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1 DIAGNÓSTICO SÓCIO-ECONÔMICO E AVALIAÇÃO DE IMPACTOS NAS TERRAS INDÍGENAS KRAHÔ, KRIKATI E APINAJÉ, SITUADAS NA ÁREA DE INFLUÊNCIA DO CORREDOR DE TRANSPORTE MULTIMODAL CENTRO- NORTE HIDROVIA ARAGUAIA-TOCANTINS Gilberto Azanha Maria Elisa Ladeira

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  • 1

    DIAGNSTICO SCIO-ECONMICO E AVALIAO DE

    IMPACTOS NAS TERRAS INDGENAS KRAH, KRIKATI

    E APINAJ, SITUADAS NA REA DE INFLUNCIA DO

    CORREDOR DE TRANSPORTE MULTIMODAL CENTRO-

    NORTE

    HIDROVIA ARAGUAIA-TOCANTINS

    Gilberto Azanha

    Maria Elisa Ladeira

  • 2

    N D I C E

    Parte I Diagnstico

    Aspectos Gerais por Terra Indgena

    Terra Indgena Krah ou Kraolndia

    Nome

    Localizao

    Populao

    Histrico do Contato

    Situao Atual da Terra

    Assistncia

    Terra Indgena Krikati

    Nome

    Localizao

    Populao

    Histrico do Contato

    Situao Atual da Terra

    Assistncia

    Terra Indgena Apinaj

    Nome

    Localizao

    Populao

    Histrico do Contato

    Situao Atual da Terra

    Assistncia

  • 3

    Timbira: Modo de Vida e Uso dos Recursos Naturais

    Organizao social e meio ambiente

    Chefia e representao poltica

    Morfologia social e subsistncia

    O sistema de nominao

    As mulheres e as roas

    As festas

    Os homens e a caa

    A relao com os recursos naturais: uma relao entre sujeitos

    A conservao dos recursos naturais e sua utilizao

    Krah

    Caracterizao da economia regional

    Grau e modo de insero no ambiente regional

    Levantamento de projetos governamentais e no-governamentais em curso na regio

    Krikati

    Caracterizao da economia regional

    Grau e modo de insero no ambiente regional

    Levantamento de projetos governamentais e no-governamentais em curso na regio

    Apinaj

    Caracterizao da economia regional

    Grau e modo de insero no ambiente regional

    Levantamento de projetos governamentais e no-governamentais em curso na regio

  • 4

    PARTE II - AVALIAO DE IMPACTOS

    Identificao dos impactos

    Avaliao e anlise dos impactos

    PARTE III - MEDIDAS MITIGADORAS E COMPENSATRIAS

    Medidas mitigadoras e compensatrias de curto e mdio prazo

    Krikati

    Apinaj

    Krah

    . Bibliografia Citada

    . Anexos

  • 5

    PARTE I DIAGNSTICO

    Aspectos Gerais por Terra Indgena

    Terra Indgena Krah ou Kraolndia

    Nome

    Os Krah esto classificados como Timbiras Orientais e pertencem ao tronco lingstico

    J. A origem da denominao Krah desconhecida pelos atuais integrantes do grupo.

    O termo aparece na literatura em meados do sculo XIX , possivelmente dado por

    colonos da regio. Na verdade os atuais Krah resultaram da juno, nas primeiras duas

    dcadas do sculo XIX, de duas etnias: os Precamekra (ou Kenpocatj) e os

    Mcamekra.. Estas autodenominaes ainda so reconhecidas pelos ndios.

    Localizao

    A Terra Indgena Krah, com um territrio de 3.200 Km2, est localizada entre o rios

    Manoel Alves Pequeno e Vermelho, afluente do rio Manoel Alves Grande, na bacia do

    rio Tocantins. A rea Krah est situada nos municpios de Goiatins (antiga Piac) e

    Itacaj, ao norte do estado do Tocantins, nas coordenadas aproximadas de 47,5 W e 8

    S. As vias de acesso so atravs da BR 010 (Belm-Braslia) at a altura da cidade de

    Presidente Kennedy e depois pela TO 239 at a cidade de Itacaj. Para o acesso s

    aldeias situadas a leste da TI, o trajeto feito desde Araguana (sede da FUNAI local)

    at a cidade de Goiatins.

    No incio do sculo XIX, os Krah habitavam a regio banhada pelo curso inferior do

    rio Balsas e seus afluentes, Neves e Macap, no Maranho.

  • 6

    Populao

    Atualmente os Krah esto distribudos em 08 aldeias: Pedra Branca, Pedra Furada,

    Manuel Alves, Santa Cruz, Cachoeira, Rio Vermelho, Aldeia Nova, Forno Velho, e em

    quatro ncleos residenciais isolados: Lagoinha, Serra Grande, Riozinho e Morro do Boi.

    Nas aldeias Krah encontramos descendentes dos Apinay, Apaniekra e Xerente e dos

    extintos Kenkatej, que tiveram sua aldeia massacrada em 1913 por fazendeiros locais.

    Encontram-se ainda indivduos com ascendncia civilizada, de cor negra,

    principalmente na aldeia Morro do Boi. impossvel calcular a exata proporo em que

    estes grupos contriburam para a constituio da populao Krah. Contudo, todo aquele

    que nasce em uma aldeia Krah e educado como tal - considerado Krah,

    independentemente de sua ascendncia.

    A populao atual de 1.423 ndios distribudos pelas seguintes faixas etrias* :

    F M

    01 05 128 109

    06 - 09 103 102

    10 14 85 95

    15 19 87 86

    20 29 92 96

    30 39 72 65

    40 49 37 46

    50 59 16 22

    60 69 17 18

    70 79 28 26

  • 7

    + 80 12 19

    (*) neste quadro no esto computados 62 pessoas (das aldeias Riozinho e Serra Grande) cujo censo

    realizado pela FUNAI no discriminou por faixa etria.

    Histrico do Contato

    No incio do sculo XIX a frente pastoril proveniente do Piau comeava a ocupar a

    regio banhada pelo curso inferior do rio Balsas (MA), territrio ocupado pelos Krah.

    O contato foi inicialmente hostil e os Krah foram empurrados na direo do Tocantins.

    Em 1808 os Krah aniquilaram a fazenda Saco, e em 1809 a fazenda Vargem da Pscoa

    na Ribeira da Balsa. Em conseqncia uma de suas aldeias foi atacada e derrotada por

    150 voluntrios e 20 soldados de linha, caindo nas mos dos vencedores 70 prisioneiros

    que foram enviados para So Luiz.

    Foi em conseqncia destes ataques que os Krah (subgrupo Mkrare) deixaram seu

    territrio original, na regio do rio das Balsas e Macap e rumaram em direo ao oeste,

    para o Tocantins, onde entraram em contato com o fazendeiro e comerciante Francisco

    Jos Pinto de Magalhes, fundador de So Pedro de Alcntara, atual Carolina (MA).

    Este comerciante que estava ocupado com o comrcio entre o Par e Gois atravs do

    Tocantins, com o apoio dos criadores de gado do sul do maranho, fez amizade com os

    Krah. A fundao de So Pedro de Alcntara, as margens do Tocantins, tinha como

    finalidade constituir-se em um local de parada e reabastecimento para os navegadores

    do Tocantins, transformar-se em uma base para a explorao agrcola das florestas

    marginais do Tocantins e tambm uma base para a organizao de expedies para

    escravizar ndios, que seriam empregados nas plantaes locais ou vendidos em Belm.

    A Carta Rgia de 5 de setembro de 1811 permitia a escravido temporria de ndios

    hostis na bacia do Tocantins.

    O carter da aliana destes Krah (Mkrare) com este comerciante assim descrito por

    Nimuendaj : por um lado eles (os Krah) continuavam prejudicando o mais possvel,

    debaixo da capa de paz, os seus inimigos, os fazendeiros do leste, com furtos de gado,

    fazendo crer que os culpados eram as outras tribos (Timbira) vizinhas; por outro lado

  • 8

    eles eram os fiis aliados de Magalhes em todas as bandeiras contra os outros

    Timbira....

    Dessa maneira, os Krah, no somente participavam, ao lado dos fazendeiros, dessas

    expedies escravizadoras, como forneciam, com seus constantes roubos de gado,

    motivo para os fazendeiros continuarem com suas expedies. Vrios grupos Timbira

    parecem ter desaparecidos em conseqncia disso.

    No Tocantins os Krah (subgrupo Mkrar) penetraram no territrio ocupado por outro

    grupo Timbira, os Precamekra, vtimas das alianas dos Krah com as bandeiras de

    So Pedro de Alcntara. Os sobreviventes se juntaram aos Mkrar compondo, dessa

    forma, Krah atuais.

    Entretanto, a populao indgena ao redor de Carolina foi diminuindo e a conseqncia

    imediata desse novo contexto que os prprios Krah apareciam como responsveis

    pelos constantes e continuados roubos de gado, tornando-se indesejveis. Apesar de que

    em 1840, um fazendeiro da regio mantinha perto de sua fazenda uma pequena aldeia

    Krah, com cerca de 25 habitantes, para proteg-lo dos ndios Akuen, havia um

    movimento entre a populao local para afast-los da regio j colonizada.

    Em 1848, os Krah foram levados pelo missionrio Frei Rafael de Taggia para o sul, na

    confluncia do rio do Sono com o Tocantins, fundando a atual Pedro Afonso, j em

    terras de Gois, onde at aproximadamente 1860, habitaram uma grande aldeia. Mesmo

    essa transferncia tinha ainda como um dos fins colocar os Krah como sentinela

    avanada dos fazendeiros contra os Akuen.

    Nos anos de 1849/1850 uma epidemia de sarampo reduziu a populao a menos da

    metade. depois destas epidemias ou da febre como dizem os informantes mais

    velhos, que os Krah comeam gradualmente a se deslocar rumo ao norte, para as

    cabeceiras do rio Manoel Alves Pequeno, onde atualmente est demarcado seu

    territrio.

  • 9

    As notcias sobre os Krah, na segunda metade do sculo passado so mais raras. Parece

    que no mais entraram em choque com outros grupos tribais, com exceo apenas da

    expedio, j em 1923, que realizaram contra os Apinaj. Os Krah contam que ao se

    deslocarem para a regio atual tiveram cinco aldeias at que se reuniram em uma grande

    aldeia chefiada pelo Tito (um ndio Krah filho de um fazendeiro da regio que assumiu

    a paternidade educando-o e presenteando-o com muitas cabeas de gado), desde alguns

    anos antes da viagem que este fez, em 1873, capital do Imprio, at o seu assassinato,

    ocorrido nos ltimos anos do sculo passado.

    Este assassinato realizado na prpria aldeia por um regional provocou - pela seqncia

    de atrocidades cometidas entre a prpria populao regional, j que Tito foi assassinado

    por vingana a seu pai, tambm assassinado - uma nova disperso dos Krah. Data desta

    poca a relao estabelecida com Agostinho Soares, fazendeiro local, uma aliana que

    perdurou atravs de seus descendentes at que, j na terceira gerao, cansados dos

    furtos de gado praticados pelos Krah e esquecidos da proteo destes quando do

    estabelecimento de seus avs na regio, atacam, em 1940, duas das aldeias Krah

    matando 26 ndios, o que veio a ocasionar a demarcao do territrio atual.

