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I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ

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Coletânea textual em prosa e verso, escrita por vinte destemidos marajoaras de coração e de berço, dos muitos que temos neste torrão. Hábeis autores que confiaram ao Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) a árdua, mas gratificante, incumbência de organizar, editar e conduzir à luz da publicação esta pioneira obra.

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I Antologia Literária do

Marajó

I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ

Comissão editorial Dilomeno Márcio Maués Vitelli Jorge Domingues Lopes Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho Marcos Antônio Maués Vitelli Maria Dalva Viana Lima

RevisãoJorge Domingues Lopes

Marcos Antônio Maués Vitelli

Projeto gráfico, Editoração eletrônica e CapaDilomeno Márcio Maués Vitelli

Jorge Domingues Lopes

Ficha catalográficaHilma Celeste Alves Melo (CRB 2/374)

Impressão e acabamentoGráfica da Universidade Federal do Pará

O motivo ornamental utilizado nesta Antologia foi baseado no desenho de uma peça de cerâmica “tortual de fuso, decorado com motivos incisos”, do livro “Motivos ornamentais da cerâmica

marajoara: modelos para o artesanato de hoje” (2005, p. 104), do Pe. Giovanni Gallo.

Todos os textos desta Antologia são de inteira responsabilidade de seus respectivos autores, que autorizaram expressamente a sua publicação pelo CPOEMA.

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

I Antologia Literária do Marajó / organizadores Dilomeno Márcio Maués Vitelli, Jorge Domingues Lopes. - Belém: CPOEMA EDITORA, 2009.

216 p.

ISBN 978-85-2470386-7

1. Poesia brasileira – Pará. 2. Prosa brasileira – Pará. I. Vitelli, Dilomeno Márcio Maués, org. II. Lopes, Jorge Domingues, org.

CDD – 20.ed.869.91

Todos os direitos desta publicação reservados para o Clube do Poeta e do Escritor Marajoara – CPOEMA

5.a Rua, 1069, 68870-000, Centro-Soure-Pará

Impresso no BrasilPrinted in Brazil

Dilomeno Márcio Maués Vitelli Jorge Domingues Lopes

Soure2009

Organizadores

I Antologia Literária do

Marajó2ª edição

Apresentação

A I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ é uma coletânea textual em prosa e verso, escrita por vinte destemidos marajoaras de coração e de berço; dos muitos que temos neste torrão composto pelos municípios de Cachoeira do Arari*, Salvaterra, Santa Cruz do Arari e Soure. Hábeis autores que confiaram ao Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) a árdua, mas gratificante, incumbência de organizar, editar e conduzir à luz da publicação esta pioneira obra.

Não usaremos este valioso espaço para delinear as inúmeras dificuldades que o escritor encontra para publicar um livro, sobretudo no Marajó. Mas, vale a nota de que, mesmo diante da ausência de patrocínio oficial, a presente obra é sonho palpável, graças, antes de tudo, a Deus e depois aos autores, familiares, amigos e mecenas que depositaram sua confiança no Cooperativismo, ferramenta indispensável para se chegar ao objetivo comum: publicar esta Antologia Literária.

A abrangência da obra, abastada pela diversidade de seus autores, cada um com seu estilo próprio em forma, temática e conteúdo, é prova cabal de que unidos somos capazes de transformar nossas aspirações em realidade, como bem nos lembra o educador Paulo Freire: “Não podemos deixar de sonhar sonhos possíveis”. Neste sentido, o volume da nossa força de vontade só se compara ao grande Lago Arari, que gentilmente empresta seu nome ao título desta Antologia.

Sendo merecedora de nossa atenção, a coletânea em foco é, provavelmente, um novo referencial na história da cultura marajoara, pois, pela primeira vez, contistas, cronistas e poetas marajoaras promovem uma ação conjunta e inédita na região. Iniciativa marcante,

* Arari vem do tupi *ara’ri “variedade de arara” (forma histórica, 1928 arary), logo rio Arari = rio das araras, é também nome de um cipó (cipó-cururu), encontrado nas margens dos rios da região. Marajó, maior arquipélago de ilhas fluviomarinhas do planeta, provém do tupi mbara-ïo “tirado do mar, anteparo do mar”, em alusão à posição da ilha na foz do Amazonas, segundo Teodoro Sampaio (Cf. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001).

tanto pelo valor de seus escritos, quanto pela relevante contribuição à bibliografia do gênero. Pororoca de palavras que traz movimentação artística ao Arquipélago do Marajó.

Almejamos que o presente livro, construído nesta primeira edição a vinte mãos, incentive muito mais o escritor à seara das letras, o leitor ao gostoso hábito da leitura e que fomente, de alguma forma, outras iniciativas no campo sociocultural do Estado do Pará.

