Introdução Ao Estudo Do Direito Dos Estrangeiros

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRORespeitar os Direitos do Homem

    Alexandra Chcharo das Neves

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    Biblioteca Nacional de Portugal - Catalogao na Publicao

    PROMOTOROBSERVATRIO DA IMIGRAO

    www.oi.acidi.gov.pt

    AUTORAALEXANDRA CHCHARO DAS NEVES

    [email protected]

    EDIOALTO-COMISSARIADO PARA A IMIGRAOE DILOGO INTERCULTURAL (ACIDI, I.P.)

    RUA LVARO COUTINHO, 14, 1150-025 LISBOA

    TELEFONE: (00351) 21 810 61 00 FAX: (00351) 21 810 61 17E-MAIL: [email protected]

    EXECUO GRFICAPros-Promoes e Servios Publicitrios, Lda.

    PRIMEIRA EDIO250 EXEMPLARES

    ISBN

    978-989-685-041-8

    DEPSITO LEGAL338890/12

    LISBOA, DEZEMBRO 2011

    NEVES, Alexandra

    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem. (Teses ; 36)ISBN 978-989-685-041-8

    CDU342 00 341 316 314

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    Dissertao de Mestrado em Cincias Jurdico-Processuais

    Autora: Alexandra Chcharo das Neves

    Orientadora: Professora Doutora Ana RoqueUniversidade Autnoma de Lisboa

    2009

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    ndicePREFCIO 11

    NOTA PRVIA 13

    RESUMO 16

    ABSTRACT 17

    INTRODUO 18

    CAPTULO I BREVE PERSPECTIVA HISTRICA DA EVOLUO DA TUTELA

    JURDICA DOS ESTRANGEIROS 261. NAS CIVILIZAES CLSSICAS 26

    2. NA IDADE MDIA 29

    3. A PARTIR DO RENASCIMENTO 31

    4. O SC. XX E XXI 34

    CAPTULO II ESBOO DA EVOLUO DA CONDIO JURDICA CONSTITUCIONALDO ESTRANGEIRO EM PORTUGAL 36

    CAPTULO III O PRINCPIO DA EQUIPARAO NAS CONSTITUIES EM VIGORNOS PASES LUSFONOS E EM ALGUNS PASES EUROPEUS 39

    1. NOS PASES LUSFONOS 39

    1.1. Na Repblica de Cabo Verde 39

    1.2. Na Repblica Democrtica de So Tom e Prncipe 40

    1.3. Na Repblica da Guin-Bissau 40

    1.4. Na Repblica Federativa do Brasil 41

    1.5. Na Repblica de Angola, de Moambique e de Timor-Leste 41

    2. NA EUROPA 42

    2.1. Na Itlia 43

    2.2. Na Alemanha e em Frana 43

    2.3. Em Espanha 43

    CAPTULO IV A CIDADANIA PORTUGUESA E EUROPEIA E O CIDADO ESTRANGEIRO 45

    1. INTRODUO 45

    2. O DIREITO CIDADANIA NO DIREITO INTERNACIONAL 46

    3. TRAOS GERAIS DO DIREITO CIDADANIA PORTUGUESA 46

    4. A CIDADANIA EUROPEIA 49

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    CAPTULO V ESBOO DA CONDIO JURDICA DO ESTRANGEIRO NO DIREITOINTERNACIONAL 52

    CAPTULO VI DA TITULARIDADE DE DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAISPELO CIDADO ESTRANGEIRO 57

    1. OS PRINCPIOS DA UNIVERSALIDADE, DA IGUALDADE E DA EQUIPARAO, NODIREITO INTERNO 57

    1.1. A concepo universalista dos direitos fundamentais 57

    1.2. A igualdade e a equiparao de direitos 58

    2. OS DIREITOS ABRANGIDOS PELO PRINCPIO DA EQUIPARAO E O SEU REGIMEJURDICO 61

    3. AS EXCEPES CONSTITUCIONAIS AO PRINCPIO DA EQUIPARAO 643.1. Generalidades 64

    3.2. A participao poltica dos estrangeiros 693.2.1. As limitaes admitidas pelo Direito Internacional 693.2.2. As limitaes resultantes do ordenamento jurdico interno 71

    4. O EXERCCIO DAS FUNES PBLICAS QUE NO TENHAM CARCTERPREDOMINANTEMENTE TCNICO 76

    4.1. O DIP e a Constituio da Repblica Portuguesa 76

    4.2. O regime de vinculao dos trabalhadores que exercem funes pblicas 79

    5. OS DIREITOS E DEVERES RESERVADOS PELA CONSTITUIO E PELA LEIEXCLUSIVAMENTE A PORTUGUESES 81

    CAPTULO VII LIMITAES DE DIREITOS EM MATRIA DE ENTRADA,PERMANNCIA, SADA E AFASTAMENTO DO TERRITRIO NACIONAL 84

    1. AS LIMITAES ADMITIDAS PELO DIREITO INTERNACIONAL 84

    2. AS LIMITAES ADMITIDAS PELO DIREITO INTERNO 86

    2.1. Generalidades 86

    2.2. Dos estrangeiros de Estados no membros da UE 88

    2.3. Dos estrangeiros de Estados-membros da UE 94

    2.4. Particularidades em matria de afastamento do territrio nacional 962.4.1. Princpios gerais para a expulso 962.4.2. O processo administrativo e judicial de expulso 1002.4.3. As garantias fundamentais do processo de expulso 1042.4.4. O efeito do recurso e da impugnao judicial 105

    2.5. Particularidades em matria de extradio 106

    CAPTULO VIII AS LIMITAES EM MATRIA DO DIREITO LIBERDADE 110

    CAPTULO IX AS LIMITAES EM MATRIA DO DIREITO FAMLIA 115

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    1. OS PRINCPIOS FUNDAMENTAIS DA PROTECO DA FAMLIA 115

    2. O DIREITO AO REAGRUPAMENTO FAMILIAR 117

    2.1. O conceito de famlia 119

    3. A EXPULSO DO TERRITRIO E O DIREITO A MANTER OS LAOS FAMILIARES 124

    CAPTULO X A CLUSULA DE RECIPROCIDADE E OUTRAS DISCRIMINAES 128

    1. A INCONSTITUCIONALIDADE DAS CLUSULAS DE RECIPROCIDADEINTRODUZIDAS PELA LEI ORDINRIA 128

    2. DISCRIMINAES QUANTO AO GOZO DA GENERALIDADE DOS DIREITOS CIVIS 130

    3. DISCRIMINAES NO ACESSO AO DIREITO E TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA 1313.1. Os princpios gerais 131

    3.2. O regime de concesso de apoio judicirio 133

    3.3. Dos actos processuais em lngua estrangeira 1423.3.1. No processo civil 1423.3.2. No processo penal 1503.3.3. Na Lei N. 23/07, de 4.7 164

    4. DISCRIMINAES QUANTO AO DIREITO SADE 166

    4.1. O direito sade como direito do ser humano 166

    4.2. Um direito universal com limitaes 1695. DISCRIMINAES QUANTO AO DIREITO SEGURANA SOCIAL 173

    5.1. O direito fundamental segurana social 173

    5.2. O direito da segurana social 174

    5.3. As discriminaes 179

    6. DISCRIMINAES NA PROTECO DA PROPRIEDADE 184

    6.1. Princpios gerais na proteco do direito de propriedade 184

    6.2. Da propriedade industrial 186

    6.3. Dos direitos de autor e direitos conexos 1887. DISCRIMINAES NA LIBERDADE DE ESCOLHA DE PROFISSO 190

    7.1. Princpios gerais da condio jurdica do estrangeiro no direito laboral 1907.1.1. No direito internacional e comunitrio 1907.1.2. No ordenamento jurdico interno 191

    7.2. A liberdade de escolher como profisso o exerccio da advocacia 196

    7.3. A liberdade de escolher o exerccio da actividade de segurana privada 198

    CONCLUSES 201

    1. A EVOLUO DA PROTECO JURDICA DOS ESTRANGEIROS 202

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    2. PRINCPIOS GERAIS DA CONDIO JURDICA DOS ESTRANGEIROSNA ORDEM INTERNA 202

    3. AS LIMITAES QUE A CONSTITUIO ADMITE AO PRINCPIO DA EQUIPARAO 2034. POTENCIAIS INCONSTITUCIONALIDADES EXISTENTES NO ORDENAMENTOJURDICO INTERNO 204

    5. POR LTIMO 210

    BIBLIOGRAFIA 211

    ANEXO I BREVSSIMA VISO SOCIAL 217

    1. PESQUISA JUNTO DO ACIDI 218

    1.1.Questionrio 2181.2.Entrevista 219

    2. PESQUISA JUNTO DO SEF 220

    2.1.Questionrio 220

    2.2. Resposta 220

    PARECERES DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERALDA REPBLICA JURISPRUDNCIA 223

    Do Tribunal Constitucional 223

    Do Supremo Tribunal de Justia 225

    Do Tribunal da Relao de Coimbra 225

    Do Tribunal da Relao do Porto 226

    Do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem 226

    Do Tribunal de Justia Europeu 226

    Do Supremo Tribunal Administrativo 227

    Legislao nacional mais relevante 228

    Alguns instrumentos internacionais e comunitrios 235

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    ABREVIATURAS

    AAFDL - Associao Acadmica da Faculdade de Direito de LisboaAc.- AcrdoACIME - Alto Comissariado para a Integrao das Minorias tnicasACIDI - Alto Comissariado para a Integrao e Dilogo InterculturalAR - Assembleia da RepblicaArt. - ArtigoBFDC - Boletim da Faculdade de Direito de CoimbraBMJ- Boletim do Ministrio da JustiaCC- Cdigo CivilCDFUE - Carta dos Direitos Fundamentais da Unio Europeia

    CEDHLF - Conveno Europeia dos Direitos do Homem e Liberdades FundamentaisCEE- Comunidade Econmica EuropeiaCGA - Caixa Geral de AposentaesCP - Cdigo PenalCPA - Cdigo de Procedimento AdministrativoCPC- Cdigo de Processo CivilCPLP - Comunidade dos Pases de Lngua PortuguesaCPP - Cdigo de Processo PenalCPTA - Cdigo de Processo dos Tribunais AdministrativosCRP - Constituio da Repblica PortuguesaCT - Cdigo do TrabalhoDL - Decreto-LeiDR - Dirio da RepblicaDIP - Direito Internacional PblicoDUDH - Declarao Universal dos Direitos do HomemEEE - Espao Econmico EuropeuEOA - Estatuto da Ordem dos AdvogadosFDL - Faculdade de Direito de LisboaGNR - Guarda Nacional Republicana

    LE - Lei 23/07, de 4.7MDE - Mandado de Deteno EuropeuMP - Ministrio PblicoOA - Ordem dos AdvogadosOIT - Organizao Internacional de TrabalhoOMC - Organizao Mundial do ComrcioOrg. - OrganizaoPg. ou p. - PginaPGR - Procuradoria Geral da RepblicaPIDCP - Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polticos

    PIDESC - Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e CulturaisProc. - Processo

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    PSP - Polcia de Segurana PblicaRC - Relao de Coimbra

    RCT - Regulamento do Cdigo de TrabalhoRLJ - Revista de Legislao e JurisprudnciaROA - Revista da Ordem dos AdvogadosSEF - Servio de Estrangeiros e FronteirasSIS - Sistema de Informaes SchengenSIS do SEF - Sistema Integral de Informaes do SEFSNS - Servio Nacional de SadeSS. - SeguintesTEDH - Tribunal Europeu dos Direitos do HomemTC - Tribunal ConstitucionalTJE - Tribunal de Justia EuropeuTUE - Tratado da Unio EuropeiaUAL - niversidade Autnoma de LisboaUE - Unio Europeia

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    PREFCIO

    Esta obra, que tem como base a dissertao de mestrado da autora, incidesobre uma questo premente da actualidade: o estatuto do estrangeiroface ao contexto dos direitos humanos, no quadro do Estado de direitodemocrtico.