    Mas os problemas das relaes com os civilizados continuaram persistindo. No territrio

    concedido aos Krah havia moradores sertanejos, que o SPI permitiu continuarem nas

    terras que ocupavam mediante contratos de arrendamento. Em 1952 um encarregado do

    SPI rescindiu 100 destes contratos de arrendamento fazendo com que uma grande parte

    dos moradores se retirasse do territrio indgena. Atualmente, o territrio Krah,

    encontra-se plenamente ocupado pelos ndios.

    importante ressaltar, para que se compreenda as relaes estabelecidas entre as vrias

    aldeias que compem os Krah atuais, que elas resultam da subdiviso

    Mkrare/Prekramekra (Kenpokatej). A composio poltica destas aldeias pode ser

    assim resumida: o povo das aldeias do Galheiro, Santa Cruz, Morro do Boi, Aldeia

    Nova, Forno Velho e o povo da Pedra Branca, Pedra Furada, Manoel Alves,

    Cachoeira e Rio Vermelho.

  • 10

    Situao Atual da Terra

    A rea Krah (Kraolndia) encontra-se Homologada e Registrada no CRI e SPU;

    Decreto 99062 de 07/03/90 homologa a demarcao (DOU 08/03/90); Reg. CRI de

    Goiatins, Matricula 1377 Livro 2.F fl. 269 em 10/03/92; Registro CRI de Itacaj,

    Matrcula. 2150 Livro 2-F Fl 100 v em 10/03/92; Registro SPU TO -29 em 1990, com

    extenso de 302.533 ha. Localiza-se nos municpios de Goiatins e Itacaj.

    Os Krah tiveram seu territrio atual delimitado em 5 de agosto de 1944, atravs de um

    decreto do Governo de Gois que lhes concedia o uso e gozo das terras que ocupavam.

    Este ato foi decorrente de um ataque de fazendeiros locais duas aldeias Krah, quando

    26 ndios foram mortos. O Governo Federal foi acionado por um antigo missionrio

    batista que havia vivido entre os ndios entre 1926 e 1938. Imediatamente foram

    tomadas as devidas providncias, sendo que os dois fazendeiros considerados como

    responsveis foram condenados a sete anos de priso e alguns outros a penas menores.

    Foi aps esse massacre que o SPI instalaria um posto de servio junto s aldeias e o

    Governo de Gois lhes delimitaria o territrio.

    Assistncia1

    A FUNAI atende aos trs povos indgenas aqui envolvidos atravs da Administrao

    Regional (ADR) de Araguana (TO). Nesta cidade mantida a sede do rgo e a CASA

    do NDIO, localizada a cerca de 5km do centro da cidade, s margens o rio Lontra,

    instalada em 1985. A Casa do ndio conta com um total de 7 funcionrios. H um

    gabinete odontolgico e um posto de enfermagem que faz o atendimento primrio e

    1 As informaes sobre a situao de sade entre os Krah, Apinaj e Kricati foram obtidas junto ADR de Araguana atravs de entrevistas com a Chefe do Servio de Assistncia, Maria Maviolene G. da Silva, e com a

    responsvel pela Diviso de Educao, Maria da Graa. Foi utilizado tambm como subsdio, na rea de sade, o

    Relatrio da Casa do ndio elaborado por aquela ADR. Muitas das informaes puderam ser complementadas e

    avaliadas pelos dados de campo e relatrios dos consultores, Gilberto Azanha e Maria Elisa Ladeira, disponveis no

    Centro de Trabalho Indigenista - CTI, ONG qual esto ligados.

  • 11

    servio de assistncia social. O quadro dos servidores da rea de sade lotados na Casa

    do ndio de Araguana conta com uma enfermaria-padro, um dentista (meio perodo),

    duas atendentes de enfermagem, duas tcnicas de enfermagem, estas trabalhando sob o

    regime de 12 horas e plantes 12x36.

    As doenas de maior predominncia entre os ndios atendidos pela ADR so as gripes,

    bronquites, diarrias, dermatomicoses, pneumonias, gastroenterites, desidratao,

    desnutrio, anemia. H casos crescentes de tuberculose pulmonar, cncer e diabetes.

    Este quadro indicativo, do lado das molstias infecto-contagiosas, de falta de

    assistncia primria preventiva nas aldeias; do lado das molstias degenerativas (cncer,

    diabetes, problemas cardacos), indica um processo recente, provavelmente originado

    pela mudana dos hbitos alimentares.

    A ADR de Araguana mantm junto aos KRAH 04 postos de assistncia (PIN).

    Entretanto a assistncia prestada s aldeias precria. Aliada as dificuldades crnicas da

    FUNAI e o total desconhecimento da realidade por parte das Secretarias Estaduais de

    Educao e principalmente da Sade, existem srias dificuldade de acesso a grande

    maioria das aldeias.

    Entre os anos de 1975/1976, os Krah foram alvo de um projeto de Desenvolvimento

    Comunitrio realizado no mbito da FUNAI, que viria a alterar o modo de

    relacionamento de algumas de suas aldeias com o Estado, iniciando uma nova etapa em

    suas relaes com a sociedade nacional. Estes projetos, de carter experimental, foram

    desenvolvidos em quatro reas indgenas diferentes, consideradas como emblemticas

    da problemtica indgena de ento.

    A rea Krah tem um total de 12 aldeias (do ponto de vista da FUNAI) e 11 escolas,

    que funcionam de modo intermitente e com variaes significativas entre si com um

    total aproximado de 482 alunos e 19 professores (FUNAI e CTI, 1997). Existem dois

    programas de educao na rea: os ministrados pelos professores contratados pela

    Secretaria Estadual de Educao do Tocantins (SEDUC) e o programa de Educao do

    Centro de Trabalho Indigenista (CTI, uma ONG de apoio que trabalha com os Krah h

  • 12

    mais de 10 anos) e que acompanha as escolas em trs aldeias (Rio Vermelho, Aldeia

    Nova e Riozinho). Segundo relatrios do CTI, h 19 professores na rea, sendo que

    deste conjunto apenas 04 so no-ndios e contratados pela FUNAI ou pelo municpio

    de Itacaj. Dos professores indgenas, 05 so remunerados pelo CTI e recebem desta

    entidade orientao pedaggica e apoio de material didtico; os restantes 10 professores

    indgenas so contratados pela SEDUC.

    A situao dos prdios escolares, acesso a material didtico, merenda etc. varia em cada

    aldeia dependendo de sua distncia dos centros urbanos, a mobilizao dos professores

    e lideranas e, claro da vontade das entidades envolvidas.

    So 04 os Postos Indgenas (PIN) que a FUNAI mantm entre os Krah: PIN Krah,

    PIN Cachoeira, PIN Santa Cruz e PIN Rio Vermelho.

    As aldeias jurisdicionadas aos PINs Krah, Cachoeira e Santa Cruz recebem assistncia

    complementar da FUNAI atravs de um Posto de Servios localizado na cidade de

    Itacaj. Este escritrio atua como apoio para a assistncia na rea de sade e conta com

    uma D-20 e com dois servidores (uma tcnica em enfermagem e uma atendente) com

    jornada de 8 horas semanais e plantes alternados nos finais de semana. Como ocorre

    em todos os PINs, este Posto de Servio conta com um aparelho de radiofonia; nas

    aldeias que no contam com servidores da FUNAI, qualquer ocorrncia de sade

    comunicada ao Posto que desloca a D-20 para o local, junto com o servidor. Se for

    necessrio deslocar o enfermo para atendimento especializado, este conduzido para

    Araguana, onde a FUNAI dispe de uma Casa do ndio.

    Os veculos de transporte na TI Krah so praticamente inexistentes; alm da D-20, a

    FUNAI conta para a assistncia a todas as 13 aldeias da rea de um trator de pneu e dois

    barcos.

    Aldeias Jurisdicionadas ao PIN Krah

    Aldeia Pedra Branca

    Populao: 271

  • 13

    Municpio: Itacaj

    Esta aldeia a mais antiga do universo das aldeias Krah atuais. Sede do antigo posto

    do Servio de Proteo aos ndios (SPI), tem recebido assistncia sistemtica dos rgos

    governamentais desde 1941. Situa-se a 18 km de Itacaj e era a at o incio dos anos 80

    a aldeia mais prxima de um ncleo urbano. A FUNAI mantm ali uma infra-estrutura

    bsica, que consiste em uma enfermaria-residncia, escola (construda pela SEDUC) e

    casa-sede do PIN. Dois professores no-ndios, contratados pela FUNAI, se

    responsabilizam pelos 51 alunos distribudos da 1 4 sries do 1 grau. Dois monitores

    indgenas, pagos pela SEDUC, auxiliam os professores. A Secretaria de Sade do

    Tocantins (SESAU) mantm um monitor de sade indgena, Dilson Poput.

    Aldeia Pedra Furada

    Populao: 101

    Municpio: Itacaj

    Esta aldeia, antiga ciso da aldeia Pedra Branca e bem prxima a esta, conta com uma

    enfermaria-residncia construda pela FUNAI em 1974 e com um prdio escolar

    construdo pela SEDUC, esta secretaria se responsabilizando pelos honorrios dos dois

    monitores ndios responsveis pela alfabetizao bilnge dos 36 alunos matriculados. A

    SESAU mantm um monitor de sade, o ndios Alcides Pirca.

    Atualmente, h um grupo de famlias desta aldeia em mudana para a regio central da

    rea (gua Branca), pretendendo ocupar um espao construdo pela FUNAI e SEDUC

    como centro de eventos e reunies; um dos monitores de educao acompanhar este

    grupo na nova aldeia.

    Aldeia Manuel Alves

    Populao: 114

    Municpio: Itacaj

  • 14

    Ciso mais recente da aldeia Pedra Branca (1981), a aldeia Manuel Alves localiza-se

    muito prxima a cidade de Itacaj, sofrendo interferncia direta da mesma. Conta com

    prdio escolar e enfermaria e um barco tipo voadeira, que utilizado nas travessias

    dirias do rio que empresta o nome aldeia e limite da rea. Transposto o rio Manuel

    Alves Pequeno, em cinco minutos de caminhada chega-se cidade.

    A FUNAI mantm um professor no-ndio e a SEDUC um monitor indgena. A Misso

    Novas Tribos do Brasil tambm possui um professor ali residente. Este pessoal leciona

    para os 41 alunos matriculados da 1 4 sries do 1 grau. Entretanto comum parte

    destes alunos abandonarem as escolas indgenas para freqentarem as escolas na cidade,

    ainda que de forma intermitente. A SESAU mantm um monitor de sade, o ndio Joci

    Messias.

    Aldeias Jurisdicionadas ao PIN Cachoeira

    Aldeia Cachoeira

    Populao: 217

    Municpio: Itacaj

    Esta aldeia, juntamente com a aldeia do Rio vermelho, uma das mais tradicionais,

    mantendo integralmente a diversidade da vida ritual. Situada na poro noroeste da rea

    indgena, fica a 35 km de Itacaj. Possui prdio escolar construdo pela SEDUC e

    enfermaria-residncia. A SEDUC remunera os dois monitores indgenas que so

    responsveis pela alfabetizao dos 55 alunos matriculados. Alm do chefe do PIN, a

    FUNAI mantm ali um atendente de enfermagem e a SESAU um monitor indgena de

    sade, Jos Lindo.

    Aldeias Jurisdicionadas ao PIN Rio Vermelho

    Aldeia Rio Vermelho

    Populao: 210

  • 15

    Municpio: Goiatins

    Esta aldeia originou-se de uma ciso da aldeia da Cachoeira e localiza-se s margens do

    rio de mesmo nome, limite leste da rea Krah e prxima a cidade de Goiatins (37 km

    de estrada carrovel). O PIN conta com uma casa-sede, enfermaria e um prdio escolar

    construdo com recursos da FUNAI e do CTI. Esta entidade remunera dois professores

    indgenas enquanto a SEDUC dois monitores bilnges. A FUNAI mantm uma

    atendente de enfermagem e a SESAU um monitor indgena. O nico transporte uma

    C-10 doada pelo CTI h alguns anos e que se encontra em pssimo estado.