Aqui também externamos nossa gratidão a todos que colaboraram para a construção deste livro; a todos os autores que dão mais um passo relevante, quiçá, rumo à nobre carreira literária; e, de modo especial, a Maria Dalva Viana Lima, Jorge Domingues Lopes, Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho e Marcos Antônio Maués Vitelli; dinâmicos e corajosos membros do CPOEMA e da Comissão Editorial, com os quais tivemos a honra de trabalhar.

Com um abraço do tamanho da Amazônia, desejamos a você boa leitura. Até logo!

Dilomeno Márcio Maués VitelliPoeta, pedagogo e ex-presidente do CPOEMA

Sumário

Prefácio ...................................................................................................................................................................... 13

Ailton Silva Favacho .......................................................................... 16Moleque atrevido ........................................................................... 17Me nina, moça ............................................................................... 25

Alcindino Pacheco Portal .................................................................. 26Salvaterra ....................................................................................... 27Sabores marajoaras ........................................................................ 28Jovens da 3ª idade .......................................................................... 29Ode ao Pará .................................................................................... 29Abacaxi .......................................................................................... 30Sindicato Rural .............................................................................. 31O bezerro de duas cabeças .............................................................. 32Conheça o Marajó I ........................................................................ 33Conheça o Marajó II ....................................................................... 34Búfalo do Marajó ........................................................................... 35

Dilomeno Márcio Maués Vitelli ....................................................... 36Mona lisa ....................................................................................... 37Ela é a onda .................................................................................... 37Volta pra mim ................................................................................ 38Bálsamo derramado ........................................................................ 39Soure por um fio de poesia ............................................................. 40Tempo nublado .............................................................................. 41Sexta-feira Santa ............................................................................ 42Palavra é crueldade ........................................................................ 42O dia-a-dia da poesia ..................................................................... 43Melodias do mar ............................................................................ 44A passos atrás ................................................................................ 45

Jorge Domingues Lopes ..................................................................... 46A última palavra ............................................................................ 47As águas ......................................................................................... 49A ferida .......................................................................................... 50Elementar I – Ares da Terra .......................................................... 52Elementar II – Fogo ....................................................................... 53Elementar III – Água ..................................................................... 54Ao amar ......................................................................................... 55

José Antônio Monteiro Muribeca ..................................................... 56No tempo de João Vianna .............................................................. 57Brilhante Cachoeira ....................................................................... 58Lembrando Dalcídio ....................................................................... 59Marajó supremo ............................................................................. 60Meu Marajó ................................................................................... 61Ge ................................................................................................... 62Quero ............................................................................................. 63Meu poema, seu poema .................................................................. 64Amor em poema ............................................................................. 65És ................................................................................................... 65

José Lúcio Sarmento Alves ................................................................ 66O Boto, uma versão científica ........................................................ 67A gana humana .............................................................................. 74Canção ao vento ............................................................................. 74Anjo ............................................................................................... 75

Liz Carla Silva Castro ......................................................................... 76Navegante sonhadora ..................................................................... 77Contemplação marajoara ............................................................... 78Olhos de inspiração ........................................................................ 80Dentro de mim ............................................................................... 81Eterno laço ..................................................................................... 82O meu amor não morrerá .............................................................. 83É sempre assim .............................................................................. 84Saudade .......................................................................................... 85

Luíz José Monteiro Cecim ................................................................. 86Anjo e demônio .............................................................................. 87Bocas .............................................................................................. 88Canção da esperança ...................................................................... 88Do fundo d’alma ............................................................................ 90Vozes .............................................................................................. 91É preciso ......................................................................................... 92Ociosidade interior ....................................................................... 93Procissão ........................................................................................ 94Sussurros ....................................................................................... 95

Luiz Tarciso Coelho Bezerra ............................................................. 96Banco da Amazônia – 50 anos, em set./2006 ................................. 97Brincadeiras ................................................................................... 98Cândida .......................................................................................... 99E o que é que me falta fazer mais? ................................................. 99O cachorro ...................................................................................... 100Prazer carnal .................................................................................. 100Minha aposentadoria ..................................................................... 101Patativa do Assaré e Assaré do Patativa ....................................... 103Preto Jovêncio, O Vaqueiro ........................................................... 104Quem é a Mulher? ......................................................................... 105Soneto do Amor Ausente ............................................................... 105

Marcos Antônio Maués Vitelli ................................................................ 106A magia do amor ............................................................................ 107Desencanto ..................................................................................... 108Distância ........................................................................................ 109Escolha ........................................................................................... 110Mutismo ........................................................................................ 111Recordações .................................................................................... 112Saudade .......................................................................................... 113Tempo ............................................................................................ 114Vozes no poema .............................................................................. 115

