fim, porque se trata de uma questão entre a entidade sindical e os seus associa-dos, não dizendo respeito às empresas e seus empregados, estando, portanto, fora do alcance da sentença normativa, mesmo que a assembleia geral do sindicato te-nha referendado a citada contribuição. Faz referência, ainda, a Lei Maior a dissídio coletivo de natureza econômica, que não pode fixar contribuição. Assim, a fixação da contribuição negocial deve ser determinada em assembleia geral e não pode ser postulada na petição inicial do dissídio coletivo. O mesmo pode-se dizer quanto à inclusão de cláusula de contribuição negocial em dissídio coletivo que diga respeito às entidades de empregadores, pois a relação seria entre sindicato e empresa, não se tratando da criação de normas e condições de trabalho, mesmo porque não haveria o repasse da contribuição, como ocorre com a contribuição do empregado que lhe é descontada e recolhida pelo empregador. A contribuição da empresa não pode ser descontada em folha, pela inexistência desta. Não se trata, assim, de um conflito coletivo típico. Logo, deve ser solucionada no âmbito interno do sindicato, pois se trata de questão interna corporis, e não por meio de sentença normativa. As nor-mas coletivas devem conter cláusulas normativas e/ou obrigacionais. A contribui-ção negocial, contudo, não é uma cláusula normativa, nem obrigacional. Logo, há impossibilidade jurídica de se constar cláusula a respeito de contribuição negocial na sentença normativa, mesmo que em acordo celebrado em dissídio coletivo, pois, se a contribuição é fixada em assembleia geral, o exercício do poder normativo da Justiça do Trabalho fica afastado. Se por algum motivo, contudo, a contribuição

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negocial for prevista em acordo em dissídio coletivo – ainda que inconstitucional tal orientação –, transitada em julgado a sentença normativa, será competente a Justiça do Trabalho para apreciar o cumprimento da referida decisão. O TST vem evitando, contudo, que aconteça tal fato quando há recurso ordinário da Procuradoria do Tra-balho quanto a esse aspecto. A Procuradoria Regional do Trabalho tem legitimidade para recorrer da decisão normativa homologatória de acordo que objetiva a exclu-são de cláusula que infringe o ordenamento jurídico, principalmente no tocante à cláusula instituidora de contribuição negocial. Em se tratando de questão que diz respeito à relação entre associado e o sindicato da categoria, não há necessidade de decisão normativa sobre o tema.

Os sindicatos não querem perder receita sindical, principalmente os de em-pregadores, que têm de manter suas sedes e outros custos, além de certos dirigentes que querem se perpetuar na direção sindical.

A Lei nº 13.467/2017 entrará em vigor 120 dias depois da publicação no Diário Oficial, o que foi feito em 14 de julho de 2017.

A partir da sua vigência, não mais poderá ser cobrada a contribuição sindical de forma compulsória.

Não poderá, portanto, ser cobrada a contribuição sindical de forma propor-cional em 2018, pois ela não mais estará em vigor nessa data. Não existirá lei exi-gindo de forma compulsória a contribuição sindical para 2018, pois a contribuição será facultativa, dependendo da vontade de cada um em autorizá-la.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017): Modificações Quanto ao Regime das Férias na Relação de Emprego

guSTAVO FILIPE BARBOSA gARCIALivre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Especialista em Direito pela Universidad de Sevilla, Pós-Doutorado em Direito pela Universidad de Sevilla, Membro Pesquisador do IBDSCJ, Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Titular da Cadeira 27, Profes-sor Universitário em Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito, Advogado e Consultor Jurídico, Ex-Juiz do Trabalho das 2ª, 8ª e 24ª Regiões, Ex-Procurador do Trabalho do Ministério Público da União, Ex-Auditor-Fiscal do Trabalho.

A Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, com início de vigência depois de 120 dias de sua publicação oficial (art. 6º), ocorrida em 14.07.2017, alterou a Con-solidação das Leis do Trabalho e as Leis nºs 6.019/1974, 8.036/1990 e 8.212/1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho.

No presente texto, propõe-se examinar as principais modificações voltadas ao regime das férias na relação de emprego.

As férias têm o objetivo de proporcionar período mais extenso de descanso ao empregado, de modo a evitar problemas de saúde decorrentes do cansaço ex-cessivo1.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, XVII, assegura o direito ao “gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal”.

O período aquisitivo de férias é de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, como estabelece o art. 130 da CLT.

Nesse enfoque, todo empregado tem direito anualmente ao gozo de um pe-ríodo de férias, sem prejuízo da remuneração (art. 129 da CLT).

Após a aquisição do direito às férias, elas devem ser concedidas pelo em-pregador, respeitando o período concessivo, que é de 12 (doze) meses seguintes ao término do período aquisitivo.

1 Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 1061.

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Nesse sentido, as férias devem ser concedidas por ato do empregador, em um só período, nos 12 (doze) meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito (art. 134 da CLT).

Conforme o art. 134, § 1º, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, desde que haja concordância do empregado, as férias podem ser usufruídas em até 3 três períodos, sendo que um deles não pode ser inferior a 14 (quatorze) dias corridos e os demais não podem ser inferiores a 5 (cinco) dias corridos, cada um.

Essa divisão do período de gozo das férias, portanto, exige a anuência do empregado.

Em termos práticos, entretanto, sabendo-se que o empregado presta serviços de forma subordinada ao empregador, nem sempre a vontade daquele tem como ser manifestada de forma autêntica e hígida, mesmo porque normalmente precisa do emprego para manter a própria subsistência e de sua família.

Quanto às férias individuais, o art. 134, § 1º, da CLT, na redação decorrente do Decreto-Lei nº 1.535/1977, prevê que somente em casos excepcionais serão as férias concedidas em 2 (dois) períodos, um dos quais não pode ser inferior a 10 (dez) dias corridos.

Especificamente quanto às férias coletivas, o art. 139, § 1º, da CLT, o qual não é modificado pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que as férias podem ser gozadas em 2 (dois) períodos anuais, desde que nenhum deles seja inferior a 10 (dez) dias corridos.

Cabe esclarecer que podem ser concedidas férias coletivas a todos os empre-gados de uma empresa ou de determinados estabelecimentos ou setores da empresa (art. 139 da CLT).

Como se pode notar, passa-se a autorizar, desde que haja anuência do em-pregado, o parcelamento do gozo das férias individuais em até 3 (três) períodos.

Nesse caso, um dos períodos não pode ser inferior a 14 (quatorze) dias corri-dos e os demais não podem ser inferiores a 5 (cinco) dias corridos.

Exemplificando, poderíamos passar a ter férias de 30 dias fracionadas da seguinte forma: 14 dias, 8 dias e 8 dias.

Não obstante, deve-se registrar que nem sempre o empregado tem direito a 30 dias de férias. Nesse enfoque, segundo o art. 130 da CLT, após cada período de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte proporção: 30 dias corridos, quando não houver faltado ao serviço mais de 5 vezes; 24 dias corridos, quando houver tido de 6 a 14 faltas; 18 dias corridos, quando houver tido de 15 a 23 faltas; 12 dias corridos, quando houver tido de 24 a 32 faltas.

Como se pode notar, apenas quando o período de férias é de 30 ou 24 dias é que se permite o parcelamento em três períodos, pois um dos períodos não pode

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ser inferior a 14 (quatorze) dias corridos e os demais não podem ser inferiores a 5 (cinco) dias corridos.

Os períodos de férias mais curtos são passíveis de crítica, pois dificilmente irão atender à finalidade social do direito em questão, que seria de possibilitar o efetivo descanso ao empregado.

Cabe lembrar que a Convenção nº 132 da Organização Internacional do Trabalho, sobre férias anuais remuneradas, de 1970, foi aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 47/1981 e promulgada pelo Decreto nº 3.197/1999.

O art. 8º da referida Convenção da OIT dispõe que o fracionamento do perío-do de férias anuais remuneradas pode ser autorizado pela autoridade competente ou pelo órgão apropriado de cada país. Além disso, salvo estipulação em contrário contida em acordo que vincule o empregador e a pessoa empregada, e desde que a duração do serviço dessa pessoa lhe dê direito a tal período de férias, em uma das frações do referido período deve corresponder pelo menos a duas semanas de trabalho ininterrupto.

O art. 134, § 2º, da CLT, o qual prevê que aos menores de 18 (dezoito) anos e aos maiores de 50 (cinquenta) anos de idade as férias são sempre concedidas de uma só vez, é revogado pelo art. 5º, I, f, da Lei nº 13.467/2017.

Passa a ser vedado o início das férias no período de 2 (dois) dias que antece-de feriado ou dia de repouso semanal remunerado (art. 134, § 3º, acrescentado pela Lei nº 13.467/2017).

Essa previsão tem como objetivo não prejudicar o empregado quanto ao gozo das férias individuais, evitando que estas iniciem no período de 2 (dois) dias antes de feriado ou repouso semana remunerado, pois nesses dias o empregado já estaria descansando de forma remunerada.

Ainda assim, evidentemente, admite-se que o início das férias ocorra em período posterior ao feriado ou dia de repouso semana remunerado.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

A Dispensa Coletiva na Lei nº 13.467/2017 da Reforma Trabalhista

EnOQuE RIBEIRO DOS SAnTOSProfessor Associado de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da USP, Desembargador do Trabalho do TRT da 1ª Região, Mestre em Direito Civil (Direito das Obrigações) pela Unesp, Doutor e Livre Docente em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP.

SUMÁRIO: Introdução; I – A dispensa coletiva no Brasil até o advento da novel reforma trabalhista; II – A dispensa coletiva nos países da União Europeia; III – Alteração na dispensa coletiva com o advento da nova CLT (Lei nº 13.467/2017); Conclusão.

INTRODUÇÃO

A reforma trabalhista, objeto da Lei nº 13.467/2017, recentemente promulga-da pelo Presidente da República, promoveu sensíveis alterações na CLT, e em várias situações, como ocorreu no objeto deste artigo, que trata da dispensa coletiva de trabalhadores pelos empregadores, de forma frontalmente prejudicial aos direitos dos trabalhadores e em colisão com a legislação mais moderna dos países de eco-nomia avançada.

I – A DISPENSA COLETIVA NO BRASIL ATÉ O ADVENTO DA NOVEL REFORMA TRABALHISTA

Antes de avançarmos no assunto, importante ressaltar a diferença fundamen-tal entre a dispensa individual e a dispensa coletiva.

A dispensa individual é instituto do direito individual do trabalho, e é a que tem mais incidência em nosso país. O Brasil, no tópico, adota a doutrina do employment at will, que vigora também nos Estados Unidos da América.

Por essa doutrina não existe qualquer óbice à dispensa do trabalhador, mes-mo sem motivação. Prevalece algo semelhante à “denúncia vazia” que vige nos contratos de locação, pois não existe qualquer necessidade de fundamentação ou motivação na dispensa individual, bastando o pagamento dos consectários legais, entre eles a multa de 40% dos depósitos do FGTS.

Este tipo de dispensa do trabalhador remanesce ou nos remete aos tempos medievais ou semiprimitivos, já que totalmente divorciada dos princípios e direitos fundamentais insculpidos na Constituição Federal de 1988, entre eles o da dignida-de da pessoa humana, fundamento de validade do Estado Democrático de Direito

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(art. 1º, III), os fundamentos da soberania, cidadania, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político, bem como os objetivos fundamentais do Estado, em seu art. 3º, de I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – ga-rantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Entre os direitos fundamentais elencados no art. 5º da Constituição Federal, prevalecem: a regra de ninguém será submetido a tratamento desumano ou de-gradante (inciso III); a regra que declara invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano mate-rial ou moral decorrentes de sua violação (inciso X); as regras de que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, e de que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (incisos LIII e LIV).

Isto sem esquecer ainda dos preceitos constitucionais do art. 170 (da ordem econômica), do art. 193 (da ordem social) e dos arts. 200 e 225 (meio ambiente, inclusive o laboral).

Além desta normativa constitucional, a Constituição Federal, em seu art. 7º, I, estabelece:

I – relação de empregado protegida contra despedida1 arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei2 complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Observa-se, que apesar da disposição constitucional protetiva do emprego, a novidade jurídica que surge com a Lei da Reforma Trabalhista nos afasta, ainda mais, do necessário alinhamento aos países mais avançados democraticamente na defesa dos direitos e garantias relacionados à proteção contra a dispensa3 arbitrária ou imotivada do trabalhador.

1 Na maioria dos países da União Europeia, para cumprir a Diretiva nº 85/98/CE, de 1998, na dispensa individual, os empresários devem obedecer a um procedimento jurídico de despedimento, com ampla defesa e contraditório assegurados aos empregados, de forma a dignificar a pessoa humana, e em não incorrer em despedimento ilícito, nas palavras de Júlio Gomes (Direito do trabalho. Lisboa: Almedina, 2011. p. 972) para quem: “Teremos substituído a Inquisição medieval pelo empregador moderno e permitiremos, em homenagem ao interesse da empresa, o controlo por uma entidade privada dos vícios e das virtudes de boa parte dos cidadãos que são maioritariamente trabalhadores subordinados”.

2 Em Portugal, de acordo com João Leal Amado (Contrato do trabalho. Lisboa: Almedina, 2016. p. 320), o regime jurídico de despedimento, com fulcro na tutela da segurança no emprego, vem assentado há vários anos no conhecido tripé: 1) em primeiro lugar, na exigência de motivação do despedimento, sendo desde logo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos; 2) em segundo lugar, na processualização ou procedimentalização do despedimento, sendo que a inexistência ou nulidade do processo/procedimento disciplinar determinam a ilicitude do despedimento que, apesar disso, tenha sido proferido pela entidade empregadora; 3) em terceiro lugar, na técnica sancionatória do despedimento contra legem, designadamente através da aquisição da ideia de invalidade do despedimento, implicando, entre outras consequências, o direito à reintegração do trabalhador ilicitamente despedido”.

3 Mesmo na dispensa individual, exige-se além do procedimento prévio, com ampla defesa e contraditório, um parecer da estrutura representativa dos trabalhadores, ou seja, após a conclusão das diligências probatórias, o empregador apresenta cópia integral do processo à comissão de trabalhadores, que poderá, no prazo de

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Já a dispensa coletiva é um instituto do Direito Coletivo do Trabalho, que possui princípios, normas, institutos e instituições totalmente diversas do direito in-dividual do trabalho. Vigem nesse ramo do Direito, como objeto, os direitos difu-sos, coletivos e individuais homogêneos, e os direitos mais elevados da dignidade humana.

A presença do interesse público primário de toda a sociedade impõe a esse ramo do Direito uma proteção especial, com a efetiva e necessária participação dos legitimados ou autores ideológicos, entre eles o Ministério Público do Trabalho, neste desiderato, como gestor do microssistema de tutela coletiva e dos instrumen-tos de que dispõe para proteger os direitos sociais e indisponíveis dos trabalhadores.

Daí importante tal diferenciação entre os institutos.

No Brasil, não existe legislação própria no que respeita a dispensa coletiva de trabalhadores pelas empresas, e por longo tempo essa matéria remanesceu em um verdadeiro limbo jurídico, numa verdadeira “terra de ninguém”, até que a maté-ria foi regulamentada por decisão do colendo Tribunal Superior do Trabalho.

O caso paradigmático foi o da Embraer, em 2009, no qual o colendo Tribu-nal Superior do Trabalho fixou a tese de que a negociação coletiva é imprescindível4

cinco dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado (art. 356º, nº5, do Código do Trabalho português). A exigência de motivação do despedimento patronal em Portugal encontra guarida no art. 4º da Convenção nº 158 da OIT, de 1982, aprovada pela ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 55/1994, de 27 de agosto.

4 Vejamos decisão do colendo Tribunal Superior do Trabalho (TST) neste sentido: “Recurso ordinário em dissídio coletivo. Dispensas trabalhistas coletivas. Matéria de direito coletivo. Imperativa interveniência sindical. Restrições jurídicas às dispensas coletivas. Ordem constitucional e infraconstitucional democrática existente desde 1988. A sociedade produzida pelo sistema capitalista é, essencialmente, uma sociedade de massas. A lógica de funcionamento do sistema econômico-social induz a concentração e centralização não apenas de riquezas, mas também de comunidades, dinâmicas socioeconômicas e de problemas destas resultantes. A massificação das dinâmicas e dos problemas das pessoas e grupos sociais nas comunidades humanas, hoje, impacta de modo frontal a estrutura e o funcionamento operacional do próprio Direito. Parte significativa dos danos mais relevantes na presente sociedade e das correspondentes pretensões jurídicas têm natureza massiva. O caráter massivo de tais danos e pretensões obriga o Direito a se adequar, deslocando-se da matriz individualista de enfoque, compreensão e enfrentamento dos problemas a que tradicionalmente perfilou-se. A construção de uma matriz jurídica adequada à massividade dos danos e pretensões característicos de uma sociedade contemporânea – sem prejuízo da preservação da matriz individualista, apta a tratar os danos e pretensões de natureza estritamente atomizada – é, talvez, o desafio mais moderno proposto ao universo jurídico, e é sob esse aspecto que a questão aqui proposta será analisada. As dispensas coletivas realizadas de maneira maciça e avassaladora, somente seriam juridicamente possíveis em um campo normativo hiperindividualista, sem qualquer regulamentação social, instigador da existência de mercado hobbesiano na vida econômica, inclusive entre empresas e trabalhadores, tal como, por exemplo, respaldado por Carta Constitucional como a de 1891, já há mais um século superada no país. Na vigência da Constituição de 1988, das convenções internacionais da OIT ratificadas pelo Brasil relativas a direitos humanos e, por consequência, direitos trabalhistas, e em face da leitura atualizada da legislação infraconstitucional do país, é inevitável concluir-se pela presença de um Estado Democrático de Direito no Brasil, de um regime de império da norma jurídica (e não do poder incontrastável privado), de uma sociedade civilizada, de uma cultura de bem-estar social e respeito à dignidade dos seres humanos, tudo repelindo, imperativamente, dispensas massivas de pessoas, abalando empresa, cidade e toda uma importante região. Em consequência, fica fixada, por interpretação da ordem jurídica, a premissa de que ‘a negociação coletiva é imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores’. Dispensas coletivas trabalhistas. Efeitos jurídicos. A ordem constitucional e infraconstitucional democrática brasileira, desde a Constituição de 1988 e diplomas internacionais ratificados (Convenções OIT nºs 11, 87, 98, 135, 141 e 151, ilustrativamente), não permite o manejo meramente unilateral e potestativista das dispensas trabalhistas coletivas, por de tratar de ato/fato coletivo, inerente

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para a dispensa em massa de trabalhadores. Em outras palavras, não pode haver dispensa coletiva que não seja precedida de negociação coletiva. Estabeleceu-se, desta forma, uma linha divisória para os casos futuros.

II – A DISPENSA COLETIVA NOS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA

Em Portugal, nos termos do art. 359, nº 1, do Código do Trabalho,

considera-se despedimento coletivo a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectiva-mente de microempresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande empresa, por outro, sempre que aquele ocorrência dê lugar a encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou a redução do número de trabalhadores e seja determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos.

No que se refere aos motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, o item 2 do mesmo artigo informa que se trata de motivos definidos em moldes bastante amplos e indeterminados, que revelam a especial vocação do despedimento coleti-vo para fazer face a situações de crise da empresa que impliquem a reestruturação ou o redimensionamento desta, bem como a respectiva orientação estratégica no mercado.

Observa-se, destarte, que o despedimento coletivo é visto aos olhos dos Países-membros da União Europeia como um mecanismo de resposta a situações de crise empresarial, de forma a garantir a viabilidade econômica e financeira da empresa, ou ainda como um instrumento utilizado para prevenir a crise empresarial de sorte a assegurar que a empresa permaneça saudável e viva.

De acordo com João Leal Amado5, em Portugal, para promover o despedi-mento coletivo, as empresas devem observar um procedimento distinto das dispen-sas individuais. Assegura o autor6 que

ao direito coletivo do trabalho, e não direito individual, exigindo, por consequência, a participação do(s) respectivo(s) sindicato(s) profissional(is) obreiro(s). Regras e princípios constitucionais que determinam o respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), a valorização do trabalho e especialmente do emprego (arts. 1º, IV, 6º e 170, VIII, da CF), a subordinação da propriedade à sua função socioambiental (arts. 5º, XXIII e 170, III, da CF) e a intervenção sindical nas questões coletivas trabalhistas (art. 8º, III e VI, da CF), tudo impõe que se reconheça distinção normativa entre as dispensas meramente tópicas e individuais e as dispensas massivas, coletivas, as quais são social, econômica, familiar e comunitariamente impactantes. Nesta linha, seria inválida a dispensa coletiva enquanto não negociada com o sindicato de trabalhadores, espontaneamente ou no plano do processo judicial coletivo. A d. Maioria, contudo, decidiu apenas fixar a premissa, para casos futuros, de que ‘a negociação coletiva é imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores’, observados os fundamentos supra. Recurso ordinário a que se dá provimento parcial”. (ED-RODC 30900-12.2009.5.15.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, DJ 10.08.2009, DEJT 04.09.2009 – grifos nossos).

5 AMADO, João Leal. Contrato de trabalho. Lisboa: Almedina, 2016. p. 326-327.6 Idem, ibidem, p. 326-327. Importante destacar que Portugal, após constatar, por meio dos dados estatísticos

disponíveis, que as microempresas representavam mais de 80% de seu tecido empresarial, nelas laborando quase 30% da mão de obra assalariada naquele país, desenvolveu uma classificação tipológica das empresas laborais, promovendo uma espécie de dimensionamento do direito do trabalho, de forma a construir regimes laborais diversificados e adaptados à dimensão da empresa na qual o trabalho é prestado. O próprio Código

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o empregador que pretenda promover um despedimento coletivo deve comunicar esta intenção à estrutura representativa dos trabalhadores, nos termos do art. 360 do Código de Trabalho, seguindo-se uma fase de informações e negociação “com vista a um acordo sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que reduzam o número de trabalhadores a despedir” (art. 361 do mesmo Código de Trabalho), negociação esta em que participará o serviço competente do ministério responsável pela área laboral (art. 362).

III – ALTERAÇÃO NA DISPENSA COLETIVA COM O ADVENTO DA NOVA CLT (LEI Nº 13.467/2017)

Não obstante, agora o art. 477-A da nova CLT nos apresenta a seguinte re-dação:

Art. 477-A. As dispensas imotivadas individuais, plúrimas ou coletivas equiparam--se para todos os fins, não havendo necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação.

A redação do novo artigo equipara, para todos os fins, as dispensas indivi-duais, plúrimas e coletivas, ignorando a diferente natureza jurídica destes institutos, como já mencionado, além de afastar a necessidade de prévia negociação coletiva ou participação sindical do evento de qualquer tipo de dispensas, o que não apenas precariza e fragiliza as relações de emprego, como também não veda expressamen-te eventuais arbitrariedades do patronado.

Para além de atropelar a decisão judicial paradigmática do colendo TST, o novel art. 477-A da nova CLT também colide com a legislação correlata mais mo-derna dos Países-membros da União Europeia, como podemos inferir da Diretiva nº 98/59/CE do Conselho da União Europeia, de 20 de julho de 1998, que assim dispõe:

Art. 1º, 1. Para efeitos da aplicação da presente directiva:

a) Entende-se por “despedimentos colectivos” os despedimentos efectuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, quando o número de despedimentos abranger, segundo a escolha efectuada pelos Estados-membros:

i) ou, num período de 30 dias:

– no mínimo 10 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente mais de 20 e menos de 100,

do Trabalho português, no art. 91, distingue vários tipos de empresas laborais tendo em vista seu critério ocupacional, ou seja, o número de trabalhadores empregados. Assim, o Código do Trabalho português procede à seguinte classificação tipológica: microempresa (a que emprega menos de 10 trabalhadores); pequena empresa (a que emprega de 10 a menos de 50 trabalhadores); média empresa (a que emprega de 50 a menos de 250 trabalhadores); grande empresa (a que emprega 250 ou mais trabalhadores). Procurando minorar as previsíveis dificuldades práticas suscitadas pela aplicação desta classificação, o nº 2 do art. 100º esclarece que o número de trabalhadores será calculado com recurso à média do ano civil antecedentes, salvo no ano de início da atividade, caso em que a determinação do número de trabalhadores se reporta ao dia da ocorrência do facto que determina o respectivo regime (nº 3 do mesmo artigo).

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– no mínimo 10% do número dos trabalhadores, nos estabelecimentos que empre-guem habitualmente no mínimo 100 e menos de 300trabalhadores,

– no mínimo 30 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 300;

ii) ou, num período de 90 dias, no mínimo 20 trabalhadores, qualquer que seja o nú-mero de trabalhadores habitualmente empregados nos estabelecimentos em questão;

b) Entende-se por “representantes dos trabalhadores” os representantes dos trabalha-dores previstos pela legislação ou pela prática dos Estados-membros.

Para o cálculo do número de despedimentos previsto no primeiro parágrafo, alínea a), são equiparadas a despedimentos as cessações do contrato de trabalho por iniciativa do empregador por um ou vários motivos não inerentes à pessoa do trabalhador desde que o número de despedimentos seja, pelo menos, de cinco.

Art. 2º [...]

1. Sempre que tenciona efectuar despedimentos colectivos, a entidade patronal é obri-gada a consultar em tempo útil os representantes dos trabalhadores, com o objectivo de chegar a um acordo.

2. As consultas incidirão, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos colectivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas conse-quências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeada-mente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos.

Os Estados-membros podem prever que os representantes dos trabalhadores possam recorrer a peritos, nos termos das legislações e/ou práticas nacionais.

3. Para que os representantes dos trabalhadores possam formular propostas construti-vas, o empregador deve, em tempo útil, no decurso das consultas:

a) Facultar-lhes todas as informações necessárias; e

b) Comunicar-lhes, sempre por escrito:

i) os motivos do despedimento previsto,

ii) o número e as categorias dos trabalhadores a despedir,

iii) o número e as categorias dos trabalhadores habitualmente empregados,

iv) o período durante o qual se pretende efectuar os despedimentos,

v) os critérios a utilizar na selecção dos trabalhadores a despedir, na medida em que as leis e/ou práticas nacionais deem essa competência ao empregador,

vi) o método previsto para o cálculo de qualquer eventual indemnização de despedi-mento que não a que decorre das leis e/ou práticas nacionais.

O empregador deve remeter cópia à autoridade pública competente pelo menos dos elementos da comunicação escrita previstos nas subalíneas i) a v) da alínea b).

João Leal Amado7, no que respeita à doutrina do employment at-will, infor-ma que

7 LEAL, João amado. Contrato de trabalho. Lisboa: Almedina, 2016. p. 295.

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representa, sem dúvida, o grau máximo de flexibilidade laboral (flexibilidade contra-tual de saída). Tem, porém, o inconveniente de abrir as portas ao arbítrio patronal, ins-tituindo a precariedade como traço indelével de toda e qualquer relação de trabalho – e assim legitimando o chamado “precariado”. Com efeito, admitir o despedimento por livre decisão do empregador, sem um qualquer motivo ponderoso e comprovável a justifica-lo, seria, em retas contas, sujeitar os trabalhadores à arbitrariedade ou à per-seguição individual. Acresce que aquele doutrina do employment at-will é claramente violadora da Convenção nº 158 da OIT, ratificada pelo nosso país nos anos noventa, bem como da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, cujo art. 30º es-tabelece que todos os trabalhadores têm direito a proteção contra os despedimentos sem justa causa.

Em Portugal, a única exceção está relacionada às microempresas, cujas exi-gências procedimentais são dispensadas pela lei, requerendo apenas que o trabalha-dor seja informado do respectivo encerramento com uma determinada antecedên-cia, conforme enuncia o art. 346, nº 4, do Código do Trabalho português.

CONCLUSÃO

No momento atual, não apenas de sedimentação da quarta dimensão dos di-reitos humanos, entre eles o direito de informação, de democracia, de pluralidade, e surgimento da quinta dimensão de direitos fundamentais, relacionada aos avanços da cibernética e da informática, o Brasil, ao sancionar a Lei nº 13.467/2017, que, em seu art. 477-A, coloca no mesmo patamar institutos tão diversos e regidos por regimes jurídicos díspares – a dispensa individual, a plúrima e a coletiva –, não ape-nas se afasta dos sistemas modernos de tutela da segurança no emprego vigentes nos países de economia avançada, como se posta em sentido diametralmente oposto.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista à Luz dos Direitos Fundamentais – Análise da Lei nº 13.467, de 13 de Julho de 2017

ILSE MARCELInA BERnARDI LORAJuíza do Trabalho no Paraná, Mestre em Direito pela Unoesc.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Uma armadilha a ser evitada: precarizar em lugar de modernizar as relações trabalhistas; 2 A fundamentalidade dos direitos sociais; 3 Vinculação dos Poderes Públicos aos direi-tos fundamentais; 4 Proibição de retrocesso; 5 Dispositivos da Lei nº 13.467/2017 que afrontam os direitos fundamentais sociais e o princípio da proibição do retrocesso: dois exemplos; 5.1 Restrição do âmbito de análise, pela Justiça do Trabalho, de convenções e acordos coletivos de trabalho; 5.2 Aplicação à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas dos dispositivos da nova lei (Título ii-a); Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Em 13 de julho de 2017, foi sancionada, pelo Presidente da República, a Lei nº 13.467, publicada no Diário Oficial da União de 14.07.2017 e que entrará em vigor no prazo de cento e vinte dias após a sua publicação, ou seja, em 11 de novembro de 2017. A lei em questão estabelece a chamada reforma trabalhista, com significativo impacto no âmbito das relações de trabalho, na medida em que determina alterações profundas em institutos relevantes do Direito e do processo do trabalho.

Dentre as inúmeras inovações, foram destacadas para exame no presente estudo, por sua singular relevância, as seguintes: (1) restrição do âmbito de análise, pela Justiça do Trabalho, de convenções e acordos coletivos de trabalho; (2) estabe-lecimento de regras específicas e exclusivas para indenização dos danos extrapatri-moniais decorrentes das relações de trabalho.

Assuntos significativos são também aqueles relativos à terceirização em ati-vidades finalísticas e à prevalência do negociado sobre o legislado. Quanto à tercei-rização, anteriormente, por meio da Lei nº 13.429, vigente a contar de 31.03.2017, já haviam sido introduzidas alterações na Lei do Trabalho Temporário (Lei nº 6.019/1974), ampliando significativamente as possibilidades de terceirização dos serviços da empresa contratante. Os dois temas mencionados – terceirização e pre-valência do negociado sobre o legislado – já foram objeto de abordagem em estudo

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pretérito1. Atendida tal particularidade e diante dos limites do presente estudo, não serão nesta oportunidade examinados.

A rápida tramitação do PL 38/2017, que deu origem à Lei nº 13.467/2017, não permitiu o indispensável conhecimento prévio pela sociedade de seu teor e tampouco a reflexão adequada de parte de sindicatos de empregados e de empre-gadores, de juristas e doutrinadores, do que decorre a perplexidade que permeia a interpretação dos novos dispositivos.

Com o intuito de colaborar para que eventual leitura unicamente positivista – extremamente cômoda, na medida em que exime o jurista de se comprometer com a necessária análise abrangente, ponderada e equilibrada de cada caso – promova o distanciamento do Direito da real efetivação da justiça, preconiza-se que a lei men-cionada seja interpretada à luz dos direitos fundamentais sociais consagrados no texto constitucional, sob pena de completo e irremediável aniquilamento do arcabouço de proteção dos direitos sociais duramente conquistados ao longo de décadas.

1 UMA ARMADILHA A SER EVITADA: PRECARIZAR EM LUGAR DE MODERNIZAR AS RELAÇÕES TRABALHISTAS

Apregoa-se incessantemente que a Lei nº 13.467/2017 tem como escopo principal modernizar as relações trabalhistas. Entretanto, análise de seus disposi-tivos revela que grande parte de seu conteúdo, uma vez interpretado literalmente, pode encobrir séria e real ameaça à concretização dos direitos fundamentais do trabalhador, cuja constitucionalização, no âmbito brasileiro, somente ocorreu efeti-vamente com a Carta Magna de 1988.

O Tratado de Versalhes (1919), que pôs fim, em caráter oficial, à Primeira Guerra Mundial, promoveu a consagração dos princípios universais do direito do trabalho. Determinou também a criação da OIT – Organização Internacional do Trabalho e estabeleceu, no preâmbulo, que a “a Sociedade das Nações tem por objetivo estabelecer a paz universal e que tal paz não pode ser fundada senão sobre a base da justiça social”. A OIT, por sua vez, fomentou a ação legislativa de natu-reza internacional acerca das questões relativas ao trabalho, estabelecendo um rol de direitos do trabalhador havidos como fundamentais e obrigatórios para todos os estados signatários do Tratado.

No Brasil, consoante refere Sarlet (2013, p. 554), a Constituição Federal de 1988 foi a primeira, na história do constitucionalismo brasileiro, a estabelecer título especial para os denominados direitos e garantias fundamentais (Título II). No tópi-co, a par da consagração de direitos sociais básicos e de índole mais geral, houve previsão de vasto rol de direitos dos trabalhadores, igualmente hospedado no capí-tulo dos direitos sociais.

1 LORA, Ilse Marcelina Bernardi. A terceirização no direito do trabalho e o Projeto de Lei nº 4.330/2004. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, v. 27, p. 119-135, 2016; e A prevalência do negociado sobre o legislado na reforma trabalhista. Revista SínTESE Trabalhista e Previdenciária, v. 1, p. 19-32, 2016.

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A história, entretanto, ensina que, em ambiente de progressivo e inquietante processo de crise econômica como vive o Brasil, as primeiras providências que são tracejadas com o suposto intento de refrear a deterioração do cenário econômico--social são aquelas que afetam os trabalhadores.

Com efeito, diante de cenário de adversidade, a flexibilização é reiterada-mente apresentada como medida para estancar a crise. A flexibilização é conside-rada pela doutrina

movimento impulsionado pela ideologia neoliberal, que pretende suprimir ou rela-tivizar as normas jurídicas que garantem a proteção do empregado na relação con-tratual com o seu empregador, com vistas a “baratear” a mão de obra e o “custo” da produção, viabilizando, pretensamente, a competitividade das empresas no mercado globalizado. (Goldschmidt, 2009, p. 129)

Muitas das disposições insertas na nova lei podem ser consideradas como subproduto da flexibilização, sempre desejada e perseguida como hipotético meio de redução dos custos da produção, em especial diante das mudanças verificadas no processo produtivo. Citam-se, a propósito, além daquelas que serão aqui exa-minadas, as alterações introduzidas no Capítulo II do Título II da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas à jornada de trabalho, bem como aquelas previstas nos arts. 611-A, pertinentes ao alcance das Convenções e Acordos Coletivos de Traba-lho, que terão prevalência sobre a lei quando dispuserem sobre as matérias elenca-das nos incisos daquele artigo.

Convém rememorar que os padrões de produção capitalista foram alvo de intensas transformações a partir do final do século XIX. Ao taylorismo, que teve início a partir do último quarto do século XIX, fundamentado na divisão do trabalho em níveis (gerentes e não gerentes) e na eficiência, seguiu-se o fordismo, efetivado a contar do segundo quarto do século XX. Esse modelo estruturava-se na linha de produção em série, compartimentalização das atividades e pouca especialização. A redução da produtividade, o aumento do capital e a saturação do consumo em massa, com a consequente redução dos lucros, determinaram a crise desse padrão. O capital, então, passou a empregar a denominada reestruturação produtiva, que origina maior racionalização de máquinas e equipamentos e aumento do controle sobre o trabalho. O toyotismo reorganizou o processo de produção, exigindo traba-lhadores de alta qualificação, aptos a executar diversas funções e dispostos a sugerir medidas capazes de impulsionar o processo produtivo. Uma de suas características é “a modificação de vários aspectos do processo de produção por meio da desregu-lamentação, da fragmentação da classe trabalhadora, da precarização do emprego e do trabalho, da terceirização da força de trabalho e da ruptura do sindicalismo” (Hoffmann, 2003, p. 153).

A flexibilidade e a desregulamentação passaram a ser proclamadas como ex-pedientes indispensáveis para resolver desde a crise de empregabilidade e empregos até as dificuldades financeiras das empresas. Estas, sob o argumento de necessidade de redução de custos, lançaram mão de diversas estratégias, citando-se, a título de

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exemplo, o recurso às cooperativas de mão de obra (CLT, art. 442, parágrafo único), cujas atividades irregulares e danosas o tempo cuidou de comprovar, além da dele-gação de suas atividades, inclusive finalísticas, a terceiros.

Intimidado pelo capital, o Estado foi gradativamente reduzindo as normas de proteção, afastando-se progressivamente das relações laborais e abrindo espaço para a atividade dos sindicatos, com incontestável estímulo à negociação coletiva. No entanto, a conjuntura econômica, com destaque para o agravamento do de-semprego, determinou a perda, pelos sindicatos, de sua potencialidade de pressão e de negociação. O desamparo, determinado pela rarefação das normas estatais e pela prostração dos sindicatos, impele os trabalhadores a buscar nos direitos funda-mentais, assegurados na Constituição Federal, os meios para recompor o equilíbrio entre os seus direitos e os poderes empresariais, bem assim para estabelecer freio à opressora precarização das relações laborais.

Nesta inquietante quadra, diante do iminente risco de desarticulação dos direitos sociais dos trabalhadores penosamente conquistados, faz-se absolutamente indispensável a efetiva compreensão acerca da fundamentalidade dos direitos so-ciais, de seu caráter vinculativo e da consequente proibição do retrocesso social, instrumentos relevantes para orientar a adequada interpretação e aplicação da no-vas normas, de forma a assegurar a necessária modernização das relações trabalhis-tas sem prejuízo a qualquer das partes envolvidas.

2 A FUNDAMENTALIDADE DOS DIREITOS SOCIAIS

A Constituição Federal de 1988 consagrou os direitos sociais no art. 6º, assim considerando, atendida a redação conferida pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015, a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Topologicamente, o artigo em questão se encontra no Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo II, dos Direitos Sociais. O Brasil, ao assim agir, acompanhou a tendência verificada em âmbito mundial no sentido de constitucionalização dos direitos sociais após a Segunda Guerra Mundial.

Para Silva (2012, p. 288-289), os direitos sociais, como aspecto dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas disponibilizadas pelo Estado de forma direta ou indireta, previstas em normas constitucionais, que oportunizam me-lhor situação de vida aos mais necessitados. Tais direitos têm a aptidão de promover a igualdade social, guardando, portanto, vinculação com o direito de igualdade. “Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade”.

Segundo Marmelstein (2008, p. 174), tanto do ponto de vista formal como material, os direitos sociais devem ser havidos fundamentais. Afirma o autor textual-mente que “os direitos sociais são, à luz do direito positivo-constitucional brasileiro,

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verdadeiros direitos fundamentais, tanto em sentido formal (pois estão na Consti-tuição e têm status de norma constitucional) quanto em sentido material (pois são valores intimamente ligados ao princípio da dignidade da pessoa humana)”.

Sarlet (2013, p. 476-478) assevera que a condição de direito social não se encontra exclusivamente ligada a uma atuação positiva do Estado no incremento da segurança social, como meio de compensar desigualdades fáticas evidentes e instru-mento para garantir nível mínimo de condições para uma vida digna. A afirmação de fundamentalidade de todos os direitos assim intitulados na Constituição Federal, circunstância que abrange todo o Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais e, desta forma, os direitos sociais previstos no art. 6º e os denominados direitos dos trabalhadores, impõe reconhecer presunção em prol da fundamentalidade também material de tais direitos e garantias. O doutrinador salienta que, segundo sua ótica, todos os direitos, expressa ou implicitamente positivados, localizados no Título II da CF (Dos Direitos e Garantias Fundamentais) ou mesmo insertos em outras partes do Constituição Federal, são direitos fundamentais.

Para Bonavides (2007, p. 642), em razão de sua estreita vinculação com o princípio da dignidade da pessoa humana, os direitos sociais recebem do direito constitucional brasileiro garantia idêntica àquela prevista para os direitos e garantias individuais do art. 60 da Constituição Federal, inexistindo distinção de grau ou de valor entre os direitos sociais e individuais.

Sublinha-se o entendimento de que as vertentes que negam a fundamentalida-de dos direitos sociais estão divorciadas do direito constitucional positivo, na medida em que se estribam em critérios de materialidade fundamental, não raro atreladas a teorias da justiça de caráter liberal, sem a indispensável harmonia com o sistema constitucional vigente. Também não tomam em consideração a expressa inserção dos direitos sociais, inclusive dos direitos dos trabalhadores, no texto da Carta Magna como uma das espécies dos direitos e garantias fundamentais do Título II, a par do compromisso do constituinte com a justiça social (Canotilho et al., 2013, p. 540).

3 VINCULAÇÃO DOS PODERES PÚBLICOS AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais são, concomitantemente, direitos subjetivos e ele-mentos fundamentais da ordem constitucional objetiva. Em razão de sua natureza de direitos subjetivos, facultam a seus titulares impor seus interesses em face dos ór-gãos que a eles se vinculam. Como elementos fundamentais da ordem constitucio-nal objetiva, estabelecem a base do ordenamento jurídico de um Estado de Direito democrático (Mendes, 2007, p. 2).

Por se encontrarem previstos na Constituição Federal, os direitos fundamen-tais tornam-se parâmetros de sistematização e de limitação dos poderes constituídos (Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário). Sua constitucionalização não permite que sejam havidos simples autolimitações dos poderes constituídos, suscetíveis a alterações ou supressão ao arbítrio destes. “Nenhum desses Poderes se confunde com o poder que consagra o direito fundamental, que lhe é superior. Os atos dos

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poderes constituídos devem conformidade aos direitos fundamentais e se expõem à invalidade se os desprezarem” (Mendes et al., 2007, p. 235).

Os direitos fundamentais foram concebidos originariamente como direitos de defesa, para colocar o cidadão a salvo de interferências indevidas do Estado. Atendida essa dimensão, ao Poder Público era conferida competência negativa, o que deter-minava a obrigação de respeitar o núcleo básico de liberdades do cidadão. Trata-se da chamada eficácia vertical, necessária, ante a manifesta desigualdade do indivíduo perante o Estado, a quem são atribuídos poderes de autoridade. Para Canotilho (1999, p. 383), a função de direitos de defesa dos cidadãos, exercida pelos direitos funda-mentais, compreende dupla perspectiva: 1) no plano jurídico-objetivo, representam normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo sua interferên-cia na esfera jurídica individual; 2) no plano jurídico-subjetivo, significam o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir abs-tenções do Estado, a fim de evitar ações lesivas por parte deste (liberdade negativa).

Entretanto, com a transformação das relações sociais e o incremento de suas reivindicações, o mero dever de abstenção revelou-se insuficiente, circunstância que deu nascimento à chamada vinculação positiva dos poderes públicos. Esta im-plica ação do Estado, a quem incumbe adotar políticas e ações aptas a fomentar a preservação dos direitos e garantias dos indivíduos, concretizando assim o ideário do Estado Social.

A vinculação positiva do Estado abarca os Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Do primeiro, exige-se o fomento de políticas públicas destinadas à efe-tivação dos direitos e garantias do cidadão, além de interpretação e aplicação das leis em consonância com os direitos fundamentais. Ao Judiciário é confiada tarefa substancial na defesa dos direitos fundamentais, em especial diante do preceito ins-culpido no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que consagra a inafastabilidade da jurisdição, incumbindo-lhe, no exercício de suas atribuições, imprimir a esses direitos a máxima eficácia possível, a par de recusar aplicação a preceitos que des-respeitem os direitos fundamentais.

No âmbito do Poder Legislativo, a atividade legiferante deve atuar de for-ma a manter coerência com o sistema de direitos fundamentais. De outra parte, “a vinculação aos direitos fundamentais pode assumir conteúdo positivo, tornando imperiosa a edição de normas que deem regulamentação aos direitos fundamentais dependentes de concretização normativa” (Mendes, 2007, p. 235).

A vinculação aos direitos fundamentais expressa, para o legislador, uma mar-cação material de sua liberdade de conformação na esfera de sua ação regulamen-tadora e concretizadora. Além disso, a norma inserta no art. 5º, § 1º, da Constituição Federal determina limitação das possibilidades de restrição, pelo legislador, no âm-bito de proteção dos direitos fundamentais. Embora apenas o legislador esteja auto-rizado a introduzir restrições aos direitos fundamentais, encontra-se ele vinculado a tais direitos, “podendo mesmo afirmar-se que o art. 5º, § 1º, da CF traz em seu bojo uma inequívoca proibição de leis contrárias aos direitos fundamentais, gerando a sin-

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dicabilidade não apenas do ato de edição normativa, mas também de seu resultado, atividade, por sua vez, atribuída à jurisdição constitucional” (Sarlet, 2008, p. 387).

A vinculação do legislador aos direitos fundamentais alcança a chamada proibição de retrocesso.

4 PROIBIÇÃO DE RETROCESSO

O princípio da proibição de retrocesso social implica garantia ao cidadão contra a atuação regressiva do Estado, proibindo a elaboração de leis que, embora não sejam retroativas, determinem redução dos direitos sociais anteriormente as-sentados.

A corrente que defende a proibição de retrocesso afirma que, relativamente aos direitos fundamentais que dependem de ação legislativa para sua concretiza-ção, uma vez alcançando determinado grau de sua realização, normatização poste-rior não pode reverter os progressos obtidos. “A realização do direito pelo legislador constituiria, ela própria, uma barreira para que a proteção atingida seja desfeita sem compensações” (Mendes et al., 2007, p. 236).

Mendes (2007. p. 236) informa que o segmento que admite a revisão, pela ação legislativa, de direitos conquistados argumenta que o princípio da proibição de retrocesso não pode ser genericamente acolhido, em razão da liberdade asse-gurada ao legislador de conformar tais direitos, afirmando ainda que a aplicação de forma indistinta de tal princípio conduziria à destruição da autonomia do Poder Legislativo.

Para Sarlet (2008, p. 436), a problemática da proibição de retrocesso guar-da estreita vinculação com a noção de segurança jurídica, princípio inafastável do Estado de Direito e umbilicalmente associado à própria concepção de dignidade da pessoa humana. A dignidade não será adequadamente respeitada e protegida quando as pessoas estiverem sujeitas a um tal grau de instabilidade jurídica que não lhes seja possível, com um mínimo de segurança e serenidade, confiar nas instituições e numa certa perenidade das suas próprias posições jurídicas. “Dito de outro modo, a plena e descontrolada disponibilização dos direitos e dos projetos de vida pessoais por parte da ordem jurídica acabaria por transformar os mesmos (e, portanto, os seus titulares e autores) em simples instrumento da vontade estatal, sendo, portanto, manifestamente incompatível mesmo com uma visão estritamente kantiana da dignidade” (Sarlet, 2008, p. 437). A dignidade da pessoa humana re-clama proteção diante de atos de caráter retroativo e também em face de medidas retrocessivas, que não podem ser consideradas como propriamente retroativas, na medida em que respeitam os direitos adquiridos, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Emenda constitucional ou lei ordinária que conduza à supressão de certos conteúdos da Constituição ou à revogação de normas legais regulamentadoras de dispositivos constitucionais, destacadamente em matéria de direitos sociais, ainda que com efeitos tão somente prospectivos, podem configurar ofensa ao princípio da proibição de retrocesso.

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A vedação de retrocesso também decorre do princípio da maximização da eficácia das normas de direitos fundamentais. O art. 5º, § 1º, da Constituição Federal estende sua proteção aos direitos fundamentais em face do poder constituinte refor-mador e também diante do legislador ordinário e demais órgãos estatais,

que, portanto, além de estarem incumbidos de um dever permanente de desenvol-vimento e concretização eficientes dos direitos fundamentais (inclusive e, no âmbito da temática versada, de modo particular os direitos sociais), não pode – em qualquer hipótese – suprimir pura e simplesmente ou restringir de modo a invadir o núcleo essencial do direito fundamental ou atentar, de outro modo, contra as exigências da proporcionalidade. (Sarlet, 2008, p. 452-453)

A proibição de retrocesso, embora não deva ser havida como regra geral de cunho absoluto, sob pena de ofensa à autonomia do legislador, não pode compro-meter o núcleo essencial dos direitos sociais já realizados e efetivados pelo legisla-dor. Para Canotilho (1999, p. 338-339), os direitos sociais e econômicos, como os direitos dos trabalhadores, o direito à assistência e à educação, uma vez alcançado determinado nível de concretização, passam a representar, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. O princípio da proibição de retrocesso social, segundo o mestre português, pode assim ser formulado:

O núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efectivado através de medidas legislativas [...] deve considerar-se constitucionalmente garantido, sendo inconstitu-cionais quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros esquemas alterna-tivos ou compensatórios, se traduzam, na prática, numa “anulação”, “revogação” ou “aniquilação” pura e simples desse núcleo essencial. (Canotilho, 1999, p. 340)

Não se trata de assegurar, em abstrato, um status quo social, e sim de resguar-dar direitos fundamentais sociais, destacadamente no seu núcleo essencial.

A liberdade de conformação do legislador e inerente autorreversibilidade têm como limite o núcleo essencial já realizado, sobretudo quando o núcleo essencial se recon-duz à garantia do mínimo de existência condigna inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana. (Canotilho, 1999, p. 340)

No sistema jurídico brasileiro, o princípio da proibição do retrocesso encon-tra-se manifestamente contemplado no caput do art. 7º da Constituição Federal, que prescreve que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social: [...]” (destacou-se). No dispositivo em questão, encontra-se elencado rol de direitos fundamentais sociais. Atendido o que consta no caput, imperativo concluir que é permitido ao legislador apenas estipular outros direitos que determinem avanço de tais direitos e nunca o retrocesso (Goldschmidt, 2011, p. 360).

Ao discorrer sobre as normas programáticas e a constitucionalidades das leis, Silva (2008, p. 159) afirma que a última parte do caput do art. 7º da Cons-tituição Federal (“além de outros que visem à melhoria de sua condição social”) é de natureza programática, acrescentando que o legislador, ao outorgar outros direitos aos trabalhadores, tem ampla discricionariedade, achando-se, entretanto,

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condicionado ao objetivo proposto, qual seja, a melhoria da condição social do trabalhador.

Qualquer providência do Poder Público, específica ou geral, que contravenha a esse fim é inválida e pode ser declarada sua inconstitucionalidade pelo juiz, sendo de notar que este também goza de discricionariedade, já que a Constituição não deu o sentido do que se deva entender por melhoria da condição social do trabalhador. (Silva, 2008, p. 159)

5 DISPOSITIVOS DA LEI Nº 13.467/2017 QUE AFRONTAM OS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E O PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO: DOIS EXEMPLOS

Embora não se ignore que a legislação trabalhista deve acompanhar as novas realidades dos modelos produtivos, não menos certo é que as eventuais alterações não podem configurar ofensa aos direitos fundamentais sociais e ao princípio da proibição do retrocesso, sob pena de se lhe recusar aplicabilidade, por manifesta inconstitucionalidade.

Examinado o teor da Lei nº 13.467/2017, depara-se o intérprete com vários dispositivos que ostentam a mácula supramencionada. Apontam-se dois exemplos considerados de especial gravidade.

5.1 RestRição do âmbito de análise, pela Justiça do tRabalho, de convenções e acoRdos coletivos de tRabalho

A Lei nº 13.467/2017 promoveu a inserção, no art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho, do § 3º, delimitando a análise, pela Justiça do Trabalho, quando do exame de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusiva-mente à “conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil)” e prescrevendo que a Justiça Especializada deverá balizar “sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva”.

Manifesta a inconstitucionalidade do dispositivo, na medida em que repre-senta afronta a direito fundamental expressamente previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” e que consagra o direito à tutela jurisdicional adequada e efetiva.

Segundo Marinoni e Mitidiero (2013, p. 712), a Constituição brasileira con-sagrou a máxima amplitude da tutela jurisdicional, englobando tanto a possibilida-de de defesa de direitos individuais quanto dos direitos coletivos. No que respei-ta à abrangência, a Constituição somente subtrai à tutela jurisdicional, conforme previsto no art. 142, § 2º, a revisão do mérito de punições militares. Inclusive as chamadas questões políticas estão submetidas ao controle jurisdicional, bastando a tanto que, a partir delas, se verifique utilização abusiva de prerrogativas políticas e

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desrespeito aos direitos fundamentais. A Carta Magna permite, entretanto, aos parti-culares submeter, voluntariamente, certos litígios à solução arbitral. “O que a Cons-tituição veda é a interdição da apreciação do Poder Judiciário pelo próprio Estado” (Marinoni; Mitidiero, 2013, p. 712-713).

Não se pode considerar efetiva a tutela jurisdicional que tem seus limites fi-xados em lei infraconstitucional que interdita a atividade do Poder Judiciário, sendo dado a este, em especial no exercício do controle difuso de constitucionalidade, proclamar a absoluta incompatibilidade do § 3º do art. 8º da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, com o direito fundamental previsto no art. 5º, XXXV, da Cons-tituição Federal.

5.2 aplicação à RepaRação de danos de natuReza extRapatRimonial decoRRentes da Relação de tRabalho apenas dos dispositivos da nova lei (título ii-a)

Neste particular aspecto, o legislador infraconstitucional demonstrou extra-ordinária e inquietante insciência, em razão de que foram desconsiderados os mais elementares preceitos que orientam a conformação do conteúdo das leis, com des-taque para a efetividade das normas constitucionais e da força normativa da Cons-tituição, a denominada nova hermenêutica constitucional, as teorias consolidadas acerca dos limites e restrições dos direitos fundamentais e, em especial, a absoluta inviabilidade de afrontar, nos termos supostamente desejados, o conteúdo essencial do direito fundamental ao trabalho digno.

A efetividade das normas constitucionais alcança a aspiração de máxima efetivação, na vida real, do ideário normativo abstratamente previsto. O princípio da força normativa da constituição, na seara da interpretação constitucional, ex-prime a pretensão de primazia dos pressupostos da constituição na resolução dos problemas jurídico-constitucionais, assegurando sua eficácia e preservação (Sarlet, 2013, p. 193-195).

A nova hermenêutica constitucional, por sua vez, envolve as conexões entre valores, princípios e regras e a teoria dos direitos fundamentais, construída sobre o fundamento da dignidade humana. O reconhecimento dos princípios, sua incorpo-ração, explícita ou implícita, pela constituição e a reconhecença pela ordem jurídi-ca de sua normatividade integram a esfera de reaproximação entre Direito e Ética. A prática dos princípios, da proeminência dos direitos fundamentais e do resgate da Ética deve refletir sobre o trabalho de juízes, advogados e membros do Ministério Público, sobre o agir do Poder Público em geral e sobre a vida das pessoas. “Trata--se de transpor a fronteira da reflexão filosófica, ingressar na dogmática jurídica e na prática jurisprudencial e, indo mais além, produzir efeitos positivos sobre a realida-de” (Barroso, 2006, p. 336-337).

O preâmbulo da Constituição Federal revela o intenso comprometimento com a justiça social, o que é corroborado pelos princípios fundamentais previstos no Título I da Carta Magna, dentre os quais ganha relevo a dignidade da pessoa

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humana (art. 1º, I), fundamento do próprio Estado Democrático de Direito. O prin-cípio em questão é autêntico fio condutor relativamente aos diversos direitos funda-mentais,

reforçando a existência de uma recíproca complementariedade entre os direitos civis e políticos (por muitos designados de direitos individuais ou de liberdade) e os direitos sociais, na medida em que os direitos sociais (ainda que não todos e não da mesma forma) expressam parcelas do conteúdo e dimensões do princípio da dignidade hu-mana. (Sarlet, 2013, p. 556)

Os direitos fundamentais sociais contemplam parâmetros para a interpreta-ção e aplicação do amplo conjunto de normas que forma o arcabouço jurídico, em que se inserem aquelas que regulam as relações de trabalho. A própria Constituição Federal retrata a preocupação com essa natureza de direitos, tendo consagrado a valorização do trabalho humano como fundamento da ordem econômica.

Na condição de direitos de defesa, os direitos fundamentais representam ins-trumento para coibir a intervenção indevida no Estado na esfera de liberdade do indivíduo e contra medidas legais restritivas.

Na sua concepção tradicional, os direitos fundamentais são direitos de defesa (Abwehrrechte), destinados a proteger determinadas posições subjetivas contra a in-tervenção do Poder Público, seja pelo (a) não impedimento da prática de determinado ato, seja pela (b) não intervenção em situações subjetivas ou pela não eliminação de posições jurídicas. (Mendes, 2007, p. 2)

Os direitos fundamentais, entretanto, não são absolutos, sujeitando-se a limi-tes, impostos pela própria necessidade de equilibrar interesses divergentes. Mendes (2007, p. 2) ensina que a análise das restrições dos direitos fundamentais exige a identificação de seu âmbito de proteção. Para a definição do âmbito de proteção, necessário analisar a norma constitucional garantidora de direitos, tendo em vista: a) a identificação dos bens jurídicos protegidos e a amplitude da proteção e b) o exame das possíveis restrições previstas expressamente na Constituição (expressa restrição constitucional) e a verificação das reservas legais de índole restritiva. A reserva legal pode ser simples ou qualificada. Nesta, a Constituição não se limita a exigir previsão em lei para autorizar restrição ao âmbito de proteção, determinando, também, as condições especiais, os fins e os meios a serem empregados. Tratando--se de direitos fundamentais sem reserva legal expressa, não é dado ao legislador, como regra geral, ir além dos limites fixados no próprio âmbito de proteção. A ação do legislador, no exercício de seu poder de restrição e conformação, é limitada pela própria Constituição, que impõe a proteção de um núcleo essencial do direito fun-damental, além de exigir clareza, determinação, generalidade e proporcionalidade das restrições impostas. O princípio da proteção do núcleo essencial busca evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental que poderia ocorrer em razão de restrições impróprias ou desproporcionais.

No que respeita ao direito fundamental ao trabalho digno, Comparato (2013, p. 35-36) explica que, a exemplo do que ocorreu com o Gulag soviético e o Lager

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nazista, que foram monstruosas máquinas de despersonalização de seres humanos, a transmutação das pessoas em coisas ocorreu de forma menos ostentosa, mas não menos funesta, com o incremento do sistema capitalista de produção. Houve a inversão total da relação pessoa-coisa. Enquanto ao capital é conferida, por assim dizer, personificação e elevação à dignidade de sujeito de direito, o trabalhador é reduzido à condição de mercadoria, de simples insumo no processo de produção, para ser, no final, na etapa de culminância do capitalismo financeiro, dispensado e banido ao lixo social como peça descartável.

Para Delgado (2006, p. 23), o trabalho deve ser entendido em sua acepção éti-ca, o que implica dizer que o homem deve ter garantido, por intermédio do trabalho digno, sua consciência de liberdade, a fim de que lhe seja possível desenvolver-se e realizar-se em sua identidade como pessoa trabalhadora. O trabalho pode ser, conco-mitantemente, instrumento de auxílio na edificação da identidade social do homem e fator de destruição de sua existência, ocorrendo a última hipótese nas situações em que não são propiciadas condições mínimas para a execução das atividades em condições de dignidade. Não sendo asseguradas ao trabalhador “condições míni-mas de saúde e de segurança no trabalho, por exemplo, não há espaço para o exer-cício do direito fundamental ao trabalho digno, que será mera abstração”.

A Constituição Federal brasileira de 1988 conferiu especial relevo ao traba-lho, entrelaçando-os com os valores e princípios da dignidade da pessoa humana, da justiça social e do valor social do trabalho. O texto constitucional descreve as várias dimensões do princípio da dignidade, com destaque para o art. 170, quan-do determina que a ordem econômica assegure a todos existência digna, e para o art. 193, quando exige que a ordem social tenha por objetivos o bem-estar e a justiça social. Insiste referido texto na aplicação multidimensional do princípio da dignidade humana, o que permite à pessoa humana afirmar-se como sujeito de di-reitos no meio social, circunstância que exige a integridade dos direitos individuais e a promoção dos direitos sociais. Merece ênfase ainda o princípio da justiça social, com repercussão sobre as dimensões econômico-sociais. Além disso, o valor social do trabalho foi guindado à condição de fundamento da República Federativa do Brasil, o que implica afirmar que o texto constitucional determinou conteúdo para o Direito, para a sociedade e para o Estado em torno do valor trabalho. Vê-se, as-sim, que a Constituição de 1988 expôs novos paradigmas relativamente ao direito fundamental ao trabalho digno, abrindo possibilidades normativas de concretização do Estado Democrático de Direito, orientador da ordem constitucional brasileira (Delgado, 2006, p. 79-80).

Por tudo isso, pretender estabelecer, por meio de lei ordinária, critérios rí-gidos e apriorísticos para o exame pelos juízes do alcance e dimensão dos danos extrapatrimoniais, vedando o recurso às demais fontes do Direito, com destaque para a Constituição Federal, significa completa subversão dos cânones elementares da ciência jurídica. Ainda, fixar os valores da indenização, considerando o último salário contratual do ofendido, representa a coisificação do trabalhador conduzida a seu paroxismo.

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CONCLUSÃO

A Lei nº 13.467/2017, que estabeleceu a chamada reforma trabalhista, recla-ma análise à luz da fundamentalidade dos direitos sociais, de seu caráter vinculativo e da consequente proibição do retrocesso, a fim de que não seja aniquilado o arca-bouço de proteção dos direitos sociais duramente conquistado ao longo de décadas.

Embora não se ignore que a legislação trabalhista reclama atualização, a fim de acompanhar as constantes transformações dos modelos socioprodutivos, tanto não pode se dar mediante pura e simples supressão de direitos sociais da classe trabalhadora, dotados de manifesta fundamentalidade.

A fundamentalidade dos direitos sociais, amplamente reconhecida pela dou-trina, estabelece vinculação positiva dos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Ao primeiro incumbe fomentar políticas públicas aptas à efetivação dos direitos e garantias do cidadão. Ao Judiciário é atribuída, com suporte especialmente no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, a tarefa de, no exercício de suas atribuições, imprimir a tais direitos a máxima eficácia possível, a par de recusar aplicação a preceitos que desrespeitem os direitos fundamentais. Ao legislador, por sua vez, a vinculação aos direitos fundamentais não lhe permite estabelecer leis contrárias aos direitos fundamentais, devendo ainda observância ao princípio da proibição do retrocesso. Este implica garantia ao cidadão contra a atuação retrocessiva do Esta-do, obstando a elaboração de leis que, embora não sejam retroativas, determinem redução dos direitos sociais preteritamente estipulados.

A restrição estabelecida pela nova lei do âmbito de análise, pela Justiça do Trabalho, de convenções e acordos coletivos do trabalho é manifestamente incons-titucional, na medida em que configura afronta a direito fundamental expressamen-te previsto no art. 5º, XXXV, que consagra direito à tutela jurisdicional adequada e efetiva.

A fixação, pelo legislador ordinário, de critérios rígidos, exclusivos e aprio-rísticos para o exame pelos juízes do trabalho do alcance e dimensão dos danos extrapatrimoniais, bem como para a fixação do valor da indenização, evidencia ex-travagante e aflitiva insciência, em razão de que foram desconsiderados os mais ele-mentares preceitos que orientam a conformação do conteúdo das leis, com destaque para a efetividade das normas constitucionais e da forma normativa da Constituição, a denominada nova hermenêutica constitucional, as teorias consolidadas acerca dos limites e restrições dos direitos fundamentais e, especialmente, a absoluta inviabili-dade de ultrajar o conteúdo essencial do direito fundamental ao trabalho digno.

REFERÊNCIAS

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Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Reforma Trabalhista e o Novo “Direito do Capital”

AMAuRI CESAR ALVESDoutor, Mestre e Bacharel em Direito pela PUC-Minas, Professor da Universidade Federal de Ouro Preto, Membro do Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

ROBERTO DAS gRAçAS ALVESBacharel em Direito pela PUC-Minas, Procurador Regional do Trabalho (MPT 3ª Região), apo-sentado, Advogado em Minas Gerais.

RESUMO: O presente artigo pretende compreender, em uma primeira e breve análise, em que am-plitude e profundidade a Lei nº 13.467/2017 prejudica os interesses dos trabalhadores brasileiros e revela a pior face do capitalismo nacional em sua história. Para tanto, reafirma a função capitalista do direito do trabalho no Brasil, trata do cenário político da reforma e destaca a prevalência do nego-ciado sobre o legislado, conforme previsto na Reforma Trabalhista. Estuda também novas previsões legais de negociação direta entre patrões e empregados, cuja marca é a prevalência da vontade patronal. Por fim, indica algumas das principais inconstitucionalidades da Lei nº 13.467/2017 e esta-belece cenários possíveis para as relações empregatícias no novo “direito do capital”.

PALAVRAS-CHAVE: Reforma Trabalhista; inconstitucionalidades; direito do capital.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Função capitalista do direito do trabalho no Brasil; 2 O cenário político da Reforma Trabalhista; 3 A prevalência do negociado coletivamente sobre o legislado; 4 Novas possibi-lidades de “negociação individual”; 5 Inconstitucionalidades da Reforma Trabalhista; 5.1 Direito indi-vidual do trabalho e Constituição da República: inconstitucionalidades da Lei nº 13.467/2017; 5.2 Di-reito coletivo do trabalho e Constituição da República: inconstitucionalidades da Lei nº 13.467/2017; 6 Cenários possíveis no novo “direito do capital”; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente artigo pretende compreender, em uma primeira e breve análise, em que amplitude e profundidade a Lei nº 13.467/2017 prejudica os interesses dos trabalhadores brasileiros e revela a pior face do capitalismo nacional em sua his-tória. Para tanto, reafirma a função capitalista do direito do trabalho no Brasil, de-monstrando que, mesmo sem a Reforma Trabalhista, o empregador sempre foi o su-jeito privilegiado da relação capital-trabalho. Não obstante sua preponderância na relação de emprego, protegida que era (e sempre foi) pelo direito do trabalho, partiu

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a elite nacional para a ruptura do sistema que sempre permitiu sua dominação, com a inauguração do novo direito do capital no País. O entendimento de como se deu tal ruptura depende da compreensão de qual foi o cenário político que permitiu a agressão da estrutura de proteção trabalhista, com destaque para a crise democráti-ca havida em 2016. A medida legislativa inicial previa essencialmente a prevalência do negociado coletivamente sobre o legislado, mas a elite conservadora brasileira percebeu a oportunidade do vazio democrático para ir muito além, com a fixação de regras claramente vantajosas ao patrão em detrimento do empregado, muitas delas inconstitucionais. Importantes também nesse contexto as novas possibilidades de “negociação individual” das condições de trabalho, em uma equivocada pres-suposição de igualdade negocial entre empregados e empregadores. Por fim, será importante refletir sobre os rumos das relações de trabalho no Brasil pós-reforma, com a identificação de cenários possíveis decorrentes do novo “direito do capital”.

1 FUNÇÃO CAPITALISTA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL

A função capitalista do direito do trabalho consiste na atuação do ramo jurí-dico especializado no sentido da preservação dos interesses patronais acima da (ou pelo menos em concorrência com) proteção ao trabalhador empregado. A proteção estatal trabalhista seria um efeito decorrente da necessidade de perpetuação do po-der do empregador na relação de emprego. Haveria, até então, um pacto silencioso que mantém os patrões ricos e os empregados pobres, sem que se questione o sis-tema capitalista e a desmedida exploração de trabalho no Brasil. Tudo isso antes e independentemente da Reforma Trabalhista.

O direito do trabalho sempre teve, historicamente, função de manutenção do status quo, mesmo antes da destruição provocada pela atual Reforma Trabalhista. Por aqui sempre houve desigualdade social em níveis alarmantes, ainda que reduzi-da minimamente no período 2004-2014.

O sistema corporativista implantado por Vargas para a regulação social por meio do direito do trabalho acabou por reduzir o papel que poderia ter sido de-sempenhado pelos sindicatos se houvesse o reconhecimento da luta de classes e da necessidade de ação autônoma da classe trabalhadora para a construção de seus direitos.

A ideia de que o direito do trabalho exerce papel destacado na manuten-ção do status quo tem fundamento, também, na função política conservadora desse ramo jurídico especializado. Conforme ensina Maurício Godinho Delgado, negar tal função seria ingenuidade, pois o direito do trabalho “confere legitimidade polí-tica e cultural à relação de produção básica da sociedade contemporânea”1. Ora, seria ilógico supor a existência de um ramo jurídico absolutamente antagônico ao sistema econômico que o suporta. É incoerente dizer que o direito do trabalho não condiz com o capitalismo, vez que aquele é fruto deste.

1 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 58.

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Outro fator importante para que se possa perceber, na prática, a função ca-pitalista aqui lembrada é o que concerne à “culpabilização do direito do trabalho” em momentos de crise econômica. Essa foi a estratégia das elites capitalistas para a implementação da Reforma Trabalhista. A estagnação da atuação coletiva organiza-da dos trabalhadores sobre o Estado e sobre os patrões se deve em muito, conforme bem identificou Wilson Ramos Filho, à estratégia capitalista de “culpabilização do Direito do Trabalho”. Sempre que há crises econômicas, no Brasil e em boa parte do mundo; o primeiro a ser responsabilizado tende a ser o patamar mínimo imperativo construído em torno das relações capital-trabalho. Em síntese, as crises econômicas seriam resultantes principalmente, dentre outros fatores, da pressão do custo da mão de obra sobre o investimento produtivo, e a sua solução residiria, consequentemen-te, na diluição dos conteúdos protetivos fixados2.

No início de 2013, a Confederação Nacional da Indústria entregou à Pre-sidenta Dilma Rousseff um estudo intitulado “101 propostas para modernização trabalhista”. Em 135 páginas, defendeu uma ampla reestruturação da legislação (constitucional e infraconstitucional) e da jurisprudência do TST sobre os temas por ela escolhidos como críticos e que representariam entraves ao desenvolvimento industrial brasileiro. Não tendo o pretendido respaldo presidencial à época, a pauta da CNI agora se torna lei. Importante destacar aqui como o discurso da CNI, funda-do em “culpabilização do direito do trabalho” em momentos de crise, frutificou no seio da Reforma Trabalhista.

A CNI, em 2012, já criticava a jurisprudência do TST, tendo agora conse-guido pelo menos incomodar o tribunal com a aprovação da Reforma Trabalhista. Eis, em síntese da CNI, sua compreensão sobre os efeitos nocivos da jurisprudência trabalhista sobre os empregadores:

O descasamento entre a legislação em vigor e as necessidades das diferentes realida-des, a ausência de regras claras e o reduzido espaço dado às negociações criam um ambiente de insegurança jurídica nas relações do trabalho. Em várias circunstâncias, as interpretações dissonantes da legislação trabalhista feitas pelos poderes públicos chegam a tornar até o passado incerto em função de alterações retroativas na aplica-ção de dispositivos legais. De fato, ao se decidir a partir de súmulas que determinada norma deveria ter sido interpretada de forma diferente da que consta na lei, ou até de forma diferente da exposta em entendimentos jurisprudenciais consolidados, muda-se a regra para os cinco anos anteriores, gerando passivos muitas vezes incalculáveis. Esse quadro limita as possibilidades de se conhecer a real dimensão de passivos tra-balhistas e previdenciários e reduz a propensão ao investimento com consequentes impactos negativos na geração de empregos.3

A crítica surtiu efeitos. O quadro abaixo retrata o foco da CNI na jurispru-dência do TST e os resultados de sua atuação política na proposição legislativa que resultou na Reforma Trabalhista.

2 RAMOS FILHO, Wilson. Direito capitalista do trabalho: histórias, mitos e perspectivas no Brasil. São Paulo: LTr, 2012. p. 313.