    Num mundo globalizado e em constante mutao, o direito tem que sereinventar para acompanhar a vida social, sendo certo que esta, por suavez, instabilizada de modo crescente por convulses econmicas, cultu-rais, polticas, sociais, climticas e ambientais cada vez mais constantes.

    A fraca valia de solues convencionais tem que ser compensada pela es-trutura mais densa da normatividade, pese embora a dificuldade de traarlinhas de fora em matrias que obrigam inter-relao harmoniosa detessituras jurdicas distintas, fruto de culturas bem diversas.

    Partindo de tal realidade, a autora procura, nesta obra, que resulta de umestudo transversal do direito interno e comunitrio, oferecer uma respostaa duas questes essenciais: se a igualdade e a dignidade do estrangeiroso valores ainda por conquistar na ordem jurdica portuguesa, por um

    lado, e se os estrangeiros esto equiparados aos portugueses no gozo eno exerccio de direitos, por outro.

    Assim, no processo de densificao e reflexo, patente ao longo de toda aobra, visvel que o fio condutor no residiu somente nos direitos humanostal como se manifestam tendencialmente na ordem jurdica portuguesa,assente e estvel, mas trouxe tambm discusso, noes menos con-solidadas e ainda menos consensualizadas de que so claro exemploa natureza e o mbito das limitaes que recaem sobre os estrangeiros,em matria de entrada, permanncia e afastamento do territrio nacional,

    da sua liberdade individual e do seu direito de constituir e manter a suafamlia. Nesta linha, assinalou algumas especificidades na expulso e naextradio dos estrangeiros e procurou aferir de que modo a proteco dafamlia poder constituir uma limitao expulso.

    de assinalar, a preocupao com a apreciao crtica da constitucio-nalidade de clusulas de reciprocidade, a partir do seu contedo, valor eadmissibilidade em diferentes reas do ordenamento jurdico, assim comode outras potenciais discriminaes, que ocorrem no gozo de direitos ci-vis, no acesso ao direito, sade, segurana social, na proteco dapropriedade industrial e intelectual, no direito escolha de profisso, a ser

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    assistido por intrprete e traduo de peas processuais para lngua queo estrangeiro domine.

    A concluso alcanada , em sntese, a de que o legislador ordinrio con-sagrou limitaes ao exerccio e gozo de direitos pelo estrangeiro, criandodiferenciaes injustificadas, arbitrrias e inconstitucionais entre estes eos cidados portugueses. E tambm este desassombro tico, que tor-na toda a dissertao um contributo inovador para o estudo do estatutojurdico do cidado estrangeiro e para a ponderao das suas eventuaisfragilidades.

    A concluir, uma palavra devida aos mritos pessoais, acadmicos e pro-fissionais da autora: com efeito, a par de uma vivacidade acutilante e deuma inteligncia rpida, por vezes a raiar a impacincia, a capacidade detrabalho, o rigor metdico e o empenho de que tem dado sobejas provastornam a sua pertena ao mundo acadmico uma mais-valia inegvel.Assim, a leitura desta obra comporta um contributo decisivo para o re-foro de direitos de cidadania essenciais, definidores de uma civilizaoverdadeiramente humanizada.

    Restar, ao leitor, aguardar pelos seus prximos passos neste caminho

    de construo, agora j num patamar diverso, onde a investigao e acoragem de apontar problemas e propor solues continuaro, certamen-te, a ser a marca de gua de quem faz do estudo uma ferramenta para aactividade, e desta um alimento constante para as ideias.

    Ana Roque

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    NOTA PRVIA

    O estudo que se agora se publica sob o ttulo Os direitos do estrangei-ro Respeitar os direitos do homem, corresponde, na sua essncia, dissertao apresentada para obteno de grau de mestre, na vertente deCincias Jurdico-Processuais, apresentada na Universidade Autnoma deLisboa, em que foi orientadora a Senhora Professora Doutora Ana Roque.

    As provas pblicas, ocorreram na mesma universidade, no dia 3 de Marode 2009, tendo como arguentes a Senhora Professora Doutora AndreiaSofia Pinto Oliveira e o Senhor Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia.

    O texto original da dissertao, sofreu algumas alteraes, nomeada-mente na sequncia das crticas formuladas durante a discusso pblica,resultantes de alteraes legislativas e de leituras posteriores.

    Sinceros agradecimentos Senhora Professora Doutora Ana Roque, mi-nha orientadora, pelo permanente entusiasmo e apoio a este trabalho einteira disponibilidade s minhas variadas questes. Paula, pela suaamizade mas, principalmente, por, sem o saber, ter-me despertado paraas questes aqui discutidas. Ao Joo, pela sua generosa amizade e pelo

    seu incentivo, crticas e sugestes. Tambm ao ACIDI e ao SEF, que co-laboraram para um melhor conhecimento da realidade social e, claro, Universidade Autnoma de Lisboa.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    Aos meus pais e aos meus filhos- o meu apoio, amor e alegria

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    RESUMO

    A sociedade portuguesa depara-se, desde a descolonizao, mas es-sencialmente depois da queda do muro de Berlim, com uma emigraocrescente.

    Esta nova realidade social, aliada adeso de Portugal UE e conse-quente liberdade de circulao, desperta-nos para as questes relativasaos direitos destes cidados estrangeiros quando se encontram sujeitosao ordenamento jurdico interno.

    Este, um estudo que obedece ao propsito de determinar se h direitos edeveres reservados exclusivamente aos cidados portugueses e se, quan-do tal ocorre, a diferenciao de tratamento legtima.

    Assim, partindo do direito internacional pblico comum, passando pelodireito internacional convencional e terminando na Lei Fundamental e nalegislao ordinria interna, pretendemos identificar as limitaes queocorrem na capacidade de gozo e de exerccio de direitos pelos estrangei-ros, em matrias to diferentes quanto a participao poltica, o exercciode funes pblicas, o direito constituio e manuteno da famlia, a

    entrada, permanncia e sada do territrio nacional, o acesso ao direito, sade, segurana, quanto propriedade industrial e intelectual, a es-colha de profisso e a necessidade de intrprete e de traduo de peasprocessuais.

    Centrando-nos no conceito restrito de estrangeiro, como sendo o homemque no possui cidadania portuguesa, mas outra, excluindo, portanto, aspessoas colectivas, procuraremos saber se o Estado de direito democr-tico assegura o respeito dos direitos fundamentais de todos os homens ese reconhece o estrangeiro como um igual, apesar das presses econmi-cas e sociais em sentido contrrio, nomeadamente, do desemprego, dosencargos financeiros com o pagamento de despesas de sade, subsdios,penses de reforma, prestaes sociais, etc..

    Porm, excluiremos deste estudo os estrangeiros que possuam o estatutode refugiado, que tenham requerido asilo ou sejam aptridas, porquantoos mesmos possuem estatuto jurdico prprio.

    Palavras-chave: Estrangeiro; Direitos; Equiparao; Reciprocidade.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    ABSTRACT

    Portuguese society is facing a growing process of emigration since theending of colonization and especially after the fall of the Berlin wall.

    This new social reality, along with the portuguese adhesion to EU and thefreedom of circulation, awakens us to some questions related to the rightsof these foreign citizens when they are subjected to the internal legislation.

    This study has the goal to determine if there are rights and duties exclusivelyreserved to the portuguese citizens and, if this is the case, whether the

    difference of treatment is legitimate.Thus, starting from the public common international law and endingwith the ordinary internal legislation, we intent to identify the limitationsthat take place in the capacity of acquisition and exercise of rights byforeigners in different matters such as political participation, the exerciseof public functions, the right to constitute and maintain family, the entry,permanence and departure from the national territory, the access tohealthcare, industrial and intellectual property, the choice of a job or theaid of an interpreter.

    If we concentrate on the restricted concept of foreigner as a person thatdoesnt have portuguese citizenship, excluding therefore the collectivepeople, we will try to know if the State of democratic law assures therespect of the fundamental rights to all men and if it recognizes foreignersas equals, although there may be economical and social pressures no to doso, namely concerning to unemployment, financial duties such as healthexpenses, allowances, retirement incomes, social payments, amongothers.

    This study will not include, however, the foreigners that have the statute ofrefugees, these who might have asked for asylum or without nationality,because they have a specific juridical status.

    Keywords:Foreigner; Rights; Equalization; Reciprocity.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    INTRODUO

    Hospes, hostis (Mxima antiga1) mais fcil desintegrar um tomo do que um preconceito(Albert Einstein)

    O reconhecimento da dignidade inerente a todos os membrosda famlia humana e dos seus direitos iguais e inalienveisconstitui o fundamento da liberdade, da justia e da paz domundo.(Prembulo da DUDH, do PIDESC, do PCIDCP e da Conveno

    sobre os Direitos da Criana)No ter existido outra poca histrica em que a migrao seja to elevadaa nvel mundial.

    Segundo dados de Junho de 2001, existiam 170 milhes de migrantes le-gais no mundo, dos quais a Europa acolhia meio milho por ano, e os quese encontram em situao irregular, chegavam a uma mdia de 300/400mil por ano EU2.