Maria Jardelina Pinheiro ................................................................... 116Harpa do poeta ............................................................................... 117Quero te amar ................................................................................ 117Musa dos poetas ............................................................................. 118O vento .......................................................................................... 119Madona .......................................................................................... 120Triste separação ............................................................................. 121Cabocla morena .............................................................................. 122Cidade das mangueiras .................................................................. 123O nascimento da Princesinha do Marajó ...................................... 124

Maria José Barros de Almeida .......................................................... 126Minha inspiração .......................................................................... 127Terra querida ................................................................................. 128Santa Cruz, linda e faceira ............................................................ 129Minha terra .................................................................................... 130Minha mãe Rosa, meu porto seguro .............................................. 131

Pra sempre te amar ........................................................................ 132Para Anderson e Bárbara ............................................................... 133Sua fé ............................................................................................. 1342° Domingo de Maio ...................................................................... 134

Maria Justina Sabóia .......................................................................... 136Outra vez ....................................................................................... 137A filha do sol .................................................................................. 138Imenso sentimento ......................................................................... 139Ilha maravilha ................................................................................ 140Marajó curumim ............................................................................ 141Marajó em canto ............................................................................ 142Lágrimas de um rio ........................................................................ 143Cotidiano ........................................................................................ 144Amor cigano .................................................................................. 145

Max Barbosa Gomes ................................................................................... 146Marajó ............................................................................................ 147Pedaço da Amazônia ...................................................................... 148Exaltação ........................................................................................ 149Madrugada cachoeirense ................................................................ 150Lucidez ........................................................................................... 151O louco ........................................................................................... 152Eu e meu ........................................................................................ 152Paz e tristeza .................................................................................. 153Vinte de março ............................................................................... 154O problema .................................................................................... 155

Mestre Tomaz ................................................................................................ 156HISTÓRIAS E LENDAS .............................................................. 157Pretinho da Bacabeira .................................................................... 157A Carrocinha ................................................................................. 157O Vaqueiro Boaventura ................................................................. 158Mãe de Fogo ................................................................................... 158A Verdadeira História do Lobisomem ........................................... 158O Fantasma ................................................................................... 160As Cidades do Marajó e suas Tradições ......................................... 161Reação Clube .................................................................................. 162VERSO EM RIMA DE PROSA .................................................. 163Dia das Mães ................................................................................. 164O Toco ............................................................................................ 165

Otávio da Silva Nascimento Júnior ................................................. 166Sinto ............................................................................................... 167A grande Ilha de Marajó ................................................................ 168Lembranças daquela carta .............................................................. 169Ao meu conterrâneo ....................................................................... 170Maisa ............................................................................................. 171Olhos .............................................................................................. 171Boto ................................................................................................ 172Ontem, hoje e o amor ..................................................................... 173Vem ................................................................................................ 174Nunca ............................................................................................ 174Uma lágrima escondida ................................................................. 175

Reginaldo da Consolação Monteiro ................................................ 176Um símbolo de amor ...................................................................... 177Uma velhice feliz ............................................................................ 177O poeta é um sofredor .................................................................... 177Quando a vi pela primeira vez ....................................................... 178Na verdade, quem sou eu? ............................................................. 180Dia das mães sem você ................................................................... 181O preço de uma alucinação alcoólica ............................................. 183Uma inesquecível noite de amor .................................................... 184

Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador ......................... 186Heróis anônimos ............................................................................ 187Soure .............................................................................................. 189Belezas naturais ............................................................................. 190Cultura .......................................................................................... 191Feliz cidade .................................................................................... 192Olhos de poeta ................................................................................ 193Ilha de esperança ............................................................................ 194

Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa ................................................... 196A natureza e um sofredor .............................................................. 197Cristão ............................................................................................ 198Dádivas .......................................................................................... 198Egoístas .......................................................................................... 199Eu sei ............................................................................................. 200Últimas palavras ............................................................................ 201Sinais de realidade ......................................................................... 202

Fernanda ........................................................................................ 203O poeta apaixonado ........................................................................ 204Sabedoria ........................................................................................ 205Rosa ................................................................................................ 205

Sinval Lyra, Dr. .................................................................................. 206Acróstico ........................................................................................ 207Devaneio ........................................................................................ 208A chuva .......................................................................................... 209Experiência de amar ....................................................................... 210Nova aurora ................................................................................... 211Doce ilusão ..................................................................................... 212Caminhando ................................................................................... 213O luar ............................................................................................. 213Enganos ......................................................................................... 214Consumatum est ............................................................................ 214

Prefácio

Ao ler a I Antologia Literária do Marajó, deparei-me com a singeleza da expressão do sentimento artístico e com o amor pelo fascinante mundo amazônico do Arquipélago do Marajó. Lembrei-me de um texto de Jorge Luís Borges que diz:

“Não apenas o escritor, mas todo o homem deve se lembrar de que os fatos da vida são instrumentos, (...) tudo que lhe aconteceu (...) funciona como argila, como material que deve ser aproveitado para sua arte”.