    Recentemente um grupo composto por 5 famlias abandonou esta aldeia na tentativa de

    constiturem uma novo grupo local. Liderados pelo ndio Antnio Cavalcanti Xc

    (funcionrio da FUNAI), esto acampados a 18 km aproximadamente da aldeia do Rio

    Vermelho, numa paragem denominada Bacur.

    Aldeia Nova do Galheiro

    Populao: 106

    Municpio: Goiatins

    Situada tambm s margens do Rio vermelho, a poucos quilmetros da aldeia anterior

    (18), esta uma ciso recente da aldeia do Galheiro, situada na poro sudoeste da rea.

    Noventa por cento das famlias desta antiga aldeia mudaram-se para o outro lado da rea

    a procura de mais caa e matas para roas.

    Independentes da assistncia da FUNAI, opo escolhida como forma de manterem sua

    autonomia poltica, os habitantes desta aldeia no contam com o auxlio de nenhum

    funcionrio e nem a FUNAI mantm ali qualquer infra-estrutura. Em tese, esta aldeia

    deveria receber apoio do PIN Rio Vermelho; mas alm da postura dos seus habitantes,

    isto no ocorre por problemas polticos com a aldeia Rio Vermelho. O nico meio que

    vincula esta aldeia FUNAI um aparelho de radiofonia. O nico meio de transporte

    que possuem um barco de alumnio com motor tipo rabeta.

  • 16

    O CTI mantm uma escola, construda pelos prprios ndios com adobe e remunera dois

    professores indgenas. A SESAU mantm um monitor de sade.

    Aldeias Jurisdicionadas ao PIN Santa Cruz

    Aldeia Santa Cruz

    Populao: 177

    Municpio: Itacaj

    Localizada ao sul da rea, nas margens do Rio Manuel Alves Pequeno, esta aldeia

    originria de uma antiga ciso da aldeia do Galheiro. Apresentou nos ltimos anos forte

    incremento populacional, absorvendo famlias vindas das aldeias Nova, Forno Velho e

    Serra Grande.

    Conta com a infra-estrutura bsica da FUNAI: casa-sede, enfermaria e prdio escolar.

    Alm do chefe-do-posto, a FUNAI mantm ali um atendente de enfermagem. A SESAU

    complementa a assistncia a sade mantendo um monitor indgena. A SEDUC mantm

    trs monitores bilnges. Possuem um barco de alumnio para a travessia do rio; o

    restante do percurso feito a p (12 km).

    Aldeia Forno Velho

    Populao: 92

    Municpio: Itacaj

    Aldeia tambm originada de uma ciso da aldeia do Galheiro, agrupa famlias vindas da

    aldeia Santa Cruz. Contam com uma precarssima assistncia da FUNAI: quando

    necessitam apoio emergencial na rea de sade, deslocam-se a p para a aldeia Santa

    Cruz ou transmitem uma mensagem via radiofonia para o Posto de Servios de Itacaj.

    A nica construo um prdio escolar feito de material simples com apoio da ADR de

    Araguana e SEDUC, entidade que remunera o monitor bilnge. A SESAU mantm um

  • 17

    monitor de sade. O futuro desta aldeia incerto, com algumas famlias pretendendo

    voltar para a Santa Cruz e outras para a aldeia Nova.

    Aldeia Serra Grande

    Populao: 34

    Municpio: Itacaj

    Esta aldeia formada pelas famlias que no se deslocaram para o Rio Vermelho e que

    constituram a aldeia Nova. No conta com nenhuma infra-estrutura da FUNAI; a

    SEDUC remunera um monitor bilnge, responsvel pela alfabetizao dos 25 alunos

    matriculados. No tem ningum responsvel pela rea de sade, nem mesmo um

    monitor indgena. Seu futuro como grupo local autnomo tambm incerto.

    Ncleos Isolados

    Morro do Boi

    Populao: 76

    Municpio: Itacaj

    Este ncleo teve sua origem com o matrimnio de um velho Krah da aldeia do

    Galheiro (ento Peritor) com uma negra, h mais de 60 anos, gerando uma

    descendncia mestia que reluta em integrar-se ao modo de vida Krah. Alguns o

    fizeram no passado, mas a maioria continua vivendo dentro da rea, no obedecendo os

    padres indgenas. Entendem a lngua Krah, mas s falam em portugus. Desde a 2

    gerao, os casamentos so estabelecidos com ndias Krah (que passam a residir com o

    marido, quebrando a norma de residncia Krah, que uxorilocal); as suas mulheres se

    casam com habitantes do local (para horror dos Krah) ou geram filhos com os

    pequenos regionais pobres das vizinhanas. O nico contato com a FUNAI o aparelho

    de radiofonia que ali mantido.

    Ncleo do Riozinho Ncleo da Lagoinha Roa do Aleixo

  • 18

    Populao: 42 28 13

    Estes trs ncleos, a rigor, no se constituem em grupos locais ou aldeias; so

    compostos por apenas 01 grupo familiar (composto por filhos/filhas e genros/noras) e

    liderados por trs velhos: Agostinho (Lagoinha), Baslio (Riozinho) e Aleixo, que

    resolveram viver isolados, fora dos fuxicos das aldeias. O primeiro e terceiro

    pertencem ao povo do Galheiro Velho; o segundo originado da aldeia Pedra Branca.

    No existe nenhuma infra-estrutura da FUNAI nestes ncleos; a SEDUC mantm um

    monitor na Lagoinha e a SESAU um de sade. No Riozinho, o CTI remunera um

    monitor bilnge.

    Terra Indgena Krikati

    Nome

  • 19

    A autodenominao do grupo Kricatij significando aqueles da aldeia grande, lhes

    aplicada tambm pelos demais Timbira. Seus vizinhos imediatos, os Pykopj, se referem

    aos Krikati usando o designativo Pcatg que significa, aqueles que dominam a

    chapada. Devido proximidade fsica e cultural entre os Krikati e os Pukopj, estes

    dois grupos foram confundidos por muito tempo como um nico sob a denominao

    genrica de Gavies.

    Localizao

    As referncias histricas de Casteneau (1844), Ferreira Gomes (1859), Marques (1870)

    coincidem com a descrio da ocupao territorial dos Krikati feita por Nimuendaj em

    1946, informando que ...os Krikati nunca abandonaram suas antigas sedes ao leste do

    Tocantins, onde este rio muda sucessivamente a sua direo de Sul/Norte para

    Leste/Oeste ao nascente de Imperatriz, no interior.

    Atualmente os Krikati habitam a aldeia de So Jos, localizada no municpio de Montes

    Altos, a sudoeste do estado do Maranho. A rodovia estadual MA-280 corta a rea

    reivindicada pelos Krikati, passando a apenas 300 metros da aldeia So Jos.

    Populao

    Devido j mencionada referncia comum nas fontes histricas entre os Krikati e os

    Pykopj, no incio do sculo XIX o total da populao dos dois grupos foi estimado por

    Paula Ribeiro em aproximadamente 2.000 ndios e, em 1919, um censo do Servio de

    Proteo ao ndios (SPI) indicou uma populao de 273 ndios distribudos entre as

    aldeias Engenho Novo e Canto da Aldeia. Foi s a partir dos anos de 1960 que as

    populaes dos dois grupos comearam a ser indicadas em separado.

    DATA FONTE NMERO DE NDIOS

    1963 Servio de Proteo ao ndio 230

    1964 J.C. LAVE 210

  • 20

    1969 NEWTON 204

    1979 FUNAI 291

    1984 SANTOS 338

    1990 FUNAI 420

    1996 Centro de Trabalho Indigenista 530

    Histrico do Contato

    Os Krikati fazem parte da nao Timbira, que ocupava tradicionalmente uma grande

    extenso de terra situada nos cerrados do norte do Gois e sul do Maranho, regies que

    foram gradativamente colonizadas a partir do incio do sculo passado por frentes

    agropastoris. Atualmente os territrios ocupados pelos Timbira, que somam sete grupos

    distintos, em um total de 22 aldeias e com uma populao de 5 mil ndios, so

    descontnuos, formando pequenas ilhas de terra que variam de 50.000 a 300.000

    hectares cercadas ou invadidas por pequenas fazendas de criao de gado. Dos grupos

    Timbira atuais, o Krikati o nico que no tem um territrio demarcado.

    O processo de colonizao do centrosul maranhense data de meados do sculo passado e

    desenvolveu-se sobretudo atravs da pecuria extensiva. Por esta poca so registrados

    inmeros combates entre os colonizadores e os grupos indgenas Timbira, ocupantes

    originrios daquela regio.

    Aguerridos e belicosos, os assim chamados Gavies, isto os Pykobj e os Krikati,

    tornaram infrutferas as tentativas de colonizao compreendida entre as cabeceiras do

    rio Pindar e Tocantins (os chamados Campos do Graja) at 1841. Em 1817 o Governo

    do Maranho financiaria a instalao de uma colnia militar nas margens do alto Graja,

    a Colnia Leopoldina, para chamar os ndios da regio paz e permitir assim, a

    colonizao da regio. A execuo deste projeto ficou a cargo de Francisco Pinto de

  • 21

    Magalhes, o bem sucedido pacificador dos Mkamekra (subgrupo que compem os

    atuais Krah). Porm em 1821 nada mais restava desta colnia pois seu comandante

    viu-se obrigado....em presena da ferocidade (dos ndios) a abandonar o presdio e

    retirar-se com dezoito homens.

    Em 1849 o Governo Provincial do Par estabeleceu s margens do rio Tocantins a

    colnia militar de Teresa Cristina, atual cidade de Imperatriz, nas imediaes de aldeias

    Krikati, estabelecendo um ponto importante no apoio pacificao dos ndios na regio,

    imprescindvel para garantir-se a sua ocupao pelos criadores de gado.

    As primeiras referncias explcitas aos Krikati (Caracati) nas fontes histricas,

    enquanto um grupo diverso dos Gavies, aparece em um relatrio de provncia que

    menciona: o missionrio da Colnia de Santa Tereza do Tocantins...comunicou que em

    fins do ano passado (1853) que nessa ocasio haviam descido do serto para sua

    misso quinhentos indgenas;...e ultimamente participa haver reunido ali mais trezentos

    e dois da tribo Caracaty . Atravs deste texto, ficamos sabendo tambm que os

    primeiros contatos pacficos com os Caracaty ( Krikati) somente aconteceram em 1854.

    At o incio dos anos 1860, numerosos relatrios de Presidentes da Provncia do

    Maranho atestavam que a regio compreendida entre o Tocantins (entorno de Santa

    Teresa/Imperatriz) e a margem esquerda do Graja (proximidades da Serra da

    Desordem) estava sob domnio dos ndios Gavio, ou seja, dos Pykopj, Krikati (ou

    Caracati ) e Pihcamekra (Pivocas ou Pivocamekras nestes relatrios).

    De 1860 em diante, os Pihcamekra (que habitavam as cabeceiras do Pindar e

    mantinham estreita relao de aliana tanto com os Krikati como com os Pykopj)

    comearam a estabelecer contatos pacficos com o missionrio de Santa Teresa, Manuel

    Procpio. Por essa mesma poca, os Krikati estavam estabelecidos em suas aldeias

    situadas na bacia do ribeiro Arraia e os Pykopj no Santana. Em 1862, os Krikati

    atacaram a fazenda Salto, matando 16 pessoas, ataque motivado pelo roubo de

    crianas indgenas (e o assassinato de duas delas) por duas pessoas residentes na dita

    fazenda.