3 CNI. 101 propostas para modernização trabalhista. Brasília: CNI, 2012.

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QuadRo 1 – JuRispRudência do tst. pRopostas da cni. RefoRma tRabalhista:

Tema Jurisprudência “101 propostas da CNI”

PL 6.787/2016 PLC 38/2017

Minutos residuais Súmula nº 449 do TST

Proposta 14 Art. 4º, § 2º, da CLT

Deslocamento in- terno

Súmula nº 429 do TST

Proposta 14 Art. 58, § 2º, da CLT

Compensação de jornada

Súmula nº 85 do TST Proposta 09 Art. 59-A da CLT

12 x 36 sem intervalo Súmula nº 444 do TST

Proposta 06 Art. 59-B da CLT

12 x 36 sem dobra do feriado

Súmula nº 444 do TST

Proposta 10 Art. 59-B da CLT

Descaracterização da compensação

Súmula nº 85, IV, do TST

Proposta 05 Art. 59-C, parágra-fo único, da CLT

Pagamento parcial de intervalo suprimido

Súmula nº 437, I, do TST

Proposta 07 Art. 71, § 4º, da CLT

Equiparação, P.C.S. e homologação

Súmula nº 06, inciso I Proposta 22 Art. 461 da CLT

Ultratividade da norma coletiva

Súmula nº 277 do TST

Proposta 04 Art. 614-B, parágra-fo único, da CLT

Perícia e sucum- bência

Súmula nº 457 do TST

Proposta 84 Art. 790-B da CLT

Intervalo de 30 minutos

Súmula nº 437, II, do TST

Propostas 01 e 13 Art. 611-A, III, da CLT

Duração do trabalho, saúde e segurança

Súmula nº 437, II, do TST

Proposta 01 Art. 611-B, parágra-fo único, da CLT

Sobreaviso Súmula nº 428 do TST

Proposta 16 Art. 611-A, III, da CLT

Ponto eletrônico Súmula nº 338 do TST

Proposta 98 Art. 611-A, X, da CLT

Terceirização em qualquer atividade

Súmula nº 331 do TST

Proposta 19 Lei nº 6.019/1974

Horas in itinere Súmula nº 90 do TST Proposta 28 Art. 58, § 2º, da CLT

Banco de horas por negociação individual

Súmula nº 85, V, do TST

Proposta 09 Art. 59, § 5º, da CLT

Fonte: Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

O Deputado Rogério Marinho, relator da “Reforma Trabalhista”, aparente-mente repetindo lições da CNI, faz o mesmo discurso ao justificar o injustificável novo art. 8º da CLT:

Com a nova redação proposta para o art. 8º, queremos deixar evidente a supremacia da lei na aplicação do direito do trabalho, por mais paradoxo que possa parecer tal dispositivo, impedindo-se, dessa forma, a inversão da ordem de aplicação das normas. Essa prática tem dado margem a um aumento no número de ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, pois é comum que o empregador, mesmo cumprindo toda a le-

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gislação e pagando todas as verbas trabalhistas devidas, se veja demandado em juízo com pedidos fundados apenas em jurisprudências e súmulas dos tribunais.4

É claro, também, que a insatisfação da CNI e seu discurso de culpabilização não ficaram restritos à jurisprudência, tendo também foco na profunda alteração da CLT. O discurso da CNI a respeito da CLT, aparentemente vencedor com a edição da Lei nº 13.467/2017, é, em síntese, o seguinte:

Paradoxalmente, para fazer frente ao desafio de ampliar seus níveis de competiti-vidade, o Brasil conta com uma legislação trabalhista da década de 40 do século passado. Prestes a completar 70 anos, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) está embasada na premissa de que todos os trabalhadores são hipossuficientes porque foi concebida em um momento histórico marcado pelo predomínio do trabalho na agricultura, por um processo de industrialização ainda incipiente, por trabalhadores ainda com reduzido nível de formação e qualificação e por um movimento sindical pouco estruturado.5

No segundo quadro, a insatisfação da CNI em relação à CLT e os resultados políticos.

QuadRo 2 – alteRação da legislação tRabalhista nos teRmos pRopostos pela cni:

Tema “101 propostas da CNI” PL 6.787/2016

Grau de insalubridade Proposta 01 Art. 611-A, XIII, da CLT

Jornada em ambiente insa - lubre

Proposta 01 Art. 611-A, XIV, da CLT

Restrição do sistema de cotas Propostas 43, 44, 45, 46, 66 Art. 611-A, XII, da CLT

Negociação direta gerentes e diretores

Proposta 02 Art. 444, parágra-fo único, da CLT

Flexibilização do trabalho em tempo parcial

Proposta 13 Art. 58-A, CLT

Fracionamento das férias Proposta 51 Art. 134, § 1º, da CLT

Rescisão consensual Proposta 78 Art. 484-A da CLT

Rescisão sem homologação Proposta 79 Art. 477, § 4º, da CLT

Jurisdição voluntária Proposta 80 Capítulo III-A da CLT

Arbitragem Proposta 82 Art. 507-A da CLT

Fonte: Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

Os singelos exemplos acima demonstram que a Reforma Trabalhista tem au-tor, tem dono, tem patrocinador. Tem também foco e alvos que foram atingidos: a CLT e a face mais progressista da jurisprudência do TST.

Outro fator importante para que se possa perceber, na prática, a função ca-pitalista do direito do trabalho aqui destacada é o que concerne à ausência de

4 Relatório da Comissão Especial destinada a proferir parecer sobre o Projeto de Lei nº 6.787/2016.5 CNI. Op. cit.

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concretização de direitos fundamentais no âmbito das relações trabalhistas. Ainda que a Constituição da República de 1988 tenha consagrado expressamente direitos fundamentais imediatamente aplicáveis às relações intersubjetivas entre capital e trabalho, importantes instrumentos ainda não foram efetivamente implementados.

De início aquele que resume em si o maior déficit de implementação de di-reitos fundamentais na ordem jurídica brasileira: a ineficácia prática do disposto no inciso I do art. 7º da Constituição da República. A jurisprudência insiste, ainda, na exigência de lei complementar para a implementação da norma contida no citado dispositivo constitucional, embora tal regra infraconstitucional seja dispensável, vis-to o disposto no § 1º do art. 5º da Constituição da República. É simples: as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. A norma do art. 7º, I, é definidora de direito fundamental e, assim sendo, tem aplicação imediata, independentemente da regulamentação por lei complementar. Ademais, a Convenção nº 158 da OIT foi devidamente ratificada pelo Brasil em 10.04.1996, por meio do Decreto nº 1.855 daquele ano, não obstante tenha sido, posteriormente e de modo inconstitucional (vício formal), denunciada pelo Poder Executivo.

Até mesmo o princípio da dignidade da pessoa humana vem sendo mitigado no plano das relações trabalhistas, sobretudo por incorreta valoração de seu sentido por parcela conservadora e elitista do Poder Judiciário e da doutrina. Importante a compreensão seguinte, que bem ilustra o que aqui se afirma:

Nesse sentido, em que pese o princípio da dignidade da pessoa humana ser dos mais importantes e relevantes, possui baixa densidade normativa, uma vez que apenas enunciado como fundamento da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III), sem maiores detalhamentos. Por sua vez e em contraste, o princípio da inalterabilidade contratual possui alta densidade normativa, na medida em que, insculpido no art. 462 da CLT, goza de claros parâmetros, positivados no dispositivo que o alberga, tornando clara e segura a sua aplicação às mais diversas situações conflituosas.6

A indicação do autor é clara: o princípio da dignidade da pessoa humana é importante, mas não tem caráter normativo suficiente à sua aplicação direta e ime-diata nas relações empregatícias em geral. E segue o autor, em sua síntese do texto aqui destacado:

b) Princípio da dignidade da pessoa humana – pelo simples fato de “ser” humano, a pessoa merece todo o respeito, independentemente de sua origem, raça, sexo, idade, estado civil ou condição social e econômica; encontra-se apenas enunciado na Carta Política de 1988 como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III), sem que seja definido ou se enumere seus corolários.7

Explica o autor em que concerne a “mínima densidade normativa” do prin-cípio da dignidade da pessoa humana trazendo um exemplo:

6 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Os pilares do direito do trabalho – Princípios e sua densidade normativa. Revista LTr, v. 76, n. 07, p. 776, jul. 2012.

7 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Op. cit., p. 776.

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A mínima densidade normativa desse princípio, conjugada com sua máxima rele-vância existencial, faz com que possa embasar imposição judicial concreta, mas em casos excepcionais e desde que adotados critérios razoáveis de fixação da imposição, como é o caso do sequestro humanitário, desde que limitado ao teto constitucional das requisições de pequeno valor...8

Eis, portanto, a essência da Reforma Trabalhista feita pela elite conservadora brasileira.

Por fim, destaque-se também, como instrumento de verificação prática da função capitalista do direito do trabalho no Brasil, a equivocada aplicação de regras constitucionais trabalhistas nas relações de emprego.

A interpretação equivocada do TST a respeito de regras constitucionais possi-bilitou, ainda que por vias indiretas, parte do que há de pior na Reforma Trabalhista, conforme será adiante desenvolvido. Ainda é tempo, entretanto, para a necessária mudança interpretativa do TST com relação a temas constitucionais sensíveis como salário-mínimo e limite de jornada, exemplificativamente9.

Inicialmente a regra constitucional do salário-mínimo, que em si já traz difi-culdade de aplicação prática e que vem sendo demolida pelo Poder Judiciário, que contempla a constitucionalidade da regra celetista do contrato a tempo parcial com pagamento de salário proporcional e abaixo do mínimo mensal. Tal discussão agora voltará à pauta, em razão do contrato de trabalho intermitente. Espera-se resposta diferente, entretanto.

O TST firmou o entendimento de que o salário-mínimo legalmente fixado leva em conta o padrão ordinário de disponibilidade de trabalho, de modo que, em jornadas (e disponibilidades semanais) menores, possível é a contraprestação mínima proporcional.

Bem verdade que os diplomas normativos que fixam o salário mínimo o fazem tomando em conta não só o parâmetro mensal, mas também o diário e o horário. Não se ignora ser razoável a contratação em regime de tempo parcial. O que não se pode entender razoável, entretanto, é servir a contratação em regime de tempo parcial como forma de precarização da contratação de emprego, como infelizmente ocorre. Em síntese, é possível contratação em tempo parcial, com dis-ponibilidade de trabalho reduzida, mas não pode ser constitucional pagamento de salário inferior ao mínimo mensal.

Salário mínimo mensal, sem a proporcionalidade da regra infraconstitucio-nal, “fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às necessidades vi-tais básicas” do trabalhador “e às de sua família com moradia, alimentação, educa-

8 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Op. cit., p. 776.9 Inegável que, na última década, a jurisprudência consolidada do TST evoluiu muito. Mas também é inegável

que ainda há um déficit histórico de efetivação constitucional pela jurisprudência do TST. Espera-se que a evolução iniciada se mantenha com a consolidação de uma maioria de Magistrados que compreenda a Constituição da República como o mais importante limite ao exercício do poder do capital sobre o trabalho no Brasil.

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ção, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social”10 é conteúdo essencial do patamar mínimo e expressão básica do princípio da proteção. Permitir ao empregador contratar emprego com remuneração (ainda que proporcional ao salário-mínimo hora) inferior ao fixado como mínimo mensal não respeita os funda-mentos da República.

Outro ponto sensível com respeito à aplicação equivocada de regras consti-tucionais trabalhistas diz respeito ao limite de jornada estabelecido no inciso XIII do art. 7º da Constituição da República. Mais uma vez os Tribunais Trabalhistas serão instados a se manifestar sobre o assunto, esperando-se respostas diferentes em face da Reforma Trabalhista.

Limitação de jornada é, conforme cediço, regra básica, elementar, essen-cial, historicamente fundante do direito do trabalho em todo o mundo. No Brasil, entretanto, não passa de referência, vez que na prática não há limite. Por aqui exis-te a figura paradoxal das horas extras habitualmente prestadas11, o que não causa constrangimento ou reflexão de seus termos por parte do TST. Ora, como é possível algo ser ao mesmo tempo habitual e extraordinário? Quando os Tribunais Traba-lhistas tratam de horas extras, discute-se seu pagamento ou compensação, mas não a circunstância extraordinária ensejadora do excesso de jornada. Assim, exigir ou não trabalho em sobrejornada, “habitual ou extraordinariamente”, tende a ser mera decisão do empregador, sem respeito ao comando constitucional do art. 7º, XIII12.

Além da paradoxal figura das “horas extras habitualmente prestadas”, convi-ve a ordem jurídica brasileira com a possibilidade de trabalho extraordinário sem o correspondente pagamento da contraprestação básica (salário) e do adicional sobre horas extras previsto no inciso XVI do art. 7º da Constituição da República. Trata-se do “banco de horas”, estabelecido por medida provisória do legislador presiden-cial da década de 90. Incrível que os tribunais reconheçam constitucionalidade da regra em questão. Há trabalho sem contraprestação! Há trabalho entregue, no interesse do empregador, quando e como ele quer exigir, em sobrejornada e sem pagamento da hora simples! A regra desconhece e afronta o princípio constitucional da valorização social do trabalho. Valorizar trabalho significa, pelo menos, pagar salário por trabalho entregue!13 Além disso, ao pactuar o banco de horas, não estão os empregadores obrigados à observância do adicional de horas extras constitucio-nalmente previsto, pois a interpretação, gramatical e formalista, é de sua incidência

10 Constituição da República, art. 7º, IV. É preciso reconhecer que o conteúdo citado ainda está longe de ser integralmente efetivado, mas nos últimos anos tem havido, de modo inequívoco, políticas públicas que privilegiam uma aproximação da promessa constitucional com a realidade do cidadão trabalhador. Tal iniciativa governamental, entretanto, resulta menos efetiva nos contratos a tempo parcial.

11 Súmula nº 172. Repouso remunerado. Horas extras. Cálculo (mantida). Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Computam-se no cálculo do repouso remunerado as horas extras habitualmente prestadas.

12 É bem verdade que não há, como regra geral, provocação da Advocacia. Quando há processo judicial a respeito de trabalho em sobrejornada, o que se pede, normalmente, é o pagamento, sem teses outras que levassem o Poder Judiciário a uma melhor postura interpretativa da norma constitucional.

13 É claro que as horas trabalhadas em sobrejornada creditadas no banco de horas serão compensadas posteriormente com folga, oportunidade em que será mantido integralmente o salário, muito embora não tenha sido implementada a quantidade-padrão de 220 horas. Tal compensação, entretanto, não justifica que em um mês haja trabalho sem pagamento.

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apenas quando há o pagamento da hora extraordinária, não sendo devido quando há compensação.

É urgente que o Poder Judiciário compreenda finalmente, agora premido pela Reforma Trabalhista, que os limites constitucionais de 8 horas diárias e 44 semanais não devem ser inobservados ordinariamente, sob pena de haver flexibilização de regras referentes à saúde e à segurança do trabalhador, que tinham até então a ca-racterística da indisponibilidade.

Diante do exposto, uma dura conclusão se impõe: antes mesmo da Refor-ma Trabalhista, o direito do trabalho servia mais aos interesses do patrão do que à proteção do empregado. Havia, entretanto, uma face protetiva importante, ainda que comparativamente diminuta, que agora é mitigada pela alteração normativa. Se antes havia um direito do trabalho caracterizado como mínimo, agora o que resta é um direito do capital, potencializado perigosamente.

2 O CENÁRIO POLÍTICO DA REFORMA TRABALHISTA

Ainda que o presente estudo privilegie os aspectos jurídicos da Reforma Tra-balhista, não é possível compreender como foi possível tanta mudança em tão pou-co tempo se não se fizer breve análise do cenário político vivenciado pelo Brasil atualmente.

De início, importante análise de Wanderlei Guilherme dos Santos:

Na realidade, como é notória, a decepção do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e associados foi profunda e democraticamente letal. Conduzidos desde o dia seguinte à apuração dos votos, pelo candidato presidencial derrotado Aécio Neves, eles percorreram o trajeto histórico dos antigos golpistas: primeiro acusaram os vito-riosos de fraude eleitoral, depois de corrupção. Reprise da eleição de 1950, de Vargas, e da de JK em 1955. E bandeira gêmea do anticomunismo de 1964. Aécio propôs a flâmula do impedimento, aceita de imediato pelo Partido Popular Socialista (PPS) de Roberto Freire e, gradativamente, pelos demais membros do PSDB e Democratas (DEM), terminando por contaminar todas as frações inconformadas das demais ban-cadas da Câmara dos Deputados. Quando a esquerda despertou, diante da adoção da derrotada agenda direitista, era tarde. A enorme coalização a favor do impedimento estava soldada, inclusive com partidos que participavam do Ministério até a véspera da votação, na Câmara dos Deputados, da autorização dada ao Senado Federal para iniciar o processo de impedimento.14 (SANTOS, Wanderley Guilherme dos. A demo-cracia impedida. Ed. FGV, 2017, p. 45/46)

Como posto pelo ilustre Professor Wanderley Guilherme dos Santos, tenta--se, ao longo da história brasileira, o impedimento periódico da democracia. O golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016 não difere, no essencial, daqueles ha-vidos nas décadas de 50, Getúlio Vargas e JK, de 60, João Goulart e, agora, Dilma.

14 SANTOS, Wanderley Guilherme dos. A democracia impedida. Rio de Janeiro: FGV, 2017. p. 45-46.

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Os integrantes da classe dominante (industriais, comerciantes, banqueiros, rentistas, ruralistas, herdeiros de fortunas, proprietários de mídia) não toleram o pro-gresso econômico, social e cultural da classe proletária e dos demais vulneráveis.

Os ricos procuram acumular e apropriar ao máximo, sem qualquer solida-riedade com os mais vulneráveis e se recusam a partilhar, o mínimo que seja, os resultados dos processos produtivos e extrativos das riquezas nacionais. Até parece que levarão para seus túmulos o que não puderam esbanjar.

Vivemos em um país onde a diferença entre classes sociais é absurda e pou-cos detêm a maior parcela das riquezas, em detrimento de milhões.

A estrutura política é resultante da estrutura econômica. Os donos dos meios de produção e do poder econômico são donos reais do poder político dominante.

No parlamento federal brasileiro, Câmara dos Deputados e Senado, como também nos estados e municípios, os ricos e seus prepostos preponderam. A re-lação é absurdamente desigual e desproporcional. Em que pese sejam minoria no conjunto da população, constituem maioria na estrutura parlamentar, do Executivo e do Judiciário.

Os pobres são maioria na população nacional e minoria nas casas legislati-vas. Em 2016, após consecutivas vitórias nas urnas em 2002 e 2006 com o Presi-dente Lula e em 2010 e 2014 com a Presidenta Dilma, a democracia brasileira foi novamente impedida por um golpe.

Os vencidos no processo democrático, liderados pelo PSDB, tornaram-se vencedores com a usurpação do poder.

O apoio dos meios oligopolizados de comunicação (TVs, jornais, revistas, portais na internet), somados com a falsa imparcialidade do Poder Judiciário e apoio do Ministério Público Federal, manipulados e instrumentalizados pelo imperialismo econômico e político dos Estados Unidos da América, levaram ao poder um gru-po corrupto e hipócrita de políticos que se prestam ao desmonte das poucas mas importantes conquistas dos governos Lula e Dilma em prol dos desfavorecidos e vulneráveis.

A esquerda brasileira no congresso nacional não se deu conta antecipada da falsidade dos chamados partidos de centro, não ideológicos mas fisiológicos extremados, que mudaram de lado e retiraram o apoio ao projeto vencedor em 2014. PMDB, PSD, PSB, PP, PPR, PTB e outros que participavam do governo Dilma simplesmente traíram.

O golpe de 2016, parlamentar-jurídico-midiático-externo, não foi perpetrado de supetão e como ato instantâneo. Começou bem antes. O processo golpista no Brasil, a rigor, é contínuo, permanente e sempre consumado quando a classe domi-nante sente-se minimamente ameaçada.

A democracia brasileira é ainda frágil e submetida aos caprichos dos ricos, os donos do poder.

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As instituições, Poder Judiciário e MP, que deveriam garantir a vontade das urnas, não exerceram seus papéis com a dignidade, firmeza e adequação justifica-damente esperados.

A traição e a hipocrisia são marcas registradas da atual geração política do-minante, sempre ajudados e manipulados por interesses estrangeiros. Corruptos e corruptores fazem discursos inflamados em nome da ética e da honestidade mesmo quando líderes seus são pegos em flagrante delito.

Redes de televisão, golpistas, fecham os olhos e câmeras em face da compra de votos nas comissões parlamentares e votações de projetos de leis dirigidas à pro-teção de seus próprios interesses. Sonegam, mas se sentem no direito de denunciar sonegadores. Hipócritas e falsos moralistas acusam os corruptos e esquecem os cor-ruptores, que são, regra geral, seus patrocinadores. Tentam iludir o povo brasileiro, mas, com as redes sociais, torna-se cada vez mais difícil ou impossível tal tarefa.

As questões do petróleo e energia em geral, da geopolítica, do sistema fi-nanceiro internacional, das novas tecnologias e do consequente novo imperialismo permeiam as estruturas econômica e política das nações e, em especial, do Brasil.

O golpe de 2016, que continua em execução, insere-se neste contexto e visa a atender exclusivamente aos privilegiados e interesses estrangeiros.

As reformas trabalhista e previdenciária só interessam àqueles que não sofre-rão prejuízos e, ao contrário, aumentarão seus lucros privados. Os patrões, de forma direta ou por prepostos, lamentavelmente dominam as instituições (parlamento, Ju-diciário, MP, mídia) que deveriam zelar pela democracia, mas que, a rigor, militam por seu impedimento. Tristes trópicos. Triste geração humana.

De toda sorte, a luta pela democracia real e não apenas formal merece con-tinuar. Não há outro caminho que leve o povo ao poder. Como falou Guimarães Rosa, “o correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta, o que ela quer da gente é coragem”. Nada é permanente. Tudo flui. O cipó de aroeira voltará no lombo de quem mandou dar, como nos lembra o poeta compositor Geraldo Vandré em sua música “Aroeira”, mais atual do que nunca. Quem viver, verá. Quem puder, resistirá, ainda que no âmbito da interpretação jurídica da “Reforma Trabalhista”.

3 A PREVALÊNCIA DO NEGOCIADO COLETIVAMENTE SOBRE O LEGISLADO

A mais destacada proposta apresentada originalmente pelo Poder Executivo no âmbito da Reforma Trabalhista era a que se refere à prevalência do negocia-do coletivamente sobre o legislado. Ocorre que, durante a tramitação do texto na Câmara dos Deputados, o tema perdeu centralidade, mas merece análise por sua relevância para o direito do trabalho.

De início vale lembrar que, no sistema juslaboral brasileiro, não havia hie-rarquia entre normas trabalhistas. Não se aplicava, no ramo jurídico especializa-do, a pirâmide hierárquica própria do direito civil. O Professor Maurício Godinho

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Delgado destaca como operava o critério normativo hierárquico vigorante no direi-to do trabalho até então:

[...] a pirâmide normativa constrói-se de modo plástico e variável, elegendo para seu vértice dominante a norma que mais se aproxime do caráter teleológico do ramo justrabalhista. À medida que a matriz teleológica do direito do trabalho aponta na direção de conferir solução às relações empregatícias segundo um sentido social de restaurar, hipoteticamente, no plano jurídico, um equilíbrio não verificável no plano da relação econômico-social de emprego –, objetivando, assim, a melhoria das con-dições socioprofissionais do trabalhador –, prevalecerá, tendencialmente, na pirâmide hierárquica, aquela norma que melhor expresse e responda a esse objetivo teleológico central justrabalhista. Em tal quadro, a hierarquia de normas jurídicas não será estática e imutável, mas dinâmica e variável, segundo o princípio orientador de sua configu-ração e ordenamento.15

No plano do direito individual do trabalho, o princípio básico à compreen-são da ausência de hierarquia normativa era o da norma mais favorável, que tende a privilegiar a aplicação da norma que melhor consulte aos interesses jurídicos do tra-balhador empregado, independentemente da pirâmide normativa clássica civilista.

No plano do direito coletivo do trabalho, que é o que interessa na discussão aqui proposta, o princípio básico à compreensão da aplicação normativa é o da adequação setorial negociada.

A pergunta que se impunha e agora perde um pouco de seu aspecto central era referente à possível preponderância, a priori, de uma norma jurídica autônoma sobre outra heterônoma ou vice-versa. Na linha doutrinária do Professor Maurício Godinho Delgado, o princípio da adequação setorial negociada trata dos “critérios de harmonização entre as regras jurídicas oriundas da negociação coletiva (através da consumação do princípio de sua criatividade jurídica) e as regras jurídicas prove-nientes da legislação heterônoma estatal”16. Tal princípio resolveria, até a Reforma Trabalhista, as mais diversas situações fáticas:

Pelo princípio da adequação setorial negociada, as normas autônomas juscoletivas, construídas para incidirem sobre certa comunidade econômico-profissional, podem prevalecer sobre o padrão geral heterônomo justrabalhista, desde que respeitados cer-tos critérios autorizativos: a) quando as normas autônomas juscoletivas implemen-tam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta).17

Percebe-se que em cada caso concreto deveria o intérprete avaliar o con-fronto entre normas autônoma e heterônoma para decidir sobre a aplicação de uma

15 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 183.16 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 1595.17 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 1596.

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ou outra, atento ao princípio da adequação setorial negociada, sem que houvesse, sempre e aprioristicamente, a prevalência do negociado sobre o legislado.

O legislador reformador ignorou o princípio em análise, muito embora esteja tal valor em linha com a Constituição da República, como será visto. A leitura do disposto no novo art. 611-A da CLT mostra a tentativa do legislador em fixar uma preconcepção de preponderância da norma autônoma, pretendendo uma hierar-quia estática que até então inexistia. Por importante, eis a transcrição da regra:

Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:

I – pacto quanto à jornada de trabalho,observados os limites constitucionais;

II – banco de horas anual;

III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;

IV – adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015;

V – plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do em-pregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;

VI – regulamento empresarial;

VII – representante dos trabalhadores no local de trabalho;

VIII – teletrabalho, regime de sobreaviso,e trabalho intermitente;

IX – remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo emprega-do, e remuneração por desempenho individual;

X – modalidade de registro de jornada de trabalho;

XI – troca do dia de feriado;

XII – enquadramento do grau de insalubridade;

XIII – prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autori-dades competentes do Ministério do Trabalho;

XIV – prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em pro-gramas de incentivo;

XV – participação nos lucros ou resultados da empresa.

§ 1º No exame da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho observará o disposto no § 3º do art. 8º desta Consolidação.

[...]

É sempre importante lembrar que a regra celetista, original ou reformada, deve ser interpretada em conformidade com a Constituição da República. Sendo assim, o novo art. 611-A não tem o condão de afastar a origem constitucional do princípio da adequação setorial negociada. Trata-se da preservação do princípio independentemente da regra.

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O legislador, preocupado com o que fez e consciente de suas arbitrarieda-des, tentou limitar a atuação da Justiça do Trabalho ao criar a nova regra do § 3º do art. 8º da CLT, também mencionado no § 1º do seu art. 611-A. Fixa a regra, incons-titucionalmente, que,

no exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Traba-lho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na auto-nomia da vontade coletiva.

Pretendeu o legislador reformador estabelecer a hierarquia entre as normas jurídicas e afastar do Poder Judiciário o poder/dever de avaliar seu conteúdo, em clara afronta ao disposto no art. 5º, XXXV. O legislador imaginou restringir a análise do Poder Judiciário aos requisitos de validade do negócio jurídico (agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei), mas se “esqueceu” da norma constitucional que estabelece claramente que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

A situação é tão simples que nem demanda análise mais aprofundada. Se a norma de ACT ou CCT ameaça ou atinge direitos trabalhistas, cabe ao Poder Judi-ciário fixar sua aplicação ou não no caso concreto, o que se dará com a aplicação do princípio da adequação setorial negociada, que tem respaldo constitucional, como explica Maurício Godinho Delgado:

Estão bem claros, dessa maneira, a lógica e o sentido da ordem constitucional bra-sileira relativamente aos poderes e limites da negociação coletiva trabalhista: esta constitui veículo para o aperfeiçoamento da ordem jurídica, em harmonia aos prin-cípios e regras constitucionais fundamentais – jamais um mecanismo de desprestí-gio ou precarização dessa ordem jurídica e das relações socioeconômicas por ela regulamentadas.

[...]

Em síntese, a negociação coletiva trabalhista concerne a poder inerente à sociedade civil e que é amplamente reconhecido e respeitado pela ordem jurídica do País, inclu-sive a constitucional. Porém, não se trata de poder absoluto, incontrolável e avassala-dor, ou seja, inusitado tipo de super poder que ostente a prerrogativa de atuar no sen-tido antitético às próprias conquistas firmadas pela Constituição da República, pelas Convenções Internacionais da OIT ratificadas pelo Estado Brasileiro e pela legislação heterônoma estatal da República Federativa do Brasil.18

O Poder Judiciário trabalhista vai, sim, analisar o mérito de ACT e CCT inde-pendentemente do que pretende o disposto no art. 611-A da CLT, pois acima dele está o disposto no art. 5º, XXXV, da Constituição da República.

Em tese inicial, é até admissível que se perceba, no art. 611-A da CLT, uma presunção de prevalência do negociado sobre o legislado, mas tal somente se con-

18 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 1599 e 1601.

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firmará no caso concreto com a análise de mérito do conteúdo de ACT e CCT em confronto com a norma jurídica heterônoma, ou seja, com a aplicação do princípio da adequação setorial negociada.

4 NOVAS POSSIBILIDADES DE “NEGOCIAÇÃO INDIVIDUAL”

Muito se discutiu ao longo dos últimos meses sobre a polêmica proposta de prevalência do negociado sobre o legislado, como visto no item anterior. Ocorre que a Reforma Trabalhista foi além da negociação coletiva, criando diversas possi-bilidades de negociação individual que certamente trarão prejuízos aos direitos dos trabalhadores.

A Reforma Trabalhista, na prática, acaba por mitigar a noção de hipossufi-ciência, pois em diversos dispositivos pressupõe igualdade contratual e jurídica en-tre empregados e empregadores. Fossem outros os verdadeiros autores da reforma, seria possível pensar em equívoco, mas, vendo a pauta da CNI, por exemplo, perce-be-se, com clareza, de que a ideia é a da maior aproximação da relação de emprego com o direito civil. O que se busca, ainda que a médio prazo, é a transformação do contrato de trabalho em um contrato comum, típico do direito civil.

O direito do trabalho sempre foi informado pelo princípio da imperatividade das normas trabalhistas, bem como teve desde 1943 como regra básica celetista a inalterabilidade contratual lesiva. A Reforma Trabalhista parece desconhecer tanto o princípio quanto a regra, pois permite que a negociação individual prejudique os interesses do trabalhador no contrato, tanto no momento da admissão quanto em seu curso.

Se é difícil aceitar a ideia de prevalência do negociado coletivamente so-bre o legislado, é quase impossível compreender como justrabalhistas alguns novos dispositivos celetistas, conforme será visto. Parece que o legislador reformador não conhece a ideia de subordinação jurídica. Não conhece o que é o temor do desem-prego. Nunca viu de perto a face da fome. Somente tal ignorância com relação à realidade fática justifica permitir que o empregado possa, individualmente, negociar condições de trabalho que certamente lhe serão piores do que as atuais e abaixo do que hoje se compreende como patamar civilizatório mínimo.

A livre estipulação de cláusulas trabalhistas e a “livre” manifestação da von-tade do empregado no contrato são, hoje, dogmas patronais desconectados com a realidade fática. O empregado, por ser subordinado ao patrão e quase sempre de-pendente economicamente do emprego, não tem a mesma potencialidade negocial que tem o empregador. Isso é óbvio em qualquer lugar do mundo que adote o capi-talismo como sistema econômico. Ora, no capitalismo há quem manda e há quem obedece, sendo a relação subordinada uma expressão do sistema. Não é possível pressupor igualdade negocial com subordinação jurídica. Mas a insistência patronal começa a produzir frutos. Facilmente perceptível, também aqui, a influência direta da CNI na Reforma Trabalhista. Apenas exemplificativamente o seguinte quadro.

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QuadRo 3 – novas possibilidades na negociação individual:

Tema Proposta CNI Nova regra CLT

Banco de horas Proposta 9 da CNI Art. 59, § 5ºCompensação mensal de jornada

Proposta 9 da CNI Art. 59, § 6º

Sistema 12 x 36 Súmula nº 444 do TST Art. 59-AAlteração do contrato: presencial para teletrabalho

- Art. 75-C

Disposições sobre infraes-trutura para teletrabalho

- Art. 75-D

Parcelamento das férias em 3 períodos

Proposta 51 da CNI Art. 134, § 1º

Horário de intervalo especial da lactante

- Art. 396, § 2º

Livre estipulação: curso superior e salário “razoável”

Proposta 02 da CNI Art. 444, parágrafo único

Acordo para extinção do contrato

Proposta 78 da CNI Art. 484-A

Arbitragem: curso superior e salário “razoável”

Proposta 82 da CNI Art. 507-A

Termo de quitação anual de obrigações trabalhistas

- Art. 507-B

Fonte: Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

Talvez a maior expressão do poder da CNI sobre a Reforma Trabalhista seja o disposto no novo parágrafo único do art. 444 da CLT. Seu conteúdo é o seguinte:

Art. 444. As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das auto-ridades competentes.

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Já em 2012, a CNI manifestava-se sobre o assunto e apontava o que denomi-nava irracionalidade da CLT:

A legislação trabalhista nacional, quando constituída, foi pautada em princípios de proteção aos trabalhadores em razão da sua condição de hipossuficiência em relação aos empregadores. Entretanto, essa situação se modificou no decorrer dos anos. A hipossuficiência já não ocorre, especialmente no caso dos cargos de gestão, como gerentes, diretores e profissionais altamente especializados e com altos salários. Esses profissionais, fortemente disputados no mercado de trabalho, possuem ampla condi-ção de negociar as cláusulas dos seus contratos de trabalho, melhor adequando-as em seu benefício e do empregador, a exemplo de uma jornada mais flexível. Para eles, não se justifica a necessidade de manutenção de uma legislação rígida e detalhada.

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Nos dias atuais, é mais adequado permitir que esses trabalhadores pactuem direta-mente com seus empregadores as suas cláusulas contratuais mediante negociação individual.19

A hipossuficiência, para a CNI, não decorre da posição de empregado. Não decorre de subordinação jurídica. Nos termos fixados no parágrafo único do art. 444 da CLT, a hipossuficiência estaria afastada nos casos em que o empregado com curso superior receba salário igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do RGPS, o que hoje (2017) corresponde a R$ 11.062,62. É quase doze vezes o valor do salário-mínimo, mas é um salário apenas “razoável”.

Nos termos da leitura (e não interpretação) do parágrafo único do art. 444 da CLT, poderia o empregado com curso superior e salário “razoável” negociar diretamente com o empregador no mesmo plano que negocia o sindicato: banco de horas, intervalo intrajornada de 30 minutos, teletrabalho, sobreaviso, remunera-ção, prêmio, insalubridade, PLR. Ora, não é difícil imaginar qual será o argumento do empregador quando o empregado aqui destacado for negociar. O argumento provavelmente será o salário já “razoável” recebido pelo empregado, que não ne-cessitaria nada mais além dele. Por absurdo que possa parecer, será um sério risco para o empregado brasileiro ultrapassar a barreira dos onze mil reais mensais, pois isso poderá significar ter que abrir mão de direitos hoje garantidos e infensos à ne-gociação individual.

5 INCONSTITUCIONALIDADES DA REFORMA TRABALHISTA

A tramitação da Reforma Trabalhista no Congresso Nacional foi algo sui generis e sua mancha deixará reflexos perenes na vida brasileira, mas não cabe neste ponto maior detalhamento de seus absurdos. Vale, entretanto, lembrar que inconstitucionalidades foram claramente identificadas durante a tramitação do PLC 38/2017 no Senado da República e os líderes do governo decidiram ignorar os ví-cios e partir para um acordo com o Presidente da República, que se comprometeu a vetar alguns pontos. É inequívoco que o Senado da República abriu mão de seu papel de casa revisora para acelerar a aprovação do texto. O que se espera é que a classe trabalhadora possa retribuir a cada um deles, nas futuras eleições, o prejuízo que ela irá suportar em razão de sua omissão.

Ao presente estudo interessam levantar algumas várias inconstitucionali-dades que ainda permaneceram após a sanção presidencial e publicação da Lei nº 13.467/2017. As principais estão aqui apresentadas e têm por base os debates realizados no âmbito do Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP20 du-rante todo o primeiro semestre letivo do ano de 2017. Há uma escolha, no presente artigo, pela restrição da análise aos temas de direito material do trabalho.

19 CNI. Op. cit.20 Análise inicial do PL 6.787/2016, posteriormente do PLC 38/2017 e, ao final, dos termos da Lei

nº 13.467/2017, o que resultará, em breve, em livro com análise de cada dispositivo da Reforma Trabalhista, sempre em perspectiva crítica, constitucional e em defesa da classe trabalhadora.

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O Brasil escolheu, em 1988, elevar os direitos constitucionais trabalhistas ao status de direitos fundamentais sociais. Tal escolha deve, hoje e sempre, balizar a interpretação da norma infraconstitucional trabalhista, obviamente. É importante compreender que o cidadão, dentre eles o trabalhador, é hoje o centro do ordena-mento jurídico e que as demais regras legais devem ser interpretadas e aplicadas tendo tal valor como norteador da análise.

O direito do trabalho está também no centro do ordenamento jurídico cons-titucional. O Estado Democrático de Direito fixado em 1988 realiza-se na práti-ca, também, por meio da proteção justrabalhista. Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado destacam a importância do direito do trabalho no âmbito do Estado Democrático de Direito:

São impensáveis a estrutura e a operação prática de um efetivo Estado Democrático de Direito sem a presença de um direito do trabalho relevante na ordem jurídica e na experiência concreta dos respectivos Estado e sociedade civil. É que grande parte das noções normativas de democratização da sociedade civil (e, em certa medida, também do Estado), garantia da dignidade da pessoa humana na vida social, garantia da prevalência dos direitos fundamentais da pessoa humana no plano da sociedade, subordinação da propriedade à sua função social, garantia da valorização do trabalho na atividade econômica e do primado do trabalho e especialmente do emprego na ordem social, desmercantillização de bens e valores cardeais na vida socioeconômica e justiça laboral, em suma, grande parte das noções essenciais da matriz do Estado Democrático de Direito estão asseguradas, na essência, por um amplo, eficiente e incisivo direito do trabalho disseminado na economia e sociedade correspondentes.21

Diante de tal análise, já seria fácil defender a inconstitucionalidade de diver-sos dispositivos da Reforma Trabalhista, pois fundamentos da República foram ata-cados por regras decorrentes da Lei nº 13.467/2017. Não pretende o presente artigo, obviamente, esgotar toda a análise de constitucionalidade da Lei nº 13.467/2017. O comentário detalhado, artigo por artigo, será feito a tempo e modo. Mas já é possível, poucos dias após a publicação da lei, uma sinalização segura com relação às óbvias inconstitucionalidades de alguns dispositivos, sobretudo à luz do disposto nos arts. 5º, 7º e 8º da Constituição da República.

A escolha metodológica aqui, para facilitar a compreensão, será por breve análise dos dispositivos constitucionais que tornam as novas disposições celetistas inconstitucionais. Em seguida, quadros informativos auxiliarão na visualização das inconstitucionalidades claramente cometidas pelo legislador reformador. Outra es-colha metodológica é dividir as inconstitucionalidades em dois grupos. O primeiro apresenta as inconstitucionalidades nas normas celetistas que tratam de direitos in-dividuais trabalhistas. O segundo demonstra as inconstitucionalidades havidas em novas normas celetistas sobre o direito coletivo do trabalho.

21 DELGADO, Maurício Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. Constituição da República e direitos fundamentais: dignidade da pessoa humana, justiça social e direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 51.

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5.1 diReito individual do tRabalho e constituição da República: inconstitucionalidades da lei nº 13.467/2017

No que concerne ao direito individual do trabalho, as normas constitucionais mais inobservadas, nos termos específicos da presente análise, são as dos incisos IV, XIII, XXII do art. 7º. As regras constitucionais celetistas abaixo destacadas agridem direitos constitucionais sociais elementares: salário-mínimo, limite de jornada e re-dução dos riscos inerentes ao trabalho. Infelizmente, deve-se lembrar, conforme já exposto aqui no item 1, que o Poder Judiciário Trabalhista tem grande responsabi-lidade nisso, pois desde 1988 interpreta e flexibiliza a aplicação de regras constitu-cionais de modo impróprio.

Com relação ao salário-mínimo, é necessário que se insista na tese de que a regra do art. 7º, IV, impõe pagamento do valor fixado tendo como referência o mês, conforme já exposto no item 1 deste estudo. Não são constitucionais, desde muito tempo, por exemplo, as regras que tratam do trabalho em tempo parcial com paga-mento inferior ao valor do salário-mínimo mensal. São inconstitucionais as regras dos arts. 58-A, 443, § 3º e 452-A por permitirem pagamento de valores mensais in-feriores a R$ 937,00, independentemente do número de horas trabalhadas no mês22.

No que concerne ao art. 58-A, a inconstitucionalidade vem desde sua in-clusão na CLT no início dos anos 2000. A situação agora piora ao ser permitida a exigência de sobrejornada nos contratos em regime de tempo parcial. Sobre os arts. 443, § 3º e 452-A, a agressão à regra do salário-mínimo decorre da possibilida-de de receber o empregado, ao final do mês, menos de um salário-mínimo em seu contrato intermitente.

Repita-se, por importante, que salário-mínimo mensal, sem a proporcionali-dade da regra infraconstitucional, “fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às necessidades vitais básicas” do trabalhador “e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e pre-vidência social”, é conteúdo essencial do patamar mínimo e expressão básica do princípio da proteção. Qualquer regra infraconstitucional que permite pagamento parcial, ainda que proporcional, do salário-mínimo é inconstitucional.

No mesmo sentido também já sinalizada é a análise do descumprimento do disposto na regra constitucional do art. 7º, XIII. Trata-se de regra que impõe limite de jornada e não mera referência para pagamento ordinário. É inadmissível, por ser inconstitucional, qualquer regra celetista que permita jornada superior a 8 horas e disponibilidade semanal de trabalho acima de 44 horas. A leitura da regra constitu-cional deve ser a mais simples, direta e objetiva possível, para que se revele, assim, seu conteúdo fundamental. São inconstitucionais as regras dos arts. 59, 59-A e 62, III, da CLT.

No que diz respeito ao art. 59 da CLT, especialmente aqui seus novos §§ 5º e 6º, a inconstitucionalidade decorre da permissão legal de contratação de jornada

22 Salário-mínimo mensal em 2017.

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de 12 horas sem concessão de intervalo para alimentação e descanso. No mesmo sentido, o disposto no art. 59-A, que permite a contratação da jornada de 12 horas por mero ajuste bilateral (“acordo individual”). Nesse caso específico, não há sequer a possibilidade de o Poder Judiciário continuar insistindo na interpretação anterior, de que ACT e CCT podem violar o limite constitucional ordinariamente. Aqui o caso é de agressão à literalidade do texto constitucional, que exige ajuste normativo coletivo para elastecimento (extraordinário) da jornada23. Também já não teria sido recepcionado em 1988 o disposto no art. 62 da CLT, pois a regra constitucional não estabelece distinção entre empregados para efeito do limite de jornada. Sendo as-sim, a regra do inciso III do art. 62 é não só inconstitucional como injustificável, vez que o controle de jornada no teletrabalho é algo ordinário, perfeitamente factível e necessário para a preservação da saúde e da segurança do trabalhador.

Importante também que o Poder Judiciário reconheça a norma jurídica fun-damental consistente na obrigação patronal e estatal de promover a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, nos termos do inciso XXII do art. 7º da Constituição da República. Há pelo menos três regras celetistas que contrariam o dispositivo constitucional citado: arts. 60, pará-grafo único; 71, § 4º, e 394-A.

A regra do art. 60, parágrafo único, permite ao empregador exigir jornada acima do limite constitucional, em ambiente insalubre, sem que se submeta ele ao licenciamento prévio junto às autoridades competentes. A regra claramente expõe inconstitucionalmente o empregado a riscos não só decorrentes da jornada excessi-va, mas também do ambiente insalubre. A nova regra do art. 71, § 4º, permite que o empregador conceda intervalo intrajornada apenas parcialmente, sem ter a obriga-ção de indenizar integralmente o empregado em decorrência da inobservância do limite mínimo de uma hora. É inconstitucional por expor o trabalhador a riscos à saúde, principalmente mental, em decorrência de excesso de trabalho sem a pausa necessária. O art. 394-A, que não demanda maior esforço argumentativo no sentido de sua inconstitucionalidade, permite o trabalho da gestante em ambiente insalu-bre. Aqui a inconstitucionalidade revela-se por si só, pois agride fundamentos da República e normas constitucionais de proteção à saúde e à segurança da mulher e do nascituro.

Há na Lei nº 13.467/2016 agressão à regra do art. 7º, VIII e XVII, em pelo me-nos dois dispositivos celetistas: arts. 443, § 3º, e 452-A. Ambos tratam do trabalho intermitente. Há, no confuso dispositivo que conceitua e regulamenta a nova mo-dalidade contratual, clara abertura ao não pagamento e concessão de décimo ter-ceiro salário e férias. Basta que em nenhum dos “períodos de prestação de serviço” (art. 452-A, § 6º) seja superior a 14 dias em um mês. Poderá haver relação de em-prego em que o empregado não vai receber nunca décimo terceiro salário ou férias.

Ainda no que concerne ao art. 7º da Constituição da República, os importan-tes conteúdos jurídicos extraídos do seu caput e inciso I. Interpretação gramatical do

23 Sobre o tema, veja ALVES, Amauri Cesar. Limite constitucional de jornada, dano existencial e trabalho escravo. Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, v. 31, p. 153-186.

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disposto no art. 442-B levará à sua inconstitucionalidade. O legislador reformador parece pretender excluir da proteção trabalhista empregados em razão da simples formalização de um contrato autônomo. Tal não pode ser (e não será) obviamente a interpretação do dispositivo, mas a tentativa é clara de afastar a proteção estatal tra-balhista mediante simples formalidade. A tentativa do legislador agride o conceito de “empregado” consagrado constitucionalmente e em reiteradas decisões do STF.

Conforme já exposto no item 4 do presente estudo, há na Lei nº 13.467/2017 novas possibilidades de “negociação individual”, ou seja, sem a necessidade do crivo da negociação coletiva. Aqui se destaque apenas a regra do parágrafo único do art. 444 da CLT, que cria nova figura jurídica no direito do trabalho brasileiro. Ao permitir que o empregado que tenha formação superior e “salário razoável” ne-gocie diretamente com o empregador os temas fixados no art. 611-A da CLT, “com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos”, há clara afronta ao disposto no art. 7º, XXVI. Para tais trabalhadores, haverá o afastamento do disposto em negociações coletivas, o que é inconstitucional.

Por fim, há regras celetistas que contrariam o disposto no art. 5º da Constitui-ção da República. Parece desconhecer o legislador reformador o status de cidadão que também tem o trabalhador brasileiro. As regras dos arts. 456-A, 461 e 507-B são inconstitucionais por agressão a direitos fundamentais do cidadão.

O art. 456-A desconhece as normas constitucionais de proteção à imagem do cidadão trabalhador, em afronta ao disposto no art. 5º, X. Quer o legislador in-fraconstitucional tornar lícita a exploração da imagem do empregado por meio da veiculação de publicidade em seu uniforme, sem autorização prévia e pagamento. Já está suficientemente assentado doutrinária e jurisprudencialmente que a imposi-ção patronal de uso de uniforme com logotipos de outras empresas, sem que haja concordância do empregado e compensação econômica, viola o direito de imagem do trabalhador24. Não é possível que a lei ordinária altere a conclusão constitucio-nal já bem desenvolvida pelo Poder Judiciário.

O art. 461 da CLT merecerá um estudo apartado, pois, desde antes da Refor-ma Trabalhista, já merecia interpretação constitucional diferente daquela que lhe dá o Poder Judiciário25. Sinalize-se, aqui, desde já, um vergonhoso convite à desigual-dade fixado no seu novo § 2º, apenas para exemplificar, que permite o afastamento da equiparação salarial se o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira ou adotar, por meio de norma interna da empresa, plano de cargos e sa-lários, dispensada qualquer forma de homologação ou registro em órgão público. É, em apertada síntese, uma porta aberta à criatividade discriminatória do patrão, sem que se submeta previamente seu plano de cargos e salários ao crivo estatal ou negocial coletivo.

Apenas para melhor visualização do anteriormente exposto, segue quadro.

24 Exemplificativamente, veja a Súmula nº 35 do TRT da 3ª Região.25 Sobre o tema, veja ALVES, Amauri Cesar. Salário igual: argumentos para combater as discriminações de

gênero e cor. Belo Horizonte: RTM, 2017.

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QuadRo 4 – inconstitucionalidades das RegRas celetistas de diReito individual do tRabalho:

Tema Nova regra celetista Norma constitucional

Trabalho em tempo parcial e salário parcial

Art. 58-A Art. 7º, IV

Banco de horas por ajuste individual

Art. 59, §§ 5º e 6º Art. 7º, XIII

12 x 36 por ajuste individual Art. 59-A Art. 7º, XIII12 x 36 em local insalubre sem autorização

Art. 60, parágrafo único Art. 7º, XXII

Teletrabalho e limite de jornada

Art. 62, III Art. 7º, XIII

Pagamento parcial de intervalo suprimido

Art. 71, § 4º Art. 7º, XXII

Trabalho da gestante em ambiente insalubre

Art. 394-A Art. 7º, XXII

Contratação de autônomo Art. 442-B Art. 7º, caput e ITrabalho intermitente Art. 443, § 3º Art. 7º, IV, VIII, XVIIRelação de emprego com livre negociação

Art. 444, parágrafo único Art. 7º, XXVI

Trabalho intermitente Art. 452-A Art. 7º, IV, VIII, XVIIUniforme e direito de imagem

Art. 456-A Art. 5º, X

Equiparação salarial Art. 461 Art. 5º, caput

Fonte: Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

Infelizmente foram necessárias as rupturas da ordem democrática, do pro-cesso legislativo, do pacto silencioso capitalista de manutenção do status quo no modelo legislado brasileiro e do pudor patronal para que finalmente possa o Poder Judiciário Trabalhista assumir seu papel protagonista de afirmação do direito cons-titucional. É o que se espera26.

5.2 diReito coletivo do tRabalho e constituição da República: inconstitucionalidades da lei nº 13.467/2017

No que concerne ao direito coletivo do trabalho, já foi visto em item anterior que a Reforma Trabalhista tenta promover, nos termos da Lei nº 13.467/2017, a prevalência do negociado sobre o legislado. O tema já foi aqui discutido no plano da interpretação e da aplicação do princípio da agregação setorial negociada. A

26 Passados mais de vinte anos do surgimento da Constituição, já existe maturidade histórica, cultural e científica para se bem compreender suas diretrizes essenciais com respeito ao direito do trabalho. Na verdade, hoje se tem claro que a Constituição de 1988 produziu leitura e compreensão abrangentes do direito do trabalho na economia, na sociedade e na ordem jurídica brasileiras, destacando com clareza seu papel na sociedade política e na sociedade civil do País. (DELGADO, Maurício Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. Constituição da República e direitos fundamentais: dignidade da pessoa humana, justiça social e direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 51)

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estratégia, agora, é da afirmação das inconstitucionalidades das regras dos arts. 8º, 477-A, 611-A, 614 e 620 da CLT reformada.

De início, a regra do art. 8º, especificamente em seu § 3º. A nova regra cele-tista tentou estabelecer que,

no exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Traba-lho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na auto-nomia da vontade coletiva.

A análise de tal aberração jurídica merecerá também estudos outros, especí-ficos. Mas já é possível indicar, com absoluta tranquilidade, a óbvia inconstitucio-nalidade por violação direta, literal, da garantia fixada no inciso XXXV do art. 5º da Constituição da República. Está muito claro que restringir o “exame de convenção co-letiva ou acordo coletivo do trabalho” exclusivamente à “conformidade dos elemen-tos essenciais do negócio jurídico” contraria frontalmente a garantia que todo cidadão tem de submeter ao Poder Judiciário qualquer “lesão ou ameaça a direito”. Ora, se o trabalhador quiser submeter ao juízo trabalhista o mérito de ACT ou CCT, poderá e deverá fazê-lo, estando o Poder Judiciário livre para dizer o direito no caso concreto.

Outra inconstitucionalidade diz respeito ao art. 477-A da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017. Aqui o inconformismo dos poderosos atingiu a jurisprudência progressista do TST, fruto da aplicação do art. 8º da Constituição da República no que concerne às dispensas coletivas27. Pretendeu a Lei nº 13.467/2017 igualar a dispensa coletiva à dispensa individual. Ocorre que tal tentativa não se sustenta por alteração da regra infraconstitucional, como pretendido, pois a jurisprudência do TST sobre a matéria tem fundamentação constitucional. A imposição de negocia-ção sindical para validar dispensa coletiva decorre da norma contida no art. 8º, III, da Constituição da República, pois o impacto da medida exige a presença do ente coletivo obreiro para a definição de seus contornos, sendo a nova regra celetista do art. 477-A da CLT inconstitucional.

Inconstitucional também a regra do art. 611-A da CLT, analisada em síntese aqui. A inconstitucionalidade pode ser vista de dois prismas. A primeira análise pode ser feita regra a regra do dispositivo, identificando inconstitucionalidades na eleição de temas para receber a presunção de prevalência sobre a lei. Em razão da restrição de tempo e espaço, tal análise merece estudo próprio. Outra análise, aqui desenvolvida, tende a revelar a inconstitucionalidade da prevalência do negociado sobre o legislado enquanto novo instituto trazido pela Lei nº 13.467/2017.

27 “Nota-se, pois, que o acórdão prolatado pelo Tribunal Superior do Trabalho fixou a posição de que a dispensa coletiva pode ser objeto de controle pelo Poder Judiciário Trabalhista. Traçou, ainda, um entendimento inovador quanto a tal modalidade de dispensa, no sentido de que, para ser considerada válida, deve ser precedida de uma negociação coletiva, sob pena de surgir para a empresa a obrigação de reintegrar os empregados coletivamente dispensados.” (Tese de Doutorado do Prof. Cláudio Jannotti da Rocha)

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A ausência de hierarquia normativa no direito do trabalho já foi desenvolvida em item próprio e não necessitará, aqui, nova análise. Há de se destacar, agora, a violação ao disposto nos arts. 1º, III e IV; 3º, I a III; 7º a 11; 170 e 193, em atenção e adesão à proposta de veto apresentada pelo Ministério Público do Trabalho em documento enviado à presidência da república:

Do conjunto de princípios constitucionais protetivos do trabalho (C/1988, arts. 1º, III e IV, 3º, I a III, 7º a 11, 170 e 193) emana um mandamento de otimização da proteção social do trabalhador, do qual se extrai princípio interpretativo do direito do trabalho que orienta a aplicação da norma mais favorável à proteção social. Esse princípio se encontra densamente previsto nas regras do caput do art. 7º, que garante a melhoria da condição social do trabalhador, e no § 2º do art. 5º da Constituição, segundo o qual “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrente do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Fere a razoabilidade admitir-se que o Constituinte de 1988 haja proclamado a ne-gociação coletiva como direito fundamental do trabalhador (CF/1988, art. 7º, XXVI), para colocá-lo a salvo de investidas legislativas contra a liberdade de negociação coletiva, e que, ao mesmo tempo, haja reduzido esse direito a instrumento de redução de eficácia dos demais direitos fundamentais previstos no mesmo dispositivo (salário, jornada, gratificações, FGTS, férias, adicionais etc.). Tal interpretação conduziria a admitir-se direito fundamental dotado de mecanismo de autoflagelo, em negação à sua própria fundamentalidade, o que contradiz a racionalidade hermenêutica que se espera de toda a teoria de interpretação constitucional.28

A situação ainda piora se a leitura do art. 611-A da CLT se faz de modo com-binado com o disposto no § 3º de seu art. 8º, já aqui enfrentado. A prevalência do negociado sobre o legislado, nos termos fixados pela Lei nº 13.467/2017, embora te-nha aparência de algo democrático, revela tentativa dos detentores do poder de forçar a negociação coletiva para patamares abaixo do que hoje se entende como mínimo civilizatório. Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado esclarecem que a Constituição da República “sepultou o debate acerca do paradigma mais adequado para o Brasil (isto é, o modelo jurídico legislado versus o modelo jurídico negociado), realizando enfática escolha pelo modelo legislado de regulação trabalhista”29.

Importante reafirmar que não há prevalência entre regras jurídicas autôno-mas e heterônomas ou conjuntos normativos, ressalvada apenas a preponderância da Constituição da República, mas que há, histórica e constitucionalmente, opção pelo modelo legislado de regulamentação trabalhista, que admite a negociação co-letiva em complemento à lei, harmonicamente, sem preponderância.

A mesma justificativa lançada acima, em perspectiva constitucional, vale para a nova regra celetista do art. 620 da CLT, pois não pode haver, aprioristica-mente, prevalência entre ACT e CCT.

28 MPT. Pedido de veto total ou parcial do Projeto de Lei da Câmara nº 38/2017. Disponível em www.mpt.gov.br.29 DELGADO, Maurício Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. Op. cit., p. 51.

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Por fim, vale aqui, também brevemente, reafirmar a ultratividade das nor-mas trabalhistas em perspectiva constitucional, em sentido contrário ao disposto no novo art. 614 da CLT.

Acordos coletivos de trabalho e convenções coletivas de trabalho veiculam essencialmente normas jurídicas, muito embora a fonte de produção da norma seja privada, de matriz contratual (ajuste autônomo de vontades). Assim, havendo normas jurídicas aplicáveis aos contratos de emprego (autônomas ou heterôno-mas), independentemente do prazo de vigência de ACT ou CCT, somente outra norma jurídica posterior pode alterar o conteúdo do direito trabalhista. A nego-ciação coletiva cria norma jurídica (ACT, CCT), vez que vincula, genericamente, toda a categoria (patrões e empregados), ainda que não tenham os sujeitos repre-sentados, isoladamente, firmado o compromisso coletivo. É norma geral e abstrata e não cláusula contratual específica, concreta e pessoal, como ocorre no ajuste individual.

Tal compreensão da natureza jurídica da norma decorrente de negociação coletiva afirma a inconstitucionalidade do disposto no art. 614 da CLT em razão de ofensa ao disposto nos arts. 7º, XXVI e 8º, VI, da Constituição da República. A vedação da ultratividade, expressamente afirmada na nova regra celetista, acaba por excluir do contrato de emprego a aplicação de normas jurídicas sem que outra norma o faça, o que nega o direito ao reconhecimento dos termos de ACT e CCT (art. 7º, XXVI, da CR) e a necessidade de nova negociação coletiva para a fixação de novas normas jurídicas autônomas (art. 8º, VI, da CR).

Eis o quadro com a essência do que aqui foi exposto no plano do direito coletivo do trabalho.

QuadRo 5 – inconstitucionalidades das RegRas celetistas de diReito coletivo do tRabalho:

Tema Regra celetista Norma constitucional

Restrição da análise de ACT e CCT

Art. 8º, § 3º CR, art. 5º, XXXV

Dispensa coletiva Art. 477-A CR, art. 8º, IIIPrevalência do negociado sobre o legislado

Art. 611-A CR, arts. 1º, III e IV; 3º, I a III; 7º a 11; 170 e 193

Vedação da ultratividade de ACT ou CCT

Art. 614 CR, arts. 7º, XXVI e 8º, VI

Prevalência de ACT sobre CCT

Art. 620 CR, arts. 1º, III e IV; 3º, I a III; 7º a 11; 170 e 193

Fonte: Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da UFOP.

As análises sobre a constitucionalidade da Lei nº 13.467/2017 seguirão nos próximos anos. A expectativa, agora, é que o TST e o STF inaugurem nova interpre-tação sobre a aplicação das regras celetistas, sempre na perspectiva de sua confor-midade com a Constituição da República.

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6 CENÁRIOS POSSÍVEIS NO NOVO “DIREITO DO CAPITAL”

Embora o Brasil seja um país em que previsões são quase sempre difíceis, é possível contemplar pelo menos três possibilidades de cenário para esse novo “di-reito do capital” que se pretende inaugurar após a Lei nº 13.467/2017. O primeiro, catastrófico para a classe trabalhadora e expressão maior da realização do projeto de poder patronal, é que haja a franca e incontrastável aplicação dos novos conteú-dos celetistas. O segundo, em sentido contrário, é que haja finalmente uma revolu-ção proletária no país, fruto da ruptura do pacto silencioso fundamentado até então no sistema estatal de proteção trabalhista. Ocorre que nenhum dos dois cenários é provável. Certo é supor que haverá uma forte corrente jurídica de interpretação res-tritiva, de perspectiva constitucional, dos principais pontos da Reforma Trabalhista. Importante, então, desenvolver brevemente tais cenários.

A síntese do primeiro cenário é o empobrecimento da classe trabalhadora brasileira e, consequentemente, de todo o país. Já está mais do que comprovado, no Brasil e no mundo, que restringir direitos trabalhistas, não obstante possa gerar economia para o empregador em um primeiro momento, não gera empregos. A dé-cada neoliberal é prova objetiva disso30. Em sentido contrário, ou seja, sem reformas trabalhistas precarizantes, o país cresceu e gerou milhões de empregos no período 2004-2014, com distribuição de renda e dias melhores para a imensa maioria da classe trabalhadora31. Partindo de tal premissa, o que vai acontecer ao trabalhador brasileiro caso não haja freios de interpretação e aplicação da Lei nº 13.467/2017 é a exacerbação da sua vulnerabilidade social. A consequência óbvia e até esperada por alguns é a ampliação do abismo econômico entre ricos e pobres, o que piora a inserção do trabalhador no mercado de consumo e, ao final, trará impacto também nos ganhos dos empregadores. O empobrecimento da população refletirá nas ven-das e nos lucros de muitos dos que hoje comemoram a nova legislação.

A síntese do segundo cenário é uma convulsão social decorrente de um dos efeitos do primeiro, que é o empobrecimento geral da classe trabalhadora. Dentre os três cenários aqui destacados, este é o mais difícil de se concretizar. Parece que a natureza pacífica do trabalhador, tão decantada por Getúlio Vargas, acabou por ser mesmo uma característica inafastável da gente brasileira. Mas é fato que a Refor-ma Trabalhista foi rejeitada pela imensa maioria da população. Manifestaram-se de modo inequívoco e quase unânime as centrais sindicais, a Igreja Católica, a OAB, o MPT, a Magistratura (incluindo parte significativa do TST) e estudantes. Ocorre que, até o momento, a insatisfação é pacífica, pois os piores efeitos só serão sentidos pelos trabalhadores no médio prazo. Assim, quando a pobreza começar a chegar onde nunca esteve, talvez haja a ruptura com o modelo de capitalismo sem freios que se aplica hoje no Brasil.

30 Sobre o tema, ver CARDOSO, Adalberto Moreira. A década neoliberal e a crise dos sindicatos no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003; ALVES, Amauri Cesar. Função capitalista do direito do trabalho no Brasil. Revista LTr, São Paulo: LTr, a. 77, set. 2013.

31 Sobre o tema, ver ALVES, Amauri Cesar. Pluralidade sindical. São Paulo: LTr, 2015, especialmente capítulo 4.

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O mais provável, como já antecipado, é que haja resistência à Lei nº 13.467/2017 no plano de sua interpretação e aplicação. Em síntese, dois mo-dos de enfrentamento são possíveis no terceiro cenário aqui proposto: interpretação restritiva da Reforma em perspectiva constitucional e a construção de novas estra-tégias interpretativas do direito do trabalho a partir da Reforma. Não são os dois modelos necessariamente excludentes, mas, sim, caminhos para um mesmo rumo, que é o da restrição dos efeitos nocivos das medidas precarizantes fixadas pela Lei nº 13.467/2017. No primeiro modelo, a estratégia já é suficientemente conhecida e deve ser sempre aplicada, pois privilegia a Constituição da República como ápice do ordenamento jurídico e óbice às construções normativas que lhe sejam con-trárias. O segundo modelo não refuta o primeiro, obviamente, e permite construir novas estratégias interpretativas a partir do conteúdo da Lei nº 13.467/2017, uma vez que ela tenta fixar novos contornos de aplicação do direito do trabalho no Brasil. São, neste caso, novas respostas para novos ataques do capital sobre o tra-balho.

Com relação à interpretação constitucional da Lei nº 13.467/2017, a propos-ta é relativamente simples, já foi apresentada em itens anteriores e será aqui resumi-da. Toda regra legal, para ser interpretada e aplicada, deve ser submetida ao crivo da sua compatibilidade com a Constituição da República. Também importante que o intérprete, ao aplicar a norma, oriente “seu sentido e alcance à realização dos fins constitucionais”32. Significa dizer que a Constituição “figura hoje no centro do sis-tema jurídico, de onde irradia sua força normativa, dotada de supremacia formal e material”33. Ao aplicar a Lei nº 13.467/2017, deve-se ter sempre como fundamento a Constituição da República, que “funciona, assim, não apenas como parâmetro de validade para a ordem infraconstitucional, mas também como vetor de interpreta-ção de todas as normas do sistema”34.

A proposta de novas respostas interpretativas para o mais recente e grave ataque do capital sobre a proteção trabalhista ensejará estudos futuros, mas pode ser aqui sinalizada resumidamente. A ideia central é estruturar, no plano justrabalhista, aplicações hermenêuticas para o conceito de vulnerabilidade. A reafirmação do direito do trabalho (e a consequente limitação do direito do capital) como instru-mento de justiça social passa por uma nova epistemologia que busque reestruturar a atuação do Estado e da sociedade no plano da regulação de trabalho após a ruptura provocada pela Reforma Trabalhista. Novas teorias justrabalhistas devem ser de-senvolvidas a partir da Lei nº 13.467/2017, seja no plano da interpretação, seja no âmbito da efetivação do direito. O desenvolvimento do conceito de vulnerabilidade pode trazer respostas a problemas práticos já vivenciados hoje e que tendem a se agravar em futuro próximo.

32 BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito (O triunfo tardio do direito constitucional do Brasil). In: SARMENTO, Daniel; GALDINO, Flávio. Direitos fundamentais: estudos em homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 227-228.

33 BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., p. 227-228.34 BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., p. 227-228.

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REFERÊNCIAS

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______. Pluralidade sindical. São Paulo: LTr, 2015.

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CARDOSO, Adalberto Moreira. A década neoliberal e a crise dos sindicatos no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003.

CNI. 101 propostas para modernização trabalhista. Brasília: CNI, 2012.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, 2016.

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______; DELGADO, Gabriela Neves. Constituição da República e direitos fundamen-tais: dignidade da pessoa humana, justiça social e direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2017.

MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Os pilares do direito do trabalho – Princípios e sua densidade normativa. Revista LTr, v. 76, n. 07, jul. 2012.

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SANTOS, Wanderley Guilherme dos. A democracia impedida. Rio de Janeiro: FGV, 2017.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista e Sua Aplicação nos Contratos em Vigor

LuíS RODOLFO CRuz E CREuzAdvogado e Consultor em São Paulo, Sócio de Cruz & Creuz Advogados, Doutorando em Di-reito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP, Mestre em Relações Internacionais pelo Programa Santiago Dantas, do convênio das Universidades Unesp/Unicamp/PUC-SP, Mestre em Direito e Integração da América Latina pelo Prolam – Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo – USP, Pós-Graduado em Direito Societário – LLM – Direito Societário, do Insper (São Paulo), Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.

DAnIELA WAgnER Advogada, Pós-Graduanda em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica – PUC-Minas, Especialista em Propriedade Intelectual pela World Intellectual Property Organization (WIPO), Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP.

RESUMO: O objetivo deste estudo é avaliar uma importante alteração legislativa ocorrida no Brasil e introduzida especialmente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) por meio da Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Dentre vários debates e polêmicas que acompanham a lei, pretendemos con-textualizar a sua tramitação, que veio acompanhada de outros notáveis projetos de lei, igualmente controvertidos. Ademais, analisaremos se a nova lei poderá ser aplicada aos contratos que já estão em vigor, à luz dos princípios do direito do trabalho e da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Ao final, à guisa de conclusão, apresentamos nossos comentários derradeiros acerca do estudo realizado.

PALAVRAS-CHAVE: Lei nº 13.467, de 13.07.2017; Reforma Trabalhista; Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); relações de trabalho; aplicação da lei no tempo; princípios constitucionais.

SUMÁRIO: Introdução; I – O Projeto de Lei nº 4.302/1998; II – Projeto de Lei nº 4.330/2004; III – Projeto de Lei da Câmara nº 38/2017 – A Reforma Trabalhista; IV – Princípio da condição mais benéfica; V – O direito adquirido à luz da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro; À guisa de conclusão; Referências.

INTRODUÇÃOA reforma trabalhista trazida pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 20171,

sancionada em 13 de julho de 2017 pelo Presidente da República Michel

1 Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017: Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis nºs 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de

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Temer2, traz diversas polêmicas, sendo que a que trataremos no presente artigo é sobre a aplicabilidade da nova lei nos contratos de trabalho anteriores a ela.

A Consolidação das Leis do Trabalho3 promulgada em 1943 é considerada ultrapassada e defasada por certos setores da sociedade, que a consideram respon-sável pelo engessamento das relações empresariais e de emprego, comprometendo até mesmo a própria economia. Para outros setores, ela é vital e essencial, e garante o mínimo existencial e representa o avanço e conquistas contra a classe “burguesa”4.

A provocação ao estudo torna-se válida uma vez que, em um primeiro mo-mento, o Ministério do Trabalho divulgou que a nova regra valeria apenas para os contratos novos e, posteriormente, o Ministro Ronaldo Nogueira informou que as mudanças atingiriam todos os contratos, com exceção daqueles com condições já estabelecidas em documento ou convenções coletivas em vigor5.

Diante dessa divergência, pretendemos, a partir dos princípios do direito do trabalho e dos conceitos da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, in-vestigar e analisar como a novel legislação trabalhista deve ser aplicada nas relações empregatícias já existentes.

Antes, porém, pretendemos passar vistas sobre dois projetos de lei que re-centemente foram aprovados, em matéria trabalhista, e que impactam as relações laborais, alteram o regime e, também, preencheram fortemente os noticiários.

I – O PROJETO DE LEI Nº 4.302/1998

O Projeto de Lei nº 4.302/19986, oriundo da Mensagem nº 344, de 1998, do Poder Executivo, que foi aprovado em março de 2017 e transformado na Lei Ordi-

maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

2 Ainda que com suas já programadas e “cantadas” alterações, que poderão vir, mas efetivamente não existem certezas no mundo político e a certeza com a qual podemos trabalhar é a lei publicada no Diário Oficial, e desta, o presidente Michel Temer não fez vetos ao texto aprovado pelo Congresso.

3 Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943: Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

4 Burguesa entre aspas, pois hoje um empreendedor que contrate uma pessoa de igual nível econômico, social e cultural sujeitará essa relação às leis trabalhistas. E certamente não haverá o “burguês” na relação, no sentido histórico da palavra, a qual foi inicialmente empregada na evolução da defesa dos direitos trabalhistas. Queremos, nesta nota, provocar o leitor, tentando alertá-lo sobre a atualidade do tema, sendo que o conceito se distancia das modernas relações de trabalho que se virtualiza e cada vez mais envolve emprego de tecnologia e acessos remotos – quando não criações e emprego de articulações e estratégias colaborativas (o que torna complexo o debate do conceito tradicional de hierarquia e subordinação em seu sentido puro ou estratificado).

5 Estadão Conteúdo. Dúvidas cercam reforma trabalhista, 15 de julho de 2017. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/carreira/duvidas-cercam-reforma-trabalhista/>. Acesso em: 17 jul. 2017.

6 Projeto de Lei nº 4.302/1998. Dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de trabalho temporário e na empresa de prestação de serviços a terceiros, e dá outras providências. Nova ementa do substitutivo: Altera dispositivos da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=20794>. Acesso em: 17 jul. 2017.

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nária nº 13.429, de 31 de março de 20177, foi o primeiro a movimentar o cenário legislativo brasileiro no ano de 2017, causando bastante alarde aos contrários e bem festejado por aqueles que clamam por avanços na regra laboral pátria. Essa nova lei altera dispositivos da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o tra-balho temporário nas empresas urbanas e sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.

O projeto de lei teve uma tramitação complexa, com fases de maior interes-se e quase ostracismo, até que, ao final de 2016, recebeu surpreendente atenção, avançando pelas mais diversas Comissões pelas quais passou, em curtos espaços de tempo e tramitação, até debates e votação em Sessão Deliberativa Extraordinária no dia 22 de março de 2017.

Vale destacar que o tema é tão polêmico que a promulgação da lei levou o Procurador-Geral da República Rodrigo Janot a ingressar com pedido de Ação Di-reta de Inconstitucionalidade (ADIn) nº 5.735 e pedir a suspensão da chamada “Lei de Terceirização”8.

A título de contextualização, a ADIn9 é uma das espécies de controle con-centrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a qual visa que o órgão máximo declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual que sejam destoantes da Constituição Federal. Esse controle apenas pode ser exercido por nosso órgão jurisdicional máximo, não competido a nenhum outro juiz, que são incompetentes para conhecer da validade das leis, dado que todas as normas que compõem nosso sistema jurídico nacional apenas e tão somente “serão válidas se conformarem com as normas da Constituição Federal”10.