É desta argila que se formou esta Antologia. Da vida simples de pessoas comuns emanou o sentimento artístico, que se transfigurou em versos e contos. São sonetos e odes ao lado de poemas escritos com versos livres, brancos e até formas concretistas; há contos e microcontos ao lado de crônicas sobre lugares e situações do cotidiano.

Enfim, tudo isso traduz a vida, no inquietante cismar do artista com a palavra, cujo esforço coletivo dos escritores, vale ressaltar, alguns estreantes outros mais experientes, trouxe a público esta obra.

É na palavra peculiar do homem caboclo, filho ou não desta Ilha, que deseja expressar, por meio da literatura, a experiência com a terra, seu encatamento pela natureza, suas paixões, venturas e desventuras, que cotejamos o limiar entre o vivido e o imaginado. Por isso, alguns textos, mesmo seguindo a matriz das tradições orais amazônicas, destacam, além dos aspectos culturais da região, traços de uma produção literária contemporânea que almeja a universalidade.

A atmosfera mística de um mundo habitado por “pretinhos”, “botos”, “vaqueiros”, criaturas mágicas que povoam encruzilhadas, estradas, rios, igarapés, matas e fazendas, e compõem o cenário para esses artistas em cujo ufanismo ressaltam e exaltam um Marajó desconhecido, que se vai desnudando pouco a pouco nos textos. Assim, ao reunir escritores dos municípios de Cachoeira do Arari, Soure,

Salvaterra e Santa Cruz do Arari, observamos, de certo modo, a própria composição da identidade marajoara.

Por isso, o cantar a terra passa pela idealização de uma natureza idílica e segue para mostrar, por meio da ficcionalidade, a vida real de homens e mulheres reais que aproveitam da vida, argila de sua arte, todos os sentimentos que revolvem seu espírito criador e que marcam seu regionalidade.

Elizabete Raiol LopesProfessora de Literatura Brasileira

I Antologia Literária do Marajó

“Com as palavras nasciam rumos, sombras,movimentos, impulsos,

novos ares.”

Jorge de Lima(Canto V – Poemas da Vicissitude.

Invenção de Orfeu, 1952)

Ailton Silva Favacho

Nasceu em Soure-PA, no dia 04 de setembro de 1980. De origem humilde, sempre se dedicou aos estudos, tendo ingressado, aos 17 anos, na UFPA, licenciando-se em Letras, habilitação em Língua Portuguesa. Descobriu, desde muito cedo, o gosto pela leitura e pela escrita, chegando a compor pequenas narrativas e poemas. Carteiro de ofício e filho de professora e marceneiro, costuma exercer as profissões de ambos, além de dedicar-se ao artesanato e a movimentos sociais.

Meus agradecimentos elevo a Deus por ter-me concedido este singelo talento e a todos os meus familiares e amigos que me incentivaram, contribuindo sig-nificativamente para que pudesse participar desta publicação.

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Ailton Silva Favacho

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MOLEQUE ATREVIDOMaldito do homem que não sonha.

Passava-se julho quando Caio e Bete haviam concluído a Faculdade de Engenharia Civil. O desemprego assolava o país, grande era a concorrência na capital. No jornal, a oferta de vagas numa pequena cidade do interior. Vivia-se o período das obras que só se edificam próximo às eleições. Era preciso tentar impressionar o povo, descrente diante de tanta corrupção.

Não havia escolha. Já se fora o tempo em que se podia apontar o lugar para exercer um ofício. Preencheram os requisitos exigidos e conseguiram trabalho, sazonal. Dias depois, partiram cedo, de madrugada. No céu, a lua e as estrelas cintilavam sobre o caminho para Niili, localizada numa região em que as fazendas de búfalos compunham quase todo o cenário e onde, à época, reinava a estiagem, impiedosa e voraz. Nunca estivera tão quente e seca. A televisão noticiava o aquecimento que o homem fomenta e pelo qual paga alto preço.

Às margens da estrada, a vegetação e a água tinham desaparecido, e um enorme zebu olhava a seu redor procurando o que comer. Mas o fogo já comera praticamente tudo. Somente algumas poucas árvores restaram. Durante horas, a paisagem parecia nada se alterar. Pensavam ter brecado. Só pensavam. A viagem, longa e triste, lenta e incomodamente ia consumindo-lhes as forças. No caminho, inúmeras pessoas eram encontradas, em geral saindo em busca de uma vida melhor. Grande era o êxodo; pequena a chance de conseguir o que se queria.