    No se verifica qualquer desacelerao no ritmo de crescimento da mi-grao3, para a qual contribui a conjuntura poltica, social e econmicamundial, nomeadamente os inmeros focos de conflitos armados e o recen-te agravamento da crise alimentar, devido poltica dos biocombustveis.

    claro que a realidade portuguesa vai reflectindo as mudanas que ocor-rem no mundo. Assim que, a partir da segunda metade do sculo XX,concretamente da dcada de 70, com a descolonizao, e da dcada de90, com a desagregao do Bloco de Leste, Portugal recebe um nmerocrescente de imigrantes que pretendem estabilizar-se de forma mais ou

    1. Estrangeiro, inimigo.2. Dados de Joo Maria Mendes, A Europa e os Migrantes na Viragem do Sculo, Janus, 2001, Anu-rio de Relaes Exteriores, Pblico e UAL, pp. 120-121. Para consulta de outros dados estatsticos, porexemplo, na mesma obra: Os Movimentos de Populaes na Histria, por scar Soares Barata (pp.116-117), Novas Tendncias Migratrias Escala Mundial, por Han Entzinger (pp. 118-119), Ten-dncias Migratrias Nos Pases Europeus Da OCDE, por Margarida Rebelo (pp.122-123), Racismo eXenofobia na Europa, por Carla Folga, entre outros (pp. 124-125).3. Na Viso, de 03.09.2009, no artigo denominado As Ilhas da Esperana, o jornalista Joo Romo,dava conhecimento que 7.570 imigrantes tinham tentado chegar Grcia, a partir da Turquia, apenasno decurso de 2008. Alis, Joo Romo, informa os meios desesperados usados pelos imigrantes paraentrarem no territrio da UE, das centenas de mortes por afogamento que ocorrem anualmente nessa

    tentativa e denuncia as violaes dos direitos do homem cometidas pela Grcia, pela Itlia e pela Es-panha, seja nas polticas de imigrao, seja pela recusa em receber e dar assistncia s embarcaesde imigrantes mas tambm nas condies dos centros de acolhimento e nas detenes arbitrrias.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    menos definitiva em territrio nacional.

    Conforme nos revela o Plano para a Integrao dos Imigrantes4, estes sohoje 9% da populao activa e 4,5% da populao nacional.

    Os estrangeiros contribuem, assim, positivamente, para a resoluo doproblema demogrfico, para o crescimento econmico, para a sustentabi-lidade da segurana social e para o enriquecimento cultural do pas.

    Deste modo, estamos hoje perante um pas com uma significativa po-pulao de estrangeiros e confrontado com uma importante diversidadecultural, tnica, lingustica e religiosa.

    Diariamente, os portugueses interagem, no local de trabalho, na escola,nas compras, nos tempos livres, com cidados estrangeiros, sendo es-sencial que ambos conheam reciprocamente os seus direitos e deveres.

    At muito recentemente, se atendermos histria da humanidade, oestrangeiro no era sujeito de direito, no lhe sendo reconhecida perso-nalidade jurdica. Porm, hoje, deseja-se uma melhor cooperao entreos povos, que se concretize a solidariedade internacional, que se atinja a

    igualdade entre todos os homens, que se respeite os direitos inalienveisde todos e que se reconhea e garanta a dignidade de todo o ser humano.

    Ser que a ordem jurdica portuguesa acompanha esta vocao inter-nacional de proteco do estrangeiro e de pr fim s discriminaes,nomeadamente, em razo do territrio de origem?

    O ndex de Polticas de Integrao de Migrantes, que representa um estu-do comparativo das medidas relativas integrao de imigrantes em 28pases (25 dos Estados-membros, Canad, Noruega e Sua), em matrias

    relativas ao acesso ao mercado de trabalho, reagrupamento familiar, par-ticipao poltica, acesso nacionalidade e medidas anti-discriminao,coloca Portugal em segundo lugar quanto proximidade s melhores pr-ticas no mbito das polticas de integrao5.

    E, com efeito, so vrias as intervenes polticas, sociais, econmicas eculturais que tm ocorrido na sociedade portuguesa, para fazer face s

    4. Aprovado pela Resoluo do Conselho de Ministros N. 63-A/07, de 3.5.5. Na revista da Ordem dos Advogados, de Janeiro de 2010, com o ttulo O Portugal dos afectos est

    por cumprir, Ana Isabel Cabo conclui que Portugal, apesar de ter sido considerado o pas na van-guarda da Europa e do mundo, ainda possui situaes de discriminao denunciadas por algumasorganizaes.

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    vrias questes que se suscitam perante esta nova realidade da imigrao.

    Ao nvel legislativo, mas no s, e a ttulo meramente exemplificativo,constatamos que:

    - O Cdigo da Publicidade6probe toda a publicidade que contenha discri-minao baseada no territrio de origem;

    - O Art. 240., do CP (cuja redaco original de 19957e a actualmen-te em vigor foi introduzida pela Lei 59/2007, de 4.9), pune com penas depriso quem constituir, organizar ou desenvolver propaganda que incite discriminao, dio ou violncia ou provocar actos de violncia ou difamarou injuriar pessoas por causa da sua origem. Acresce que o homicdio agravado quando revele dio gerado pela origem nacional (Art.132., N.2, al. f)8, circunstncias que, por fora do Art. 146, N. 2, podem tambmqualificar as ofensas integridade fsica e, portanto, agravar a moldurapenal;

    - A Lei 134/99, de 28.89, foi criada com o objectivo de prevenir e proibir asdiscriminaes no exerccio de direitos fundamentais, econmicos, sociaisou culturais por motivo, nomeadamente, da nacionalidade, apresentan-

    do, a ttulo exemplificativo, as prticas discriminatrias que constituemcontra-ordenao;

    - Foi constitudo o Alto Comissariado para a Imigrao e DilogoIntercultural (ACIDI10), com o objecto de combater o racismo, a xenofobiae quaisquer discriminaes por motivos baseados, nomeadamente, nanacionalidade;

    - Foi permitida a constituio de associaes de imigrantes, como objectivo de proteger os direitos e interesses destes e dos seus

    6. DL 330/90, de 23.10, com a ltima redaco introduzida pelo DL 224/04, de 4.12.7. Repare-se que, na redaco original, no se encontrava prevista a punio da discriminao base-ada na origem nacional, mas apenas baseada na raa, etnia ou cor. Todavia, por fora da ConvenoInternacional sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Racial (Lei 7/82, de 29.4) erapossvel entender que o conceito de discriminao racial abrangia aquela que era fundada na origemnacional (nesse sentido Maria Joo Antunes,in Comentrio Conimbricense do Cdigo Penal, em anota-o ao Artigo 240., Coimbra Editora, 1999). A actual redaco, vem tornar mais claras as situaesque integram discriminaes. Alis, o princpio da tipicidade poderia criar dificuldades em considerar-se a discriminao baseada no territrio de origem punido, quando as vitimas no pertencessem araa ou etnia diferente.8. Redaco introduzida pela Lei 59/2007, de 4.9. Anteriormente, na al. e), s estava prevista a qualifi-

    cao por dio racial, religioso ou poltico.9. Regulamentada pelo DL 111/2000, de 4.7.10. O DL 167/07, de 3.5, aprovou a orgnica do ACIDI.

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    descendentes, residentes em Portugal;

    - Em Agosto de 2001, entrou em funes a Comisso para a Igualdadee Contra a Discriminao Racial, especializada na luta contra a dis-criminao e criada junto do ACIDI;

    - A Alta Autoridade para a Comunicao Social, a 27.06.01, deliberoudenunciar Procuradoria-Geral da Repblica, para efeitos de pro-cesso penal, a existncia de vrios sitesportugueses, na Internet, quedefendiam a ideologia fascista, o nazismo, o racismo e a xenofobia;

    - A lei penal relativa s violaes do direito internacional humani-trio (Lei 31/2004, de 22.7), pune quem cometa certos actos (contraintegridade fsica, transferncia forada de crianas e procedimen-tos que impeam a procriao ou o nascimento) com inteno dedestruir um grupo nacional, tnico, racial ou religioso;

    - A Lei 18/2004, de 11.5, transps para o ordenamento interno aDirectiva N. 2000/43/CE, do Conselho, de 29/6, aplicando o princ-pio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem prejuzo dasdiferenas de tratamento baseadas na nacionalidade ou que decor-

    ra do estatuto jurdico do estrangeiro ou do aptrida. De qualquermodo, enuncia, sem carcter taxativo, vrias situaes que consi-dera prticas discriminatrias baseadas na nacionalidade e que sopunidas como contra-ordenaes (Art. 3, e 10.). Para maior garan-tia dos direitos, o diploma consagra a legitimidade das associaesque tenham por fim a defesa da no discriminao para intervir,em representao da vtima, em processos jurisdicionais e, ainda, oprincpio de que cabe ao alegado autor da discriminao provar quea diferena de tratamento no discriminatria (Art. 6.)11;

    - No Plano Nacional para a Incluso, aprovado pela Resoluo doConselho de Ministros N.166/06, de 15.12, o Estado assumiu comouma das prioridades polticas ultrapassar as discriminaes, refor-ando a integrao () dos imigrantes;

    - Pela Portaria 111/2007, de 24.1, foi criado o Programa TodosDiferentes Todos Iguais, com o objectivo de promover debates, co-lquios, animao sociocultural, publicao de trabalhos, acesde formao para a cidadania e os direitos do homem, assim comopromover e celebrar a diversidade;

    11. Princpio do nus da prova que no se aplica ao processo penal nem s aces em que a averi-guao dos factos incumbe ao tribunal ou a outra instncia competente.

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    - A Resoluo do Conselho de Ministros N. 63-A/07, de 3.5, apro-vou o Plano para a Integrao dos Imigrantes e criou uma Rede dePontos Focais de Acompanhamento que, sob orientao do ACIDI,apresentar ao Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigrao,na forma de relatrios anuais de execuo das medidas previstasno Plano. Concretamente, pretendeu-se alterar qualitativamente aspolticas de acolhimento e integrao dos imigrantes, reduzindo-seas desvantagens no acesso educao, trabalho, sade, habitaoe direitos sociais, rejeitando-se discriminaes;

    - Foram criados os programas para a Integrao dos Nacionais

    dos Pases Terceiros (INTI) e para Cooperao Administrativa emMatria de Fronteiras Externas, Vistos e Imigrao (ARGO), que po-dero contribuir significativamente para o combate discriminao;

    - A 15 de Outubro, foi publicada a Portaria 1262/09, que afirmandono seu prembulo pretender ainda responder s exigncias dos re-gimes jurdicos para aquisio da nacionalidade portuguesa e paraa concesso de autorizao de residncia permanente e estatuto deresidente de longa durao, no que diz respeito ao conhecimento dalngua portuguesa, criou os cursos de portugus para Falantes de

    Outras Lnguas;- A Lei N. 12/93, de 22 de Abril, na redaco dada pela Lei N.22/2007, de 29 de Junho, relativa ddiva, colheita, anlise, pro-cessamento, preservao, armazenamento e distribuio de tecidose clulas de origem humana, dispe no Art. 2. que o seu mbitode aplicao se circunscreve aos cidados nacionais, aos aptridase aos estrangeiros residentes em Portugal, especificando que, emrelao aos estrangeiros sem residncia permanente em Portugal,o regime jurdico dos actos que tenham por objecto a ddiva ou

    colheita de rgos, tecidos e clulas de origem humana, para finsteraputicos ou de transplante, bem como s prprias intervenesde transplante, regem-se pelo seu estatuto pessoal. Parece-nos quetal normativo constituiu uma clara proteco dos princpios e ideaisticos, morais, religiosos ou outros, do pas da nacionalidade do es-trangeiro sem ligao a Portugal. Assim, o Art. 6., N.2, do mesmodiploma, dispe que as colheitas em vida que envolvam estrangeirossem residncia permanente em Portugal, s podem ser feitas me-diante autorizao judicial, enquanto a colheita em cadveres nemsequer se encontra prevista como admissvel relativamente a taisestrangeiros (por exemplo, Art. 10.).