Dentre o extenso rol, o Procurador-Geral da República é um dos legítimos a propor denominada ação11, sendo que sua legitimidade é tida, na jurisprudência do STF, como “universal”, pois dispensa a demonstração da pertinência temática para o ajuizamento da ADIn.

Janot sustenta na ADIn que a Lei nº 13.429/2017 é formalmente inconstitu-cional por vícios na tramitação do projeto de lei, uma vez que

7 Lei nº 13.429, de 31 de março de 2017. Altera dispositivos da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências; e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13429.htm>. Acesso em: 11 jul. 2017.

8 Neste sentido, vide matéria: <http://br.blastingnews.com/politica/2017/07/procurador-rodrigo-janot-pede-supensao-da-lei-de-terceirizacao-001819121.html>. Acesso em: 11 jul. 2017.

9 Constituição Federal de 1988: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 19 jul. 2017.

10 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 48.11 Constituição Federal de 1988: “Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação

declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004): [...] VI – o Procurador-Geral da República”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 19 jul. 2017.

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não houve deliberação, pela Câmara dos Deputados, de requerimento de retirada da proposição legislativa, formulado por seu autor, o Presidente da República, antes da votação conclusiva. A ausência de deliberação desse requerimento, que constitui prerrogativa reflexa do poder de iniciativa, implica usurpação de inconstitucionalida-de formal.12

Ademais, defende que referida lei é também materialmente inconstitucional. Em suas palavras, a lei “amplia o regime de locação de mão de obra temporária para atender demandas complementares das empresas”, sendo que essa

ampliação, aliada à triplicação do prazo máximo do contrato de trabalho temporário com o mesmo tomador, de três meses para 270 dias, conforme o novo art. 10 da lei, rompe com o caráter excepcional do regime de intermediação de mão de obra, adotado pela norma revogada, viola o regime constitucional de emprego socialmente protegido, previsto no art. 7º, I, da Constituição, esvazia a eficácia dos direitos funda-mentais sociais dos e vulnera o cumprimento, pelo Brasil, da Declaração de Filadélfia (item I.a) e das Convenções nºs 29 e 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que constituem normas de direitos humanos dotadas de status supralegal.13

Portanto, a cena dos próximos capítulos será dada pelo STF, que deverá jul-gar a constitucionalidade ou não da lei.

II – PROJETO DE LEI Nº 4.330/2004

O Projeto de Lei nº 4.330/200414 teve origem na Câmara dos Deputados e visava originalmente a regulamentar contratos de terceirização no mercado de trabalho.

Foi aprovado na Câmara dos Deputados em meados de 2015 (22.04.2015), tendo sido enviado ao Senado Federal por remessa por meio do Ofício nº 140/2015/PS-GSE, o qual aguarda apreciação. Certamente, teremos uma trami-tação consideravelmente prejudicada em função das demais tramitações aprovadas “a toque de caixa” pelo Congresso Nacional, impulsionadas pelo Poder Executivo.

De toda forma, essa proposta visa a regulamentar a terceirização no mercado de trabalho e, por razões óbvias, teve debate político e civil bastante acalorado – vide a longa tramitação do projeto somente na Câmara de mais de 10 (dez) anos.

Passaremos agora a outro projeto de lei central que culminou com a mais recente reforma na legislação trabalhista.

12 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 158.884/2017-AsJConst/SAJ/PGR, p. 10. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/adin-terceirizacao.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2017.

13 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 158.884/2017-AsJConst/SAJ/PGR, p. 11. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/adin-terceirizacao.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2017.

14 Projeto de Lei nº 4.330/2004. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=267841>. Acesso em: 11 jul. 2017.

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III – PROJETO DE LEI DA CÂMARA Nº 38/201715 – A REFORMA TRABALHISTA

Trata-se de um projeto de autoria do Presidente da República, que chegou ao Senado em 28 de abril de 2017 e foi lido em Plenário no dia 2 de maio, com amplo escopo. Tal projeto altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis nºs 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho.

O Projeto de Lei da Câmara nº 38/201716 foi aprovado na terça-feira, dia 11 de julho de 2017, pelo Plenário do Senado. Em sua tramitação, percorreu regular-mente as comissões de Assuntos Econômicos (CAE), de Assuntos Sociais (CAS) e de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), até sua votação pelo conjunto dos senado-res em plenário, recebendo 50 (cinquenta) votos a favor, 26 (vinte e seis) contrários e uma (uma) abstenção.

E esse foi o projeto de lei que foi convertido em lei e seguiu para sanção presidencial, culminando com a publicação da Lei nº 13.467 no dia 13 de julho de 201717.

IV – PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA

Primeiro passo para a consideração de nosso tema proposto julgamos ser considerar matéria de natureza principiológica, tão cara à justiça constitucional e à proteção dos direitos fundamentais, sejam de natureza de direitos humanos e/ou trabalhistas.

Neste sentido, colecionamos importante conceituação de princípios, trazida pelos ensinamentos do jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez, que os define como “linhas e diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indireta-mente uma série de soluções, pelo que podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os casos não previstos”18.

Em outra basilar definição de Geraldo Ataliba, temos que os princípios são

linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes magnas do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos por toda a sociedade e obrigatoriamente perseguidos pe-los órgãos de governo (poderes constituídos). Eles expressam a substância última do querer popular, seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da adminis-

15 Indicamos um bom extrato da tramitação e atividade legislativa relacionada ao Projeto de Lei da Câmara nº 38/2017. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/129049/pdf>. Acesso em: 18 jul. 2017.

16 Projeto de Lei da Câmara nº 38/2017. Disponível em: <http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/129049>. Acesso em: 18 jul. 2017.

17 Lei nº 13.467 no dia 13 de julho de 2017. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- -2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 18 jul. 2017.

18 RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1993. p. 16.

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tração e da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser prestigiados até as últimas consequências.19

Segundo pontual lição do clássico Paulo Bonavides: “O princípio exige que tanto a lei como o ato administrativo lhe respeitem os limites e que além do mais tenham o seu mesmo conteúdo, sigam a mesma direção, realizem o seu mesmo espírito”20. Já na palavras de Patrícia Uliano Effting, “princípio é o fundamento de todo o Ordenamento Jurídico. Todos os atos com efeitos jurídicos e todas as ações humanas devem respeitar os princípios de um sistema, por se mostrarem como pre-missas reconhecidas para a construção de todo o conjunto de regras”21.

Noutras palavras, os princípios são verdadeira fonte do Direito que auxiliam tanto na interpretação das normas jurídicas, como na solução de controvérsias não tuteladas pela lei. Vale pontuar que os princípios são fontes acessórias do direito na esfera trabalhista na esteira do preceito insculpido do art. 8º da CLT22.

O princípio-mãe do direito do trabalho é o princípio da proteção, no qual reconhece a “desigualdade de fato entre os sujeitos da relação jurídica de trabalho e promove a atenuação da inferioridade econômica, hierárquica e intelectual dos trabalhadores”23.

Ainda na doutrina de Plá Rodriguez24, tal princípio comporta três regras, ou subprincípios. Vejamos.

O primeiro deles é o princípio do in dubio pro operario. De acordo com tal princípio, na hipótese de uma norma trabalhista comportar mais de uma interpre-tação válida, o operador do Direito deverá aplicar a mais benéfica ao trabalhador. Não obstante, Arnaldo Sussekind entende que, na aplicação do princípio in dubio pro operario, o intérprete deve escolher “entre duas ou mais interpretações viáveis, a mais favorável ao trabalhador, desde que não afronte a nítida manifestação do legislador, nem se trate de matéria probatória”25. Já Sérgio Pinto Martins pontua que

19 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 2. ed. Atual. Rosalea Miranda Folgosi. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 34.

20 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 251.21 EFFTING, Patrícia Uliano. A finalidade do princípio da igualdade: a nivelação social – Interpretação dos atos

de igualar. Florianópolis: Conceito Editorial, 2012. p. 35.22 Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943: Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. “Art. 8º As

autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste” (grifos nossos). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

23 PINHO PEDREIRA, Luiz de Pinho. Principiologia de direito do trabalho. Salvador: Contraste, 1996. p. 28 apud FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015. p. 36.

24 RODRIGUEZ, Américo Plá. Ob. cit., p. 42 e 43.25 SUSSEKIND, Arnaldo. Instituições de direito do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 1991. p. 129.

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o princípio não pode ser livremente e incondicionalmente aplicado ao processo do trabalho, “pois, havendo dúvida, à primeira vista, não se poderia decidir a favor do trabalhador, mas verificar quem tem o ônus da prova no caso concreto, de acordo com as especificações dos arts. 333 do CPC e 818 da CLT”26.

Ainda, temos o princípio da norma mais favorável, segundo o qual, se existir mais de uma norma trabalhista a ser aplicada ao caso concreto, independentemente de sua posição hierárquica, deve prevalecer aquela mais favorável ao trabalhador.

Por fim, ainda decorrente do princípio protetor, o princípio da condição mais benéfica determina que as vantagens decorrentes do contrato de trabalho prevalece-rão, sendo proibida sua redução ou supressão enquanto durar o vínculo empregatí-cio. Vale pontuar interessantes ressalvas de Marcelo Tavares Cerdeira:

Já o princípio da condição mais benéfica, que é outra vertente do princípio da pro-teção, garante ao empregado a continuidade das condições benéficas de seu con-trato vigente, não podendo a alteração de qualquer norma jurídica mais recente ou vindoura lhe causar prejuízos. Reflexos deste Princípio podem ser encontrados no art. 5º, XXXVI, da CF/1988, Súmula nº 51 do col. TST e art. 468 da CLT. Por este último dispositivo, entende-se que qualquer alteração contratual prejudicial, mesmo se consentida, será nula de pleno direito, por ilícita. A condição benéfica anterior a ser preservada deve ser situação concreta e real já antes reconhecida, devendo ser mais favorável ao trabalhador. Não se enquadram como condição benéfica passível de manutenção os benefícios instituídos apenas provisoriamente. Outro ponto a se destacar é que a supressão de condições adversas, tais como sobrejornada, adicional noturno, adicionais de insalubridade ou periculosidade, etc., não se enquadra como condição benéfica suprimida, não sendo relevado o caráter econômico, que não pode ser tido como vantajoso face aos prejuízos biológicos e psicológicos ocasionados ao trabalhador.27

Nas palavras de Plá Rodriguez, “a regra da condição mais benéfica pressu-põe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que seja mais favorável ao trabalhador que a nova norma aplicável”28. Ou seja, devemos efetivamente (i) ter uma situação concreta e (ii) ela deve ser reconhecida e (iii) ela deve ser reconhecida como mais favorável ao trabalhador, para que preencha tais requisitos.

Nota-se que o princípio da condição mais benéfica coaduna com nosso or-denamento, sendo uma manifestação da denominada teoria do direito adquirido,

26 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 11. ed. São Paulo: Atlas, p. 76.27 CERDEIRA, Marcelo Tavares. Correlações entre o princípio da norma mais favorável e o princípio da condição

mais benéfica no Direito do Trabalho. In: Periódico Migalhas, publicado em terça-feira, 2 de dezembro de 2008. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI74445,21048-Correlacoes+entre+o+principio+da+norma+mais+favoravel+e+o+principio>. Acesso em: 20 jul. 2017.

28 RODRIGUEZ, Américo Plá. Ob. cit., p. 60.

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presente em nossa Constituição Federal (art. 5º, XXXVI29), repetida na Lei de Intro-dução às Normas do Direito Brasileiro (art. 6º30).

A CLT já determinava que a alteração nos contratos individuais de trabalho só é permitida por mútuo consentimento das partes, mas desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula31.

Importante ressaltarmos, ainda, que o próprio Tribunal Superior do Trabalho, corroborando com o conceito de tal princípio, editou duas súmulas nesse sentido:

Súmula nº 51: [...] I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vanta-gens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revoga-ção ou alteração do regulamento.32

Súmula nº 288: [...] I – A complementação dos proventos de aposentadoria, instituída, regulamentada e paga diretamente pelo empregador, sem vínculo com as entidades de previdência privada fechada, é regida pelas normas em vigor na data de admissão do empregado, ressalvadas as alterações que forem mais benéficas (art. 468 da CLT).33

E não é só. Nossa jurisprudência vem na mesma toada:

Estatuto de 1967. Aposentadoria. Complementação. Alteração das regras. Estatuto de 1997. Princípio da condição mais benéfica. Em se tratando de cláusulas contratuais, não se cogita da Teoria do Conglobamento, a exigir aplicação de um ou de outro Re-gulamento, por inteiro. Prepondera o princípio da condição mais benéfica, segundo o qual, em uma determinada situação concreta, a regra a ser aplicada é aquela que se revelar mais favorável ao trabalhador (CLT, art. 468; Súmulas nºs 51 e 288 do colendo TST). 2. Recursos conhecidos e desprovidos [...]. (TRT 10ª R., RO 01580-2012-005-10-00-1, 3ª T., Relª Desª Cilene Ferreira Amaro Santos, J. 12.03.2014 – grifos nossos)

Aviso prévio proporcional. Lei nº 12.506/2011. Contagem. Interpretação. Princípio da condição mais benéfica. A Constituição da República de 1988, no art. 7º, XXXI, garan-tiu aos trabalhadores o direito ao aviso prévio mínimo de 30 dias e aviso proporcional ao tempo de serviço, que foi regulamentado pela Lei nº 12.506/2011. Com a regula-mentação, aos empregados com até um ano de trabalho na mesma empresa, despedi-do sem justa causa, assegurou-se o direito de, no mínimo, 30 (trinta) dias, e aos traba-lhadores com tempo de serviço superior a um ano estabeleceu-se um acréscimo de 3

29 Constituição Federal de 1988. “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

30 Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942: Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Redação dada pela Lei nº 12.376, de 2010. “Art. 6º A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

31 Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943: Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. “Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho, só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

32 Súmulas do TST. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/sumulas>. Acesso em: 17 jul. 2017.33 Súmulas do TST. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/sumulas>. Acesso em: 17 jul. 2017.

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(três) dias para cada ano de trabalho, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfazendo um total de 90 (noventa) dias. A norma regulamentadora, contudo, não foi suficiente-mente clara e na tarefa interpretativa do juiz é possível conferir ao texto legal exegese que melhor se ajuste aos valores e princípios que sustentam o próprio Direito do Trabalho, em especial o princípio da condição mais benéfica, que decorre do amplo princípio da proteção e que inspira optar pela linha hermenêutica que melhor atenda aos interesses do trabalhador. Nesse sentido, considera-se que o trabalhador terá direi-to ao aviso prévio proporcional, com acréscimo de 3 (três) dias por ano completo de trabalho, contados a partir do primeiro ano, bastando que passe de 1 ano, de 2 anos, e assim sucessivamente. Este posicionamento foi adotado na Norma Técnica nº 184, do Ministério do Trabalho e Emprego, que orienta o acréscimo de 3 (três) dias por ano a partir do momento em que a relação contratual supere um ano na mesma empresa. Diante de uma situação concreta, em que a relação empregatícia teve duração de 5 anos e 1 mês, o trabalhador faz jus ao aviso prévio de 45 dias, e não apenas de 42 dias. Recurso ordinário do autor a que se dá provimento, no particular. (TRT 9ª R., RO 45264-2013-014-09-00-9, 2ª T., Relª Marlene Teresinha Fuverki Suguimatsu, J. 13.10.2015)

V – O DIREITO ADQUIRIDO À LUZ DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO

Antes da Lei nº 12.37634, de 2010, a então Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro era a Lei de Introdução ao Código Civil. Observa-se que a nova lei adequou o nome ao seu âmbito de aplicação, visto que, salvo disposição em con-trária, é aplicável tanto às normas de direito privado quanto às de direito público.

A Lei de Introdução35 é a norma responsável de regular a aplicação da lei brasileira no tempo e no espaço, sendo que os arts. 1º ao 6º regulam a vigência da lei no tempo.

Conforme já vimos, o art. 6º estabelece que “a lei em vigor terá efeito imedia-to e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.

O primeiro ponto que merece especial atenção é que a reforma da lei tra-balhista, a Lei nº 13.467/2017, apesar de ter sido recentemente sancionada, ainda não está vigor, pois foi estabelecido um prazo de vacatio legis de 120 (cento e vinte) dias36. Assim, quando da sua entrada em vigor, tal norma deverá obrigatória e ne-cessariamente respeitar o ato jurídico perfeito e o direito adquirido.

34 Lei nº 12.376, de 30 de dezembro de 2010. Altera a ementa do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12376.htm>. Acesso em: 18 jul. 2017.

35 Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (atual). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del4657.htm>. Acesso em: 18 jul. 2017.

36 Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. “Art. 6º Esta lei entra em vigor após decorridos cento e vinte dias de sua publicação oficial”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

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O ato jurídico perfeito é aquele já consumado segundo a lei vigente ao tem-po em que se efetuou37. Então, o ato jurídico será considerado perfeito e consumado quando, sob a vigência de uma lei, todos os seus efeitos foram alcançados. Na lição de Cretella Júnior:

Na expressão “ato jurídico perfeito”, o vocábulo “perfeito” tem o sentido de “acaba-do”, “que completou todo o ciclo de formação”, “que preencheu todos os requisitos exigidos pela lei”. Não o sentido de “irrepreensível”, “íntegro”, embora os dois sen-tidos tenham pontos de contato. Se o ato se completou, na vigência de determinada lei, nenhuma lei posterior pode incidir sobre ele, tirando do mundo jurídico, porque “perfeição”, aqui, é sinônimo de “conclusão”.38

Segundo a Lei de Introdução, o direito é adquirido quando o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenham termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem39. Se-gundo De Plácido e Silva, o direito adquirido

tira sua existência dos fatos jurídicos passados e definitivos, quando o seu titular os pode exercer. No entanto, não deixa de ser adquirido o direito, mesmo quando seu exercício dependa de um termo prefixo ou de uma condição preestabelecida inalte-rável ao arbítrio de outrem. Por isso sob o ponto de vista da retroatividade das leis, não somente se consideram adquiridos os direitos aperfeiçoados ao tempo em que se promulga a lei nova, como os que estejam subordinados a condições ainda não veri-ficadas, desde que não se indiquem alteráveis ao arbítrio de outrem40.

Assim, de acordo com Sampaio, o direito adquirido trata-se de um “reforço temporal e preclusivo a um direito subjetivo integrante, teoricamente, do ativo de seu titular (direito adquirido de valor econômico) ou da esfera jurídica do indivíduo (direito adquirido sem valor econômico)”41. Temos, assim, uma regra jurídico-tem-poral, de caráter principiológico, mandatória e essencial para a base do Estado De-mocrático de Direito em que vivemos, sem aquela a esfera público/privada sofreria constantes invasões e abalos de credibilidade e privacidade.

A bem da verdade, o direito adquirido está ligado diretamente à ideia da segurança jurídica, no sentido de que se trata de uma de barreira à retroatividade da lei e de garantia da previsibilidade dos negócios42.

37 Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942: “Art. 6º [...] § 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. (Incluído pela Lei nº 3.238, de 1957)”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

38 CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários a Lei do Mandado de Segurança. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 460.

39 Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942: “Art. 6º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por êle, possa exercer, como aquêles cujo comêço do exercício tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. (Incluído pela Lei nº 3.238, de 1957)”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 17 jul. 2017.

40 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984. p. 77/78.41 SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito adquirido e expectativa de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

p. 84.42 SAMPAIO, José Adércio Leite. Ob. cit., p. 83.

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O que o ordenamento evita é que alguém possa ser prejudicado com uma nova lei, afetando um direito que lhe fora previamente conquistado.

À GUISA DE CONCLUSÃO

Por todo o exposto, pudemos analisar que se buscou com a novel legislação avançar na busca de novos equilíbrios nas relações sociais – o que naturalmente não se espera que não venham desacompanhados de calorosos debates.

Nossa Carta Constitucional de 1988 tem sólidos fundamentos e valores indi-viduais e coletivos, dentre eles os valores sociais do trabalho. Desde seu preâmbulo, a Carta já institui que o Brasil é um Estado que visa à preservação dos direitos sociais e que deve perseguir uma ordem social justa. Nessa linha, o Projeto de Lei da Câ-mara nº 38/2017, em suas justificativas, desde o início buscou frisar e fundamentar o respeito e reconhecimento do princípio da vedação ao retrocesso, em especial na esfera dos direitos sociais fundamentais do trabalho. Reconheceu-se, inclusive, que o processo de discussão do PLC 38/2017 envolveu debates relacionados a direitos fundamentais inclusos direitos básicos humanos.

Vale lembrar pontual lição de Pimenta Bueno, citado pelo ilustre Vicente Váo, que a Administração Pública (Poder Executivo e assim como demais Poderes Legislativo e Judiciário), no exercício de sua função,

não deve criar direitos ou obrigações novas que a lei não criou, ordenar ou proibir o que a lei não ordenou nem proíbe, extinguir ou anular direitos ou obrigações novas que a lei conferiu, criar princípios novos ou diversos, alterar a forma que, segundo a lei, deve revestir um ato, atingir, alterando-o por qualquer modo, o texto, ou o espírito da lei.43

Nessa seara, verificamos que o cuidado com a redação do texto do PLC 38/2017 foi grande, ainda que ele venha a alterar mais de 100 pontos da Consoli-dação das Leis do Trabalho – CLT e que tenha provocado todo o acalorado debate.

Quanto à aplicação da nova lei nos contratos já vigentes, temos que nosso ordenamento jurídico privilegia a segurança jurídica, sendo que o trabalhador que já possui uma relação concreta, com todas as regras preestabelecidas, não poderá ser afetado com a nova lei, ainda mais se alguma previsão lhe diminuir direitos.

Assim, tanto pelo princípio da condição mais benéfica, quanto pela teoria do direito adquirido trazido pela Lei de Introdução, o trabalhador já contratado está “blindado”44 às mudanças trazidas pela lei, sempre devendo ser cotejado seu contrato, ainda, para verificar caso a caso eventuais situações benéficas ou não, ou mesmo em caso de ilicitudes já inscritas no próprio contrato (que aí de nada vale-

43 RÁO, Vicente. Parecer sobre a Lei nº 4.680/1965 e seu Decreto Regulamentador nº 57.690/1966 (Em 2 de maio de 1967). Disponível em: <http://www.abapnacional.com.br/pdfs/leis/parecer_vicente_rao.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2017.

44 Não gostamos exatamente do termo, mas podemos emprestá-lo aqui para este uso.

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riam o referido direito adquirido), tendo por fim, como horizonte máximo, nossos preceitos e garantias fundamentais de nossa Carta Magna.

REFERÊNCIAS

ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 2. ed. Atual. Rosalea Miranda Folgosi. São Paulo: Malheiros, 1998.

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

CERDEIRA, Marcelo Tavares. Correlações entre o princípio da norma mais favorável e o princípio da condição mais benéfica no Direito do Trabalho. In: Periódico Migalhas, publicado em terça-feira, 2 de dezembro de 2008. Disponível em: <http://www.miga-lhas.com.br/dePeso/16,MI74445,21048-Correlacoes+entre+o+principio+da+norma+ mais+favoravel+e+o+principio>. Acesso em: 20 jul. 2017.

CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários a Lei do Mandado de Segurança. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

EFFTING, Patrícia Uliano. A finalidade do princípio da igualdade: a nivelação social – Interpretação dos atos de igualar. Florianópolis: Conceito Editorial, 2012.

FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015.

MARTINS, Sérgio Pinto Martins. Direito do trabalho. 11. ed. São Paulo: Atlas.

RÁO, Vicente. Parecer sobre a Lei nº 4680/65 e seu Decreto Regulamentador nº 57.690/1966 (Em 2 de maio de 1967). Disponível em: <http://www.abapnacional.com.br/pdfs/leis/parecer_vicente_rao.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2017.

RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1993.

SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito adquirido e expectativa de direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

SUSSEKIND, Arnaldo. Instituições de direito do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 1991.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Os Limites das Negociações Coletivas Contemporâneas Frente à Reforma Trabalhista

MáRCIA REgInA LOBATODoutoranda e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Es-pecialista em Direito do Trabalho, Graduada em Direito e em Administração de Empresas, Professora de Direito Processual do Trabalho e Direito do Trabalho, Diretora de Secretaria de Seções Especializadas no Tribunal Regional do Trabalho – 3ª Região/MG.

RESUMO: O enfoque dado às negociações coletivas de trabalho sempre ocuparam no cenário jusla-boral posição de destaque, porquanto é a partir daí que os necessários ajustes entre capital e traba-lho se realizam, vislumbrando a harmonização social. Nesse contexto, os sindicatos exercem a sua função negocial, cuja missão é imprescindível, com o escopo de conquistar direitos laborais, além do mínimo legal previsto, em benefícios dos agrupamentos de profissionais dos quais têm a representa-tividade, em busca da redução das desigualdades econômicas e sociais, entrevendo proporcionar a incontáveis trabalhadores uma vida minimamente digna. Dentre as diversas formas de solucionar os conflitos oriundos das relações de trabalho, a negociação é apontada como a melhor e mais civilizada técnica de autocomposição entre os atores sociais, atenuando as controvérsias daí decorrentes e, de comum acordo, elaborando normas que disciplinarão o contrato individual de trabalho das cate-gorias envolvidas no procedimento transacional. Contudo, o poder de criar normas por essa via não é, de todo absoluto: requer-se a observância, por parte dos sindicatos representativos das classes profissionais, aos limites traçados à luz dos princípios da criatividade jurídica da negociação e da adequação setorial negociada, com o propósito de validar as negociações sem, contudo, incorrer em violações aos direitos já assegurados aos obreiros, observando-se para tanto normas inseridas pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. A par disso, com a reforma trabalhista, os instrumentos cole-tivos, resultantes da negociação coletiva, deverão ser produzidos criteriosamente a fim de se evitar a flexibilização ostensiva de direitos laborais. Destacando-se a imprescindibilidade de se refletir e se debater sobre o Direito como mecanismo para a construção de uma sociedade mais justa e equâni-me, sob de pena descaracterizar o Estado Democrático de Direito, assim como os direitos sociais dos trabalhadores, consagrados pela Constituição Federal de 1988.

PALAVRAS-CHAVE: Negociações coletivas; limites; Reforma Trabalhista; flexibilização; Lei nº 13.467/2017.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Papel dos sindicatos nas negociações coletivas; 2 Funções das negociações coletivas; 3 Os limites à negociação coletiva trabalhista: princípios da criatividade jurídica da negocia-ção coletiva e da adequação setorial negociada; 4 Flexibilização dos direitos laborais frente à reforma trabalhista; Conclusão; Referências.

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INTRODUÇÃO

Os conflitos resultantes das relações laborais refletem habitualmente de modo negativo no cotidiano das partes envolvidas. Mas o direito do trabalho alber-gou as negociações coletivas, que têm como um de seus propósitos solucionar os embates que envolvam interesses relativos ao capital e ao trabalho.

Diante desse cenário, propõe-se inicialmente analisar o papel dos sindicatos como representantes de classe nas negociações coletivas de trabalho, considerando que, para a realização de ajustes ou de acordos daí provenientes, requer-se a parti-cipação de tais entidades, porquanto esta é uma missão prevista expressamente pelo texto constitucional.

Com efeito, os sindicatos defendem, de forma ampla, os direitos e interesses de toda a categoria cuja representação lhes foi confiada com o próprio surgimento da entidade. Tais direitos têm caráter coletivo ou individual, alcançando coletiva-mente os integrantes e não de modo isolado a cada um destes.

Sendo assim, buscar-se-á averiguar o procedimento das negociações cole-tivas, como mecanismo pacificatório colocado à disposição das partes envolvidas nos embates, com o propósito de deslindar as possíveis controvérsias entre empre-gados e empregadores, já que seus interesses são naturalmente antagônicos.

Nesse contexto, um exame concernente às limitações do processo negocial, traçado à luz dos princípios da criatividade jurídica da negociação e da adequação setorial negociada, faz-se imprescindível com a intenção de validar tal ação sem que, contudo, incorra-se em violações aos direitos dos trabalhadores já assegurados pelo texto constitucional.

Os impactos da reforma trabalhista frente às negociações coletivas requer uma averiguação, considerando-se os efeitos daí decorrentes. Dessa maneira, é ne-cessária uma análise com enfoque nesse método transacional nessa nova perspecti-va, com o objetivo de se contribuir para o debate e a reflexão acerca da preponde-rância do negociado sobre o legislado.

1 PAPEL DOS SINDICATOS NAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS

Aos entes sindicais são conferidos poderes e atribuições vislumbrando a de-fesa dos direitos e dos interesses das classes profissional ou patronal que represen-tam, o que se traduz em relevante missão voltada à realização do progresso da ordem econômica e à garantia da paz social.

Antes, porém, de adentrar no campo de atuação dos sindicatos profissionais e econômicos na esfera das negociações coletivas, considera-se valorosa uma aná-lise objetiva do surgimento dessas entidades que, contemporaneamente já constitu-cionalizadas, alcançaram um patamar de partícipes indispensáveis para a concre-tização da democracia, viabilizando aos envolvidos oportunidades de alcançarem plenamente os objetivos colimados.

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Primitivamente, os movimentos associacionistas dos trabalhadores eram inexpressivos, mas, mesmo assim, era a forma de se mitigar a fragilidade de sua classe em face do empregador. Entretanto, não lhes eram conferidas quaisquer prer-rogativas, tampouco prestígio social, restando quase vãos os esforços empreendidos em busca de mudanças em proveito de seus interesses. A lei do mercado inexora-velmente predominava em detrimento dos direitos do operariado.

Ocorre que o natural crescimento dos grupos de pressão formados por tra-balhadores, em sua grande maioria, desempregados ou provenientes das indús-trias têxteis que, unidos por um sentimento de solidariedade, impuseram mudan-ças nesse cenário. Assim, a partir da Revolução Industrial, por volta do século XVII, os movimentos coletivos intensificaram-se, surgindo na Inglaterra, paulati-namente, as primeiras entidades de classe voltadas a salvaguardar os interesses da classe operária.

Os ideais traçados pelos trabalhadores foram sendo construídos e se estru-turando ao longo do tempo. Somando-se a isso, a necessidade de se organizarem corroborou o fortalecimento dos sindicatos, cujo papel inicial pautava-se na repre-sentação do operariado na luta por melhores condições de trabalho, de salários, de jornada dentre outras necessidades, em contraponto ao abuso e ao excesso de exploração do sistema capitalista.

Desse modo, a priori, a incumbência dessas entidades seria apenas a de romper com o sistema econômico, fortemente instalado, dominante, com o objetivo de se obter a satisfação das reivindicações predominantemente econômicas dos operários.

Concomitantemente à expansão do sistema capitalista, o sindicalismo, de uma forma dialética, resplandeceu no mundo ocidental, passando por fases eman-cipatórias, influências ideológicas e pela necessária adaptação à realidade das di-ferentes ordens jurídicas que o acolheram, compreendendo-se, neste contexto, o ordenamento jurídico pátrio.

Importante sublinhar que, ao lado dos sindicatos profissionais, surgiram as entidades representativas da classe econômica, ganhando forma especialmente em face das transações políticas vinculadas ao governo italiano de Mussolini, no pe-ríodo compreendido entre os séculos XIX e XX, segundo as lições de Ricardo C. Antunes (1980, p. 28).

No Brasil, a regulamentação dos sindicatos profissionais e patronais se deu com o advento do Decreto nº 19.770, de 19 de março de 1931, que estabeleceu distinções explícitas entre as entidades profissionais e as patronais1.

1 Decreto nº 19770, de 1931 – Regula a sindicalização das classes patronais e operárias e dá outras providências. ”Art. 1º Terão os seus direitos e deveres regulados pelo presente decreto, podendo defender, perante o Governo da República e por intermédio do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, os seus interesses de ordem econômica, jurídica, higiênica e cultural, todas as classes patronais e operárias, que, no território nacional, exercerem profissões idênticas, similares ou conexas, e que se organizarem em sindicatos, independentes entre si, mas subordinada a sua constituição [...]” (Brasil, 1931).

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Com o desenvolvimento da sociedade, principalmente após a Segunda Gran-de Guerra Mundial, clamava-se por uma nova postura frente aos costumes até então cristalizados, o que concorreu também para o aperfeiçoamento do sindicalismo, o qual passou por transformações significativas, de modo que, os sindicatos passaram a se organizar visando a alcançar seus objetivos, exercendo funções social, jurídica, econômica e negocial, esta última vista como a primordial.

O direito do trabalho, vanguardista no Brasil, abrigou a tutela dos deno-minados interesses coletivos, acompanhando um movimento crescente no plano supranacional de proteção a tais interesses, fortalecendo assim essa ideologia, con-siderada embrionariamente, como decorrente da Revolução Industrial.

Nesse ambiente, desponta nessa ciência jurídica um seguimento especia-lizado na proteção dos conflitos coletivos laborais, o direito coletivo, no qual o papel das entidades sindicais, na defesa dos interesses dos trabalhadores, passou a ser preponderante e sua presença no deslinde das controvérsias entre o capital e o trabalho tornou-se indispensável.

Os conflitos oriundos das relações laborais e os movimentos de massa, co-rolários da proatividade grupal, naturalmente motivaram o instituto da negociação coletiva, como uma proposta para a busca da, sempre indispensável, pacificação social. Nessa dinâmica, a figura da representação de classes, os sindicatos, passou a exercer um papel fundamental nas intermediações, visando a assegurar os interesses de seus representados.

Assim, em busca da harmonia e do necessário equilíbrio entre capital e tra-balho, os sindicatos passaram a desempenhar a função de colaboração e de incre-mento nas negociações coletivas, apresentando propostas em nome de incontáveis trabalhadores, para serem discutidas com o adversário, exaurindo-se na tentativa de se obterem resultados exitosos em prol dos seus representados.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, estabeleceu-se a obrigato-riedade da “participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho”, na forma do inciso VI do art. 8º (Brasil, 1988, grifo nosso). Todavia, consoante as lições de Alice Monteiro de Barros (2016, p. 1243), a despeito de a “norma fazer alusão aos sindicatos, no plural, vem-se entendendo que a participação obrigatória nas negociações refere-se ao sindicato profissional e é uma decorrência do princípio da tutela, que só se aplica ao empregado”. Partindo dessa alegação, a participação do sindicato patronal no método de negociação não seria obrigatória.

Cumpre sublinhar que, no processo negocial, é imprescindível a compatibi-lidade entre as atividades exercidas pelo seguimento profissional e o setor econô-mico.

Para Maurício Godinho Delgado (2017, p. 130), o papel dos sindicatos, enquanto representantes dos trabalhadores no processo da negociação coletiva, é buscar o diálogo com os sindicatos patronais ou com os empregadores prevendo entabular ajustes, que materializam em normas coletivas que regerão os contratos individuais dos obreiros das respectivas bases representadas. Outrossim, consoante o precitado autor, como fruto deste procedimento resulta um “importante universo

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de fontes justrabalhistas (os diplomas coletivos negociados), o que confere especial destaque ao presente papel dos sindicatos” (Delgado, 2017, p. 130).

Outrossim, muito se fala sobre o enfraquecimento dos sindicatos. As medidas públicas restritivas, a oscilação da economia e o nível crescente de desemprego são apontados como alguns fatores, dentre tantos, que levam ao desagregamento das entidades sindicais, provocando uma atuação latente. Entretanto, é inegável que os reflexos oriundos dessa conjuntura atingem não apenas os sindicatos, mas todos os seguimentos da sociedade. Ocorre que a atuação dos sindicatos nas negociações coletivas não deve se pautar, como não se pauta, nas crises cíclicas do capitalismo, as quais são passíveis de superação. Diante disso, reitera-se: a função negocial é, inquestionavelmente, a principal missão dos sindicatos, com respaldo na CF de 1988, art. 7º (inciso XXVI) e art. 8º (incisos III e VI) e na legislação infraconstitucio-nal, como se pode verificar nos art. 513, a e b, 611, 612 e 613 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Desse modo, importa ressaltar, independentemente da conjuntura socioeco-nômica contemporânea, o quão relevante é o objetivo perseguido pelos sindicatos no andamento das negociações coletivas, visando a resguardar o interesse e a prote-ção do grupo, o que, a rigor, irá favorecer o trabalhador no seu contrato individual de trabalho, beneficiando-o e protegendo-o, face à discrepância de forças entre o trabalho e o capital. Portanto, nesse contexto, pode-se dizer que o papel dos sin-dicatos, frente às negociações coletivas, permite a conquista de direitos aos agru-pamentos de profissionais, o que conduz a uma sociedade mais justa e igualitária.

2 FUNÇÕES DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVASA negociação coletiva de trabalho pode ser compreendida como uma ação

rotineira em busca do equilíbrio entre interesses antagônicos, e é definida por Maurício Godinho Delgado (2017, p. 130) como “um dos mais importantes méto-dos de solução de conflitos existentes na sociedade contemporânea. Sem dúvida, o mais destacado no tocante a conflitos trabalhistas de natureza coletiva”.

É uma modalidade de autocomposição de conflitos sobrevinda do enten-dimento entre os atores sociais, figurando, de um lado, empregados, e, de outro, empregadores. Muito embora a negociação não seja a única modalidade de auto-composição, porquanto podem ser citadas, ainda, a conciliação, a mediação e a arbitragem, ela é considerada o método mais democrático dentre todos, pois con-duz e administra os interesses profissionais e econômicos das partes diretamente interessadas.

Trata-se de uma prática procedimental, cuja diferenciação mais significativa, em confronto com as demais formas já aludidas, relaciona-se apenas aos sujeitos envolvidos na dinâmica operacional para o deslinde do conflito instaurado entre os interlocutores sociais.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é membro efetivo, traçou, em sua Recomendação nº 154, meios para motivar a negociação

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coletiva, sugerindo formas para que o procedimento seja realizado com sucesso e, em seu art. 2º, conceituando-a e relacionando de modo objetivo a sua finalidade, nos termos a seguir:

A expressão “negociação coletiva” compreende todas as negociações que tenham lugar entre, de uma parte, um empregador, um grupo de empregadores ou uma or-ganização ou várias organizações de empregadores, e, de outra parte, uma ou várias organizações de trabalhadores, com o fim de: a) fixar as condições de trabalho e emprego, ou b) regular as relações entre os empregadores ou organizações e uma ou várias organizações de trabalhadores, ou alcançar todos estes objetivos de uma só vez. (Organização Internacional do Trabalho, 1981)

O envolvimento e a atuação da OIT na criação de normas são crescentes, com o objetivo de, invariavelmente, garantir o bem-estar do trabalhador, como se observa no teor da Recomendação de nº 163, a qual apresenta um rol exemplifi-cativo de sugestões para se promoverem as negociações, almejando facilitar a sua concretização.

O primeiro diploma, no Brasil, que contemplou a negociação coletiva foi o Decreto nº 21.761, de 23 de agosto de 1932, o qual instituiu as convenções e os acordos coletivos do trabalho (Brasil, 1932).

Em seguida, esse método negocial foi constitucionalizado, sendo previsto originariamente na Constituição de 1934 (art. 121, § 1º, j), permanecendo nas Car-tas de 1937 (art. 127), 1946, 1967 e 1969 e, com o advento da Constituição Federal de 1988, a negociação coletiva e o direito sindical foram valorizados, ao se reco-nhecerem os instrumentos normativos delas oriundos (art. 7º, XXVI) e a obrigatorie-dade da participação dos sindicatos nesse procedimento (art. 8º, VI).

No plano infraconstitucional, a negociação coletiva também foi acolhida textualmente pela Consolidação das Leis do Trabalho com a alteração promovida pelo Decreto-Lei nº 229, de 1967, que modificou a redação dos arts. 616 e 617, os quais traçam as regras procedimentais para a sua necessária validação e eficácia.

Hugo Gueiros Bernardes (1989, p. 357) lista princípios atinentes à negocia-ção coletiva, cuja observância faz-se estritamente necessária pelas partes envolvidas nesta sistemática, a exemplo do princípio da boa-fé, o qual se traduz na obrigação de averiguarem as propostas recíprocas e as contrapostas apresentadas, com a indis-pensável fundamentação, tanto em relação às reivindicações, quanto as atinentes à rejeição, quando for o caso.

Existem situações consideradas volúveis e que, sobremaneira, influenciam o conteúdo final da negociação coletiva, a exemplo da mão de obra. Sendo maior a sua oferta, a tendência é a sua desvalorização, ocorrendo também o contrário: quanto menos oferta de mão de obra, mais valorizada é a força de trabalho. Na primeira hipótese, mais dificultosas as conquistas dos trabalhadores, ao passo que, na segunda, as chances de êxito elevam-se.

É bem verdade que, para o necessário equilíbrio da negociação, são inevi-táveis as concessões recíprocas. Desse jeito, importa reconhecer que, nessa con-

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juntura, não há vencidos, tampouco vencedores, assim como não há espaço para o inexorável, o intransigente e o implacável. É de capital importância a atenção ao princípio da adaptabilidade das vantagens laborais concedidas frente à real situação econômica da empresa, de maneira que possa haver condescendência em tempos de maior rentabilidade e redução destas em tempos de crise, a fim de não se exa-cerbar ainda mais o desemprego, podendo-se, desta forma, inferir características de função econômica e social inerentes às negociações.

Interessantes os apontamentos de Ives Gandra da Silva Martins Filho, para quem,

numa sociedade democrática e plural, é natural a convivência sadia com as divergên-cias, numa dialética que apresentando a todos os agentes transformadores da realida-de os diferentes ângulos dos problemas existentes, aportem contributos significativos para a sua melhor solução. (Martins Filho, 2015, p. 791)

Nesse contexto, a parcimônia torna-se base elementar para condução das conversações almejando o ajuste das reivindicações, propostas e contrapropostas, no ato da negociação. No mesmo contexto, o princípio do conglobamento deverá ser observado, já que o trabalhador renuncia a alguns direitos e conquista outros para, ao final, as concessões favoráveis suplantarem das desfavoráveis. Essa seria a ideia e uma das finalidades desse método negocial.

Alguns fatores contribuem para que as negociações obtenham mais suces-so. Pode-se destacar, entre eles, a garantia constitucional relacionada à autonomia sindical, bem como o do número de trabalhadores associados ao sindicato concer-nente à determinada categoria profissional. Neste último caso, porque, quanto mais elevado for este percentual, mais forte será a entidade incumbida da representação da classe. Do ponto de vista de pressão em massa, esses aspectos refletem de forma evidente no resultado final do procedimento negocial.

À vista disso, a negociação coletiva prima por amenizar os conflitos oriundos das relações de trabalho visando a agregar vantagens bilaterais, porquanto, à medi-da que as controvérsias se acentuam, os debates entre as partes envolvidas tendem a se intensificar, em busca de um maior entendimento, com o objetivo de se obter um ajuste pacífico.

3 OS LIMITES À NEGOCIAÇÃO COLETIVA TRABALHISTA: PRINCÍPIOS DA CRIATIVIDADE JURÍDICA DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA E DA ADEQUAÇÃO SETORIAL NEGOCIADA

O limite à autonomia da vontade, via negociação, é previsto no direito posi-tivo, ressaltando-se que essa questão não é de exclusividade do direito do trabalho. Outros ramos da ciência jurídica, a exemplo do direito do consumidor, também estabelecem normas restritivas a essa liberdade, vedando, por exemplo, o ajuste de cláusulas consideradas abusivas ao consumidor. Frise-se, ainda, que este tenha anuído expressamente ao contrato.

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Sendo exitosa a negociação coletiva, dela resultarão os instrumentos coleti-vos trabalhistas firmados pelos convenentes. Trata-se da convenção coletiva de tra-balho (CCT) e do acordo coletivo de trabalho (ACT), os quais trazem, em seu bojo, normas de natureza econômica e social, cujo objetivo é reger o contrato individual de trabalho das categorias envolvidas na transação, destacando-se que tais normas deverão contemplar direitos superiores aos mínimos previstos em lei.

O alcance das soluções conflituosas, materializado nos aludidos expedien-tes, ocorre sem a interferência estatal, evidenciando-se a autonomia da vontade das partes, além de propiciar que os direitos e vantagens conferidos aos trabalhadores representados no processo negocial sejam cumpridos voluntariamente pelo empre-gador, partindo-se da premissa de que o ajuste ocorreu com a sua aprovação.

Nesse contexto, vale destacar o enunciado constante do princípio da criati-vidade jurídica da negociação coletiva apontado por Maurício Godinho Delgado, segundo o qual se traduz na

noção de que os processos negociais coletivos e seus instrumentos (contrato coletivo, acordo coletivo e convenção coletiva do trabalho) têm real poder de criar norma jurídica (com qualidades, prerrogativas e efeitos próprio a esta), em harmonia com a normatividade heterônoma estatal. (Delgado, 2016, p. 1420)

À vista disso, por intermédio do sistema negocial, criam-se normas, e não cláusulas contratuais, as quais são consubstanciadas nos já mencionados recursos com repercussão no mundo jurídico, tais quais as normas elaboradas pelo Estado, acentuando-se a necessária harmonia entre as normas oriundas da autonomia da vontade das partes em relação às estatais.

Cumpre distinguir as cláusulas denominadas normativas das contratuais. As primeiras estabelecem condições de trabalho aplicáveis às categorias no âmbito de suas representações e não aderem de forma definitiva aos contratos de trabalho laborais, uma vez que estas poderão ser revogadas, produzindo efeitos erga ommes. Já as cláusulas contratuais sujeitam-se a um efeito adesivo perene e não podem ser suprimidas pela parte que as instituiu, segundo as lições clássicas de Maurício Godinho Delgado (2016, p. 1420).

Consoante, ainda, o mesmo autor, tal poder de criar normas por intermédio da negociação coletiva não é absoluto, ressaltando-se que há limites a este poder, sob pena de esse método transformar-se em mecanismo de invalidação, esvazia-mento ou mesmo de descaracterização do Estado Democrático de Direito, assim como dos princípios humanístico e social consagrados pela Constituição Federal de 1988.

Para a validação dessas normas, consubstanciadas nos instrumentos coleti-vos (CCT e ACT) e resultantes da transação negocial, é preciso que essa operação seja realizada observando-se os critérios defendidos pelo princípio da adequação setorial negociada, levando-se em conta que tal princípio “funciona como limite à negociação coletiva, impondo condições tais que, caso sejam ultrapassadas, invali-

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dada restará a cláusula que o infringir”, preleciona Maria Cecília Máximo Teodoro (2007, p. 79-97).

Consoante as orientações delineadas por esse princípio, para que tal expe-diente transacional seja tido como válido, além da exigência de se observarem os meios de feitura traçados pela Consolidação das Leis do Trabalho (arts. 611 ao 625), é preciso que as normas pactuadas e consubstanciadas nos instrumentos coletivos estabeleçam direitos superiores comparados ao padrão geral decorrente da legisla-ção heterônoma estatal.

Outrossim, só é possível o ajuste de regramento autônomo, em decorrência de método negocial, desde que se relacione a direitos de indisponibilidade relativa, pois os de indisponibilidade absoluta não são passíveis de se acordar e se, ainda assim, houver alguma cláusula no bojo do expediente coletivo convencionado, des-respeitando direitos de tal natureza, esta será invalidada de pleno direito.

Corrobora, nesse sentido, a Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, inseriu o art. 611-A, estipulando a prevalência do negociado sobre legislado, dentre os quais o pacto à jornada de trabalho, observando-se para tal os limites impostos pela Cons-tituição Federal de 1988 e a troca do dia de feriado previsão de entrada em vigor após 120 (cento e vinte dias) contados a partir de sua publicação.

Os limites estabelecidos pela aludida lei ao acrescentar também art. 611-B, o qual elenca a vedação de supressão ou redução de direitos, como os relacionados ao valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), salário-mínimo e o valor nominal do décimo terceiro salário. Os preceitos relacionados à saúde do trabalhador, bem como os atinentes à segurança do trabalho, à integridade moral, compreendidos aí o direito à intimida-de, à privacidade, à honra e à boa fama, permanecem inegociáveis.

Acredita-se que tal medida motivará as negociações coletivas, porquanto ampliou as possibilidades de acordo entre capital e trabalho para ajustar normas antes inimagináveis e que, inquestionavelmente, serão mais benéficas ou mesmo interessantes para a classe trabalhadora.

Nessa lógica, a tendência da jurisprudência trabalhista, de modo bem obje-tivo, alinha-se à adequação setorial negociada, como se infere do teor do verbete oriundo do colendo Tribunal Superior do Trabalho:

Súmula nº 85 – Compensação de jornada (inserido o item VI) – Res. 209/2015, DEJET divulgado em 1º, 2 e 03.06.2016.

[...]

VI – Não é válido acordo de compensação de jornada em atividade insalubre, ainda que estipulado em norma coletiva, sem a necessária inspeção prévia e permissão; [...] (Brasil, 2016)

Observa-se que a lógica da jurisprudência laboral é, pois, no sentido de man-ter os limites da negociação coletiva afinados aos princípios preconizados pela Car-

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ta de 1988 e não a utilização deste método para precarizar as relações juslaborais e afrontar as legislação heterônomas.

A Consolidação dispõe que, nos contratos individuais de trabalho, as altera-ções são consideradas lícitas apenas por consentimento mútuo, desde que estas não resultem, direta ou indiretamente, em prejuízos ao empregado sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia (art. 468).

Diante desse quadro, importa sublinhar a necessária observância às normas voltadas para a proteção ao labor. Além disso, tão importante quanto tal proteção é o alerta para a impossibilidade, via do método negocial, de se estabelecer cláusula violando, ainda que minimamente, a dignidade do trabalhador ou opondo-se ao primado do valor social do trabalho. Nessa eventualidade, é patente a nulidade da pactuação à luz da já citada regra do art. 468 da CLT.

Não obstante as necessárias restrições impostas ao transacional na forma já reportada, de modo que não se violem direitos trabalhistas já conquistados, a Constituição Federal de 1988 permite, por intermédio da negociação coletiva, a redução dos direitos dos trabalhadores, em princípio, inabdicáveis, a exemplo da irredutibilidade salarial (inciso VI do art. 7º). Entretanto, tal permissividade constitu-cional deverá ser avaliada cautelosamente, de maneira a não ensejar uma amplia-ção desmedida de flexibilização que possa ensejar o desajuste de direitos sociais já garantidos pela Lei Maior.

Em vista disso, o procedimento negocial necessariamente deverá se pautar nas garantias mínimas asseguradas pelo texto constitucional, salientando-se que a natureza tuitiva inerente ao direito do trabalho inquestionavelmente necessita pre-ponderar. Além do mais, para real alcance do objetivo colimado por essa sistemáti-ca, o seu método deverá se apresentar com a áurea de moralidade translúcida, ini-bindo que os direitos conquistados duramente pelos trabalhadores sejam solapados.

Destarte, para tanto, importa observar as concepções ostentadas pelos prin-cípios da criatividade jurídica da negociação coletiva e da adequação setorial ne-gociada. Só assim restará espaço para que tais direitos permaneçam intocáveis, de modo a resguardar a fonte de subsistência dos trabalhadores e garantir-lhes um patamar mínimo civilizatório.

4 FLEXIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS LABORAIS FRENTE À REFORMA TRABALHISTA

Flexibilizar é adaptar uma situação existente tornando-a mais serena, adap-tando-a em face das circunstâncias e das pretensões de outrem. Transplantando essa concepção para o direito do trabalho, pode-se dizer que se trata de tornar mais maleável o rigor natural das normas concebidas pelo ordenamento jurídico, concer-nentes aos direitos dos trabalhadores.

Nesse contexto, conclama-se para a reflexão da prevalência dos acordos de-correntes das negociações coletivas sobre as normas imperativas heterônomas es-tatais, considerando-se que esta é a temática principal da reforma trabalhista e que daí resultará a possibilidade da flexibilização geral dos direitos individuais e sociais

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dos trabalhadores, os quais, a rigor, já se encontram sob o manto da tutela absoluta. Isso tem provocado celeumas, dúvidas e incertezas na comunidade jurídica e na sociedade como um todo.

É bem verdade que o capitalismo está sujeito a crises cíclicas e que as adap-tações a essas fases são necessárias. Entretanto, o que se repudia naturalmente é a perversidade associada ao modo como se procede para suplantar as vicissitudes decorrentes em tempos de recessão econômica e adversa das negociações coletivas, como se pretende com a reforma trabalhista.

Nesse cenário, a Consolidação das Leis do Trabalho reconheceu o império do negociado sobre o legislado com a inclusão do art. 611-A, apresentando um rol exemplificativo das hipóteses possíveis dessa ocorrência. Isso se confirma pela leitura do caput de tal dispositivo, ao mencionar a expressão “entre outros”, carac-terizando, assim, uma generalidade que, por consequência, poderá viabilizar a des-regulamentação ostensiva de outros direitos, além dos arrolados pela Consolidação.

É preciso, pois, que se atente às novas possibilidades flexibilizatórias, já que a tendência é de se elevar significativamente a sua adoção, reduzindo ou até mesmo suprimindo direitos sociais outrora assegurados pela Carta de 1988.

O inciso I do supracitado dispositivo autoriza a transação relacionada à jor-nada de trabalho, “observando os limites constitucionais” sem, contudo, especificar que o limite diário que, além das oito horas previstas, é de, no máximo, mais duas horas. Infere-se daí que o trabalhador poderá trabalhar em um dia catorze horas, no outro dia quatro horas, e assim sucessivamente, até completar as quarenta e quatro horas semanais permitidas pela CF/1988. Mas é preciso ressaltar que o excesso de horas em um dia afeta a segurança e a saúde do obreiro, tratando-se de direito in-disponível e irrenunciável. Esse é apenas um exemplo de afronta ao direito social do trabalhador assegurado constitucionalmente (art. 6º).

Cumpre ressaltar, ainda, que, nessa hipótese, havendo jornada de catorze horas, como exemplificado, as horas trabalhadas para além do permitido legalmen-te (oito horas) não serão remuneradas a título de horas extras; haverá uma compen-sação, configurando mais uma supressão de direitos laborais.

Vale lembrar que a Carta de 1988 não apenas rompeu com o sistema autori-tário de outrora, como também resplandeceu no mundo jurídico como instrumento emancipatório, institucionalizando os direitos humanos fundamentais, notavelmen-te a dignidade da pessoa, que, nas palavras de Enoque Ribeiro (2004, p. 78), é vista como o “arcabouço para a fruição dos demais direitos individuais e coletivos”, o seu fundamento “pode ser considerado como o princípio nuclear para a hermenêutica de todos os direitos e garantias conferidos às pessoas”.

A despeito de a relação entre o trabalho e o capital, em geral, ser complexa e conflituosa, já que é assinalada, teoricamente, pela subordinação jurídica dos obrei-ros em face dos empregadores, os trabalhadores receberam tratamento especial com o avento da Constituição Federal de 1988, que dedicou o Capítulo II aos direitos sociais dos trabalhadores urbanos e rurais. Como a reforma trabalhista autoriza, por meio

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das negociações coletivas, que esses direitos sejam flexibilizados em desfavor dos trabalhadores, acarreta afronta e direta aos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Nesse contexto, o princípio da proteção ao empregado tem se mostrado cada vez mais depauperado, dado que o cenário atual comprova que a ideia de aplicação da norma mais favorável está em declínio, pois a norma resultante das negociações coletivas está autorizada a flexibilizar um maior número de direitos sociais dos tra-balhadores. Essa é a nova realidade que se apresenta.

As mudanças introduzidas pela aludida reforma influenciarão, sobremaneira, as relações trabalhistas, com desdobramentos daí decorrentes que afetarão um nú-mero imensurável de trabalhadores. Assim, no processo negocial, as atenções para essas questões deverão ser redobradas, a fim de se evitar a vitimização da categoria profissional, e sim ser instrumento para fortalecer os trabalhadores.

Importa sublinhar que propostas governamentais outrora aprovadas, flexibi-lizando a legislação trabalhista a exemplo da criação de banco de horas, no caso de contrato temporário, ao argumento de que criariam novos postos de trabalho, restaram frustradas, pois o contingente de desempregados se eleva cada vez mais. A propósito, a criação de emprego é motivada pelo crescimento da economia, e não devido à alteração legislativa.

Adverte Márcio Túlio Viana que,

se pensarmos bem, não se trata realmente de trocar o legislado pelo negociado. Trata--se, ao contrário, de trocar o que antes era negociado pelo que será agora legislado pelas grandes corporações, que certamente saberão impor ainda mais a sua vontade. (Viana, 2001, p. 158)

Nesse contexto, o novo papel do sindicato passa a ser extremamente de-cisivo e intrigante, pois estar-se-á permitindo, cada vez mais, a flexibilização dos direitos de classe, como se isto solucionasse as questões do desemprego: “Isso nos mostra que um papel novo e importante pode ser, ao mesmo tempo, um triste e po-bre papel”, afirma o anteriormente referido autor (Viana, 2001, p. 158).

O quadro socioeconômico brasileiro contemporâneo não favorece grandes conquistas aos trabalhadores, e, pelo menos a curto prazo, os prognósticos não podem ser considerados os melhores, já que, no atual cenário, o número de desem-pregados está cada vez mais elevado. Somada a essa situação lastimável, a flexibili-zação dos direitos trabalhistas, permitida pela transação via negociação coletiva, só tende a piorar a presente realidade.

Outrossim, diante dessa circunstância de fragilidade vivenciada pelos traba-lhadores, o seguimento produtivo prefere a negociação, com a produção de normas autônomas, em detrimento de normas imperativa, heterônoma estatal, porquanto, neste contexto, o terreno é fértil, favorecendo-lhes a imposição unilateral de sua von-tade, ao argumento da preservação de postos de trabalho, e os sindicatos profissionais acabam por renunciar, a título de transação, direitos da categoria que representam.

Consoante as lições de Vólia Bomfim Cassar, ao afirmar que a

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flexibilização pode ser de duas espécies: 1ª – de adaptação; 2ª – por necessidade. A primeira visa tão somente a adaptar o direito previsto em lei ou nas normas autônomas à realidade econômico-social das empresas empregadoras. A segunda visa à manuten-ção da empresa, que, em virtude da crise econômica, está agonizando e morrendo. Logo, a segunda visa à sobrevivência da empresa. (Cassar, 2017, p. 16)

Diante disso, uma apuração prévia sobre a capacidade financeira da empre-sa é imprescindível, a fim de inviabilizar a flexibilização de direitos ao argumento de salvaguardar o emprego, obstando sagacidade utilizada por parte de algumas delas que, valendo-se desse meio, pretendem permanecer no mercado de trabalho ostentando o poder de concorrência.

Nesse cenário, importante é a lição de Enoque Ribeiro, para quem a solução de

problemas oriundos das relações de trabalho, que podem ser mediados por meio de um inteligente esforço de negociação coletiva, somente pode ser encontrada de forma definitiva, se enfrentarmos a questão de um ponto de vista moral e espiritual. Se essa relação for considerada por um ângulo mais elevado do que os salários e acumulação de riqueza, teremos uma relação revitalizada por preceitos de amizade, colaboração e solidariedade, sob o fundamento máximo do respeito à dignidade da pessoa humana. (Ribeiro, 2004, p. 80)

Nessa linha de pensamento, partindo da premissa de que a negociação co-letiva prima pela busca da solução dos conflitos laborais de maneira democrática, podem-se obter resultados melhores em prol de todos, mediante a cooperação mú-tua sem a necessária redução ou supressão de direitos laborais.

A partir daí, para que se conceba uma sociedade mais justa e igualitária, torna-se imperioso o alerta sobre transação e ajustes entabulados por meio de con-venções ou acordos coletivos de trabalho, de modo que os direitos sociais dos traba-lhadores sejam resguardados, ressaltando-se que os entes sindicais devem adotá-los em prol dos obreiros, evitando-se a precarização desses direitos e garantindo-se a verdadeira dignidade da pessoa humana.

CONCLUSÃOUma das tarefas da sociedade é criar mecanismos que sejam aptos para aco-

lher as necessárias tendências do cotidiano, ressalvando-se que essa missão en-contra-se perenemente em construção. Nesse quadro, os movimentos sociais de outrora, motivados pelo sentimento de solidariedade do operariado, no contexto da Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra, suscitaram o desejo de união dos traba-lhadores em busca de melhores condições de trabalho e de salários, em contraponto à exploração capitalista, que despontava como sistema predominante.

Diante disso, apurou-se, no presente estudo, que o sindicalismo emergiu do necessário apoio mútuo ao operariado, ante as fragilidades impostas pelas circuns-tâncias daquele período. Em seguida, os movimentos de massa ganharam espaço nesta aldeia global. Assim, os entes sindicais perpassaram paulatinamente por varia-das fases ideológicas, foram sendo acolhidos por diferentes ordenamentos jurídicos, nestes compreendida a ordem pátria.

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A partir do seu reconhecimento no Brasil, as entidades de classe foram na-turalmente revestindo-se de características próprias e, albergadas pelo direito do trabalho, com a autonomia que lhes foi conferida, passaram a atuar traçando planos de ação na defesa dos direitos e interesses dos membros da categoria que repre-sentavam. Isso porque os conflitos de natureza coletiva oriundos das relações de trabalho simplesmente não se estancaram.

Com o propósito de encontrar soluções para os embates entre empregados e patrões, averiguou-se o quão importante é o exercício da função negocial conferida aos sindicatos para viabilizar a busca de soluções das controvérsias entre o capital e o trabalho. Nesse cenário, a negociação coletiva despontou como um dos instru-mentos mais eficazes destinados ao deslinde das divergências havidas entre o capi-tal e o trabalho, cujos interesses são naturalmente antagônicos; busca-se, todavia, um entendimento que possa atender a interesses recíprocos e bilaterais.

Diante disso, certificou-se de que o papel dos sindicatos em negociações coletivas é de capital relevância, porquanto o resultado derivado das conversações alcançam um número incontável de trabalhadores da classe a qual estes represen-tam, possibilitando a eles a solução de impasses de natureza grupal, produzindo normas jurídicas materializadas nas convenções coletivas de trabalho (CCT) e acor-dos coletivos de trabalho (CCT).

A despeito de o procedimento negocial mostrar-se como o meio pacificatório mais relevante, ocupando-se da busca de harmonização das controvérsias laborais, ele requer limites. A partir daí, constatou-se que a validação de tais mecanismos pren-de-se à observância aos princípios da criatividade jurídica da negociação coletiva e da adequação setorial negociada, segundo os quais as normas autônomas resultantes das negociações deverão encontrar-se em harmonia com aquelas oriundas da legisla-ção estatal. Ademais, tais normas, consubstanciadas nos instrumentos coletivos deve-rão estabelecer direitos superiores, se comparados ao padrão geral decorrente da le-gislação heterônoma e relacionados apenas aos direitos de indisponibilidade relativa.

A partir da averiguação realizada sobre a flexibilização de direitos sociais dos trabalhadores frente à reforma trabalhista, por meio da Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, conclui-se que, na produção de convenção coletiva de trabalho (CCT) e do acordo coletivo de trabalho (ACT) oriundos da negociação coletiva, é preciso cautela, de maneira que sejam sopesadas as concessões recíprocas, naturais deste método. Afinal, a transação deverá ser realizada para garantir a ampliação e a instituição de melhorias de direitos, consubstanciados nestes mecanismos que passarão a reger os contratos individuais dos trabalhadores, representados na nego-ciação, e não para abolir as condições mais benéficas.

Assim, no campo juslaboral, é sempre necessária uma atenção especial re-lativamente à proteção do trabalhador, a parte mais frágil da relação contratual, de maneira a tentar impedir a imposição da vontade do mais forte, o empregador. Conviver com as diversidades, realmente, não é fácil. Com efeito, é uma arte que se reveste do espírito democrático e que conclama cada partícipe a incorporar em si esta característica, de maneira que se possam harmonizar os conflitos em prol da dignidade dos trabalhadores e da tão desejável pacificação social.

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Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

A Desnaturação do Direito do Trabalho sob o Véu da “Reforma Trabalhista”

CLáuDIO JAnnOTTI DA ROCHADoutor em Direito pela Faculdade Mineira de Direito – PUC-Minas (2016), Mestre em Direito pela Faculdade Mineira de Direito – PUC-Minas (2011), Curso de Biopolítica e Direito na Uni-versity of Stirling, Escócia (2015), Professor Titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), em Brasília/DF, e de seu Mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, Professor da Faculdade de Direito de Vitória (FDV), na Graduação e na Pós-Graduação Lato Sensu, Membro do Núcleo Docente Estruturante do UDF, Pesquisador do Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania da UnB e do Grupo de Pesquisa Invisibilidade Social e Ener-gias Emancipatórias em Direitos Humanos da FDV – ambos com os respectivos registros no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq, Membro da Rede Nacional de Grupos de Pesquisas e Estudos em Direito do Trabalho e da Seguridade Social (RENAPEDTS), Membro do Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais, ICJS, de Belo Horizonte/MG, Pesquisador, Advogado. Autor de livros e artigos.

AILAnA RIBEIROProfessora de Direito do Trabalho do Instituto de Educação Continuada da PUC-Minas, Mes-tranda em Direito do Trabalho, linha de pesquisa “Trabalho, Modernidade e Democracia”, pela PUC-Minas, sob a orientação da Profª Pós-Doutora Maria Cecília Máximo Teodoro, Pós-Gra-duada em Direito Material e Processual do Trabalho pela PUC-Minas, Pesquisadora no Grupo de Pesquisa “Retrabalhando o Direito” (RED), Integrante da RENAPEDTS, Servidora do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.

SUMÁRIO: Considerações iniciais; 1 Um estigma conveniente; 2 O PLC 38 de 2017 e a desnaturação do direito do trabalho; Reflexão final; Referências.

Quando uma utopia desmorona, é toda a circulação de valores que regulam a dinâmica social e o sentido de suas práticas que entra em crise. É esta a crise em que vivemos. (André Gorz)

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Tão velho quanto recorrente é aquele discurso de que os direitos trabalhistas no Brasil oneram demasiadamente a atividade empresarial e que, portanto, atravan-cam a expansão da economia brasileira.

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Esse é o discurso brasileiro neoliberal vigente, produzido e difundido pela classe dominante (detentora do capital), internalizado e reproduzido pela própria classe dominada (detentora da força de trabalho). Uma crença fabricada, que se tornou um verdadeiro dogma no interior da sociedade capitalista pós-moderna.

O curioso é que, ao se investigar as raízes históricas dos direitos trabalhistas, decorrentes do constitucionalismo, percebe-se que, além do objetivo (talvez, mera-mente secundário) de se conferir um patamar civilizatório mínimo à classe superex-plorada, o grande escopo do reconhecimento formal de direitos aos trabalhadores foi domar a revolta da classe operária para inibir o caos e permitir ao capital conti-nuar a se expandir mediante a exploração da mão de obra alheia. Metaforicamente, pode-se dizer que trabalho e capital são como água e óleo: podem conviver lado a lado, mas cada um em seu espaço; jamais se misturam.

Sob esse prisma, portanto, não restam dúvidas de que os direitos trabalhistas surgem para atender a uma dupla necessidade: da classe trabalhadora, em se manter fisiologicamente viva; do capital, em se manter ideologicamente vivo.

Como assinalou Karl Polanyi, o mercado autorregulado “não poderia existir por muito tempo sem aniquilar a essência humana e natural da sociedade; teria destruído fisicamente o homem e transformado o seu ambiente em um deserto” (Polanyi apud Chomsky, 2007, p. 13).

Assim, muito além de uma generosa concessão do Estado, a proteção social consubstanciada no direito do trabalho, fruto do constitucionalismo social iniciado em 1934 e formalmente institucionalizada no Brasil na “Era Vargas”, representou uma necessidade mínima para refrear a atividade destrutiva e irracional do merca-do, preservando a fonte de subsistência central da economia capitalista: a relação de emprego (Delgado, 2014, p. 110).

Tal raciocínio nos conduz, então, à percepção de que o ramo justrabalhis-ta institucionalizou-se, sobretudo, para salvaguardar o próprio capitalismo de uma eminente implosão, e não para, de fato, emancipar os trabalhadores da penúria que lhes assolava, dia após dia, dentro e fora dos galpões das fábricas.

Por essa razão, pode-se afirmar que o direito do trabalho edificou-se sobre um arcabouço mínimo – repita-se, mínimo – de direitos, bem distante do ideal almejado pela classe operária, mas suficiente para convencê-la, diante da coatora necessidade de sobrevivência, a permanecer vendendo a sua força de trabalho aos detentores dos meios de produção.

Ocorre que, não obstante estar genuinamente imbuído desse caráter de pro-teção social mínima, derivado de uma real necessidade e não de uma mera faculda-de legislativa, a retórica pós-moderna é de que o direito do trabalho é superprotetor em relação ao trabalhador.

Mas, basta analisarmos o atual cenário sócio-jurídico brasileiro, caracteriza-do por um descumprimento espontâneo, reiterado e em massa dos direitos traba-lhistas – apontado por José Roberto Freire Pimenta (2004, p. 340) como o principal

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problema da Justiça do Trabalho –, para concluirmos que tachar de superprotetor um instituto que, com muita dificuldade, cumpre o seu objetivo de proteção míni-ma, atuando muito mais na esfera de reparação do que propriamente de proteção, é uma grande incoerência. Ou seria uma grande conveniência?

1 UM ESTIGMA CONVENIENTE

Fato é que, num contexto de “capitalismo manipulatório”1, em que a “ra-cionalização econômica”2 dita com cada vez mais exclusividade as regras do jogo (da política, da vida, das relações...), tudo aquilo que se reveste de um mínimo propósito social ou humano, em detrimento do puramente econômico, incomoda profundamente todos aqueles que pensam e agem segundo a lógica das relações de poder imposta.

Assim, no bojo de uma sociedade ditada pela razão econômica, nitidamente empenhada em atender aos interesses e caprichos do capital, tudo aquilo que se posiciona como freio, contrapeso, à sua livre expansão é malvisto, malquisto e, portanto, tende a ser difamado.

No que diz respeito ao ramo justrabalhista, apesar de as suas origens esta-rem indiscutivelmente ligadas à sobrevivência do próprio sistema capitalista, não há dúvidas de que o seu desenvolvimento e expansão ao longo dos anos, viabilizados pela atuação, ainda que meramente reativa, do tripé trabalhador, sindicato e Justiça do Trabalho, tornaram o direito do trabalho muito além de um instrumento do po-der, um contrapoder em si mesmo.

Dotado, portanto, desse potencial regulador (ainda que mínimo) sobre o ca-pital, o verdadeiro mote do direito do trabalho, ao menos no plano dos ideais, con-siste em restringir “o livre império das forças de mercado na regência da oferta e da administração do labor” para impedir a total mercantilização e degradação da força de trabalho humana (Delgado, 2014, p. 54).

Assim, na medida do possível, tendo em vista as barreiras impostas pelo sis-tema no qual atua, ao direito do trabalho cumpre “o papel de humanizar o sistema capitalista, notadamente, em razão de seu poder cogente, da sua aptidão redistributi-va e da sua finalidade de promoção da igualdade substancial – ainda que relativa, já que vivemos num sistema intrinsecamente desigual” (Viana e Teodoro, 2017, p. 333).

Tudo isso, no plano teórico, pode ser até aceito pela classe empresarial do-minante, que, ao optar por contratar um empregado, manifesta a sua concordância

1 Expressão utilizada por Giovanni Alves na obra Trabalho, subjetividade e capitalismo manipulatório – O novo metabolismo social do trabalho e a precarização do homem que trabalha (2010, p. 14), para designar a fase em que o capitalismo “leva à exaustão os recursos de manipulação das instâncias intrapsíquicas do homem, pelas quais se constituem os consentimentos espúrios à dominação do capital” (Disponível em: <http://www.giovannialves.org/artigo_giovanni%20alves_2010.pdf>).

2 Expressão cunhada por Marx e Engels e utilizada por André Gorz (2007, p. 29) na obra Metamorfoses do trabalho: crítica da razão econômica, para designar a premissa capitalista de objetivar, medir, quantificar, monetarizar, todas as esferas da vida humana, sobrepondo a razão econômica a qualquer outro tipo de razão instrumental.

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tácita diante do compromisso justrabalhista de promover uma mínima redistribuição de renda e preservar a dignidade do trabalhador. Contudo, no plano prático, reza a lenda do capital que esse “tal direito do trabalho” está posto para ser descumprido ou, no máximo, parcialmente cumprido, já que o cumprir à risca pode significar redução da competitividade e da margem de lucro da empresa.

Assim, em prol da nobre finalidade de maximizar o lucro empresarial, o des-cumprimento do patamar mínimo (repita-se, mínimo) de direitos trabalhistas, pre-vistos, sobretudo, pela Constituição Federal de 1988 e pela Consolidação das Leis Trabalhistas de 1943, tornou-se prática corriqueira e amplamente aceita pela moral vigente.