  • 22

    Temendo inevitvel represlia, parte dos Krikati se refugiaram entre os Pihcamekra e

    outros foram buscar abrigo em cima da Serra da Desordem, onde depois de algum

    tempo comearam a ser atacados por um fazendeiro de nome Amaro (em uma s

    emboscada, este fazendeiro trucidou 23 ndios jovens, que foram jogados no Arraia).

    Alm destes ataques, as condies de sobrevivncia do grupo na Serra da Desordem

    eram precrias; sem muitas alternativas, acabaram por estabelecer relaes pacficas

    com Amaro, permitindo-lhe ocupar com seus rebanhos as terras localizadas nos

    ribeires Gregrio e Tapuio, formadores do Arraia.

    Cercados e enfraquecidos pelas constantes represlias movidas pelo Governo Provincial,

    os ndios Krikati comeam a estabelecer relaes amistosas com os novos ocupantes,

    ainda em nmero insignificante, permitindo a presena destes em seu territrio. Por

    volta dos anos 70 do sculo passado, estas relaes resumiam um tipo de acordo pelo

    qual os ndios davam permisso temporria para a invernada do gado dos fazendeiros

    em suas terras em troca da doao de alguma cabea de gado.

    Depois de perambularem por vrias aldeias, em 1915 aproximadamente, os Krikati e

    Pihcamekra se uniram formando uma grande aldeia, a do Canto da Aldeia. Este

    ltimo grupo comeou a deixar as terras ao redor de Imperatriz devido a uma grande

    epidemia de sarampo que quase dizimou o grupo. Descendo o Tocantins, subiram o

    Clementino e foram se estabelecer na bacia do Arraia. A partir da, os contatos entre os

    dois grupos se intensificaram, terminando por se juntarem na aldeia mencionada. Esta

    fuso deve ter se dado em funo do baixssimo contigente populacional dos dois

    grupos, impedindo a realizao dos grandes rituais.

    Foi nesta aldeia que o funcionrio do ento Servio de Proteo ao ndio SPI,

    Marcelino Miranda, apareceu com ordens de transferir os ndios para Barra do Corda,

    por presso dos fazendeiros locais, antigos aliados dos Krikati. A tentativa se revelou

    frustada, pois os poucos ndios que foram para a gleba Rodeador comprada pelo SPI,

    retornaram depois de seis meses para seus antigos territrios.

    Quando Nimuendaj os visitou em 1929, pouco depois da tentativa frustada de

    transferncia, encontrou-os dispersando-se em todas as direes (1946, 161). Muitos

  • 23

    foram se estabelecer junto aos Pykopj; outras famlias foram para o Arraia e outras

    ainda para o Pindar. Nimuendaj chega a dar como certa a extino dos Krikati como

    grupo autnomo.

    Somente por volta de 1935 os Krikati conseguiram reunir-se novamente, na aldeia

    Taboquinha; em funo da tuberculose que comeara a grassar nesta aldeia, muitas

    acusaes de feitiaria surgem e esta aldeia se dispersa e cindi-se em vrias outras

    (Baixa Funda, Cabeceira das Cabras, So Jos e Batia).

    Em 1962 o prefeito de Montes Altos, Jocino Gomes, pressionado pelos fazendeiros

    locais, convocou uma reunio na Prefeitura com representantes de todas as aldeias

    Krikati e os fazendeiros, visando acertar um acordo pacfico que impedisse a matana

    de gado pelos ndios...e represlias por parte dos fazendeiros invasores. Este acordo

    estabelecia que os fazendeiros doariam uma cabea de gado por ms para os ndios; em

    troca estes no matariam mais gado e se comprometiam a residir um uma nica aldeia,

    para facilitar a fiscalizao do acordo.

    Para estimular a fuso das aldeias dispersas, o proco local, frei Aristides, instalou na

    aldeia So Jos uma escola. Vrias famlias acabaram mudando-se para esta ltima

    aldeia. A idia geral por traz deste acordo, era liberar partes do territrio para os

    fazendeiros invasores. Para reforar ainda mais esta idia, a FUNAI estabeleceria seu

    posto de assistncia nesta aldeia em 1977. Mas mesmo assim, em 1979, os Krikati

    habitavam em quatro pontos distinto de seu territrio. Somente em 1983 todas as

    famlias dispersas acabaram por congregarem-se na aldeia So Jos.

    Situao Atual da Terra

    A rea Krikati est delimitada (Portaria Ministerial 328 de 07/07/92 declara de posse

    permanente indgena e revoga a Portaria Ministerial 258 de 28/05/92/DOU 08/07/92),

    com extenso de cerca de 146.000 ha e no momento encontra-se em processo de

    demarcao fsica (j finalizada em campo) e levantamento fundirio dos ocupantes

    no-ndios situados no territrio delimitado.

  • 24

    A delimitao desta rea obedeceu a cuidadosos estudos com o propsito de se garantir a

    este povo a possibilidade de um crescimento demogrfico e uma sobrevivncia digna de

    acordo com seu prprio modo de vida.

    Os estudos que delimitaram a rea indgena Krikati em 146 mil hectares no foram

    feitos somente pela FUNAI, mas por um perito nomeado pelo Juiz Federal da 2 Vara de

    So Lus - que reconheceu sua validade jurdica ao indeferir o pleito de muitos

    fazendeiros de Montes Altos, que entraram em juzo em 1981 para tentar o

    reconhecimento legal de seus ttulos de propriedade incidentes na rea pleiteada pelos

    Krikati.

    O Juiz Federal no reconheceu como vlidos os ttulos dos 120 fazendeiros que

    propuseram a ao, julgando extinta a ao, sem julgamento de mrito. Os prprios

    peritos indicados pelos fazendeiros na ao foram forados a reconhecer que os ttulos

    de propriedade apresentados ...eram de posses sem denominao, localizao, limites

    confrontantes ou rea definida - o que determina a nulidade dos registros promovidos

    pelos herdeiros ou sucessores (Ao n 1875/81, 2 Vara da Justia Federal do

    Maranho). Portanto, o que foi reconhecido em Juzo, alm da legitimidade da posse

    indgena sobre a rea proposta pelo perito, que os pretensos proprietrios eram na

    verdade ocupantes de terras da Unio Federal cujo usufruto exclusivo caberia somente

    aos ndios Krikati, segundo o disposto no artigo n 231, caput, da Constituio da

    Repblica.

    A omisso do Poder Pblico, ao postergar indefinidamente a demarcao administrativa

    da rea indgena, gerou uma situao explosiva colocando em risco a sobrevivncia

    fsica dos ndios Krikati.

    Em 1989, a FUNAI cadastrou 563 ocupaes na rea delimitada para os ndios onde

    constatou-se que em 161 delas os ocupantes no moravam no imvel (o que quer dizer

    que esses ocupantes no vivem exclusivamente do imvel ou tm uma outra fonte de

    renda). E que 256 ocupaes foram estabelecidas entre os anos de 1979 e 1989 (aps,

    portanto, a primeira portaria de delimitao, portanto) e destas ainda um total de 96

    foram efetivadas somente nos anos de 1988 e 1989. Portanto, quase 50% das ocupaes

  • 25

    foram estabelecidas depois do incio da ao judicial (o que caracteriza a m-f destes

    ocupantes).

    Os dados levantados tambm apontam para o tipo de manipulao que as elites polticas

    de Montes Altos e Stio Novo tm exercido, abusando da ingenuidade e falta de

    informaes de muitos ocupantes pobres: ao sentirem que o resultado da ao judicial

    que propuseram lhes seria desfavorvel, eles comearam a distribuir lotes em trechos

    da rea indgena (principalmente no Quiosque), tentando criar de fato um problema

    social (a realocao de um grande nmero de famlias de pobres trabalhadores).

    Essas mesmas elites polticas tm argumentado que a demarcao das terras dos Krikati

    vai inviabilizar o crescimento econmico dos municpios de Montes Altos e Stio

    Novo. Tomando como exemplo a demarcao da rea Apinaj (tambm invadida por

    em semelhante de pessoas e estabelecimentos), as elites polticas locais de

    Tocantinpolis brandiram por longo tempo os mesmos argumentos. Mas a demarcao

    foi efetivada, os moradores no indgenas retirados e indenizados, e nem por isso o

    municpio deixou de progredir economicamente. Ao contrrio, registrou ndices

    significativos de crescimento, at porque a demarcao forou uma mudana de

    qualidade dos estabelecimentos agropecurios, que passaram de extensivos e com claras

    finalidades especulativas, para intensivos e produtivos. E o nmero de ocupaes ali

    eram de 641, para uma dimenso semelhante da rea Indgena no total do municpio.

    A delimitao da rea indgena Krikati obedeceu a todos os preceitos administrativos

    necessrios e foi realizada de acordo com a legislao em vigor. O perodo de 1992

    1997, marcado pelas vrias tentativas infrutferas por parte da FUNAI para a

    demarcao da rea. Em fevereiro de 1997 os Krikati, cansados de esperar pela ao

    governamental, acabaram por colocar fogo em uma torre de alta tenso da

    ELETRONORTE situada no interior da rea. Em decorrncia deste episdio houve uma

    presso da Eletronorte e do Governo do Maranho para que se resolvesse a questo da

    demarcao da rea Krikati. A Procuradoria Geral da Repblica, por solicitao do CTI

    e dos prprios ndios, entra com um mandado contra a FUNAI obrigando-a a demarcar

    fisicamente a rea delimitada pela portaria ministerial 328 de julho de 1992.

  • 26

    As posies governamentais so ambguas. O discurso pblico o da demarcao, mas

    efetivamente h toda uma presso para que os Krikati concordem em reduzir a rea

    delimitada, abrindo mo da regio do ribeiro Arraias. As condies para a demarcao

    fsica so precrias, e esta somente se efetiva pelo empenho dos Krikati que receberam

    apoio dos Apinaj e de funcionrios da FUNAI local.

    Assistncia

    Os Krikati esto subordinados FUNAI atravs da Administrao Regional de

    Araguana (TO). At 1995 estavam vinculados Administrao Regional de Imperatriz

    (MA), entretanto, por desavenas com esta Administrao devido ao que consideravam

    seu pouco empenho em relao a demarcao de seu territrio, conseguiram a

    transferncia administrativa para Araguana.

    Reduzidos a uma nica aldeia, por fora da invaso de seu territrio e da situao de

    tenso subsequente, os Krikati enfrentam graves problemas em relao a devastao de

    seu territrio com a escassez de gua, caa e as frutas silvestres. Em 1974 foi instalado

    um posto indgena da FUNAI junto aldeia So Jos, acabando por atrair, com a

    promessa de uma assistncia mais digna, os grupos familiares que ocupavam ainda

    pores distintas do territrio Krikati.

    Beneficirios do Convnio CVRD/ FUNAI os Krikati tiveram entre 1982 e 1991 vrios

    recursos em sua aldeia (caminho, trator, garagem, aude, banheiros, etc.) que no

    contriburam para uma melhoria efetiva em sua qualidade de vida. O mesmo aconteceu

    em relao aos benefcios do convnio ELETRONORTE/ FUNAI, que continuam at

    hoje de forma pontual e assistemtica.