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    Com estas medidas e outras intervenes legislativas, algumas que iremosabordar ao longo do trabalho, pretende-se caminhar para uma sociedadedemocrtica e pluralista que respeite os direitos do cidado estrangeiro ecrie um ambiente de tolerncia, cooperao e dilogo.

    Na verdade, a democracia, pressupe o respeito pelos direitos das mi-norias, que se incentive o aprofundamento dos laos entre os cidadosestrangeiros e a sociedade portuguesa, que a integrao e inclusosocial seja possvel e harmoniosa e, por ltimo, que se adquira umconceito realmente universal e no particular do estrangeiro(Laruelle,2000:222), porquanto este no uma semi-humanidade, nem aquilo

    que teramos de chamar um terceiro homem () uma parte adversa dahumanidade(2000:235).

    Assim, foi essencialmente com duas questes em mente, que inicimoseste estudo. Ser que a igualdade e a dignidade do estrangeiro so valo-res ainda por conquistar na ordem jurdica portuguesa? Encontram-se osestrangeiros equiparados aos portugueses no gozo e exerccio de direitos?

    Para tentar obter as respostas, decidimos centrar o estudo no estatutojurdico do estrangeiro, enquanto pessoa singular, enquanto homem, e

    naqueles direitos que asseguram a dignidade do homem, que lhe so ina-lienveis ou essenciais para a vida em sociedade.

    Mas, essencialmente, pretendemos determinar o conjunto dos direitos edeveres do cidado estrangeiro que se encontra em territrio nacional,partindo da determinao dos standardsmnimos de direitos consagra-dos pelo direito internacional e dos direitos fundamentais garantidos naCRP, para apurar limitaes aos seus direitos comparativamente comos cidados portugueses e se as mesmas so admissveis, justificadas,proporcionais, adequadas e necessrias.

    Assim, excluiremos da investigao a pessoa colectiva estrangeira erestringiremos o estudo ao estrangeiro pessoa singular, excluindo os ap-tridas, os refugiados e aqueles que requerem asilo, assim como o pessoaldiplomtico, uma vez que estes possuem estatutos jurdicos prprios.Porm, no deixaremos de nos referir sua condio jurdica, quando odiploma em anlise expressamente lhes faa referncia.

    Concretizando, ainda, o perfil do estudo, claro que o tema escolhidopoderia ser examinado por diversas perspectivas e abordar diferentes

    questes jurdicas. Todavia, escolhemos a que respeita ao regime jurdicoque determina a capacidade de gozo e de exerccio de direitos dos estran-

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    geiros que se encontram em territrio nacional.

    Excluiremos, pois, do mbito da anlise, as questes relativas, por exem-plo, aplicao do direito estrangeiro em Portugal, atravs das normasde conflito e as questes processuais conexas, como sejam o reconheci-mento de sentenas estrangeiras. No primeiro caso, porque estaramosdefinitivamente no plano do direito internacional privado e, no segundo,porque entraramos no mbito do direito adjectivo.

    Tambm nos afastaremos, por no dizerem respeito directamente aos di-reitos do homem, das matrias relacionadas com o direito da economiaem geral, por exemplo, as que respeitam ao investimento internacionalrealizado por estrangeiros (relativamente ao quais existem mltiplosacordos internacionais e bilaterais), assim como os relativos aos limites aquisio por estrangeiros nas privatizaes do sector empresarial doEstado.

    Sempre que se justifique, avaliaremos as diferenas de regime entre oscidados dos Estados-membros da UE e os de Estados terceiros, assimcomo entre os que esto de passagem e os que residem em Portugal e en-tre os que possuem visto ou autorizao para se encontrarem no territrio

    nacional e os que esto irregularmente.Assim, iniciaremos este trabalho pela anlise sumria da evoluo da tu-tela jurdica dos estrangeiros no mundo, desde as civilizaes clssicasat hoje. Num segundo momento, j no Captulo II e III, procuraremosapurar a evoluo da condio jurdica do estrangeiro no direito constitu-cional portugus at actualidade e a proteco constitucional garantidahoje nos pases lusfonos e nos pases europeus que so, tradicionalmen-te, fonte do direito portugus e com quem mantemos estreitas relaeshistrico-culturais.

    Tendo sempre em mente os direitos do homem, no Captulo IV, distingui-remos o conceito de cidadania, nomeadamente de cidadania europeia e,sumariamente, as condies para a aquisio da cidadania portuguesa.

    De seguida, iremos, no Captulo V, determinar os standardsmnimos dedireitos garantidos ao estrangeiro pelo direito internacional pblico e pelodireito comunitrio.

    A partir da procuraremos identificar, no Captulo VI, os direitos e deveres

    constitucionais de que so titulares os estrangeiros. De que modo os prin-cpios da universalidade, da igualdade e da equiparao se repercutem

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    na esfera jurdica do estrangeiro e como servem de critrio fundamentalpara se determinar se as leis ordinrias podem reservar direitos apenasaos cidados portugueses. Assim, comearemos, depois, a fixar as ex-cepes constitucionais ao princpio da equiparao de direitos e deveresentre cidados estrangeiros e portugueses, em matria de participaopoltica e acesso s funes pblicas sem carcter predominantementetcnico. Aps o que procuraremos, tambm, caracterizar os direitos e de-veres reservados pela Constituio apenas aos cidados portugueses e osrequisitos formais e materiais da lei ordinria que veda o exerccio e gozode direitos ao estrangeiro.

    Desde o Captulo VII ao IX, caracterizaremos as limitaes que recaem so-bre os estrangeiros, em matria de entrada, permanncia e afastamentodo territrio nacional, sua liberdade individual e ao seu direito de consti-tuir e manter a sua famlia.

    De passagem, abordaremos algumas especificidades na expulso e naextradio dos estrangeiros e de que modo a proteco da famlia podeconstituir uma limitao expulso.

    Por ltimo, no Captulo X, imediatamente antes das concluses, tenta-

    remos determinar a constitucionalidade de clusulas de reciprocidade,identificar o seu contedo, valor e admissibilidade em diferentes reas doordenamento jurdico, assim como outras potenciais discriminaes queocorrem no gozo de direitos civis, no acesso ao direito, sade, seguran-a social, na proteco da propriedade industrial e intelectual, no direito escolha de profisso, a ser assistido por interprete e traduo de peasprocessuais para lngua que o estrangeiro domine.

    Ao encerrar este estudo, tentaremos concluir se o legislador ordinrioconsagrou limitaes ao exerccio e gozo de direitos pelo estrangeiro,

    criando diferenciaes injustificadas, arbitrrias e inconstitucionais entreestes e os cidados portugueses.

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    CAPTULO I BREVE PERSPECTIVA HISTRICA DA EVOLUO DA

    TUTELA JURDICA DOS ESTRANGEIROS

    1. NAS CIVILIZAES CLSSICAS

    Nesta exposio esquemtica que se segue, sobre a evoluo da condiojurdica do estrangeiro, ignoraremos as sociedades primitivas12, ainda noconstitudas pelo menos em Cidades-Estado e sem organizao poltica.Tambm no referiremos as que, historicamente, foram menos relevantescomo fonte do direito na Europa, como sejam as da Mesopotmia13ou doEgipto14.

    Mas, por todos os continentes, ao longo dos sculos, os estrangeiros noforam configurados como pessoas e, genericamente, nenhuns direitoslhes foram reconhecidos.

    As formas mais perfeitas de cidade, que funcionam como Estado, fe-cham-se ao mundo exterior, encarando o estrangeiro como o inimigo. Oestrangeiro o estranho em relao cidade.

    Esta ideia est estreitamente ligada a uma viso religiosa, onde o es-trangeiro surge como o impuro, aquele que no tem religio, que no protegido pelos deuses nacionais e que, consequentemente, se encontradesprotegido pelas leis nacionais.

    A condio jurdica do estrangeiro, s reflexamente garantida, atravs detratados bilaterais que regulavam a paz e o comrcio.

    A ideia de direitos do homem, ou da igualdade entre os homens, eradesconhecida.

    A escravatura, era um estatuto reconhecido e aceite, quer por Plato, querpor Aristteles. Na Repblica, Livro III, por exemplo, Plato faz referncias raas de ouro, prata e de bronze que desempenhariam, na polis, fun-

    12. Estas sociedades, encontram-se constitudas em famlias, tribos ou cls e o estrangeiro todoaquele que estranho a este grupo. Para alm do grupo il existe un monde hostile, souvent mystrieux,envers lequel les hommes primitifs prouvent de la crainte, du mpris et de la haine. De la crainte parceque tout qui vient de ltranger est charg de puissance ou de force magique qui peuvent apporter mort,malheur ou maladie; du mpris car leurs yeux ils sont eux-mmes les seuls hommes, les seuls vraishommes, cest dailleurs souvent le sens mmes du nom quils se donnent. Pour les trangers ils rser-

    vent des termes de mpris: barbare, mangeurs de terre, etc. (Dorsinfanc-Smets, 1984 : 60).13. Sobre o estatuto do estrangeiro na Mesopotmia, ver Cardascia (1984 :105-117).14. Sobre o estatuto do estrangeiro no Antigo Egipto ver Pirenne (1984:93-103).

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    es diferentes e possuam direitos e deveres diferentes.

    Embora nas Cidades-Estado gregas, se defendesse a ideia de igualdadee de liberdade, estas eram exclusivas dos cidados, distinguindo-se estesdos no cidados, onde se incluam os estrangeiros, as mulheres e osescravos.