Convém realçar que foi a partir da segunda metade do século XX, num contexto de reestruturação produtiva vivenciada pelo capital, caracterizada pela flexibilização dos modos de produção e das relações produtivas, e “financiada” pela política neoliberal então dominante, que o lendário discurso de que o direito do trabalho, superprotetor que é, onera demasiadamente a atividade empresarial, elevou-se ao patamar de dogma.

Esse dogma é professado, inclusive, pelo Consenso de Washington (1989), que, a pretexto de ofertar a fórmula mágica para a retomada da expansão econômi-ca ocidental, impôs aos países em desenvolvimento, dentre eles o Brasil, a adoção de 10 postulados, dentre os quais se encontrava a “desregulamentação trabalhista”.

Desde então, o direito do trabalho, historicamente estigmatizado em virtude de representar, ou ao menos pretender representar, uma força reguladora do coin-teresse da classe empresarial dominante, torna-se alvo de uma explícita campanha política e econômica em prol da sua desregulamentação, eufemisticamente difundi-da no Brasil como “flexibilização trabalhista”.

E os reflexos práticos desse ideal de flexibilizar o direito do trabalho não tardaram a surgir, traduzindo-se nas mais diversas medidas executivas, judiciárias e, sobretudo, legislativas, dentre as quais se destacam a consagração da prescrição quinquenal e não mais trintenária do FGTS; o cancelamento da Súmula nº 277 do TST, que previa a ultratividade das negociações coletivas, de modo que, fin-da a vigência de um instrumento coletivo, os direitos por ela previstos deixam de incorporar os contratos individuais de trabalho mesmo diante da recusa ou mora da empresa em renegociar com o sindicato; os julgados do STF reconhecendo a prevalência do negociado sobre o legislado, mitigando a aplicação de normas de ordem pública em nítida prejuízo ao trabalhador; a promulgação da Lei nº 13.429, de 2017, que legitimou o instituto da terceirização trabalhista, em franca ofensa à dignidade humana; e, por último, a aprovação pela Câmara do Deputados e pelo Senado, em regime de urgência, da dita “Reforma Trabalhista”.

2 O PLC 38 DE 2017 E A DESNATURAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO

Eis que em dezembro de 2016, sob a égide do governo de Michel Temer, que assumiu a Presidência do país em virtude do impeachment da Presidenta eleita,

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Dilma Rousseff, passa a tramitar um tímido (mas não despretensioso) projeto de lei, autuado como PL 6.787/2016, propondo a alteração de alguns poucos dispositivos legais reguladores das relações trabalhistas – 7 artigos da CLT e 8 artigos da Lei nº 6.019/19743, que, em síntese, objetivavam promover três significativas mudanças no estuário normativo trabalhista: alteração no trabalho temporário; a prevalência do negociado sobre o legislado em questões pertinentes ao salário, à jornada e às férias,;e alteração na jornada do trabalho a tempo parcial.

Como já discutido acima, a fama de antiquada e superprotetora atribuída à legislação trabalhista brasileira, sobretudo à CLT, ganhou destaque no contexto de crise econômica e de consequente reestruturação produtiva do capital, vivenciadas a partir dos anos finais do século XX. Desde então, culpabilizar o direito do trabalho tornou-se conveniente para a classe empresarial, que, atingida pelos efeitos de uma crise econômica de ordem estrutural, tornou-se a grande porta-voz da necessidade de se esterilizar direitos trabalhistas em prol da saúde econômica da empresa, fonte geradora de empregos. Na realidade, o que se presenciou foi a tônica do antigo na-zismo: repetir a mesma mentira mil vezes, para lhe conferir ar de verdade.

Assim, o que se passou a denominar de “reforma trabalhista”, profetizada como condição básica e suficiente para reavivar a economia brasileira, tornou-se amplamente difundida pelos meios midiáticos e reproduzida por parcela expressiva dos seus receptores – já que, como dito por Marx e Engels, por ocasião do “Manifes-to Comunista”, a ideologia dominante tende a ser a ideologia da classe dominante.

E uma vez que motivada pelos interesses de quem realmente goza de influên-cia política expressiva no Brasil, não foi de se estranhar o fato de, após poucos meses de efetiva tramitação, ter sido votado e aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados um texto substitutivo para o PL 6.787/2016, elevando de 7 para 100 o número de artigos da CLT a serem alterados em nome da “reforma trabalhista” – que, desde então, tornou-se o PLC 38/2017.

Dentre as diversas alterações propostas pelo PLC 38/2017 – já aprovado pelo Senado e prestes a ser sancionado pelo Presidente da República –, um ponto em comum: o objetivo de extirpar do ordenamento jurídico vigente direitos arduamente conquistados pela classe trabalhadora.

Assim, valendo-se das palavras de Jorge Luiz Souto Maior4, pode-se dizer que o PLC 38/2017 não representa “nada além do que uma espécie de reunião de teses jurídicas empresariais, trazidas ao conjunto do Projeto pelo impulso da somatória de vaidades pessoais e até mesmo por sentimento de vingança de alguns”. Pode-se afirmar, ainda, que de “reforma” nada tem a “reforma trabalhista”, já que a semân-tica da palavra reforma reflete a ideia de mudança voltada a um melhoramento

3 Nota Técnica Conjunta PLC 38/2017 – Reforma Trabalhista. Disponível em: <https://sinait.org.br/docs/NT_Sinait_Anamatra_Anpt_Alal_Aljt_Jutra-VersaoFinal.pdf>, 2017. Acesso em: 10 jul. 2017.

4 MAIOR, Jorge Luiz Souto. A pequena política do grande capital: “reformas a qualquer custo”. 2017. Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-pequena-politica-do-grande-capital-reformas-a-qualquer-custo>. Acesso em: 2 jul. 2017.

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– e, sob o prisma do trabalhador, destinatário legítimo da proteção justrabalhista, nenhum melhoramento pode ser verificado. Senão vejamos algumas das alterações trazidas pela pretensa reforma:

– institui a figura do trabalho intermitente, autorizando a prestação de serviço subordi-nada mediante alternância de períodos de atividade de inatividade, sem remunerar o empregado pelo tempo em que se encontrar aguardando o chamado do empregador;

– reduz os custos e, portanto, estimula a prática da dispensa imotivada ao extinguir a obrigatoriedade da rescisão de contratos com mais de um ano de vigência ser realizada perante o sindicato ou autoridade do Ministério do Trabalho, bem como ao conceder o prazo de 10 dias do término do contrato para a liberação das guias para habilitação e saque do seguro-desemprego e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), bem como para o pagamento das parcelas constantes do instru-mento de rescisão ou recibo de quitação;

– legitima a dispensa em massa de empregados, determinando a não exigência de autorização prévia de entidade sindical ou celebração de convenção ou acordo coletivo em tais situações;

– confere aos Planos de Demissão Voluntária ou Planos de Demissão incentivada o poder de quitação geral e irrestrita, considerando que o plus recebido pelo trabalha-dor no ato da dispensa é o preço do seu silêncio, impedindo-o de discutir no Judi-ciário toda e qualquer irregularidade praticada no decorrer da relação de trabalho;

– extingue o direito às horas in itinere, dispondo que o tempo de deslocamento até o local de trabalho em transporte fornecido pelo empregador quando a empresa situa--se em local de difícil acesso e sem a cobertura por linhas de transporte público não mais deve ser remunerado como tempo à disposição do empregador;

– estimula o descumprimento dos intervalos intrajornada pelo empregador ao deter-minar que, quando suprimidos, serão remunerados com natureza indenizatória e em percentual de 50% sobre o período suprimido e não mais sobre o período completo do intervalo, como até então ocorria;

– permite que a gestante ou lactante trabalhe em locais com grau médio e mínimo de insalubridade, de modo que, se a empresa não contar com outra ocupação compatí-vel com a condição especial da gestante, poderá simplesmente afastá-la da empresa, transferindo os custos do seu afastamento para a Previdência;

– extingue a contribuição sindical obrigatória, retirando importante e, por vezes, única fonte de receita das já fragilizadas organizações sindicais, inviabilizando de vez a possibilidade de se contar com entidades sindicais de fato combativas, munidas de força para conquistar patamares mais elevados de direitos em prol da categoria representada.

E não é preciso ser um expert em direito do trabalho, nem mesmo ter qual-quer conhecimento técnico de Direito para notar que as alterações expostas acima – bem como as inúmeras outras trazidas pelo PLC 38/2017 – representam conces-são de benesses aos empregadores às custas da precarização ou mesmo retirada de direitos do trabalhador.

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O que se presencia, portanto, é uma franca inversão dos valores norteadores do direito do trabalho, que passa a se aproximar muito mais dos interesses do capital do que dos interesses da classe trabalhadora, cuja luta representou a grande fonte material do surgimento e consolidação do ramo justrabalhista.

Assim, conforme advertido por Ribeiro e Abreu (2016, p. 113), ao se pre-conizar um direito do trabalho “modernizado”, flexível diante dos interesses em-presariais, o que mais se pretende se não permitir que os pretensos regulados (os detentores do capital) controlem seu regulador (o direito do trabalho)? Essa pergunta reflexiva nos conduz à percepção de que um direito do trabalho que incorpore os ditames flexibilizatórios do capitalismo não é, ao contrário do que se pretende di-fundir, um direito laboral aprimorado, “reformado”, que esteja simplesmente exer-cendo a sua capacidade de adequação ao dinamismo social, mas, sim, um direito do trabalho subvertido, corrompido, desnaturado.

E dentre as tantas expressões passíveis de expressarem o que o PLC 38/2017 de fato provocou sobre o direito do trabalho, considera-se que a desnaturação (abai-xo ilustrada), definida como “um fenômeno no qual o estado inicial bem definido de uma proteína formada sob condições fisiológicas é transformado em uma estrutura final mal definida sob condições não fisiológicas, usando-se um agente desnaturan-te”, representa, com franqueza e autenticidade, todo esse processo que insistem em chamar de “reforma trabalhista”.

Nota-se que, em seu sentido original, o processo de desnaturação, estimu-lado por um agente externo desnaturante, que pode ser, por exemplo, o calor, pro-voca a drástica alteração das estruturas da proteína, de modo que a sua identidade é transmutada. O resultado é uma proteína desprovida da sua atividade biológica característica5.

Assim, o PLC 38/2017 e o seu arcabouço de teses empresariais advogan-do contra a proteção jurídica da classe trabalhadora podem ser comparados a um agente desnaturante, apto a promover uma verdadeira transmutação das estruturas

5 WIKIPEDIA. Desnaturação. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Desnatura%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 15 jul. 2017.

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identitárias do direito do trabalho. O resultado? Certamente – e lamentavelmente – será um direito do trabalho desprovido da sua atividade orgânica característica.

3 REFLEXÃO FINAL

Como já preconizado por Paul Joseph Goebbels, o Ministro da Propaganda de Adolf Hitler na Alemanha Nazista, uma mentira repetida mil vezes torna-se uma verdade. Tornou-se. O discurso falacioso de que o superprotetor direito do traba-lho é o grande entrave à expansão da economia e à própria geração de empregos, martelado em nossas cabeças pela mídia, dia após dia, prosperou e passou a gozar, inclusive, de um respaldo legislativo: o PLC 38/2017.

Não há dúvidas de que esse Projeto, prestes a se tornar lei, representa uma estratégia político-econômica conservadora e neoliberal voltada a tornar ainda mais incisivo o controle da força de trabalho pelo mercado, ou, em outros termos, o con-trole da classe trabalhadora pelo capital. A ideia é desnaturar o direito do trabalho para fragilizar e pressionar, individualmente, os trabalhadores, eliminando-se do mercado de trabalho mecanismos considerados “anticompetitivos” sob o prisma empresarial.

Assim, com uma objetividade suspeita e preocupante, está posta a fórmu-la de que o aumento da “pressão exercida sobre os empregados (um crescimento qualitativo e quantitativo da oferta de trabalho juntamente com uma restrição da política salarial)” aumentará significativamente a propensão de investimentos pelo capital, que será revertida em oferta de empregos (OFFE, 1985, p. 89).

Contudo, conforme bem advertido por Claus Offe, (1985, p. 91), essa fór-mula neoliberal, quase matemática, parece ignorar o fato de que os investidores, logo que se verem livres dos altos custos dos salários e demais verbas trabalhistas, serão defrontados com o problema da “demanda insuficiente”, já que trabalha-dores mal pagos são, também, consumidores com baixo poder aquisitivo. Assim, para evitar a redução do lucro sagrado, promovida pela redução na demanda, as empresas deixarão de contratar mais empregados – ou, ainda, dispensarão em massa os já existentes –, produzindo um efeito totalmente reverso ao pleno em-prego pretendido.

Portanto, tendo em vista a elevada probabilidade de que a “reforma traba-lhista” – enquanto instrumento de desnaturação do direito do trabalho mediante a mutilação das suas estruturas protetivas – não sirva para nada mais além de au-mentar a fossa existente entre trabalho e capital, intensificando a exploração do homem pelo homem, submetermos simplesmente ao curso das coisas não pode ser a posição adotada.

Enquanto cidadãos minimamente conscientes, não podemos seguir o fluxo do retrocesso social por acreditar não existir solução. Soluções existem. Mas, para existirem, precisam ser criadas por mentes pensantes e realizadas por forças huma-nas atuantes. Pensemos e lutemos!

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REFERÊNCIAS

ALVES, Giovanni. Trabalho e subjetividade: o espírito do toyotismo na era do capitalis-mo manipulatório. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2011.

CHOMSKY, Noam. O governo no futuro. Trad. Maira Parula. Rio de Janeiro: Record, 2007.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 13. ed. São Paulo: LTr, 2014.

GORZ, André. Metamorfoses do trabalho: crítica da razão econômica. Trad. Ana Montoia. São Paulo: Anablumme, 2003.

MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

OFFE, Claus. Capitalismo desorganizado. Trad. Editora Brasiliense. São Paulo: Brasiliense, 1985.

RIBEIRO, Ailana; ABREU, Nara. Um novo espírito para o direito do trabalho? In: Direi-to do Trabalho – Cenários contemporâneos. Belo Horizonte: RTM, 2016.

VIANA, Marcio Tulio; TEODORO, Maria Cecília Máximo. Misturas e fraturas: do poder diretivo à concepção do trabalho como necessidade. Revista Brasileira de Estudos Po-líticos, v. 114, 2017. Disponível em: <http://www.pos.direito.ufmg.br/rbep/index.php/rbep/article/view/467/391>. Acesso em: 5 jun. 2017.

Assunto Especial – Doutrina

Lei nº 13.467/2017 – A Reforma Trabalhista

Reforma Trabalhista: o Princípio da Intervenção Mínima na Autonomia da Vontade Coletiva: Realidade Ou Engodo?

PATRICIA OLIVEIRA LIMA PESSAnHAAdvogada da Petrobras, Especializada em Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Direito Empresarial. Autora de diversos artigos jurídicos publicados em revistas especializadas.

RESUMO: Apesar dos grandes embates políticos, a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que altera diversos artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, foi sancionada, tornando-se, portanto, uma realidade. Dura? Talvez para alguns. Mas, como diz o brocardo jurídico, dura lex, sed lex (a lei é dura, porém é a lei). Um novo cenário apresenta-se nas relações de trabalho, em especial com a introdução do princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, impondo novas reflexões. O presente texto busca uma singela análise desse princípio, instigando o leitor a refletir sobre seu real objetivo.

PALAVRAS-CHAVE: Lei nº 13.467/2017; Reforma Trabalhista; direito do trabalho; jornada de trabalho; princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.

SUMÁRIO: Introdução; I – O princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva: realidade ou engodo? Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o direito do trabalho sempre foi conhecido pelo seu caráter pro-tecionista em relação ao empregado. Tal perfil foi assim concebido por ter sido constatado, ao longo de fatos históricos, que a intervenção estatal se fazia necessária para equilibrar a balança numa negociação entre desiguais. Afinal de contas, como o trabalhador poderia fazer impor sua vontade numa negociação na qual o fator “necessidade” pesava muito mais, sobretudo diante do poder econômico da outra parte (empregador).

O chamado “patamar mínimo civilizatório” necessário à sobrevivência digna do trabalhador precisava ser garantido pelo Estado.

Ocorre que, com a evolução dos tempos, o crescente fenômeno da globali-zação introduziu novos desafios ao mercado, sobretudo no campo econômico. A

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competitividade ficou cada vez mais acirrada, implicando a crescente necessidade de redução de custos de produção.

E, dentro da ideia de redução de custos, vieram os debates acerca da necessi-dade de revisão de alguns direitos trabalhistas, os quais estariam onerando as folhas de pagamento e funcionando como verdadeiro desestímulo ao empreendedorismo. Tal providência – no entender de alguns – fomentaria o mercado comercial e via-bilizaria a retomada do crescimento econômico do País, gerando também novos postos de trabalho.

Defende-se a tese de que uma menor intervenção do Estado seria salutar, retirando-se da legislação a obrigatoriedade de alguns direitos que até então integra-vam obrigatoriamente as relações de trabalho. Fruto de todo esse movimento, surge então a Lei nº 13.467/2017.

I – O PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA NA AUTONOMIA DA VONTADE COLETIVA: REALIDADE OU ENGODO?

Diante de tal quadro, após grandes embates políticos e jurídicos, a Lei nº 13.467/2017 faz nascer a chamada “Reforma Trabalhista”, inserindo na ordem jurídica interna trabalhista a aplicação do princípio da intervenção mínima na auto-nomia da vontade coletiva.

Passa a vigorar a prevalência da validade do acordado sobre o legislado.

Entretanto, não significa dizer que fica liberada toda e qualquer negociação.

As fraudes aos princípios norteadores do direito do trabalho continuarão a ser combatidas, mas caberá ao Poder Judiciário agora limitar sua análise ao exame da presença dos elementos essenciais do negócio jurídico, quais sejam: agente ca-paz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, forma prescrita ou não defesa em lei.

O texto da novel legislação traz também muitas questões passíveis de ques-tionamentos, inclusive do ponto de vista constitucional, o que, por certo, irá inspi-rar, no mínimo, um exercício de hermenêutica que resguarde a primazia da cons-tituição.

Focando aqui em um desses pontos, chama-nos atenção constatar que o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, muito embora sirva como uma nova diretriz para os contratos de trabalho, tenha sido ignorada pelo próprio legislador sem que haja qualquer justificação para tanto.

É o que se verifica, por exemplo, da análise do teor da nova redação dada pela Lei nº 13.467/2017 ao art. 58, § 2º, da CLT, o qual versa sobre as horas in itinere. Diz o dispositivo:

O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de

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transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.

Note-se que o legislador importou a definição constante no texto contido no inciso I da Súmula nº 90 do Tribunal Superior do Trabalho1, mas, em afronta ao posicionamento deste, concluiu a redação em sentido oposto, ao dispor que “não será computado na jornada de trabalho”.

Além da aparente pirraça diante do entendimento firmado pelo Tribunal, o legislador contradiz a si mesmo na medida em que deixa de aplicar o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, impondo sua vontade sem qualquer razão plausível para tanto. Afinal de contas, o Estado pretende ou não evitar-se imiscuir nas relações de trabalho firmado entre as partes?

Pior, sua intervenção, nesse caso, dá-se em desfavor da parte vulnerável da relação contratual (pois, se fosse o inverso, ainda poderia se socorrer dos princípios protecionistas do direito do trabalho).

Não bastando, invadiu a esfera de competência resguardada ao empregador inerente ao exercício do poder diretivo, uma vez que o teor da lei impede que este defina onde começa ou termina o posto de trabalho ou mesmo opte por inserir no contrato de trabalho a jornada de trabalho computável nos termos da Súmula nº 90. Ora, se o empregador decidir remunerar as horas despendidas em condução for-necida ao trabalhador para ir e voltar do trabalho, estaria então procedendo contra legem?

Note-se que o legislador arvorou-se tanto em impor sua vontade que deixou de aprofundar uma necessária pesquisa na vasta legislação que rege as relações de trabalho.

Sim, pois a sua pretensão de vedar o direito ao pagamento das horas in itinere, com a nova redação dada ao art. 58, § 2º, da CLT, restará inócuo, na me-dida em que poderá ser afastada pela simples aplicação analógica do disposto no art. 294 da própria CLT2 (que versa sobre o tempo de deslocamento em atividades de mineração), e também a Lei nº 8.213/1991, que dispõe sobre acidente de traba-lho, em especial aquele ocorrido no percurso casa x trabalho3. Isto para se falar o mínimo, visto que um estudo mais aprofundado, sobretudo se valendo das normas constitucionais, facilmente subsidiará entendimento diverso daquele imposto pelo legislador.

1 “O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular, e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho.”

2 “Art. 294. O tempo despendido pelo empregado da boca da mina ao local do trabalho e vice-versa será computado para o efeito de pagamento do salário.”

3 “Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta lei [...]: d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.”

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Portanto, a nova redação do art. 58, § 2º, da CLT parece confessar um in-tuito do legislador que foge à pura e simples aplicação do princípio da intervenção mínima por parte do Estado na autonomia da vontade coletiva, fato que gera pre-ocupação, tendo em vista as tantas críticas à Reforma Trabalhista e sua legalidade.

CONCLUSÃO

Certamente, a Lei nº 13.467/2017 traz muitos pontos passíveis de críticas, so-bretudo sob o prisma da constitucionalidade4, e muitas serão as ações questionando a legitimidade da reforma trabalhista.

Sua sanção denota o ganho de uma batalha, mas a guerra – por assim dizer – parece estar ainda longe de terminar. Provavelmente caberá ao Supremo Tribunal Federal definir o lado vitorioso, se é que, na prática, existirá tal lado.

Por enquanto, resta constatar que o legislador deixou vestígios de que seu intuito de introduzir a intervenção mínima do Estado na autonomia da vontade coletiva foi condicionado a um filtro prévio de caráter duvidoso, já que – como no exemplo aqui tratado –, sem razão plausível, o legislador impôs regra que, na pior das hipóteses (sob o ponto de vista do caráter protecionista do direito do trabalho), deveria ter ficado a critério das partes.

O mérito acerca de a Reforma Trabalhista ser ou não positiva para a econo-mia é algo que depende do ponto de vista de quem faz a análise e envolve questões que vão muito além da visão jurídica. Mas a contradição do legislador é preocu-pante na medida em que faz refletir sobre as reais razões que inspiraram a novel roupagem na legislação trabalhista, pois, conforme já disse o escritor Gore Vidal, “as contradições nos definem e ao mesmo tempo nos desmantelam”.

4 Conforme salientado pelo Professor Homero Batista, à afronta: art. 7º, XIII, da CF/1988, tendo sido destacado que: 1. O conceito de tempo à disposição do empregador independe da opinião do legislador e decorre de simples observação dos fatos, das máximas da experiência e da razoabilidade do homem médio. A jornada é composta pelo trabalho e, também, pelo não trabalho colocado à disposição do empregador. 2. A efetiva ocupação do posto depende da designação feita pelo empregador, a quem compete o poder diretivo. Pode ser na portaria da fábrica ou em máquina localizada a 20, 30 ou 40min do acesso principal. O que não se pode é pretender descontar da jornada o tempo de deslocamento dentro da empresa ou nos arredores. 3. Posto de trabalho é conceito vaporoso, sem conteúdo doutrinário e que vai infernizar o processo do trabalho de agora em diante. Pense um minuto. Quanta coisa o motorista de ônibus já fez antes de dar partida no veículo? Quantos detalhes já foram resolvidos antes de a cozinheira ligar o fogão? E da costureira pregar a primeira fivela? Quanta encrenca te esperava no escritório antes que sentasse à frente de sua mesa, que é o posto de trabalho dos juristas? Agora transponha esse pensamento para a metalurgia, a petroquímica, a aeronáutica, o telemarketing e a zona rural. Claramente o artigo é uma pirraça ao TST. Uma cilada. 4. O conceito de duração do trabalho normal (art. 7º, XIII, da CF/1988) não está adstrito à energia empreendida no processo produtivo, mas a todas as atividades inerentes, no aguardo ou na execução das ordens – ainda que a matéria-prima tenha faltado, os clientes estejam ausentes da lojaou o percurso seja extenso. [...] 8. Achando-se dentro dos domínios da empresa ou nos arredores, em local desprovido de transporte coletivo, o trabalhador tem direito de computar o início da sua jornada, conforme art. 7º, XIII, da CF/1988. O art. 58, § 2º, não se sobrepõe.

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REFERÊNCIAS

______. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília/DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em: nov. 2014.

______. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 21 jul. 2017.

______. Decreto-Lei nº 5.452/1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Dis-ponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del5452.htm>. Acesso em: 21 jul. 2017.

______. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis nºs 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991.

DA SILVA, Homero Batista Mateus. Comentários à reforma trabalhista. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

Parte Geral – Doutrina

Da Flexibilização das Relações de Trabalho*

The Flexibilization of Work Relations

ROCCO AnTOnIO RAngEL ROSSO nELSOnMestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Especialista em Ministério Público, Direito e Cidadania pela Escola Superior do Ministério Pú-blico do Rio Grande do Norte, Especialista em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Potiguar, Ex-Professor do Curso de Direito e de outros cursos de Graduação e Pós-Graduação do Centro Universitário Facex, Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Res-ponsabilidade Social, vinculado à linha de pesquisa “Democracia, Cidadania e Direitos Funda-mentais” do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, campus Natal-Central, Professor Efetivo de Direito do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, campus João Câmara.

RESUMO: Ao se conversar/debater sobre as prerrogativas básicas do trabalhador, não se tem como esquivar-se sobre a amplitude desses direitos sociais e suas consequências econômicas no custo de um empreendimento empresarial. Afere-se que os argumentos sobre a chamada flexibilização/desregulamentação do direito trabalhista têm sua base numa político-econômica neoliberal, o qual propugna por uma norma trabalhista cunhado no seio do “mercado”, de sorte que ela se adeque, se amolde, às necessidades e na velocidade da expansão dele. A pesquisa em tela, fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa, usando-se os métodos de abordagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, tem por linha de fundo analisar a racionalidade do discurso sobre a flexibilização das relações de trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Relação de trabalho; flexibilização; discurso econômico; uma resposta do Direito.

ABSTRACT: When you talk/discuss the basic prerogatives of the worker, there is no way to dodge on the scale of these social rights and their economic impact on the cost of a business enterprise. Is assessed that the arguments about the so called relaxation/deregulation of labor law has its basis a new liberal political-economic, which advocates for a labor standard coined within the “market”, so it fits the requirements and speed of expansion. Research on screen, making use of a method of qualitative analysis, using the methods of hypothetical-deductive approach of descriptive and analyti-cal character, the bottom line is to analyze the rationality of discourse on flexibility of labor relations.

KEYWORD: Working relationship; flexibilization; economic discourse; a response of Law.

SUMÁRIO: Das considerações iniciais; 1 O discurso pela flexibilização dos direitos trabalhistas; 2 Perspectiva do direito do trabalho na ótica da teoria dos sistemas; 2.1 Uma breve incursão; 2.2 O sistema jurídico trabalhista como promotor da dignidade da pessoa humana; Considerações finais; Referências.

* Artigo de investigação elaborado de estudo desenvolvido na linha de pesquisa “Democracia, Cidadania e Direitos Fundamentais”, inscrito no Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Responsabilidade Social, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, Brasil.

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DAS CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Desenvolve-se uma discussão, que já atravessa décadas1, a qual veio a tomar novo fôlego com a crise financeira do “subprime”, nos Estados Unidos, em 2008, da imperiosa necessidade de reforma na legislação trabalhista, principalmente no que tange à figura da Consolidação das Leis do Trabalho, que, juntamente com o plexo de direitos fundamentais sociais previsto da Constituição Federal de 1988, tornam a figura do empregado um custo altíssimo de empresa, o que limita a possibilidade do agente econômico de se adaptar as crises2, bem como fazer frente a uma concorrên-cia, o qual não se limita mais ao ambiente de mercado local3 ou mesmo nacional, mas sim global4.

[...] essa renovação tecnológica intensa eliminava as antes impermeáveis barreiras do espaço e do tempo, extremando a competição capitalista no plano das diversas regiões do globo.5

Além das instabilidades econômicas e do fator concorrência, citado supra, somam-se ao desenvolvimento tecnológico (robotização, microeletrônica, microin-formática, hiperconectividade gerado pela internet6 etc.) novas formas de organiza-

1 Podemos falar que esse debate, no Brasil, começa a se desenvolver, fortemente, a partir da década de 90.2 Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexi-

bilização das normas trabalhistas. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p. 40.3 “‘As pessoas dispõem agora não apenas de seu próprio sistema de acesso às informações para entender melhor o

que está ocorrendo em seus países ou fora dele, não apenas para discuti-las entre si, mas também do mecanismo de comando e controle para se organizar e tomar uma providência’, acrescenta Mundie. ‘No passado, somente governos e exércitos dispunham desses tipos de sistemas de comando e controle. Agora as pessoas dispõem. E quanto mais essas ferramentas penetram em grandes volumes, mais cai o preço de sua produção e uso, e então mais elas penetram e mais longe se difundem. E, quanto mais se difundem, mais impossível se torna controlar qualquer coisa do centro’. Mais impossível se torna também manter qualquer coisa no nível ‘local’. Tudo agora flui instantaneamente dos cantos mais remotos de qualquer país para essa plataforma global onde tudo é compartilhado.” (FRIEDMAN, L. Thomas; MANDELBAUM, Michael. Éramos nós – A crise americana e como resolvê-la. Trad. Ivo Korytovski. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. p. 80)

4 “É comum ocorrerem crises, em princípio localizadas, ou restritas à esfera interna de certos países, mas que acabam alcançando outras regiões, todo o território nacional, e mesmo outros Estados nacionais, em curto espaço de tempo.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 52)

5 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso do direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 99.6 “Se a Terra Plana 1.0 girava em torno de produzir mercadorias e serviços nessa nova plataforma global, a Terra

Plana 2.0 gira em torno de tudo isso – mas também de gerar e compartilhar ideias nessa plataforma. Como Craig Mundie, superintendente de Estratégia e Pesquisa da Microsoft, nos disse, o que o PC, a internet e os mecanismos de busca fizeram para as páginas da web ‘foi permitir que qualquer pessoa com conectividade achasse qualquer coisa que lhe interessasse’, e o que o PC, o smartphone, a internet e o Facebook estão fazendo ‘é permitir que qualquer um ache qualquer pessoa’ que lhe interesse – ou ao menos qualquer dos 500 milhões de pessoas que já usam as redes sociais. Elas podem encontrar qualquer um que compartilhe seu interesse especial em tricô, culinária etíope, os New York Yankees, crianças com síndrome de Down, pesquisas sobre câncer, lançar uma jihad contra os Estados Unidos ou derrubar o governo do Egito, da Tunísia ou da Síria. Quando tantas pessoas conseguem encontrar qualquer coisa ou pessoa mais facilmente que nunca, e podem permanecer em contato mais facilmente que nunca para colaborar na produção de mercadorias, enciclopédias ou revoluções, você está na Terra Plana 2.0 – um mundo hiperconectado. E isso tem implicações profundas.” (FRIEDMAN, L. Thomas; MANDELBAUM, Michael. Éramos nós – A crise americana e como resolvê-la. Trad. Ivo Korytovski. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. p. 80)

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ção de produção e o desafio de combater o desemprego/subemprego7, dentre outros fatores8, vindo à tona o debate sobre a necessidade de flexibilização das relações de trabalho9.

Segue as palavras de Alice Monteiro de Barros:

[...] Muitos sustentavam que a predominância de normas imperativas nos institutos jurídicos era o fato gerador da crise das empresas, uma vez que lhes retirava as pos-sibilidades de adaptarem-se a um mercado turbulento. Afirmavam que a rigidez daí advinda impedia a competitividade das economias europeias e o aproveitamento das oportunidades de inovação tecnológica. [...]10

Será mesmo que esse contexto econômico justifica suplantar normas proteti-vas do trabalho? É o direito do trabalho um direito arcaico que entrava o progresso, obstaculizando o crescimento econômico?

Fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa e utilizando-se os métodos de abordagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, bus-car-se-á fazer uma apreciação sobre essa temática.

1 O DISCURSO PELA FLEXIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS TRABALHISTAS

A partir dessa realidade, galgada pelo dinamismo econômico, vê-se no direi-to do trabalho um empecilho à expansão do capital11 e à livre organização do mer-cado12. De tal sorte, propaga-se um discurso fervoroso de que a Consolidação das Leis do Trabalho está fora do seu tempo, não sendo mais um uma fonte normativa, a contento13, aos anseios desse mercado hiperconectado.

De fato, o ramo justrabalhista afirmou-se no período anterior como o mais clássico e abrangente instrumento de políticas sociais surgido no capitalismo, produzindo in-questionável intervenção normativa na economia, em favor, regra geral, de importan-

7 Cf. SCABIN, Roseli Fernandes. O direito do trabalho como limitador do poder econômico. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 31.

8 Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Op. cit., p. 42.

9 Cf. BARROS, Alice Monteiro de. Curso do direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 68.10 BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 68.11 “A flexibilização tem sido voltada para o capital, para o aumento da produção. Visa maximizar lucros em

decorrência da internacionalização das economias.” (MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 07)

12 “Na verdade, a globalização que nos é oferecida não vem acompanhada de um comportamento liberal ou neoliberal dos países centrais, já que impõem barreiras monetárias e alfandegárias. A alta proteção trabalhista e a visão do bem-estar social praticados na era da administração econômica nacional ocasionam sociedades ocidentais não competitivas em relação às economias industrializadas e, por isso, alguns defendem que tais direitos devem ser drasticamente reduzidos, diminuindo os gastos, possibilitando melhor competitividade no mercado.” (CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 26)

13 “A legislação trabalhista brasileira pode ser comparada a urna máquina ultrapassada, que foi criada para trabalhar, mas que parecia não ter nascido para semelhante fim. A CLT não tem mais a mesma finalidade que tinha quando de sua criação, necessitando ser revista. Urna das formas dessa revisão é verificar mecanismos de flexibilização, de forma a adaptar à realidade de fato à norma jurídica.” (MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 02)

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te distribuição social dos ganhos do sistema econômico. Nesse contexto, a desregula-mentação de suas regras ou, pelo menos, sua crescente flexibilização, tudo passou a compor foco destacado na matriz cultural que se generalizou no Ocidente no último quartel do século XX.14

Ao contrário, seria o direito do trabalho um verdadeiro óbice ao desenvol-vimento econômico do Brasil15, gerando efeitos deletérios ao próprio trabalhador16, visto que, em decorrência de fatores econômicos, o empregador não teria mobilida-de em suprimir direitos dos empregados, os quais foram elevados a status de direito fundamental, o que originaria a demissão dele, em decorrência da impossibilidade de redução do custo com a mão de obra.

A quebra dessa rigidez, no que tange a premissas trabalhistas, tem sido de-nominado de flexibilização do direito do trabalho17, o qual se pode dizer que tem o seguinte slogan: “Diminuição dos salários em prol da manutenção e criação de vagas de emprego”.

Essa flexibilização dar-se-ia, por exemplo, da seguinte maneira:

[...] precarização dos contratos, seja através da terceirização, do excesso de trabalho, dos baixos salários, seja através de contratos temporários; e a prevalência contratual sobre a estatutária, enfatizando-se o negociado sobre o legislado.18

Ao se falar em flexibilização dos direitos trabalhistas, vem acoplado a esse discurso a figura da necessidade da desregulamentação19, em que as normativas trabalhistas, ao invés de ser dispostas em enunciados legislativos, em que a rigidez é natural de sua estrutura, passariam a ser frutos de negociações coletivas interme-

14 DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 99.15 “Houve, sem dúvida, uma acentuada desregulação, informalização e desorganização do mercado de trabalho,

especialmente nos países semiperiféricos ao capitalismo central (Brasil, incluído), porém, sem que se criassem alternativas minimamente civilizadas de gestão trabalhista, em contraponto com o padrão juslaborativo clássico.” (DELGADO, Mauricio Godinho. Curso do direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 990)

16 “Nessa visão, a legislação criada pelo Estado, para proteger o trabalhador representada, em especial, pela Consolidação das Leis do Trabalho, acaba tendo o efeito perverso de, por vezes, retirar-lhe a sua própria fonte de renda, vale dizer, o seu emprego, isto é, a possibilidade de trabalhar para obter o seu sustento.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 52)

17 “[...] seria imperioso flexibilizar as normas que disciplinam as relações de trabalho, possibilitando ao empregador, ao invés de dispensar os empregados, em momentos, por exemplo, de dificuldade financeira, reduzir ou mesmo excluir determinados direitos, que não integrem o núcleo mínimo necessário, ainda que com a participação dos sindicatos das categorias profissionais, de modo a adaptar o direito do trabalho à atual situação econômica.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 52-53)

18 CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Op. cit., p. 42.

19 “Além disso, seria necessário desregulamentar certos aspectos da disciplina legal da relação de emprego, prevista na CLT, os quais passariam a ser regidos por normas decorrentes da negociação coletiva de trabalho.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 53)

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diados pelos sindicatos20 patronais ou pelo próprio empregador e os sindicatos dos trabalhadores21.

O atual conjunto normativo no Brasil, no que tange à flexibilização22, pos-sui exemplos dessa reivindicação empresarial: a figura do regime de tempo parcial (acrescido à CLT por meio da Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)23; suspensão do contrato para participação do empregado curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador (acrescido à CLT por meio da Medida Provi-sória nº 2.164-41, de 2001)24; empresa de trabalho temporário25; a inserção do regi-

20 “Evidencia-se nas relações coletivas de trabalho, que são organizadas através e sindicatos, uma fragilidade em todo o mundo, predominando poder econômico em detrimento de políticas públicas que possam equilibrar as forças do capital e da mão de obra. Aumentam as taxas de desfiliação sindical e os novos operários estão cada vez menos interessados no sindicato que os representa; uma das causas disso é, sem dúvida, decorrente da política neoliberal. O sindicalismo sempre esteve ao lado de posturas socialistas ou comunistas, o que não tais encontra espaço no cenário atual, devido à queda da ideologia soviética.” (LEBRE, Eduardo Antonio Temponi. A importância do emprego na era da globalização de mercado: considerações sobre a ideologia neoliberal e a reforma da Consolidação das Leis do Trabalho. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 45)

21 Pode-se falar em desregulamentação heterônoma, quando realizada unilateralmente pelo Estado, onde se estaria diante de uma flexibilização heterônoma. Bem como existe a figura a desregulamentação fruto das negociações convencionais, as quais substituiriam as garantias legais (flexibilização autônoma). Cf. BARROS, Alice Monteiro de. Curso do direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 69-70.

22 “A flexibilidade interna atinente à ordenação do trabalho na empresa compreende a mobilidade funcional e geográfica, a modificação substancial das condições de trabalho, do tempo de trabalho, [...] flexibilização externa, que diz respeito ao ingresso do trabalhador na empresa, às modalidades de contratação, de duração do contrato, da dissolução do contrato. [...]” (BARROS, Alice Monteiro de. Curso do direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 69)

23 CLT: “Art. 58-A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais. § 1º O salário a ser pago aos empregados sob o regime de tempo parcial será proporcional à sua jornada, em relação aos empregados que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral. § 2º Para os atuais empregados, a adoção do regime de tempo parcial será feita mediante opção manifestada perante a empresa, na forma prevista em instrumento decorrente de negociação coletiva.”

24 CLT: “Art. 476-A. O contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, com duração equivalente à suspensão contratual, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, observado o disposto no art. 471 desta Consolidação. § 1º Após a autorização concedida por intermédio de convenção ou acordo coletivo, o empregador deverá notificar o respectivo sindicato, com antecedência mínima de quinze dias da suspensão contratual. § 2º O contrato de trabalho não poderá ser suspenso em conformidade com o disposto no caput deste artigo mais de uma vez no período de dezesseis meses. § 3º O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual nos termos do caput deste artigo, com valor a ser definido em convenção ou acordo coletivo. § 4º Durante o período de suspensão contratual para participação em curso ou programa de qualificação profissional, o empregado fará jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador. § 5º Se ocorrer a dispensa do empregado no transcurso do período de suspensão contratual ou nos três meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará ao empregado, além das parcelas indenizatórias previstas na legislação em vigor, multa a ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo, sendo de, no mínimo, cem por cento sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato. § 6º Se durante a suspensão do contrato não for ministrado o curso ou programa de qualificação profissional, ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, ficará descaracterizada a suspensão, sujeitando o empregador ao pagamento imediato dos salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor, bem como às sanções previstas em convenção ou acordo coletivo. § 7º O prazo limite fixado no caput poderá ser prorrogado mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, desde que o empregador arque com o ônus correspondente ao valor da bolsa de qualificação profissional, no respectivo período.”

25 Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974.

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me do FGTS, impossibilitando a estabilidade do trabalhado; ampliação de contratos determinado26, dentre outros.

A título de esclarecimento técnico, deve-se ficar clarividente que o fenôme-no da flexibilização e o da desregulamentação das relações de trabalho, por mais que estejam imbricados, são fenômenos distintos27.

Na flexibilização há intervenção normativa Estatal28, em que este abranda a severidade da normativa trabalhista vigente, permitindo uma maior mobilidade. Exemplo clássico é o art. 7º, VI, da Constituição Federal de 1988: “Irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”.

Já na desregulamentação, um dos pontos nevrálgicos na política econômica neoliberal29, propugna pela ausência completa do Estado30, não havendo a consti-tuição de um patamar jurídico mínimo, permitindo que o empresariado e os traba-lhadores formatassem o contrato de trabalho segundo as dinâmicas e necessidades do mercado31.

Tem-se na desregulamentação uma supervalorização da proteção decorrente de natureza convencional em detrimento da de natureza legal32.

Destaca-se o posicionamento do Professor Sergio Pinto Martins, o qual utili-za a expressão “flexibilização das condições de trabalho” ao invés de “flexibiliza-ção do direito do trabalho”, vislumbrando nesse fenômeno algo natural/salutar, de forma a compatibilizar as regras do direito do trabalho com a realidade econômica, tecnológica e social33. Ou seja, não visualiza, o Professor Sergio Pinto Martins, a

26 Lei nº 9.601, de 21 de janeiro de 1998.27 Cf. CAIRO JR., José. Curso do direito do trabalho. 6. ed. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 117-118. 28 Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Op. cit., p. 35-36.29 “Milton Friedman afirma que qualquer intervenção no livre jogo do mercado é coercitiva. A intervenção do

Estado só se justifica para manter a lei e a ordem, julgar disputas sobre a interpretação da lei, reforçar os contratos, promover a competição, evitar o monopólio. O Estado não deveria intervir para fixar salário mínimo, pois iria distorcer o mercado; em programas de previdência, em razão de que iria provocar injustificada distribuição de renda e um incentivo para os filhos que não viessem a cuidar dos pais idosos [...].” (MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 06-07)

30 Cf. MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 10. Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p. 42.

31 “[...] Desregulamentação significa desprover de normas heterônomas as relações de trabalho. Na desregulação, o Estado deixa de intervir na área trabalhista, não havendo limites na lei para questões trabalhistas, que ficam a cargo da negociação individual ou coletiva.” (MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 14)

32 Cf. SOARES FILHO, José. Sociedade pós-industrial. Os impactos da globalização na sociedade, no trabalho, na economia e no Estado. Curitiba: Juruá, 2007. p. 103. “Os defensores da corrente neoliberalista, sob o argumento de que é o excesso de encargos trabalhistas que dificulta a gestão empresarial e o crescimento econômico, têm insistido na tese de que a negociação coletiva deve prevalecer sobre as correspondentes leis, vulnerando a hierarquia das fontes formais de direito e revogando, pela vontade coletiva dos sindicatos, os direitos arduamente conquistados e constitucionalmente garantidos” (CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p. 41).

33 MARTINS, Sergio Pinto. Op. cit., p. 13-14.

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flexibilização como uma forma de precarização das condições de trabalhos, mas a sua conformação com o dinamismo econômico34.

2 PERSPECTIVA DO DIREITO DO TRABALHO NA ÓTICA DA TEORIA DOS SISTEMAS

2.1 uma bReve incuRsão

Estar a se analisar o direito, de tal sorte, tem-se que estudar a figura do tra-balhador dentro de um isolamento jurídico o qual é constituído por uma estrutura normativa de regras e princípios.

Ultrapassar essa realidade constituiria a contaminação do sistema jurídico desvirtuando-se em algum hibridismo espúrio. “[...] o sistema jurídico é operativa-mente fechado”35, e isso a partir de uma visão luhmanniana.

Sendo assim, a lógica sistêmica jurídica opera em termos exclusivamente ju-rídicos, a partir de uma linguagem binária lícito/ilícito36. A partir disso, tem o direito a função única de garantir uma expectativa de direito, normativa37.

Com isso extrai-se a seguinte premissa: o sistema jurídico distingue-se do sis-tema político e do sistema econômico38, o qual possui uma outra lógica, uma outra linguagem, com outras funções.

O direito positivo moderno trata de todo e qualquer tema ou caso, desde que juridica-mente. A partir desse tratamento, constrói sua diferença com outros sistemas e opera com elevado grau de complexidade interna.39

A inobservância da premissa supra acarreta atribuir ao direito funções além de suas possibilidades40, vindo ele a ser reduzido como técnica do sistema político ou econômico41, quedando-se, assim, as fronteiras entre os sistemas e consequente-mente anulando ou corrompendo os limites impostos pelo direito aos demais siste-mas. Ter-se-ia a politização do direito e a mercantilização do direito42.

34 Cf. MARTINS, Sergio Pinto. Op. cit., p. 15.35 CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e diferenciação social. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 101.36 Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 105.37 Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 105.38 Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 111.39 CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 88.40 “Transformar o Direito é o que está ao alcance do sistema jurídico. Pretende transformar, com a norma

jurídica, a realidade econômica me parece um ambição, um imperialismo que vai além das possibilidades do Direito.” (CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e diferenciação social. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 94)

41 “Questão interessante e de grande importância para a presente reflexão é o fato de que, a nosso ver, dentre os ramos da ciência jurídica o direito do trabalho é, talvez, desde suas origens, o mais interdependente da Economia e dos ciclos econômicos, com todas as suas consequências no mercado de trabalho.” (SCABIN, Roseli Fernandes. O direito do trabalho como limitador do poder econômico. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 35)

42 Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 105. “[...] A política não pode operar economicamente. O mesmo se diga do direito. [...]” (CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e diferenciação social. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 109).

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É ululante que o sistema operativo fechado, a qual é o direito, não possui controle sobre os sistemas que estão em seu entorno (político, econômico, das ci-ências). Da mesma forma, esse ambiente externo ao direito não consegue suprir o conteúdo típico e único do direito.

Nas palavras do Professor Campilongo:

[...] A unidade, os limites e a especificidade do sistema jurídico são construídos a partir de dentro do próprio sistema jurídico, não são oferecidas pela economia nem pela ciência. A unidade do sistema jurídico é resultante do funcionamento do próprio sistema jurídico. A diferenciação entre o sistema jurídico, a ciência, a economia, a política, é uma diferenciação construída no interior do Direito. Isto limita muito o socorro que eu possa ter – com critérios hermenêuticos, ou, pelo menos, com critérios juridicamente admissíveis – de elementos exteriores ao sistema jurídico.43

2.2 o sistema JuRídico tRabalhista como pRomotoR da dignidade da pessoa humana

No momento em que se busca desanuviar qual a função do direito e como desenvolve o seu programa no meio das interações complexas dos sistemas, revela--se com uma clareza solar que não se pode coadunar-se com a lógica econômica do neoliberalismo, que prega um discurso de flexibilização dos direitos trabalhistas, quanto mais pactuar a sua desregulamentação.

Não se pode conceber o direito como forma de maximizar os lucros das en-tidade privadas, mas sim como uma geradora de expectativas de direito geradoras do mínimo existencial44 para o trabalhador.

Pelo filtro jurídico, não se ver no trabalhador uma mão de obra geradora de despesas, como na economia, mas sim um ser humano, uma pessoa, a qual se deve buscar um normatividade geradora de um status de promotora da dignidade humana.

É isso que constitui o direito do trabalho, um limite jurídico à racionalidade econômica45 de forma a impedir que o capital se maximize, que o mercado se ex-panda de forma que desconsidere a pessoa do trabalhador46.

43 CAMPILONGO, Celso Fernandes. Op. cit., p. 94.44 “A garantia de direitos mínimos ao trabalhador faz parte de um conjunto de valores humanos civilizatórios

(mínimo existencial), que encontra respaldo no princípio da dignidade da pessoa humana previsto constitucionalmente corno maior patrimônio da humanidade.” (CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 29)

45 “O poder econômico, que se intensificou a partir da Revolução Industrial, não é ilegítimo, e pode estar previsto e reconhecido no ordenamento jurídico. O que o legislador deve fazer é coibir os abusos, no sentido de proteger as partes mais fracas da relação jurídica. Nessa ordem de ideias, o Estado deve limitar o poder econômico, coibindo e punindo os abusos: é o que ocorre não só nas relações trabalhistas, mas também nas relações de consumo e nas relações empresariais, para proteção de pequenas e médias empresas.” (SCABIN, Roseli Fernandes. O direito do trabalho como limitador do poder econômico. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 40)

46 “Apesar das crises, é necessário firmar um projeto nacional, para que os Estados não fiquem à mercê das exigências externas, fazendo triunfar os interesses da nação, mesmo num mundo globalizado. A nossa Carta estabelece um Estado forte, intervencionista e regulador. A desregulamentação desmedida e a minimização

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Nessa esteira é o pensamento do Professor Gustavo Felipe:

O direito do trabalho, portanto, exerce o relevante papel de assegurar patamares mí-nimos de dignidade e justiça social, impedindo que a busca pela obtenção de lucros e a concorrência acabem impondo níveis inaceitáveis de exploração do trabalho huma-no, em afronta aos valores magnos da liberdade, justiça, solidariedade e bem comum.

Em conclusão, por qualquer ângulo que se analise a questão, deve-se assegurar a dignidade da pessoa humana, por meio da construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a necessária valorização social do trabalho e o respeito à livre ini-ciativa. [...]47

O discurso da flexibilização das relações de trabalho utiliza argumentos ex-traído não do sistema jurídico, mas sim de uma lógica mercadológica, extrassistê-micos48. É um discurso falacioso, que prega a redução de gastos com a mão de obra, o que geraria a manutenção das vagas de trabalho, ou possibilidade de aumentar a demanda dela, além de uma maior capacidade concorrencial (lógica econômica)49.

Isso em detrimento de direitos que proporcionam um patamar civilizatório mínimo ao homem. Ou seja, manutenção das vagas de emprego ou mesmo o seu aumento, mas rebaixando a um nível que não proporcionará ao trabalhador, sujeito de direito, uma melhor qualidade de vida, mas sim mais trabalho às custas da sua dignidade.

No escólio de Vólia Bomfim:

A “superexploração” acarreta excesso de trabalho e pouco descanso para repor o mínimo de energia. A recuperação física e mental do trabalho e do estresse dele de-

dos direitos enfraquecem o Estado, único agente capaz de, através de políticas públicas, erradicar as desigualdades sociais que se avolumam em nosso país” (CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 290). “‘[...] Chega-se à não esperada escravidão virtual’. ‘O trabalhador competente é aquele que trabalha 24 horas por dia. Realidade triste que precisa de releitura. Escravizou- -se o homem ao mercado tecnológico e as redes de informação permitem que o trabalhador se submeta a jornadas desgastantes, ambientalmente prejudiciais à sua saúde, em troca de algo que ainda não se sabe o que é. Como afirmado, o sistema capitalista vem procurando uma nova vítima para se alimentar, o próprio ser humano, o que denota sua voracidade pela já reconhecida e tão afirmada acumulação primitiva’” (KOLLER, Carlos Eduardo; VILLATORE, Marco Antônio César. A consolidação das leis do trabalho: institutos em crise e os impactos na sociedade hegemônica e capitalista brasileira. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 12).

47 GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 57.

48 “[...] Daí por que as decisões judiciais devem pautar-se por critérios intrassistêmicos e respeitar as expectativas normativas construídas pela jurisprudência, afastando qualquer elemento concernente aos efeitos que determinada decisão possa ocasionar ao Erário [...]” (Parecer constante da obra coletiva Crédito-prêmio de IPI. São Paulo: Manole, 2005. p. 26-27). “Trata-se de afirmação importante. Boa parte dos problemas aqui arrolados encontra solução fácil: orientação por critérios extrassistêmicos e propensão para o abandono das expectativas normativas em nome de expectativas cognitivas, motivadas política ou economicamente. Prefiro a cautela do Professor Paulo de Carvalho” (CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e diferenciação social. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 90).

49 “[...] nota-se que a doutrina flexibilizadora habilmente pretende convencer de que favorece o direito do trabalho constitucionalizado, quando enfrenta, pela desregulação, a crise.” (SOARES FILHO, José. sociedade pós-industrial. Os impactos da globalização na sociedade, no trabalho, na economia e no Estado. Curitiba: Juruá, 2007. p. 103)

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corrente fica esquecida, e este desconforto é agravado pelos salários cujos valores são cada vez mais insuficientes para uma subsistência mínima. Tais práticas são realizadas em nome e em busca da maior lucratividade.50

Nesse ínterim, o “capital” aumenta, se expande, se multiplica, na proporção que se aumenta a desigualdade social, a desigualdade entre classes, fomentando a concentração de renda, abstraindo o homem como sujeito, como indivíduo.

Colaciona-se, aqui, a conclusão trazida por um estudo desenvolvido pela Organização Internacional do Trabalho sobre o aumento vertiginoso do emprego formal no Brasil, na década de 200051, indo em divergência frontal à afirmação de que a legislação trabalhista seria um obstáculo à criação de empregos, bem como o exagero do processo de flexibilização, recomendando que o governo, ao invés de se concentrar em desregulamentar o mercado de trabalho, deveria concentrar os es-forços em políticas que incentivassem a formalização da atividade empresarial, seja com incentivos fiscais, seja com simplificação de registros, dentre outros52.

Destaca-se, novamente, o argumento da Professora Vólia Bonfim, que vis-lumbra a possibilidade de flexibilizar normas trabalhistas, excepcionalmente em situação de processo de recuperação da “saúde” da sociedade empresarial, perdu-rando a redução das vantagens trabalhistas nesse ínterim, tendo em vista o princípio da função social da empresa, em que, com o seu fechamento, haveria a extinção dos postos de trabalho e, consequente, prejuízo ao trabalhador53.

Ou seja, seria admissível a flexibilização, temporária e excepcionalmente, em situação de dificuldade financeira, exaustivamente comprovado, em que há um real risco de fechamento das atividades empresariais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao se falar de direito do trabalho, estar-se a estudar uma constelação de direitos elevados a status de norma fundamental propiciadora do desenvolvimento humano, numa esteira de dignificação do homem, em seu sentido mais amplo,

50 CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Op. cit., p. 41.

51 Cf. BERG, Janine. Laws or luck? Understanding rising formality in Brazil in the 2000s. International Labour Office. Brasília: ILO, 2010. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/employment/pub/laws_luck_245.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2013.

52 “The labour market flexibility debate has been exaggerated, at least in the case of Brazil. The experience of the 1990s and 2000s does not support the claim that labour regulations caused growing informality, and the strong growth in formal jobs in the 2000s at the same time that the minimum wage nearly doubled in real terms, demonstrates that labour laws are not an impediment and that some policies, such as the minimum wage, can be important for stimulating growth and job creation. Rather than focusing on deregulating the labour market, governments should take steps to encourage firms to register their businesses and their workers, either through simplifying registration, lowering taxes or providing incentives to develop high-road competitiveness strategies.” (BERG, Janine. Laws or luck? Understanding rising formality in Brazil in the 2000s. International Labour Office. Brasília: ILO, 2010. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/employment/pub/laws_luck_245.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2013, p. 24)

53 Cf. CASSAR, Vólia Bomfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Op. cit., p. 41.

126 ...............................................................................................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

galgado num longo processo histórico54 no qual se reconhece o valor do trabalho e humaniza-se o sujeito de direito.

O direito do trabalho é uma disciplina/sistema autônomo, não se constituin-do em um adendo à economia. Foi criado e constituído com o fito de proteger o trabalhador de forma que ele não fosse mais visto como mercadoria, de equalizar a relação jurídica com o detentor dos meios de produção.

Doravante, as norma trabalhistas galgam uma constelação de direitos ao tra-balhador, este naturalmente hipossuficiente, de modo a tentar ofertar um ambiente de igualdade entre as partes por meio de normas jurídicas, tendo em vista a desi-gualdade de fato.

Em nenhum ordenamento jurídico, as normas autônoma, fruto das tratativas coletivas, foram normas principais. Ao contrário, sempre foram subsidiárias às nor-mas heterônomas fixadas em lei, pois o direito do trabalho só passa a existir quando da intervenção do Estado na economia (Welfare State), em prol da aclamada igual-dade social55.

Que o direito tem sua criação e desenvolve-se a partir de necessidades de regular conduta humana tendo em vista acontecimentos fáticos, não se questiona. Todavia, ele não é um sistema anexo aos interesses políticos e econômicos, o qual se formatara ao momento. Ele possui linguagem, dinâmica e lógica própria, cons-truindo-se e reconstruindo-se dentro do seu próprio sistema.

O caráter axiológico do discurso sobre a flexibilização é de conteúdo mera-mente mercadológico; quer ver o trabalhador como custo/despesa/ônus sem razão justificável.

Acreditar que no Brasil, com estrutura sindical vigente, estes tenham condi-ções de conseguir promover tratativas, onde as partes estejam no mesmo patamar de igualdade, revertendo em expectativas de condições de trabalho melhores56 do

54 “O direito do trabalho é uma verdadeira conquista obtida ao longo da história da humanidade, exercendo papel fundamental, ao garantir condições mínimas de vida, assegurando a dignidade da pessoa humana e evitando abusos que o capital e a busca pelo lucro pudessem causar aos membros da sociedade, em especial àqueles que não detêm o poder econômico.” (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho e reforma trabalhista: o debate sobre a desregulamentação e a flexibilização. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 150, p. 51-57, mar./abr. 2013, p. 56-57)

55 “Temos a sensação de que as ideias radicais no sentido de afastamento do Estado do seu papel limitador do poder econômico representam um grande perigo, pois o eventual retrocesso das conquistas dos trabalhadores e, portanto, a piora das condições de trabalho poderão resvalar em consequências em outras esferas da vida social, inclusive com o aumento da violência que já atinge níveis insuportáveis na atualidade.” (SCABIN, Roseli Fernandes. O direito do trabalho como limitador do poder econômico. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 41)

56 “Essas negociações, quando ocorrem, podem até mesmo reduzir conquistas econômicas dos trabalhadores para evitar o desemprego; observa-se que o baixo nível de oferta de emprego e o fechamento de postos de trabalho diminuem a receita sindical, ou seja, o sindicato quer a manutenção e ampliação dos empregos, aceitando, inclusive, diminuição de direitos (como redução de jornada de trabalho e salário), o que importa na denominada desregulamentação do contrato de trabalho, ou seja, o fim da intervenção estatal nas condições contratuais de labor.” (LEBRE, Eduardo Antonio Temponi. A importância do emprego na era da globalização de mercado: considerações sobre a ideologia neoliberal e a reforma da Consolidação das Leis do Trabalho.

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que as existentes em lei é negar a história, falsear a natureza da ciência econômica e enxergar o direito como instrumento operacional dos demais sistemas sociais (sem autonomia), incapaz de gerar mudança no seio das interações em sociedade57.

REFERÊNCIAS

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______. Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974. Dispõe sobre o Trabalho Temporário nas Empresas Urbanas, e dá outras Providências. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 4 de janeiro de 1974. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6019.htm>. Acesso em: 20 dez. 2013.

In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 52)

57 “No mundo do trabalho, como consequência dos grandes índices de desemprego, assistirmos ao enfraquecimento das entidades sindicais, constritas agora defesa da manutenção, pelas empresas, das vagas de trabalho. O papel do sindicato, que outrora lutava pela conquista de direitos para os trabalhadores, fica, relegado, no mundo atual, à luta pela diminuição do desemprego” (SCABIN, Roseli Fernandes. O direito do trabalho como limitador do poder econômico. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 41). “O papel reservado aos sindicatos tem sido diminuído e a taxa de desfiliação sindical vem crescendo e a crise dos sindicatos é, igualmente, mundial, isto porque, historicamente, com exceção do Canadá, a maioria dos países teve uma postura sindical embasada na luta de classes, ou seja, no movimento político comunista e anarquista, que foi amplamente difundido e, o mais importante, vivido pelos sindicatos. E o que aconteceu foi o esgotamento desse modelo, fato evidenciado com maior clareza após a queda do muro de Berlim, em 1989, uma vez que a luta ideológica, suscitada entre o capital e o trabalho, acabou dentro do espírito comunista e anarquista. O que ficou prevalecendo foi a economia de mercado e os mecanismos de capitais, assim sendo, restou aos sindicatos uma revisão da sua postura e a adoção de medidas que tornem menos afligíveis a condição do desempregado. Para uma sociedade que funciona com altos índices de desemprego, os sindicatos são vistos como uma corporação de poucos privilegiados: os que têm um emprego (com as garantias legais e contratuais)” (LEBRE, Eduardo Antonio Temponi. A importância do emprego na era da globalização de mercado: considerações sobre a ideologia neoliberal e a reforma da Consolidação das Leis do Trabalho. In: CAVALCANTE, Jouberto e Quadros Pessoa; VILLATORE, Marco Antônio César (Coord.). CLT 70 anos de consolidação: uma reflexão social, econômica e jurídica. São Paulo: Atlas, 2013. p. 54).

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______. Lei nº 9.601, de 21 de janeiro de 1998. Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 22 de janeiro de 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9601.htm>. Acesso em: 20 dez. 2013.

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Parte Geral – Doutrina

Provas Periciais – Inspeção Judicial – Honorários Periciais e Assistentes Técnicos

JORgE DA SILVA WAgnERAdvogado, Mestrando em Direito do Trabalho pela PUC/SP, Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela PUC/SP, Especialista em Direito Civil pela FMU.

RESUMO: Este artigo tem como objetivo promover o estudo da prova pericial e inspeção judicial, buscando não só abordar conceito, generalidades e características, mas também analisar a doutrina comprando diversos autores, buscando destacar, de maneira objetiva, as principais questões debati-das em torno do tema. O estudo ainda visa a enfocar as inovações advindas com a sanção do novo Código de Processo Civil.

PALAVRAS-CHAVE: Prova; perícia; perito; assistente técnico; honorários; contraditório. inspeção ju-dicial.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceito; 2 Espécies de perícias; 3 Classificação; 4 Sistemáticas da perícia; 5 Honorários periciais; 6 Inspeção judicial; 6.1 Conceito; 7 Natureza jurídica; 8 Momento para realiza-ção; 9 Princípio do contraditório; Referências.

INTRODUÇÃO

Durante um litígio, poderá o Magistrado se deparar com uma situação fora da área de seu conhecimento e que somente uma pessoa com qualificação técnica ou especializada sobre o assunto poderá dizer ou atestar sobre o assunto envolvido, auxiliando o juiz a dar uma solução ao caso concreto.

Os primeiros indícios sobre a prova pericial surgiram na Grécia e no Egito, onde determinadas pessoas com certos conhecimentos técnicos em diversas áreas eram convocadas para proceder à averiguação, verificação, exame e vistoria de determinadas matérias ou assuntos.

No Brasil, a pericia judicial foi introduzida pelo Código de Processo Civil de 1939, nos arts. 208 e 254 a 258, que regulavam a perícia, nomeação do perito pelo juiz e indicação pelas partes.

Posteriormente, o Código de Processo Civil de 1973 revogou o CPC/1939, mantendo, entretanto, as regras do Código anterior, porém imprimindo uma reda-ção mais clara e de melhor técnica.

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O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) trouxe algumas novi-dades no regramento da perícia judicial. Assim, vamos abordar tópicos inerentes às tais mudanças na nova legislação processual.

Atualmente, a prova pericial está regulada entre os arts. 464 a 480 do novo Código Civil.

1 CONCEITO

Perícia, do latim peritia, é o conhecimento proveniente da experiência, da habilidade, do talento de indivíduo para constituir uma espécie de prova consistente no laudo ou parecer técnico ou científico dessa pessoa habilitada a formulá-lo.

As partes podem se valer de todos os meios legalmente admitidos ou moral-mente legítimos para demonstrar suas alegações.

O conhecimento dos fatos em geral chega ao Magistrado por meio de docu-mentos e depoimentos, sendo menos comum ocorrer a prova emprestada, a confis-são, os indícios etc.

Entretanto, algumas vezes, em razão da complexidade da matéria, exigem--se conhecimentos especiais (técnicos ou científicos), por ser insuficiente a prova documental ou a testemunhal.

De acordo com o art. 156 do novo Código de Processo Civil, o juiz será as-sistido por perito quando a prova depender de conhecimento técnico ou científico, perito que é considerado um auxiliar da justiça.

Assim, a prova pericial é admissível quando se necessite demonstrar no pro-cesso algum fato que dependa de conhecimento especial que esteja além dos co-nhecimentos que podem ser exigidos do homem médio e do juiz. Não importa se o juiz que está tratando da causa possui capacitação técnica individual e específica para analisar a situação controvertida; nesse caso, a prova deve ser produzida por um especialista alheio ao processo.

Segundo Fredie Didier Jr., “a prova pericial é aquela pela qual a elucidação do fato se dá com o auxílio de um perito, especialista em determinado campo do saber, devidamente nomeado pelo juiz, que deve registrar sua opinião técnica e científica no chamado laudo pericial que poderá ser objeto de discussão pelas par-tes e seus assistentes”1.

Portanto, a prova pericial consistente no exame, vistoria ou avaliação, a ser realizado por profissional especialista, previamente escolhido e designado pelo juiz, e com a finalidade de obter informações capazes de esclarecer dúvidas quanto a fatos, cujo conhecimento extrapola o saber comum do juiz.

1 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 2. ed. Bahia: JusPodivm, 2008. p. 207. 2 v.

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O laudo técnico-pericial é a materialização formal e escrita da avaliação técnica desenvolvida no curso de um processo e que expressa o parecer técnico do perito judicial ou dos assistentes técnicos, ou o conjunto destes, a respeito do ponto controvertido objeto da perícia.

2 ESPÉCIES DE PERÍCIAS

De acordo com o art. 464 do novo Codex, a prova pericial pode consistir em exame, vistoria ou avaliação.

O exame e a vistoria são atividades substancialmente iguais que se distin-guem tão somente pelo seu objeto, já que o exame consiste na inspeção por meio de perito sobre pessoas, coisas móveis ou animais com o objetivo de verificar fatos que interessam à causa. A vistoria, por sua vez, é a inspeção sobre bens imóveis cujo objetivo é o mesmo do exame, ou seja, verificar fatos que interessam à causa.

Por fim, a avaliação, também chamada de arbitramento, é a fixação de valor de coisas ou direitos, em moeda corrente, segundo os conhecimentos técnicos do avaliador.

Na seara juslaboral, podemos destacar as seguintes modalidades de perícias judiciais trabalhistas: a avaliação ambiental de trabalho que tem como finalidade embargo/interdição; a segunda avaliação ambiental de trabalho para fins de adicio-nal de insalubridade e periculosidade (ou, ainda, penosidade, quando previsto em norma coletiva ou leis municipais, já que ainda não há lei federal específica para tal hipótese); a terceira avaliação ambiental de trabalho para fins de adicional de periculosidade; o exame médico-ocupacional (nesse caso, destaca-se a possibilida-de de perícia por profissional da área da saúde, não médico, como fisioterapeutas, psicólogos, como previsto no novo CPC); e a perícia contábil.

O novo CPC, ainda, possibilita a substituição da prova pericial por simples inquirição do Juízo, quando a matéria for de menor complexidade, hipótese pouco admitida pela doutrina na seara trabalhista.

3 CLASSIFICAÇÃO

A prova pericial pode ser classificada em judicial e extrajudicial. A prova pericial judicial mais comum é aquela requerida por uma das partes ou ambas ou determinada de ofício pelo Magistrado.

A prova pericial extrajudicial é menos frequente e poderá ocorrer nas hipóte-ses do art. 195 da CLT, quando, objetivando caracterizar, classificar ou delimitar as atividades insalubres ou perigosas, poderão as empresas e os sindicatos representa-tivos das categorias profissionais interessadas requererem ao Ministério do Trabalho a realização de perícia em estabelecimento ou setor daquelas2.

2 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. A prova no processo do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 388.

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A caracterização do risco da insalubridade e/ou periculosidade será levada a efeito, regra geral, por meio de perícia por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, devidamente registrados no Ministério do Trabalho. Cristalizado o enten-dimento jurisprudencial de que é irrelevante se a perícia for realizada por engenhei-ro ou médico (OJ 165 da SDI-I do TST).

A prova judicial, ainda, poderá ser obrigatória ou facultativa; quando a prova pericial versar sobre insalubridade ou periculosidade, o juiz deverá determinar, de acordo com o art. 195, § 2º, da CLT, a realização da prova técnica, ainda que o réu seja revel e confesso quanto à matéria de fato.

Entretanto, nas ações reparatórias por acidente ou doença laboral, para aferir dano, culpa e nexo, ela não é obrigatória, contudo pode ser determinada de ofício (CLT, art. 765) ou requerida pelo interessado. Nesses casos, pode o Juízo valer-se de perícia realizada em ação em face do ente previdenciário, por exemplo.

4 SISTEMÁTICAS DA PERÍCIA

O art. 464 do novo Código de Processo Civil, aplicável ao processo juslabo-ral (CLT, art. 769), dispõe que o juiz poderá indeferir a prova pericial quando: a) a prova do fato não depender do conhecimento especial de técnico; b) for desneces-sária em vista de outras provas produzidas; e c) a verificação for impraticável.

De acordo com a normativa, o juiz poderá indeferir a prova do fato que não depender de conhecimento especial de técnico. É o que se vê do seguinte arresto:

Cabe ao juiz a direção do processo (CLT, art. 765) e o poder-dever de indeferir a prova pericial quando o fato a ser provado não depender do conhecimento especial de técnico (art. 420, I, do CPC). (TRT 3ª R., RO 759/2008-075-03-00.4, Rel. Milton V. Thibau de Almeida, DJEMG 30.03.2009)

Como reitor do processo e destinatário final da prova (arts. 370 do CPC e 765 da CLT), o juiz deve avaliar a pertinência da prova pericial e indeferi-la quando a prova não exigir conhecimento técnico ou quando for desnecessária em razão de outras provas já produzidas3.

Nesse diapasão, a 1ª Jornada de Direito do Trabalho aprovou o Enunciado nº 54, que dispensa a prova pericial, nos seguintes termos:

Prova pericial. Possibilidade de dispensa. Aplica-se o art. 427 do Código de Processo Civil no processo do trabalho, de modo que o juiz pode dispensar a produção de prova pericial quando houver prova suficiente nos autos.

Também poderá ser dispensada a prova pericial quando a prova for desne-cessária em vista de outras provas produzidas.

3 SCHIAVI, Mauro. Provas no processo do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2014. p. 202.

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A prova técnica poderá ser também ser dispensada, a critério do juiz, quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem pareceres técnicos ou documen-tos sobre questões de fato (CPC/2015, art. 472). Por exemplo, o juiz poderá dispen-sar a realização de prova pericial quando a reclamada trouxer aos autos laudo onde há prova de que o reclamante alterou grosseiramente os cartões de ponto a caneta, recebendo por horas extras não prestadas, tendo sido esse o motivo justificador da dispensa por justa causa.

E ainda, quando for impraticável a perícia, por exemplo, quando a fonte da prova não mais existir – vestígios e sinais desaparecem –, ou se revele física ou juridicamente inacessível ou quando a verificação probatória exigir recursos não disponíveis na ciência. Nesse sentido:

A desativação ou adulteração do local de trabalho não constitui fato impeditivo da perícia, se por outros meios o perito puder atingir resultado desejado pela prova. Somente haverá prejuízo à perícia se o perito declarar que a verificação se tornou impraticável (CPC, art. 420, parágrafo único, III). (TRT 2ª R., RO 20000299051, Ac. 20010397722, 9ª T., Rel. Luiz Edgar Ferraz de Oliveira, DOESP 17.07.2001)

Da perícia. Laudo. Setor desativado. Verificação impraticável. O juiz indeferirá a prova pericial quando verificar a impraticabilidade desta. A prova emprestada, em tais casos, se traduz em meio hábil capaz de solucionar a lide. (TRT 2ª R., Re-cord 2950041285/SP, 02950041285, 5ª T., Rel. Francisco Antonio de Oliveira, DJ 16.04.1996, publ. 29.04.1996)

A doutrina e jurisprudência divergem sobre o cabimento da prova empresta-da, que é aquela produzida em outro processo judicial e aproveitada em processo distinto. Parte da doutrina e da jurisprudência sustenta que é nula por violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. Outra corrente, à qual nos filiamos, sustenta pela validade por estar em conformidade ao princípio da efetividade da tutela jurisdicional.