Após tanto sacrifício, finalmente chegaram. Logo foram em busca de um local para tomar banho e para saciar a sede e a fome que os massacravam há horas. Por coincidência, Caio encontrou Tonho, um velho amigo de infância, por quem foi convidado, juntamente com Bete, para conhecer-lhe a residência. Na casa, havia não só água e comida como também conforto similar àquele do qual ambos dispunham em sua casa. A refeição parecia ter sido temperada com sonífero, fazendo-os adormecer a tarde inteira. Tarde ensolarada, bastante apropriada a um passeio, mas faltava-lhes energia.

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Quando o sol já se recolhia para seu descanso diário, acordaram e resolveram sair para ver o lugar em que estavam, o que lhes esperava. Passearam muito e puderam vislumbrar um local abandonado, onde não havia sequer um parque ou cinema. Restava a pracinha, na qual crianças brincavam de pião, de roda e de peteca. Brincadeiras raras e já quase extintas pelos vídeogames e computadores.

Achavam já ter visto o suficiente para aquele dia. Regres-saram para casa. No noticiário da noite, guerras, violência, conflitos. Estaria o racional em regressão? Após o jantar, os dois acomodaram-se em um quarto que o amigo lhes concedeu para ficarem enquanto durasse a realização das obras nas quais iriam trabalhar já a partir do dia seguinte.

Ao amanhecer, nuvens excêntricas em conjunto com raios solares traziam consigo um tom enigmático, misterioso. A sinfonia dos pássaros anunciava o nascer de mais um dia, o início de mais um capítulo de uma novela real e infinda de um povo cuja sombra eram as dificuldades, diversas. A esperança, o sofrimento, a incerteza, tudo voltava à cena. Na cozinha de uma velha casa, onde morava Chica, a vizinha e lavadeira de roupas de Tonho, ouviu-se uma voz pueril, corajosa:

— Mãe, sonhei que era médico, conseguia dinheiro e uma casa grande e bonita. A gente não passava mais fome.A mãe, chateada com o marido, que costumava chegar embriagado, tentando espancá-la, retrucou:

— Deixa de besteira, Leo. Cuida é de ir vender o chopp que a Dona Marciana fez. Nós precisamo é de dinheiro e não desses sonho besta. Hoje não temo nem café, e teu pai já tá bebendo lá no Custódio. Cuida, vai logo, garoto! E vê se não volta pra casa sem nenhum trocado.

Incentivar sonhos era coisa que não se fazia em Niili. Aprendera-se desde cedo a viver daquele jeito, a aceitar aquela realidade, aquelas condições difíceis de sobrevivência. Não se podia nem se queria sonhar; muitos pareciam estáticos diante de tudo. E nada faziam para burlar tal sina e alterar o cruel destino. Perdiam horas envolvidos em jogos de cartas. Jovens e adultos. As cartas sobre a mesa

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geravam um outro mundo, cheio de fantasias, no qual mergulhavam sem perceber que o tempo não dá tempo a quem acha que tem tempo de fazer algo sempre adiado. Mais pareciam crianças, cuja limitação diante da miséria e da falta de oportunidades as fazia brincar ao invés de lutar contra inimigos aparentemente indestrutíveis.

Miro era pai de Leo e de mais cinco filhos. Jamais lhes afagou a face, nunca os abraçou. Tornara-se alcoólatra, maltratava a companheira e havia anos que não trabalhava. Vivia a família do pouco gerado pela lavagem de roupas e dos trocados que Leo conseguia durante horas de andanças. Da mulher doíam as mãos calejadas; das crianças, a barriga.

— Mamãe, lá vem o papai. — Dizia, já choramingando, a pequena Lu, que via na presença do pai uma ameaça.

— Vão pra casa da vó de vocês, mas não falo nada pra ela. — Ordenava a sofrida esposa, poupando os filhos de mais um conflito.

— Cadê a bóia, já tá pronta? Quero cumê. Cadê o cumê? ― Chegara o homem, bêbado, faminto e constantemente irado.

Nada lhe dizia Chica. O silêncio talvez fosse a melhor saída. Talvez. O porre irritava-se ainda mais ao sentir-se ignorado.

— Tu não fala, não? — Indagava Miro já segurando a mulher pelos braços e cabelos.