    Concretamente, no direito ateniense, j se reconhecem trs categorias deestrangeiros cujos estatutos jurdicos so bem diferentes. Os istelosso aqueles estrangeiros que pertencem a Estados com quem Atenascelebrou tratados e que podem exercer os direitos que lhe esto reco-nhecidos nos mesmos. Os metoikos so aqueles que Atenas autorizoua estabelecerem-se na cidade e aos quais est vedado possuir imveis etransmitir ou receber por meio de testamento. Esto sujeitos a uma ju-risdio com especificidades prprias15e a penas diferentes das que soatribudas ao ateniense, tm o dever de pagar uma contribuio cidade ede defender a mesma em caso de guerra, no possuem quaisquer direitospolticos, tm as mesmas obrigaes fiscais que os cidados e liberdadereligiosa e no podem celebrar casamentos mistos. E, por ltimo, existiamos xnos, onde se incluam os estrangeiros de passagem, que, no sendogregos, no possuam qualquer proteco legal. De realar que decorrido

    um certo perodo de tempo, caso o xnos permanecesse na cidade, deviafazer-se reconhecer como metoiko ou partir de Atenas16.

    Porm, esta estratificao social, no impediu o nascimento da corren-te de pensamento designada como estoicismo, que j entendia o homemcomo ser humano que est para alm da qualidade de cidado, defenden-do direitos iguais e liberdade para todos.

    Quando o domnio de Roma se expande, esta percebe que, para assegurara coeso e o desenvolvimento do imprio em formao, torna-se necess-

    rio conceder direitos aos povos vencidos.

    Durante a construo daquele que ser, no futuro, o Imprio Romano,nascem as cidades que, na Itlia, recebem o jus civitatise aquelas quetm o gozo de apenas alguns direitos civis,jure latiie, ainda, uma terceiracategoria, a dos povos conquistados fora da Itlia.

    Genericamente, o direito romano distinguia o jus civile, integrado pelasnormas que eram aplicveis aos romanos, ojus gentium, constitudo pelasnormas aplicveis aos estrangeiros, e ojus naturale, comum a todo o ser

    15. O cidado ateniense responde perante o Aropago e o estrangeiro perante o Palladio.16. Para maior desenvolvimento, por exemplo, Aymard (1984 :119-139).

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    humano. Por outro lado, designava todos aqueles que no possuram ogozo do jus civitatiscomo peregrini (que constituam a maioria dos povosconquistados).

    A estes peregrini, estavam-lhes vedados os direitos privados, na sua ge-neralidade (ojus conubii e ojus commercii) e polticos (ojus suffragiie ojushonorum), mas possuam alguns direitos que constituiu ojus gentium17.

    Ojus gentiumpermitia aosperegrinicontrair casamento, embora no coma forma dejuxtae nuptiae(um casamento legal com efeitos inferiores aoreconhecido aos cidados romanos); no podiam suceder a um romano eno podiam adquirir propriedade ex jure quiritium,mas sim ex jure gentim(um direito real inferior ao direito de propriedade).

    Roma distinguia, ainda, a condio deperegrini latinipara os estrangeiroslatinos e que se caracterizava, essencialmente, por possurem, para almdos direitos consagrados nojus gentim,ojus commercii.

    Por ltimo, restavam os brbaros, designao que correspondia a todosos estrangeiros ao imprio que, por no estarem subordinados a Roma eao direito romano, estavam totalmente destitudos de proteco jurdica.

    De realar que, para a definio dojus naturale,que constituir o embriodos direitos do homem, foi importante a contribuio de Ccero. Separandoo direito natural do direito positivo, defendeu a existncia de um direitoimutvel, no tempo e no espao, que o cristianismo veio complementarcom a ideia da universalidade do homem.

    de referir, ainda, que, com o decreto de Caracala, em 212, foi concedidaa cidadania romana a grande parte dos habitantes do Imprio Romano,o que permitiu uma restrio do nmero daqueles que poderiam ver a

    sua capacidade de exerccio de direito diminuda pela sua qualidade deperegrini. Alis, verifica-se ao longo da histria de Roma, uma igualizaoentre osperegrinie os cidados romanos, que se inicia desde logo com alex iulia, que concedeu a cidadania romana aos povos de Itlia18.

    Foi a romanizao das provncias conquistadas, que difundiu a organiza-o poltica e administrativa romana, assim como a ordem jurdica que

    17. De referir que, regra geral, nos territrios conquistados, permaneciam em vigor as suas prpriasleis, embora a romanizao tivesse acabado por abranger tambm o direito, para alm da organizao

    administrativa, poltica, etc..18. Para maior desenvolvimento do estatuto do estrangeiro em Roma, possvel consultar Visscher(1984: 195-208) e Jean Gaudemet (1984: 209-).

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    esteve na origem do Direito Civil de muitos pases europeus.

    2. NA IDADE MDIA

    As invases dos povos da Germnia, que desagregam o imprio romano doocidente, levaram formao de pequenos reinos e, consequentemente,ao enfraquecimento da autoridade poltica. Novamente, todo o estrangeiroest fora da lei, no tendo o direito de exercer quaisquer direitos civis epolticos.

    Com o advento do feudalismo em grande parte da Europa, e com os donos

    dos feudos a pretenderem exercer uma soberania dentro dos seus dom-nios, a lei a lei do suserano. E todos os habitantes do domnio do senhordevem-lhe obedincia.

    Assim, por um lado, ter o estatuto de estrangeiro todo aquele que aban-dona o feudo e se estabelece noutro local. Por outro lado, a capacidadede gozo de direitos, variava em funo da lei do suserano. Porm, gene-ricamente, o estrangeiro no era proprietrio (era-o apenas o senhor),no podia receber ou transmitir bens por testamento19, necessitava depagar um tributo para casar com mulher de outra condio ou para exer-

    cer o comrcio, qualquer nacional podia apoderar-se dos seus bens paracompensao de ofensas que tivesse sofrido no pas de origem do estran-geiro20, podia ser preso (antes de julgado) por dvidas e tinha de pagar umcauo por custas processuais para interpor uma aco judicial21.

    Tambm o direito de naufrgio, foi tpico da Idade Mdia, pelo que eraadmissvel a apropriao dos bens naufragados no mar ou em rios, sendonegado ao estrangeiro proprietrio dos bens qualquer direito. Em Portugal,em 1211, D. Afonso II proibiu este direito e ordenou a restituio dos bensnaufragados ao proprietrio, embora mantendo este responsvel pelas

    despesas na recuperao dos bens ou pessoas22.

    Com efeito, a conjuntura poltica e social da poca faz com que, durante

    19. O senhor feudal, a partir do sc. XI, e o rei, a partir do sc. XIV, apoderam-se dos bens dos estran-geiros que morrem sem deixar herdeiro directo no reino. o denominado direito de albingio, que emPortugal no ter vigorado (nesse sentido Albuquerque e Albuquerque,1983: 123).20. o denominado direito de represlia. Albuquerque e Albuquerque (1983:131), identificam vriosdiplomas portugueses onde se encontra a consagrao deste direito.21. Progressivamente, os habitantes do feudo ou do reino (ao contrrio dos estrangeiros), foram ad-quirindo privilgios que lhes permitiam no serem preventivamente presos por dvidas, nem terem de

    pagar custas antes de iniciada a aco.22. Esta proibio do direito de naufrgio foi renovada por D. Joo I e inserida nas ordenaes Afonsi-nas. Nesse sentido, Albuquerque e Albuquerque (1983:126).

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    o regime feudal, o homem esteja desprovido de garantias e de protecojurdica.

    Durante este perodo, mantm-se uma relao de subordinao entre osindivduos e o seu suserano, da qual decorriam deveres de fidelidade e devassalagem do primeiro em relao ao segundo, e deveres de protecodo segundo para com o primeiro. O estrangeiro, elemento estranho a estarelao, aquele a quem no so reconhecidos direitos.

    Por outro lado, embora o cristianismo viesse reconhecer a existncia dequalidades inerentes pessoa humana e a igualdade de todos os homens conhecida a afirmao de S. Paulo: no h nem grego, nem judeu,nem escravo, nem homem livre, elevando a ideia de amor ao prximoe da universalidade do homem certo que, ao introduzir uma dimensoreligiosa nos fundamentos da igualdade entre todos os homens, veio per-mitir a intolerncia e a discriminao, relativamente a todos aqueles queno professassem o seu credo.

    O que, acrescido ao facto de o poder poltico se encontrar totalmente su-bordinado ao poder religioso (aliado a outros factores, nomeadamentedemogrficos, econmicos, guerras, doenas, etc.), tornou a Idade Mdia

    numa poca em que os direitos de igualdade e dignidade do ser humanoforam eliminados.

    Porm, com o surgimento da luta entre o rei e a nobreza, aquele v noestrangeiro um aliado que lhe pode trazer importantes benefcios econ-micos ou polticos.

    Deste modo, o estatuto jurdico do estrangeiro vai lentamente sofrendoalteraes. Os estrangeiros vo adquirindo capacidade de exerccio dedireitos de propriedade, podem contrair casamento e constituir famlia,

    mas, entre outras incapacidades, mantinha-se a de transmitir bens mortiscausa.

    E assim, a partir do sc. XI, com as movimentaes de pessoas, devido sCruzadas, e com o incremento do comrcio internacional e o desenvolvi-mento da navegao pelas Repblicas Italianas, nasce o consulado.

    Com efeito, comea a verificar-se, principalmente no Sul da Europa, queos estrangeiros passam a escolher, de entre eles, um magistrado en-carregado de resolver os seus diferendos. E, rapidamente, so muitos os

    tratados de comrcio que consagram esse direito23.

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    Em Portugal, os muitos estrangeiros que aqui se fixam, so rapidamenteassimilados pelo meio social e verifica-se, tambm, que o rei, a fim deincentivar o estabelecimento de colnias, lhes atribui certos privilgios.

    conhecida a carta de D. Afonso IV, em 1338, que aos florentinos conce-deu a possibilidade de escolherem, entre eles, o cnsul com jurisdiosobre todos os litgios em que interviessem concidados. D. Fernandoatribuiu o mesmo privilgio genericamente a todos os estrangeiros, relati-vamente aos pleitos que ocorressem entre eles, assim como concedeu aosingleses um juiz privativo para os litgios que ocorressem entre eles e osportugueses e desde que o objecto do mesmo fosse a compra e venda de

    mercadorias (Albuquerque e Albuquerque,1983:114-ss).Por outro lado, em Portugal, tambm se verificam algumas restries prtica do comrcio por parte dos estrangeiros, nomeadamente, nopodendo estes dedicarem-se ao comrcio de retalho, mas apenas ao co-mrcio por grosso (Albuquerque e Albuquerque,1983:124).

    3. A PARTIR DO RENASCIMENTO

    O regresso ao estudo das fontes clssicas faz ressurgir, a partir do sc.XIV, as ideias de igualdade e dignidade do homem.