O Tribunal Superior do Trabalho posicionou-se no AI-RR 789598/2001.3, que a utilização da prova emprestada não resulta em nulidade “se o laudo produzi-do na outra ação tratar da mesma questão em análise nos autos trabalhistas”.

Reforçando a tese ora defendida, o TST editou a OJ 278 da SDI-I, que admite a prova pericial emprestada, quando a prova for impraticável, em razão, por exem-plo, da desativação do local de trabalho nas hipóteses de insalubridade e periculo-sidade, in verbis:

Adicional de insalubridade. Perícia. Local de trabalho desativado. A realização da perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de provas.

Nesse sentido, importante destacar as seguintes ementas:

Adicional de insalubridade. Perícia. Local de trabalho desativado. Prova emprestada. Admissibilidade. Orientação Jurisprudencial nº 278 da eg. SBDI-I. Conforme a atual, iterativa e notória jurisprudência deste col. Tribunal Superior do Trabalho, cristalizada

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na Orientação nº 278 da eg. SBDI-I, quando não for possível a realização de perícia para a verificação de insalubridade, como em caso de fechamento da empresa, pode o julgador utilizar-se de outros meios de prova, como o laudo. Emprestado. Incidên-cia do Enunciado nº 333 do TST e do art. 896, § 4º, da CLT. Recurso de revista não conhecido. (TST, RR 6365326420005025555, 636532-64.2000.5.02.5555, 4ª T., Rel. Milton de Moura França, DJ 10.09.2003, publ. DJ 26.09.2003)

Periculosidade e insalubridade. Prova emprestada. Admissibilidade. A prova pericial só é obrigatória quando é possível. Desativado ou alterado o local de trabalho, ad-mite-se a prova emprestada – que também é prova técnica – desde que tenham sido avaliados o mesmo local (ou local semelhante) e as mesmas condições de trabalho, de forma a fornecer ao juiz os elementos técnicos necessários ao seu esclarecimento e convencimento. (TRT 2ª R., RO 20010459388/SP, 20010459388, 1ª T., Rel. Eduardo de Azevedo Silva, DJ 09.05.2002, publ. 28.05.2002)

Humberto Theodoro Junior sustenta que,

em lugar da pericial judicial minuciosamente regulada pela lei, o novo CPC permite a denominada produção de prova técnica simplificada, aplicável quando o ponto controvertido for de menor complexidade (art. 464, § 2º). Essa substituição da perícia pode ocorrer a requerimento das partes ou por deliberação do juiz de ofício. Consiste a prova técnica simplificada na simples inquirição em audiência de especialista, pelo juiz, sobre ponto controvertido da causa que demande especial conhecimento cientí-fico ou técnico (art. 464, § 3º).4

Verificada a necessidade de perícia, o Magistrado deverá nomear perito ha-bilitado, com conhecimento técnico sobre a questão; fixar prazo razoável para en-trega do laudo, fixando ainda prazo para as partes para apresentarem quesitos que entendam necessários para o esclarecimento dos fatos e indicar assistente técnico, caso queiram (conforme art. 465, § 1º, do CPC, tal prazo será de quinze dias, porém, no âmbito do processo do trabalho, tal prazo fica a critério do juiz).

De acordo com o art. 3º da Lei nº 5.584/1970, as perícias serão realizadas por um único perito nomeado pelo Magistrado, e cada parte poderá indicar um único assistente técnico, que deverá apresentar o laudo no mesmo prazo concedido ao perito, sob pena de desentranhamento dos autos.

Entretanto, a norma processual civil estabelece que o Magistrado poderá no-mear mais de um perito quando se tratar de perícia complexa, que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, e a parte indicar mais de um assistente técnico (CPC, art. 475). O Código de Processo Civil apenas supre situação especial, sendo de aplicação subsidiária ao processo do trabalho (CLT, art. 769).

O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi atribuído, inde-pendentemente de termo de compromisso (CPC, art. 466).

4 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 56. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 383/384. 1 v.

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Para desempenho de sua função, podem o perito e os assistentes técnicos uti-lizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder de parte ou repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças.

Tais prerrogativas não conferem poderes similares aos do Magistrado. É o que se vê do seguinte arresto:

O perito não pode substituir o juiz no exercício do poder/dever de ouvir testemunhas, na sua acepção técnica. Só o juiz tem poderes para tomar o compromisso (art. 415, caput) e advertir a testemunha quanto às sanções penais que incidirão no caso de falso testemunho. Portanto, o art. 429 do CPC há que ser interpretado no sentido de que o perito pode ouvir “informantes” a respeito do objeto da perícia. Dessa forma, ainda que tenham sido ouvidos pelo perito (“informantes”), tal circunstância não re-tira das partes o direito de produzir prova testemunhal, ainda mais quando a perí-cia não envolve conhecimento técnico. (TRT 17ª R., RO 00451.2006.009.17.00.5, Ac. 11265/2007, Rel. Cláudio Armando Couce de Menezes, DOES 13.12.2007, p. 6)

No entanto, poderá o perito escusar-se da atribuição, desde que alegue moti-vo legítimo, apresentando no prazo de cinco dias, contados da intimação o impedi-mento superveniente, sob pena de se reputar renunciado o direito a alegá-la (CPC, arts. 157 e 467), podendo ainda ser recusado por impedimento ou suspeição (CPC, art. 148, II). O Magistrado, ao aceitar a escusa ou julgar procedente a impugnação, nomeará novo perito.

Pode, ainda, o perito ser substituído quando carecer de conhecimento téc-nico ou científico; ou sem motivo legítimo, deixar de cumprir o encargo no prazo que lhe foi assinado.

Quando por dolo ou culpa o perito prestar informações inverídicas, respon-derá pelos prejuízos que causar à parte, ficará inabilitado, por dois anos, a funcionar em outras perícias e incorrerá na sanção que a lei penal estabelecer.

No prazo de cinco dias contados da intimação às partes, poderão indicar assistentes técnicos e formular quesitos. Durante o curso da perícia, também se fa-culta às partes formular quesitos suplementares, a fim de que o perito possa melhor esclarecer os fatos.

O novo Código de Processo Civil amplia o prazo de cinco para quinze dias para formulação de quesitos e indicação de assistente técnico, além de trazer algumas inovações quanto aos honorários periciais, prevendo que o perito ciente da nomea-ção deverá, no prazo de cinco dias, apresentar sua proposta de honorários, indicar seu currículo, com comprovação de sua especialização, indicar seus contatos profissio-nais, em especial seu endereço eletrônico, que será utilizado para intimá-lo.

Nada impede que a parte que inicialmente não tenha formulado os quesitos indique quesitos suplementares, uma vez que a parte tem direito de participar da formulação da prova.

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Sendo assim, surgindo circunstâncias que requerem esclarecimento, ou mes-mo se o laudo pericial não elucidar de forma adequada o fato, cabem quesitos suplementares.

O perito indicado pelo juiz, diferentemente dos assistentes técnicos indi-cados pelas partes, não deverá emitir qualquer juízo quanto à pretensão deduzida no processo, quer manifestando sobre quem tenha razão, quer examinando teses jurídicas; o laudo deve se ater ao exame, vistoria ou avaliação do objeto periciado.

O art. 473 do novo diploma, no tocante ao trabalho do perito, inova ao aden-trar no conteúdo de seu trabalho, regulamentando a forma e o conteúdo de como deverá ser apresentada a exposição do objeto da perícia, análise técnica ou científi-ca, indicação do método utilizando e resposta conclusiva a todos os quesitos apre-sentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público, estabelecendo ainda que a fundamentação deverá ser em linguagem simples e coerente, sendo vedado ultrapassar os limites de sua designação, como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.

Outra novidade significativa é a perícia consensual, em que as partes pode-rão escolher o perito de comum acordo, desde que os litigantes sejam plenamente capazes e a causa possa ser resolvida por autocomposição, prestigiando, dessa for-ma, o princípio da autonomia da vontade, com caráter vinculativo para o Magis-trado. As partes, ao escolher o perito, já devem indicar os respectivos assistentes técnicos para acompanhar a realização da perícia, que se realizará em data e local previamente anunciado (§ 1º do art. 471 do CPC).

Ressalta-se que, embora as partes possam escolher o perito que será imposto ao Magistrado independentemente de sua vontade, o prazo será fixado pelo juiz (§ 2º do art. 471 do CPC). E, para equiparar a atuação do perito indicado pelas partes ao do indicado pelo juiz, a perícia consensual substitui, para todos os efeitos, a que seria realizada por perito nomeado pelo juiz (§ 3º do art. 471 do CPC).

No que se refere à prova técnica simplificada, nada mais é que a tentativa de ressuscitar a inquirição do perito em audiência, a fim de esclarecer ponto controver-tido de menor complexidade, dispensando a elaboração de laudo escrito, podendo se valer de recursos tecnológicos de som e imagens.

Por derradeiro, o novo Código de Processo Civil permite ao Magistrado im-por sanções ao perito, quando o laudo apresentado for inconclusivo ou se mostre defeituoso, como a redução da remuneração inicialmente arbitrada para o trabalho.

O Magistrado não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua con-vicção com outros elementos ou fatos provados nos autos (art. 479 do CPC).

O art. 479 do novo Código de Processo Civil repete o art. 436 do CPC/1973. Há, entretanto, interessante novidade, já que o juiz, ao apreciar o laudo, deverá indicar na sentença os motivos que levaram a considerar ou deixar de considerar as conclusões do laudo.

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O Magistrado determinará de ofício ou a requerimento das partes uma nova perícia designando outro perito, quando a primeira perícia não esgotar totalmente o objeto da análise técnica, ou ainda subsistam dúvidas sobre o tema (art. 480 do CPC). A segunda perícia terá por objeto os mesmos fatos da primeira, e destina-se a corrigir omissão ou inexatidão dos resultados a que chegou a perícia anterior (art. 480, § 1º, do CPC).

5 HONORÁRIOS PERICIAIS

De acordo com o art. 790-B da Consolidação, a responsabilidade dos ho-norários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiário de justiça gratuita.

Não há previsão legal nas demandas envolvendo relação de emprego para “adiantamento” ou “depósito prévio” de parte dos honorários periciais, embora a prática forense demonstre o contrário.

A jurisprudência pacificou o entendimento no sentido de não serem devidos os honorários periciais prévios na Justiça do Trabalho em razão do princípio da gra-tuidade no processo juslaboral. Nesse sentido, a OJ 98 da SDI-II do col. TST:

Mandado de segurança. Cabível para atacar exigência de depósito prévio de hono-rários periciais. É ilegal a exigência de depósito prévio para custeio dos honorários periciais, dada a incompatibilidade com o processo do trabalho, sendo cabível o man-dado de segurança visando à realização da perícia, independentemente do depósito.

Contudo, com o advento da EC 45/2004, que deu nova redação ao art. 114 da Constituição Federal de 1988, a competência da Justiça do Trabalho ampliou-se, passando a julgar qualquer relação de trabalho, tendo o Tribunal Superior do Traba-lho editado a Instrução Normativa nº 27/2005, que estabelece, no art. 6º, parágrafo único, a faculdade de o juiz, em relação à perícia, exigir depósito prévio dos hono-rários, ressalvadas as lides decorrentes da relação de emprego.

Com relação aos honorários periciais do assistente técnico, o Tribunal Supe-rior do Trabalho firmou o entendimento por meio da Súmula nº 341 no sentido de que, uma vez que a indicação é faculdade da parte, ela que deve responder pelos respectivos honorários, ainda que vencedora no objeto da perícia.

Por fim, cabe ressaltar ainda a seguinte Orientação Jurisprudencial nº 387 da SDI-I do TST, convertida em maio de 2014, que estabelece:

Súmula nº 457. Honorários periciais. Beneficiário da justiça gratuita. Responsabilida-de da união pelo pagamento. Resolução nº 66/2010 do CSJT. Observância. (conver-são da Orientação Jurisprudencial nº 387 da SBDI-1 com nova redação).

A União é responsável pelo pagamento dos honorários de perito quando a parte su-cumbente no objeto da perícia for beneficiária da assistência judiciária gratuita, ob-servado o procedimento disposto nos arts. 1º, 2º e 5º da Resolução nº 66/2010 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT.

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A orientação jurisprudencial, agora convertida na Súmula nº 457, tem como objetivo a de que o perito não fique sem receber pelo seu trabalho em razão de a parte sucumbente ser beneficiária da gratuidade da justiça. Os Tribunais Regionais do Tra-balho elaboraram provimento no sentido de ser expedida certidão de honorários pelas Varas, cujos valores serão pagos pela União, matéria que atualmente é disciplinada pela Resolução nº 66/2010 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

6 INSPEÇÃO JUDICIAL

6.1 conceito

Os juízos e Tribunais têm ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência neces-sária ao esclarecimento delas (art. 765 da CLT).

A CLT é omissa a respeito da inspeção judicial. Em razão da omissão da nor-ma consolidada, aplicam-se, de forma subsidiária, os dispositivos correlatos sobre a matéria, previstos no novo Codex, arts. 481 a 484.

A respeito do tema, cumpre destacar que continua idêntico tratamento no novo Código de Processo Civil, tendo em vista que os arts. 481 a 484 que dela tra-tam são reproduções do Código de Processo Civil de 1973.

O juiz, de ofício ou a requerimento da parte, pode, em qualquer fase do pro-cesso, inspecionar pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre fato que interesse à decisão da causa (art. 481 do CPC).

Segundo leciona Cândido Rangel Dinamarco,

Inspeção judicial é a verificação pessoal de pessoas ou coisas feitas pelo próprio juiz. É uma prova real, tendo em comum com a perícia a circunstância de ser um exame a incidir sobre essas fontes passivas de prova; mas esse exame não passa de mera obser-vação para melhor esclarecer-se, sem os conhecimentos técnicos do perito. Se o juiz exigir sentir que o caso pode exigir tais conhecimentos técnicos, ser-lhe-á lícito levar consigo um perito que o auxilie a captar e melhor entender os sinais que as fontes de prova venham fornecer.5

A inspeção judicial ou inspeção ocular é o meio de prova pelo qual o juiz, sem concurso de intermediários, desloca-se da sede do juízo para recolher dados probatórios, procurando aclarar fatos ou pontos duvidosos da causa.

7 NATUREZA JURÍDICA

Sua natureza jurídica é controvertida em razão de a inspeção judicial não constituir exatamente um meio de prova, porque o juiz não se utiliza de instrumen-

5 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 625. 3 v.

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tos, objetos ou auxiliares para colher elementos de convicção, mas ele próprio sai a campo para proceder a exames e verificações, tomando contato direto com os fatos, ou seja, em verdade, é um mecanismo de obtenção de meio de prova, sendo este a pessoa ou coisa inspecionada.

A doutrina prefere qualificá-la como meio de prova especial que coloca o juiz diante do próprio fato, permitindo-lhe percebê-lo pelos seus próprios sentidos.

8 MOMENTO PARA REALIZAÇÃO

Uma vez que tem caráter complementar ou subsidiário, a inspeção judicial, em regra, deverá ser determinada após a produção de outras provas.

Dessa forma, a inspeção judicial tem como objetivo esclarecer pontos de dúvidas sobre o conjunto probatório, de forma que sua determinação pressupõe a produção de prova.

Entretanto, dispõe o art. 481 do novo Codex que o juiz poderá, em qualquer fase do processo, ordenar sua realização, razão por que, quando circunstâncias especiais os justificarem, o ato poderá ser praticado até mesmo no limiar do proce-dimento.

O juiz pode ser auxiliado por especialistas quando da realização da inspe-ção. O expert submete-se às regras gerais de impedimento e suspeição.

O novo Código de Processo Civil dispõe de algumas regras para que o juiz realizar a inspeção judicial quando: I – julgar necessário para a melhor verificação ou interpretação dos fatos que deva observar; II – a coisa não puder ser apresenta-da em juízo, sem consideráveis despesas ou graves dificuldades; III – determinar a reconstituição dos fatos.

9 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

Em homenagem ao contraditório, o Magistrado, ao determinar dia e hora para inspeção, “deverá intimar as partes para que possam se quiserem acompanhá--la, prestando esclarecimentos e fazendo observações que reputem de interesse da causa” (art. 483, parágrafo único, do CPC).

Nesse sentido é a opinião de Renato Saraiva: “As partes poderão assistir a ins-peção, prestando esclarecimentos e fazendo observações que reputem de interesse para causa. Para isso, torna-se necessária a intimação prévia do dia, hora e local da diligência, em observância ao princípio do contraditório e ampla defesa”6.

Mauro Schiavi entende que,

embora as partes têm direito de assistir à diligência, pode o Juiz do Trabalho, consi-derando os princípios da efetividade processual e a busca da verdade real (arts. 765

6 SCHIAVI, Mauro. Op. cit., p. 215.

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da CLT e 130 do CPC), postergar o contraditório para fase posterior ao término da di-ligência, pois, na realidade, tem demonstrado que, no âmbito trabalhista, dificilmente a inspeção judicial terá eficácia se as partes e, principalmente, determinada empresa forem previamente avisadas da inspeção judicial.7

O entendimento da jurisprudência é de que a ausência de intimação não caracteriza cerceio do direito de defesa.

Concluída a diligência, o Magistrado mandará lavrar auto circunstanciado, mencionando nele tudo quanto for útil ao julgamento da causa. O auto poderá ser instruído com desenho, gráfico ou fotografia (art. 483 do CPC).

REFERÊNCIAS

DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito proces-sual civil. 2. ed. Bahia: JusPodivm, 2008. 2 v.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. 3 v.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2011.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. 2 v.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil. Lei 13.105. Ino-vações, alterações, supressões. São Paulo: Método, 2015.

SCHIAVI, Mauro. Provas no processo do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2014.

TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. A prova no processo do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2003.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 56. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

7 Ibidem, p. 216.

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Superior do TrabalhoProcesso nº TST‑RR‑5249‑85.2011.5.12.0001Acórdão7ª Turma

acÓRdão

RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – JUNTADA DE DOCUMENTO COM CONTEÚDO FALSO – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS – CONFIGURAÇÃO

A juntada de documento com conteúdo falso revela nítida intenção de alterar a verdade dos fatos e, por conseguinte, induzir o julgador a erro, hipótese que se amolda perfeitamente àquela prevista no inciso II do art. 17 do CPC/1973. Assim, a Corte de origem, ao reconhecer a conduta desleal da reclamada e não enquadrá-la como litigante de má-fé, violou os arts. 17, II, e 18 do CPC/1973. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

EMPREGADO QUE NÃO CUMPRIU O PERÍODO DE CARÊNCIA PARA RECEBIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO – RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DOS SALÁ- RIOS DO PERÍODO DE AFASTAMENTO – APELO FUNDADO APENAS EM DIVERGÊNCIA JURIS- PRUDENCIAL

O único aresto colacionado pela parte desserve à comprovação de dis-senso pretoriano, nos termos da Súmula nº 296, I, do TST, por não refletir as premissas fáticas das quais partiu o acórdão recorrido. Recurso de revista de que não se conhece.

DIFERENÇAS SALARIAIS – PERÍODO APÓS O AFASTAMENTO DECORRENTE DE DOENÇA – APELO DESFUNDAMENTADO

O Tribunal Regional considerou que a pretensão da autora configurou ino-vação recursal, na medida em que alterou a causa de pedir formulada em petição inicial. A recorrente não ataca tal fundamento. Assim, está des-fundamentado o recurso de revista, porquanto suas razões se encontram dissociadas dos fundamentos adotados pelo Tribunal Regional. Incidência da Súmula nº 422 do TST. Recurso de revista de que não se conhece.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL – ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS – MATÉRIA FÁTICA

O Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto fático-probatório, consignou que a reclamante não se desincumbiu do ônus de provar o

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fato constitutivo do seu direito à indenização por danos morais, uma vez que não ficou demonstrada nos autos a ocorrência de mora no adimple-mento dos salários ou de assédio moral. Conclusão em sentido contrário esbarra no teor da Súmula nº 126 desta Corte, pois demanda o revolvi-mento de fatos e provas. Recurso de revista de que não se conhece.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR – DANOS MORAIS E MATERIAIS – CARAC- TERIZAÇÃO – RETENÇÃO DA CTPS DO EMPREGADO

A análise do acórdão recorrido revela que a Corte a quo não adotou tese explícita acerca da suposta obrigação da ré de ajuizar ação de consigna-ção em pagamento. Não foram opostos embargos de declaração. Assim, nesse ponto, o recurso de revista encontra óbice na ausência do preques-tionamento a que se refere a Súmula nº 297 do TST e torna impertinente a indicação de violação do art. 335 do Código Civil. Recurso de revista de que não se conhece.

MULTA POR ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS – ÔNUS DA PROVA

O art. 818 da CLT disciplina a distribuição do encargo probatório entre as partes do processo. Assim, a violação do mencionado dispositivo legal somente ocorre na hipótese em que magistrado decide mediante atribui-ção equivocada desse ônus, o que não ocorreu no caso dos autos. Não provado o fato constitutivo do direito ao recebimento da multa normativa, uma vez que não foi demonstrada a ocorrência de mora salarial, como se extrai do acórdão regional, é impossível reconhecer a violação literal do mencionado dispositivo de lei. Recurso de revista de que não se conhece.

JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA – BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA

Impertinente a indicação de contrariedade ao item II da Súmula nº 368 desta Corte, uma vez que tal preceito, por tratar da responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, não guarda re-lação direta com a matéria em debate, qual seja: incidência desses encar-gos na base de cálculo do imposto de renda. Recurso de revista de que não se conhece.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST--RR-5249-85.2011.5.12.0001, em que é Recorrente Elaira Drielle de Carvalho e Recorrido Tam Linhas Aéreas S.A.

A reclamante, não se conformando com o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (fls. 474/500), interpõe o presente recurso de revista (fls. 504/535) no qual aponta violação de dispositivos de lei e da Constituição Federal, bem como indica dissenso pretoriano.

Decisão de admissibilidade às fls. 538/539.

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Contrarrazões ausentes, conforme certidão à fl. 541.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos ter-mos do art. 83, § 2º, II, do Regimento Interno do TST.

É o relatório.

voto

Inicialmente, destaco que o presente apelo será apreciado à luz da Consoli-dação das Leis do Trabalho, sem as alterações promovidas pela Lei nº 13.015/2014, uma vez que se aplica apenas aos recursos interpostos em face de decisão publicada já na sua vigência, o que não é a hipótese dos autos – acórdão regional publicado em 19.03.2013.

Pela mesma razão, incidirá, em regra, o CPC de 1973, exceto em relação às normas procedimentais, que serão aquelas do Diploma atual (Lei nº 13.105/2015), por terem aplicação imediata, inclusive aos processos em curso (art. 1.046).

Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passo à análise dos pressupostos recursais intrínsecos.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – JUNTADA DE DOCUMENTO COM CONTEÚDO FALSO – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS – CONFIGURAÇÃO

conhecimento

Insurge-se a autora contra a decisão regional que, a despeito de reconhecer que a ré colacionou aos autos documentos contendo informações falsas, não deferiu o pedido de condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé. Aponta violação dos arts. 14, III, 16, 17, I e II, e 18 do CPC/1973. Transcreve arestos para o confronto de teses.

Eis a decisão recorrida:

“Busca a autora a condenação da ré às penalidades decorrentes da litigância de má-fé, tendo em vista a adulteração das fichas financeiras anexadas aos autos pela recorrida. Alega que desde a sua manifestação à defesa e aos documentos com ela apresentados, a autora impugnou as fichas financeiras juntadas pela ré, uma vez que os valores nelas contido não correspondiam aos valores depositados em sua conta salário, conforme extratos bancários anexados à petição inicial. Relata que em razão dessa arguição, foi determinada a expedição de ofício ao Banco Santander para que fornecesse os extratos bancários da sua conta corrente no período de outubro/2007 a agosto/2009, os quais, após juntados, comprovaram a veracidade das suas alegações.

Com isso, afirma que as fichas financeiras juntadas pela recorrida são imprestáveis como meio de prova da remuneração por ela auferida ao longo do contrato de traba-lho, impondo-se a aplicação das penalidades decorrentes da litigância de má-fé, com fundamento nos arts. 14, inc. III, 16, 17, inc. I e 18, todos do CPC.

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A Juíza de 1º grau indeferiu a pretensão obreira sob o argumento de que não verifi-cou qualquer das hipóteses elencadas no CPC que ensejasse a aplicação da multa pretendida.

Em que pese a indignação da autora seja pertinente, tendo em vista a deslealdade pro-cessual evidenciada ante a juntada de fichas financeiras que informem o pagamento de valores diversos aos efetivamente pagos à autora, este fato não permite a comina-ção das penalidades decorrentes da litigância de má-fé. Admitir-se-ia, no máximo, a determinação de expedição de ofício ao Ministério Público do Trabalho para as providências cabíveis, o que se fará no momento oportuno.

Ante o exposto, rejeito o pedido de aplicação das penas decorrentes da litigância de má-fé em decorrência da adulteração das fichas financeiras.” (fls. 493/494)

O art. 17, II, do CPC/1973, reputa como litigante de má-fé aquele que alterar a verdade dos fatos aduzidos na peça inicial ou de defesa.

Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior, “não é permitido ao litigante deduzir pretensão que, prima facie, vai de encontro à literalidade da lei ou ao fato que, nos autos, se revela juridicamente grave quando a parte, de forma intencional, mente acerca dos fatos que irão influir de maneira decisiva na solução judicial do litígio”1.

Afirma, ainda, este autor, que “a infração do dever de veracidade, nessa perspectiva, é punida sempre que, maliciosamente, a parte falseia a verdade para confundir o adversário ou iludir o juiz da causa, seja na descrição manipulada dos fatos fundamentais do pedido (objeto do processo), seja na inovação deformada de citações doutrinárias e jurisprudenciais, seja mesmo na deturpação de depoimentos ou documentos dos autos [...]” (destaquei).

Conforme se depreende do excerto acima transcrito, o Tribunal Regional consignou que as fichas financeiras colacionadas pela ré revelavam informações falsas, na medida em que continham dados e valores que divergiam daqueles efeti-vamente pagos à reclamante.

A juntada de documento com conteúdo falso revela nítida intenção de alterar a verdade dos fatos e, por conseguinte, induzir o julgador a erro, hipótese que se amolda perfeitamente àquela prevista no inciso II do art. 17 do CPC/1973.

Assim, a Corte de origem, ao reconhecer a conduta desleal da reclamada e não enquadrá-la como litigante de má-fé, violou os arts. 17, II, e 18 do CPC/1973, razão pela qual conheço do recurso de revista.

mÉRito

Como consequência lógica do conhecimento do apelo, por violação dos arts. 17, II, e 18 do CPC/1973, dou-lhe provimento para condenar a reclamada ao

1 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de processo civil anotado. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 35.

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pagamento de multa por litigância de má-fé no importe de um por cento sobre o valor da causa.

EMPREGADO QUE NÃO CUMPRIU O PERÍODO DE CARÊNCIA PARA RECEBIMENTO DE AUXÍLIO- -DOENÇA PREVIDENCIÁRIO – RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DO PERÍODO DE AFASTAMENTO – APELO FUNDADO APENAS EM DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL

conhecimento

A reclamante pugna pelo pagamento dos salários devidos no período em que ficou afastada do emprego, em razão de doença, sem percepção de remunera-ção por parte da empregadora ou de benefício previdenciário. Transcreve aresto ao confronto de teses.

Eis a decisão recorrida:“O auxílio-doença, regulado pelo art. 59 e seguintes, da Lei nº 8.213/1991, é devido a todo segurado que, havendo cumprido o período de carência exigido por lei (12 meses), ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.

O § 3º do art. 60 da mencionada Lei, estabelece que durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à em-presa pagar ao segurado empregado o seu salário integral, o que ocorreu na hipótese dos autos.

O que se discute, no entanto, é o dever, ou não da empresa em arcar com o paga-mento dos salários da autora após os primeiros 15 dias de afastamento, tendo em vista o indeferimento, pelo INSS, do pedido de auxílio-doença tendo em vista a falta de carência da autora segurada.

Em consulta ao Laudo Pericial anexado ao marc. 53, realizado por médico psiquiatra forense nomeado pelo Juízo, extraio os seguintes trechos que conduzem à conclusão no sentido de que não foi verificada a culpa da empresa pela doença desenvolvida pela autora.

[...]

Ao ser questionado se a autora sofreu algum incidente durante sua jornada de trabalho que lhe gerou extrema tensão emocional, respondeu o Perito que ela teve incidentes pessoais, na forma de crises ansiosas paroxísticas, ditas também de pânico, de caracte-rísticas fóbico-angustiosas, como excepcionalmente alguns passageiros de avião têm e pessoas em terra firma também têm. Por outro lado, ela nunca teve crises convulsivas (que são epilépticas), como foi alegado na inicial (marc. 53, p. 9).

Portanto, restou definido no laudo que a sintomatologia apresentada pela autora não teve origem nas atividades laborativas, podendo até ser agravadas em função disso, porém, de causa diversa que o trabalho.

É certo que a demandante esteve afastada do trabalho no período compreendido en-tre 12.02.2008 e 24.06.2009, bem como que teve negado o pedido de benefício de auxílio doença por falta de carência. Durante este período, não houve efetivamente prestação de trabalho, estando o contrato de trabalho suspenso.

A situação nos remete a uma reflexão: se por um lado o Órgão Previdenciário está obstado de conceder o benefício vindicado porque o segurado não cumpriu um dos requisitos estabelecidos no art. 59, da Lei nº 8.213/1991 (falta de carência), por outro, o empregador está obstado de exigir que o empregado retorne ao trabalho, ainda que para função diversa da sua, pois enquanto perdurar a doença que motivou o seu

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afastamento, o contrato de trabalho permanecerá suspenso. Vale dizer, o empregador só poderá admitir o retorno do empregado ao trabalho quando ele for considerado apto ao exercício da sua função ou de outra qualquer. Dessa forma, subsiste uma lacuna na lei, que não define de quem é a obrigação de arcar com o pagamento dos salários referentes ao período em que o segurado empregado esteve com o contrato de trabalho suspenso, sendo certo que só se remunera o trabalho efetivamente realizado.

Ora, a reclamante trabalhou para a reclamada por apenas 4 (quatro) meses, perma-necendo afastada do trabalho, para tratamento de doença, pelo período de 1 ano e 4 meses. Como se pode exigir da empresa o pagamento de todo esse período sem a devida prestação de serviços? E mais, na ausência da autora, a empresa ré teve que colocar outra pessoa trabalhando em seu lugar, a qual recebeu o pagamento pelo ser-viço realizado. Sendo assim, teria a empresa a obrigação de remunerar duas pessoas pelo mesmo serviço, mesmo uma delas não o fazendo?

Penso que não.

Entendo que impingir à reclamada a essa condenação significaria culpabilizá-la pela ocorrência de um dano à autora da qual não foi responsável, sem falar nos prejuízos de ordem econômica ao ter que remunerar um trabalho não realizado.

Tampouco comungo do entendimento manifestado na sentença de que a autora po-deria ter sido readaptada para outra função, pois além de não haver nenhum indício de que esse fosse o desejo da obreira, enquanto perdurasse a doença, a empresa não poderia permitir que ela trabalhasse, seja em que função fosse.

Ante todo o exposto, dou provimento ao recurso, no tópico, para excluir da condena-ção o pagamento dos salários e seus consectários, referentes ao período de afastamen-to da autora.” (fls. 482/489)

O único aresto colacionado pela parte, às fls. 517/518, desserve à comprova-ção de dissenso pretoriano, nos termos da Súmula nº 296, I, do TST, por não refletir as premissas fáticas das quais partiu o acórdão recorrido.

Isso porque, enquanto o principal fundamento adotado no acórdão recorrido para solucionar a controvérsia é a ausência de culpa da empresa e de nexo causal entre a enfermidade da autora e as atividades desenvolvidas na ré, razão pela qual esta última não poderia responder pelo infortúnio, o motivo determinante do aresto paradigma é o fato de que, naquela situação, se entendeu ser a empresa responsável pela moléstia do ex-empregado, em razão do reconhecimento de nexo causal.

Não conheço.

DIFERENÇAS SALARIAIS – PERÍODO APÓS O AFASTAMENTO DECORRENTE DE DOENÇA – APELO DESFUNDAMENTADO

conhecimento

A autora alega que ficou provado, inclusive por confissão do preposto da ré, seu retorno ao trabalho em junho de 2009, bem como o pagamento de salário inferior ao devido. Pugna, então, pela condenação da recorrida no adimplemento dessas diferenças. Aponta violação do art. 818 da CLT.

Eis a decisão recorrida:

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“A demandante diz-se credora de diferenças salariais referentes ao período após o afastamento do trabalho, ou seja, no período de 25.06.2009 a 04.08.2009, sob a ale-gação de que a demandada não pagou corretamente os seus salários.

Afirma que em análise aos extratos bancários juntados pelo Banco Santander veri-fica-se que no interstício referido ela recebeu, a título de salário, a quantia total de R$ 460,57, inferior ao efetivamente devido.

Não merece prosperar a alegação recursal.

Isto por que, verifica-se neste pedido flagrante inovação recursal, na medida em que a pretensão inicial é de pagamento de diferenças salariais decorrentes do desrespeito ao piso da categoria previsto nas normas coletivas anexadas aos autos (marc. 1, p. 6), nada mencionando e nem requerendo o pagamento de diferenças salariais advindas da desconsideração das fichas financeiras como meio de prova.

Assim, e diante da inovação ora perpetrada, nego provimento ao recurso no tópico.” (fls. 496/497)

O Tribunal Regional considerou que a pretensão da autora configurou ino-vação recursal, na medida em que alterou a causa de pedir formulada em petição inicial.

A recorrente não ataca tal fundamento, na medida em que se limita a reiterar os argumentos do recurso ordinário, fundamentando seu pedido na imprestabilida-de das fichas financeiras, e não no desrespeito ao piso normativo, como aduzido na peça vestibular.

Assim, está desfundamentado o recurso de revista, porquanto suas razões se encontram dissociadas dos fundamentos adotados pelo Tribunal Regional, qual seja: inovação recursal.

Nesse sentido é a Súmula nº 422 do TST:

“RECURSO – APELO QUE NÃO ATACA OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECOR-RIDA – NÃO CONHECIMENTO – ART. 514, II, DO CPC (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 90 da SBDI-2) – Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005

Não se conhece de recurso para o TST, pela ausência do requisito de admissibilidade inscrito no art. 514, II, do CPC, quando as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que fora proposta. (ex-OJ 90 da SBDI-2 – inserida em 27.05.2002)”

Não conheço.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL – ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS – MATÉRIA FÁTICA

conhecimento

A recorrente pretende a reforma da decisão que indeferiu o pedido de pa-gamento de indenização por danos morais decorrente de atraso no pagamento de salários, bem como do assédio moral sofrido quando do seu retorno ao labor, o

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qual teria a intenção velada de forçar seu pedido de demissão. Aponta violação dos arts. 1º, III, 5º, X, da Constituição Federal. Transcreve aresto para confronto de teses.

Eis a decisão recorrida:

“Pretende a reclamante a reforma do julgado na parte em que indeferiu o pagamento de indenização por danos morais pelo atraso no pagamento dos salários, bem como indenização pelo assédio moral sofrido por ela quando, após retornar ao trabalho, passou a ser perseguida e discriminada pelos representantes da ré, com a nítida inten-ção de forçar o seu pedido de demissão.

Evidenciada quando da análise dos tópicos anteriores (recurso da ré e da autora), que não houve o alegado atraso no pagamento dos salários, não há falar em pagamento de indenização por danos morais pretendido.

No que se refere ao alegado assédio moral, consistente na perseguição da autora e no fato de ela não ser escalada para vôos após o seu retorno, além de não restarem comprovadas as suas alegações no tocante, como bem salientado pela Juíza de 1º grau a não inclusão da autora nas escalas de vôo após o seu retorno da licença deve ser considerada como medida prudente e salutar do empregador em razão da doença da autora, sobretudo considerando que quando de seu retorno ao trabalho a sintomato-logia permaneceu inalterada.

Nego provimento ao recurso no tópico.”

O Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto fático-probatório, con-signou que a reclamante não se desincumbiu do ônus de provar o fato constitutivo do seu direito à indenização por danos morais, uma vez que não ficou demonstrada nos autos a ocorrência de mora no adimplemento dos salários ou assédio moral. Conclusão em sentido contrário esbarra no teor da Súmula nº 126 desta Corte, pois demanda o revolvimento de fatos e provas.

Inviável, assim, a aferição de violação dos artigos mencionados.

Os arestos colacionados às fls. 526/527 desservem à comprovação de dis-senso pretoriano, nos termos da Súmula nº 296, I, do TST, por não refletirem as premissas fáticas das quais partiu o acórdão recorrido.

Não conheço.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR – DANOS MORAIS E MATERIAIS – CARACTERIZAÇÃO – RETENÇÃO DA CTPS DO EMPREGADO

conhecimento

Postula a autora o pagamento de indenização por danos morais, em razão de a ré ter retido sua CTPS por prazo superior ao legal. Aduz que, se a reclamante não compareceu à homologação da rescisão contratual, cabia à empresa ajuizar ação de consignação em pagamento para devolver seu documento de trabalho. Aponta violação do art. 335, II, do Código Civil. Transcreve aresto para o confronto de teses.

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Eis a decisão recorrida:

“Insurge-se a reclamada contra a condenação ao pagamento da indenização de um dia de salário por dia de atraso na entrega da CTPS e da CCF (Carteira de Capacitação Física), conforme previsto na cláusula 50 da CCT. Alega que não efetuou a entrega dos referidos documentos por culpa da autora, que não compareceu para recebê-los no ato da homologação da sua rescisão junto ao Sindicato.

A declaração encontrada no marcador 14, p. 20, firmada pelo Sindicato Nacional dos Aeronautas ao qual é filiada a autora, comprova que a demandante não compareceu para a homologação da sua despedida, mesmo tendo sido cientificada da data e hora de homologação, consoante comprova o documento do marc. 14, p. 19. Por outro lado, o documento anexado à p. 18, do marc. 14, evidencia a autorização firmada pela autora para o depósito das verbas rescisórias em sua conta corrente.

Observo que a CTPS da autora foi a ela devolvida na primeira audiência, como cons-tou na ata respectiva (marc. 15).

A cláusula 50 da CCT assim dispõe:

‘INDENIZAÇÃO POR RETENÇÃO DA CTPS

Fica estabelecido o direito a indenização correspondente ao valor de um dia de salário por dia de atraso pela retenção da CTPS, após o prazo de 48 horas, contado da entrega para anotações contra recibo.’

No caso concreto, a autora desligou-se da empresa no dia 04.08.2009, recebeu seus haveres rescisórios no dia 13.08.2009 e a homologação da rescisão foi agendada para o dia 18.08.2009, à qual, repiso, a autora não compareceu.

A presente ação foi ajuizada somente no dia 18.07.2011, quando passados aproxima-damente 2 (dois) anos da sua rescisão contratual.

De outro norte, a demandante não produziu nenhuma prova no sentido de que a demandada estivesse retendo dolosamente sua CTPS e a sua CCF, tanto é que proce-deu à devolução dos referidos documentos já na primeira audiência, quando teve o primeiro contato efetivo com a autora após a resilição contratual.

Embora exista, de fato, previsão convencional de pagamento de multa diária pela retenção da CTPS, no presente caso entendo não se tratar de retenção, mas, sim, de inércia da autora, bem como no seu desinteresse em buscar junto à empresa os documentos que lhe pertenciam, de forma que dou provimento ao recurso da ré, no particular, para excluir da condenação o pagamento da indenização referida.”

Primeiramente, registre-se que a análise do acórdão recorrido revela que a Corte a quo não adotou tese explícita acerca da suposta obrigação da ré de ajuizar ação de consignação em pagamento. Não foram opostos embargos de declaração. Assim, nesse ponto, o recurso de revista encontra óbice na ausência do prequestio-namento a que se refere a Súmula nº 297 do TST e torna impertinente a indicação de violação do art. 335 do Código Civil, uma vez que o que se discute, nos presentes autos, é o direito ou não à indenização por danos morais, e não as hipóteses de cabimento do referido procedimento especial.

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Ainda nesse sentido, o aresto colacionado às fls. 531/532 desserve à com-provação de dissenso pretoriano, nos termos da Súmula nº 296, I, do TST, por não refletir as premissas fáticas das quais partiu o acórdão recorrido, notadamente por tratar de depósito das verbas rescisórias e não de impossibilidade de entrega e do-cumento por suposta culpa do empregado.

Não conheço.

MULTA POR ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS – ÔNUS DA PROVA

conhecimento

A autora defende o pagamento da multa normativa devida em razão do atra-so no pagamento dos seus salários. Aponta violação do art. 818 da CLT.

Eis a decisão recorrida:

“Tendo em vista o indeferimento do pedido inerente ao suposto atraso no pagamento dos salários (diferenças salariais do período de 25.06.2009 a 04.08.2009), não há falar na cominação de multa pelo atraso referido.

Nego provimento.” (fl. 498)

O art. 818 da CLT disciplina a distribuição do encargo probatório entre as partes do processo. Assim, a violação do mencionado dispositivo legal somente ocorre na hipótese em que magistrado decide mediante atribuição equivocada des-se ônus, o que não ocorreu no caso dos autos.

Não provado o fato constitutivo do direito ao recebimento da multa norma-tiva, uma vez que não se demonstrou a ocorrência de mora salarial, como se extrai do acórdão regional, é impossível reconhecer a violação literal do mencionado dispositivo de lei.

Não conheço.

JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA – BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA

conhecimento

A recorrente defende que os juros de mora e a correção monetária devem ser excluídos da base de cálculo do imposto de renda. Indica contrariedade à Súmula nº 368, II, do TST.

Eis a decisão recorrida:

“Tendo em vista o acolhimento do recurso da reclamada, que implicou no indeferi-mento das pretensões iniciais, não havendo condenação, não há falar em recolhimen-to das contribuições fiscais e previdenciárias.

Nego provimento.” (fl. 499)

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA...........................................151

Impertinente a indicação de contrariedade ao item II da Súmula nº 368 desta Corte, uma vez que tal preceito, por tratar da responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, não guarda relação direta com a matéria em debate, qual seja: incidência desses encargos na base de cálculo do imposto de renda.

Não conheço.

isto posto

Acordam os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, apenas quanto ao tema “Litigân-cia de má-fé – Juntada de documento com conteúdo falso – Alteração da verdade dos fatos – Configuração”, por violação dos arts. 17, II, e 18 do CPC/1973, e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a reclamada ao pagamento de multa por litigância de má-fé no importe de um por cento sobre o valor da causa. Eleva-se o valor da condenação em R$ 5.000,00, para fins processuais.

Brasília, 14 de junho de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001) Cláudio Brandão Ministro Relator

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Ementário34376 – Atleta profissional de futebol – seguro de acidentes de trabalho – não contratação – in-

denização devida

“Embargos. Atleta profissional de futebol. ‘Seguro de acidentes de trabalho’. Não contratação. Indenização. Nos termos do art. 45 da Lei nº 9.615/1998, as entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de acidentes de trabalho para atletas profissionais a ela vinculados, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos. E, segundo o parágrafo primeiro, a importância segurada deve garantir direito a uma indenização mínima correspondente ao valor total anual da remuneração ajustada no caso dos atletas profissionais. À míngua de previsão de sanção específica para o caso de descumprimento da obrigação, resolve-se a controvérsia à luz da responsabilidade civil, nas formas dos arts. 186, 247 e 927 do Código Civil. Comprovados o dano e o nexo de causalidade – lesão física durante uma partida de futebol sem a oportunidade de acionar seguro ante a não celebração do contrato pela empregadora –, e sendo a atividade de ris-co, conforme o próprio art. 45 em exame já antecipa, resta patente a obrigação de indenizar. No tocante ao valor da indenização, o critério estabelecido pela lei – indenização mínima correspon-dente ao valor anual da remuneração ajustada no caso dos atletas profissionais – encontra razão de ser no virtual desamparo ao atleta profissional jogador de futebol que tenha a carreira parcial ou totalmente interrompida em virtude de acidente do trabalho. Embargos de que se conhece e a que se nega provimento.” (TST – E-ED-RR-168500-29.2006.5.01.0046 – SDI-1 – Rel. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro – DJe 20.04.2017)

Comentário Editorial SínTESENo acórdão em destaque analisou-se a obrigatoriedade da contratação do seguro de acidente do trabalho para o atleta profissional jogador de futebol.

Na Lei nº 9.615/1998, com suas sucessivas alterações, encontramos que:

“Art. 45. As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de vida e de aci-dentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, para os atletas profissionais, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos.

§ 1º A importância segurada deve garantir ao atleta profissional, ou ao beneficiário por ele indicado no contrato de seguro, o direito a indenização mínima correspondente ao valor anual da remuneração pactuada.

§ 2º A entidade de prática desportiva é responsável pelas despesas médico-hospitalares e de medicamentos necessários ao restabelecimento do atleta enquanto a seguradora não fizer o pagamento da indenização a que se refere o § 1º deste artigo. (NR) (Redação dada ao artigo pela Lei nº 12.395, de 16.03.2011, DOU 17.03.2011)”

Nesse sentido:

“SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO – ATLETA PROFISSIONAL – Segundo disposição expressa no art. 45 da Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé), ‘as entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de acidentes de trabalho para atletas profissionais a ela vinculados, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos’. Sobre o tema, acom-panhando voto proferido pela Exma. Desembargadora Maria Laura Franco Lima de Faria nos autos 00668-2004-001-03-00-9 RO (1ª T.), entendo que ‘a exegese mais lógica é no sentido de que o seguro que as entidades desportivas são obrigadas a contratar deve prever cobertura contra acidente do trabalho que resulte invalidez permanente, quer total ou parcial’ (g.n.). Nesse raciocínio, o acidente que ocasiona lesão temporária no atleta (cotidiano em sua vida profissional) não está sujeito ao seguro acidente. Por outro lado, nos casos em que o atleta vem a juízo pleitear indenização pela não contratação do festejado seguro, com apoio nos arts. 186 e 927 do Código Civil, há de se verificar se a entidade desportiva assumiu ou não plenamente os encargos trabalhistas durante o período de afastamento médico; se quando da suspensão contratual, ao invés de se manter à custa do INSS na forma dos arts. 59 a 63 da Lei nº 8.213/1991, como ocorre para os trabalhadores em geral auferindo ‘renda mensal correspondente a 91% (noventa e um por cento) do salário de benefício’ (art. 61) com aten-ção ao teto nacional hoje fixado em R$ 2.400,00 (devidamente corrigido; cf. art. 5º da EC 41/2003), o atleta obtiver, do empregador, a prerrogativa da manutenção integral da remu-neração, tais pagamentos não devem ser desconsiderados para fins do supracitado art. 45 da

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Lei nº 9.615/1998. Sobretudo em se tratando de atleta com ‘supersalário’. Afinal, o parágrafo único do mesmo art. 45 da Lei nº 9.615/1998 preconiza que a ‘importância segurada deve garantir direito a uma indenização mínima correspondente ao valor total anual da remuneração ajustada [...]’ (g.n.). Na permanência da remuneração integral (prática habitual no ramo), enquanto se aguarda recuperação física do atleta, é de se ter cautela para não contemplar pa-gamento em duplicidade resultando em enriquecimento sem causa e privilégios ainda maiores para a classe. Nesse sentido, a r. sentença proferida nos autos 00752-2004-111-03-00-8 RO pelo MM. Juiz Rogério Valle Ferreira, para o caso do goleiro Velloso então empregado do Clube Atlético Mineiro, julgamento mantido em sede de recurso pela 2ª T. do Regional com relatoria do Exmo. Desembargador Bolívar Viégas Peixoto. Na decisão, os julgadores acentuaram que o ‘autor não sofreu qualquer prejuízo pela falta de seguro, tendo recebido total assistência do reclamado, médica e financeira, durante a contusão’, e que ‘no período de recuperação [...], o reclamado continuou honrando a sua remuneração, sendo certo que isto não se coaduna com a pretensão obreira no sentido de poder cumular o benefício que porventura pudesse receber de uma seguradora, com os salários pagos pelo seu empregador’ (TRT 3ª R. – RO 1643/2008-105-03-00.0 – Relª Desª Deoclecia Amorelli Dias – DJe 21.09.2010 – p. 199).”

O Mestre Wladimir Novaes Martinez corrobora:

“Em termos gerais, acidente do trabalho dos futebolistas é um evento, previsível ou não, nor-malmente de natureza traumática, que obsta a sua atividade por mais de 15 dias, entendida está como sendo os treinamentos e as práticas dos jogos propriamente ditos. E até mesmo os exercícios aeróbicos na academia do clube.

Diferentemente do que sucede com os demais segurados, empregados ou não do clube des-portivo, embora raramente possa ocorrer, por ora, desse conceito está excluída a doença ocu-pacional (doença do trabalho ou doença profissional).

Um infortúnio laboral poderá suceder dentro do retângulo no campo de futebol, durante a partida e até fora dela: o causador ser um colega do próprio clube ou jogador do adversário; qualquer pessoa, inclusive assistente de pugna e até o árbitro; a própria natureza ou o piso do gramado.

De regra, os locais de trabalho desses atletas profissionais são a sede do clube, seus centros de treinamento, locais de concentração e o estádio onde ocorre a partida de futebol e outros mais.

Em face dos salários que ultrapassem R$ 3.691,74, é recomendável aos clubes de futebol que celebrem um contrato de seguro privado para a cobertura dos acidentes do trabalho.

Em seu art. 45, a Lei Pelé diz: ‘As entidades de prática esportiva são obrigadas a contratar seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, para os atletas profissionais, com o objeto de cobrir os riscos a que estes estão sujeitos’ (redação à Lei nº 12.395/2011).” (Acidente de trabalho do jogador de futebol. Revista SínTESE Trabalhista e Previdenciária, Porto Alegre, a. I, n. 02, p. 102, ago./set. 2011)

34377 – Avulso – Ogmo – regime de trabalho no porto – jornada de trabalho – características próprias – remuneração fixada em norma coletiva – validade

“Trabalho portuário avulso. Órgão gestor de mão de obra portuária. Regime de trabalho no porto. Jornada de trabalho. Características próprias. Remuneração fixada em norma coletiva. Validade. Autonomia coletiva. Ausência de complessividade. O trabalho portuário está regulado pela nova Lei de Modernização dos Portos, a Lei nº 12.815, de 05 de junho de 2013, a qual visa, dentre outros escopos, uma reformulação do sistema de gerenciamento de operações e de mão de obra, a fim de trazer maior competitividade, eficiência e diminuição dos custos à atividade portuária. Um dos grandes destaques da referida Lei foi o relevo atribuído ao Órgão Gestor de Mão de Obra portuário, o qual passou a emergir como principal responsável por administrar o fornecimento de mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso, nos termos do art. 32 e incisos da Lei nº 12.815/2013. Nesse contexto, a remuneração, a definição das funções, a composição dos ternos, a multifuncionalidade e as demais condições do trabalho avulso serão objeto de negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores e os operadores portu-ários, definindo as características do trabalho a ser organizadas pelo Ogmo. É válida a estipulação em norma coletiva de remuneração tabelada por produção para o trabalhador avulso portuário, por expressa autorização do art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 12.023/2009, em conjunto com

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os princípios da igualdade entre entes coletivos, da autonomia coletiva e da adequação setorial (art. 7º, inciso XXVI, da CFRB), não se configurando em salário-complessivo. Precedentes do Colendo Tribunal Superior do Trabalho. Assim, eventuais exposições a condições de risco e/ou insalubridade já são consideradas quando do cálculo da remuneração,por meio de pactuação coletiva, de forma que a condenação do Ogmo e dos tomadores ao pagamento de tal parce-la representa pagamento dobrado (bis in idem). Recurso conhecido e provido.” (TRT 11ª R. – RO 0000578-61.2016.5.11.0004 – Relª Ruth Barbosa Sampaio – DJe 20.04.2017 – p. 172)

Transcrição Editorial SínTESELei nº 12.815/2013:

“Art. 32. Os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário, destinado a:

I – administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso;

II – manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso;

III – treinar e habilitar profissionalmente o trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro;

IV – selecionar e registrar o trabalhador portuário avulso;

V – estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso;

VI – expedir os documentos de identificação do trabalhador portuário; e

VII – arrecadar e repassar aos beneficiários os valores devidos pelos operadores portuários re-lativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários.

Parágrafo único. Caso celebrado contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviços, o disposto no instrumento precederá o órgão gestor e dispensará sua intervenção nas relações entre capital e trabalho no porto.”

34378 – Cartões de ponto – estabelecimento com menos de dez empregados – dispensa – legali-dade

“Estabelecimento com menos de dez empregados. Apresentação de cartões de ponto. Dispensa. A não apresentação de cartões de ponto por empresas com menos de dez colaboradores não impli-ca na inversão do ônus da prova prevista na Súmula nº 338, I, do C. TST, posto que não são obri-gadas a manter os registros de jornada destes.” (TRT 2ª R. – Proc. 0002473-28.2015.5.02.0009 – (20170232446) – Rel. José Ruffolo – DJe 24.04.2017)

Transcrição Editorial SínTESESúmula nº 338 do TST:

Nº 338 – JORNADA DE TRABALHO. REGISTRO. ÔNUS DA PROVA. (INCORPORADAS AS ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS NºS 234 E 306 DA SDI-1)

I – É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não apresentação injustificada dos controles de freqüência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário.

(ex-Súmula nº 338 – Res 121, DJ 21.11.2003)

II – A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário.

(ex-OJ 234 – Inserida em 20.06.2001)

III – Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ 306 – DJ 11.08.2003)”

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34379 – Competência – Justiça do Trabalho – local da prestação de serviço – irrelevância – alcance

“1. Ajuizamento da ação no domicílio do autor. Exegese da norma contida no art. 651, § 3º, da consolidação das leis do trabalho em harmonia com a garantia constante do inciso XXV do art. 5º do texto maior. A norma do art. 651 da CLT, editada na década de 40 do século passado, ao estabelecer o local da prestação laboral como o foro competente para ajuizamento da ação trabalhista, visou facilitar o acesso à justiça, o que pressupõe residir o empregado no local da prestação do trabalho. Por conseguinte, deve ser interpretada de acordo com a sua vocação institucional de facilitar o acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV, da Carta de 1988). 2. Tempo para preparo e troca de uniforme exigido pelo empregador. Integração na jornada. O tempo de preparo despendido pelo trabalhador na troca de uniforme, cujo uso é obrigatório, deve ser considerado à disposição do empregador, na forma do que previsto no art. 4º da CLT, inte-grando a jornada. Essa exigência constitui ordem emanada do empregador e que compete ao empregado cumprir, inclusive sob pena de desobediência. 3. Fator de atualização monetária. IPCA-E. Aplicação do contido no entendimento acolhido por esta corte em incidente de in-constitucionalidade. Data de incidência. Até que seja revogado o entendimento deste Tribunal acolhido em Incidente de Inconstitucionalidade, a atualização dos créditos trabalhistas deve ser levada a efeito com base no fato IPCA-E, não sendo afetado por recente decisão do Colendo TST. Todavia, em nome da segurança jurídica e, levando-se em consideração a modulação dos efeitos daquela decisão, a incidência dar-se-á apenas a partir de 26 de março de 2015. Recurso parcialmente provido.” (TRT 24ª R. – RO 0000284-70.2012.5.24.0106 – Rel. Des. Francisco das C. Lima Filho – DJe 11.04.2017 – p. 14)

34380 – Cooperativa de trabalho – contrato de parceria – odontologia – reconhecimento de vín-culo empregatício – impossibilidade

“Recurso ordinário. Cooperativa de trabalho. Contrato de parceria. Odontologia. Reconhecimen-to de vínculo empregatício. Impossibilidade. Admitida a celebração de parceria entre cooperati-vas para a prestação de serviços de odontologia, às reclamadas incumbe o ônus de provar a ine-xistência dos requisitos ensejadores do reconhecimento do vínculo empregatício (art. 3º da CLT). Hipótese em que comprovada a ausência de subordinação jurídica e de pessoalidade, eis que os profissionais cooperados exerciam suas atividades com autonomia, não há como se reputar ilícita a constituição da cooperativa, restando inviável o reconhecimento do vínculo empregatício. Re-curso ordinário a que se nega provimento.” (TRT 6ª R. – RO 0000322-33.2014.5.06.0003 – Rel. André Genn de Assunção Barros – DJe 11.04.2017 – p. 2276)

34381 – Dano moral – empregado portador de doença grave – dispensa discriminatória – indeni-zação – pagamento devido

“Recurso ordinário. Empregado portador de doença grave. Dispensa discriminatória. Presunção. Súmula nº 443/TST. Os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), do valor social do trabalho (art. 1º, IV) e da não discriminação (art. 3º, IV), bem como a regência da Recomendação nº 200, da OIT, sinalizam de que deve ser evitada a dispensa imotivada de um trabalhador acometido de moléstia grave, dado o seu estado debilitado, física e mentalmente, circunstância em que o trabalho, além de lhe proporcionar o sustento, é fator edificante de sua dignidade. Assim, considerando que a reclamada não fez prova em contrária, de se manter a decisão que presumiu a dispensa discriminatória de trabalhador acometido de neoplasia maligna do tecido conjuntivo (CID C49.1). Reparação por danos morais. Dosimetria. quanto ao valor a ser atribuído à indenização por danos morais, prevalece no ordenamento jurídico nacional o sistema aberto, em que se deve considerar a ofensa perpetrada, a condição cultural, social e econômica dos envolvidos, o caráter didático-pedagógico-punitivo da condenação e outras circunstâncias que, na espécie, possam servir de parâmetro para reparação da dor impingida. Nessa esteira, de se conservar o valor arbitrado por ser importe razoável e proporcional que não conduz à ruína patrimonial do ofensor, nem é vil a ponto de configurar menosprezo ao dano moral suporta-

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do pela reclamante. Recurso ordinário conhecido e não provido.” (TRT 7ª R. – RO 0000932-40.2015.5.07.0002 – Rel. Emmanuel Teofilo Furtado – DJe 25.04.2017 – p. 275)

34382 – Dano moral – faxineira – fibromialgia – hérnia de disco – condições de trabalho – agra-vamento – nexo concausal – indenização devida

“Fibromialgia. Hérnia de disco. Faxineira. Condições de trabalho. Agravamento. Nexo concau-sal. Indenização por danos morais. Deferimento. O trabalho contribuiu para o agravamento das doenças, ante a forma como os serviços eram prestados, já que a atividade de faxineira deman-dava um grande esforço da coluna vertebral, independentemente das enfermidades terem causas desconhecidas ou degenerativas. Presente, portanto, o nexo concausal entre o agravamento das doenças e as condições de trabalho enfrentadas pela reclamante. Indenização por danos morais devida.” (TRT 8ª R. – RO 0000122-26.2015.5.08.0103 – 1ª T. – Relª Desª Fed. Rosita de Nazare Sidrim Nassar – DJe 18.04.2017 – p. 88)

34383 – Empregador – meio ambiente do trabalho – saúde do empregado – responsabilidade

“Saúde do trabalhador. Atestado médico. Empregador. Obediência. É dever do empregador cui-dar da saúde do trabalhador, especialmente para cumprir determinação médica no sentido de evitar o desempenho de determinadas funções. Danos morais. Inexistência. Não comprovado o efetivo prejuízo ou dano, resta indevida a indenização quanto aos danos morais. Recurso ordiná-rio conhecido e improvido.” (TRT 22ª R. – RO 0001608-34.2016.5.2.0002 – Relª Liana Ferraz de Carvalho – DJe 12.04.2017 – p. 258)

Comentário Editorial SínTESEA vertente tem por escopo analisar a responsabilidade do empregador no meio ambiente do trabalho.A previsão está contida no Texto Constitucional:“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:[...]XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;[...]”Nesse sentido, trazemos a baila os ensinamentos dos Drs. Tereza Aparecida Asta Gemignani e Daniel Gemignani:“O meio ambiente de trabalho, pela dimensão e importância que apresenta, congrega direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, cuja análise deve ser feita sob a perspectiva constitucional.Com efeito, a constitucionalização dos direitos trabalhistas é a resposta que vem sendo apre-sentada pelo sistema normativo à nova questão social surgida na contemporaneidade, apon-tando para a edificação de um novo padrão axiológico, que a doutrina vem sedimentando na aplicação dos direitos fundamentais também às relações entre particulares, superando o antigo modelo que os restringia às relações do cidadão com o Estado.Conforme já ressaltamos em outro artigo, uma ‘das características mais expressivas da pós--modernidade, que marca a época contemporânea, é a intensificação das relações de poder entre os particulares’. Em um momento de fragilidade das instituições, o sistemático descum-primento da lei causado pelo descrédito em sua atuação coercitiva tem acirrado as disputas de poder nas relações privadas, entre as quais as trabalhistas. Quando se trata de meio ambiente de trabalho, essa relação entre particulares se reveste de especial importância, porque gera efeitos ainda mais amplos, em decorrência das consequências que pode provocar em seu entorno social.O direito de trabalhar em um ambiente saudável e seguro, disposto no inciso XXII do art. 7º da Constituição Federal ao garantir a ‘redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança’, alberga direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.Além disso, se reveste de inequívoca socialidade, por ser evidente o predomínio do interesse social sobre o meramente individual, assim ensejando a aplicação dos princípios da boa-fé ob-

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jetiva, função social do contrato, função social da empresa e função social da propriedade, pois os efeitos provocados não atingem apenas as pessoas dos contratantes, de modo que se revela insuficiente a alternativa de apenas pagar um adicional (de insalubridade ou periculosidade) em vez de melhorar, de forma efetiva, as condições do meio ambiente do trabalho.O trabalhador acidentado, ‘descartado do processo produtivo’, vai engrossar a legião dos ex-cluídos, passando a ser sustentado pela previdência, em um momento em que o modelo conhecido como Estado do Bem-estar Social se desintegra a olhos vistos.” (Meio ambiente de trabalho. Precaução e prevenção. Princípios norteadores de um novo padrão normativo. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 19 julho 2017)

34384 – Enquadramento sindical patronal – atividade preponderante – submissão do empregador às normas coletivas – observação

“Enquadramento sindical patronal. Atividade preponderante. Submissão do empregador às nor-mas coletivas celebradas pelo ente sindical representativo da sua categoria econômica ainda que a ele não seja filiado. O enquadramento sindical patronal é definido, em regra, em razão da atividade preponderante do estabelecimento, sendo certo que a inserção do empregador em uma dada categoria econômica o obriga ao adimplemento das obrigações previstas nas normas coletivas celebradas pelo sindicato respectivo, mesmo que a empresa não esteja filiada ao ente sindical, pois, além do fato deste enquadramento não depender da vontade das partes, é certo que o vínculo que une os integrantes da categoria econômica decorre da solidariedade de interesses econômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas, na forma prevista no art. 511, § 1º, da CLT.” (TRT 5ª R. – RO 0001515-85.2014.5.05.0561 – 4ª T. – Relª Desª Ana Lúcia Bezerra Silva – DJe 25.04.2017)

34385 – Estabilidade provisória – gestante – lapso de 10 meses entre a despedida e o ajuizamento da reclamatória – abuso do exercício do direito de ação – inocorrência

“Estabilidade gestante. Lapso de 10 meses entre a despedida e o ajuizamento da reclamatória. Abuso do exercício do direito de ação. Inocorrência. A demora no ajuizamento da demanda trabalhista, ainda que decorrido o período da estabilidade provisória da empregada gestante, não importa o reconhecimento do abuso do exercício do direito de ação, desde que respeitado o prazo prescricional constante do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal de 1988, garantindo-se à autora os salários desde sua dispensa até a data do término da garantia de emprego, à luz do disposto na OJ 399 da SBDI-1, do Colendo TST.” (TRT 7ª R. – RO 0000289-67.2015.5.07.0007 – Rel. Antonio Marques Cavalcante Filho – DJe 12.04.2017 – p. 126)

Comentário Editorial SínTESEDiscutiu-se no presente caso o direito de a empregada gestante interpor reclamatória tra-balhista, embora tenha ocorrido o lapso temporal de 10 meses entre a sua despedida e o ajuizamento da ação.O Tribunal concluiu que não houve abuso do direito de ação, uma vez que o prazo prescricional de dois anos foi observado pela empregada.Essa é a redação contida na OJ 399 da SBDI-1 do TST:“399. ESTABILIDADE PROVISÓRIA – AÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA APÓS O TÉRMINO DO PERÍODO DE GARANTIA NO EMPREGO – ABUSO DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AÇÃO – NÃO CONFIGURAÇÃO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – O ajuizamento de ação trabalhista após de-corrido o período de garantia de emprego não configura abuso do exercício do direito de ação, pois este está submetido apenas ao prazo prescricional inscrito no art. 7º, XXIX, da CF/1988, sendo devida a indenização desde a dispensa até a data do término do período estabilitário.”No mesmo sentido:ESTABILIDADE PROVISÓRIA – GESTANTE – AÇÃO AJUIZADA APÓS 7 MESES DO NASCI-MENTO DO FILHO – INDENIZAÇÃO – RECONHECIMENTO – “Recurso de embargos. Ges-tante. Estabilidade provisória. Demora injustificada para ajuizar ação buscando garantia de emprego. Impossibilidade de se presumir abuso de direito. Indenização. Responsabilidade objetiva. Não demonstrado o exercício abusivo do direito, já que sobre isso não há notícia nos

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autos, configura-se o direito da reclamante à indenização relativa à estabilidade provisória, nos termos como decidido pela col. Turma. A regra legal, contida no art. 10, II, letra b, do ADCT, dispõe que é vedada a despedida da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. O abuso de direito não se presume. Decorre ele da demons-tração de que a parte utiliza o controle jurisdicional com o fim de, maliciosamente, retirar da outra parte a possibilidade de reparar, por outro meio, a lesão de direito ou a minorar seus efeitos. A demora injustificada para o ajuizamento da reclamação trabalhista não é motivação excludente da reparação do direito violado. A opção de uma das partes da relação jurídica em conduzir-se contrariamente à ordem jurídica atrai a ilicitude do ato praticado, provocando a lesão a um direito. Na ordem constitucional a finalidade da proteção à maternidade mais se dirige ao nascituro do que propriamente à mãe. Daí, objetivamente, não há que se perquirir culpa. O tempo decorrido entre a dispensa e a propositura da ação não revela abuso. Ao contrário, está a revelar a inércia; a negligência que, ao fim, irá desaguar no interesse social da segurança das relações jurídicas, consubstanciada no direito tornado incerto. Para tanto, a prescrição, o que não ocorreu no presente caso. Embargos conhecidos e desprovidos.” (TST – ERR 776.813/2001.9 – SBDI-1 – Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga – DJU 1 31.08.2007)

Os Mestres Luiz Eduardo Gunther e Cristina Maria Navarro Zornig assim explicam:

“Uma das questões mais polêmicas sobre a estabilidade da gestante é aquela originada da suposta demora da mulher trabalhadora em ajuizar a ação, supondo-se, assim, a sua má-fé e só deferindo-se direito à indenização desde o ajuizamento da ação, pois seria sua a culpa pela demora.

Essa corrente foi defendida arduamente pelo Eminente Professor e Juiz Valentin Carrion, que afirmava: “A sentença deve deferir os salários a partir do ajuizamento da ação; perde os salários anteriores quem os pleiteia tardiamente; a lei quer a manutenção do emprego com trabalho e salários, mas não pode proteger a malícia”.

Mais contundente é o Eminente Professor da USP e Juiz Sergio Pinto Martins, que afirma: “Existem acórdãos que entendem que se a empregada ajuíza a ação depois de expirado o prazo da garantia de emprego, ainda assim faz jus a esse direito, em razão de que o prazo prescricional é de dois anos a contar da cessação do contrato de trabalho (art. 7º, XXIX, a, da Constituição).

Entretanto, passados alguns meses após a dispensa e pedindo a empregada reintegração, entendo que deva ser desconsiderado o período que vai da dispensa até a data do ajuizamento da ação, em razão da inércia da empregada na sua proposição e de ter direito ao emprego e não a receber sem trabalhar.

No caso de a empregada deixar terminar o período de garantia de emprego e só depois ajuizar a ação, penso que não faz jus nem a reintegração, muito menos a indenização, pois o seu ato impediu o empregador de reintegrá-la no emprego, mostrando seu desinteresse em voltar a trabalhar na empresa. O direito previsto na Constituição é ao emprego e não à indenização.” (Estabilidade da gestante: aspectos controvertidos. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 5 maio 2017)

34386 – Execução – desconsideração da personalidade jurídica – responsável subsidiário – inapli-cabilidade

“Agravo de petição. Execução. Benefício de ordem. Desconsideração da personalidade jurídica. Responsável subsidiário. Inaplicabilidade. Não provido. Conhecida a situação de insolvência da executada principal e havendo condenação de responsável subsidiário no título judicial, é desne-cessária a desconsideração da personalidade jurídica da executada para execução dos bens dos sócios da reclamada principal. A agravante consta como responsável subsidiário no título judicial, de modo que também garante a satisfação do crédito devido ao exequente. Nesta condição, é desnecessário o redirecionamento da execução para atingir os bens dos sócios da empresa com base na teoria da despersonalização da pessoa jurídica, que não pode ser invocada em benefí-cio de quem também integra o título judicial na qualidade de devedor, ainda que subsidiário, e em prejuízo ao exequente, cujo crédito possui natureza salarial. Agravo de petição conhecido e não provido.” (TRT 21ª R. – Ap 0064200-17.2012.5.21.0024 – 1ª T. – Rel. Jose Rego Junior – DJe 10.04.2017 – p. 2917)

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ...........................................................159

Remissão Editorial SínTESEVide RST nº 321, mar. 2016, assunto especial intitulado “A desconsideração da personalidade jurídica e o novo CPC”.

34387 – Execução – insolvência do devedor principal – responsável subsidiário – prosseguimento

“Execução. Responsável subsidiário. Benefício de ordem. Notório estado de insolvência do de-vedor principal. Novas diligências. Desconsideração da personalidade jurídica. Inexigibilidade. Não provido. 1. Sendo público e notório o estado de insolvência e a ausência de patrimônio da reclamada principal, torna-se despicienda, para o direcionamento da execução contra o devedor subsidiário, a prévia realização de diligências sabidamente inúteis, haja vista que a execução deve ser norteada pelos princípios da celeridade, utilidade e efetividade. 2. Da mesma forma, é prescindível a desconsideração da personalidade jurídica e a persecução dos bens dos sócios da empresa, pois a execução deve ser dirigida precipuamente àqueles que constam do título execu-tivo judicial e são devedores da obrigação, ainda que de forma subsidiária. A teoria da descon-sideração da personalidade jurídica não pode ser invocada em benefício de quem também deu causa à inadimplência. Agravo de petição conhecido e não provido.” (TRT 21ª R. – Ap 0068000-28.2013.5.21.0021 – 1ª T. – Rel. Des. José Rêgo Júnior – DJe 10.04.2017 – p. 2923)

34388 – Execução – sentença coletiva – competência – inexistência de prevenção do juízo que julgou o mérito da ação – efeitos

“Ação de execução de sentença coletiva. Competência. Inexistência de prevenção do juízo que julgou o mérito da ação coletiva. A ação de execução de título judicial de ação coletiva é autô-noma, portanto, não implica em prevenção do Juízo que analisou tal demanda. Neste sentido a Súmula 13 desta Corte: ‘Conflito de competência negativo. Execução individual de sentença pro-ferida no julgamento de ação coletiva. Inexistência de prevenção do juízo que examinou o mérito da ação coletiva. A ação de execução a título individual, originada de sentença condenatória proferida no julgamento de ação coletiva, constitui processo autônomo, a ser distribuída dentre as diversas Varas do Trabalho, inexistindo prevenção em relação à Vara da qual se originou o título executivo. Inteligência dos arts. 95, 98, § 2º, I, 99 e 100 da Lei nº 8.078/1990.” (TRT 17ª R. – RO 0001306-37.2016.5.17.0004 – Rel. Claudio Armando Couce de Menezes – DJe 26.04.2017 – p. 322)

34389 – Fraude à execução – venda do imóvel após o ajuizamento da ação – configuração

“Venda do imóvel após o ajuizamento de demanda trabalhista. Fraude à execução mantida. Re-gistre-se que o fato de a determinação para a inclusão do reclamado, ora agravado, no Banco Nacional dos Devedores Trabalhistas ter ocorrido apenas em 12.12.2012 (fl. 502), não legitima a realização do negócio jurídico compra e venda – pelo terceiro, ora agravante, tendo em vista a existência demanda capaz de reduzi-lo a insolvência desde 2002, como já explicitado.” (TRT 2ª R. – Proc. 0086400-79.2002.5.02.0482 – (20170196695) – Rel. Valdir Florindo – DJe 03.04.2017)

Remissão Editorial SínTESEVide RST nº 323, maio 2016, ementa nº 33414 do TRT 18ª R.

