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Imagem 04.Tomografia computadorizada do tórax, após a injeção intravenosa de meio de
contraste
Paciente JJS, masculino, 42 anos, há 2 meses iniciou quadro de dor torácica à direita, com
piora progressiva e irradiação para ombro direito e região cervical associada à tosse seca e
dispneia. Evoluiu com edema cervicofacial, exacerbado pela posição supina. Refere perda
ponderal de 7 kg nos últimos 2 meses e episódios de calafrios e febre de 38°c. Ao exame,
presença de edema cervicofacial e de membros superiores, mais intensos à esquerda.
Presença de telangiectasias e circulação colateral em regiões mamárias, supra e
infraclaviculares.
De acordo com as imagens e a história clínica, qual o diagnóstico mais
provável?
a) Insuficiência cardíaca
b) Tumor de cabeça e pescoço
c) Síndrome da veia cava superior
d) Pericardite aguda
Imagens 1 e 2: Fotografias evidenciam edema facial, mandibular, cervical e de membros superiores, ligeiramente mais intensos à esquerda. Região cervical e andar superior do tórax pletóricos. Telangiectasias e circulação colateral supra e infraclaviculares e em regiões mamárias. Cicatriz de biópsia de linfonodo em região supraclavicular à direita.
Imagem 3: Radiografia simples do tórax, incidência posteroanterior: opacidade para-hilar direita com limites pouco definidos (área amarela) sugerindo comprometimento estrutural pulmonar adjacente associada à elevação da cúpula frênica (paralisia ou eventração; seta verde) e a acúmulo líquido pleural (obliteração do seio costofrênico lateral; seta azul); pequeno desvio da porção inferior da traquéia para a esquerda (seta vermelha).
Imagem 4: Tomografia computadorizada do tórax, após a injeção intravenosa de meio de contraste iodado, nível subcarinal: veia cava superior com calibre reduzido (seta azul) devido a compressão por lesão expansiva circunjacente (massa linfonodal; área verde), que ocupa parcialmente os sítios mediastinais pré-vascular e paratraqueais direitos. Em outros planos foram evidenciados tromboembolismo pulmonar e derrame pleural à direita.
Diagnóstico
O paciente apresenta sinais de congestão (pletora cervicofacial, telangiectasias no tórax, dispneia e dor torácica) associados a sinais e sintomas sistêmicos (perda ponderal, febre e calafrios), quadro compatível com a síndrome da veia cava superior (SVCS). A radiografia simples do tórax, incidência posteroanterior, evidenciando opacidade para-hilar direita associada a derrame pleural e elevação da cupúla frênica ipsilaterais, corroboram essa hipótese.
Na insuficiência cardíaca o aparecimento da doença é, normalmente, mais insidioso. Os sinais de congestão iniciariam nos membros inferiores e evoluiriam de maneira ascendente se não houvesse controle da doença, enquanto na SVCS esses se restringem às regiões cervicofacial e superior do tórax.
Os vários tipos de câncer de cabeça e pescoço tipicamente evoluem com odinofagia e disfagia no início do quadro. Muitas vezes o paciente apresenta rouquidão como primeiro sintoma e a congestão não é tão exuberante como no caso apresentado.
A pericardite aguda evolui com dor torácica de intensidade importante, que melhora com posição sentada, acompanha-se de adinamia, mal-estar e febre. O comprometimento diastólico, em tese, poderia levar a sinais de congestão vascular, mas em grau substancialmente menor que no presente caso.
Discussão do caso
A Síndrome da Veia Cava Superior (SVCS) representa um conjunto de sinais (dilatação das veias do pescoço, pletora facial, edema de membros superiores, cianose) e sintomas (cefaleia, dispneia, tosse, edema de membro superior, ortopneia e disfagia, entre outros)
decorrentes da obstrução do fluxo sanguíneo através da veia cava superior em direção ao átrio direito.
A veia cava superior (VCS) é formada na porção superior do mediastino médio pela fusão das veias braquiocefálicas direita e esquerda, pela quais recebe a drenagem venosa da cabeça, SNC, região cervical, membros superiores e parte do tórax, e desembocando no átrio direito.
Imagem 9: Representação ilustrativa da anatomia da veia cava superior. (Fonte: http://scolarite.fmp-usmba.ac.ma/cdim/mediatheque/e_theses/14-07.pdf)
Anteriormente, as principais causas de SVCS eram as doenças infecciosas. Hoje, estima-se que 70% dos casos sejam decorrentes de carcionama indiferenciado de pequenas células. Linfomas, carcinoma metastático de mama e bócio subesternal são causas menos frequentes.