    A partir desse momento, o pensamento filosfico sobre o direito, exprimeuma concepo antropocntrica do homem. a supremacia da razo, davontade humana, da liberdade e da valorizao do esprito crtico.

    Estas ideias, serviram de base doutrinria s declaraes de direitos,como sejam a Bill of Rights(1789), nos EUA24, e a Declarao dos Direitosdo Homem e do Cidado (proclamada pela Assembleia Constituinte em

    Agosto de 1789 e consagrada no texto constitucional em 1791), em Frana,onde figuravam, com destaque, o direito vida, liberdade, segurana e propriedade.

    23. As relaes consulares que nasceram das convenes bilaterais possuem, hoje em dia, o seu re-gime jurdico base na Conveno sobre as Relaes Consulares, adoptada em Viena, a 24.4.63, (apro-vada para adeso pelo DL 183/72, de 30.5, com as rectificaes publicadas no DR srie I, de 11.7.72e 29.12.75), no se encontrando, ainda, em vigor a Conveno Europeia sobre Funes consulares,aberta a assinatura em Paris a 11.12.67 (aprovada para ratificao pelo Decreto 60/84, de 3.10).24. A Declarao de Independncia dos EUA ocorreu a 04.07.1776 e a Constituio data de 1787. ABill of Rights constitui as primeiras dez emendas Constituio introduzidas por James Madison noCongresso, em 1789, e ratificadas em 1791. Tais emendas, limitam o poder do Governo Federal, prote-

    gendo os direitos dos cidados, nomeadamente consagrando a liberdade de expresso, de religio, deuso e porte de armas, de reunio, de petio, de imprensa, entre outros. A Bill of Rights foi influenciadapela Declarao de Direitos do Estado da Virgnia e pela Bill of Rights inglesa de 1689.

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    Grcio (1583-1645), afasta o fundamento sobrenatural/divino para explicaro direito natural. Tambm Hobbes (1588-1679), procura na razo humanaa justificao para o direito25.

    Alis, o movimento da reforma, j tinha introduzido a ideia de o homempossuir liberdade para interpretar a palavra de Deus.

    Assim sendo, o direito passa de alicerar-se no racional e no no divino.

    Porm, o marco essencial no reconhecimento do direito dos estrangeiros,foi a Revoluo Francesa, uma vez que se afirmou a igualdade entre todosos homens.

    O homem assume o estatuto de cidado, intervm e participa no poder epassa a ver consagrados direitos e garantias, alguns dos quais inerentes qualidade humana e que, por isso, se impem a toda a ordem jurdica.

    Na Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado, a AssembleiaNacional declara os direitos naturais, inalienveis e sagrados do homeme, no Art. 1., estipula que os homens nascem e permanecem livres eiguais em direitos.

    Assim, o Decreto de Maro de 1791 consagra, desde logo e entre outrasmatrias, o direito dos estrangeiros (e dos franceses) de exercerem aprofisso que escolherem26, a constituio revoga o direito de albingio,considerando-o contrrio aos princpios de fraternidade que ligam os ho-mens independentemente da nacionalidade27, o Decreto de Abril de 1791reconhece o direito de sucesso28e o Cdigo Penal, por exemplo, deixa depossuir disposies especficas para os estrangeiros.

    25. Hobbes, embora tenha sustentado o absolutismo em termos filosfico-polticos, na sua obra-primaLeviat defendeu que os sbditos tinham o direito de abandonar o soberano que no os protegesse.26. a seguinte a redaco do decreto, nesta matria, A compter du 1 Avril prochain il est libre toutepersonne de faire tel ngoce et dexercer telle profession, art, ou mtier quelle trouvera bon.27. LAssemble Nationale () Considrant que le droit daubaine est contraire aux principes de fraternitqui doivent lier tous les hommes quels que soient leur pays et leur gouvernements; que ce droit tabli dansles temps barbares doit tre proscrit chez un peuple qui a fond sa constitution sur les droits de lhommeet du citoyen, et que la France libre doit ouvrir son sein tous les peuples de la terre, en les invitant jouir,sous un gouvernement libre, les droit sacrs et inviolables de lhumanit () decreta a abolio do direitode albingio.

    28. A redaco a seguinte: Les trangers, quoique tablis hors du royaume sont capables de recueilliren France les successions de leurs parents mme franais; ils pourront de mme recevoir et disposer parles moyens qui seront autoriss par la loi.

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    Pensadores como Montesquieu29, Voltaire30e Rousseau,31entre outros, de-fendem a ideia de que todo o homem possui certos direitos inalienveis,decorrentes da sua prpria natureza humana.

    Por isso, fica vedado ao Estado revogar, alterar ou restringir esses direitosfundamentais.

    E inicia-se a constituio do moderno direito das gentes, que se tornouessencial com o veloz aumento de relaes comerciais internacionais eda migrao.

    Tendo a Revoluo Francesa uma vocao universalista, estes ideais re-volucionrios so transportados pelas invases napolenicas, no sendo,por isso, de estranhar a saudao em Portugal, por exemplo, em Sacavmdas tropas de Junot.

    Durante o sc. XIX, os cdigos civis, nomeadamente o holands, o italianoe o portugus, estabelecem a equiparao entre os nacionais e os es-trangeiros, salvo quanto aos direitos polticos. E tambm, em Portugal, aconstituio de 1822 reflecte as ideias da Revoluo Francesa, reconhe-cendo os direitos e deveres individuais

    Todavia, importa referir que logo em 1804, uma vez que, no estrangeiro,os Franceses no possuam direitos garantidos, o Cdigo Civil Francsconsagrou o princpio da equiparao entre nacionais e estrangeiros, mascondicionado pela clusula da reciprocidade32.

    Assim, o princpio da universalidade dos direitos, fundado na igualdadeentre todos os homens, cidados ou estrangeiros, acaba por ser abafadopela clusula de reciprocidade, que, sendo consequncia de sentimentosnacionalistas, acaba por ser adoptada pela generalidade dos Estados.

    29. Em 1748, na sua obra O Esprito das Leis, defendeu, por exemplo, a diviso do poder em executi-vo, legislativo e judicial, que o rei era um mero executor das decises por essa forma de governo e quedevia ser redigida uma constituio com a natureza de lei mxima da sociedade.30. Tendo sustentado que os desgnios divinos so conhecidos, no pelos dogmas da igreja, mas pelarazo dos homens.31. Ao escrever o Contrato Social, defendeu o princpio segundo o qual a vontade dos homens pro-move instituies mais justas. Na sua obra Discurso sobre a Origem e o Fundamento da Desigualda-

    de entre os Homens, susteve que a propriedade privada originava a desigualdade entre os homens eque este era corrompido pela sociedade.32. Vejam-se os Artigos 8. e 11., do Code Civil de 1804.

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    4. O SC. XX E XXI

    Aps a Segunda Guerra Mundial face s desigualdades entre os povos,acentuadas por dois conflitos blicos mundiais e o genocdio ocorridodurante o segundo emerge, no ocidente, uma sociedade fundada emprincpios democrticos e no respeito pelos direitos fundamentais, consti-tuindo um marco essencial a constituio da ONU e a Declarao Universaldos Direitos do Homem (1948), seguindo-se outros instrumentos regionaise internacionais, entre os mais importantes, o Pacto Internacional dosDireitos Civis e Polticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos,Sociais e Culturais (ambos de 1976), a Conveno Americana sobre os

    Direitos Humanos (1978), a Conveno Europeia dos Direitos Humanos eLiberdades Fundamentais (1952), a Carta dos Direitos Fundamentais daUnio Europeia (2002) e a Conveno Africana dos Direitos do Homem edos Povos (1986).

    Desde logo, constituiu um progresso assinalvel a proteco dos direitosdo homem e do estrangeiro por meio de convenes multilaterais, em vezdepender de tratados bilaterais como at ento. Acresce que o direito in-ternacional passou a reconhecer expressamente a personalidade jurdicado estrangeiro, gozando este de estatuto prprio.

    Com efeito, o direito internacional comum, obrigou os Estados a reco-nhecerem o estrangeiro como pessoa, como sujeito de direitos, comopossuindo personalidade jurdica, embora no tenha imposto a equipa-rao entre o estrangeiro e o cidado do pas de acolhimento, nem que oEstado deva permitir a entrada, permanncia e residncia aos estrangeiros(alis, reconheceu o direito dos Estados de expulsarem ou extraditarem osestrangeiros, embora sujeito a certos condicionalismos e requisitos queconstituem o standardmnimo de direitos garantidos aos estrangeiros).

    Pelo menos no mundo ocidental, estabelece-se a ideia da universalidadedos direitos do homem, como direitos inerentes ao ser humano.

    A partir da segunda metade do sc. XX, emerge um novo conjunto econceitos de direitos, alguns dos quais so reconhecidos como sendoinalienveis do homem, nomeadamente, direitos de natureza social, eco-nmica e cultural, como sejam o direito educao, sade, seguranasocial, cultura.

    queles direitos sociais, culturais e econmicos, ditos de segunda ge-

    rao, juntam-se, depois da dcada de 80, os denominados direitos desolidariedade ou de fraternidade, ditos de terceira gerao, como sejam

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    os relacionados com a biotica, a investigao cientfica e manipulao dagentica, o direito paz, ao meio ambiente, ao patrimnio comum da hu-manidade, autodeterminao dos povos, etc., e exprimindo um mnimotico universal, um direito internacional dos direitos do homem.

    Na verdade, a conscincia tica universal actual, exige o tratamento dosestrangeiros como pessoas e o direito internacional promove o tratamentodos estrangeiros como pessoas, garantindo-lhe um standardmnimo dedireitos.

    Na prtica, ao sistema histrico da incapacidade de gozo e exerccio dedireitos dos estrangeiros, sucede o sistema de igualdade de direitos entreestes e os cidados, em termos absolutos ou condicionado clusula dereciprocidade.

    Hoje em dia, j no se tolera que o homem no seja sempre consideradosujeito de direitos, independentemente da sua condio de cidado ou es-trangeiro. Prevalece, maioritariamente, uma cultura jurdica de respeitopelos estrangeiros.

    Porm, como veremos, o direito internacional geral, apesar de garantir ao

    estrangeiro um feixe mnimo de direitos, continua a no proibir a discrimi-nao em razo da nacionalidade.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    CAPTULO II ESBOO DA EVOLUO DA CONDIO JURDICA

    CONSTITUCIONAL DO ESTRANGEIRO EM PORTUGALTodo o ordenamento jurdico reflexo da histria e da sociedade, das alte-raes sociais, culturais e econmicas que provocam mutaes no modode sentir, ver e resolver as vrias questes que se suscitam no direito.