34390 – Horas extras – motorista – atividade externa – controle e fiscalização de jornada – Esta-tuto do Motorista – observação

“Horas extras. Motorista. Atividade externa. Controle e fiscalização de jornada. Estatuto do Mo-torista. Lei nº 13103/2015 (art. 235-B, III, da CLT e art. 67-E do CTB). 1. O marco referencial do Estatuto do Motorista é a sujeição da atividade a controles rígidos e redundantes de horário (tacógrafo, e mais a papeleta, diário de bordo ou ficha de registro externo), com rompimento do tabu relativo à alegação de trabalho externo (art. 62, I, da CLT). 2. De acordo com o art. 2º, V, b, da Lei nº 13.103/2015, o controle de jornada e de tempo de direção são obrigatórios. O art.

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67-E do Código de Trânsito Brasileiro confirma que deve haver registrador instantâneo do tem-po de direção. Esses controles, de acordo com o art. 105, II, do CTB, e do art. 2º da Resolução nº 405 do Contran, deverão ser feitos prioritariamente por tacógrafo ou congênere (equipamento registrador instantâneo inalterável de velocidade e tempo, como rastreamento satelital), a cargo do empregador, e, na sua impossibilidade, por papeleta, diário de bordo ou ficha externa, a cargo do motorista, com a fiscalização do empregador.” (TRT 4ª R. – RO 0010201-46.2014.5.04.0512 – 2ª T. – Rel. Des. Marcelo José Ferlin D’ Ambroso – DJe 05.04.2017)

Transcrição Editorial SínTESEConsolidação das Leis do Trabalho:

“Art. 62. Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados;

II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equi-param, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.

Parágrafo único. O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratifica-ção de função, se houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo acrescido de 40% (quarenta por cento). (Redação dada ao artigo pela Lei nº 8.966, de 27.12.1994, DOU 28.12.1994)”

34391 – Horas in itinere – dificuldade de acesso ao local de trabalho – requisitos preenchidos – pagamento devido

“Horas in itinere. Empregado residente em município diverso daquele em que estabelecido o empregador. O preenchimento dos requisitos legais para o recebimento das horas in itinere deve considerar a dificuldade de acesso ao local de trabalho e não a do local de residência do empre-gado. Preenchidos os requisitos do art. 58, § 2º da CLT e da Súmula nº 90 do TST, são devidas as horas in itinere. A contratação de empregado residente em município distinto daquele em que se localiza a empresa não enseja o pagamento de horas in itinere, mesmo que o transporte seja fornecido gratuitamente pelo empregador, desde que: a) o local de trabalho, em relação ao município sede, não seja de difícil acesso; e b) seja suficiente a existência de mão de obra no município sede da empresa, em relação à demanda de mão de obra desta (Súmula nº 54, TRT 18ª R.).” (TRT 18ª R. – RO 0012082-63.2015.5.18.0082 – Rel. Welington Luis Peixoto – DJe 26.04.2017 – p. 5120)

Transcrição Editorial SínTESEConsolidação das Leis do Trabalho:

“Art. 58. [...]

§ 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.

§ 3º (Revogado).” (NR)

34392 – Jornada de trabalho – escala 12 x 36 – descumprimento do acordo coletivo – regime de compensação – descaracterização – horas extras devidas

“Recurso de revista interposto pela reclamada. Acórdão regional publicado na vigência da Lei nº 13.015/2014. Horas extras. Jornada 12 x 36. Jornada noturna. Hora de 60 minutos. Previsão em norma coletiva. I – Não obstante a previsão convencional quanto ao cumprimento do regime de 12 x 36 horas, o Tribunal Regional constatou a realização habitual de horas extraordinárias

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(dobras), por isso considerou descaracterizado o regime compensatório e deferiu as horas extras respectivas. II – Recurso de revista de que não se conhece.” (TST – RR 1614-64.2013.5.09.0016 – 4ª T. – Relª Desª Conv. Cilene Ferreira Amaro Santos – DJe 07.04.2017)

Comentário Editorial SínTESECuida a ementa em estudo da descaracterização da jornada de trabalho na escala 12 x 36 e o pagamento das horas extras.

A CF/1988 limita a jornada de trabalho do empregado a oito horas diárias.

Reza o seguinte dispositivo:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro se-manais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

[...]”

Entretanto, encontramos a jornada de trabalho 12 x 36, prevista, obrigatoriamente, no acordo coletivo de trabalho. Tal jornada não tem, propriamente, amparo na lei, mas, em fonte autôno-ma de direito, reflete, na grande maioria dos casos, a livre vontade de ambas as partes. Para isso dá-se o nome de flexibilização das normas trabalhistas.

Nessa modalidade de escala, o empregado trabalha doze horas seguidas e descansa trinta e seis horas.

A Súmula nº 444 do TST, aceita esse tipo de jornada. Vejamos:

“Nº 444 – JORNADA DE TRABALHO – NORMA COLETIVA – LEI – ESCALA DE 12 POR 36 – VALIDADE – É valida, em caráter excepcional, a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso, prevista em lei ou ajustada exclusivamente mediante acordo cole-tivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, assegurada a remuneração em dobro dos feriados trabalhados. O empregado não tem direito ao pagamento de adicional referente ao labor prestado na décima primeira e décima segunda horas. (Publicada pela Resolução TST nº 185, de 14.09.2012, DJe TST de 26.09.2012, rep. DJe TST de 27.09.2012 e DJe TST de 28.09.2012)”

Importante salientarmos que, com a Lei nº 13.467/2017, há a possibilidade de empregador e empregado negociarem a jornada de trabalho individualmente sem a participação do sindicato.

O projeto estabelece a possibilidade de jornada de 12 de trabalho com 36 horas de descanso. Segundo o relator, a jornada 12 x 36 favorece o trabalhador, já que soma 176 horas de traba-lho por mês, enquanto a jornada de 44 horas soma 196 horas.

Com a reforma trabalhista, a jornada 12 x 36 passa a fazer parte da legislação. O texto tam-bém prevê que a remuneração mensal incluirá descanso semanal remunerado e descanso em feriados.

34393 – Jornada de trabalho – turno ininterrupto de revezamento – entrada antecipada – norma coletiva – limite de 15 minutos para tomar café e trocar de uniforme não computados como tempo à disposição do empregador – efeitos

“Turno ininterrupto de revezamento. Entrada antecipada. Norma coletiva. Limite de 15 minutos para tomar café e trocar de uniforme não computados como tempo à disposição do empregador. Reuniões relâmpago. Não comprovadas. Habitualmente, a entrada era anotada com minutos de antecedência, mas o autor não comprovou que tal período se destinava às reuniões relâmpago. Nesse caso, como existe permissivo normativo, presume-se que tal período destinava-se ao tempo não contabilizado na jornada, facultativo ao empregado, cuja finalidade era tomar café da manhã e trocar de roupa, conforme previsto no parágrafo nono da cláusula quarta da norma coletiva.” (TRT 1ª R. – RO 0011246-63.2015.5.01.0341 – 4ª T. – Rel. Alvaro Luiz Carvalho Moreira – DOERJ 12.04.2017)

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Comentário Editorial SínTESENo v. acórdão analisou-se o tempo à disposição do empregador na troca de uniforme e o período para tomar café.O TST já se posicionou na seguinte Súmula:“Nº 366 – CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO. (CONVERSÃO DAS ORIENTAÇÕES JURISPRUDEN-CIAIS NºS 23 E 326 DA SDI-1)Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal, pois configurado tempo à disposição do empregador, não importando as atividades desenvolvidas pelo empregado ao longo do tempo residual (troca de uniforme, lanche, higiene pessoal, etc.). (Redação dada à Súmula pela Resolução TST nº 197, de 12.05.2015, DJe TST de 15.05.2015, rep. DJe TST de 18.05.2015)”No mesmo sentido, destacamos a seguinte decisão assim ementada:“JORNADA DE TRABALHO – TEMPO DESTINADO À TROCA DE UNIFORME – CÔMPUTO – Tempo destinado à troca de uniforme. Integração à jornada de trabalho. Hipótese de cabi-mento. Ocorrendo a troca de uniforme e outros preparativos no início e no final da jornada propriamente dita exclusivamente em razão da necessidade de rigor na higiene e asseio, vi-sando a uma produção de maior qualidade, convertendo-se em benefício da própria empresa, e, tratando-se de cumprimento de exigência advinda unicamente da empregadora, há que se computar esse tempo como de efetivo trabalho, ainda que apenas preparatório a ele. Inteligên-cia da Súmula/TST nº 366. (TRT 24ª R. – RO 323-31.2012.5.24.0021 – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Nicanor de Araújo Lima – DJe 03.12.2012)”Salientarmos o entendimento esposado pelo Mestre Valentin Carrion: “Tempo de serviço efetivo: soma dos períodos de vigência do contrato de trabalho, em que o empregado executa ou aguarda ordens ou aos que a lei atribui os mesmos efeitos, parcial ou totalmente; estes últimos são os períodos de interrupção do contrato e às vezes de suspensão.” (Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 40)Por fim, destacamos que, com a publicação da Lei nº 13.467/2017, a qual alterou significa-tivamente a Consolidação das Leis do Trabalho, o § 2º do art. 4º, não considera como tempo à disposição do empregador as seguintes situações:“Art. 4º [...][...]§ 2º Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1º do art. 58 desta Consolidação, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras: I – práticas religiosas; II – descanso; III – lazer; IV – estudo; V – alimentação; VI – atividades de relacionamento social; VII – higiene pessoal; VIII – troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa.” (NR).”

34394 – Motorista carreteiro – prestação de serviços em diversos estados da federação – norma coletiva aplicável – efeitos

“Recurso ordinário empresarial. Motorista carreteiro. Prestação de serviços em diversos estados da federação. Norma coletiva aplicável. A averiguação acerca da norma coletiva aplicável à determinada relação de trabalho deve ser feita, como regra, in abstrato, tendo sempre em mente

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ...........................................................163

os parâmetros legais e constitucionais acerca da representação sindical (art. 8º, II, da CF/1988; arts. 511 e 611, da CLT). No caso, inexiste controvérsia quanto à representação das entidades sin-dicais (econômica e profissional) nas normas coletivas adunadas por ambas as partes, mas apenas quanto ao critério de eleição a ser adotado para definir, dentre elas, qual a aplicável ao contrato de trabalho, prevalecendo, pela especificidade do caso – motorista carreteiro que presta serviços em diversos Estados da Federação – o critério da vinculação (filial à qual esteve subordinado). Re-curso improvido, no particular.” (TRT 6ª R. – RO 0001365-80.2014.5.06.0172 – Rel. Ruy Salathiel de Albuquerque e Mello Ventura – DJe 26.04.2017 – p. 1680)

34395 – Pensão vitalícia – limitação a 65 anos – impossibilidade

“Recurso de revista da reclamada. Apelo interposto sob a égide da Lei nº 13.015/2014. Pensão vitalícia. Limitação a 65 anos. Impossibilidade. Cinge-se a controvérsia a determinar se a pensão mensal, fixada pela redução da capacidade laborativa do empregado, em decorrência de doença ocupacional, pode ou não ser limitada à idade média da capacidade laborativa do trabalhador brasileiro, no caso, 65 (sessenta e cinco) anos. Nos termos do art. 950, caput, do Código Civil, ha-vendo a redução da capacidade laborativa em decorrência de dano ou lesão sofridos quando do exercício da profissão, a indenização deferida à parte lesionada pode incluir pensão correspon-dente à perda da capacidade laborativa. Conforme se depreende da redação do referido preceito legal, a pensão, no caso de redução da capacidade laborativa, não encontra limites temporais, sendo, portanto, devida enquanto perdurar a situação fática de incapacidade. Ora, não se pode autorizar que uma pessoa que já tenha ficado inabilitada, total ou parcialmente, para o desem-penho de suas atribuições, e que, no último caso, não se recupere, venha a sofrer novo prejuízo, em decorrência da cessação do pagamento da pensão mensal devido pela pessoa que lhe causou o dano, sobretudo quando já estiver com idade mais avançada. Dessarte, não prospera o pleito de limitação da pensão mensal à idade média da capacidade laborativa brasileira (65 anos). Precedentes. Recurso de Revista não conhecido. Recurso de revista adesivo do reclamante. Não conhecimento do recurso principal. Aplicação do art. 997, § 2º, inciso III, do CPC/2015 (que re-produz o teor do art. 500, III, do CPC/1973). Nos termos do art. 997, § 2º, inciso III, do CPC/2015 (que reproduz o teor do art. 500, III, do CPC/1973), não conhecido o Recurso principal, igual sorte segue o Recurso adesivo. Recurso de Revista adesivo do Reclamante não conhecido.” (TST – RR 334700-48.2005.5.01.0341 – 4ª T. – Relª Min. Maria de Assis Calsing – DJe 07.04.2017)

34396 – Portuário – avulso – prescrição bienal – aplicabilidade

“Recurso de revista interposto pelo reclamado. 1. Trabalhador portuário avulso. Prescrição bienal. Aplicabilidade. I – Mesmo após o cancelamento da Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1/TST, o entendimento de que a prescrição bienal do art. 7º, XXIX, da CF é aplicável ao trabalhador avulso manteve-se firme nesta Corte Superior, com amparo no art. 7º, XXXIV, da CF/1988, que trata da isonomia entre os trabalhadores avulsos e os empregados com vínculo permanente. II – Por outro lado, a jurisprudência que se sedimentou no Tribunal Superior do Trabalho é de que, em relação ao trabalhador avulso, o prazo prescricional de dois anos previsto no art. 7º, XXIX, da CF/1988 para reclamar eventuais direitos da relação de trabalho é contado da data do cancelamento ou extinção do seu registro perante o Ogmo. Julgados. III – Recurso de revista de que não se conhece. 2. Diferenças de adicional noturno. Aplicação da Lei nº 4.860/1965 aos trabalhadores portuários avulsos. I – O entendimento que prevalece nesta Turma é de que o art. 4º, § 1º, da Lei nº 4.860/1965 se aplica apenas aos trabalhadores da Administração dos Portos Organizados, por força de previsão expressa do art. 19 daquele Diploma Legislativo, assim redi-gido: ‘as disposições desta Lei são aplicáveis a todos os servidores ou empregados pertencentes às Administrações dos Portos organizados sujeitos a qualquer regime de exploração’. Logo, o art. 4º, § 1º, da Lei nº 4.860/1965 não se aplica ao trabalhador portuário avulso vinculado a ter-minal de uso privado, como é o caso do Reclamante. III – Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.” (TST – RR 306-75.2011.5.04.0121 – 4ª T. – Relª Desª Conv. Cilene Ferreira Amaro Santos – DJe 07.04.2017)

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Transcrição Editorial SínTESEOJ – 1ª Seção de Dissídios Individuais nº 384 do Tribunal Superior do Trabalho:“384. TRABALHADOR AVULSO. PRESCRIÇÃO BIENAL. TERMO INICIAL. (CANCELADA)É aplicável a prescrição bienal prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988 ao trabalha-dor avulso, tendo como marco inicial a cessação do trabalho ultimado para cada tomador de serviço. (Cancelada pela Resolução TST nº 186, de 14.09.2012, DJe TST de 26.09.2012, rep. DJe TST de 27.09.2012 e DJe TST de 28.09.2012)”

34397 – Processo do trabalho – leilões sucessivos – limitação – ausência – efeitos

“1. Agravo de petição. Leilões sucessivos. Art. 888 da CLT. Ausência de limitação no processo do trabalho. O processo do trabalho não veda a realização de leilões sucessivos do bem penhorado para se alcançar o objetivo colimado na execução, conforme se extrai do art. 888, da CLT, não havendo que se falar de aplicação subsidiária do inciso V do art. 88,6 do CPC/2015. 2. Leilão. Lance mínimo. Preço vil. Art. 891, parágrafo único, do CPC/2015. Aplicação subsidiária. Diante da omissão da CLT quanto ao lance mínimo a ser observado no leilão do bem penhorado, eviden-te que o teor do 891, do CPC/2015, guarda compatibilidade com o processo do trabalho. Agravo de petição conhecido e parcialmente provido.” (TRT 10ª R. – Ap 0000053-20.2013.5.10.0002 – Rel. Grijalbo Fernandes Coutinho – DJe 11.04.2017 – p. 38)

Transcrição Editorial SínTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 888. Concluída a avaliação, dentro de dez dias, contados da data da nomeação do ava-liador, seguir-se-á a arrematação, que será anunciada por edital afixado na sede do juízo ou tribunal e publicado no jornal local, se houver, com a antecedência de 20 (vinte) dias.§ 1º A arrematação far-se-á em dia, hora e lugar anunciados e os bens serão vendidos pelo maior lance, tendo o exequente preferência para a adjudicação.§ 2º O arrematante deverá garantir o lance com o sinal correspondente a 20% (vinte por cento) do seu valor.§ 3º Não havendo licitante, e não requerendo o exequente a adjudicação dos bens penhorados, poderão os mesmos ser vendidos por leiloeiro nomeado pelo juiz ou presidente.§ 4º Se o arrematante, ou seu fiador, não pagar dentro de 24 (vinte e quatro) horas, o preço da arrematação, perderá, em benefício da execução, o sinal de que trata o § 2º deste ar-tigo, voltando à praça os bens executados. (Redação dada ao artigo pela Lei nº 5.584, de 26.06.1970, DOU 29.06.1970)”

34398 – Reclamação trabalhista – pensionista de ex-funcionário da extinta Fepasa – complemen-tação – cabimento

“Reexame necessário. Reclamação trabalhista. Pensionista de ex-funcionário da extinta Fepasa. Complementação de pensão. Pretensão de receber o reajuste salarial previsto no Dissídio Coletivo TST-DC-92590/2003 entabulado entre a RFFSA e o Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana. Previsão de paridade com os empregados da ativa. Relação de trato sucessivo. Prescrição parcelar que deve ser considerada. Inexistência de comprovação de qualquer defasagem entre os valores percebidos pela autora e os ferroviários em atividade nos cinco anos que antecederam o ajuizamento da ação. Reexame necessário provido, para julgar improcedente o pedido.” (TJSP – RN 0006464-40.2016.8.26.0047 – Assis – 5ª CDPúb. – Relª Maria Laura Tavares – DJe 03.04.2017)

34399 – Relação de emprego – corretor de seguros – configuração

“Bradesco seguros. Vínculo de emprego. Corretor de seguros. Evidenciados os elementos para sua caracterização, constantes dos arts. 2º e 3º da CLT, gera vínculo de emprego a prestação de serviços de corretor de seguros, quando evidenciados os elementos para sua caracterização e,

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ...........................................................165

especialmente, demonstrada a inserção do trabalhador na dinâmica e no objeto social da empre-sa. Recurso da reclamante provido, no aspecto.” (TRT 4ª R. – RO 0001220-53.2012.5.04.0009 – 1ª T. – Relª Desª Laís Helena Jaeger Nicotti – DJe 25.04.2017)

34400 – Rescisão do contrato de trabalho – empregado portador do vírus HIV – dispensa discri-minatória – configuração

“Dispensa discriminatória. Caracterizada. É ônus do empregador, consoante dicção da Súmula nº 443 do C. TST, comprovar o motivo ensejador da dispensa. Inexistindo prova em sentido con-trário presume-se que a despedida foi derivante da enfermidade (HIV) da qual a autora é portado-ra.” (TRT 2ª R. – Proc. 00001352-63.2010.502.0033 – (20170201885) – Relª Juíza Maria Cristina Xavier Ramos Di Lascio – DJe 19.04.2017)

Transcrição Editorial SínTESESúmula nº 443 do TST:“Nº 443 – DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DO-ENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO. Presume-se dis-criminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego. (Publicada pela Resolução TST nº 185, de 14.09.2012, DJe TST de 26.09.2012, rep. DJe TST de 27.09.2012 e DJe TST de 28.09.2012)”

34401 – Rescisão do contrato de trabalho – pedido de demissão – prova por áudio – efeitos

“Conversão do pedido de demissão em dispensa sem justa causa. Prova contida em áudio gravado em CD. Restando claro pela análise do áudio contido no CD-R, anexado aos autos pela autora, que a mesma pediu demissão, indevido o pedido de conversão em dispensa sem justa causa.” (TRT 1ª R. – RO 0010778-93.2015.5.01.0343 – 3ª T. – Relª Raquel de Oliveira Maciel – DOERJ 20.04.2017)

34402 – Rescisão indireta – sucessivas alterações lesivas nas regras de comissionamento – reco-nhecimento

“Sucessivas alterações lesivas nas regras de comissionamento. Reconhecimento da rescisão in-direta do contrato de trabalho. Princípio da imediatidade inaplicável. Os elementos dos autos comprovam, de maneira ampla, as alterações contratuais nas regras de pagamento de comissões em prejuízo do reclamante, em especial as decorrentes da ‘bancarização’ e ‘encarteiramento’ realizadas em fevereiro de 2013. Embora o autor tenha solicitado demissão em junho de 2013, o retardo do pedido não pode ser entendido como perdão tácito, pois justifica-se a tolerância do empregado com as faltas graves cometidas pelo empregador em razão do seu maior interesse na manutenção do emprego. Extrapolação do módulo semanal. Inocorrência. Apesar de o autor ter afirmado na exordial que cumpria jornada de segunda a sexta-feira, das 8h30min às 18h45min, com uma hora de intervalo, ele confessou em audiência que saía do trabalho às 18h/18h30. Razão pela qual entendo como razoável fixar como hora de término da jornada a média dos horários informados pelo reclamante, ou seja, 18h15min. Logo, fixada a jornada das 8h30min às 18h15min, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira, não há extrapolação do módulo semanal. Nesse cenário, deve se afastada a condenação ao pagamento de horas extras superiores a 44ª semanal. Condição de bancário. Período de 01.08.2012 a 01.02.2013. Pagamento das ho-ras laboradas além da 6ª como extras. Devido. O quadro fático dos autos evidencia que o autor passou, a partir de agosto de 2012, a exercer além das atribuições para as quais foi inicialmente contratado, atividades tipicamente bancárias, tendo essas novas atribuições o objetivo de prepa-rar o reclamante para a ‘bancarização’ a ser implementada em fevereiro de 2013. Assim, pelo princípio da primazia da realidade, deve ser conhecida a condição de bancário do reclamante no período de 01.08.2012 a 01.02.2013. Por consequência, devido o pagamento, no aludo ínterim,

166 .......................................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

das horas laboras além da 6ª como extras. Indenização por uso de veículo próprio. Indevida. Não há que se falar em indenização pelo uso de veículo próprio, na medida em que o autor confessou que em Brasília o expediente era interno e que as visitas eram realizadas com o gerente da recla-mada, sendo que em relação ao labor no Tocantins e Pará, o autor não apresentou testemunhas contemporâneas aos serviços prestados naqueles estados. Estorno de comissões. A jurisprudência não admite o estorno de comissões para além da situação descrita no art. 7º da Lei nº 3.207/1957 que, por configurar situação desfavorável ao trabalhador, deve receber interpretação restritiva, além do entendimento contrário permitir a transferência do risco do negócio para o empregado. Assim, as comissões sobre vendas são devidas mesmo na hipótese de inadimplência do cliente. Honorários contratuais. Indenização. Perdas e danos. Tratando-se de reclamação trabalhista de-corrente de relação empregatícia, não há de se falar em indenização decorrente de honorários contratuais, mas apenas em honorários assistenciais, os quais não são devidos quando o autor não se encontre assistido pelo sindicato de sua categoria (TST, Súmula nº 219 e OJ 305). Recurso do reclamante parcialmente conhecido e parcialmente provido. Recurso das reclamadas conhe-cido e parcialmente provido.” (TRT 10ª R. – RO 0001107-24.2013.5.10.0001 – Rel. Des. Mário Macedo Fernandes Caron – DJe 20.04.2017 – p. 99)

34403 – Seguro-desemprego – atividades informais – recebimento do benefício – possibilidade

“Seguro-desemprego. Atividades informais. Possibilidade de recebimento do benefício. Não inci-dência automática do inciso V do art. 3º da Lei nº 7.998/1990. Preenchidos os requisitos da Lei nº 7.998/1990 e observadas as finalidades do programa seguro-desemprego, quais sejam, prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado e auxiliá-lo na busca ou preserva-ção do emprego, é devido o presente benefício, uma vez que o simples fato de exercer atividade informal para sobreviver não acarreta necessariamente a incidência do inciso V do art. 3º da Lei nº 7.998/1990.” (TRT 10ª R. – RO 0000091-15.2016.5.10.0006 – Rel. Dorival Borges de Souza Neto – DJe 11.04.2017 – p. 41)

34404 – Terceirização ilícita – serviços inerentes à atividade-fim da instituição bancária – admi-nistração pública indireta – princípio da isonomia – observação

“Terceirização ilícita. Serviços inerentes à atividade-fim da instituição bancária. Administração pública indireta. Princípio da isonomia. A Súmula nº 331 do TST veda a contratação de trabalha-dores por interposta pessoa para a execução de atividades-fim da tomadora dos serviços, exceto aquelas expressamente consideradas como lícitas. In casu, a terceirização é ilícita e deveria ense-jar o reconhecimento do vínculo de emprego diretamente com o tomador dos serviços, o que não ocorre na hipótese em que o tomador de serviços integra a Administração Pública. Neste caso, há vedação legal ao estabelecimento do vínculo empregatício, o que não impede, entretanto, a análise acerca do tratamento isonômico, nos termos da OJ 383 da SDI-1 do TST.” (TRT 3ª R. – RO 0001595-20.2014.5.03.0136 – 11ª T. – Relª Adriana Goulart de Sena Orsini – DJe 20.04.2017)

Transcrição Editorial SínTESESúmula nº 331 do TST:

“Nº 331 – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE. (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação)

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços es-

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ...........................................................167

pecializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a res-ponsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiaria-mente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cum-primento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorren-tes da condenação referentes ao período da prestação laboral. (Redação dada pela Resolução TST nº 174, de 24.05.2011, DJe TST 30.05.2011, rep. DJe TST 31.05.2011 e DJe TST 01.06.2011)”

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34405

Supremo Tribunal Federal19.05.2017 Primeira TurmaSegundo AgRg no Recurso Extraordinário nº 993.766 Rio Grande do SulRelator: Min. Luiz FuxAgte.(s): Paulo Cesar de SouzaAdv.(a/s): Vilmar LourençoAgdo.(a/s): Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProc.(a/s)(es): Procurador‑Geral Federal

ementa

SEGUNDO AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PREVIDENCIÁRIO – CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM ESPECIAL – TRABALHO PRESTADO EM PERÍODO ANTERIOR À LEI Nº 9.032/1995 – CONTROVÉRSIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL – MATÉRIA COM REPERCUSSÃO GERAL REJEITADA PELO STF NO ARE 1.029.712 – TEMA Nº 943 – AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

acÓRdão

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento virtual de 12 a 18.05.2017, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 19 de maio de 2017.

Ministro Luiz Fux Relator Documento assinado digitalmente

RelatÓRio

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): Trata-se de agravo interno interpos-to por Paulo Cesar de Souza, contra decisão de minha relatoria, publicada em 05.04.2017, cuja ementa transcrevo:

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA – PREVIDENCIÁRIO APOSENTADORIA ESPECIAL – PRINCÍ-PIO TEMPUS REGIT ACTUM – PRECEDENTES – CONVERSÃO DE TEMPO DE SER-VIÇO COMUM EM ESPECIAL – MATÉRIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL – NECESSIDADE DE REVOLVI-

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................169

MENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 279 DO STF – RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – APLICAÇÃO DA NOVA SUCUMBÊNCIA RECUR-SAL – ART. 85, §§ 8º E 11, DO CPC/2015 – AGRAVO DESPROVIDO – RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO.”

Inconformada com a decisão supra, a parte agravante interpõe o presente recurso, alegando, em síntese:

“[...] não se pode confundir ‘regime jurídico’ com ‘caracterização do tempo de ser-viço como comum ou especial’, porquanto a primeira segue as regras aplicáveis no momento da concessão de benefício, enquanto a segunda se efetiva no momento do labor, portanto, segundo regras vigentes à época.

Outrossim, o direito à conversão de tempo comum em especial é direito adquirido e já se incorporou ao patrimônio jurídico do segurado (tempus regit actum), pois é ato jurídico posterior, sem falar que está protegido pela Constituição Federal, na condição de cláusula pétrea, somente pode ser alterado pelo constituinte originário e de forma expressa, do contrário, fere diretamente o Texto Constitucional.

Nesse ínterim, a Lei nº 9.032/1995 em seu art. 3º ao alterar a redação do § 3º do art. 57, da Lei nº 8.213/1991 não resguardou o direito adquirido dos segurados à qualifi-cação de tempo reduzido, o que apresenta verdadeira inconstitucionalidade.

Consecutivamente, sua aplicação demonstra verdadeira ofensa ao texto Constitucio-nal, portanto, inconstitucional e nula de pleno direito” (doc. 89, fl. 24).

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): A presente irresignação não merece prosperar.

Em que pesem os argumentos expendidos no agravo, resta evidenciado das razões recursais que a parte agravante não trouxe nenhum argumento capaz de in-firmar a decisão hostilizada, razão pela qual deve ela ser mantida, por seus próprios fundamentos.

Com efeito, o Tribunal de origem consignou que a conversão do tempo de serviço qualificado como comum em tempo especial, para fins de concessão do be-nefício de aposentadoria especial, somente é possível caso o segurado tenha imple-mentado todos os requisitos necessários à concessão do benefício até 27.04.1995, porquanto tal conversão foi vedada a partir da edição da Lei nº 9.032/1995, publi-cada em 28.04.1995.

Assim, ao julgar a controvérsia, o Tribunal a quo fundamentou sua con-clusão na legislação infraconstitucional aplicável à espécie, notadamente a Lei nº 9.032/1995, que alterou as regras de aposentadoria especial.

170 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Conforme já asseverado, para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo acórdão recorrido seria necessária a interpretação da legislação infraconstitucional pertinente, o que torna inadmissível o recurso extraordinário.

Aliás, outro não foi o entendimento do Plenário deste Tribunal ao afirmar a inexistência de repercussão geral do tema, na análise do ARE 1.029.723, Rel. Min. Edson Fachin, Tema nº 943, o qual possui a seguinte ementa:

“PREVIDENCIÁRIO – CONVERSÃO DO TEMPO COMUM PARA ESPECIAL – TRA-BALHO PRESTADO EM PERÍODO ANTERIOR À LEI Nº 9.032/1995 – LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA REFLEXA – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.”

Destaco, por oportuno, que não houve a intimação para apresentação de contrarrazões ao presente recurso, em obediência ao princípio da celeridade pro-cessual e por não se verificar prejuízo à parte ora agravada, uma vez que voto pela manutenção da decisão recorrida (art. 6º c/c art. 9º do CPC/2015).

Ex positis, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

pRimeiRa tuRma extRato de ata

Segundo AgRg no Recurso Extraordinário nº 993.766

Proced.: Rio Grande do Sul

Relator: Min. Luiz Fux

Agte.(s): Paulo Cesar de Souza

Adv.(a/s): Vilmar Lourenco (33559/RS, 38701-A/SC)

Agdo.(a/s): Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Proc.(a/s)(es): Procurador-Geral Federal

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos ter-mos do voto do Relator. Primeira Turma, Sessão Virtual de 12 a 18.05.2017.

Composição: Ministros Marco Aurélio (Presidente), Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

Carmen Lilian Oliveira de Souza Secretária da Primeira Turma

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34406

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Conflito de Competência nº 149.760 – PR (2016/0297552‑5)Relator: Ministro Mauro Campbell MarquesAgravante: Município de LondrinaProcurador: Marcia Nakagawa Rampazzo – PR021264Agravante: Autarquia Municipal de Saúde Procurador: Lia Correa Bessa – PR028052Agravado: Lucenir Venancio dos Santos e outros Advogado: Antônio Roberto Orsi – PR019573

ementa

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – JUÍZOS COMUM ESTADUAL E TRABALHISTA – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE – PRÉVIO PROCESSO SELETIVO – CONTRATAÇÃO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT) – POSTERIOR PUBLICAÇÃO DA LEI Nº 11.350/2006 – APLICAÇÃO DO REGIME CELETISTA APENAS EM CASOS EM QUE O ESTADO OU MUNICÍPIO NÃO TENHA REGIME PRÓPRIO, EM SENTIDO DIVERSO – PRECEDENTES DO STJ – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO1. A controvérsia está relacionada ao juízo competente para processar e julgar demanda ajuizada por agente comunitário de saúde em face de município, questionando o pagamento de verbas trabalhistas.

2. O art. 8º da Lei nº 11.350/2006 estabeleceu o regime celetista nas hi-póteses de contratação de agente comunitário de saúde, salvo se o ente público adotar forma diversa por meio de lei local.

3. Será celetista o regime aplicável salvo se, no caso dos Estados, do Dis-trito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.

4. Não se tem autos notícia de que o município tenha disposto de regime jurídico de forma diversa do estabelecido pela CLT.

5. Seja em função da Lei Federal nº 11.350/2006, seja em razão do re-gramento municipal, o regime jurídico aplicável à parte reclamante é o celetista, o que, por conseguinte, implica a competência da Justiça do Trabalho. Precedentes.

6. Agravo interno não provido.

acÓRdão

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na

172 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julga-mento:

“A Seção, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria, Napoleão Nunes Maia Filho e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Presidiu o julga-mento o Sr. Ministro Herman Benjamin.

Brasília (DF), 28 de junho de 2017.

Ministro Mauro Campbell Marques, Relator

RelatÓRio

O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):

Trata-se de agravo interno interposto pelo Município de Londrina e outro contra decisão monocrática, de minha relatoria, assim ementada:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – JUÍZOS COMUM ESTADUAL E TRABALHISTA – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE – PRÉVIO PROCESSO SELETIVO – CONTRATAÇÃO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT) – POSTERIOR PUBLICAÇÃO DA LEI Nº 11.350/2006 – APLICAÇÃO DO REGIME CELETISTA APENAS EM CASOS EM QUE O ESTADO OU MUNICÍPIO NÃO TENHA REGIME PRÓPRIO, EM SENTIDO DIVERSO – PRECEDEN-TES DO STJ – CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.

No presente recurso, sustenta-se que

diferente do que consta na decisão, o Município de Londrina adotou regime diverso para contratação de agente de combate à endemias, de caráter jurídico-administrativo especial. Não há regra de aplicação de regime específico (celetista ou estatutário) aos trabalhadores contratados temporariamente, eis que, desde a ordem constitucional, fixou-se que lei específica estabeleceria qual os critérios a serem adotados aos res-pectivos contratados, sendo que no âmbito municipal, a lei que regula a matéria é a de nº 6.387/1995 alterada pela Lei Municipal nº 11.261/2011. Assim, diferente do que consta no v. despacho, no caso específico desta Municipalidade há lei municipal disciplinando a matéria, motivo pelo qual a competência para apreciar o feito não é do juízo trabalhista.

Pugna, por fim, a reconsideração da decisão, em juízo de retratação, ou a remessa do presente recurso ao órgão colegiado.

É o relatório.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................173

ementa

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – JUÍZOS COMUM ESTADUAL E TRABALHISTA – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE – PRÉVIO PROCESSO SELETIVO – CONTRATAÇÃO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT) – POSTERIOR PUBLICAÇÃO DA LEI Nº 11.350/2006 – APLICAÇÃO DO REGIME CELETISTA APENAS EM CASOS EM QUE O ESTADO OU MUNICÍPIO NÃO TENHA REGIME PRÓPRIO, EM SENTIDO DIVERSO – PRECEDENTES DO STJ – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO1. A controvérsia está relacionada ao juízo competente para processar e julgar demanda ajuizada por agente comunitário de saúde em face de município, questionando o pagamento de verbas trabalhistas.

2. O art. 8º da Lei nº 11.350/2006 estabeleceu o regime celetista nas hi-póteses de contratação de agente comunitário de saúde, salvo se o ente público adotar forma diversa por meio de lei local.

3. Será celetista o regime aplicável salvo se, no caso dos Estados, do Dis-trito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.

4. Não se tem autos notícia de que o município tenha disposto de regime jurídico de forma diversa do estabelecido pela CLT.

5. Seja em função da Lei Federal nº 11.350/2006, seja em razão do re-gramento municipal, o regime jurídico aplicável à parte reclamante é o celetista, o que, por conseguinte, implica a competência da Justiça do Trabalho. Precedentes.

6. Agravo interno não provido.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):

Inicialmente é necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo nº 3/STJ: “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC”.

A pretensão recursal não merece guarida.

Dessume-se das razões recursais que a parte agravante não trouxe elementos suficientes para infirmar a decisão agravada, que, de fato, deu a solução que melhor espelha a orientação jurisprudencial do STJ sobre a matéria.

A controvérsia está relacionada ao juízo competente para processar e julgar demanda ajuizada por agente comunitário de saúde em face de município, questio-nando o pagamento de verbas trabalhistas.

Em primeiro lugar, o art. 8º da Lei nº 11.350/2006 estabeleceu o regime ce-letista nas hipóteses de contratação de agente comunitário de saúde, salvo se o ente público adotar forma diversa por meio de lei local, nos seguintes termos:

174 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos gestores locais do SUS e pela Fundação Nacional de Saúde – Funasa, na forma do disposto no § 4º do art. 198 da Constituição, submetem-se ao regime jurídico esta-belecido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, salvo se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.

Ou seja: será celetista o regime aplicável salvo se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.

Em segundo, não se tem autos notícia de que o município tenha disposto de regime jurídico de forma diversa do estabelecido pela CLT.

O Município de Londrina, no presente recurso, apenas trouxe à colação leis municipais que regem “as contratações por tempo determinado para atender à ne-cessidade temporária de excepcional interesse público da Administração Direta, Indireta e Fundacional do Município”. Tais leis, porém, não estabelecem o regime jurídico das referidas contratações.

Portanto, seja em função da Lei Federal nº 11.350/2006, seja em razão do regramento municipal, o regime jurídico aplicável à parte reclamante é o celetista, o que, por conseguinte, implica a competência da Justiça do Trabalho.

Sobre o tema, é idêntica a orientação desta Corte Superior:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLI-TO DE COMPETÊNCIA – JUÍZO DE DIREITO E JUÍZO LABORAL – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE – SERVIDOR TEMPORÁRIO – REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO – LEI MUNICIPAL Nº 1.670/2006, DE BELO JARDIM/PE – SUBMISSÃO AO REGIME ESTATUTÁRIO – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO ESTADUAL – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO

1. A determinação da competência para o processo e o julgamento das demandas envolvendo direitos decorrentes da relação de trabalho entre servidores públicos e a Administração Pública depende do vínculo estabelecido entre eles.

2. O STF, no julgamento da ADI 3.395/DF, em 05.04.2006, referendou liminar ante-riormente concedida, que suspendera qualquer interpretação do inciso I do art. 114 da CF, alterado pela EC 45/2004, que atribuísse à Justiça do Trabalho a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.

3. Tem-se, pois, que, se o vínculo estabelecido entre o Poder Público e o servidor for estatutário ou de caráter jurídico-administrativo, a competência para análise das con-trovérsias trabalhistas será da Justiça Comum (Estadual ou Federal), ao passo que, na hipótese de vínculo trabalhista, regido pela CLT, caberá à Justiça laboral o julgamento dos litígios daí advindos.

4. O Município agravado, por meio da Lei nº 1.670/2006, do Município de Belo Jar-dim/PE, submeteu os ocupantes de agente comunitário de saúde ao regime estatutário, razão pela qual a competência para o julgamento do feito é do Juízo Comum.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................175

5. No tocante ao período anterior à referida lei municipal, também é da Justiça Co-mum Estadual a competência para julgar a respeito dos pedidos relativos ao período em que a reclamante foi contratada temporariamente, ou seja, de forma precária, con-forme estabelecido no art. 37, IX, da CF, ante a relação jurídico-administrativa entre os demandantes. Precedente: AgRg-CC 126.296/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 05.02.2014.

6. Agravo Regimental desprovido.

(AgRg-CC 126.125/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª S., J. 09.04.2014, DJe 30.04.2014)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE – CONTRATO DE TRABA-LHO PREVENDO REGIME JURÍDICO DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABA-LHO – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA LABORAL

1. Analisa-se no presente feito qual o Juízo competente para julgar demanda em que a reclamante, contratada como agente comunitário de saúde, objetiva o recebimento de verbas trabalhistas.

2. Considerando a juntada aos autos de contrato de trabalho onde se estabelece que a relação jurídico-trabalhista seria regido pela CLT, afasta-se a competência do Juízo Comum, atraindo a competência do Juízo Laboral para o julgamento da lide. Incide, na espécie, o art. 8º da Lei nº 11.350/2006: “Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos gestores locais do SUS e pela Fundação Nacional de Saúde – Funasa, na forma do disposto no § 4º do art. 198 da Constituição, submetem-se ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT”.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg-CC 127.849/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª S., J. 12.06.2013, DJe 21.06.2013)

Nenhuma censura, portanto, merece o decisório ora recorrido, que deve ser mantido pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Com essas considerações, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

ceRtidão de Julgamento pRimeiRa seção

Número Registro: 2016/0297552-5 Processo Eletrônico AgInt-CC 149.760/PR

Números Origem: 00008912120165090863 14333276 8912120165090863

Pauta: 28.06.2017 Julgado: 28.06.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

176 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Moacir Guimarães Morais Filho

Secretária: Belª Carolina Véras

autuação

Suscitante: Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região

Suscitado: Juízo de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública de Londrina/PR

Interes.: Lucenir Venancio dos Santos e outros

Advogado: Antônio Roberto Orsi – PR019573

Interes.: Autarquia Municipal de Saúde

Interes.: Município de Londrina

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Empregado público/Temporário

agRavo inteRno

Agravante: Município de Londrina

Procurador: Marcia Nakagawa Rampazzo – PR021264

Agravante: Autarquia Municipal de Saúde

Procurador: Lia Correa Bessa – PR028052

Agravado: Lucenir Venancio dos Santos e outros

Advogado: Antônio Roberto Orsi – PR019573

ceRtidão

Certifico que a egrégia Primeira Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Seção, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria, Napoleão Nunes Maia Filho e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34407

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.673.280 – PR (2017/0108366‑5)Relator: Ministro Herman BenjaminRecorrente: Jose MarquesAdvogado: Ivete Lani Dal Bem Rodrigues – PR018584Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social

ementa

PROCESSUAL CIVIL – PREVIDENCIÁRIO – AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL – ACORDO TRABALHISTA – REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO – SÚMULA Nº 7/STJ

1. O Tribunal de origem, ao decidir a vexata quaestio, consignou (fl. 226/e-STJ): “[...] Na hipótese em apreço, vieram aos autos o termo de audiência em que foi realizado acordo trabalhista entre as partes (fls. 23-24) e a Carteira de Trabalho e Previdência Social do requeren-te, onde consta anotação do vínculo empregatício referente ao período controvertido, anotação esta que decorreu de acordo e não de sentença judicial fundada em início de prova material, de modo que tal documen-to não serve como prova apta a autorizar o reconhecimento do tempo de serviço pleiteado. Vale registrar que a ação trabalhista foi ajuizada pelo autor em desfavor do espólio de Luiz Marques Filho e Filennina Marques (pais do primeiro), sendo citados os demais herdeiros (Luiz Carlos Marques, Maria de Lourdes Marques Pelisari, João Marques, Luis Carlos Vieira da Costa, Ligia Mara Vieira da Costa), uma vez que o reque-rente alega ter sido admitido para trabalhar como tratorista e trabalhador rural nas três propriedade agrícolas da família. Ora, à presente ação pre-videnciária não vieram quaisquer documentos que pudessem constituir início de prova material do alegado exercício de atividades laborais no período afirmado. Com efeito, além das cópias do acordo e da CTPS, fo-ram apresentados tão somente recibos de salários referentes aos anos de 2008 e 2009, preenchidos e assinados pelo próprio autor, o qual, inclu-sive, afirma em seu depoimento pessoal que, após o falecimento de seus pais. passou a ser coproprietário e administrador das terras onde alega ter trabalhado como empregado no período dc 02.01.1974 a 18.08.2009. As provas constantes nos autos não permitem, portanto, o reconheci-mento do vínculo empregatício do autor no período de 02.01.1974 a 18.08.2009. [...]”

178 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

2. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão vergastado que o aco-lhimento da pretensão recursal demanda reexame do contexto fático--probatório, mormente para avaliar se foram cumpridos os requisitos para a concessão do benefício pleiteado, o que não se admite ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.

3. Recurso Especial não conhecido.

acÓRdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-das, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “‘A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).’ Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.”

Brasília, 27 de junho de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Herman Benjamin Relator

RelatÓRio

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Trata-se de Recurso Es-pecial (art. 105, III, a e c, da CF) interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim ementado:

PREVIDENCIÁRIO – ACORDO TRABALHISTA COM ACORDO – VALORAÇÃO – CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO – REQUISITOS NÃO IMPLEMENTADOS

1. A decisão proferida na Justiça do Trabalho reconhecendo tempo de serviço de ex--empregado não tem valor como prova material se a reclamatória é ajuizada visando, exclusivamente, à produção de efeitos perante o INSS.

2. A aposentadoria por tempo de serviço é indevida se a parte autora deixou de imple-mentar qualquer dos requisitos necessários à sua outorga.

Os Embargos de Declaração foram acolhidos apenas para fins de preques-tionamento.

A parte recorrente alega, em Recurso Especial, a ocorrência de violação aos arts. 33 e 48 da Lei nº 8.213/1991, sob o argumento de que foram preenchidos todos os requisitos para a concessão do benefício pleiteado.

É o relatório.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................179

voto

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Os autos foram recebidos neste Gabinete em 01.06.2017.

O Tribunal de origem, ao decidir a vexata quaestio, consignou (fl. c226/e- -STJ):

Na hipótese em apreço, vieram aos autos o termo de audiência em que foi realizado acordo trabalhista entre as partes (fls. 23-24) e a Carteira de Trabalho e Previdência Social do requerente, onde consta anotação do vínculo empregatício referente ao pe-ríodo controvertido, anotação esta que decorreu de acordo e não de sentença judicial fundada em início de prova material, de modo que tal documento não serve como prova apta a autorizar o reconhecimento do tempo de serviço pleiteado.

Vale registrar que a ação trabalhista foi ajuizada pelo autor em desfavor do espólio de Luiz Marques Filho e Filennina Marques (pais do primeiro), sendo citados os demais herdeiros (Luiz Carlos Marques, Maria de Lourdes Marques Pelisari, João Marques, Luis Carlos Vieira da Costa, Ligia Mara Vieira da Costa), uma vez que o requerente alega ter sido admitido para trabalhar como tratorista e trabalhador rural nas três pro-priedade agrícolas da família.

Ora, à presente ação previdenciária não vieram quaisquer documentos que pudessem constituir início de prova material do alegado exercício de atividades laborais no pe-ríodo afirmado.

Com efeito, além das cópias do acordo e da CTPS. foram apresentados tão somente recibos de salários referentes aos anos de 2008 e 2009, preenchidos e assinados pelo próprio autor, o qual, inclusive, afirma em seu depoimento pessoal que, após o faleci-mento de seus pais. passou a ser coproprietário e administrador das terras onde alega ter trabalhado como empregado no período dc 02.01.1974 a 18.08.2009.

As provas constantes nos autos não permitem, portanto, o reconhecimento do vínculo empregatício do autor no período de 02.01.1974 a 18.08.2009.

Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão vergastado que o acolhimento da pretensão recursal demanda reexame do contexto fático-probatório, mormente para avaliar se foram cumpridos os requisitos para a concessão do benefício pleitea-do, o que não se admite ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.

Por tudo isso, não conheço do Recurso Especial.

É como voto.

ceRtidão de Julgamento segunda tuRma

Número Registro: 2017/0108366-5 REsp 1.673.280/PR

180 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Números Origem: 00087708620124049999 160031693 160035963 160082614 160134686 160137268 17001036812002 2123332010 21263320108160137 87708620124049999

Pauta: 27.06.2017 Julgado: 27.06.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Elaeres Marques Teixeira

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

Recorrente: Jose Marques

autuação

Advogado: Ivete Lani Dal Bem Rodrigues – PR018584

Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social

Assunto: Direito previdenciário – Benefícios em espécie – Aposentadoria por tempo de serviço (art. 52/4)

ceRtidão

Certifico que a egrégia 2ª T., ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34408

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Recurso Especial nº 1.577.590 – RS (2016/0008743‑1)Relator: Ministro Gurgel de Faria Agravante: Ciagro Alimentos Ltda.Agravante: Teichmann Transportes Ltda.Advogado: Nelson Wilians Fratoni Rodrigues e outro(s) – SP128341Agravado: Fazenda Nacional

ementa

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA E ADICIONAL DE INSALUBRIDADE – INCIDÊNCIA – REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SOBRESTAMENTO – DESNECESSIDADE

1. A Primeira Seção desta Corte Superior sedimentou orientação de que a contribuição previdenciária incide sobre o adicional de transferência (REsp 1.566.395/PR e AgRg-REsp 1.511.255/PR, entre outros) e o adicional de insalubridade (AgRg-REsp 1.487.689/SC e AgRg-REsp 1.559.166/RS, entre outros).

2. A existência de repercussão geral reconhecida pelo STF, no RE 593.068 RG/SC (DJe 22.05.2009) e no RE 565.160 RG/SC (DJe 01.02.2008), não implica sobrestamento de todos os processos que versem sobre a ques-tão, pois aconteceu na vigência do Código de Processo Civil de 1973, não tendo o relator no STF determinado a suspensão de todos as deman-das pendentes no território nacional que tratam dos temas, como previsto no art. 1.035, § 5º, do CPC/2015.

3. “A pendência de julgamento, no STF, de Recurso Extraordinário sub-metido ao rito do art. 543-B do CPC não enseja o sobrestamento de re-cursos que tramitam no STJ” (AgRg-EDcl-REsp 1.528.287/RS).

4. Agravo interno desprovido.

acÓRdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por una-nimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro

182 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina (Presidente) e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 02 de maio de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Gurgel de Faria Relator

RelatÓRio

O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):

Trata-se de agravo interno interposto pela empresa Ciagro Alimentos Ltda. contra decisão de e-STJ fls. 657/659, que negou provimento ao recurso especial, para reconhecer a incidência de contribuição previdenciária sobre os adicionais de transferência e de insalubridade e, ainda, que o crédito reconhecido pelo Tribunal de origem somente poderá ser compensado após o trânsito em julgado (art. 170-A do Código Tributário Nacional) e com débitos de mesma natureza e destinação (art. 26 da Lei nº 11.457/2007, c/c o art. 66 da Lei nº 8.383/1991).

Em suas razões (e-STJ fls. 666/674), a agravante sustenta que o Supremo Tri-bunal Federal reconheceu repercussão geral sobre a discussão relativa à incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias, a gratifica-ção natalina, os serviços extraordinários, os adicionais noturnos e de insalubrida-de (Tema nº 163 – RE 593.068 RG/SC) e sobre o alcance da expressão “folha de salários” versada no art. 195, I, da Constituição Federal (Tema nº 20 – RE 565.160 RG/SC). Desse modo, concluiu que todos os recursos que versem sobre as questões deveriam ser sobrestados, em obediência ao art. 1.035, § 5º, do CPC/2015.

Em caso de não reconsideração do julgado, a agravante pleiteia a submissão do recurso à Turma, para análise de seus fundamentos.

Sem impugnação da União (e-STJ fl. 678).

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):

Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC” (Enunciado Administrativo nº 3).

Feito esse registro, o pedido de sobrestamento deste processo, em razão da existência de repercussão geral dos temas reconhecida pelo Supremo Tribunal Fede-ral, no RE 593.068 RG/SC (DJe 22.05.2009) e RE 565.160 RG/SC (DJe 01.02.2008), não merece provimento.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................183

Como se vê a repercussão foi reconhecida na vigência do Código de Proces-so Civil de 1973, não tendo havido determinação do relator no STF de suspensão de todos os processos pendentes no território nacional que versem sobre a mesma questão, como previsto no art. 1.035, § 5º, do CPC/2015.

Desse modo, aplica-se ao caso o entendimento pretoriano vigente à época, segundo o qual “a pendência de julgamento, no STF, de Recurso Extraordinário submetido ao rito do art. 543-B do CPC não enseja o sobrestamento de recursos que tramitam no STJ” (AgRg-EDcl-REsp 1.528.287/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 23.09.2015).

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

ceRtidão de Julgamento pRimeiRa tuRma

AgInt-REsp 1.577.590/RS Número Registro: 2016/0008743-1

Números Origem: 450177756620154040000 50005601120154047103 RS-50005601120154047103 TRF4-50177756620154040000

Pauta: 02.05.2017 Julgado: 02.05.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Flaubert Machado Araújo

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Ciagro Alimentos Ltda.

Recorrente: Teichmann Transportes Ltda.

Advogado: Nelson Wilians Fratoni Rodrigues e outro(s) – SP128341

Recorrido: Fazenda Nacional

Assunto: Direito tributário – Contribuições – Contribuições previdenciárias – Contribuição sobre a folha de salários

agRavo inteRno

Agravante: Ciagro Alimentos Ltda.

Agravante: Teichmann Transportes Ltda.

184 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Advogado: Nelson Wilians Fratoni Rodrigues e outro(s) – SP128341

Agravado: Fazenda Nacional

ceRtidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina (Presidente) e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34409

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoApelação Cível nº 0024092‑32.2017.4.01.9199/MG Processo Orig.: 0001356‑54.2014.8.13.0405Relator: Desembargador Federal João Luiz de SousaApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: DF00025372 – Adriana Maia VenturiniApelado: Maria Francisca de FariaAdvogado: MG00143341 – Leiliani Bertolassi Hidalgo

ementa

CONSTITUCIONAL – PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR IDADE – RURÍCOLA – INEXISTÊNCIA DE RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO1. A comprovação da qualidade de trabalhador rural ocorre mediante início de prova material devidamente corroborado pela prova testemu-nhal produzida em juízo, bem assim a implementação do requisito etário exigido.

2. Na hipótese, a parte-autora cumpriu o requisito etário, eis que com-pletou 55 anos em 2008 (nascimento em 18.01.1949) cuja carência é de 168 meses (1994 a 2008). A parte-autora não se desincumbiu em comprovar a sua qualidade de segurada especial, haja vista não ter co-lacionado aos autos documentos em seu nome que comprovassem, de forma segura, tal qualidade. Embora os documentos acostados aos autos às fls. 23/26 (cópia da certidão de casamento, realizado em 29.04.1972, onde consta a qualificação profissional do cônjuge como lavrador – fls. 23 e cópia das certidões de nascimento dos filhos, Ronaldo Pedro de Faria – 21.02.1973 – Maria das Graças de Farias – 03.11.1974 – e Mônica Aparecida de Faria – 13.09.1976, indicando o genitor como la-vrador), o INFBEN de fls. 118 aponta o recebimento de aposentadoria por invalidez urbana (NB. 106.908.873-8, DIB 13.06.1997/ramo de ati-vidade: comerciário e forma de filiação: empregado) elidindo, logo, todo o conjunto probatório. Destarte, é indevida a aposentadoria rural por idade à parte-autora, ainda que esta apresente documentos em nome próprio, quando a renda principal da família é proveniente de atividade urbana exercida pelo marido/esposa, de modo a descaracterizar o regime de economia familiar (Precedente: STJ, Ag REsp. 88596, SP).

5. Diante da ausência de documentos que demonstrem atividade rural da parte-autora não se reconhece o direito ao benefício de aposentadoria ru-

186 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

ral por idade, eis que não é admitida prova exclusivamente testemunhal para tal fim (Súmula nº 27 do TRF/1ª Região e 149/STJ).

6. Considerado o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum pro-bationis, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes.

7. Os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 300,00 (trezen-tos reais), a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do NCPC.

8. Apelação do INSS provida para reformar a sentença e julgar improce-dente o pedido.

acÓRdão

Decide a Segunda Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, dar provi-mento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.

Segunda Turma do TRF da 1ª Região, 28 de junho de 2017.

Desembargador Federal João Luiz de Sousa Relator

RelatÓRio

O Exmo. Sr. Desembargador Federal João Luiz de Sousa (Relator):

Trata-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, para fins de obtenção de benefício previdenciário.

Citado, o INSS não apresentou resposta.

A sentença julgou procedente o pedido formulado na inicial, condenando o réu a conceder o benefício postulado pela parte-autora, acrescido de correção monetária sobre as verbas em atraso, juros de mora, bem assim os correspondentes honorários advocatícios.

Nas razões de recurso, a autarquia federal sustentou que a parte-autora não comprovou sua qualidade de segurada especial com o início de prova material cor-roborada por prova testemunhal produzida nos autos.

É o relatório.

voto

Presentes os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação do INSS no seu efeito devolutivo (arts. 1011 e 1012, V, do CPC).

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................187

A concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural está condi-cionada à presença dos seguintes requisitos: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício preten-dido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/1991).

Com efeito, no caso presente a parte-autora conta com a idade mínima exi-gida para a obtenção do benefício, conforme comprovam os documentos pessoais acostados aos autos, eis que completou 55 anos em 2008.

No tocante à prova do labor rural, cumpre registrar que o eg. Superior Tribu-nal de Justiça adotou, em matéria previdenciária, a solução pro misero, dada a notó-ria dificuldade dos trabalhadores rurais em comprovar todo o período de atividade.

Assim sendo, não há um rol taxativo dos documentos necessários, sendo possível aceitar como início razoável de prova material documentos públicos como, por exemplo, Certidão de Casamento, Certidão de Óbito do cônjuge, Certidão de Nascimento de filhos, Certificado de Reservista etc., nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge como trabalhador rural.

Neste sentido o entendimento manifestado no julgamento REsp 267.355/MS, relatado pelo Ministro Jorge Scartezzini, publicado no DJ 20.11.2000, do seguinte teor: “A qualificação profissional de lavrador ou agricultor do marido, constante dos assentamentos de registro civil, é extensível à esposa, e constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural [...]”.

Muito embora a jurisprudência tenha flexibilizado o posicionamento no tocante aos documentos que podem servir como início de prova documental, a jurisprudência já firmou entendimento de que não possuem integridade probante documentos confeccionados em momento próprio ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, produzidos tão somente com o intuito de servir como meio de prova em ações de índole previdenciária. Não são aceitos como início de prova material, assim, certidões de cartório eleitoral com anotação da pro-fissão da parte autora, prontuários médicos, certidões relativas à filiação a sindicatos de trabalhadores rurais etc., contemporâneos ao ajuizamento da ação.

Saliente-se, ainda, que documentos que, em regra são aceitos como início de prova documental, como certidões de casamento com anotação da profissão da parte autora ou de seu cônjuge, podem ter sua eficácia afastada pelo conjunto pro-batório dos autos como na hipótese em que comprovada a existência de vínculos urbanos de longa duração da parte ou de seu cônjuge, o que ilide a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar ou quando demonstrada a con-dição de produtor rural de relevante quilate, que não se coaduna com a pretensa vulnerabilidade social do trabalhador nas lides campesinas.

Na hipótese, a parte-autora não se desincumbiu em comprovar a sua qua-lidade de segurada especial, haja vista não ter colacionado aos autos documentos

188 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

em seu nome que comprovassem, de forma segura, tal qualidade. Embora os docu-mentos acostados aos autos às fls. 23/26 (cópia da certidão de casamento, realizado em 29.04.1972, onde consta a qualificação profissional do cônjuge como lavrador – fls. 23 e cópia das certidões de nascimento dos filhos, Ronaldo Pedro de Faria – 21.02.1973 – Maria das Graças de Farias – 03.11.1974 – e Mônica Aparecida de Faria – 13.09.1976, indicando o genitor como lavrador), o INFBEN de fls. 118 aponta o recebimento de aposentadoria por invalidez urbana (NB. 106.908.873-8, DIB. 13.06.1997/ramo de atividade: comerciário e forma de filiação: empregado) elidindo, logo, todo o conjunto probatório.

Destarte, é indevida a aposentadoria rural por idade à parte-autora, ainda que esta apresente documentos em nome próprio, quando a renda principal da família é proveniente de atividade urbana exercida pelo marido/esposa, de modo a descaracterizar o regime de economia familiar (Precedente: STJ, Ag REsp 88596, SP).

Saliente-se, por oportuno, que uma vez verificada a imprestabilidade da pro-va material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas teste-munhais, como já sedimentou este Tribunal em reiterados julgados, o que culminou na edição da Súmula nº 27, verbis:

“Não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural (Lei nº 8.213/1991, art. 55, § 3º).”

No mesmo sentido o enunciado da Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:

“A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação de atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.”

Esclareço, por oportuno, que a coisa julgada na espécie deve produzir efeitos secundum eventum litis, de forma que, na hipótese de alteração das circunstâncias verificadas, poderá a parte autora postular a aposentadoria almejada, fundando-se em outras melhores provas.

Os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 300,00 (trezentos re-ais), a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do NCPC.

Posto isso, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido formulado na inicial.

É como voto.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34410

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Especialidade I – Penal, Previdenciário e Propriedade IndustrialNº CNJ: 0000280‑56.2017.4.02.9999 (2017.99.99.000280‑2)Relator: Desembargador Federal Messod Azulay NetoApelante: Ivanilda Bernaldo da SilvaAdvogado: ES012942 – Elyanderson Augusto F. de Souza e outroApelado: INSS – Instituto Nacional do Seguro Social Procurador: Procurador FederalOrigem: Ementa

PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS) – PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E/OU MENTAL – AUSÊNCIA DE ESTUDO SOCIAL – SENTENÇA ANULADA – RETORNO À ORIGEM1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Fe-deral de 1988, objetivou garantir a subsistência e a dignidade da pessoa humana àqueles que, em razão de uma deficiência incapacitante para o trabalho, ou em razão da idade, não podem, por si próprios, ou por meio de sua família, manter seu sustento.

2. Para concessão do referido benefício, no caso dos presentes autos, faz--se necessário comprovar a deficiência incapacitante da autora mediante perícia médica judicial, além de comprovar a miserabilidade.

3. No presente caso, restou atendido o requisito atinente à incapacidade da autora/apelante. Com efeito, o laudo médico pericial, fls. 74/76, atesta que a autora “é portadora de surdez bilateral (surdo muda)”, provavel-mente congênita, de comprometimento neurossensorial.

4. Quanto à miserabilidade, verifica-se que não foi realizado estudo so-cial, não havendo como saber as condições em que a autora e sua família sobrevivem. Assim, sem a comprovação de tal requisito, não há como apreciar o pedido contido na inicial, havendo necessidade de retorno do feito ao Juízo de origem para a sua regular instrução e julgamento.

5. Apelação parcialmente provida, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular instrução (realização de estudo social) e julgamento do feito.

acÓRdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por una-

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nimidade, dar parcial provimento à apelação, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular instrução (realização de estudo social) e julgamento do feito, nos termos do voto do Relator, constante dos autos, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 22 de junho de 2017.

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator

RelatÓRio

Trata-se de Apelação Cível interposta por Ivanilda Bernaldo da Silva Em face de sentença de fls. 122/124, que julgou improcedente o seu pedido de concessão de benefício assistencial (Loas).

Em razões recursais de fls. 126/132, alega a autora que é portadora de sur-dez de provável natureza congênita, que não tem condições de exercer qualquer atividade e que necessita do benefício assistencial (Loas) para poder arcar com os tratamentos necessários decorrentes da doença. Requer seja reformada a sentença, para julgar o pedido procedente.

Contrarrazões às fls. 134/135.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo parcial provimento do ape-lo, a fim de que seja anulada a sentença, viabilizando a realização do estudo social, com vistas à confirmação dos dois requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado (fls. 142/146).

É o relatório.

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator

voto

A sentença deve ser anulada.

O benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, objetivou garantir a subsistência e a dignidade da pessoa humana àqueles que, em razão de uma deficiência incapacitante para o trabalho, ou em razão da idade, não podem, por si próprios, ou por meio de sua família, manter seu sustento.

Para concessão do referido benefício, faz-se necessário comprovar a defi-ciência incapacitante da autora mediante perícia médica judicial, além de compro-var a miserabilidade.

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No presente caso, ao contrário do entendimento do Juízo a quo, restou aten-dido o requisito atinente à incapacidade da autora/apelante. Com efeito, o laudo médico pericial, fls. 74/76, atesta que a autora “é portadora de surdez bilateral (sur-do muda)”, provavelmente congênita, de comprometimento neurossensorial.

Quanto à miserabilidade, verifica-se que não foi realizado estudo social, não havendo como saber as condições em que a autora e sua família sobrevivem. Assim, sem a comprovação de tal requisito, não há como apreciar o pedido contido na ini-cial, havendo necessidade de retorno do feito ao Juízo de origem para a sua regular instrução e novo julgamento.

Neste sentido, vejam-se os seguintes julgados:

CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – LOAS – ART. 203, V, DA CF/1988 – LEI Nº 8.742/1993 – IDOSO – AUSÊNCIA DE ESTU-DO SOCIAL – PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE – SENTENÇA ANULADA – RE-TORNO À ORIGEM – 1. A Constituição Federal, em seu art. 203, inciso V, e a Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social. 2. Os requisitos para a con-cessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei nº 8.742/1993. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime; e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 3. Na hipótese, constata-se o preenchi-mento do requisito etário, por contar a autora com idade superior a 65 anos, confor-me comprovado por documentação encartada aos autos. Verifica-se, entretanto, a ausência do estudo social, não sendo possível, pois, aferir as condições reais do grupo familiar. Tal particularidade é imprescindível quando se trata de pedido inicial de con-cessão de Loas na condição de idoso que, em tese, a faria jus ao benefício em razão da idade, desde que comprovada a condição de miserabilidade. De tal arte, ressoa como medida de rigor a anulação da sentença, a fim de que seja realizado o estudo social correspondente. 4. Apelação da parte autora parcialmente provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja realizado o estudo social correspondente e proferida nova decisão.

(TRF 1ª R., Apelação nº 00391285620134019199, Des. Fed. João Luiz de Sousa, 2ª T., e-DJF1 Data: 04.04.2016 Pagina:.)

CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – LOAS – ART. 203, V, DA CF/1988 – LEI Nº 8.742/1993 – PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍ-SICA E/OU MENTAL – AUSÊNCIA DE ESTUDO SOCIAL – SENTENÇA ANULADA – RETORNO À ORIGEM – 1. A Constituição Federal, em seu art. 203, inciso V, e a Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua famí-lia, independentemente de contribuição à seguridade social. 2. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei nº 8.742/1993. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de

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outro regime; e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 3. Na hipótese, constata-se a ausência do estudo social, não sendo possível, pois, aferir as condições reais do grupo familiar. Tal particularidade é imprescindível quando se trata de pedido inicial de concessão de Loas por deficiência física ou mental, vindo a parte autora a completar 65 anos no decorrer do processo, passando, em tese, a fazer jus ao benefício em razão da idade, desde que comprovada a condição de miserabilidade. De tal arte, ressoa como medida de rigor a anulação da sentença, a fim de que seja realizado o estudo social correspondente. 4. O benefício eventualmente implantado por força de decisão de caráter precário, consistente no deferimento da antecipação dos efeitos da tutela, ten-do em conta a presença dos pressupostos da medida adotada, deverá ser mantido na condição de medida cautelar incidental ao processo ajuizado, até ulterior deliberação do juízo singular. 5. Remessa oficial provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja realizado o estudo social correspondente e proferida nova decisão. 6. Apelações do INSS e da autora prejudicadas.

(TRF 1ª R., Apelação, Des. Fed. João Luiz de Sousa, 2ª T., e-DJF1 Data: 01.07.2016 Pagina:.)

Pelo exposto, dou parcial provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem, para regular instrução (realiza-ção de estudo social) e julgamento do feito.

É como voto.

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 02.06.2017Apelação Cível nº 0005543‑15.2015.4.03.6183/SP2015.61.83.005543‑9/SPRelatora: Desembargadora Federal Lucia UrsaiaApelante: Francisco Marto de MouraAdvogado: SP290227 Elaine Horvat e outro(a)Apelado(a): Instituto Nacional do Seguro Social – INSSNº Orig.: 00055431520154036183 2ª Vr. São Paulo/SP

ementa

PREVIDENCIÁRIO – REVISÃO – RMI – CÁLCULO – FATOR PREVIDENCIÁRIO – INCIDÊNCIA – APLICABILIDADE

1. O fator previdenciário instituído pela Lei nº 9.876/1999, cuja consti-tucionalidade foi questionada pelas ADIns 2.110 e 2.111, tendo como Relator o Ministro Sydney Sanches, leva em conta o tempo de contri-buição, a idade e a expectativa de vida do segurado no momento da aposentadoria.

2. O cálculo da expectativa de vida, que tem como base a tábua de mortalidade referente ao ano anterior, que anualmente é divulgada no primeiro dia útil de dezembro, momento em que o fator previdenciário é então atualizado com os novos valores, é de competência atribuída ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

3. Tendo a lei conferido competência exclusiva ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE para elaborar e divulgar a expectativa de sobrevida do total da população brasileira, não tem o Poder Judiciário o condão de modificar os critérios utilizados pelo mesmo, sob pena de avocar para si competência dado ao Poder Legislativo, em total afronta ao princípio da independência e da harmonia dos Poderes (art. 2º da C.F). Assim, a expectativa de sobrevida do segurado na idade da aposen-tadoria será obtida a partir da tábua completa de mortalidade para o total da população brasileira, construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos.

4. Para apuração do salário-de-benefício do apelante, não descurou a au-tarquia previdenciária de aplicar a Lei vigente ao tempo do fato gerador

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para a concessão do benefício, incluindo-se, in casu, o fator previden-ciário.

5. Apelação da parte autora desprovida.

acÓRdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimida-de, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 23 de maio de 2017.

Lucia Ursaia Desembargadora Federal

RelatÓRio

A Senhora Desembargadora Federal Lucia Ursaia (Relatora): Trata-se de ape-lação interposta pela parte autora em face de sentença de improcedência de pedi-do revisional de benefício previdenciário, em cujas razões recursais se sustenta o direito ao recálculo da renda mensal inicial de sua aposentadoria, sem a utilização do fator previdenciário, com o pagamento das diferenças atualizadas, acrescidas de juros de mora e verba honorária.

Sem as contrarrazões de apelação, os autos foram remetidos a este egrégio Tribunal.

É o relatório.

voto

A Senhora Desembargadora Federal Lucia Ursaia (Relatora): A parte autora obteve a concessão de seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em 02.03.2009, ou seja, na vigência da atual Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.1998, e da Lei nº 8.213/1991, conforme se verifica do documento juntado aos autos à fl. 33.

Com efeito, consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o fato gerador para a concessão do benefício previdenciário deve ser regido pela lei vigen-te à época de sua concessão. Confira-se:

“1. O benefício previdenciário deve ser concedido pelas normas vigentes ao tem-po do fato gerador, por força da aplicação do princípio tempus regit actum.” (REsp 833.987/RN, Relª Min. Laurita Vaz, J. 03.04.2007, DJU 14.05.2007, p. 385).

Desta maneira, em obediência ao princípio do tempus regit actum, a aposen-tadoria concedida à parte autora em 02.03.2009, deve ser regida pela legislação em

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vigor à época, no caso o art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999, que assim dispunha:

“I – para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário;”

Cumpre salientar que a Lei nº 9.876/1999, sob o fundamento de que os 36 (trinta e seis) últimos salários-de-contribuição apenas abarcavam cerca de 10% (dez por cento) de todo o período contributivo do segurado, alterou o art. 29, bem como revogou seu § 1º, da Lei nº 8.213/1991, ampliando o período de apuração para abranger todo o período de contribuição do segurado.

Por sua vez, dispôs o art. 3º da referida Lei nº 9.876/1999:

“Para o segurado filiado à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação desta Lei, que vier a cumprir as condições exigidas para a concessão dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, no cálculo do salário-de-benefício será conside-rada a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, corresponden-tes a, no mínimo, 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, observado o disposto nos incisos I e II do caput do art. 29 da Lei nº 8.213, de 1991, com redação dada por esta Lei.”