    A aldeia So Jos conta com uma nica escola, com 118 alunos (FUNAI) e uma

    professora no-ndia contratada pela FUNAI. Segundo relatrios do CTI, h uma

    professora indgena que recebe seus vencimentos pelo municpio responsvel pelas

    aulas de alfabetizao na lngua juntamente com uma missionria evanglica. Os Krikati

    contavam com uma casa de apoio para os estudantes na cidade de Montes Altos, distante

  • 27

    da aldeia apenas 1 hora, mas que recentemente foi desativada devido tenso nas

    relaes entre os ndios e os regionais devido demarcao do territrio Krikati.

    Uma atendente de enfermagem da FUNAI presta os servios de sade primria; os casos

    mais graves so encaminhados para Imperatriz ou Araguana.

    Terra Indgena Apinaj

    Nome

    Os Apinaj esto classificados como Timbiras Ocidentais e pertencem ao tronco

    lingstico J. Apinay ou Apinaj no autodenominao do grupo, porm

    atualmente a forma com os quais se designam e so designados pelos demais

    grupos Timbira e por seus vizinhos regionais. No vocbulo Timbira Oriental, o

    sufixo y/j assinala coletividade.

  • 28

    Curt Nimuendaj fornece outras designaes para o grupo, todas elas derivadas do

    termo ht - hto entre os Timbira Orientais, que significa canto e se refere ao territrio

    tradicional dos Apinaj localizado no canto formado pelo Araguaia e Tocantins, regio

    conhecida como Bico do Papagaio.

    Localizao

    Os Apinaj nunca deixaram de habitar a regio compreendida pela confluncia Araguaia/

    Tocantins e cujo limite meridional era dado, at o incio deste sculo, pelas bacias dos

    rios Mosquito (no divisor de guas do Tocantins) e So Bento (no Araguaia).

    Atualmente a rea Indgena Apinaj est localizada nos municpios de Tocantinpolis e

    Itaguatins, no extremo norte do Estado do Tocantins. A rea Apinaj sofre o impacto das

    rodovias Transamaznica e TO-291 e cortada ainda por outra rodovia estadual, a

    TO126, que liga Tocantinpolis a Itaguatins.

    Populao

    As referncias histricas apontam o seguinte quadro populacional:

    data fonte nmero de ndios

    sculo XIX Cunha Matos 4.200

    1859 Ferreira Gomes 2.000

    1897 Coudreau 400

    1926 Snethlage 150

    1928 Nimuendaj 150

    Esses dados mostram que em menos de 60 anos os Apinaj tiveram sua populao

    reduzida em mais de 90%. A partir de meados deste sculo a populao se estabiliza e

    inicia um rpido processo de recuperao demogrfica, como aponta os seguintes dados:

  • 29

    data fonte nmero de ndios

    1967 Matta 253

    1977 Waller 364

    1980 Galvo 413

    1985 FUNAI 565

    1993 CTI 780

    1997 FUNAI 1.025

    A populao Apinaj atual, segundo censo da FUNAI (ADR/Araguana1997) de 1.025

    pessoas distribudas pelas seguintes faixas etrias:

    F M

    1-5 155 208

    6-9 60 69

    10-14 70 48

    15-19 45 60

    20-29 70 57

    30-39 43 33

    40-49 27 19

    50-59 17 04

    60-69 04 08

    70-79 08 06

  • 30

    + 80 06 06

    Histrico do Contato

    Os primeiros civilizados a alcanar o territrio ocupado pelos Apinaj foram jesutas

    que, entre 1633 e 1658, empreenderam 4 entradas Tocantins acima, a fim de descerem

    ndios para as aldeias do Par. A medida que os caminhos pelos rios Araguaia e

    Tocantins foram sendo abertos, os contatos com os grupos indgenas que habitavam esta

    regio foram-se tornando mais constantes e as referncias aos Apinaj cada vez mais

    precisas.

    Os rios Araguaia e Tocantins tiveram vrias expedies coloniais a percorrer suas guas

    no primeiro quartel do sculo XVIII, vindas no apenas do sul, mas tambm do

    Maranho e Par, que disputavam a posse da rica regio aurfera recentemente

    descoberta pelos bandeirantes de S. Paulo no sul de Gois. At o final do sculo XVIII

    os Apinaj entraram diversas vezes em contato hostil com os civilizados,

    empreendendo correrias pelo Tocantins para apoderarem-se de ferramentas.

    Em conseqncia dessas correrias foi fundado, em 1780, o posto militar de Alcobaa,

    que apesar de suas 6 peas de artilharia foi abandonado devido as incurses dos Apinaj.

    E, em 1791, foi fundado outro posto militar no rio Arapary. Em 1797 foi fundado o

    posto So Joo das Duas Barras, atual So Joo do Araguaia. Esse fato marcou a entrada

    dos Apinaj em contato permanente com a sociedade nacional.

    Entretanto as relaes entre a guarnio do posto e os ndios continuaram conflituosas.

    Em 1810 foi fundada, por um comerciante, a localidade de S.Pedro de Alcntara, que

    estabelecendo relaes amistosas com os vizinhos Krah, utilizaram-se deles para atacar

    outros grupos indgenas. Em 1826, foi fundado , no prprio territrio ento ocupado

    pelos Apinaj, o primeiro povoado, Santo Antnio, logo abaixo da cachoeira das Trs

    Barras. Possuam ento os Apinaj 5 aldeias . Em 1816 este vilarejo foi incorporado ao

  • 31

    arraial de So Pedro de Alcntara, formando ento a cidade de Carolina, na margem

    maranhense do Tocantins.

    Em 1824, o arraial de Carolina contava com uma populao de 81 brancos e cerca de

    120 a 150 Apinags. Neste mesmo ano, Cunha Mattos, localizou os Apinaj em 4

    aldeias com uma populao aproximada de 4200 ndios. Em 1831 seria fundada Boa

    Vista, que se tornaria a atual Tocantinpolis, reunindo uma pequena populao

    nordestina, provavelmente constituda por elementos refugiados dos freqentes conflitos

    entre chefes polticos nordestinos. Na verdade, a referncia nas fontes histricas nos

    remete a descrio de Boa Vista como uma capela cujos habitantes so ndios Apinajs

    e Caraous (Krah), alm de uns facnoras piauienses ali abrigados.

    Em 1840, fundada por Frei Vito uma misso em uma das aldeias Apinaj, estendendo

    sua influncia a outras trs, atingindo um total de cerca de 3 mil ndios. A tradio oral

    do Apinaj no guarda lembrana deste aldeamento, fazendo meno a fundao de Boa

    Vista apenas a partir da chegada de Frei Gil Vilanova, em finais do sculo passado.

    Em 1850, j navegavam pelo Tocantins de maneira regular 31 embarcaes comerciais,

    empregando quase quinhentas pessoas a seu servio, ao passo que a navegao no

    Araguaia continuava fortemente dependente de auxlio governamental. Mas ainda na

    segunda metade do sculo XIX a populao Apinaj era numericamente expressiva

    sendo revelada pelos vrios relatrios oficiais de negcios da Provncia de ento. Em

    1851, o aldeamento de Ba Vista era calculado como tendo 2822 ndios. Em 1877 novo

    relatrio provincial informava uma populao de 1564 Apinajs, justificando o

    decrscimo populacional relatando uma epidemia de sarampo.

    Em fins do sculo , a ocupao da regio dos Apinaj adquiriu carter mais sistemtico,

    iniciando a histria dos conflitos pela posse da terra no local. As conseqncias desta

    ocupao foram arrasadoras: ao mesmo tempo em que a populao branca aumentava,

    os ndios sofreram uma diminuio drstica em seu contingente populacional. Em 1897,

    Coudreau estimou a populao Apinaj em 400 pessoas e na virada do sculo

    Buscalioni, em expedio a Gois, visita os Apinaj da aldeia de S. Vicente e calcula sua

    populao em cerca de 150 indivduos. Assim os Apinaj, que at ento haviam sido o

  • 32

    grupo humano mais expressivo da regio, conhecida como bico do papagaio ou

    tringulo do Tocantins, ingressam no novo sculo como uma minoria inexpressiva

    frente aos ocupantes regionais em pleno processo de ocupao fundiria.

    Nos primeiros anos do sculo, a regio do Bico do Papagaio foi alcanada por uma

    frente extrativista de babau, que veio se juntar pecuria como uma das principais

    atividades econmicas . Nesta regio, diferentemente do que ocorria nas zonas de

    extrao de borracha e castanha, pouco mais ao norte, nenhuma atividade econmica

    adquiriu hegemonia sobre as outras. A pecuria perdeu a fora quando a frente de

    expanso nordestina atravessou o Tocantins, devido s dificuldades de transporte do

    gado para os mercados consumidores do nordeste.

    O babau, de menor preo e no sofrendo com as variaes do mercado internacional,

    como a borracha e a castanha, jamais chegou a envolver o conjunto da populao do

    municpio. Assim o povoamento do territrio Apinaj ocorreu de maneira relativamente

    constante durante o sculo XX, sem bruscas mudanas econmico e sociais. Essa

    situao foi essencial para a sobrevivncia dos Apinaj, ainda que com a populao

    grandemente diminuda nos ltimos anos do sculo XIX.

    Entre 1928 e 1937, Nimuendaj visitou vrias vezes os Apinaj apresentando um

    relato bastante pessimista da situao fundiria de ento no territrio indgena:

    ...de seu antigo territrio, dificilmente uma parte sequer dele est em posse da tribo,

    pois os colonos neo-brasileiros esto espalhados por todo o seu habitat hereditrio,

    ainda que esparsamente. At cerca de 20 anos atrs, no ocorrera a nenhum Apinaj

    suspeitar que isso representasse algum perigo para seu prprio futuro. Pelo contrrio,

    eles aceitaram de bom grado, por seu valor aparente, os protestos de amizade dos

    intrusos, e quando abriram seus olhos j era muito tarde......todo o seu territrio tem

    agora senhores estranhos, e o pouco que sobrou corre perigo de ser apropriado algum

    dia por algum fazendeiro suficientemente poderoso e sem escrpulos.

    A possibilidade de uma certa convivncia entre os Apinajs e regionais era dada pela

    prpria forma de ocupao da regio pela sociedade nacional: uma populao dispersa,

  • 33

    vivendo basicamente da agricultura de subsistncia, criao de animais de pequeno

    porte e extrao, em pequena escala, de algum babau. Esta populao pde manter

    relaes personalizadas com os Apinaj, como, por exemplo, as relaes de compadrio,

    comum nas zonas camponesas do pas. Este tipo de relao nunca foi possvel, por

    exemplo, em zonas de extrao de castanha-do-Par e de borracha, onde a organizao

    do trabalho no regime de barraco impediu qualquer contato individualizado com os

    ndios.

    Esta era, praticamente, a natureza da ocupao do territrio Apinaj por no-ndios at a

    dcada de 1940, excetuando-se o limite leste (territrio do subgrupo Krindjobrire e

    atual municpio de Nazar), ocupado por criadores de gado. At 1940 so constantes

    tambm os registros de epidemias (sarampo, febre, varicela) que dizimaram em muito a

    populao Apinaj, a ponto de uma de suas aldeias, a ltima em guas do Araguaia, ter

    sido praticamente dizimada tendo os poucos sobreviventes buscado refgio junto aos

    Apinaj da atual aldeia S. Jos (antiga Bacaba). Este subgrupo Apinaj (Rrkjoir) s

    voltaram a ocupar esta regio, a do Cocal, na dcada de 1980.