    Assim, no se estranha que as primeiras constituies portuguesas purae simplesmente ignorem os direitos dos estrangeiros e que a constituiode 1933, num claro recuo em relao Constituio de 1911, venha consa-grar o princpio da reciprocidade como princpio dominante.

    Com efeito, a Constituio de 182233teria de ser inovadora na consagra-o de direitos e liberdade do homem, uma vez que reflecte os ideais deRevoluo Francesa e integra-se no movimento constitucional europeuque esta revoluo iniciou. Porm, sob a epgrafe do ttulo I Dos Direitose Deveres Individuais dos Portugueses, era omissa quanto aos direitosdos estrangeiros, com excepo da referncia, no Art. 25., que permitiaqueles o exerccio particular dos seus cultos religiosos.

    J a Carta Constitucional de 182634, integra-se no movimento iniciado pe-

    las potncias europeias com vista restaurao do poder das dinastiasreinantes, cujos ideais se reflectem na revolta chefiada por D. Miguel, econhecida pela Vilafrancada (ocorrida em 2 de Junho de 1823). Assim, aCarta Constitucional, vai restituir ao rei parte importante do poder que aanterior constituio retirava e, quanto ao direitos dos estrangeiros, nadamais consagra do que o direito ao exerccio particular ou domstico dosseus cultos religiosos (Art. 6.).

    A Constituio de 183835, mantm-se na mesma senda, no consagrandodireitos aos estrangeiros e dedicando o seu ttulo III apenas aos Direitos eGarantias dos Portugueses.

    S com a Constituio de 191136se garante, finalmente, no Art. 3., a

    33. Esta Constituio vigorou entre 2.9.1822 e 2.6.1823, data em que ocorreu o golpe denominado Vila-francada. Aps a revoluo de 9.9.1836, entrou de novo em vigor at Constituio de 1838.34. A Constituio vigorou at 1828 e ao incio da guerra civil entre liberais e legitimastes. Quandoa guerra civil findou com a assinatura da Conveno de vora-Monte, a Constituio foi reposta emvigor mantendo-se at 1836. Teve, ainda, um outro perodo em vigor entre 1842 e 1910, isto depois dogolpe de Costa Cabral e at instaurao da Repblica.35. O golpe de Costa Cabral, ps fim sua vigncia, em 1842, tendo entrado de novo em vigor a Carta

    Constitucional de 1826.36. Manteve-se em vigor at 1926, isto , at ao movimento de Sidneo Pais, que deu inicio II Rep-blica ou, tambm designado, Estado Novo.

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    portugueses e estrangeiros, residentes no pas, a inviolabilidade dos direi-tos concernentes liberdade, segurana individual e propriedade, nostermos que se elencam ao longo de trinta e oito nmeros. Normativo quese articulava com o Artigo 26., do Cdigo de Seabra (Cdigo Civil de 1867),segundo o qual: os estrangeiros que viajam ou residam em Portugal, tmos mesmos direitos e obrigaes civis dos cidados portugueses, enquan-to aos actos que ho-de produzir os seus efeitos neste reino, excepto oscasos em que a lei expressamente determine o contrrio, ou se existirtratado ou conveno especial que determine ou regule de outra forma osseus direitos.

    Resulta, assim, que esta Lei Fundamental e o Cdigo Civil, consagraramo princpio da equiparao, no permitindo que a lei ordinria restringisseou limitasse, em matria de direitos e garantias, a equiparao entre cida-dos nacionais e estrangeiros.

    Ora, h um recuo na garantia dos direitos dos estrangeiros com aConstituio de 1933.

    Esta Constituio, no Art. 7., veio estabelecer que o cidado portugusgozava de direitos e garantias consignadas na Constituio, salvo quan-

    to aos naturalizados, as restries estabelecidas na lei, e no seu artigonico preconizava o seguinte: dos mesmos direitos e garantias gozamos estrangeiros residentes em Portugal, se a lei no determinar o con-trrio. Exceptuam-se os direitos polticos e os direitos pblicos que setraduzam num encargo para o Estado, observando-se porm, quanto aosltimos, a reciprocidade de vantagens concedidas aos sbditos portugue-ses por outros Estados. Aps a reviso pela Lei 3/71, de 16.8, o Art. 7.,da Constituio, profundamente alterado. No Art. 1., reservam-se aoscidados portugueses o exerccio de altos cargos polticos, governativos,judiciais e militares. No Art. 2., estabeleceu-se que os estrangeiros go-

    zam, em Portugal, dos direitos e garantias reconhecidos na Constituioaos portugueses, se a lei no determinar o contrrio. Exceptuam-seos direitos polticos, salvo o exerccio de funes pblicas com carc-ter predominantemente tcnico e os direitos pblicos que se traduzamnum encargo para o Estado. Porm, quanto a estes ltimos, observa-sea reciprocidade de vantagens concedidas aos sbditos portugueses poroutros Estados. No Art. 3., equiparam-se os direitos e garantias dosportugueses com os brasileiros do seguinte modo: sob reserva de igualtratamento em favor dos portugueses no Brasil, os cidados brasileirospodem ser equiparados aos nacionais para o efeito do gozo de direitos,exceptuando aqueles a que se refere o Art. 1. deste artigo; o exercciode direitos polticos porm, s ser permitido aos cidados brasileiros que

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    tenham a sua residncia principal e permanente em territrio portugus.

    Assim, e ao contrrio da Constituio de 1911, a Lei Fundamental de 1933,admite que a lei ordinria exclua estrangeiros do gozo de direitos con-cedidos aos cidados portugueses e consagrou que os estrangeiros nogozavam de direitos polticos assim como de direitos que constitussemum encargo para o Estado, salvo no caso de reciprocidade.

    Com efeito, as ideias nacionalistas (a ideia de Nao soberana) vieraminflectir a evoluo que tinha ocorrido com a Constituio de 1911.

    Repare-se que, com o Cdigo Civil de 1966, o Art. 14. pe fim ao siste-ma de equiparao, substituindo-o pelo da reciprocidade. O Prof. FerrerCorreia, no anteprojecto do Cdigo Civil, justificou esta soluo escreven-do o seguinte: no se nega que o primeiro (o sistema de equiparao)seja o sistema idealmente mais perfeito. Todavia, h que atender aos inte-resses de tantos sbditos portugueses que fazem e combatem a sua vidano estrangeiro, quase sempre em condies de manifesta desigualdadeperante a lei civil com os nacionais. O Estado Portugus, negando aosestrangeiros em Portugal aqueles direitos que no seu Estado de origemforam recusados aos portugueses em idnticas condies de facto, pode-

    r deste modo influir no melhoramento da condio daqueles sbditos37

    .Temos, assim, a defesa do sistema de reciprocidade como modo de pres-so para a melhoria das condies dos emigrantes portugueses.

    Com a Constituio de 1976, regressamos ao princpio da equiparao dedireitos entre estrangeiros e portugueses. O que corresponde a uma evo-luo internacional para a extino de todas as formas de discriminao,em razo do sexo, da nacionalidade, da raa, da etnia, etc.

    37. Direito Internacional Privado, Direito Dos Estrangeiros, 1951, inBMJ 24, 9.

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    CAPTULO III O PRINCPIO DA EQUIPARAO NAS CONSTITUIES

    EM VIGOR NOS PASES LUSFONOS E EM ALGUNS PASES EUROPEUSVejamos, de forma breve, sem anlise reflexiva, porquanto no objec-to deste trabalho invadir-se a rea do direito comparado, de que modoalgumas constituies garantem a proteco dos direitos fundamentaisdos cidados estrangeiros e, concretamente, se as mesmas consagram oprincpio da equiparao.

    1. NOS PASES LUSFONOS

    1.1. Na Repblica de Cabo Verde

    De entre os pases de lngua portuguesa, destaca-se o ordenamento jur-dico de Cabo Verde, que reconhece o estatuto do cidado lusfono.

    Com efeito, desde logo, a Constituio da Repblica de Cabo Verde, noArt. 23., consagra o princpio da equiparao entre nacionais e estran-geiros do seguinte modo:

    N. 1. Com excepo dos direitos e deveres reservados constitucio-nal ou legalmente aos cidados nacionais, os estrangeiros e aptri-das que residam ou se encontrem em territrio nacional, gozam dosmesmos direitos, liberdades e garantias e esto sujeitos aos mesmosdeveres que os cidados cabo-verdianos;

    N. 2. Os estrangeiros e os aptridas podem exercer funes pblicasde carcter predominantemente tcnico, nos termos da lei.

    E na Lei 36/V/9738, Cabo Verde tornou extensivo o princpio da equiparaoa todos os cidados nacionais dos pases membros da CPLP, reconhecen-do-lhes capacidade eleitoral activa e passiva para as eleies autrquicas,o direito de exercerem actividade politica conexa com essa capacidadeeleitoral, o de poderem aceder a funes pblicas de carcter predomi-nantemente tcnico e a cargos pblicos electivos no mbito das autarquiaslocais, bem como o direito de circularem, e isentando-os de visto de entra-da no pas, mesmo que no possuam domiclio em Cabo Verde.

    38. Cuja consulta possvel inhttp://cplp.org/.

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    1.2. Na Repblica Democrtica de So Tom e Prncipe

    A Constituio da Repblica Democrtica de S. Tom e Prncipe es-tabelece, no Art. 16.:

    N. 1. Os estrangeiros e os aptridas que residam ou se encontramem S. Tom e Prncipe, gozam dos mesmos direitos e esto sujeitosaos mesmos deveres que o cidado santomense, excepto no que serefere aos direitos polticos, ao exerccio das funes pblicas e aosdemais direitos e deveres reservados por lei ao cidado nacional;

    N. 2. O exerccio de funes pblicas, s poder ser permitido aosestrangeiros desde que tenham carcter predominantemente tcni-co, salvo acordo ou conveno internacional.

    Encontramos, deste modo, a consagrao do princpio da equiparaocom algumas excepes, nomeadamente em matria de direitos polti-cos. Porm, uma vez que data da independncia (11 de Julho de 75) foiadoptado o Cdigo Civil Portugus, na redaco ento vigente (redacooriginal do DL 47 344/66, de 25.11.66, com as alteraes dos DL 67/75, de19.12, e do DL 261/75, de 27.5), mantm-se actualmente em vigor a redac-o do Art. 14., que claramente consagra a clusula da reciprocidade

    relativamente ao gozo de direitos civis.

    1.3. Na Repblica da Guin-Bissau

    A Constituio da Repblica da Guin-Bissau, no Art. 28., j consagra oprincpio da reciprocidade, nos seguintes termos:

    N. 1. Os estrangeiros, na base da reciprocidade, e os aptridas,que residam ou se encontrem na Guin-Bissau, gozam dos mesmos

    direitos e esto sujeitos aos mesmos deveres que um cidado gui-neense, excepto no que se refere, aos direitos polticos, ao exercciode funes pblicas e aos demais direitos e deveres expressamentereservados por lei ao cidado nacional;

    N. 2. O exerccio de funes pblicas, s poder ser permitido aosestrangeiros desde que tenham carcter predominantemente tcni-co, salvo acordo ou conveno internacional.