As manifestações da SVCS ocorrem devido à obstrução do retorno venoso da veia cava superior ao átrio direito. A VCS é vulnerável à obstrução devido aos seguintes fatores: sua localização estratégica no compartimento visceral do mediastino, cercada por estruturas rígidas como esterno, traqueia, brônquio direito, aorta e artéria pulmonar direita; sua parede fina, facilmente compressível; o transporte de sangue em baixas pressões; e a presença de linfonodos mediastinais circundando-a completamente (subcarinais, perihilares, paratraqueais). A dispneia, a pletora facial e o edema cervicofacial são os sintomas mais frequentes e até 60% dos pacientes apresentam algum deles ao procurar auxílio médico. As síncopes acontecem devido a elevada pressão venosa no sistema nervoso, o que proporciona hipóxia transitória.
Imagem 10: Esquema representando os principais sinais da SVCS. (Fonte: http://semiologiamedica.blogspot.com.br/2011/09/sindrome-da-veia-cava-superior.html)
A progressão da massa mediastinal leva ao surgimento de outros sinais e sintomas como edema de membros superiores, disfagia, dor torácica, queda do nível de consciência, (obnubilação e coma) e circulação colateral na parede torácica.
O sinal característico da síndrome é o sinal de Pemberton, que consiste na elevação dos membros superiores acima da cabeça o que leva aumento da pressão venosa na VCS, acentuando a pletora cervicofacial. O paciente pode queixar-se de tonturas e piora da dispneia. Geralmente os sintomas são piores pela manhã, já que o decúbito aumenta a dificuldade ao retorno venoso.
O diagnóstico da SVCS é principalmente clínico. Os exames de imagem são complementares e auxiliam na avaliação da gravidade. A maioria dos pacientes apresenta alterações, como alargamento de mediastino e derrame pleural, à radiografia de tórax em PA e perfil. Tomografia computadorizada (TC) com contraste venoso e cavografia superior são os exames com maior sensibilidade e especifidade para o diagnóstico da SVCS e permitem melhor avaliação da causa, nível e extensão do bloqueio venoso. A ressonância magnética é útil em pacientes com alergia ao contraste ou nos que há dificuldade para obtenção do acesso venoso.
Até o tratamento definitivo, o paciente deve receber cuidados para prevenir hipertensão intracraniana (HIC), que ocorre devido à congestão vascular. Cabeceira elevada, repouso,
dieta hipossódica, diuréticos de alça são medidas utilizadas para prevenção da HIC. O tratamento definitivo requer o estabelecimento do diagnóstico etiológico.
Evolução
Paciente foi submetido a biópsia e imuno-histoquímica, cujos achados indicaram o diagnóstico de Linfoma não Hodgkin difuso de grandes células B. Iniciou-se então quimioterapia em 8 ciclos, no esquema R-CHOP (Rituximab, Ciclofosfamida, Doxorrubicina, Vincristina e Prednisona), seguida de radioterapia. Atualmente, o paciente está no 6º ciclo de quimioterapia. Nova TC será realizada para re-estadiamento.
Aspectos relevantes
- A síndrome da veia cava superior (SVCS) consiste em um conjunto de sinais e sintomas congestivos,decorrentes da obstrução do fluxo sanguíneo através da veia cava superior.
- Estima-se que 70% dos casos de SVCS sejam decorrentes de carcionama indiferenciado de pequenas células.
- O diagnóstico é essencialmente clínico. Exames de imagem, como a TC com contraste venoso e a cavografia superior, auxiliam na identificação do comprometimento na drenagem venosa.
- O paciente deve receber cuidados para prevenção da hipertensão intracraniana até que o tratamento definitivo seja estabelecido.
- O diagnóstico etiológico orienta a conduta terapêutica.
Referências
- Lopez M, Laurentis J. Semiologia Médica. 5 ª ed.
- Cordeiro SZB, Cordeiro PB. Síndrome de veia cava superior. J Pneumol 2002;28(5):288-93.
- Porto CC, Porto AL. Semiologia Médica. 6ª ed
- Cervantes A, hirivella I. Oncological Emergencies. Ann Oncol. 2004; 15 Suppl 4:iv299-306.
Responsáveis
Júlio Guerra Domingues, acadêmico do 11º período da FM-UFMG. E-mail: jgdjulio[arroba]gmail.com
Lucas Diniz Machado, acadêmico do 11º período da FM-UFMG. E-mail: lucasdiamantina[arroba]hotmail.com
Orientadores
Valéria Maria Augusto, professora do departamento de clínica médica da FM-UFMG. E-mail: vmaopneumo[arroba]gmail.com
José Nelson Mendes Vieira, professor do Departamento de Anatomia e Imagem da FM-UFMG. E-mail: zenelson.vieira[arroba]gmail.com
Revisores
Letícia Horta, Júlia Petrocchi, Barbara Bragaglia, Luanna Monteiro e professora Viviane Parisotto.
Agradecimento
Material elaborado em parceria com a monitoria de Semiologia Médica da FM-UFMG.