— Me solta, safado! — Retrucava ela, agatanhando-lhe o rosto. Aquela cara monstruosa que até os filhos conseguia afugentar. Não gostavam dele as crianças. Era ríspido, inacessível, cruel. O jogo de cartas era bem mais atraente que a própria família. Lá bebia, o dia todo, a cachaça, o líquido que o destruía sem que se desse conta. Perdera o emprego, o respeito e a confiança. Tornara-se um marginal, evitado por quase todos. Transformara-se num bicho a vagar sem rumo, caminhando sempre em direção a lugar nenhum.

Os tempos eram difíceis em Niili. A miséria era a sombra de muitos. Para poucos sorriu a vida. Emprego e dinheiro pareciam estranhos ou desconhecidos a incontáveis indivíduos. Leo continuava a sonhar com a medicina. Realizar-se seria a glória para o menino pobre e negro da humilde cidadezinha. Queria poder curar crianças carentes, mudar de vida, ajudar a família, mas ainda era moleque e

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não tinha apoio ao menos para manter vivo o sonho. Apesar disso, sua persistência e determinação sufocavam a carência de incentivo e o preconceito para os quais muitas pessoas se rendem. Chamavam-lhe de Pretinho da Bacabeira, zombavam-lhe da cor. E não é que o moleque tinha algo de Pretinho! Ambos eram ousados, atrevidos, sagazes. Contrariamente ao que desejavam, os ignorantes que o discriminavam traziam-lhe à mente a figura do lendário, impositor de autoridade e respeito.

Nas ruas, onde passava horas a trabalhar, Leo vivenciou diversas experiências, tornou-se excelente moleque de negócios, aprendeu a se defender das arapucas da vida e fortaleceu-se. Tanto que foi capaz de dizer não quando os meninos que não sonhavam lhe ofereceram cola para cheirar e cachaça para beber. Jamais poderia ser um médico alcoólatra ou drogado, porque assim não salvaria as vidas como as queria. Sofria muito nas ruas. Sempre surgia alguém para querê-lo humilhar. Era preço pago por não ter um pai do tipo que toda criança quer. Fazia dele às vezes. Tinha de labutar duramente para alimentar os irmãos-filhos e tentar dar-lhes o mínimo de condições para sobreviverem. Um moleque-homem. Mais homem que moleque. Consumira-lhe a infância o trabalho nas ruas. Um mal necessário do qual extraía comida e roupas, ainda que parcas. Quando possível, adorava ler bons livros. Gostava do Alfredo, aquele do caroço de tucumã; ria do Macunaíma e admirava Castro Alves, porque defendia os negros.

Os dias passaram. Leo amadureceu. Conseguiu, apesar de tudo, concluir os estudos. O pai morrera. O vício o matara. A mãe envelhecera e agora precisava dele como nunca. E ele sempre estivera ao lado dela. Era um filho obediente, carinhoso. Tinha virtudes que muitos filhos equivocadamente desprezam. Era também bastante esforçado nos tempos de escola. Estava determinado a chegar ao destino apontado. Estudar significava a maior arma para superar todos os obstáculos que a vida lhe impusera. Precisava vencer por si só e tinha em seu interior a vontade de vencer. Queria escrever a própria história, conforme a planejara.

Durante horas, ficava embaixo das mangueiras, pensando no futuro. Para buscar o que queria, era preciso passar a morar na Capital.

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Mas não poderia partir diante do debilitado estado de saúde da mãe. Jamais a deixaria. Pensava também em Clóvis, um fazendeiro que conhecera há anos quando Leo ainda era garoto. Conheceram-se num dia em que o gentil senhor foi a Niili numa balsa buscar uns búfalos, como costumavam fazer os criadores que exploravam a terra e a gente niiliense para construírem seus impérios na Capital. Leo viu a embarcação e foi até lá para vender chopp. Vários homens lá estavam e pediram a aproximação do garoto. Ele assim o fez. E os tripulantes passaram a servir-se do produto vendido pelo guri. Depois, alguns o mandavam embora recusando-se a pagar. De súbito, Clóvis chegou, percebeu o que estava acontecendo e ficou observando, revoltado, aquela cena. O menino suplicava para que lhe pagassem, porém só recebia em resposta sarcásticos risos que torturavam sua alma pueril. Chegar sem o dinheiro certo significaria perder a pequena comissão a qual teria direito. Talvez Chica lhe batesse, achando estar Leo envolvido em molecagem, deixando de ser o filho responsável, por quem sempre teve admiração. Ele chorou, e Clóvis resolveu sair da platéia e interferir:

— Por que não pagam o menino, se sabem da importância que esse dinheiro tem para ele? Gostariam vocês que outros fizessem o mesmo com seus filhos? Ficariam felizes ao vê-los humilhados da maneira como o vejo agora? Deveriam sentir pena dele e ajudá-lo, e não fazer uma coisa dessas com uma criança sacrificada pela sociedade e, principalmente, por pessoas como vocês.