E, ainda, o § 2º do mencionado artigo, cuja redação tem o mesmo teor do disposto no § 1º do art. 188-A do Decreto nº 3.048/1999, com a redação que lhe deu o Decreto nº 3.265, de 29.11.1999, assim dispôs:

“No caso das aposentadorias de que tratam as alíneas b, c e d do inciso I do art. 18, o divisor considerado no cálculo da média a que se refere o caput e o § 1º não poderá ser inferior a 60% (sessenta por cento) do período decorrido da competência julho de 1994 até a data de início do benefício, limitado a 100% (cem por cento) de todo o período contributivo.”

É o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, conforme se veri-fica na seguinte ementa de aresto:

“PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR IDADE – REVISÃO – PERÍODO BÁSI-CO DE CÁLCULO – AMPLIAÇÃO – EC 20/1998 E LEI Nº 9.876/1999 – LIMITE DO DIVISOR PARA O CÁLCULO DA MÉDIA – PERÍODO CONTRIBUTIVO

1. A partir da promulgação da Carta Constitucional de 1988, o período de apuração dos benefícios de prestação continuada, como a aposentadoria, correspondia à média dos 36 últimos salários-de-contribuição (art. 202, caput).

2. Com a Emenda Constitucional nº 20, de 1998, o número de contribuições inte-grantes do Período Básico de Cálculo deixou de constar do texto constitucional, que atribuiu essa responsabilidade ao legislador ordinário (art. 201, § 3º).

3. Em seguida, veio à lume a Lei nº 9.876, cuja entrada em vigor se deu em 29.11.1999. Instituiu-se o fator previdenciário no cálculo da aposentadoria e ampliou-se o período de apuração dos salários-de-contribuição.

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4. Conforme a nova Lei, para aqueles que se filiassem à Previdência a partir da Lei nº 9.876/1999, o período de apuração envolveria os salários-de-contribuição desde a data da filiação até a Data de Entrada do Requerimento – DER, isto é, todo o período contributivo do segurado.

5. De outra parte, para os já filiados antes da edição da aludida Lei, o período de apuração passou a ser o interregno entre julho de 1994 e a DER.

6. O período básico de cálculo dos segurados foi ampliado pelo disposto no art. 3º, caput, da Lei nº 9.876/1999. Essa alteração legislativa veio em benefício dos segura-dos. Porém, só lhes beneficia se houver contribuições.

7. Na espécie, a recorrente realizou apenas uma contribuição desde a competência de julho de 1994 até a data de entrada do requerimento – DER, em janeiro de 2004.

8. O caput do art. 3º da Lei nº 9.876/1999 determina que, na média considerar-se-á os maiores salários-de-contribuição, na forma do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/1991, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo desde julho de 1994. E o § 2º do referido art. 3º da Lei nº 9.876/1999 limita o divisor a 100% do período contributivo.

9. Não há qualquer referência a que o divisor mínimo para apuração da média seja limitado ao número de contribuições. 10. Recurso especial a que se nega provimen-to.” (STJ, REsp 929032, 5ª T., Rel. Min. Jorge Mussi, J. 24.03.2009, DJe 27.04.2009)

Portanto, para apuração do salário-de-benefício do apelante, não descurou a autarquia previdenciária de aplicar a Lei vigente ao tempo do fato gerador para a concessão do benefício, incluindo-se, in casu, o fator previdenciário.

Ressalta-se que o fator previdenciário instituído pela Lei nº 9.876/1999, cuja constitucionalidade foi questionada pelas ADIns 2.110 e 2.111, tendo como Relator o Ministro Sydney Sanches, leva em conta o tempo de contribuição, a idade e a expectativa de vida do segurado no momento da aposentadoria.

O Decreto nº 3.266, de 29 de novembro de 1999, assim determina:

“Art. 1º Para efeito do disposto no § 7º do art. 29 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com a redação dada pela Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, a expecta-tiva de sobrevida do segurado na idade da aposentadoria será obtida a partir da tábua completa de mortalidade para o total da população brasileira, construída pela Fun-dação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos.

Art. 2º Compete ao IBGE publicar, anualmente, até o dia primeiro de dezembro, no Diário Oficial da União, a tábua completa de mortalidade para o total da população brasileira referente ao ano anterior.”

Assim, temos que o cálculo da expectativa de vida, que tem como base a tábua de mortalidade referente ao ano anterior, que anualmente é divulgada no primeiro dia útil de dezembro, momento em que o fator previdenciário é então atualizado com os novos valores, é de competência atribuída ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................197

A suposta alteração da metodologia para o cálculo das tábuas de mortalida-de ou para o cálculo do fator previdenciário, o que causaria desvantagens para os cálculos das aposentadorias do RGPS, foi questionada pelo Ministério Público junto ao Ministério da Previdência Social, cuja resposta foi no sentido de que as mesmas se mantiveram inalteradas.

Assim, tendo a lei conferido competência exclusiva ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE para elabora e divulgar a expectativa de sobrevida do total da população brasileira, não tem o Poder Judiciário o condão de modificar os critérios utilizados pelo mesmo, sob pena de avocar para si competência dado ao Poder Legislativo, em total afronta ao princípio da independência e da harmonia dos Poderes (art. 2º da CF), ainda que isso implique em diminuição nos benefícios dos segurados. Assim, a expectativa de sobrevida do segurado na idade da aposentado-ria será obtida a partir da tábua completa de mortalidade para o total da população brasileira, construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos.

Neste sentido, é a jurisprudência da Décima Turma deste Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região:

“PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – REVISÃO DE BENEFÍCIO – FATOR PREVIDENCIÁRIO – TÁBUA DE MORTALIDADE – MÉDIA NACIONAL PARA AMBOS OS SEXOS – OBSCURIDADE INEXISTENTE – PREQUESTIONAMENTO

I – O objetivo dos embargos de declaração, de acordo com o art. 535 do Código de Processo Civil, é sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão.

II – A decisão embargada consignou expressamente que a expectativa de vida, como variável a ser considerada no cálculo do fator previdenciário, deve ser obtida a par-tir de dados idôneos, tendo o legislador, entretanto, certa discricionariedade para, sem afronta aos princípios da isonomia e da proporcionalidade, defini-la. E não se pode afirmar que a norma ofende a Constituição da República somente porque não diferencia as condições pessoais do trabalhador, sua região de origem, ou mesmo o respectivo sexo.

III – A questão invocada em sede de embargos declaratórios foi devidamente escla-recida no acórdão embargado. O que pretende, na verdade, o embargante, é a redis-cussão do mérito da ação, o que não é possível em sede de embargos de declaração.

IV – Os embargos de declaração interpostos com notório propósito de prequestiona-mento não têm caráter protelatório (Súmula nº 98 do e-STJ).

V – Embargos de declaração do autor rejeitados.’ (AC, Proc. 00007035720154039999, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, J. 09.06.2015, e-DJF3 Judicial 1 Data: 17.06.2015, Fonte_Republicacao4654053)”

Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora, na forma da fundamentação.

É o voto.

Lucia Ursaia Desembargadora Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34412

Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação/Remessa Necessária nº 5040509‑50.2016.4.04.9999/PRRelatora: Des. Federal Salise Monteiro SanchoteneApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSApelado: Carlos Roberto BalicoAdvogado: Luiz Cezar Martins Castanheiro

ementa

PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-DOENÇA

Aposentadoria por invalidez.

COISA JULGADA – OCORRÊNCIA

Estando caracterizada a denominada tríplice identidade, deve ser reco-nhecida a coisa julgada.

acÓRdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e dar provimento ao recurso para reconhecer a existência de coisa julgada e julgar improcedente o pedido, revogada a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre/RS, 05 de julho de 2017.

Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene Relatora

RelatÓRio

Trata-se de apelação interposta contra sentença, proferida em 16.06.2016, que, confirmando a antecipação de tutela anteriormente deferida, julgou proce-dente o pedido de concessão de aposentadoria por invalidez a contar da DER (11.09.2013), condenando o INSS ao pagamento das parcelas em atraso acrescidas de juros e correção.

O INSS argui, preliminarmente, a ocorrência de coisa julgada. No mérito, requer seja fixada a data de início do benefício quando da perícia judicial.

Após a apresentação das contrarrazões, e por força da remessa oficial, vie-ram os autos para julgamento.

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voto

REMESSA NECESSÁRIA

Nos termos do art. 14 do novo CPC, “a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos pro-cessuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”.

O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e aca-bados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.

Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC vigente sujeitam-se a reexa-me obrigatório se condenarem a Fazenda Pública ou assegurarem ao autor direito equivalente ao valor de mil salários mínimos ou mais.

A remessa oficial está prevista no art. 496 do Código de Processo Civil de 2015 (sem grifos no original):

Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas res-pectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.

§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

§ 2º Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.

§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econô-mico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respecti-vas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autar-quias e fundações de direito público.

§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:

I – súmula de tribunal superior;

II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

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IV – entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito admi-nistrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.

Em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, Rel. Min. Teori Zavascki).

Portanto, em atenção ao precedente citado, o conhecimento da remessa ne-cessária das sentenças anteriores à mudança processual observará os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.

Assim, tratando-se de sentença proferida na vigência do Código de Processo Civil de 2015, o cabimento da remessa necessária deve ser analisado a partir dos parâmetros previstos no art. 496, § 3º, do CPC.

Se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pú-blica em valor superior ou igual a 1.000 (mil) salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida, pois é neste momento que é fei-ta a avaliação quanto à obrigatoriedade da remessa. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.

No caso concreto, o valor do proveito econômico outorgado em sentença à parte autora da demanda é mensurável por simples cálculo aritmético.

A sentença de 16.06.2016 condenou o INSS ao pagamento do benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora a contar da DER (11.09.2013).

Tratando-se ou não de benefício equivalente ao salário mínimo, o valor, como visto, é facilmente estimável, o que atribui liquidez ao julgado.

Mesmo com o acréscimo dos consectários legais, a toda evidência o montan-te final fica muito aquém de 1.000 (mil) salários mínimos.

Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.

CASO CONCRETOBusca o INSS a reforma da sentença que julgou procedente o pedido de con-

cessão de aposentadoria por invalidez, a contar da DER, em 11.09.2013.

Analisando os autos, contudo, verifico tratar-se de coisa julgada.

Com efeito. Há coisa julgada quando presente a identidade de partes, de pedido e de causa de pedir.

Especificamente em relação às causas previdenciárias, tem se entendido que a coisa julgada deve ser analisada a partir de uma perspectiva peculiar de seguran-ça jurídica que consubstancia justa aderência do sistema normativo processual à especificidade do direito material e à dinâmica da realidade social (RI 5006812-

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................201

44.2012.404.7003, Terceira Turma Recursal do Paraná, Relator p/Acórdão José Antonio Savaris, J. 05.06.2013).

Na hipótese, em 05.02.2013, a parte autora ajuizou a ação nº 50002878520134047011 perante o Juízo Federal da 1ª VF de Paranavaí/PR, re-querendo a concessão e/ou restabelecimento de benefício por incapacidade desde 12.07.2012, data em que cessado o auxílio-doença NB 545.505.443-0, por do-enças relacionadas à coluna lombar. Nesse processo, a perícia médica, realizada em 27.05.2013, concluiu pela inexistência de incapacidade. Após, em 05.08.2013, sobreveio sentença de improcedência, com trânsito em J. 15.10.2013.

Com o resultado desfavorável nessa demanda, pouco mais de um mês depois da prolação da sentença, a parte autora apresentou novo requerimento administrati-vo (NB 603.259.653-6, com DER em 11.09.2013) em razão das mesmas patologias, cujo indeferimento resultou no ajuizamento da presente ação em 22.02.2014.

Consoante se depreende, ainda que a ação ora em curso tenha por objeto a concessão de benefício com requerimento administrativo diverso da ação ante-rior, é dever do segurado demonstrar que houve mudança na sua situação fática, seja pelo agravamento da doença já existente, seja pela constatação de patologia diversa.

Na hipótese, contudo, não houve a devida prova pela autora, uma vez que a documentação apresentada junto à petição inicial, relacionada às doenças da colu-na, é praticamente a mesma anexada na ação que tramitou na VF de Paranavaí/PR.

Além disso, as conclusões da perícia realizada neste processo, na data de 16.04.2015, não destoam do resultado do laudo judicial produzido em 27.05.2013 no outro processo, o que afasta a possibilidade de caracterização do agravamento da doença nesse ínterim.

Portanto, constatada a identidade de partes, pedido e causa de pedir, cumpre seja reconhecida a coisa julgada na hipótese.

CONCLUSÃO

Nesses termos, a sentença deve ser reformada a fim de que o pedido seja julgado improcedente, com a revogação da antecipação dos efeitos da tutela con-cedida em primeiro grau, atentando-se para o entendimento firmado pela Terceira Seção Previdenciária deste Tribunal, no sentido de que presente a boa-fé e consi-derando a natureza alimentar dos valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela, mesmo que posteriormente revogada, não podem ser considerados indevidos os pagamentos realizados, não havendo que se falar, por consequên-cia, em restituição, devolução ou desconto (TRF4, AC 5004044-22.2015.404.7204, 6ª T., Rel. João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 11.11.2016).

Cabe a parte autora suportar o pagamento das despesas processuais, honorá-rios periciais e honorários advocatícios, estes últimos arbitrados em R$ 937,00, cuja exigibilidade permanecerá sobrestada até modificação favorável de sua situação econômica.

202 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Por fim, convém atentar para os inúmeros precedentes desta Turma acerca da reprodução sistemática de demandas idênticas (Classe: AC, Apelação Cível, Processo: 0010897-89.2015.404.9999; Órgão Julgador: 6ª T.; DE 24.08.2016; Rel. João Batista Pinto Silveira; (Classe: AC, Apelação Cível, Processo: 5028269-29.2016.404.9999; Órgão Julgador: 6ª T., DE 12.08.2016; Relª Vânia Hack de Almeida).

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e dar provimento ao recurso para reconhecer a existência de coisa julgada e julgar improcedente o pedido, revogada a antecipação dos efeitos da tutela.

Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene Relatora

extRato de ata da sessão de 05.07.2017

Apelação/Remessa Necessária nº 5040509-50.2016.4.04.9999/PR

Origem: PR 00004254620148160121

Relator: Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene

Presidente: Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira

Procurador: Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira

Apelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Apelado: Carlos Roberto Balico

Advogado: Luiz Cezar Martins Castanheiro

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05.07.2017, na se-qüência 684, disponibilizada no DE de 19.06.2017, da qual foi intimado(a) Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Ministério Público Federal e as demais Procu-radorias Federais.

Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial e dar provimento ao recurso para reconhecer a existência de coisa julgada e julgar improcedente o pedido, revogada a antecipação dos efeitos da tutela.

Relator Acórdão: Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene

Votante(s): Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene Juiz Federal Altair Antonio Gregorio Des. Federal João Batista Pinto Silveira

Lídice Peña Thomaz Secretária de Turma

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34413

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoGabinete do Desembargador Federal Leonardo CarvalhoApelação Cível nº 594506‑PB (0001031‑59.2017.4.05.9999)Apte.: Geraldo Jose Duarte FilhoAdv./Proc.: Admilson Leite de Almeida JúniorApdo.: INSS – Instituto Nacional do Seguro SocialRepte.: Procuradoria Representante da EntidadeOrigem: 1ª Vara da Comarca de Pombal – PBRelator: Des. Federal Leonardo Carvalho

ementa

PREVIDENCIÁRIO – PROCESSO CIVIL – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – LITISPENDÊNCIA CON- FIGURADA – INEXISTÊNCIA DE NOVO QUADRO FÁTICO QUE JUSTIFIQUE A PROPOSITURA DE UMA NOVA AÇÃO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE EXTINGUIU O PROCESSO SEM EXAME DE MÉRITO

I – Apelação interposta pela parte autora contra sentença que extinguiu sem resolução do mérito a ação ordinária de concessão de benefício assistencial, em razão de se verificar litispendência com o Processo de nº 0504453-22.2009.4.05.8202.

II – O processo citado tramitou na 8ª Vara Federal do Juizado Espe-cial Federal de Sousa/PB, com sentença de procedência do pedido (fls. 107/110), com posterior acórdão, reformando a sentença conforme certidão de fl. 111.

III – Apela a parte autora alegando que não há similitude entre as deman-das judiciais, levantando o fato de ter um novo requerimento administra-tivo e nova situação fática.

IV – Da análise das provas juntadas aos autos, verifica-se que a presente ação possui as mesmas partes (Geraldo José Duarte Filho x INSS), a mes-ma causa de pedir (a incapacidade do autor) e o mesmo pedido (benefí-cio assistencial) de ação anteriormente ajuizada (Processo nº 0504453-22.2009.4.05.8202, do JEF/PB), na qual foi julgado improcedente o pedido pelo acórdão da turma recursal (fl. 111).

V – O processo que tramita no Juizado Especial possui a mesma causa de pedir e mesmas partes, assim como o mesmo pedido dos presentes autos, tendo a parte autora proposto a presente demanda em 29.04.2013.

204 .................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

VI – Apelante, ao ajuizar a presente demanda, não demonstrou a exis-tência de um novo quadro fático (modificativo da causa de pedir) que pudesse viabilizar o seu prosseguimento. Na hipótese, o requerente ob-jetiva resgatar uma discussão já sepultada, por está caracterizada a litis-pendência.

VII – Haja vista que restou configurada a identidade das ações nos termos do art. 485, V do CPC/2015, deve ser negado provimento à apelação,mantendo a sentença que reconheceu a litispendência.

VIII – Apelação da parte autora improvida.

[16.1]

acÓRdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível, em que são par-tes as acima mencionadas.

Acordam os Desembargadores Federais da Segunda Turma do Tribunal Re-gional Federal da 5ª Região, à unanimidade, em negar provimento à apelação do autor, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado.

Recife, de de 2017.

Leonardo Carvalho Desembargador Federal Relator

RelatÓRio

O Exmo. Desembargador Federal Leonardo Carvalho (Relator): Geraldo José Duarte Filho ajuizou ação contra o Instituto Nacional de Seguro Social-Inss, objeti-vando a concessão do benefício assistencial.

Ao final, o MM. Juiz de primeiro grau julgou improcedente o pedido autoral, por ter entendido estar caracterizada a coisa julgada do nos autos do processo de nº 0504453-22.2009.4.05.8202 que tramitou na 8ª Vara Federal do Juizado Espe-cial Federal de Sousa – PB.

Irresignado, apela o autor alegando a não configuração de coisa julgada por não haver similitude entre as causas de pedir entre as demandas judiciais.

Sem contrarrazões.

Subiram os autos, sendo-me conclusos por força de distribuição. É o relatório.

Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA .....................................205

voto

O Exmo. Desembargador Federal Leonardo Carvalho (Relator):

Compulsando os autos, verifica-se que o autor, de 22 anos, nº 0504453-22.2009.4.05.8202 que tramitou na requereu benefício assistencial na 8ª Vara Fe-deral do Juizado Especial Federal de Sousa – PB, com sentença de procedência do pedido (fls. 107/110), com posterior acórdão, reformando a sentença conforme certidão de fl. 111.

Da análise das provas juntadas aos autos, verifica-se que a presente ação possui as mesmas partes (Geraldo José Duarte Filho x INSS), a mesma causa de pedir (a incapacidade do autor) e o mesmo pedido (benefício assistencial) de ação anteriormente ajuizada (Processo nº 0504453-22.2009.4.05.8202, do JEF-PB), na qual foi julgado procedente o pedido, sendo reformada a decisão pelo acórdão da turma recursal (fl. 111).

O processo que tramitou no Juizado Especial apesar de não ter transitado em julgado na data da sentença destes autos (fl. 167), possui a mesma causa de pedir e mesmas partes, assim como o mesmo pedido., tendo a parte autora proposto a presente demanda em 29.04.2013, baseando-se nas mesmas provas acostadas no processo anterior. Tendo em vista que o lapso temporal desta lide está inserido no já indeferido, não há como analisar o pedido formulado nesta ação, pois, a situação jurídica da parte postulante é a mesma do processo do JEF, razão pela qual deve ser reconhecida a litispendência.

O apelado, ao ajuizar a presente demanda, não demonstrou a existência de um novo quadro fático (modificativo da causa de pedir) que pudesse viabilizar o seu prosseguimento. Na hipótese, o requerente objetiva resgatar uma discussão já sepultada, por estar caracterizada a litispendência.

Ademais, apesar de haver um novo requerimento administrativo, realizado após o trânsito em julgado da primeira demanda, em 28.09.2009 (fl. 16), o mesmo não é suficiente por si só, para caracterizar a existência de fatos novos que pudesse descaracterizar a coisa julgada. Segue a jurisprudência nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – APOSENTADORIA RURAL POR IDADE – COISA JULGADA CONFIGURADA

1. Compulsando os autos, verifica-se que a autora requereu aposentadoria rural na Justiça Federal, com sentença devidamente transitada em julgado, tendo sido os autos arquivados em 28.10.2009, conforme se verifica em consulta ao site da Justiça Federal de Sergipe.

2. Da análise das provas juntadas aos autos, verifica-se que a presente ação possui as mesmas partes (Maria Augusta de Souza x INSS), a mesma causa de pedir (óbito do pretenso instituidor e o exercício de atividade rural) e o mesmo pedido (pensão por morte) de ação anteriormente ajuizada (Processo nº 0503852-86.2009.4.05.8502, da JFSE), na qual foi indeferido o pedido, tendo seu transito julgado se dado em 27.10.2009.

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3. O pedido autoral no processo nº 0503852-86.2009.4.05.8502 baseou-se nas mes-mas provas acostadas ao presente feito, porquanto a autora se limitou a acostar aos au-tos a certidão de óbito, as certidões de nascimento dos filhos, certidão de casamento religioso e ficha do instituto de identificação (departamento de criminalista), todos de conhecimento anterior à primeira demanda, razão pela qual não há como se analisar o pedido de concessão formulado nesta ação, pois já aferida a mesma situação de fato em processo anterior.

4. In casu, verifica-se que a parte autora, ao ajuizar a presente demanda, não trouxe qualquer elemento novo (modificação do pedido ou da causa de pedir) que pudesse viabilizar o seu prosseguimento. Na hipótese, a requerente objetiva resgatar uma dis-cussão já sepultada pelo manto da coisa julgada que se consolidou depois de apre-ciada judicialmente.

5. A apresentação de um novo indeferimento administrativo não é suficiente, por si só, para caracterizar a existências de fatos novos que pudessem descaracterizar a coisa julgada.

6. Ressalte-se que restou consignado na sentença que “o interessado sequer apresenta uma documentação mínima a formar um início de prova material do exercício da atividade rural em regime de economia familiar, conforme exigido pela legislação”.

7. Desta feita, haja vista que restou configurada a identidade das ações nos termos o art. 301, § 2º, do CPC, deve ser extinto o processo, sem resolução do mérito, em face da coisa julgada.

8. Apelação provida,, para extinguir o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, V do CPC.

(Processo: 00026794520154059999, AC583130/PB, Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, 4ª T., J. 08.09.2015, Publicação: DJe 17.09.2015 – P. 178).

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR IDADE DE TRA-BALHADOR RURAL – COISA JULGADA CONFIGURADA – PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – ART. 267, V DO CPC

1. Verificando os autos, percebe-se que a autora, ora apelada, requereu administra-tivamente a aposentadoria rural, pela primeira vez, em 09.11.2011. O pedido foi indeferido e a requerente entrou com ação perante a 9ª Vara Federal da Paraíba, dis-tribuída em 19.12.2012, conforme o documento acostado aos autos.

2. Alega a apelante que não há que se falar em coisa julgada em matéria previdenciá-ria em razão de novo pedido administrativo e novas provas em que se funda a preten-são autoral. Requer a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido.

3. A sentença, que foi confirmada pela Turma Recursal dos Juizados Federais daquele estado, concluiu que a requerente não havia comprovado sua qualidade de segurada especial, razão pela qual a demanda foi julgada improcedente, transitando em julgado em 21.01.2014.

4. Insatisfeita, entretanto, com o deslinde da controvérsia, a apelada realizou novo requerimento administrativo, dessa vez em 14.02.2014, ou seja, dois anos e três me-ses após o primeiro e menos de um mês após o transito em julgado da primeira ação, que foi igualmente indeferido, ajuizando, assim, a presente demanda em 19.08.2014.

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5. Em análise dos autos, conclui-se que, apesar de haver um novo requerimento admi-nistrativo, a requerente não acostou nenhum documento que comprovasse uma nova realidade fática.

6. Todos os documentos acostados aos autos foram produzidos antes de 2012, ou seja, antes do primeiro requerimento administrativo e, consequentemente, da primeira demanda, exceto a declaração de exercício de atividade rural, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Cariri/PB, que foi emitida em 27.01.2014, que não traz informação nova.

7. Desse modo, percebe-se que a requerente quer, em verdade, rediscutir questão já protegida pela coisa julgada. Ressalte-se, inclusive, que esta Corte já decidiu no sentido de que um novo indeferimento administrativo não é suficiente para descarac-terizar a coisa julgada, em face da suposta existência de fatos novos. Precedente: (AC 572393-SE, Rel. Des. Fed. Fernando Braga, J. 07.10.2014, 2ª T.).

8. Restando indubitável que a autora não possui condições de arcar com as verbas de sucumbência sem colocar em risco a sua manutenção, sendo, portanto, benefi-ciária da gratuidade da justiça, não pode ser condenada ao pagamento dos honorários advocatícios, seja em cumprimento ao que dispõe o art. 3º, V da Lei nº 1.060/1950, seja em razão de que a disposição do art. 12 da mesma lei não foi recepcionada pela CF/1988, em virtude da auto-aplicabilidade plena do disposto na art. 5º, inciso LXXIV.

9. Apelação provida, para extinguir o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, V do CPC. (Processo: 00026794520154059999, AC583130/PB, Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, 4ª T., J. 08.09.2015, Publicação: DJe 17.09.2015, p. 178)

Desta feita, haja vista que restou configurada a identidade das ações, e por-tanto, questão já decidida nos termos do art. 505, caput do CPC/2015, portanto, deve ser extinto o processo, sem resolução do mérito, em face da coisa julgada de acordo com o art. 485,V do CPC/2015.

No que diz respeito à verba honorária, esta Segunda Turma já pontua en-tendimento majoritário no sentido de prestigiar o princípio da vedação da surpresa, segundo o qual não podem as partes ser submetidas a um novo regime processual financeiramente oneroso, ao meio de uma lide que ainda se desenvolve. E nessa linha, há que ser aplicada a disciplina do CPC de 1973, que não proibia a fixação de honorários em quantia certa e também não previa honorários advocatícios re-cursais. Ressalvado o ponto de vista do Relator que entende ser cabível a fixação dos honorários advocatícios recursais, se a sentença foi prolatada na vigência do CPC/2015, nos termos do REsp 1.636.124/AL, de Relatoria do Ministro Herman Benjamin, J. 06.12.2016, DJe 27.04.2017.

Diante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora mantendo a decisão de primeiro grau que reconheceu a litispendência.

É como voto.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Ementário34414 – Ação acidentária – nexo entre doença e atividade laborativa – conversão de benefício –

incapacidade laboral – não comprovação

“Apelação. Direito previdenciário. Direito processual civil. Ação acidentária. Incapacidade labo-ral. Não comprovada. Nexo entre doença e atividade laborativa. Conversão de benefício. Inde-vido. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. 1. A concessão da aposentadoria por invalidez depende do reconhecimento de incapacidade total e permanente. 2. A concessão de benefício previdenciário em razão de incapacidade laborativa temporário ou permanente exige comprovação da incapacidade. Considerando que as perícias realizadas pelo INSS e a perícia judicial concluíram pela inexistência de incapacidade, não há que se falar em concessão de benefício previdenciário. 3. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. Unânime.” (TJDFT – Proc. 20160110041007APC – (1010036) – 4ª T.Cív. – Rel. Romulo de Araujo Mendes – J. 19.04.2017)

Remissão Editorial SínTESEVide RST nº 336, jun. 2017, ementa nº 34260 do TRT 6ª R.

34415 – Aposentadoria por idade rural – atividade comprovada – benefício devido

“Previdenciário. Aposentadoria por idade rural. Art. 48, § 1º, da Lei nº 8.213/1991. Atividade rural comprovada. Início de prova material corroborada por prova testemunhal. Requisitos pre-enchidos. Benefício devido. 1. O benefício da aposentadoria por idade é concedido, desde que demonstrado o cumprimento da carência, ao segurado trabalhador rural que tenha 60 anos de idade, se homem, ou 55 anos se mulher (§ 1º, art. 48 da Lei nº 8.213/1991). 2. Comprovada a atividade rural e a carência exigidas através de início de prova material corroborada pela tes-temunhal, e preenchida a idade necessária à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao recebimento da aposentadoria por idade. 3. Apelação provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.” (TRF 3ª R. – AC 0041474-43.2016.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Nelson Porfirio – DJe 11.04.2017 – p. 1044)

Comentário Editorial SínTESENo presente caso foi analisada a aposentadoria por idade do rurícola.Segundo o § 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, o rurícola terá direito à aposentadoria por idade quando completarem sessenta anos de idade, se homens e, cinquenta e cinco anos de idade, se mulheres.Além disso, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido.Ocorre que, com a possibilidade da Reforma Previdenciária, o trabalhador rural também sofre-rá alterações na concessão dos benefícios previdenciários.Até o momento do fechamento desta edição, o texto aprovado determina que (art. 8º da PEC 287/2016):“Art. 8º Os trabalhadores rurais e seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos de que trata o § 8º do art. 195 da Constituição que, na data de promulgação desta Emenda, exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, como o pro-dutor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o extrativista, o pescador artesanal poderão se aposentar se na data da promulgação da Emenda contarem com idade igual ou superior a cinquenta anos, se homem, e quarenta e cinco anos, se mulher, quando atenderem cumulati-vamente as seguintes condições:I – sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco anos de idade, se mulher, e cento e oitenta meses de tempo de atividade rural; eII – um período adicional de efetiva contribuição, nos termos do § 8º do art. 195 da Constitui-ção, equivalente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data da promulgação desta Emenda, faltaria para atingir o tempo de atividade rural exigido no inciso I.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO ......................................................209

§ 1º As regras previstas neste artigo somente serão aplicadas se o segurado estiver exercendo a atividade prevista no caput na data de promulgação desta Emenda e no período anterior ao requerimento do pedido de aposentadoria.

§ 2º O valor das aposentadorias concedidas na forma deste artigo será de um salário mínimo.

[...]

Art. 10. O tempo de atividade rural exercido até a data de promulgação desta Emenda, inde-pendentemente da idade do trabalhador rural referido no § 8º do art. 195 da Constituição, será comprovado na forma da legislação vigente na época do exercício da atividade e somente poderá ser computado mediante a manutenção da qualidade de segurado especial rural no período compreendido entre a entrada em vigor da Lei a que se refere o art. 10 desta Emenda e a implementação das condições necessárias para a obtenção do benefício.

§ 1º As regras previstas neste artigo somente serão aplicadas se o segurado estiver exercendo a atividade prevista no caput na data de promulgação desta Emenda e no período anterior ao requerimento do pedido de aposentadoria.

§ 2º O tempo de que trata o caput será reconhecido tão somente para concessão da aposen-tadoria a que se refere o § 7º do art. 201 da Constituição.

§ 3º O valor das aposentadorias concedidas na forma deste artigo será de um salário mínimo.”

34416 – Aposentadoria por tempo de contribuição – contagem híbrida – comprovação do serviço rural – pagamento devido

“Previdenciário. Contagem híbrida de tempo de serviço rural e urbano. Aposentadoria por tempo de contribuição. Possibilidade. Idade exigida. 65 anos para homens e 60 para mulheres. Compro-vação de tempo de serviço rural. 1. A 3ª seção do STJ consolidou entendimento no sentido de que é possível a contagem híbrida de tempo de serviço rural e urbano, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, dispensada, todavia, a comprovação de contribuições relativas ao serviço rural prestado em época anterior à Lei nº 8.213/1991. 2. ‘Como expressamente previsto em lei, a aposentadoria por idade urbana exige a idade mínima de 65 anos para homens e 60 anos para mulher, além de contribuição pelo período de carência exigido. Já para os trabalhadores exclusi-vamente rurais, a idade é reduzida em cinco anos, e o requisito da carência restringe-se ao efetivo trabalho rural (art. 39, I, e 143 da Lei nº 8.213/1991)’. 3. O § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, introduzido pela Lei nº 11.718/2008, permite que aos 65 anos, se homem e 60 anos, mulher, o se-gurado preencha o período de carência faltante com períodos de contribuição de outra qualidade de segurado, calculando-se o benefício de acordo com o § 4º do art. 48. 4. Considerando que a intenção do legislador foi a de permitir aos trabalhadores rurais, que se enquadrem nas categorias de segurado empregado, contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial, o apro-veitamento do tempo rural mesclado ao tempo urbano, preenchendo inclusive carência, o bene-fício da aposentadoria por idade híbrida deve ser reconhecido. 5. Não implementado o requisito etário, o apelo, contudo, deve ser desprovido.” (TRF 2ª R. – AC 0001958-43.2016.4.02.9999 – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 24.04.2017 – p. 31)

Comentário Editorial SínTESECinge-se a controvérsia ao reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de contri-buição híbrida.

É sabido que a Lei nº 11.718/2008, que acrescentou o § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213/1991, possibilitou aposentadoria por idade “híbrida” aos trabalhadores rurais que não implemen-tassem os requisitos para a aposentadoria por idade rural, se a soma do tempo de trabalho rural com as contribuições vertidas em outras categorias alcançar a carência de que trata o art. 142 da Lei nº 8.213/1991; e uma vez implementada a idade mínima prevista no caput do art. 48 da mesma lei.

Oportuno, o destaque do trecho do voto do Relator do STJ, Ministro Mauro Campbell Marques, no julgamento do AgRg-REsp 1.476.456/RS:

Com efeito, a modalidade híbrida trazida pela Lei nº 11.718/2008 permite uma adequação da norma para as categorias de trabalhadores urbanos e rurais. Possibilitou ao segurado especial

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a soma do tempo de atividade rural sem contribuições previdenciárias ao tempo de contribui-ção em outra classificação de segurado, com a finalidade de implementar o tempo necessário de carência. Essa a interpretação a ser dada ao § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991.

Confira-se o precedente da 2ª T. do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – NÃO CARACTERIZAÇÃO – JULGA-MENTO EXTRA PETITA – NÃO OCORRÊNCIA – ART. 48, §§ 3º E 4º DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.718/2008 – OBSERVÂNCIA – RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO

1. A Lei nº 11.718/2008 introduziu no sistema previdenciário brasileiro uma nova modalidade de aposentadoria por idade denominada aposentadoria por idade híbrida.

2. Neste caso, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.

3. Não atendendo o segurado rural à regra básica para aposentadoria rural por idade com comprovação de atividade rural, segundo a regra de transição prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/1991, o § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, introduzido pela Lei nº 11.718/2008, permite que aos 65 anos, se homem e 60 anos, mulher, o segurado preencha o período de carência faltante com períodos de contribuição de outra qualidade de segurado, calculando-se o benefício de acordo com o § 4º do art. 48.

4. Considerando que a intenção do legislador foi a de permitir aos trabalhadores rurais, que se enquadrem nas categorias de segurado empregado, contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial, o aproveitamento do tempo rural mesclado ao tempo urbano, pre-enchendo inclusive carência, o direito à aposentadoria por idade híbrida deve ser reconhecido.

5. Recurso especial conhecido e não provido.

(REsp 1.367.479/RS, 2ª T., de minha Relatoria, DJe 10.09.2014)

Destarte, o segurado especial que comprove a condição de rurícola, mas não consiga cum-prir o tempo rural de carência exigido na tabela de transição prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/1991 e que tenha contribuído sob outras categorias de segurado, poderá ter reco-nhecido o direito ao benefício aposentadoria por idade híbrida, desde que a soma do tempo rural com o de outra categoria implemente a carência necessária contida na Tabela, não ocor-rendo, por certo, a diminuição da idade.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.”

34417 – Aposentadoria por tempo de serviço – rurícola sem registro – início de prova material corroborada por testemunha – valoração – pagamento devido

“Previdenciário. Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Atividade rural sem registro. Início de prova material corroborada por prova testemunhal. 1. O tempo de atividade campestre reconhecido nos autos é de ser computado, exceto para fins de carência, e apenas para fins de aposentação no Regime Geral da Previdência Social – RGPS, nos termos do § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 e inciso X do art. 60 do Decreto nº 3.048/1999. 2. Início de prova material corroborada por idônea prova testemunhal. 3. Somados os períodos de trabalho anotados em CTPS e constantes do CNIS e o tempo de serviço rural reconhecido, faz jus o autor ao benefício de aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição. 4. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425. 5. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme entendimento consolidado na c. 3ª Seção desta Corte (AL-EI 0001940-31.2002.4.03.610). A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.8. Remessa oficial provida em parte e apelações desprovidas. 6. Os honorários advocatí-cios devem observar as disposições contidas no inciso II do § 4º do art. 85 do CPC, e a Súmula nº 111, do e. STJ. 7. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/1996, do art. 24-A da Lei nº 9.028/1995, com a redação dada pelo

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art. 3º da MP 2.180-35/01, e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/1993. 8. Remessa oficial, havida como submetida, e apelação providas em parte.” (TRF 3ª R. – AC 0010528-25.2015.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Baptista Pereira – DJe 11.04.2017 – p. 1119)

34418 – Auxílio-doença – conversão em aposentadoria por invalidez – laudo judicial – incapaci-dade para o exercício de atividade laboral – benefício devido

“Previdenciário. Concessão. Auxílio-doença. Conversão em aposentadoria por invalidez. Laudo judicial. Incapacidade para o exercício de atividade laboral. 1. Tendo constado no laudo peri-cial que a incapacidade do autor seria total para a sua atividade habitual; bem como que não poderia ser reabilitado para desempenhar outras atividades laborativas dentro de sua realidade funcional e grau de instrução; e levando em consideração sua idade na data do ajuizamento da ação, o benefício de auxílio-doença deve ser convertido definitivamente em aposentadoria por invalidez a partir da data de realização da perícia judicial. 2. Os requisitos para a concessão do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez estão dispostos no art. 42, caput e § 2º, da Lei nº 8.213/1991, quais sejam: 1. qualidade de segurado; 2. cumprimento do período de carência (12 contribuições), quando exigida; 3. incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou total e permanente (aposentadoria por invalidez) representando esta última aquela incapaci-dade insuscetível de recuperação ou de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência (incapacidade total e permanente para o trabalho) e. 4. não ser a doença ou lesão preexistente à filiação do segurado ao Regime Geral da Previdência Social. 3. Embora o Juízo a quo tivesse concluído que a incapacidade do autor é preexistente à sua filiação ao sistema previdenciário, nada há nos autos que comprove que a doença antecedeu a filiação do autor ao INSS. 4. O Juízo não está adstrito às conclusões de laudos periciais da autarquia. Pode levar em consideração o laudo judicial em virtude do maior grau de imparcialidade deste profissional, porque, além da condição equidistante em relação aos litigantes, tem condições de apresentar um trabalho para melhor formação do seu convencimento. 5. Concessão da antecipação dos efeitos da tutela para implantação do benefício, em razão da existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e em razão da natureza alimentar do direito buscado (benefício de prestação continuada). Art. 300, do NCPC. 6. Honorários advocatícios nos termos do art. 85, § 4º, II, do Novo CPC. Definição do percentual, somente ocorrerá quando liquidado o julgado. 7. Até a data da entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os juros moratórios, contados a partir da citação, devem ser fixados em 1% ao mês, ao passo que a correção monetária deve ser cal-culada de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal. Após a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, passam a incidir o índice oficial de remuneração básica e os juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o seu art. 5º. 8. A isenção do pagamento de custas processuais da Autarquia Previdenciária, prevista no § 1º do art. 8º da Lei nº 8.620/1993, apenas é aplicável às demandas que tramitam na Justiça Federal. Em se tratando de ação proposta na Justiça Estadual em razão da delegação de competência constitucional (§ 3º do art. 109 da CRFB), a isenção há de ter como fundamento o diploma legal do Estado-Membro. Nos termos da Lei do Estado do Espírito Santo nº 9.974/2013 não isenção de custas. 9. Apelação a que dá provimento para julgar procedente o pedido para conceder auxílio-doença à parte autora a partir do requeri-mento administrativo apresentado em 11.04.2013 (fl. 31), devendo ser convertido definitivamente em aposentadoria por invalidez a partir da data de realização da perícia judicial.” (TRF 2ª R. – AC 2015.02.01.900119-7 – (629157) – 2ª T.Esp. – Rel. Marcello Granado – DJe 20.04.2017 – p. 32)

Transcrição Editorial SínTESELei nº 8.213/1991:

“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for consi-derado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

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§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de inca-pacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.

§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”

34419 – Benefício previdenciário por incapacidade – valores recebidos a título de auxílio-doença no período – desconto – cabimento

“Previdenciário e processual. Benefício por incapacidade. Valores recebidos a título de auxílio--doença no período. Desconto. 1. Reunidos os requisitos de qualidade de segurado e carência e comprovada a incapacidade permanente para o trabalho, é devida a concessão de aposen-tadoria por invalidez. 2. Comprovado que o autor recebeu auxílio-doença no período, está autorizado o INSS a descontar, do montante da condenação, os valores pagos neste período a este título.” (TRF 4ª R. – Ap-RN 5041277-10.2015.4.04.9999 – 6ª T. – Rel. Marcelo de Nardi – J. 05.04.2017)

34420 – Benefício previdenciário – revisão – alteração do teto pelas ECs 20/1998 e 41/2003 – benefício com DIB anterior à data da promulgação da CF/1988 – contradição – omissão – obscuridade – inocorrência

“Previdenciário. Embargos de declaração em agravo legal. Revisão de benefício. Alteração do teto pelas ECs 20/1998 e 41/2003. Benefício com DIB anterior à data da promulgação da CF/1988. Contradição. Omissão. Obscuridade. Inocorrência. Efeito infringente. Embargos de declaração opostos pelo autor em face do v. acórdão que negou provimento ao seu apelo, mantendo a sen-tença que julgou improcedente o pedido de reajustamento e readequação do benefício (revisão do teto das ECs 20/1998 e 41/2003), com o pagamento das diferenças daí advindas. Não se constata a presença de contradições, obscuridades ou omissões a serem supridas, uma vez que o r. decisum embargado, de forma clara e precisa, concluiu que, como o benefício previdenciário teve DIB em 07.08.1984, antes da promulgação da atual CF, ele não faz jus à revisão preten-dida. Os recentes julgados do E. STF (RE 898.958/PE, ARE 885.608/RJ e ARE 758.317/SP), nos quais os Eminentes Relatores esclarecem que a Suprema Corte não impôs limites temporais ao alcance do acórdão RE 564.354/SE, dizem respeito notadamente aos benefícios concedidos no Buraco Negro (concedidos posteriormente à promulgação da CF/1988, porém, antes da edição da Lei nº 8.213/1991), que posteriormente foram revistos nos termos dos arts. 144 e 145 da Lei nº 8.213/1991. A Revisão preceituada pelo RE 564.354/SE, não se aplica aos benefícios concedi-dos antes da edição da CF/1988, pois apenas a partir da Lei nº 8.213/1991, se verificou a defasa-gem histórica entre os fatores de correção do teto e dos salários-de-contribuição, pois antes disso ambos estavam vinculados à política salarial do Governo – agasalhado o v. Acórdão recorrido em fundamento consistente, não se encontra o magistrado obrigado a exaustivamente responder a to-das as alegações das partes, nem tampouco ater-se aos fundamentos por elas indicados ou, ainda, a explanar acerca de todos os textos normativos propostos, não havendo, portanto, qualquer vio-lação ao art. 1.022, do CPC – o Recurso de Embargos de Declaração não é meio hábil ao reexame da causa. A explanação de matérias com finalidade única de estabelecer prequestionamento a justificar cabimento de eventual recurso não elide a inadmissibilidade dos embargos declarató-rios quando ausentes os requisitos do art. 1.022, do CPC. Embargos de declaração improvidos.” (TRF 3ª R. – EDcl-AC 0012678-49.2013.4.03.6183/SP – 8ª T. – Relª Desª Fed. Tania Marangoni – DJe 20.04.2017 – p. 2587)

Remissão Editorial SínTESEVide RST nº 334, abr. 2017, ementa nº 34185 do TRF 2ª R.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO ......................................................213

34421 – Competência – auxílio-doença – síndrome do manguito rotador – ausência de alegação de incapacidade decorrente de exercício de atividades laborativas ou acidente do traba-lho – natureza previdenciária – Justiça Federal – alcance

“Ação previdenciária. Benefício. Auxílio-doença previdenciário. Síndrome do manguito rotador. Ausência de alegação de incapacidade decorrente de exercício de atividades laborativas ou aci-dente do trabalho. Natureza previdenciária. Juiz estadual com delegação federal. Inviabilidade, todavia, de apreciação da matéria por este e. Tribunal de Justiça. Cuidando o recurso de questão relacionada a benefício de natureza previdenciária, a competência para dirimir a controvérsia é do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, consoante a disposição dos arts. 108, II, 109, I e §§ 3º e 4º, da Constituição Federal. Apuração do objeto da lide deduzido na petição inicial. Recursos não conhecidos. Remessa dos autos ao e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região.” (TJSP – Ap 1005612-65.2014.8.26.0565 – São Caetano do Sul – 16ª CDPúb. – Rel. Valdecir José do Nascimento – DJe 24.04.2017)

34422 – Contribuição previdenciária – adicionais de horas extras, noturno, de insalubridade e de periculosidade e transferência – incidência

“Tributário. Contribuição previdenciária. Adicionais de horas extras, noturno, de insalubridade e de periculosidade. Adicional de transferência. Incidência. 1. A orientação do STJ é de que integram o conceito de remuneração, sujeitando-se, portanto, à contribuição previdenciária, os adicionais de horas extras, noturno, de insalubridade e de periculosidade pagos pelo empregador. 2. No mesmo sentido, está o posicionamento do STJ que consolidou que o adicional de transfe-rência possui natureza salarial, atraindo, portanto, a incidência de contribuição previdenciária. 3. Agravo Interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.618.453 – (2016/0205784-6) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 24.04.2017 – p. 953)

34423 – Pensão por morte – sentença homologatória de acordo trabalhista – início de prova material do vínculo empregatício do de cujus – produção de prova testemunhal – neces-sidade

“Previdenciário. Pensão por morte. Sentença homologatória de acordo trabalhista. Início de pro-va material do vínculo empregatício do de cujus. Produção de prova testemunhal. Necessidade. Anulação da sentença. 1. Ação ordinária de concessão de benefício oposta por Maria Rita Ferreira da Silva em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, objetivando a concessão do benefício de pensão por morte de trabalhador urbano. 2. Sentença que acolheu o pedido inicial, para conceder o benefício de pensão por morte ao demandante, nos termos do art. 74 da Lei nº 8.213/1991, assegurando o pagamento de parcelas em atraso, a partir da data do requerimento administrativo, devidamente corrigidas e com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluídas as prestações vincendas. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a sentença trabalhista homologatória de acordo pode ser considerada como início de prova material se fundada em elementos que demonstrem o labor exercido na função, sendo necessário, para demonstrar o efetivo exercício da atividade laboral, que seja realizada a instru-ção probatória, com a oitiva de testemunhas (STJ, 2ª T., AgRg-AREsp 432092, DJ 12.03.2015). 4. Apelação e Remessa Oficial providas, para anular a sentença e determinar a produção de pro-vas testemunhais.” (TRF 5ª R. – Ap-Reex 0000459-06.2017.4.05.9999 – (34369/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Machado Cordeiro – DJe 17.04.2017 – p. 40)

34424 – Pensão mensal vitalícia – soldado da borracha – cabimento

“Previdenciário. Código de Processo Civil de 1973. Aplicabilidade. Soldado da borracha. Pensão mensal vitalícia. Art. 54 da ADCT da Constituição da República. Justificação judicial proposta antes da alteração legislativa trazida pela Lei nº 9.711/1998. Início de prova material. Inexigibili-

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dade. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugna-do. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II – In casu, a Justificação Judicial visando a concessão da pensão mensal vitalícia, destinada ao seringueiro e prevista no art. 54 do ADCT da Constituição da República, foi ajuizada antes da alteração da redação do art. 3º da Lei nº 7.986/1989, pela Lei nº 9.711/1998, sendo inexigível, portanto, início de pro-va material para a concessão do benefício. Precedente. III – Recurso Especial do INSS improvi-do.” (STJ – REsp 1.657.797 – (2017/0046965-8) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 05.04.2017 – p. 981)

34425 – Pensão por morte – filha inválida – requisitos – preenchimento – termo inicial

“Previdenciário. Processual civil. Pensão por morte. Filha inválida. Requisitos. Preenchimento. Termo inicial. Honorários advocatícios. I – A legislação não estabelece, para os filhos inválidos, exigência cumulativa de que a invalidez seja anterior à maioridade. Na verdade, o que justifica a manutenção do benefício de pensão por morte é a situação de invalidez do requerente e a manutenção de sua dependência econômica para com a pensão deixada pelo instituidor, sendo irrelevante o momento em que a incapacidade para o labor tenha surgido, ou seja, se antes da maioridade ou depois. II – Ante o conjunto probatório constante dos autos, restou configurada a invalidez da autora à época do óbito de seu genitor. III – O fato de a autora ter desempenhado atividades laborativas nos períodos de 01.02.2002 a 30.07.2004 e 01.09.2005 a 02.02.2010, e de ter vertido uma única contribuição previdenciária no ano de 2008 não obsta a concessão do benefício pleiteado, visto que a dependência econômica dos filhos inválidos em relação aos pais é presumida. IV – O fato de existir uma empresa de pequeno porte em nome da demandante nos registros da Jucesp, por si só, não comprova a efetiva capacidade da requerente para o trabalho, a qual, ao contrário, é amplamente contestada pelo fato dela ser interditada judicialmente, bem como pelos documentos médicos constantes dos autos. V – O termo inicial do benefício fica mantido na data do requerimento administrativo, eis que incontroverso. VI – Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do art. 85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, majoram-se os honorários advocatícios para 10% das di-ferenças que seriam devidas até a data da sentença, de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte. Apelo do INSS não conhecido quanto ao ponto, visto que o julgado a quo limitou a incidência da verba honorária às parcelas vencidas até o início do pagamento ocorrido em virtude do deferimento da tutela de urgência. VII – Apelação do INSS não conhecida em parte e, na parte conhecida, improvida. Remessa oficial, tida por interposta, improvida.” (TRF 3ª R. – AC 0041536-83.2016.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento – DJe 11.04.2017 – p. 915)

Remissão Editorial SínTESEVide RST nº 322, abr. 2016, artigo de Sergio Henrique Salvador intitulado “A nova pensão por morte previdenciária”.

34426 – Pensão por morte – marido aposentado – revisão da RMI – observação

“Previdenciário. Pensão derivada de aposentadoria obtida junto ao INSS. Decadência decenal. Viúva titular de pensão por morte de marido aposentado. Majoração da pensão mediante a revi-são da renda mensal inicial (RMI) da pretérita aposentação. Inviabilidade no caso concreto. Con-sumação da decadência decenal relativamente ao pedido de revisão da RMI da aposentadoria. Exegese do art. 103, caput, da Lei nº 8.213/1991, com a redação dada pela MP 1.523-9/1997. 1. No caso concreto, a autora, titular de pensão por morte, busca da majoração dos valores de seu benefício, solicitando, para tanto, a prévia revisão da renda mensal inicial (RMI) da aposentadoria de seu falecido esposo. 2. Em tal contexto, o pedido de revisão da RMI da mencionada aposen-tadoria, com a consequente majoração da pensão da viúva, acha-se inviabilizado, eis que, a teor do decidido em repetitivo no REsp 1.309.529/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 04.06.2013,

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‘incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios conce-didos ou indeferidos anteriormente a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997)’. 3. Logo, na hipótese em exame, a possibilidade de revisão da RMI da aposentadoria do finado marido da pensionista quedou fulminada pela decadência de dez anos. Nesse sentido: REsp 1.526.968/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 18.08.2016, DJe 12.09.2016. 4. Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-REsp 1.630.083 – (2016/0260969-1) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 10.04.2017 – p. 511)

34427 – Servidor público estadual falecido – filha inválida – dependência econômica – pretensão ao recebimento do benefício de pensão por morte – possibilidade

“Recursos oficial e de apelação. Ação de procedimento ordinário. Direito previdenciário. Ser-vidor público estadual falecido. Filha inválida e dependente economicamente do instituidor do benefício. Pretensão ao recebimento do benefício de pensão por morte. Possibilidade. 1. Os elementos de convicção produzidos nos autos comprovam a dependência econômica da parte autora, relativamente ao genitor falecido, instituidor do benefício. 2. A condição de inválida da parte autora foi admitida pela própria parte ré. 3. Inteligência do art. 147 da Lei Complementar Estadual nº 180/1978, na redação da Lei Complementar Estadual nº 1.012/2007. 4. Benefício de pensão por morte, concedido e devido à parte autora, desde o óbito. 5. Juros de mora de 1% ao mês, até a publicação da Medida Provisória nº 2.180-35, que acrescentou o art. 1º-F à Lei Federal nº 9.494/1997 e, após, 0,5% ao mês, a partir de 28 de abril de 2001, desde a citação. 6. Manu-tenção dos índices de correção monetária estabelecidos na r. decisão de Primeiro Grau, sob pena de inadmissível reformatio in pejus. 7. Ação de procedimento ordinário, julgada procedente. 8. Sentença, ratificada. 9. Recursos oficial e de apelação, apresentado pela parte ré, desprovidos, com observação.” (TJSP – Ap 0000152-97.2013.8.26.0291 – Jaboticabal – 5ª CDPúb. – Rel. Fran-cisco Bianco – DJe 17.04.2017)

34428 – Tempo de serviço especial – frio – ruído – hidrocarbonetos – uso de EPI – conversão – possibilidade

“Previdenciário. Tempo especial. Frio. Ruído. Hidrocarbonetos. Uso de EPI. Conversão tempo comum em especial. Possibilidade. Inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da lei de benefícios. Tutela específica. 1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 2. Não havendo mais a previsão do frio como agente nocivo nos Decretos nºs 2.172/1997 e 3.048/1999, o reconhecimento da especialidade das ativi-dades desempenhadas pelo autor deve ter por base a previsão da Súmula nº 198 do TFR. 3. A ex-posição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 4. A exposição a hidrocarbonetos permite enquadramento no Decreto nº 53.831/1964, em seu Quadro Anexo, item 1.2.11; no Decreto nº 72.771/1973, em seu Anexo I, item 1.2.10; no Decreto nº 83.080/1979, Anexo I, item 1.2.10 e no Decreto nº 3.048/1999, itens 1.0.3, 1.0.7 e 1.0.19 do Anexo IV. 5. Possível afastar o enquadramento da atividade especial somente quando comprovada a efetiva utilização de equipamentos de proteção individual que elidam a insalubri-dade. 6. É possível a conversão de tempo comum em especial desde que o segurado implemente todos os requisitos para a concessão do benefício até 28.04.1995. Implementados os requisitos para a concessão da aposentadoria especial após 28.04.1995, o segurado não possui direito à conversão. 7. O sistema previdenciário vigente após a Lei nº 9.032/1995, portanto, somente ad-mite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço previsto no art. 57 da Lei nº 8.213/1991 (15, 20 ou 25 anos, conforme o caso) em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. 8. Inadimplido o requisito tempo (25 anos), o autor não faz jus à

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concessão da aposentadoria especial. 9. Direito à averbação da especialidade do labor nos pe-ríodos reconhecidos na decisão.” (TRF 4ª R. – Ap-RN 5000565-94.2015.4.04.7115 – 6ª T. – Rel. José Luis Luvizetto Terra – J. 05.04.2017)

34429 – Tempo de serviço – rurícola sem registro – averbação – cabimento

“Previdenciário. Tempo de serviço rural sem registro. Averbação. 1. O tempo de atividade cam-pestre reconhecido nos autos é de ser computado apenas no Regime Geral da Previdência Social – RGPS, exceto para fins de carência, como expressa o § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991. Para utilização desse mesmo tempo em outro regime, que não o RGPS, impõe-se o necessário reco-lhimento das contribuições previdenciárias do respectivo período, conforme determina o art. 96, IV, do mesmo diploma legal. 2. Tendo sido apresentado início de prova material corroborada por idônea prova oral produzida em Juízo, o tempo de serviço rural efetivamente comprovado deve ser averbado nos cadastros da Autarquia. 3. Apelação desprovida.” (TRF 3ª R. – AC 0009603-29.2015.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Baptista Pereira – DJe 11.04.2017 – p. 1122)

Transcrição Editorial SínTESELei nº 8.213/1991:

“Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, com-preendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

I – o tempo de serviço militar, inclusive o voluntário, e o previsto no § 1º do art. 143 da Consti-tuição Federal, ainda que anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, desde que não tenha sido contado para inatividade remunerada nas Forças Armadas ou aposentadoria no serviço público;

II – o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;

III – o tempo de contribuição efetuada como segurado facultativo; (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

IV – o tempo de serviço referente ao exercício de mandato eletivo federal, estadual ou mu-nicipal, desde que não tenha sido contado para efeito de aposentadoria por outro regime de previdência social; (Redação dada pela Lei nº 9.506, de 1997)

V – o tempo de contribuição efetuado por segurado depois de ter deixado de exercer atividade remunerada que o enquadrava no art. 11 desta Lei;

VI – o tempo de contribuição efetuado com base nos arts. 8º e 9º da Lei nº 8.162, de 8 de janeiro de 1991, pelo segurado definido no art. 11, inciso I, alínea g, desta Lei, sendo tais contribuições computadas para efeito de carência. (Incluído pela Lei nº 8.647, de 1993)

§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, obser-vado o disposto no § 2º. (Vide Lei nº 8.212, de 1991)

§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele corres-pondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justifi-cação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regula-mento.

§ 4º Não será computado como tempo de contribuição, para efeito de concessão do benefício de que trata esta subseção, o período em que o segurado contribuinte individual ou facultativo tiver contribuído na forma do § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, salvo se tiver complementado as contribuições na forma do § 3º do mesmo artigo.” (Incluído pela Lei Complementar nº 123, de 2006)

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34430 – Tempo de serviço especial – motorista de caminhão de carga – agentes químicos – reco-nhecimento – benefício devido

“Processual civil. Previdenciário. Atividade especial. Motorista de caminhão de carga. Agentes químicos. Agentes biológicos. Aposentadoria especial. Termo a quo. Correção monetária. Juros. Honorários advocatícios. I – Em se tratando de agentes químicos, impende salientar que a consta-tação dos mesmos deve ser realizada mediante avaliação qualitativa e não quantitativa, bastando a exposição do segurado aos referidos agentes para configurar a especialidade do labor. II – A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial no período pleitea-do. III – Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213/1991. IV – O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado na data do pedido na esfera administrativa, nos termos do art. 57, § 2º c/c art. 49, da Lei nº 8.213/1991. V – Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal que estiver em vigor no momento da execução do julgado. VI – A verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado. No que se refere à sua base de cálculo, devem ser levadas em conta apenas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111, do C. STJ. Considerando que a sentença tornou-se pública, ainda, sob a égide do CPC/1973, impossível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria e Enunciado nº 7 do C. STJ: ‘Somente nos recursos in-terpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do NCPC.’ VII – Na hipótese de a parte autora estar recebendo aposentadoria, auxílio-doença ou abono de permanência em serviço, deve ser facultado ao demandante a percepção do benefício mais vantajoso, sendo ve-dado o recebimento conjunto, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991. VIII – Apelação do INSS parcialmente provida. Recurso adesivo da parte autora provido.” (TRF 3ª R. – AC 0010394-66.2013.4.03.9999/SP – 8ª T. – Rel. Des. Fed. Newton de Lucca – DJe 20.04.2017 – p. 2003)

Seção Especial – Com a Palavra, o Procurador

Reconhecimento do Tempo de Serviço para Fins Previdenciários: a Sentença Trabalhista e a Exigência Normativa de Início de Prova Material

gEORgE RESEnDE RuMIATTO DE LIMA SAnTOSProcurador Federal, Especialista em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus, Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo.

RESUMO: O presente trabalho busca discutir o papel que se pode atribuir, em âmbito previdenciário, à sentença trabalhista que reconhece tempo de serviço prestado pelo trabalhador. Como forma de delimitar as fronteiras entre o direito do trabalho e o previdenciário, pretende-se promover aborda-gem inicial acerca da autonomia científica de tais disciplinas, da submissão a princípios e regras pró-prios, bem como da atribuição de competências de processo e julgamento das ações trabalhistas e previdenciárias a órgãos judiciários diversos. Com amparo em tais premissas, propõe-se demonstrar que a exigência normativa de que o reconhecimento de tempo de serviço para fins previdenciários só pode ser feito mediante apresentação de início de prova material reclama, por sua vez, que a sentença trabalhista seja valorada, no processo administrativo ou judicial previdenciário, de acordo com a instrução probatória que lhe serve de fundamento. Isso baliza a conclusão de que a sentença trabalhista que reconhece o tempo de serviço só poderá ser aceita no âmbito previdenciário se o processo judicial trabalhista tiver se constituído de documentos contemporâneos, ou se o segurado apresentar tais documentos, em conjunto com a sentença trabalhista, no processo administrativo ou judicial previdenciário. Por fim, registram-se reflexões sobre possíveis alterações legislativas que possam conferir mais adequado equacionamento ao trato do tema, embora se sustente que toda proposta deverá sempre se considerar limitada pelas características próprias do direito do trabalho e do direito previdenciário.

PALAVRAS-CHAVE: Direito previdenciário; direito do trabalho; sentença trabalhista; reconhecimento de tempo de serviço; início de prova material.

ABSTRACT: This paper discusses the role that can be attributed, in part social security law, the labor sentence recognizing length of service by the worker. In order to delimit the boundaries between labor law and social security law, it is intended to promote initial approach about the scientific auto-nomy of these disciplines, submission to principles and own rules and the powers to prosecute and judge the labor and social security actions to various judicial bodies. Up based on these assumptions, it is proposed to demonstrate that the normative requirement that the service time of recognition for pension purposes can only be done by material evidence early presentation complains, in turn, that the labor sentence is valued at administrative or judicial pension process, according to the evidential statement that serves as its foundation. This supports the conclusion that labor sentence that recognizes the service time can only be accepted in the social security law under the labor pro-ceedings has been constituted of contemporary documents, or if the insured person presents such documents, together with labor sentence in administrative proceeding or judicial pension. Finally,

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record up reflections on possible legislative changes that may confer more adequately addressing the issue of the deal, although it maintains that any proposal should always be considered limited by the characteristics of labor law and social security law.

KEYWORDS: Social security law; labor law; labor sentence; service time recognition; early documen-tary evidence.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Interação entre o direito trabalhista e o previdenciário; 1.1 Uma palavra sobre a autonomia científica; 1.2 Divisão de competências; 2 A exigência de início de prova material contemporânea para o reconhecimento de tempo de serviço para fins previdenciários; 3 A sentença trabalhista: distinção entre as sentenças conforme a instrução probatória que lhes serviu de funda-mento; 4 Há alternativas possíveis?; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Não parece exagero dizer que o Brasil é um País de trabalhadores informais. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostram que o nível de informalidade médio da população ocupada gira na casa de um terço, considerada a evolução de 2010 a 2013.

Isso significa que cerca de um a cada três brasileiros ocupados trabalha sem registro em carteira e sem recolhimentos à Previdência Social. É por isso que são tão comuns as ações judiciais cujo objetivo é ver reconhecido o tempo de serviço pres-tado pelo trabalhador. A finalidade pretendida com tais ações varia: a correta anota-ção da CTPS para que possa servir como comprovação da experiência profissional em futura busca de emprego; a declaração do tempo trabalhado para que subsidie a cobrança de verbas trabalhistas devidas pelo empregador; o reconhecimento do tempo de serviço para que possa ser requerido benefício previdenciário; ou mesmo todos esses fins cumulados.

Ocorre que, a depender do objetivo buscado, o caminho a ser percorrido também será diverso. O Direito brasileiro atribui competências de processo e julga-mento de ações trabalhistas e previdenciárias a órgãos judiciários distintos. Assim, ocorre de o trabalhador ajuizar ação contra seu empregador perante a Justiça do Trabalho, mas, ainda que reconhecido o tempo de labor informal, não obter a aver-bação de tal tempo para fins previdenciários.

Pretendemos demonstrar por que isso ocorre. Para tanto, será preciso ana-lisar a forma como interagem o direito do trabalho e o direito previdenciário em nosso ordenamento jurídico.

Em seguida, assentadas as premissas relativas à autonomia científica de tais matérias, à divisão constitucional de competências e à submissão a disciplinas nor-mativas próprias, será possível, então, debater com maior propriedade acerca da valoração, em âmbito previdenciário, da sentença trabalhista que reconhece tempo de serviço.

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Nesse contexto, será oportuno debater a distinção entre as sentenças traba-lhistas conforme a instrução probatória que lhes serve de fundamento, questão que se relaciona diretamente com a exigência legal de que o tempo de serviço, para fins previdenciários, só pode ser reconhecido se houver suporte de início de prova material, sendo vedada, portanto, a prova exclusivamente testemunhal.

Por fim, proporemos breves reflexões sobre possíveis alternativas que pode-riam ser adotadas como forma de se buscar um termo conciliatório no trato do tema, considerando, contudo, que o inter-relacionamento entre o direito do trabalho e o direito previdenciário não significa confusão entre as disciplinas, de sorte que sempre deverão ser respeitadas as peculiaridades ínsitas a cada qual desses ramos do Direito.

1 INTERAÇÃO ENTRE O DIREITO TRABALHISTA E O PREVIDENCIÁRIO

1.1 uma palavRa sobRe a autonomia científica

O debate a que nos propusemos reclama análise inicial acerca do inter-re-lacionamento ente o direito trabalhista e o direito previdenciário. Uma primeira observação, nesse sentido, deve partir da investigação sobre a autonomia científica desses ramos do Direito.

Talvez não seja adequado avançar sem antes tecer breves considerações so-bre o que seria essa autonomia científica. Marcos Barbosa de Oliveira formula, nesse contexto, a seguinte pergunta: que forma de autonomia deve ser reivindicada pela ciência nos dias de hoje? O professor, então, registra que distinguimos três formas que a autonomia da ciência assume ao longo de sua história: a galileana (ou metodológica), a vannevariana e a neoliberal.

O autor conclui, após minucioso estudo sobre o tema, que:

A forma de autonomia a ser reivindicada pela ciência hoje (1) exclui a autonomia neoliberal, (2) cede terreno na autonomia programática, mas (3) insiste na reivindi-cação da autonomia metodológica. Trata-se de uma forma inserida em um sistema democrático de condução da ciência que, como vimos, implica o exercício da res-ponsabilidade social por parte dos cientistas. Dada a importância desse requisito, pode ser chamada autonomia com responsabilidade social, ou autonomia social-mente responsável. É a forma própria da ciência no interesse público ou ciência pós-neoliberal.

Nota-se, portanto, que é posto acento no método. Alaôr Caffé Alves explica que o método e a ação analítica presidem a construção sistemática de uma ciência e que, na medida em que se elegem determinados critérios como relevantes para os fins científicos, “já se prefigura o conteúdo material do saber teórico sobre o objeto, determinando-o como estrutura de sentido”. E prossegue, advertindo que tal ques-tão é muito importante para eliminar a ilusão idealista do direito:

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A ciência nada põe que antes já não esteja no objeto como algo possível de ser des-coberto. Ela explora as múltiplas possibilidades que a realidade material oferece, cuja seleção se obtém em função da polarização com as necessidades e propósitos do homem em sua marcha histórico-social. Nessa linha, o objeto é descoberto ou cons-truído, mas não inventado.

De fato, o recorte metodológico sempre denota, ainda que indiretamente, a preocupação com necessidades humanas ideologicamente orientadas. A constru-ção de um saber científico, desde o nascedouro, portanto, não pode ser reputada neutra, a despeito da natureza puramente descritiva que Kelsen pretendia impor à ciência jurídica. É por isso que Karl Marx registrava, sobre o processo de “criação” da ciência, que:

Mesmo nos momentos em que eu sozinho desenvolvo uma atividade científica, uma atividade que raramente posso levar ao fim em direta associação com outros, sou social, porque é como homem que realizo tal atividade. Não é só o material da mi-nha atividade – como também a própria linguagem que o pensador emprega – que me foi dado como produto social. A minha própria existência é atividade social. Por conseguinte, o que eu próprio produzo é para a sociedade que o produzo e com a consciência de agir como ser social.

Assim, o Direito emerge ex ante como realidade para que possa ser apa-nhado de acordo com o método científico, isto é, para que possa ser apresentado de forma ordenada e sistematizada. Podemos ilustrar essa constatação da seguinte forma: as relações de trabalho assalariado, por meio das quais grupos de pessoas proprietárias dos meios de produção pagam um determinado montante pela mão de obra de outras pessoas, surgiram antes da regulação normativa hoje conhecida como direito do trabalho. Ou ainda: as pessoas compravam e vendiam bens antes da positivação de um direito dos contratos.

É certo que o Direito, como ciência social normativa, busca o estudo de como se deve realizar a conduta dos homens, conforme o imperativo das normas jurídicas postas pelos grupos dominantes em uma dada comunidade. Configura-se, no dizer de Kelsen, como “ordem da conduta humana”, no sentido de “um conjunto de regras que possui o tipo de unidade que entendemos por sistema”.

Daí se dizer que o direito é uno e indivisível. Sua categorização por ramos ou disciplinas, nesse diapasão, presta-se a fins didáticos e, ainda assim, é colocada em xeque diante dos novos rumos que tem tomado a ciência jurídica pós-positivista, em especial após a Segunda Guerra. A categorização do Direito, embora já notada de certo modo no Direito romano, tomou força com a codificação napoleônica, ini-cialmente se dividindo em compartimentos estanques o direito público e o privado, noção hoje refutada por muitos estudiosos do tema.

Passo adiante, e considerada a ressalva acerca da unidade do Direito, regis-tramos que se costuma buscar a afirmação da autonomia científica de um ramo do Direito com base em determinados critérios. Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari anotam que:

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Deve-se ressaltar, inicialmente, que a autonomia de que tratam os doutrinadores, se-gundo uma concepção mais recente, não significa, em momento algum, deixar de reconhecer a vinculação que um ramo do Direito tenha com os demais, por fazerem parte do mesmo ordenamento jurídico. Dizer-se autônomo o direito previdenciário, como o queremos adiante concluir, traz a ideia de uma disciplina que merece estudo à parte, calcado em princípios e normas singulares.

A autonomia científica de um ramo do Direito, segundo critérios pacificamente acei-tos pela doutrina, e creditados a Alfredo Rocco, é observada quando a matéria a ser disciplinada contém: um conteúdo vasto de estudo e pesquisa; princípios gerais ou institutos peculiares; e método ou processo próprio.

Os autores concluem em seguida, após detida análise, pela autonomia do di-reito previdenciário. E a explicação se faz necessária porque se verifica na doutrina, embora de forma minoritária, a chamada teoria da unidade, que integra o direito previdenciário no bojo do direito do trabalho.

Amauri Mascaro Nascimento lembra que a teoria da unidade é advogada por Mario de la Cueva, para quem o tratamento dado à matéria previdenciária, con-soante a legislação mexicana, é o mesmo do direito do trabalho, de sorte que não se poderia falar em seguro social com autonomia.

A despeito disso, doutrina de escol postula que o direito previdenciário goza de autonomia científica – no sentido estrito aqui proposto –, em geral se registrando que: a) as relações entre as partes são diversas, já que no direito previdenciário o indivíduo se relaciona com o Estado, por meio de normas de direito público, ao passo que no direito do trabalho o indivíduo é parte de relação contratual, em regra com uma pessoa de direito privado, regida pelas normas em sua maioria de direito privado; b) as finalidades são distintas, sendo que no direito do trabalho se tem o interesse do trabalhador e na segurança social, a melhoria individual, material e moral da sociedade; c) o direito previdenciário conta com princípios próprios, em muito diferenciados de outras relações reguladas pela ordem positiva.

Pois bem. Resta afirmada a dualidade entre direito do trabalho e direito pre-videnciário, mas não se pode negar a forte interdisciplinaridade desses ramos do Direito, bem como a existência de diversos pontos de conexão entre eles. Aliás, os limites dessa interação é que constituem, sob certo ponto de vista, o cerne da ques-tão que nos propomos a discutir. Vejamos, então, como essas disciplinas dialogam e, especialmente, como o ordenamento jurídico brasileiro desenhou a divisão de competências no trato da matéria.