    Por volta de 1944 o SPI instala na aldeia So Jos (ainda Bacaba) um posto de

    Assistncia como forma de mediar estes conflitos. Sem dvida a criao do Posto do

    SPI auxiliou a recuperao demogrfica do grupo, j iniciada na dcada de 1930. Apesar

    de no conseguir evitar novas invases e nem buscar alternativas judiciais, o SPI

    institucionalizaria a prtica do arrendamento como meio de demonstrar aos regionais

    que habitavam em terra alheia. No final do anos 50 estes arrendamentos deixariam de

    ser cobrados e muitos dos antigos posseiros acabaram por vender suas posses.

    As terras devolutas comearam a escassear entre as dcadas de 1940/ 1950, quando

    Gois sofreu grande incremento populacional, originrio de Minas Gerais, do Maranho

    e Piau. A disponibilidade de terras caiu muito, o que foi incentivado nos anos que se

    seguiram pela abertura da rodovia Belm-Braslia e posteriormente a Transamaznica,

    valorizando as terras da regio. A conseqncia direta foi a concentrao das terras nas

    mos de novos proprietrios, processo que recebeu maior impulso com a criao do

    financiamento bancrio para atividades agrcolas e pecurias. No interior do territrio

  • 34

    Apinaj, estes pretensos proprietrios eram desalojados destas, sendo pouco os que l

    permaneceram, como agregados dos novos donos.

    Diferente dos primeiros ocupantes, que reconheciam os Apinaj como detentores

    legtimos de seu territrio, os novos proprietrios negavam o status indgena da terra,

    acirrando-se os conflitos entre ndios e brancos.

    Situao Atual da terra

    A rea Indgena Apinaj encontra-se demarcada e com registro no CRI e SPU ( Dec.

    90969 de 14/02/85 /DOU 15/02/85. Reg CRI de Tocantinpolis. Matr 957 Liv 2-C Fl 63

    em 07/11/86 .Reg SPU GO 382, 2-TO em 15/03/89). Os Apinaj reivindicam a

    ampliao da rea, tendo a FUNAI atravs da portaria 429 de 27/04/94, institudo grupo

    de trabalho que identifica a rea indgena Apinaj II, em trmites dentro do rgo

    indigenista para levantamento fundirio.

    extenso: 141.904 ha

    municpios: Tocantinpolis, So Bento e Itaguatins

    A rea de ocupao tradicional Apinaj vem sendo invadida desde a primeira metade

    deste sculo. Em 1940 o SPI instala um posto entre esses ndios com a justificativa de

    exercer um melhor controle dos invasores e mediar os conflitos entre ndios e

    civilizados. Desde ento e at 1975, sucedem-se os ofcios de agentes do SPI e

    posteriormente da FUNAI narrando episdios de conflitos e pedindo a demarcao da

    rea Apinaj. Entre 1975 a 1982 so institudos pela FUNAI vrios GT para delimitao

    da rea Apinaj tendo sido iniciado, em 1979, o processo de demarcao fsica da rea,

    que teve de ser suspenso por imposio dos ndios que discordavam dos limites que lhes

    estavam sendo impostos.

    Os Apinaj tiveram parte de suas terras reconhecidas pelo Estado brasileiro em

    fevereiro de 1985, aps terem interrompido o trfego da Transamaznica e terem

    iniciado por conta prpria com o apoio de guerreiros Krah, Xerente, Xavante e

    alguns Kayap, a demarcao de seu territrio.

  • 35

    Por ocasio da luta pela demarcao fsica, esta rea estava ocupada por 641 invases,

    com um total aproximado de 5 mil pessoas, cujos ocupantes foram indenizados por suas

    benfeitorias com recursos do Convnio CVRD/FUNAI e intimados a deixar a rea

    demarcada. Somente no foram indenizadas as famlias que residiam no limite norte da

    rea, a regio do ribeiro Pecobo, onde a FUNAI no havia realizado o levantamento

    fundirio necessrio para o clculo das indenizaes.

    Somente agora, em abril de 1997, doze anos aps a demarcao fsica da rea, a FUNAI,

    atravs da Resoluo 44, reconhece como de boa-f os ocupantes no-ndios da regio

    acima do Pecobo, responsabilizando-se pelo pagamento de suas benfeitorias,

    procedimento necessrio para a extruso desta parcela do territrio. Em junho de 97 a

    FUNAI, atravs da DAF (Departamento de Assuntos Fundirios) iniciou o pagamento

    destas indenizaes. Segundo dados da ADR de Araguana, foram indenizadas cerca de

    30% das famlias a serem retiradas.

    Contudo, a rea demarcada em 1985 pelo decreto n 95.960, no era aquela pleiteada

    pelos ndios, no tendo sido incorporado em seus limites, uma poro de seu territrio,

    nos limites sul/sudeste: as reas dos rios Mumbuca e Gameleira , frteis e vitais para a

    reproduo dos habitantes da maior das aldeias Apinaj, a aldeia So Jos., que vinha

    sendo exigido desde a primeira proposta de delimitao feita pela FUNAI em 1979. Na

    ocasio os Apinaj interrompem a demarcao que estabelecia uma rea de 85.000 ha,

    exigindo que estas suas terras, na beira do crrego Gameleira at o ribeiro Cruz fossem

    incorporadas a rea que estava sendo demarcada. Assim, em 1980, a FUNAI prope

    uma rea de 102.000 ha , acrescentando justamente esta faixa de terras frteis ao longo

    do Gameleira. Entretanto esta rea s seria encaminhada para apreciao do GETAT, em

    abril de 1983. Durante este perodo foram inmeras as presses para que os Apinaj da

    aldeia So Jos abandonassem este pleito se retirando mais para o interior da rea. A

    proposta de 1985 encaminhada pela FUNAI para deciso do MEAF (Ministrio

    Extraordinrio de Assuntos Fundirios) inclua esta parcela do territrio tradicional dos

    Apinaj. Entretanto a FUNAI foi voto vencido e esta rea no foi includa na rea do

    decreto .

  • 36

    Os Apinaj desta aldeia so os que mais sofreram redues sistemticas em seu

    territrio, desde o incio deste sculo, com a expanso da vila de Tocantinpolis e, na

    dcada de 70, com a construo da Transamaznica e da rodovia Belm-Braslia. Desde

    o dia posterior edio do decreto de demarcao, em 1985, o pessoal da aldeia So Jos

    vm demonstrando seu inconformismo em relao s parcelas perdidas de seu territrio.

    Assim, aps a demarcao, ainda em 1985, a FUNAI enviou dois Grupos de Trabalho

    para a redefinio dos limites da AI Apinaj, sem entretanto, dar continuidade ao

    processo. A partir de 1986, alegando que o decreto n 94.945 impedia a redefinio dos

    limites de qualquer rea Indgena enquanto todas as demais reas indgenas j aprovadas

    no pas no estivessem regularizadas, a FUNAI deixa de considerar o pleito dos

    Apinaj. A partir de 1991, quando da assinatura do decreto presidencial n 22 (que altera

    os procedimentos e as normas para a regularizao das reas indgenas do pas), os

    Apinaj, com o apoio do CTI, pressionam a FUNAI para reabrir a questo, conseguindo

    que a Comisso Especial de Anlise considerasse pertinente o estudo do seu caso.

    Em 27 de abril de 1994 a FUNAI assinaria a Portaria n 0429/94, criando o Grupo

    Tcnico de Reviso da rea Indgena Apinaj.O GT institudo inclui parte desta rea

    reivindicada pelos Apinaj, criando a proposta de rea, denominada nos processos

    internos da FUNAI como T.I. Apinaj II. O processo encontra-se, no momento

    aguardando a realizao do levantamento fundirio na rea a ser acrescida como

    condio para seu encaminhamento para a deciso do Ministro da Justia.

    Este levantamento fundirio era para ter sido realizado pelo GT, entretanto os trabalhos

    do GT na rea Indgena foram prejudicados por polticos e lideranas expressivas da

    regio, atravs de prticas intimidatrias e boatos alarmistas veiculados

    quotidianamente. O relatrio final do GT aponta : o levantamento fundirio da rea

    proposta ( Apinaj II) no pode ser realizado devido s aes do Prefeito de

    Tocantinpolis e do Deputado Federal Fabian Gomes de Souza, que mobilizaram a

    populao local no-indgena contra os trabalhos do Grupo, com o objetivo de impedir

    sua concluso. Tendo sua segurana fsica ameaada, os membros do Grupo de Trabalho

  • 37

    encarregados de realizar o levantamento fundirio se viram impedidos de entrar nas

    fazendas e stios instalados no local... .

    E o coordenador do GT prossegue: (foram encaminhados) ainda reiterados ofcios do

    Coordenador do Grupo ao INCRA e ao INTERTINS, solicitando informaes sobre a

    ocupao fundiria nas glebas de ambos os rgos confrontantes com a rea

    Indgena....no tiveram resposta.... O mesmo ocorreu com ofcios da Cmara de Direitos

    Indgenas e das Minorias do Ministrio Pblico Federal ao INCRA, expedidos com a

    mesma finalidade e que igualmente no mereceram resposta por parte deste rgo

    federal.

    E concluindo afirma que ..no h portanto, dados referentes ocupao no

    indgena na rea proposta. No entanto, ao percorrer o local munido de um mapa com

    dados de 1984, a respeito da localizao dos ocupantes no indgenas na rea que

    permaneceu fora da demarcao ento realizada, o Coordenador do GT pode constatar

    que o nmero de ocupantes no indgenas parece antes ter diminudo, no sendo

    localizadas muitas das habitaes constantes do mapa como pertencentes a posseiros....

    H portanto a possibilidade de que a questo social criada com a evacuao dos

    posseiros no-indgenas da rea a ser demarcada (Apinaj II) seja comparativamente

    menor, hoje, que teria sido em 1984, quando esta mesma rea, constante da proposta da

    FUNAI e dos ndios, foi excluda da demarcao pelo Grupo Interministerial. (cf:

    FUNAI, Relatrio de Identificao Apinaj II). 2

    Em resumo, durante o tumultuado processo de delimitao e demarcao da rea Apinaj

    em 1985, o MIRAD ( rgo ento responsvel pelo reconhecimento das reas indgenas)

    acabaria por decretar uma rea de 142.000 hectares, alterando a proposta encaminhada

    pela FUNAI, retirando reas importantes situadas nos ribeires do Gameleira, Mumbuca

    2 Vale lembrar que este mesmo clima de tenso chegou a nveis absurdos quando da demarcao em 1985, e mesmo logo aps a concluso da mesma, culminando no assassinato de um jovem Apinaj, Valdemar, e

    no ferimento a bala de trs velhos Apinaj, inclusive Vicente (pai de Valdemar) e o ex-capito, Romo. A

    chacina, provocada por ordem do Delegado de Polcia de Tocantinpolis, aconteceu dentro da prpria

    Delegacia de Polcia e no resultou em nenhuma punio.

  • 38

    e Cruz; ao mesmo tempo que inclua uma poro no limite norte, a regio acima do

    ribeiro Pecobo, que apesar de ter sido ocupado pelos Apinaj ainda no incio deste

    sculo, no estava sendo considerado como vital para a reproduo sociocultural dos

    Apinaj.

    Esta alterao - e que a proposta encaminhada pela FUNAI como Terra Indgena

    Apinaj 2 tenta corrigir - demonstra o profundo desconhecimento que as instncias

    governamentais tem da relao dos ndios com o territrio que habitam. Esta faixa de

    terras, considerada agora novamente pela FUNAI, vital para os Apinaj de So Jos em

    particular e para os demais em geral, principalmente quelas aldeias originrias de cises

    recentes (Patizal e Cocalinho).