Palavras ferem. Às vezes, até mais que um golpe contundente. As palavras ferem a alma e sufocam inclusive alguns daqueles julgados fortes e insensíveis. Inertes, os homens fitavam Clóvis e, sem dizer-lhe sequer uma palavra, pois as mentes perturbadas pelo teor da cobrança não a puderam produzir, curvaram-se diante de Leo, pagaram-lhe e saíram de lá todos, como se procurassem recato para fulminar o remorso que lhes tirava a paz naquela hora.

Ficaram então os dois, a sós. Puderam conhecer-se. Tornaram-se amigos. O menino falou ao novo amigo sobre a difícil vida que levava, sobre o sonho de ser médico. Achou-o confiável, sentiu nele algo de paternal. O homem, sensibilizado, prometeu ajudá-lo. Disse-lhe que gostava de ajudar quem demonstrava vontade de vencer

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na vida. Queria poder construir uma sociedade mais igual, menos injusta. Escreveu num papel um endereço e um número de telefone, pedindo-lhe que o procurasse quando precisasse. A vida colocara em seu caminho alguém solidário, a seu favor. Era quem faltava.

Com o passar do tempo, a doença de Chica agravou-se. Achando que em breve morreria, ela passou a conversar com os filhos, buscando confortá-los. Falou com todos, deixando Leo de último. Pediu-lhe que não desistisse de seu sonho, pois o tempo a fez acreditar no potencial do filho. Choravam os dois, abraçados. Sempre foram grandes amigos, porém parecia estar próxima a natural separação. O rapaz afagava-lhe o rosto, apertava-lhe as mãos. A melancolia tomava conta da humilde casa.

No dia seguinte, a morte chegou. Tristeza geral. Perder a mãe, que dor! Com a ajuda dos vizinhos, preparam o funeral e sepultaram, então, a mulher.

Depois de alguns dias, a família reuniu-se para discutir o que faria a partir daquele acontecimento. Dos seis, três acharam que deveriam ficar na casa e zelar por aquilo que tinham. Os outros decidiram que uma vida melhor só seria possível fora de Niili e, portanto, brevemente partiriam. Decidido, Leo manteve contato com Clóvis, dizendo-lhe que, na semana seguinte, estaria lá. De acordo com o que prometera, viajou. No cais, o fazendeiro estava à sua espera e o levou a uma luxuosa casa, onde morava sua esposa e mais dois filhos, que o receberam com grande alegria.

Um mês após a chegada, Clóvis o matriculou num dos melhores cursos pré-vestibulares da cidade. Também o vestiu de rico para adequá-lo ao recinto. Inicialmente, era nítido o desconcerto daquele humilde espírito frente a tanta pompa. Os amigos e parentes haviam ficado em Niili. Tornara-se um solitário na multidão. Gradativamente, o rapaz negro e pobre camuflado de burguês começou a assimilar a nova realidade em que vivia. Passou a destacar-se junto com alguns poucos da classe. Seu esforço e dedicação lhe renderam bons conhecimentos em diversas matérias, dando-lhe grande prestígio diante dos demais.

Nesse período, conheceu Mara, colega de sala, num intervalo de aulas. Ela aproximou-se para pedir explicação, e ele a ajudou

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atenciosamente. Desde então, tornaram-se amigos e parceiros de estudos quando não estavam no curso. Estudavam muito. Os dias pareciam mais curtos. Aproximavam-se as provas. Clóvis sempre o estimulava. Queria saber sobre seu desempenho e animava-se com a confiança do rapaz. Leo não conseguia esquecer os irmãos, preocupava-se com eles. A lembrança da mãe sempre lhe vinha à mente, e ele orava todos os dias por sua alma.

O envolvimento nos estudos tirava-lhe o lazer, a diversão. Fato entendido naturalmente por Leo, porque ele aprendeu, desde muito cedo, que vencer implica abdicação ao que é supérfluo. Há uma semana da prova, nervosismo e apreensão. Estava próximo o dia em que sua dedicação e esforço estariam postos em jogo. Passar em Medicina sempre havia sido uma façanha conquistada por poucos, mas nem isso o impressionava. Queria ser médico e achava que quando se quer e se busca a consecução de um objetivo, o impossível se empequenece.

Finalmente, o dia da prova. Difícil e extensa. Ainda assim, pensava ter conseguido um bom desempenho; Mara também. Restava agora a angústia da espera pelo resultado. Nesse intervalo, aproveitaram para ir à praia, à festa e começaram a namorar. Identificavam-se bastante.