1.2 divisão de competências

O Estado brasileiro segue o clássico esquema de organização tripartite: o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário (art. 2º da Constituição da República). Essa divisão, na classificação apresentada por Diogo Figueiredo Moreira Neto, diz respeito ao critério orgânico – em contraposição ao critério funcional. O autor explica que:

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Desse modo, convencionalmente, são poderes orgânicos: o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário, e poderes funcionais: o poder legiferante ou normati-vo, o poder executante ou administrativo e o poder judicante ou jurisdicional.

Inexiste, todavia, qualquer correspondência rígida entre os clássicos poderes orgâni-cos e os poderes funcionais com idêntica raiz etimológica, pois, nos modelos reais, a distribuição de funções entre órgãos do Estado obedece apenas a critérios político--constitucionais, que expressam as altas definições organizativas próprias de cada Estado.

Como indicam as denominações, os poderes orgânicos dispõem-se articuladamente em órgãos, que são entes ou corpos despersonalizados aos quais se atribuem compe-tências para executar funções determinadas, e os poderes funcionais se desdobram em funções, que são atribuições ou conjunto de atribuições cometidas aos órgãos, para atuar em missões específicas.

Assim, esquematicamente, o poder orgânico pressupõe órgãos dotados de poder fun-cional, voltados ao desempenho de certas funções, que se manifestarão pela prática de seus atos próprios.

Konrad Hesse, nessa linha de ideias, arrola a “organização” do Estado como uma das tarefas fundamentais de uma Constituição. O jurista alemão registra que:

A necessidade do ordenamento jurídico não se apresenta apenas para a formação e conservação da unidade política, mas também para a ação e incidência dos órgãos estatais constituídos com esses fundamentos. Em tal medida, necessita-se de uma nor-matização da arquitetura do Estado e do cumprimento de suas tarefas. A necessidade de fixar essas competências de forma ordenada pela Constituição tem sido algo habi-tual. Trata-se de constituir órgãos a que confiar, em função de sua natureza objetiva, os diferentes, determinados e delimitados âmbitos de atuação estatal e as competên-cias correspondentes, necessárias ao cumprimento objetivo de tais tarefas: a Consti-tuição funda competências, criando, dessa maneira, poder estatal conforme o Direito com o alcance do respectivo mandato.

Pode-se dizer, assim, que a competência diz respeito às funções de certos órgãos da comunidade jurídica, particularmente dos Tribunais e das autoridades administrativas. Evidentemente que a multiplicidade de funções atribuídas hodier-namente à comunidade exige uma divisão de trabalho. Não basta, pois, dizer que ao Poder Judiciário é atribuída a função jurisdicional. Nem mesmo seria completa tal afirmação, pois ocultaria o fato de que os demais Poderes orgânicos também exercem função jurisdicional, ainda que de forma atípica. Mas o que releva é frisar que o Judiciário, por sua vez, subdivide-se em órgãos, cada qual com competências predeterminadas pelo ordenamento jurídico.

Leone Pereira, nessa toada, define competência como “a medida, o limite, o fracionamento, a parcela da jurisdição”, ou seja, “a divisão dos trabalhos perante os órgãos encarregados do exercício da função jurisdicional”.

Daí já se inicia a separação entre o direito do trabalho e o previdenciário. Isso porque o Estado brasileiro, nessa divisão de competências, criou uma justiça

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trabalhista dedicada a processar e julgar as ações oriundas das relações de trabalho (arts. 92, II-A e IV, 111 a 116 da Constituição da República).

Já as ações relacionadas ao direito previdenciário foram inseridas no rol de competência de processo e julgamento das chamadas Justiças Comum, Federal e Estadual. No âmbito federal, as políticas públicas previdenciárias são promovidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal, de modo que a maior parte das ações que envolvem relações previdenciárias é de competência da Justiça Federal (e da Justiça Estadual, por meio de competência delegada, quando a Comarca do domicílio do autor não for sede de Vara do Juízo Federal), ex vi art. 109, I e § 3º, da CR. Esse dispositivo constitucional exclui as ações de acidentes de trabalho, que restam abrangidas pela competência residual da Justiça Estadual.

Essa dicotomia pode ser ilustrada pelo seguinte exemplo: um trabalhador conta trinta anos de trabalho formal, com registro em carteira e regular recolhi-mento de contribuições previdenciárias. Dispensado de seu emprego, consegue em seguida se reinserir no mercado. Trabalha agora como empregado (de forma subor-dinada, habitual e onerosa), mas sem registro em sua carteira de trabalho (CTPS) e, consequentemente, sem recolhimento de contribuições à Previdência. É despedido sem justa causa após cinco anos de labor informal.

Pois bem. O trabalhador tem, então, três pretensões: 1) a declaração do vín-culo de emprego que perdurou cinco anos; 2) a condenação do empregador ao pagamento de verbas trabalhistas não adimplidas; e 3) a averbação desses cinco anos de trabalho para fins previdenciários, a fim de que, somados ao seu tempo de contribuição anterior, possa gozar de aposentadoria por tempo de contribuição.

Qual a solução jurídica adequada a este trabalhador, considerada a separa-ção constitucional de competências entre as Justiças Comum e Trabalhista? Quanto às duas primeiras pretensões, não há dúvida, devem ser exercidas perante a Justiça do Trabalho, por se tratar de matéria diretamente afeta à relação de trabalho. O empregador é quem figurará no polo passivo da ação.

Sobre a terceira pretensão, oportuna o registro de Rogério Neiva:

Ainda sobre a competência e os aspectos tributários e previdenciários, outro tema relevante consiste no debate sobre o julgamento de lides envolvendo a averbação para fins previdenciários. A tese no sentido da competência tem como fundamento a compreensão de que a origem do direito postulado se relaciona com o contrato de trabalho e se sujeita à competência da Justiça Laboral. Porém, a compreensão que vem sendo adotada pelo TST é no sentido da ausência de competência. Assim, a título ilustrativo, destacam-se os seguintes precedentes:

“Mandado de segurança. Determinação dirigida ao INSS para proceder à averbação de tempo de serviço de reclamante. Incompetência [...] exorbita de sua competência o magistrado trabalhista que determina ao INSS que proceda à averbação de tempo de serviço do reclamante para fins previdenciários, mormente se sobreveio, na re-clamação trabalhista, acordo judicial, tornando desnecessária a produção de provas nesse sentido, exigida expressamente pela Lei nº 8.213/1991 [...].” (TST, RXOFROMS 556.925/1999.0, SBDI-2, Rel. Min. Ives Gandra, DJ 04.08.2000)

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“Recurso de revista. Incompetência da Justiça do Trabalho. Averbação de tempo de serviço de período de trabalho reconhecido em juízo para efeitos previdenciários. É da competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I e § 3º, da CF, a averbação do tempo de serviço relativo a vínculo empregatício reconhecido em juízo, para fins previdenciários, visto que tal competência não se encontra taxativamente prevista no art. 114 da CF, tampouco existe legislação em vigor que fixe a competência desta Justiça Especializada para determinar tal averbação [...].” (TST, RR 227/2007-043-15-00.6, 8ª T., Relª Min. Dora Maria da Costa, DEJT 04.09.2009)

Com efeito, a averbação de tempo de serviço para fins previdenciários con-substancia relação de natureza previdenciária, e não trabalhista. A pretensão é exer-cida não em face do empregador, mas do ente público previdenciário, o INSS. A ação que veicula tal pretensão se submete a princípios e normas específicos, assim como a exigência normativa sobre a forma de se provar tal tempo de serviço, como veremos, é tratada de forma especial pela legislação previdenciária.

Esse cenário denota a peculiaridade da divisão de trabalho dos órgãos juris-dicionais brasileiros. Ainda que a Justiça do Trabalho prolate sentença declaratória do vínculo de emprego, reconhecendo, no nosso exemplo, o labor prestado ao longo de cinco anos, e determine ao empregador a anotação competente na CTPS, essa sentença não valerá como título executivo contra o INSS, ou seja, o trabalhador não poderá, apenas por força dessa sentença, somar tal tempo de serviço para fins previdenciários.

Primeiro, porque a Autarquia Federal não integrou aquela ação. A sentença só faz coisa julgada às partes às quais ela é dada (art. 506 do Código de Processo Civil), de modo que não tem autoridade para impor obrigação a terceiros estranhos ao processo.

Ademais disso, nem mesmo se poderia cogitar, para suprir a falta de auto-ridade da sentença em relação ao INSS, da citação do ente público e de sua con-sequente integração ao polo passivo, já que, como vimos, falece competência à Justiça do Trabalho para julgar pretensão de natureza previdenciária.

Considerada essa divisão de competências, analisemos, então, qual a saída que o ordenamento jurídico admite para essa pretensão do trabalhador que perma-neceu de fora da apreciação do Juízo Trabalhista. Dito de outro modo: de posse da sentença trabalhista que declarou o tempo de serviço, o que deve ser feito para que tal período de labor seja reconhecido para fins previdenciários?

2 A EXIGÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA PARA O RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS

A comprovação de tempo de serviço deve ser realizada de acordo com o que prevê o ordenamento jurídico. No que se refere ao direito previdenciário, o trato do tema parte da análise da Lei nº 8.213/1991, em especial do § 3º do art. 55:

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Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

[...]

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclu-sivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

Logo se nota que o requisito basilar para que o Poder Público reconheça tempo de serviço para fins previdenciários é a existência de início de prova mate-rial. A questão foi, inclusive, decidida pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de julgamento de recurso repetitivo:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA – PREVIDENCIÁRIO – TRABALHADOR RURAL – TEMPO DE SERVIÇO – PROVA EXCLUSIVAMENTE TES-TEMUNHAL – IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO – 1. Prevalece o entendi-mento de que a prova exclusivamente testemunhal não basta, para o fim de obtenção de benefício previdenciário, à comprovação do trabalho rural, devendo ser acompa-nhada, necessariamente, de um início razoável de prova material (art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991 e Súmula nº 149 deste Superior Tribunal de Justiça). [...]. (REsp 1133863/RN, 3ª S., Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador Convocado do TJSP), Julgado em 13.12.2010, DJe 15.04.2011)

A única exceção à exigência de início de prova material se verifica nas ex-cepcionais hipóteses de força maior ou caso fortuito, que se caracterizam, nos ter-mos do art. 142, § 2º, do Decreto nº 3.048/1999, diante da verificação de ocorrên-cia notória, tais como incêndio, inundação ou desmoronamento, que tenha atingido a empresa na qual o segurado alegue ter trabalhado, devendo ser comprovada me-diante registro da ocorrência policial feito em época própria ou apresentação de documentos contemporâneos dos fatos e verificada a correlação entre a atividade da empresa e a profissão do segurado.

E não há vício na norma previdenciária que positiva restrição nos meios de se provar determinado fato. A despeito da regra da atipicidade das provas no Direi-to brasileiro, a lei, em diversos casos, exige que a prova seja feita de determinada maneira. Note-se:

Indubitavelmente, a questão mais delicada no que concerne ao tempo de serviço diz respeito à sua prova. Relativamente aos meios probatórios admitidos, nosso CPC acolheu o princípio da liberdade objetiva dos meios de demonstração (art. 332). Vale dizer, são admitidos todos os meios, desde que cientificamente idôneos e moralmente legítimos. No que concerne à avaliação das provas, nosso CPC adotou o sistema da persuasão racional para a apreciação das provas (art. 131). Assim, o destinatário da prova tem liberdade para apreciá-la, salvo quando a lei excepciona. Exatamente esse tipo de tratamento diferenciado é dispensado no § 3º do art. 55, quando se cogita

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da comprovação do tempo laboral, pois aqui a prova, contrariando a regra geral, é tarifada.

Observe-se que o Supremo Tribunal Federal já apreciou o tema e, por mais de uma vez, julgou constitucional o art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios, valendo des-tacar a seguinte ementa:

APOSENTADORIA – TEMPO DE SERVIÇO – PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMU-NHAL – INADMISSIBILIDADE COMO REGRA – A teor do disposto no § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço há de ser revelado mediante início de prova documental, não sendo admitida, exceto ante motivo de força maior ou caso fortuito, a exclusivamente testemunhal. Decisão em tal sentido não vulnera os preceitos dos arts. 5º, incisos LV e LVI, 6º e 7º, inciso XXIV, da Constituição Federal. (RE 226.772, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 06.10.2000, p. 98)

Em acréscimo, os documentos que se apresentam como início de prova ma-terial devem ser contemporâneos aos fatos que pretendem comprovar. Isso porque o art. 62 do Decreto nº 3.048/1999 é expresso ao exigir a contemporaneidade dos documentos a serem apresentados para a comprovação do exercício de atividade laboral:

Art. 62. A prova de tempo de serviço, considerado tempo de contribuição na forma do art. 60, observado o disposto no art. 19 e, no que couber, as peculiaridades do segu-rado de que tratam as alíneas j e l do inciso V do caput do art. 9º e do art. 11, é feita mediante documentos que comprovem o exercício de atividade nos períodos a serem contados, devendo esses documentos ser contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar as datas de início e término e, quando se tratar de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado. (Redação dada pelo Decreto nº 4.079, de 2002)

Discute-se se a contemporaneidade do início de prova é exigência válida, na medida em que não consta expressamente da lei, positivando-se apenas por meio de decreto. Todavia, tem prevalecido o entendimento de que não há ilegalidade. A documentação contemporânea dos fatos a serem comprovados diz respeito à própria idoneidade da prova. Esse parece ser o entendimento doutrinário predomi-nante. Como explica Augusto Massayuki Tsutiya:

A justificação administrativa somente se processará quando baseada em início de prova material, contemporânea dos fatos. O segurado deverá juntar documentos, da época, que comprovem o exercício da atividade laboral. [...] A Instrução Normativa nº 95, de 07.10.2003, em alguns de seus artigos aponta os tipos de provas que podem ser apresentados. Não se aceitam provas exclusivamente testemunhais para a compro-vação do tempo de serviço para efeito de aposentadoria, exceto caso de força maior ou caso fortuito.

No mesmo sentido o posicionamento de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, para quem “a prova da atividade laborativa, conforme o Decreto nº 3.048/1999, art. 62, corresponde àqueles documentos que são obrigató-

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rios por lei nas relações de emprego, contemporâneos ao período que se pretende comprovar”.

Essa, portanto, é uma grande diferença de tratamento normativo entre o direi-to do trabalho e o previdenciário. Isso porque, em sede de reclamação trabalhista, não vige exigência dessa estirpe. É possível, por exemplo, que o trabalhador veja reconhecido o seu alegado tempo de serviço exclusivamente com base em prova testemunhal. Ou, ainda, que o trabalhador e o empregador celebrem acordo em audiência trabalhista, reconhecendo-se o tempo de serviço e anotando-se a CTPS sem que tenha havido nenhuma instrução probatória.

Devido a essas múltiplas possibilidades de reconhecimento do tempo de serviço em âmbito trabalhista, a força probante da sentença proferida pelo Juízo do Trabalho, para fins previdenciários, precisa ser apreciada de modo analítico e diferenciado.

3 A SENTENÇA TRABALHISTA: DISTINÇÃO ENTRE AS SENTENÇAS CONFORME A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA QUE LHES SERVIU DE FUNDAMENTO

Como adiantamos, o reconhecimento do tempo de serviço na Justiça do Tra-balho pode se dar de diversas formas, notadamente: a) a sentença homologa acordo entre as partes, independentemente de qualquer instrução probatória; b) a sentença reconhece o tempo de serviço por força de confissão ficta do empregador (o qual, por exemplo, não compareceu à audiência); c) a sentença reconhece o tempo de serviço apenas com base em prova testemunhal; d) a sentença reconhece o tempo de serviço após ampla instrução probatória, marcada pela produção de provas ma-teriais e testemunhais.

São situações bastante distintas, que gerarão, por consequência, tratamento diferenciado no âmbito previdenciário. Jefferson Luis Kravchychyn [et al.] refuta(m) essa diferenciação, pontuando, com apoio de julgado da Turma de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, que a desconsideração da sentença trabalhista, ain-da que meramente homologatória, como início de prova material, malfere a coisa julgada e consubstancia desrespeito à atividade jurisdicional.

Não concordamos com tal objeção. No julgamento mencionado pelos au-tores (TNU, PEDILEF 106826420104013600-MT, Relª Juíza Federal Simone dos Santos Lemos Fernandes, Julgamento em 14.6.2011, DOU 22.07.2011), a Turma registrou que há ofensa à coisa julgada porque “é dever de qualquer magistrado, no exercício de suas funções, analisar a regularidade de acordos que homologa, coibindo fraudes e conluios”.

Ocorre que o reconhecimento do tempo de serviço fictício, por meio de acordo, pode não decorrer de conluio direcionado a lesar o ente previdenciário. Imagine-se que o trabalhador, na realidade, trabalhou por um ano sem registro para determinado empregador. Ajuíza a ação reclamando o reconhecimento de cinco anos de trabalho e o pagamento de R$ 50.000,00 a título de verbas trabalhistas

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inadimplidas. O empregador, em audiência, sabe que não houve trabalho por cinco anos. No entanto, por motivos variados, resolve encerrar o quanto antes o litígio e propõe acordo de reconhecimento do quinquênio, anotação em CTPS e pagamento de R$ 15.000,00. Em um caso como esse, o magistrado não adentrará nas especifici-dades da real prestação do serviço pelo tempo alegado. Examinará aspectos formais e, se em termos, homologará o acordo sem mais delongas.

Além disso, não há nenhuma violação à coisa julgada porque: a) a autorida-de da sentença trabalhista não abrange o ente previdenciário, que não participou da relação jurídico-processual; b) o Juízo Trabalhista não tem competência para julgar questão previdenciária, de modo que a sentença que prolata não impõe nenhuma obrigação de índole previdenciária que pudesse ser violada ou inobservada; c) a lei impõe forma diferenciada de prova do tempo de serviço para fins previdenciários, forma essa não necessariamente observada no processo trabalhista que dá azo à sentença ali produzida, já que a autonomia científica de cada um desses ramos enseja a incidência de princípios e regras diversos.

O Tribunal Superior do Trabalho, inclusive, editou, no ano de 2000, a Orientação Jurisprudencial nº 57 da SDI-2, solidificando o seguinte entendimento: “Conceder-se-á mandado de segurança para impugnar ato que determina ao INSS o reconhecimento e/ou averbação de tempo de serviço”.

Dito isso, temos que, em regra, a sentença proferida na Justiça do Trabalho, por si só, não será admitida como prova para fins de concessão de benefício previ-denciário, especialmente se inexiste nos autos administrativos ou judiciais o início de prova material, conforme exigido pelo § 3º, art. 55, da Lei nº 8.213/1991. É ne-cessário que a sentença trabalhista tenha efetivamente apreciado provas da relação empregatícia. Veja-se:

O STJ, por seu turno, vem admitindo que a sentença proferida pela Justiça do Tra-balho é suficiente para o reconhecimento da atividade laboral, quando lastreada em provas da ocorrência da relação de emprego, mesmo quando o INSS não te-nha participado do processo de conhecimento, especialmente quando há execução das contribuições incidentes sobre os salários de contribuição. Nesse sentido: STJ, AgRg-AREsp 147.454/DF, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.05.2012.

De fato, o STJ e os demais Tribunais pátrios têm entendimento firme no sen-tido de que a sentença trabalhista só tem eficácia para fins de comprovar tempo de serviço nas hipóteses em que ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previden-ciária. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – PREVIDENCIÁRIO – RECONHE-CIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO POR MEIO DE SENTENÇA TRABALHISTA – MERO RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE TRABALHO POR PARTE DO RECLA-MADO – AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE PROVAS A SUBSIDIAR O PEDIDO – I – “A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Pre-

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cedentes das Turma que compõem a Terceira Seção” (EREsp 616.242/RN, 3ª S., Relª Min. Laurita Vaz, DJ 24.10.2005). II – In casu, a sentença trabalhista tão somente ho-mologou acordo firmado entre as partes, no qual o reclamado reconheceu relação de emprego do reclamante, não tendo sido juntado, porém, qualquer elemento que evi-denciasse, na ação trabalhista, que ele houvesse prestado serviço na empresa e no pe-ríodo alegado na ação previdenciária. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg-REsp 1128885/PB, 5ª T., Rel. Min. Felix Fischer, Julgado em 27.10.2009, DJe 30.11.2009)

PREVIDENCIÁRIO – TEMPO DE SERVIÇO – INÍCIO DE PROVA MATERIAL – SEN-TENÇA TRABALHISTA – CARACTERIZAÇÃO – ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM LA-BOR – COMPROVAÇÃO – NECESSIDADE – ENTENDIMENTO DA TERCEIRA SEÇÃO – PRECEDENTES – RESSALVA DO POSICIONAMENTO PESSOAL DO RELATOR – AGRAVO DESPROVIDO – I – A questão posta em debate restringe-se em saber se a sentença trabalhista constitui ou não início de prova material, pois as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS advieram por força desta sentença. II – Possuía entendimento no sentido de que o tempo de serviço anotado na CTPS, através de sentença trabalhista, detinha força probante material, não devendo, assim, ser considerado simples prova testemunhal. III – Não obstante, a eg. Terceira Seção pacificou entendimento de que a sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e no período alegados pelo trabalhador na ação previdenciária. IV – Com base nestas inferências, consideran-do a natureza colegiada deste Tribunal, impõe-se prestigiar o posicionamento acima transcrito, ficando ressalvado o pensamento pessoal deste Relator. V – Agravo interno desprovido. (STJ, AgRg-REsp 837.979/MG, 5ª T., Rel. Min. Gilson Dipp, Julgado em 10.10.2006, DJ 30.10.2006, p. 405)

PREVIDENCIÁRIO – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL – CAR-TEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL – ANOTAÇÕES FEITAS POR OR-DEM JUDICIAL – SENTENÇA TRABALHISTA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS – INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARAC-TERIZADO – 1. A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Precedentes das Turma que compõem a Terceira Seção. 2. No caso em apreço, não houve produção de qualquer espécie de prova nos autos da reclama-tória trabalhista, tendo havido acordo entre as partes. 3. Embargos de divergência aco-lhidos. (STJ, EREsp 616242/RN, 3ª S., Relª Min. Laurita Vaz, Julgado em 28.09.2005, DJ 24.10.2005, p. 170)

Previdenciário. Aposentadoria por tempo de contribuição. Sentença proferida em ação trabalhista. Necessidade de ação própria para comprovação da atividade labo-rativa na função e período alegado. Apelação e remessa oficial providas. 1. A senten-ça trabalhista que reconhece ao reclamante tempo de serviço sem provas materiais suficientes do exercício da atividade, necessariamente, não tem que ser aceita pelo INSS em ação para concessão de benefícios de natureza previdenciária, mormente não tendo a autarquia previdenciária sido parte na demanda em questão. 2. Necessi-dade de ação própria para se comprovar a atividade laborativa na função e período alegado. 3. Precedentes do STJ e desta Turma. 4. Apelação e remessa oficial providas. (TRF da 5ª Região, AC 2006.83.02.000164-4, 4ª T., Rel. Des. Federal Marcelo Navarro, Julgamento em 19.11.2007, DJ de 08.02.2008)

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Disso se conclui que a sentença trabalhista meramente homologatória de acordo não serve de início de prova material para os fins previdenciários de com-provação tempo de serviço, porque não se baseia em provas do efetivo labor. Ao re-vés, limita-se a homologar situação reconhecida pelo empregador, sem a realização de instrução probatória. Do mesmo modo, a sentença trabalhista ancorada apenas em prova testemunhal, ou a sentença que reconhece o tempo de serviço após decla-rar a confissão ficta, decorrente de revelia do empregador no processo trabalhista.

A Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015, que estabelece rotinas para agilizar e uniformizar o reconhecimento de direitos dos segurados e beneficiários da Previdência Social, traz relevantes considerações a esse respeito. Note-se:

Art. 71. A reclamatória trabalhista transitada em julgado restringe-se à garantia dos direitos trabalhistas e, por si só, não produz efeitos para fins previdenciários. Para a contagem do tempo de contribuição e o reconhecimento de direitos para os fins previstos no RGPS, a análise do processo pela Unidade de Atendimento deverá observar:

I – a existência de início de prova material, observado o disposto no art. 578;

II – o início de prova referido no inciso I deste artigo deve constituir-se de documentos contemporâneos juntados ao processo judicial trabalhista ou no requerimento admi-nistrativo e que possibilitem a comprovação dos fatos alegados;

[...]

§ 1º A apresentação pelo filiado da decisão judicial em inteiro teor, com informação do trânsito em julgado e a planilha de cálculos dos valores devidos homologada pelo Juízo que levaram a Justiça do Trabalho a reconhecer o tempo de contribuição ou homologar o acordo realizado, na forma do inciso I do caput, não exime o INSS de confrontar tais informações com aquelas existentes nos sistemas corporativos disponí-veis na Previdência Social para fins de validação do tempo de contribuição.

[...]

Art. 578. O início de prova material deve ser contemporâneo aos fatos alegados, ob-servadas as seguintes disposições:

I – o segurado deverá apresentar documento com a identificação da empresa ou equi-parada, referente ao exercício do trabalho que pretende provar, na condição de segu-rado empregado;

II – o empregado rural deverá apresentar também, documento consignando a ativida-de exercida ou qualquer outro elemento que identifique a condição rurícola;

III – deverá ser apresentado um documento como marco inicial e outro como marco final, e, na existência de indícios que tragam dúvidas sobre a continuidade do pe-ríodo, ou seja, o período entre o documento apresentado do marco inicial e final, poderão ser exigidos documentos intermediários; e

IV – a aceitação de um único documento está restrita à prova do(s) ano(s) a que ele se referirem.

Parágrafo único. Não se aplica o contido no inciso I deste artigo, para benefícios con-cedidos no valor de um salário mínimo para períodos até 31 de dezembro de 2010, na forma do art. 183 do RPS.

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Logo, a sentença trabalhista que reconhece o tempo de serviço só poderá ser aceita no âmbito previdenciário se o processo judicial trabalhista tiver se constituído de documentos contemporâneos, ou se o segurado apresentar tais documentos, em conjunto com a sentença trabalhista, no processo administrativo ou judicial previ-denciário.

Registre-se, por fim, que o citado § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 pres-creve que a comprovação do tempo de serviço só produz efeito quando baseada em início de prova material, e com isso quer dizer que não é admissível a prova exclu-sivamente testemunhal. Destarte, ainda que amparada em documentos contempo-râneos, a sentença trabalhista assume força probante de início de prova material, e não de prova plena e autossuficiente, ou seja, tal sentença deverá se somar a outros elementos de prova no processo administrativo ou judicial previdenciário – para que o tempo de serviço seja reconhecido para fins previdenciários.

4 HÁ ALTERNATIVAS POSSÍVEIS?

Apresentamos, em síntese, o cenário dicotômico da comprovação do tempo de serviço nos âmbitos trabalhista e previdenciário. Convém agora discutir, ainda que embrionariamente, sobre ser ou não viável uma alternativa ao equacionamento dessa questão.

Vale observar, antes, que nem sempre há necessidade de obtenção de sen-tença pelos dois Juízos. É que, se a pretensão for apenas a de averbação do tempo de serviço para fins previdenciários (v.g., cômputo do tempo para a concessão de apo-sentadoria por tempo de contribuição), a demanda pode ser submetida diretamente ao INSS e, em caso de resistência, judicializada no foro previdenciário.

Claro que o trabalhador tem direito subjetivo a que o empregador anote corretamente sua CTPS, bem como tem direito ao reconhecimento das obrigações decorrentes da relação de emprego ilegalmente mantida na informalidade pelo em-pregador. São pretensões que envolvem a relação de trabalho e, como tal, podem ser normalmente submetidas ao crivo da Justiça do Trabalho.

O que se quer dizer é que uma proposta de aperfeiçoamento do sistema no trato do tema só faz sentido em relação aos casos em que o trabalhador tem, a um só tempo, pretensões de natureza trabalhista e previdenciária, e isso nem sempre ocorre. Note-se a sugestão de Jefferson Luis Kravchychyn [et al.]:

Mas para os casos de cômputo de tempo de contribuição como segurado emprega-do, com datas de serviço antigas, nos quais se tem tanto prova documental quanto testemunhal para a averbação do tempo, o ingresso na Justiça do Trabalho torna-se desnecessário, sendo mais prático o ingresso direto na Justiça Federal ou Estadual com vistas à solicitação da concessão do benefício comum ou acidentário, respectivamen-te. Nesse caso, intenta-se uma ação de averbação de tempo de contribuição cumulada com pedido de concessão de benefício previdenciário/acidentário.

Voltemos, pois, ao exemplo inicialmente utilizado, em que o trabalhador, dispensado de emprego em relação ao qual não houve registro, pretende que o

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empregador anote sua CTPS, pague verbas trabalhistas não adimplidas na época própria e pretende também que esse tempo de serviço seja averbado para que possa gozar de aposentadoria por tempo de contribuição.

Aqui, sem atalhos, não se vislumbra alternativa que não passe pela pro-mulgação de emenda constitucional. É dizer, só podemos falar em mudança de constitutione ferenda. Isso porque, como pudemos constatar, a delimitação das competências dos órgãos jurisdicionais, no Brasil, é positivada no nível constitucio-nal. A Lei Maior atribuiu a órgãos judiciais distintos a competência para o processo e julgamento das causas trabalhistas e previdenciárias.

Feita essa ressalva, poderíamos cogitar de alteração constitucional que atri-buísse ao Juízo Trabalhista a competência para processar e julgar as causas que envolvem pretensão de averbação de tempo de serviço para fins previdenciários, sempre que tal pretensão fosse exercida cumuladamente com outra, oriunda de relação de trabalho, e assentada nos mesmos fatos jurídicos constitutivos.

Isso exigiria alterações constitucionais e legais, a exemplo da inserção dessa competência adicional e condicionada da Justiça do Trabalho no rol do art. 114 da CR, além alterações legislativas correspectivas, incluindo-se a prescrição de que a prova do tempo de serviço, para fins previdenciários, submete-se aos critérios pre-vistos pela legislação previdenciária.

Todavia, remanesceria ainda relevante questão concernente à necessidade de prévia provocação da Administração, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito por ausência de interesse processual. É que o STF consolidou o entendimento de que “a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise” (RE 631240, Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, Julgado em 03.09.2014, publicação em 10.11.2014).

Então, a demanda perante o Juízo Trabalhista – contra o empregador e con-tra o INSS – só poderia ser apresentada caso o segurado tivesse, antes, requerido a averbação do tempo de serviço – e eventualmente a concessão do benefício – em sede administrativa e tivesse seu requerimento indeferido.

Evidentemente que isso inviabiliza o próprio uso da sentença como início de prova material, já que, antes da judicialização, o trabalhador deverá apresentar prova documental do vínculo empregatício ao INSS.

Mas não parece que essa exigência de prévio requerimento impeça a mudan-ça de competência ora vislumbrada. Vale notar que a já mencionada Instrução Nor-mativa INSS/PRES nº 77/2015 admite que a comprovação do vínculo de emprego, urbano ou rural, seja feita por meio de diversos tipos de documentos, como recibos de pagamento contemporâneos ao fato alegado, com a necessária identificação do empregador e do empregado, ou mesmo outros documentos contemporâneos que possam vir a comprovar o exercício de atividade junto à empresa (art. 10, I, g e i).

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Portanto, caberia ao segurado instruir seu requerimento administrativo com os documentos que tivesse e, caso indeferido o benefício pela autarquia, ajuizar a ação, no Juízo trabalhista, contra o empregador e contra o INSS.

Em acréscimo, seria mesmo possível se pensar na hipótese de competência concorrente para processo e julgamento, de maneira que a faculdade de apresentar a demanda contra o empregador e contra o INSS perante a Justiça do Trabalho não excluiria a possibilidade, hoje existente, de ajuizar a ação trabalhista apenas contra o empregador e, de posse da sentença trabalhista, provocar o INSS administrativa-mente. Indeferido o requerimento, poderia ainda levar a questão previdenciária à apreciação da Justiça Federal ou Estadual.

São caminhos que podem ser debatidos, embora não seja tarefa simples se chegar a um termo conciliatório. As dificuldades são muitas e envolvem questões variadas, entre as quais, como pudemos ver: a autonomia científica do direito do trabalho e do direito previdenciário, que leva ao tratamento legislativo diferenciado entre essas matérias; as diferenças que envolvem as relações jurídicas trabalhista e previdenciária, especialmente no que se refere à presença do Poder Público como ator processual nos conflitos de interesses de índole previdenciária, ao passo que, nas ações de natureza trabalhista, de regra, a lide se desenvolve entre particulares; e a divisão de competências prevista no plano constitucional, que submete as ações de índole trabalhista e previdenciária a órgãos judiciários diversos.

CONCLUSÃO

Pudemos constatar que a diferença de tratamento normativo entre o direito do trabalho e o direito previdenciário decorre da autonomia científica de que go-zam esses ramos do Direito. Como matérias autônomas, são governadas por princí-pios e regras específicos e métodos e processos singulares.

Isso fica evidente já no plano constitucional, na medida em que foram atri-buídas a órgãos jurisdicionais distintos as competências para processo e julgamento das ações trabalhistas e previdenciárias.

Também o reconhecimento do tempo de serviço para fins previdenciários submete-se a um regime normativo próprio, o qual exige expressamente o início de prova material, restando vedada a prova exclusivamente testemunhal (§ 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991). Difere, portanto, do reconhecimento do tempo de serviço no âmbito do direito do trabalho, em que não se encontra semelhante limitação legal.

É por isso que se mostra problemática a questão relativa ao valor probatório da sentença trabalhista no processo previdenciário em que se pretende o reconheci-mento de tempo de serviço. A sentença trabalhista, assim, será valorada de acordo com a instrução probatória que lhe serviu de fundamento.

As sentenças trabalhistas que homologam acordos independentemente de qualquer instrução probatória ou que reconhecem o tempo de serviço por força de

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confissão ficta do empregador ou mesmo que reconhecem o tempo de serviço ape-nas com base em prova testemunhal não terão, portanto, força de início de prova material para fins previdenciários, porque consubstanciam declaração despida de base documental, de sorte que não atendem à exigência normativa do mencionado § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991.

Já a sentença trabalhista que reconhece o tempo de serviço após ampla ins-trução probatória, marcada pela produção de provas materiais e testemunhais, essa sim deverá ser reputada como início de prova material idôneo no âmbito previ-denciário. Ainda assim, sua força probante será de início de prova, e não de prova plena e autossuficiente. Isso significa que tal sentença deverá se justapor a outros elementos probatórios, no processo administrativo ou judicial previdenciário, para que o tempo de serviço seja reconhecido para fins previdenciários.

Isso porque, como visto, os processos trabalhista e previdenciário são autô-nomos, de modo que a autoridade administrativa ou judicial previdenciária não se vincula ao julgamento da Justiça do Trabalho.

É possível pensar em caminhos alternativos, como uma alteração constitucio-nal que atribuísse ao Juízo Trabalhista a competência para processar e julgar as causas que envolvem pretensão de averbação de tempo de serviço para fins previdenciários, sempre que tal pretensão fosse exercida cumuladamente com outra, oriunda de rela-ção de trabalho, e assentada nos mesmos fatos jurídicos constitutivos.

Essa solução poderia ser prevista como hipótese de competência concorrente para processo e julgamento. Assim, poderia o trabalhador apresentar a demanda contra o empregador e contra o INSS perante a Justiça do Trabalho, sem prejuízo da faculdade de ajuizar a ação trabalhista apenas contra o empregador e, de posse da sentença trabalhista, provocar o INSS administrativamente. Indeferido o requeri-mento, poderia ainda levar a questão previdenciária à apreciação da Justiça Federal ou Estadual, como é feito atualmente.

Trata-se de proposta embrionária, a merecer maiores reflexões e debates. A autonomia científica do direito do trabalho e do direito previdenciário leva natu-ralmente ao tratamento legislativo diferenciado entre essas matérias, o que inclui a divisão de competências prevista no plano constitucional, que submete as ações de índole trabalhista e previdenciária, como visto, a órgãos judiciários diversos. Essas diferenças, enfim, sempre terão que ser consideradas no horizonte de toda a tentati-va de mudança e aperfeiçoamento normativo no trato do tema.

REFERÊNCIAS

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TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

Clipping Jurídico

Tribunal divulga novos valores dos limites de depósito recursal

O Tribunal Superior do Trabalho divulgou, por meio do Ato nº 360/2017, os novos va-lores referentes aos limites de depósito recursal, que passarão a vigorar a partir de 1º de agosto deste ano. De acordo com a nova tabela, o limite do depósito para a interposi-ção de recurso ordinário passa a ser de R$ 9.189, e, para recurso de revista, embargos, recurso extraordinário e recurso em ação rescisória, de R$ 18.378. Os novos valores estão previstos no art. 899 da CLT e foram reajustados pela variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC/IBGE no período de julho de 2016 a junho de 2017. (Fonte: Tribunal Superior do Trabalho)

Tribunal considera ilegal a investidura compulsória na função de depositário de bens

É inadmissível a investidura compulsória no encargo de depositário de bens penhora-dos, pois se trata de ato de vontade que depende da aceitação do nomeado. A interpre-tação, extraída da Orientação Jurisprudencial nº 89, da SDI-2, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), e da Súmula nº 319 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), foi acolhida pelo Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (TRT-PE), em julgamento de mandado de segurança (MS). O impetrante do MS atacou ato da primeira instância que o nomeou depositário dos bens da executada Cebel – Cerâmica Boa Esperança, do qual é sócio cotista minoritário. Dentre suas razões, alegou a ilegalidade da sua nomeação compulsória, pois tal dever depende da aceitação do nomeado. Além de haver recusado expressamente o compromisso, o autor do MS argumentou nunca ter exercido cargo de direção ou chefia, de ser totalmente alheio ao funcionamento da empresa e, ainda, que há nela diretoria constituída, com funcionários legalmente res-ponsáveis por seu acervo patrimonial. Em seu voto, o relator do acórdão, Desembar-gador André Genn, explicou que o art. 161 do novo Código de Processo Civil (NCPC) prevê que o depositário responde pelos danos que causar à parte, sem prejuízo de responsabilização penal e da imposição de sanção por ato atentatório à dignidade da justiça. Trata-se, portanto, de relevante múnus público que, dada a gravidade das consequências que poderão ser imputadas pelo mau exercício do encargo, poderá ser expressamente recusado, sublinhou. Além do mais, o relator esclareceu que, na prática habitual, designa-se automaticamente o depositário dos bens no ato da penhora, não se exigindo prévia anuência. No entanto, uma vez recusado o encargo [...], é inviável a manutenção da nomeação compulsória, consoante se infere dos termos da OJ 89 da SDI-2. Para complementar a fundamentação, também trouxe ao voto o teor da Súmula nº 319 do STJ: O encargo de depositários de bens penhorados pode ser expressamente recusado. Nesse contexto, a constatação da recusa expressa e justificada ao exercício deste encargo público obsta o aperfeiçoamento do depósito dos bens penhorados, cabendo ao Magistrado proceder à nova designação de depositário para a efetiva ga-rantia do Juízo, concluiu, eximindo o impetrante da incumbência e determinando que a autoridade apontada como coatora proceda à substituição. O voto seguiu o parecer do Ministério Público do Trabalho e foi acompanhado unanimemente pelos demais desembargadores do Pleno. (Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região)

Aumento da jornada de trabalho só é legal se tiver acréscimo de salário

A Juíza da 11ª Vara do Trabalho de Natal (RN) Aline Fabiana Campos Pereira não considerou ilícita o aumento da carga horária de uma ex-empregada da Sociedade

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Educacional do Rio Grande do Norte. Durante a audiência com a juíza, empregada e empregador reconheceram que o aumento da jornada de trabalho da trabalhadora, de 30 para 40 horas semanais, foi acompanhada de um aumento de salário, que passou de R$ 1.060,00 para R$ 1.377,00. Além disso, a Sociedade Educacional antecipou o pagamento do novo valor do salário para janeiro de 2017, mesmo a ex-empregada afirmando que só poderia se adequar à nova jornada de trabalho somente em abril de 2017. Assim, a juíza entendeu que não houve prejuízo à trabalhadora porque foi ob-servado o princípio da contrapartida, com majoração razoável de salário, antes mesmo de implementados os novos horários de trabalho. (Fonte: Tribunal Regional do Traba-lho da 21ª Região)

Fechamento da Edição: 26.07.2017

Tabelas Práticas

Tabela Única para Atualização de Débitos TrabalhistasAté 31 de julho de 2017 – Para 1º de agosto de 2017** TR prefixada de 1º julho/2017 a 1º agosto/2017 (Banco Central) = 0,06230%

Mês/Ano 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995

JAN 0,000890834 0,000271893 0,167471945 0,036466859 0,003528069 0,197360342 0,015698640 0,002998488 0,000238691 0,009270479 2,425396548

FEV 0,000890834 0,000233926 0,143371239 0,031299339 2,883351675 0,126423895 0,013058933 0,002389614 0,000188301 0,006554354 2,375480575

MAR 0,000890834 0,204552505 0,119855576 0,026533858 2,436292066 0,073170445 0,012204610 0,001902408 0,000148972 0,004686368 2,332261438

ABR 0,000637020 0,204777760 0,104668218 0,022872043 2,033463056 0,039697508 0,011248489 0,001530866 0,000118411 0,003303749 2,279829910

MAIO 0,000637020 0,203192856 0,086531264 0,019175087 1,832609083 0,039697508 0,010326346 0,001264343 0,000092350 0,002263307 2,203443146

JUN 0,000637020 0,200387432 0,070099857 0,016280427 1,666917491 0,037670817 0,009474581 0,001055290 0,000071767 0,001545552 2,134145314

JUL 0,000474133 0,197874427 0,059396592 0,013620368 1,335350074 0,034368047 0,008660495 0,000871780 0,000055171 2,893793153 2,074275500

AGO 0,000474133 0,195547413 0,057638614 0,010980626 1,037084558 0,031020893 0,007869600 0,000704811 0,042319051 2,755307224 2,014045470

SET 0,000474133 0,192151901 0,054192003 0,009100470 0,801828171 0,028052896 0,007029567 0,000571994 0,031737701 2,697811466 1,962921188

OUT 0,000373315 0,188902772 0,051279337 0,007338496 0,589796373 0,024858571 0,006019495 0,000456208 0,023575770 2,633575916 1,925578445

NOV 0,000373315 0,185557547 0,046967701 0,005766992 0,428568792 0,021861376 0,005025879 0,000364762 0,017267831 2,567961921 1,894247590

DEZ 0,000373315 0,179647155 0,041623273 0,004543800 0,303046806 0,018742607 0,003850658 0,000295857 0,012682015 2,495080616 1,867381571

Mês/Ano 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

JAN 1,842689531 1,681514814 1,531643657 1,420900674 1,343900984 1,316307111 1,286898196 1,251815559 1,196208208 1,174844619 1,142472367

FEV 1,819893545 1,669096734 1,514291392 1,413602246 1,341019133 1,314507550 1,283572460 1,245738845 1,194679019 1,172640056 1,139821143

MAR 1,802544058 1,658126534 1,507566139 1,401968710 1,337904492 1,314023989 1,282071154 1,240632402 1,194132106 1,171513060 1,138995371

ABR 1,787991595 1,647719572 1,494126471 1,385873179 1,334911620 1,311762510 1,279821229 1,235958009 1,192012707 1,168434236 1,136639118

MAIO 1,776273518 1,637548757 1,487107325 1,377481561 1,333177156 1,309737656 1,276811783 1,230808307 1,190971798 1,166098540 1,135668122

JUN 1,765876040 1,627209468 1,480381950 1,369591345 1,329863138 1,307349129 1,274133555 1,225111538 1,189133398 1,163159237 1,133528021

JUL 1,755171251 1,616644695 1,473144391 1,365347844 1,327023308 1,305445789 1,272121059 1,220028898 1,187043015 1,159688290 1,131336622

AGO 1,744961481 1,606076710 1,465082045 1,361354990 1,324973574 1,302266955 1,268751256 1,213397679 1,184730421 1,156709762 1,129359114

SET 1,732596006 1,596069355 1,459609967 1,357357572 1,322295924 1,297807688 1,265611274 1,208517685 1,182359790 1,152714454 1,126614681

OUT 1,721201651 1,585802867 1,453053788 1,353682324 1,320924804 1,295699585 1,263141832 1,204465862 1,180320197 1,149682741 1,124903703

NOV 1,709989600 1,575478755 1,440247111 1,350623163 1,319188752 1,291936175 1,259655107 1,200608307 1,179013849 1,147273466 1,122798455

DEZ 1,696172578 1,551685214 1,431463650 1,347929999 1,317611571 1,289450115 1,256333361 1,198479807 1,177664246 1,145064637 1,121360871

Mês/Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

JAN 1,119656753 1,103704787 1,085951181 1,078305929 1,070929880 1,058148425 1,055091727 1,053080101 1,044107897 1,025691641 1,005455557

FEV 1,117211178 1,102591170 1,083956701 1,078305929 1,070164713 1,057234974 1,055091727 1,051895666 1,043191975 1,024339513 1,003749183

MAR 1,116406249 1,102323306 1,083468057 1,078305929 1,069604240 1,057234974 1,055091727 1,051331101 1,043016748 1,023360157 1,003446143

ABR 1,114315793 1,101872640 1,081912267 1,077452586 1,068309449 1,056107052 1,055091727 1,051051522 1,041666748 1,021146312 1,001924220

MAIO 1,112900184 1,100821355 1,081421301 1,077452586 1,067915388 1,055867370 1,055091727 1,050569310 1,040549198 1,019816471 1,001924220

JUN 1,111023665 1,100011747 1,080935961 1,076903365 1,066241389 1,055373455 1,055091727 1,049935150 1,039350827 1,018255485 1,001159334

JUL 1,109964758 1,098752576 1,080227332 1,076269443 1,065054918 1,055373455 1,055091727 1,049447157 1,037469894 1,016179431 1,000623000

AGO 1,108336612 1,096653581 1,079093205 1,075032081 1,063747572 1,055221503 1,054871259 1,048342204 1,035084025 1,014534870 1,000000000

SET 1,106714169 1,094930161 1,078880666 1,074055764 1,061543807 1,055091727 1,054871259 1,047711482 1,033155124 1,011959433

OUT 1,106324742 1,092777390 1,078880666 1,073302306 1,060480146 1,055091727 1,054787931 1,046797627 1,031175268 1,010368103

NOV 1,105062761 1,090045735 1,078880666 1,072795946 1,059823055 1,055091727 1,053818418 1,045712178 1,029332762 1,008753090

DEZ 1,104411158 1,088284890 1,078880666 1,072435608 1,059139910 1,055091727 1,053600322 1,045207343 1,027999447 1,007314644

240 ...........................................................................................................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – TABELAS PRÁTICAS

ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO – TR – DIÁRIA (PRO RATA DIE) mês Julho ano 2017

DIA/MÊS TR DIÁRIA TR ACUMULADA ÍNDICE 1º JULHO - 0,000000% 1,00000000 02 JULHO - 0,000000% 1,00000000 03 JULHO 0,002966% 0,000000% 1,00000000 04 JULHO 0,002966% 0,002966% 1,00002966 05 JULHO 0,002552% 0,005104% 1,00005104 06 JULHO 0,002966% 0,008898% 1,00008898 07 JULHO 0,002966% 0,011864% 1,00011864 08 JULHO - 0,014830% 1,00014830 09 JULHO - 0,014830% 1,00014830 10 JULHO 0,002966% 0,014830% 1,00014830 11 JULHO 0,002966% 0,017796% 1,00017796 12 JULHO 0,002966% 0,020762% 1,00020762 13 JULHO 0,002966% 0,023729% 1,00023729 14 JULHO 0,002966% 0,026695% 1,00026695 15 JULHO - 0,029662% 1,00029662 16 JULHO - 0,029662% 1,00029662 17 JULHO 0,002966% 0,029662% 1,00029662 18 JULHO 0,002966% 0,032628% 1,00032628 19 JULHO 0,002966% 0,035595% 1,00035595 20 JULHO 0,002966% 0,038562% 1,00038562 21 JULHO 0,002966% 0,041529% 1,00041529 22 JULHO - 0,044496% 1,00044496 23 JULHO - 0,044496% 1,00044496 24 JULHO 0,002966% 0,044496% 1,00044496 25 JULHO 0,002966% 0,047463% 1,00047463 26 JULHO 0,002966% 0,050430% 1,00050430 27 JULHO 0,002966% 0,053398% 1,00053398 28 JULHO 0,002966% 0,056365% 1,00056365 29 JULHO - 0,059332% 1,00059332 30 JULHO - 0,059332% 1,00059332 31 JULHO 0,002966% 0,059332% 1,00059332 1º AGOSTO - 0,062300% 1,00062300

BAncO cenTrAL dO BrASiL, 04.07.2017.

LIMITES DE DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Novos valores para Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho (Ato nº 360/2017 do TST, DJe de 13.07.2017, vigência a partir de 01.08.2017)

Recurso Ordinário R$ 9.189,00

Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recursos em Ação Rescisória R$ 18.378,26

Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.

RST Nº 338 – Agosto/2017 – TABELAS PRÁTICAS ...............................................................................................................................241

INSS – JANEIRO/2017Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso, para pagamento de remuneração a partir de 1º de janeiro de 2017.

Salário-de-contribuição (R$) Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%) Até 1.659,38 8,00%

De 1.659,39 até 2.765,66 9,00%

De 2.765,67 até 5.531,31 11,00%

IR FONTE – TABELA PROGRESSIVA MENSAL PARA CÁLCULO A PARTIR DE ABRIL/2015 – MP 670/2015 – DOU 11.03.2015 Base de cálculo em R$ Alíquota % Parcela a deduzir do imposto em R$ Até 1.903.98 – – De 1.903,99 até 2,826,65 7,5 142,80 De 2.826,66 até 3.751,05 15,0 354,80 De 3.751,06 até 4.664,68 22,5 636,13 Acima de 4.664,69 27,5 869,36 Dedução por dependente 189,59

TABELA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO PARA APURAÇÃO DO SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO (ART. 33, DECRETO Nº 3.048/1999)Julho/2017 (Portaria MF nº 358, de 20.07.2017)

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/94 7,635143

ago/94 7,197533

set/94 6,824894

out/94 6,723371

nov/94 6,600600

dez/94 6,391594

jan/95 6,254618

fev/95 6,151882

mar/95 6,091575

abr/95 6,006878

maio/95 5,893719

jun/95 5,746045

jul/95 5,643337

ago/95 5,507844

set/95 5,452231

out/95 5,389178

nov/95 5,314771

dez/95 5,235712

jan/96 5,150725

fev/96 5,076606

mar/96 5,040816

abr/96 5,026240

maio/96 4,991301

jun/96 4,908833

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/96 4,849667

ago/96 4,797375

set/96 4,797184

out/96 4,790955

nov/96 4,780438

dez/96 4,767091

jan/97 4,725506

fev/97 4,652004

mar/97 4,632548

abr/97 4,579426

maio/97 4,552566

jun/97 4,538949

jul/97 4,507398

ago/97 4,503345

set/97 4,503345

out/97 4,476931

nov/97 4,461761

dez/97 4,425033

jan/98 4,394709

fev/98 4,356373

mar/98 4,355502

abr/98 4,345508

maio/98 4,345508

jun/98 4,335536

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/98 4,323430

ago/98 4,323430

set/98 4,323430

out/98 4,323430

nov/98 4,323430

dez/98 4,323430

jan/99 4,281472

fev/99 4,232795

mar/99 4,052848

abr/99 3,974160

maio/99 3,972968

jun/99 3,972968

jul/99 3,932853

ago/99 3,871299

set/99 3,815968

out/99 3,760686

nov/99 3,690927

dez/99 3,599851

jan/00 3,556111

fev/00 3,520205

mar/00 3,513529

abr/00 3,507216

maio/00 3,502662

jun/00 3,479351

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/00 3,447291

ago/00 3,371104

set/00 3,310847

out/00 3,288158

nov/00 3,276037

dez/00 3,263310

jan/01 3,238696

fev/01 3,222904

mar/01 3,211983

abr/01 3,186491

maio/01 3,150886

jun/01 3,137083

jul/01 3,091941

ago/01 3,042650

set/01 3,015510

out/01 3,004095

nov/01 2,961158

dez/01 2,938823

jan/02 2,933542

fev/02 2,927979

mar/02 2,922718

abr/02 2,919507

maio/02 2,899212

jun/02 2,867384

242 ...........................................................................................................................RST Nº 338 – Agosto/2017 – TABELAS PRÁTICAS

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/02 2,818345

ago/02 2,761730

set/02 2,698056

out/02 2,628659

nov/02 2,522463

dez/02 2,383280

jan/03 2,320623

fev/03 2,271335

mar/03 2,235786

abr/03 2,199278

maio/03 2,190298

jun/03 2,205072

jul/03 2,220616

ago/03 2,225066

set/03 2,211356

out/03 2,188378

nov/03 2,178791

dez/03 2,168383

jan/04 2,155450

fev/04 2,138343

mar/04 2,130036

abr/04 2,117964

maio/04 2,109316

jun/04 2,100912

jul/04 2,090460

ago/04 2,075310

set/04 2,064985

out/04 2,061481

nov/04 2,057982

dez/04 2,048966

jan/05 2,031496

fev/05 2,019982

mar/05 2,011133

abr/05 1,996558

maio/05 1,978553

jun/05 1,964799

jul/05 1,966963

ago/05 1,966373

set/05 1,966373

out/05 1,963428

nov/05 1,952106

dez/05 1,941621

jan/06 1,933886

fev/06 1,926565

mar/06 1,922144

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

abr/06 1,916968

maio/06 1,914670

jun/06 1,912184

jul/06 1,913524

ago/06 1,911421

set/06 1,911804

out/06 1,908750

nov/06 1,900577

dez/06 1,892628

jan/07 1,880966

fev/07 1,871794

mar/07 1,863966

abr/07 1,855800

maio/07 1,850988

jun/07 1,846188

jul/07 1,840482

ago/07 1,834611

set/07 1,823851

out/07 1,819302

nov/07 1,813861

dez/07 1,806095

jan/08 1,788744

fev/08 1,776486

mar/08 1,767472

abr/08 1,758503

maio/08 1,747321

jun/08 1,730706

jul/08 1,715098

ago/08 1,705208

set/08 1,701635

out/08 1,699086

nov/08 1,690633

dez/08 1,684233

jan/09 1,679363

fev/09 1,668683

mar/09 1,663526

abr/09 1,660206

maio/09 1,651125

jun/09 1,641277

jul/09 1,634412

ago/09 1,630662

set/09 1,629358

out/09 1,626756

nov/09 1,622861

dez/09 1,616878

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jan/10 1,613007

fev/10 1,598937

mar/10 1,587822

abr/10 1,576628

maio/10 1,565202

jun/10 1,558500

jul/10 1,560216

ago/10 1,561309

set/10 1,562403

out/10 1,554011

nov/10 1,539845

dez/10 1,524146

jan/11 1,515056

fev/11 1,500947

mar/11 1,492885

abr/11 1,483097

maio/11 1,472495

jun/11 1,464149

jul/11 1,460935

ago/11 1,460935

set/11 1,454825

out/11 1,448307

nov/11 1,443688

dez/11 1,435505

jan/12 1,428221

fev/12 1,420974

mar/12 1,415454

abr/12 1,412911

maio/12 1,403926

jun/12 1,396246

jul/12 1,392626

ago/12 1,386663

set/12 1,380451

out/12 1,371809

nov/12 1,362137

dez/12 1,354821

jan/13 1,344869

fev/13 1,332609

mar/13 1,325716

abr/13 1,317809

maio/13 1,310079

jun/13 1,305510

jul/13 1,301865

ago/13 1,303559

set/13 1,301477

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

out/13 1,297972

nov/13 1,290103

dez/13 1,283174

jan/14 1,274001

fev/14 1,266025

mar/14 1,257974

abr/14 1,247742

maio/14 1,238085

jun/14 1,230701

jul/14 1,227510

ago/14 1,225916

set/14 1,223713

out/14 1,217746

nov/14 1,213136

dez/14 1,206741

jan/15 1,199305

fev/15 1,181814

mar/15 1,168262

abr/15 1,150884

maio/15 1,142770

jun/15 1,131568

jul/15 1,122921

ago/15 1,116446

set/15 1,113662

out/15 1,108011

nov/15 1,099544

dez/15 1,087473

jan/16 1,077773

fev/16 1,061741

mar/16 1,051750

abr/16 1,047142

maio/16 1,040483

jun/16 1,030385

jul/16 1,025565

ago/16 1,019043

set/16 1,015894

out/16 1,015082

nov/16 1,013359

dez/16 1,012650

jan/17 1,011235

fev/17 1,007005

mar/17 1,004594

abr/17 1,001390

maio/17 1,000589

jun/17 0,997000

Resenha Legislativa

LEI

lei nº 13.467, de 13.07.2017 – dou de 14.07.2017

Essa Lei altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo De-creto-Lei nº 5.452/1943, e as Leis nºs 6.019/1974, 8.036/1990, e 8.212/1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho.

Fechamento da Edição: 26.07.2017

Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

ARTIGO DOUTRINÁRIO

• TendênciasdaReformaTrabalhistanaLógicaInerenteaoCapitalismo Gustavo Filipe Barbosa Garcia Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINAS

Assunto

Lei nº 13.467/2017 – A RefoRmA TRAbALhisTA

•A Desnaturação do Direito do Trabalho sob o Véu da “Reforma Trabalhista” (Cláudio Jannotti da Rocha e Ailana Ribeiro) ................................102

•A Dispensa Coletiva na Lei nº 13.467/2017 da Reforma Trabalhista (Enoque Ribeiro dos Santos) ............................................................................26

•A Reforma Trabalhista à Luz dos Direitos Fun-damentais – Análise da Lei nº 13.467, de 13 deJulho de 2017 (Ilse Marcelina Bernardi Lora) .......33

•A Reforma Trabalhista e Sua Aplicação nos Con-tratos em Vigor (Luís Rodolfo Cruz e Creuz e Daniela Wagner) .................................................75

•Contribuição Sindical e a Reforma Trabalhista(Sergio Pinto Martins) ...........................................17

•Os Limites das Negociações Coletivas Contem-porâneas Frente à Reforma Trabalhista (MárciaRegina Lobato) .....................................................87

•Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017): Mo-dificações Quanto ao Regime das Férias na Relação de Emprego (Gustavo Filipe BarbosaGarcia) ................................................................23

•Reforma Trabalhista e o Novo “Direito do Capi-tal” (Amauri Cesar Alves e Roberto das Graças Alves) ..................................................................47

•Reforma Trabalhista: o Princípio da Interven-ção Mínima na Autonomia da Vontade Cole-tiva: Realidade Ou Engodo? (Patricia OliveiraLima Pessanha) ..................................................111

•Sem uma Seção Especial de Justiça para a “Re-forma” Trabalhista (Jorge Luiz Souto Maior) ...........9

Autor

AiLAnA RibeiRo e cLáuDio JAnnoTTi DA RochA

•A Desnaturação do Direito do Trabalho sob o Véu da “Reforma Trabalhista” ............................102

AmAuRi cesAR ALves e RobeRTo DAs GRAçAs ALves

•Reforma Trabalhista e o Novo “Direito do Ca-pital” ...................................................................47

cLáuDio JAnnoTTi DA RochA e AiLAnA RibeiRo

•A Desnaturação do Direito do Trabalho sob o Véu da “Reforma Trabalhista” ............................102

DAnieLA WAGneR e Luís RoDoLfo cRuz e cReuz

•A Reforma Trabalhista e Sua Aplicação nos Con-tratos em Vigor ....................................................75

enoque RibeiRo Dos sAnTos

•A Dispensa Coletiva na Lei nº 13.467/2017 da Reforma Trabalhista .............................................26

GusTAvo fiLipe bARbosA GARciA

•Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017): Modificações Quanto ao Regime das Férias na Relação de Emprego .......................................23

iLse mARceLinA beRnARDi LoRA

•A Reforma Trabalhista à Luz dos Direitos Fun-damentais – Análise da Lei nº 13.467, de 13 de Julho de 2017 .................................................33

JoRGe Luiz souTo mAioR

•Sem uma Seção Especial de Justiça para a “Re-forma” Trabalhista .................................................9

Luís RoDoLfo cRuz e cReuz e DAnieLA WAGneR

•A Reforma Trabalhista e Sua Aplicação nos Con-tratos em Vigor ....................................................75

máRciA ReGinA LobATo

•Os Limites das Negociações Coletivas Contem-porâneas Frente à Reforma Trabalhista ................87

pATRiciA oLiveiRA LimA pessAnhA

•Reforma Trabalhista: o Princípio da Intervenção Mínima na Autonomia da Vontade Coletiva: Realidade Ou Engodo? ......................................111

RobeRTo DAs GRAçAs ALves e AmAuRi cesAR ALves

•Reforma Trabalhista e o Novo “Direito do Ca-pital” ...................................................................47

seRGio pinTo mARTins

•Contribuição Sindical e a Reforma Trabalhista.....17

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

JoRGe DA siLvA WAGneR

•Provas Periciais – Inspeção Judicial – Honorários Periciais e Assistentes Técnicos ..........................129

Rocco AnTonio RAnGeL Rosso neLson

•Da Flexibilização das Relações de Trabalho ......116

246 ......................................................................................................... RST Nº 338 – Agosto/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

Seção Especial

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Assunto

Tempo De seRviço

•Reconhecimento do Tempo de Serviço para Fins Previdenciários: a Sentença Trabalhista e a Exigência Normativa de Início de Prova Mate-rial (George Resende Rumiatto de Lima Santos) ..........................................................................218

Autor

GeoRGe ResenDe RumiATTo De LimA sAnTos

•Reconhecimento do Tempo de Serviço para Fins Previdenciários: a Sentença Trabalhista e a Exi-gência Normativa de Início de Prova Material ..........................................................................218

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Trabalhista

ResponsAbiLiDADe civiL

•Recurso de revista em face de decisão publicada antes da vigência da Lei nº 13.015/2014 – Liti-gância de má-fé – Juntada de documento com conteúdo falso – Alteração da verdade dos fatos – Configuração – Empregado que não cumpriu o período de carência para recebimento de au-xílio-doença previdenciário – Responsabilidade pelo pagamento dos salários do período de afas-tamento – Apelo fundado apenas em divergên-cia jurisprudencial – Diferenças salariais – Perí-odo após o afastamento decorrente de doença – Apelo desfundamentado – Indenização por danos morais – Assédio moral – Atraso no pa-gamento de salários – Matéria fática – Respon-sabilidade civil do empregador – Danos morais e materiais – Caracterização – Retenção da CTPS do empregado – Multa por atraso no pa-gamento dos salários – Ônus da prova – Juros de mora e correção monetária – Base de cálculo do imposto de renda (TST) .....................34375, 141

Previdenciário

AposenTADoRiA poR iDADe

•Constitucional – Previdenciário – Aposentado-ria por idade – Rurícola – Inexistência de razoá- vel início de prova material – Improcedênciado pedido(TRF 1ª R.) ..............................34409, 185

AuxíLio-DoençA

•Previdenciário – Auxílio-doença – Coisa jul-gada – ocorrência (TRF 4ª R.) .................34412, 198

benefício AssisTenciAL

•Previdenciário – Benefício assistencial (Loas) – portador de deficiência física e/ou mental – Ausência de estudo social – Sentença anulada – Retorno à origem (TRF 2ª R.) ...............34410, 189

•Previdenciário – Processo civil – Benefício as-sistencial – Litispendência configurada – Ine-xistência de novo quadro fático que justifique a propositura de uma nova ação – Manutenção da sentença que extinguiu o processo sem exa-me de mérito (TRF 5ª R.) ........................34413, 203

compeTênciA

•Conflito de competência – Juízos comum es-tadual e trabalhista – Reclamação trabalhista – Agente comunitário de saúde – Prévio processo seletivo – Contratação sob o regime da Conso-lidação das Leis do Trabalho (CLT) – Posterior publicação da Lei nº 11.350/2006 – Aplica-ção do regime celetista apenas em casos em que o estado ou município não tenha regime próprio, em sentido diverso – Precedentes do STJ – Competência da justiça do trabalho (STJ) ..............................................................34406, 171

conTRibuição pReviDenciáRiA

•Tributário e processual civil – Contribuição pre-videnciária – Adicional de transferência e adi-cional de insalubridade – Incidência – Reper- cussão geral reconhecida pelo Supremo Tribu-nal Federal – Sobrestamento – Desnecessidade (STJ) .......................................................34408, 181

fAToR pReviDenciáRio

•Previdenciário – Revisão – RMI – Cálculo – fa-tor previdenciário – incidência – aplicabilidade(TRF 3ª R.) .............................................34411, 193

pRovA

•Processual civil – Previdenciário – Ausência de início de prova material – Acordo traba-lhista – Reexame do contexto fático-probatório – Súmula nº 7/STJ (STJ) ...........................34407, 177

Tempo De seRviço

•Segundo agravo interno no recurso extraordiná-rio – Previdenciário – Conversão de tempo de serviço comum em especial – Trabalho pres-tado em período anterior à Lei nº 9.032/1995 – Controvérsia de índole infraconstitucional – Matéria com repercussão geral rejeitada pelo STF no ARE 1.029.712 – Tema nº 943 – agravo interno desprovido (STF) ........................34405, 168

EMENTÁRIO

Trabalhista

ATLeTA

•Atleta profissional de futebol – seguro de aci-dentes de trabalho – não contratação – inde-nização devida ......................................34376, 152

RST Nº 338 – Agosto/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ........................................................................................................247 AvuLso

•Avulso – Ogmo – regime de trabalho no porto – jornada de trabalho – características próprias – remuneração fixada em norma coletiva – validade .................................................34377, 153

cARTões De ponTo

•Cartões de ponto – estabelecimento com me-nos de dez empregados – dispensa – legalidade ..............................................................34378, 154

compeTênciA

•Competência – Justiça do Trabalho – local da prestação de serviço – irrelevância – alcance ..............................................................34379, 155

coopeRATivA

•Cooperativa de trabalho – contrato de parce-ria – odontologia – reconhecimento de vínculoempregatício – impossibilidade .............34380, 155

DAno moRAL

•Dano moral – empregado portador de doença grave – dispensa discriminatória – indenização– pagamento devido ..............................34381, 155

•Dano moral – faxineira – fibromialgia – hérnia de disco – condições de trabalho – agrava-mento – nexo concausal – indenização devida ..............................................................34382, 156

empReGADoR

•Empregador – meio ambiente do trabalho – saú-de do empregado – responsabilidade...... 34383, 156

enquADRAmenTo sinDicAL

•Enquadramento sindical patronal – atividade preponderante – submissão do empregador às normas coletivas – observação .............34384, 157

esTAbiLiDADe pRovisóRiA

•Estabilidade provisória – gestante – lapso de 10 meses entre a despedida e o ajuizamento da reclamatória – abuso do exercício do direito de ação – inocorrência ..........................34385, 157

execução

•Execução – desconsideração da personalida-de jurídica – responsável subsidiário – ina-plicabilidade ..........................................34386, 158

•Execução – insolvência do devedor principal – responsável subsidiário – prosseguimento ..............................................................34387, 159

•Execução – sentença coletiva – competência – inexistência de prevenção do juízo que julgouo mérito da ação – efeitos ......................34388, 159

fRAuDe

•Fraude à execução – venda do imóvel após oajuizamento da ação – configuração .....34389, 159

hoRAs exTRAs

•Horas extras – motorista – atividade externa – controle e fiscalização de jornada – Estatuto do Motorista – observação ..........................34390, 159

hoRAs in itinere

•Horas in itinere – dificuldade de acesso ao lo-cal de trabalho – requisitos preenchidos – pa-gamento devido .....................................34391, 160

JoRnADA De TRAbALho

• Jornada de trabalho – escala 12 x 36 – descum-primento do acordo coletivo – regime de com-pensação – descaracterização – horas extrasdevidas ..................................................34392, 160

• Jornada de trabalho – turno ininterrupto de reve-zamento – entrada antecipada – norma coletiva – limite de 15 minutos para tomar café e tro-car de uniforme não computados como tempoà disposição do empregador – efeitos ....34393, 161

moToRisTA

•Motorista carreteiro – prestação de serviços em diversos estados da federação – norma cole-tiva aplicável – efeitos ...........................34394, 162

pensão

•Pensão vitalícia – limitação a 65 anos – impos-sibilidade ...............................................34395, 163

poRTuáRio

•Portuário – avulso – prescrição bienal – apli-cabilidade ..............................................34396, 163

pRocesso Do TRAbALho

•Processo do trabalho – leilões sucessivos – li-mitação – ausência – efeitos ..................34397, 164

RecLAmAção TRAbALhisTA

•Reclamação trabalhista – pensionista de ex--funcionário da extinta Fepasa – complementa-ção – cabimento ....................................34398, 164

ReLAção De empReGo

•Relação de emprego – corretor de seguros – configuração ..........................................34399, 164

Rescisão Do conTRATo De TRAbALho

•Rescisão do contrato de trabalho – emprega-do portador do vírus HIV – dispensa discrimi-natória – configuração ...........................34400, 165

•Rescisão do contrato de trabalho – pedido dedemissão – prova por áudio – efeitos .....34401, 165

Rescisão inDiReTA

•Rescisão indireta – sucessivas alterações le-sivas nas regras de comissionamento – reco-nhecimento ...........................................34402, 165

248 ......................................................................................................... RST Nº 338 – Agosto/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

seGuRo DesempReGo

•Seguro-desemprego – atividades informais – re-cebimento do benefício – possibilidade .. 34403, 166

TeRceiRizAção

•Terceirização ilícita – serviços inerentes à ati-vidade-fim da instituição bancária – adminis-tração pública indireta – princípio da isonomia – observação .........................................34404, 166

Previdenciário

Ação AciDenTáRiA

•Ação acidentária – nexo entre doença e ativida-de laborativa – conversão de benefício – inca-pacidade laboral – não comprovação ....34414, 208

AposenTADoRiA poR iDADe

•Aposentadoria por idade rural – atividade com-provada – benefício devido ...................34415, 208

AposenTADoRiA poR Tempo De conTRibuição

•Aposentadoria por tempo de contribuição – contagem híbrida – comprovação do serviçorural – pagamento devido ......................34416, 209

AposenTADoRiA poR Tempo De seRviço

•Aposentadoria por tempo de serviço – rurícola sem registro – início de prova material corro-borada por testemunha – valoração – paga-mento devido ........................................34417, 210

AuxíLio-DoençA

•Auxílio-doença – conversão em aposenta-doria por invalidez – laudo judicial – incapa-cidade para o exercício de atividade laboral – benefício devido .................................34418, 211

benefício pReviDenciáRio

•Benefício previdenciário por incapacidade – valores recebidos a título de auxílio-doença no período – desconto – cabimento ............34419, 212

•Benefício previdenciário – revisão – alteração do teto pelas ECs 20/1998 e 41/2003 – bene-fício com DIB anterior à data da promulgação da CF/1988 – contradição – omissão – obs-curidade – inocorrência .........................34420, 212

compeTênciA

•Competência – auxílio-doença – síndrome do manguito rotador – ausência de alegação de incapacidade decorrente de exercício de ativi-dades laborativas ou acidente do trabalho – na-

tureza previdenciária – Justiça Federal – alcance ..............................................................34421, 213

conTRibuição pReviDenciáRiA

•Contribuição previdenciária – adicionais de horas extras, noturno, de insalubridade e de periculosidade e transferência – incidência ..............................................................34422, 213

pensão

•Pensão por morte – sentença homologatória de acordo trabalhista – início de prova material do vínculo empregatício do de cujus – produçãode prova testemunhal – necessidade ......34423, 213

•Pensão mensal vitalícia – soldado da borracha – cabimento ...........................................34424, 213

•Pensão por morte – filha inválida – requisitos – preenchimento – termo inicial ...............34425, 214

•Pensão por morte – marido aposentado – revi-são da RMI – observação .......................34426, 214

seRviDoR

•Servidor público estadual falecido – filha in-válida – dependência econômica – pretensão ao recebimento do benefício de pensão pormorte – possibilidade .............................34427, 215

Tempo De seRviço

•Tempo de serviço especial – frio – ruído – hi-drocarbonetos – uso de EPI – conversão – pos-sibilidade ...............................................34428, 215

•Tempo de serviço – rurícola sem registro – averbação – cabimento ..........................34429, 216

•Tempo de serviço especial – motorista de ca-minhão de carga – agentes químicos – reco-nhecimento – benefício devido ..............34430, 217

CLIPPING JURÍDICO

•Aumento da jornada de trabalho só é legal se tiver acréscimo de salário ..................................237

•Tribunal considera ilegal a investidura com-pulsória na função de depositário de bens .........237

•Tribunal divulga novos valores dos limites dedepósito recursal ...............................................237

TABELAS ...............................................................239

RESENHA LEGISLATIVA ........................................243

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ........................244

ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ......................245