    Assistncia

    Os dois Postos Indgenas mantidos pela FUNAI nesta rea (Apinaj e So Jos) esto

    jurisdicionados ADR de Araguana (TO). O PIN So Jos atende aldeia do mesmo

    nome (a maior aldeia Apinaj e sede do PIN), alm das aldeias Patizal e Cocalinho. Estas

    aldeias esto situadas a leste da rea indgena. Um chefe de posto da FUNAI coordena os

    trabalhos de assistncia nestas trs aldeias. O PIN Apinaj atende as aldeias de

    Mariazinha (sede), Riachinho, Bonito e Botica, todas situadas oeste da rea. Quando da

    demarcao da rea, em 1985, existiam 2 aldeias, So Jos e Mariazinha. Aps a

    demarcao, a aldeia So Jos cindiu-se, dando origem a outras duas, Cocalinho e

    Patizal; a aldeia Mariazinha por sua vez deu origem as outras trs aldeias (Bonito,

    Riachinho e Botica).

    Beneficirios do Convnio CVRD/FUNAI, os Apinaj receberam no perodo de

    abrangncia do Convnio, 1982 a 1991, vrios recursos ( trator de esteira, caminhes,

    garagens, banheiros, etc.) que em nada contriburam para a melhoria da qualidade de

    vida dos ndios.

    No caso especfico dos Apinaj, foi criado o Posto Indgena de Vigilncia Veredo

    situado no limite norte, na beira da BR-230, no local onde esta estrada atravessa a rea

    indgena, como forma de fiscalizar a entrada dos veculos e impedir assentamentos na

  • 39

    beira da estrada. Este Posto tem tambm a atribuio de impedir a prtica de atividades

    predatrias ( desde a retirada de madeira, de folha de jaborandi, da caa e pesca) ilegais

    na rea Apinaj. O Posto conta com a assistncia de um motorista e um chefe de posto.

    H uma casa sede e uma toyota nova adquiridas com recursos da prpria FUNAI .

    Atualmente na rea Apinaj existem 7 escolas, uma para cada aldeia, com uma

    populao estudantil de 294 alunos (dados FUNAI). A situao dos professores e da

    escola varia de aldeia para aldeia. Na aldeia S. Jos, a mais populosa e tradicional das

    aldeias Apinaj, existem ,por exemplo 4 professores, dois deles indgenas contratados

    pela prefeitura e SEDUC, uma professora da FUNAI e uma missionria das Novas

    Tribos. Nas demais aldeias, menores, como Patizal e Cocalinho h somente professores

    indgenas, alguns com contratos assinados com as prefeituras locais e outros com o

    estado. H professora da FUNAI tambm na aldeia da Mariazinha. Os poucos alunos

    mais adiantados estudam na cidade de Tocantinpolis, prxima a rea. A situao dos

    prdios escolares, acesso a materiais escolares, merenda etc., varia em cada aldeia

    segundo a sua proximidade a cidade, a mobilizao de seus professores e lideranas e a

    boa vontade dos organismos responsveis.

    Aldeias jurisdicionadas ao PIN Apinaj:

    Aldeia S. Jos

    populao: 472 pessoas

    municpio: Tocantinpolis.

    Com recursos da CVRD foram construdos na aldeia So Jos, a casa-sede do PIN,

    enfermaria , casa de farinha, alm de um galpo para maquinrio. O prdio da escola foi

    construdo com recursos da prpria FUNAI h mais de 15 anos e necessita de ampliao

    para atender a demanda dos alunos. Com recursos do Convnio CVRD/FUNAI foram

    adquiridos um trator, tipo jerico, um caminho e uma caminhonete D20, bens que j

    sofreram vrios reparos com recursos da FUNAI. Esta aldeia possui luz eltrica.

  • 40

    Alm do chefe do posto a FUNAI mantm ainda nesta aldeia uma professora e um

    motorista, os servios de atendente de enfermagem so realizados por uma voluntria

    que se encontra desde o incio dos anos 80 nesta aldeia. O Estado do Tocantins

    responsabiliza-se pelo pagamento de um monitor de sade indgena e por uma monitora

    bilnge. O CTI ( Centro de Trabalho Indigenista), entidade no governamental se

    responsabiliza pela remunerao de um professor indgena, a Secretaria Municipal de

    Educao de Tocantinpolis pela remunerao de outro professor indgena e a Misso

    Brasileira, dissidncia da Misso Novas Tribos do Brasil, fundamentalistas americanos,

    pela remunerao de mais 2 monitores indgenas e 3 missionrios . Esto matriculados

    132 alunos de 1a a 4a. sries do 1o. grau. Entretanto o ndice de evaso e repetncia

    grande sendo expressivo o nmero de apenas 4 alunos cursando a quarta srie.

    Aldeia Patizal

    populao: 73 pessoas

    municpio: Tocantinpolis.

    A aldeia Patizal conta com uma escola, construda em 1995 com recursos do Estado do

    Tocantins e com dois monitores indgenas remunerados pelo Estado para alfabetizao

    das crianas. A escola conta com um total de 21 crianas matriculadas. Esta aldeia no

    conta com nenhum servidor na rea de sade. O acesso a esta aldeia s pode ser dado

    atravs do tratar, j que os outros veculos do PIN S. Jos, no possuem trao, o que

    dificulta ainda mais a remoo de doentes.

    Aldeia Cocalinho

    populao : 53 pessoas

    municpio : S. Bento

    A aldeia Cocalinho conta uma enfermaria (Estado) e um prdio escolar simples

    construdo com recursos da FUNAI. A assistncia na rea de sade fica a cargo de um

  • 41

    monitor indgena, remunerado pelo Estado e a educao por conta de duas missionrias

    da Misso Brasileira. Existem 16 alunos matriculados.

    Esta aldeia situado no limite noroeste da rea, fica muito distante da sede do PIN S. Jos,

    e no conta com nenhum veculo para remoo de doentes ou para quaisquer outras

    atividades. Em casos de emergncia solicitam apoio do PIV Veredo.

    Aldeias jurisdicionadas ao PIN Apinaj

    Aldeia Mariazinha

    populao:169 pessoas

    municpio: Tocantinpolis

    Esta aldeia, sede do PIN Apinaj, conta com edificaes de alvenaria, que levantadas

    pela FUNAI foram acrescidas quando do Convnio CVRD-FUNAI. Alm da sede do

    PIN, situada a 1km de distncia da aldeia, com casa de chefe de posto e escritrio, existe

    na aldeia uma enfermaria com casa para atendente, escola e casa do professor, um

    imenso galpo onde funcionava a antiga Cantina, movida com a renda do babau, uma

    garagem, uma casa estilo indgena para reunio e para que assistam televiso, casa de

    farinha, banheiros comunitrios etc. Entretanto quase todas estas construes encontram-

    se em condies precrias. Esta aldeia possui luz eltrica.

    A demarcao da Terra Apinaj, em 1985, com a retirada dos moradores no ndios,

    aliada ao final dos recursos do Convnio CVRD/FUNAI , desmontou a estrutura

    empresarial desta aldeia, ocasionando o processo de ciso que veio a formar as aldeias de

    Botica, Bonito e Riachinho. No momento os moradores desta aldeia pensam em mudar o

    lugar da aldeia, sem se distanciarem muito, entretanto, dos bens adquiridos pelo

    Convnio e FUNAI.

    A aldeia conta com o apoio de um caminho e uma caminhonete, D20, adquiridos ainda

    na poca do Convnio. H ainda um trator de esteira e uma colhetadeira (em desuso) e

  • 42

    um trator pequeno que encontra-se em conserto pela Prefeitura. Em princpio estes

    veculos atendem as 4 aldeias.

    A FUNAI mantm um chefe de posto, uma atendente de enfermagem, e uma professora.

    A Secretaria de Educao do Estado se responsabiliza pela remunerao de uma

    monitora bilnge e a Misso Novas Tribos pela atuao de 2 missionrias como

    professoras. A escola conta com 50 alunos matriculados.

    Aldeia Riachinho

    populao: 102 pessoas

    municpio: Tocantinpolis

    A nica infra-estrutura nesta aldeia um prdio novo, construdo pela Secretaria de

    Educao do Estado que se responsabiliza pela remunerao de 2 monitores bilngues.

    H uma populao estudantil de 41 crianas. O atendimento de sade realizado pela

    aldeia Mariazinha, no contando a aldeia de Riachinho com nenhum servidor na rea de

    sade. Nesta aldeia h um significativo nmero de casamentos de Apinaj com regionais.

    Aldeia Botica

    populao: 61 pessoas

    municpio: Maurilndia

    Nesta aldeia tambm a nica infra-estrutura o prdio da escola construdo pela

    Secretaria de Educao do Estado que se responsabiliza pela remunerao de 1 monitor

    bilnge e de um monitor de sade. A Secretaria de Educao do municpio de

    Maurilndia responsvel pelo pagamento de um professor. Existem 31 alunos

    matriculados.

    Aldeia Bonito

    populao: 95 pessoas

  • 43

    municpio: Tocantinpolis.

    Esta aldeia conta apenas com uma construo, mais simples, de meia parede com um

    depsito fechado para o funcionamento da escola, construdo com recursos repassados

    pelo estado para a FUNAI e complementados por ela. A Secretaria de Educao do

    Estado arca com o pagamento de um monitor bilnge, que acaba por se responsabilizar

    pelo restante do processo escolar. H 41 alunos matriculados. No h nenhum servidor

    na rea de sade.

    Timbira: Modo de Vida e Uso dos Recursos Naturais3

    Organizao Social e Meio Ambiente

    Os cerrados do Brasil Central, muito tempo antes da colonizao portuguesa,

    constituem-se no habitat privilegiado de um grande conjunto de sociedades indgenas

    chamadas, pela literatura etnolgica, J. Os Kaiap, os Bororo, os Karaj, os Timbira e

    os Akwen (Xavante e Xerente) dominavam uma vasta extenso destes cerrados, que ia

    do norte de So Paulo, sul de Minas ao sul do Maranho/sudeste do Piau e do oeste da

    Bahia ao leste do Mato Grosso.

    3 Os Timbira caracterizam-se pelo seu tradicionalismo ou conservantismo cultural. Apesar dos 150 anos de contato, continuam mantendo a lngua como um sistema vivo e operante, a sua organizao social e poltica, a circularidade de suas aldeias e a profuso de seus rituais. As descries sobre a morfologia social e o modo de vida aqui consignadas, so vlidas ou se aplicam, grosso modo, para os Krah, Krikati e Apinaj (as diferenas so dialetais digamos assim) - o que nos livra de trazer para o escopo deste trabalho sutilezas comparativas que s interessam aos especialistas.

  • 44

    Estas sociedades tm em comum uma sofisticada organizao social (com vrios

    sistemas de metades cerimoniais e grupos rituais - sem paralelo no contexto das

    sociedades indgenas das terras baixas da Amrica do Sul), aldeias relativamente

    populosas e de serem predominantemente caadores-coletores, praticando - antigamente

    mais do que hoje - apenas uma horticultura centrada em tubrculos.

    A adaptao destas sociedades ao ambiente dos cerrados atingiu um tal requinte que

    impressionou os primeiros estudiosos europeus, que, perplexos, indagavam como seria

    possvel se constiturem, sobre uma base material to pobre (isto , sem cermica, sem

    agricultura desenvolvida, sem tecelagem), sociedades requintadas, demograficamente

    importantes e, sobretudo, expansionistas. De fato, antes do contato dizimador com os

    europeus - que se inicia no final do sculo XVII - estas sociedades possuam aldeias

    circulares ou semicirculares com 2 mil a 3 mil pessoas.