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    Repare-se que, neste caso, a Lei Fundamental est totalmente em con-cordncia com o Art. 14., do CC39, que tambm consagra a clusula dareciprocidade quanto ao gozo dos direitos civis.

    1.4. Na Repblica Federativa do Brasil

    A Constituio da Repblica Federativa do Brasil, no Art. 5., consagraque todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer nature-za, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pasa inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, seguran-a e propriedade, e, no Art. 12., estabelece, quanto aos cidadosportugueses, uma discriminao positiva nos seguintes termos: aos por-tugueses com residncia permanente no pas, se houver reciprocidade emfavor dos brasileiros, sero atribudos os direitos inerentes ao brasileironado, salvo os casos previstos na Constituio, isto , excepto os cargosde Presidente, VicePresidente da Repblica, Presidente da Cmara dosDeputados, Presidente do Senado Federal, Ministro do Supremo TribunalFederal, da carreira diplomtica e de oficial das Foras Armadas.

    E consagrando totalmente o princpio da equiparao, o Art. 3., do

    Cdigo Civil do Brasil, estabelece que a lei no distingue entre nacionaise estrangeiros quanto aquisio e ao gozo de direitos civis.

    1.5. Na Repblica de Angola, de Moambique e de Timor-Leste

    A Constituio da Repblica de Angola, no possui disposies sobre estamatria. Porm, a Lei 3/94, de 21 de Janeiro, da Repblica Democrticade Angola consagrou, no Art. 4., que os estrangeiros que residam ou seencontrem em Angola, gozam, na base de reciprocidade, dos mesmos di-

    reitos e garantias, estando sujeitos aos mesmos deveres que os cidadosangolanos, com excepo dos direitos polticos e dos demais direitos edeveres reservados por lei aos cidados angolanos. E, no Art. 5., dispeainda, que os estrangeiros, salvo acordo ou conveno internacional, nopodem exercer funes pblicas ou que impliquem o exerccio de poder deautoridade, com excepo dos que tenham carcter predominantementetcnico ou de investigao cientfica.

    39. O AArt. 14. do CC da Guin-Bissau tem exactamente a mesma redaco do mesmo normativo do

    CC Portugus, uma vez que este diploma legal foi adoptado pela Guin data da sua independncia(10.9.74), na redaco ento vigente (que era a original). Repare-se que o actual AArt. 14. do CCPortugus nunca sofreu quaisquer alteraes.

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    Tambm a Constituio de Moambique omissa em matria dos direitosdos estrangeiros, remetendo para a lei as condies de exerccio, pelosestrangeiros, de funes pblicas e privadas de interesse pblico (Art.29., N. 2). Ora, mantendo-se em vigor o Art. 14., do CC Portugus, naredaco em vigor data da independncia (25.6.75)40, encontra-se con-sagrada a clusula da reciprocidade, quanto ao gozo da generalidade dosdireitos civis.

    Igualmente, a Constituio de Timor, nada dispe sobre os direitos dosestrangeiros41, mas a Lei 9/2003, de 15 de Outubro, consagra os direitos edeveres do estrangeiro (e estabelece o regime da imigrao e do asilo42).

    Sumariamente, o estrangeiro goza dos direitos e est sujeito aos deveresconsagrados na Constituio e nas leis (Art. 5.), apenas poder exerceractividade remunerada, caso possua visto ou documento adequado (Art.8.) e -lhe garantido o direito de associao com fins culturais, religio-sos, recreativos, desportivos, beneficentes ou de assistncia (Art. 9.). NoArt. 11., estabelecem-se uma srie de restries ao estrangeiro, nome-adamente de interveno de natureza sindical, poltica e de investimentoem empresas de aviao e de comunicao social (entre outras).

    2. NA EUROPA2.1. Na Itlia

    O Art. 10. da Constituio Italiana, remete a condio jurdica dos es-trangeiros para a lei ou o tratado internacional, no consagrando, assim,expressamente o princpio da equiparao.

    Concretamente, a Lei Fundamental Italiana, dispe o seguinte: a condiojurdica do estrangeiro rege-se pela lei, em conformidade com as normas

    e os tratados internacionais. O estrangeiro, impedido de exercer no seupas as liberdades democrticas garantidas pela Constituio Italiana,tem direito de asilo no territrio da repblica, nas condies prescritaspela lei. No admitida a extradio do estrangeiro por crimes polticos.

    40. Redaco original do DL 47 344/66, de 25.11.66, com as alteraes dos DL 67/75, de 19.12, e doDL 261/75, de 27.5.41. Embora, no seu AArt. 10., consagre o princpio da solidariedade com os povos que lutam pelalibertao nacional e garanta asilo poltico aos estrangeiros perseguidos em funo da sua luta pela

    libertao nacional e social, defesa dos direitos do homem, democracia e paz. A Constituio e osrestantes diplomas timorenses citados neste trabalho podem ser consultados em www.mj.gov.tl.42. Esta lei foi regulamentada pelo Decreto 4/2004, de 7.5, cuja consulta possvel no site j identificado.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    Todavia, o Art. 16, do Cdigo Civil Italiano, vem, inequivocamente, con-sagrar o sistema da reciprocidade43.

    2.2. Na Alemanha e em Frana

    J a Lei Fundamental Alem, apesar de no Art. 3. estabelecer a igualda-de de todos os seres humanos perante a lei, no consagra expressamenteo princpio da equiparao (por exemplo, Art. 33.). Com efeito, o princpioda equiparao no ganha autonomia, relativamente ao princpio geral daigualdade.

    A Constituio da Repblica Francesa, tambm no consagra expressa-mente o princpio da equiparao entre os direitos dos cidados francesese os estrangeiros, embora no seu prembulo proclame solenemente o seuapego aos Direitos do Homem () tal como foram definidos na declaraode 1789. Porm, o Art. 11., do Cdigo Civil, consagra expressamenteo princpio da equiparao, mas mitigado pelo sistema de reciprocidade,uma vez que estabelece que o estrangeiro goza em Frana dos mesmosdireitos civis que nos Estados destes forem reconhecidos aos cidadosfranceses ali emigrantes44.

    2.3. Em Espanha

    Por ltimo, o Art. 13., N. 1, da Constituio Espanhola e o Art. 27., doCdigo Civil, consagram, inequivocamente, o princpio da equiparao, aoestabelecer que os estrangeiros gozam dos direitos estabelecidos no ttuloI, sob a epgrafe Dos Direitos e Deveres Fundamentais e, ainda, nos tra-tados e na lei (porm, os direitos polticos s podero ser exercidos pelosestrangeiros atendendo a critrios de reciprocidade). Acrescentando a lei

    civil que o princpio da equiparao poder sofrer as excepes constantesde leis especiais ou de tratados45.

    43. A redaco a seguinte: Lo straniero ammesso a godere dei diritti civili attribuiti al cittadino acondizione di reciprocit e salve le disposizioni contenute in leggi speciali.44. A redaco a seguinte: Ltranger jouira en France des mmes droits civils que ceux qui sont ouseront accords aux franais par les traits de la nation laquelle cet tranger appartiendra.45. A redaco do AArt. 27., NN.1, do CC Espanhol, a seguinte: Los estranjeros gozam en Espaa delos mismos derechos civiles que los espaoles, salvo lo dispuesto en las leys especiales y en los Tratados.Do AArt. 13., NN.1, da Constituio consta que: os estrangeiros gozaro em Espanha das liberdadespolticas garantidas no presente ttulo, nos termos que estabelecerem os tratados e a lei. O NN.2, destenormativo estabelece que somente os espanhis sero titulares dos direitos reconhecidos no AArt.

    23., salvo o que, atendendo a critrios de reciprocidade, possa estabelecer-se por tratado ou por leiquanto ao direito de sufrgio activo nas eleies municipais. O AArt. 23., da Constituio, refere-se aodireito participao em assuntos pblicos e ao direito ao acesso a cargos e funes pblicas.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    De ressalvar que, no Art. 11., N. 3, da Constituio de Espanha, admi-te-se que seja possvel celebrar com os pases ibero-americanos e comaqueles que tenham ou tenham tido um particular vnculo com a Espanha,tratados de dupla nacionalidade. Assim, encontra-se prevista a possibili-dade de esses estrangeiros adquirirem a nacionalidade espanhola, semperderem a nacionalidade de origem (dupla cidadania), adquirindo, assim,um estatuto de igualdade com os espanhis46.

    46. Antnio Marques dos Santos (2002: 53), questiona se, face s relaes que existem entre Portugale os pases de lngua portuguesa, semelhantes s que existem entre a Espanha e os pases ibero-americanos, no deveria Portugal aderir ao sistema de dupla nacionalidade o qual garantiria, de umamaneira mais ampla, mais segura e mais eficaz, os direitos dos cidados lusfonos que se encontras-sem ou residissem em Portugal, assegurando, do mesmo modo, uma melhoria da condio jurdica

    dos portugueses, em circunstncias homlogas, nos restantes Estados de lngua portuguesa. Tam-bm Jos Lus Jesus (2002:153), afirma que reforaria a solidez da Comunidade (entenda-se CPLP)se fosse reconhecido o princpio da dupla nacionalidade, aplicvel a cidados no espao dos sete.

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    OS DIREITOS DO ESTRANGEIRO Respeitar os Direitos do Homem

    CAPTULO IV A CIDADANIA PORTUGUESA E EUROPEIA E O CIDADO

    ESTRANGEIRO1. INTRODUO

    Em regra a plenitude da capacidade de gozo e de exerccios dos direitosconsagrados no ordenamento jurdico portugus atribuda queles quepossuem cidadania portuguesa. Por oposio, o estrangeiro aquele queno desfruta dos direitos inerentes cidadania.

    Nessa medida, impe-se um breve panorama do conceito de cidadania e

    de nacionalidade, do regime jurdico de atribuio e aquisio da cidada-nia portuguesa e do conceito de estrangeiro.

    No presente trabalho, partiremos do conceito de estrangeiro como o indi-vduo que est sujeito ordem jurdica portuguesa, mas que no possui acidadania portuguesa.

    Segundo o conceito clssico, estrangeiro aquele que no cidado por-tugus, podendo possuir outra nacionalidade, mas no a portuguesa, ouno possuir qualquer nacionalidade (aptrida).

    Dentro do conceito de estrangeiro, h, ainda, que distinguir os que possuemregimes especficos, a saber, o estatuto