    A regio dos cerrados, com seus amplos horizontes - que lhes permite uma

    movimentao fcil (todos os J so andarilhos e corredores) e a possibilidade de

    explorarem, simultaneamente, as vrias fisionomias vegetais que caracterizam o cerrado

    (matas de galeria, cerrades, campos, etc. ) sedimentou nos J o que se chama de

    cultura de cerrado.

    Mesmo quando compelidos a viverem em outros nichos ecolgicos (como os Kayap ou

    os Gavio Paracatej do Par), os J fazem esforos para recompor de algum modo seu

    antigo habitat (as matas de apt dos Kayap - cerrados cultivados e manejados por

    eles - ou os caminhos de corrida de tora abertos na floresta de terra firme pelos

    Paracatej do Par). Os J esto extremamente adaptados aos cerrados e em funo disto

    acredita-se que ocupam a regio h pelo menos trs mil anos.

    Os Krah - como os dois grupos Canela do Maranho - continuam mantendo seus

    padres socioculturais sem muitos problemas. O isolamento relativo da rea - e sua

    distncia em relao aos plos mais dinmicos e modernos da regio - contribuiu (e

    contribui ainda) para este fato. Cerca de 85% do territrio da rea Krah constitudo

    de cerrado tpico, onde os ndios caam, coletam, plantam roas de subsistncia nas

    matas de galeria ou de encostas, onde cultivam em pequena escala o arroz, feijo

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    trepa-pau, fava, mandioca, batata-doce, inhames, guandu, abbora, melancia, mamo

    e banana. As aldeias Krah mais populosas esto prximas de Itacaj e enfrentam

    graves problemas de subsistncia por falta de caa e dificuldades na recuperao das

    capoeiras para roa.

    At a dcada de 1940, os Apinaj mantinham, com rigor, seu sistema ritual operante - e

    com ele toda a estrutura social e cultural que os aproximavam e afastavam, ao mesmo

    tempo, dos demais Timbira. As fotografias tiradas por Curt Nimuendaj - o pai da

    etnologia cientfica brasileira - entre estes ndios, nos anos 1930, so chocantes: os

    homens ainda nus, toras de corrida espalhadas por todos os cantos da aldeia (a marca da

    intensidade da vida ritual), o rigor dos enfeites e adereos usados pelos rapazes e

    donzelas associadas nos flagrantes dos rituais de iniciao tomados por Nimuendaj,

    tudo isso causa espanto, admirao e uma certa inveja nos Timbira que hoje revm estas

    fotos. A depopulao drstica que sofreram, aliada ao engajamento imposto pelo SPI e

    posteriormente FUNAI nas atividades produtivas de coleta e quebra de coco, vieram a

    interferir neste quadro, contribuindo para a determinao de um outro horizonte de

    futuro que o continuar sendo ndio e no conseqente abandono do calendrio ritual

    como norteador das atividades econmicas. Atualmente, depois da rea demarcada e de

    uma re-aproximao mais intensa com os demais grupos Timbira, acentuada pela

    participao na Associao VytyCati, os Apinaj vem retomando com maior empenho

    alguns de seus rituais.

    Os Krikati, por fora da invaso de suas terras por mais de 500 famlias de posseiros,

    dispem de poucos recursos do seu ambiente. Por conta desta situao - e por imposio

    de uma poltica equivocada da FUNAI esto residindo desde o incio dos anos 1970,

    numa nica aldeia. A convivncia forada entre subgrupos autnomos a causa da

    instabilidade poltica permanente que se verifica entre eles (cujo reflexo imediato so as

    constantes trocas de chefes) que, somada a situao de tenso advinda da indefinio

    sobre a demarcao de seu territrio, favorecem o clima de fuxico permanente em

    que vive a aldeia So Jos. Mas a presena de muitos velhos, por outro lado, propicia as

    constantes festas em vive a aldeia, aliviando um pouco o clima de tenso ali reinante.

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    Chefia e Representao Poltica

    Uma aldeia Timbira se constitui em um grupo local autnomo, isto , que age

    politicamente e se apresenta frente as outras aldeias como unidade. Esta autonomia

    gerada em e por um processo de ciso que leva algumas famlias a se desligarem da

    aldeia-me, por razes diversas (em geral, por acusaes de feitiaria ou por fuxico das

    mulheres). Mas esta autonomia s se completa quando o novo grupo tem condies

    reais de realizar sem concurso das demais aldeias, os rituais mais importantes do ciclo

    anual (ver infra, p. ). Esta unidade do grupo local se manifesta ainda na chefia (o pahi

    possui delegao dos grupos domsticos para decidir autonomamente sobre os interesses

    da aldeia kr) e na utilizao exclusiva de uma poro do territrio para caa e coleta

    (quando uma nova aldeia formada, seu local de instalao em geral acertado com os

    membros remanescentes da aldeia original, de forma a no sobrepor seus territrios de

    caa, fonte constante de atritos entre as aldeias).

    Cada aldeia tem seu chefe (pahi), como j foi dito, e possue autonomia de deciso;

    no existe nenhum outro poder, que acima das aldeias, representaria todas aldeias Krah

    ou Apinaj ou Kricati (como um conselho de chefes ou algo parecido). Mais

    recentemente, alguns Krah das aldeias situadas ao sul da rea, constituram, com apoio

    de um padre e um funcionrio da FUNAI, uma associao civil sem fins lucrativos,

    denominada Cpj (ptio grande), com sede no interior da rea indgena; as aldeias das

    margens do rio Vermelho tambm passaram a integrar uma outra associao formal

    indgena, denominada Vyty-Cati (vyty grande, com sede em Carolina e apoiada pelo CTI

    e congregando outras aldeias de povos Timbira); os Krikati tambm constituram uma

    associao recentemente. Mas estas associaes no tem mandato nem representao

    para tomar decises pelas aldeias ou pelos Timbira em geral. Por mais que se tente (a

    FUNAI ou pessoas de fora, amigas dos ndios, que vm nesta generalidade um avano

    poltico para eles), a autonomia poltica do grupo local ainda prevalece.

    Morfologia Social e Subsistncia

    Do ponto de vista da sua morfologia, as aldeias Timbira tem as suas casas dispostas em

    um crculo cujo centro um rea tambm circular e limpa (o ptio ou c ). Ligando as

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    casas, tem-se um caminho sempre mantido limpo, o krcap ; deste caminho nasce um

    outro, mais estreito (prycar), que saindo da frente de cada casa leva at o ptio.

    Lembra a forma de uma laranja cortada transversalmente ou uma roda de bicicleta com

    poucos aros.

    As atividades quotidianas nas aldeias obedecem a um calendrio ritual, regulado pelas

    atividades do ptio, centro das aldeias circulares e lugar da cena poltica propriamente

    dita e dos homens. Ali, toda manh e no final da tarde, os homens se renem com os

    governadores para decidirem ou avaliarem as atividades do dia (quem vai para a roa,

    quem vai caar etc.) ou as atividades necessrias para a concluso ou prosseguimento de

    um ritual em curso. Os governadores(sempre dois jovens) so escolhidos pelos mais

    velhos e pertencem necessariamente metade sazonal que domina a aldeia: se no

    Vero (estao seca) pertencem metade Wacmej; se no Inverno (estao das

    chuvas), devem pertencer metade Catmj. O ptio o lugar das atividades rituais e

    da vida pblica: tudo o que chega ali (sejam pessoas de fora ou bens materiais ou

    simblicos) tem que ser visto por todos, participado com todos ou dividido com a

    totalidade da aldeia.

    O kricap, ao contrrio, o lugar da mulher, da vida privada e das atividades cotidianas

    de subsistncia; aqui nada se divide porque se est entre parentes. A casa da mulher,

    assim como a roa, locais onde tem lugar as atividades de gerao e procriao dos

    filhos. A casa (kr) constitui o grupo domstico, unidade social que inclui uma

    mulher, seu marido e filhos, casados ou no. Logo, numa mesma casa, possvel

    encontramos de duas a quatro famlias elementares (pai/me/filhos). Em cada casa, seus

    membros maiores atuam juntos para prover a subsistncia dos filhos, obrigando os

    genros a trabalharem na roa das sogras e a repartir a carne conseguida (o homem

    sempre deixa um pedao da caa abatida por ele na casa da sua me e irms; mas

    obrigado a dar a maior parte para sua mulher e filhos).

    Estes fatos so acentuados pela regra de residncia uxorilocal (que determina que, com

    o matrimnio, o homem v residir na casa da mulher, isto , com a sogra) e fixa as

    atividades de subsistncia e procriao em torno da mulher, fazendo os homens

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    circularem entre duas casas (aquela da sua me, onde nasceu e foi criado e a aquela

    onde vai gerar sua descendncia) e pelos matos e cerrados, atrs da caa.

    A regra de residncia responsvel ainda pela constituio de outro grupo social, mais

    abrangente que o grupo domstico, o segmento residencial: quando uma a famlia

    elementar j possui filhas em condies de casamento, ela constri uma nova casa ao

    lado da casa de sua me. Portanto, numa aldeia Timbira, sempre teremos um linha de

    casas formada por um grupo de irms, que se ajudam mutuamente na tarefa de

    sustentao dos seus filhos. E a nomenclatura e regras de parentesco enfatizam esta

    solidariedade das irms ao determinar que todos nascidos num mesmo segmento

    residencial (e numa mesma gerao, claro) so chamados e tratados como irmos (isto

    , os filhos de irmos de mesmo sexo so irmos e no primos, como entre ns;

    logo, os filhos das irms so filhos e no sobrinhos). Coerente com estas regras, os

    maridos das irms so tratados tambm como maridos (e no cunhados), e as relaes

    sexuais entre eles toleradas. A regra simples e clara: se as irms (ou irmos) so

    iguais (porque gerados numa mesma casa), ento os homens (e mulheres)

    permitidos a uma (ou um) so permitidos(as) s demais.

    O sistema de nominao

    As pessoas passam, mas os nomes perduram. Toda perpetuidade e dinmica da

    estrutura social Timbira so dados e estabelecidos pelo sistema de nominao. Os nomes

    pessoais integram um estoque finito ( raro mas no impossvel criarem-se nomes

    pessoais novos) que pertencem ou esto vinculados a determinados segmentos

    residenciais: as mulheres agem como donas dos seus nomes e so responsveis

    pela sua transmisso.

    Muito antes de uma criana nascer o conjunto da sociedade j sabe o nome que ter, seja

    masculino ou feminino. A regra geral de transmisso determina que dois irmos (e o

    espectro genealgico preenchido por esta categoria amplo) de sexo opostos, ao se

    tratarem com o termo ituarmeinxi (o irmo falando) e ituarmeh (irm falando)

    transmitem seus nomes pessoais para o sobrinho ou sobrinha (ituar), que passa a

    chamar o tio nominador de ktti e a tia nominadora de tyj. Ao herdar o nome pessoal, os

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    sobrinhos herdam tambm todas as posies sociais dos tios nominadores, sejam elas

    posies de parentesco, cerimoniais ou rituais. Isto quer dizer que, ao dizer o seu nome

    para um terceiro (de uma outra aldeia), um Timbira j saber de antemo a qual das

    metades cerimoniais este indivduo pertence, se seu parente ou seu afim e

    sobretudo, quais as mulheres ou homens que lhes so permitidos ou proibidos. Est

    demonstrado (in Ladeira, 1982) que para a casa onde vai o nome no vai o cnjuge e

    vice-versa. A dinmica e a teia responsvel pela estrutura social Timbira dada por

    estes dois sistema de trocas vinculados: a troca de nomes e a troca de cnjuges, sistemas

    estes que fund