No dia do aniversário de Leo, coincidentemente, ocorreu a publicação da lista de aprovados. Os céus os presentearam por tudo aquilo que passaram. Pelo sofrimento, pela confiança, pela garra. Eles provaram que obstáculos existem para serem transpostos e barreiras, para serem demolidas. A casa de Clóvis virou uma festa só. Até os vizinhos vieram prestigiar a alegria que nem os filhos deram ao fazendeiro. Continuavam dependentes por considerar o patrimônio do pai suficiente para financiar a vida que levavam. Leo ligou para os irmãos, contando, euforicamente, seu feito.

Na Faculdade, foi um excelente aluno. Formou-se e casou-se com a médica Mara. Depois de alguns meses, resolveram morar e trabalhar em Niili. Foram recebidos com festa. Leo podia agora dar tratamento digno à gente humilde de seu povo, além de ajudar a curar as feridas que a corrupção e a falta de oportunidades mantinham acesas na pobre cidade.

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Era movido pela lembrança de um poema que Clóvis leu para ele no dia em que agradeceu profundamente por todo o apoio recebido, antes de retornar da Capital. Intitulava-se Mãos Dadas e dizia:

Sei que sóNão vou salvar o mundoMas vou dizer pra todo mundoEm qualquer parteQue, se cada um,Com amor trabalho arte...Fizer sua parteSerá mais fácil conter o malMinimizar o caos.

Pode ser mais simples do que pareceDe pouco careceÉ só perceber:É partilhar sem pensar só em terE estender a mão ao irmãoAli. No chão, sem lar nem pão

Sei que sóNão vou salvar o mundoMas quando a solidariedadeDer a mão à sensibilidade Haverá um tempo diferenteDecenteDe gente

Sei que sóNão vou salvar o mundoMas espero acreditarQue isso é possívelE necessário.

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Ailton Silva Favacho

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ME NINA, MOÇA

Chegaste. Morena, tingida em neveLuzindo teus olhos fitando os meusMenina moleca sapeca sorrindoTua vida da minha o frio feneceu.

Risonho garoto em mim resgateiBrotou em meu peito amor singularNinar-te no colo, ai como esperei!Pareces ter vindo pra me recriar.

Flor linda e singela do amor emanouUm jasmim pequeno de odor puerilEm meu mundo entraste, tudo transformouPérola negra, ser meigo e gentil.

Distante és saudade e perto, alegriaDoce criatura, do Pai um presenteTe quero, te amo de noite, de diaMinha Cinderela de pardo semblante.

Princesa encantada, de agora e depoisE eu, seu vassalo, é só ordenarTe nino, me nina, ninemos nós doisÉs dona, senhora, a rainha do lar.

Alcindino Pacheco Portal

Filho de Sebastião Claro Portal e Maria Melo Pacheco Portal, nasceu em Retiro Grande, Município de Cachoeira do Arari em 23/12/1932. É casado com Assunção Maria Seabra Portal, com quem tem 16 filhos e mais de 30 netos. Seu gosto pela literatura está intimamente ligado a música. Descobriu-se para a poesia numa viajem a São Paulo que fez à convite dos filhos. Na ocasião, sua cunhada Leonor encomendou-lhe letra e música com o título “Do meio do Vale”, de início relutou, mas, depois de alguns dias, criou o louvor para o encontro evangélico. ALCINDINO é músico, intérprete, compositor e poeta. Aos 74 anos de idade, destina esforços para lançar o seu 3° CD gospel. Durante sua carreira literária já obteve algumas conquistas: Menção Honrosa no III Concurso de Poesia do CPOEMA, no ano e 2003 em Soure. Neste mesmo ano, obteve o 2° Lugar no Concurso de Poesia do V FESCABU, em Cachoeira do Arari, e 1° Lugar no VI Festival da Canção Cachoei-rense, com a música “Cidade do meu encanto”, em 2005.

A Deus.A toda a minha família .À família CPOEMA.Aos amigos marajoaras.À Câmara Municipal de Cachoeira do Arari.

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SALVATERRA

IVamos falar sobre Salvaterra,Da foz do Rio Camará.Aqueles que não conheceram Como era este lugar.Era encosto de pescadores.Como era ruim pra gente saltar.

IIHoje tem um porto bonitoE uma rodovia também.É um movimento diárioPra ir e voltar de Belém.Isto é uma prova concretaDe quem administra bem.

IIISegue a rodovia pela Condeixa,Um lugar bonito e bom.De Condeixa vem o Moroacá.A próxima é a Vila União.Dela, pra frente, se expande...A próxima é a Vila de Joanes.

IVDela continua aindaNão é o fim.Tem a Vila Ceará.A próxima é o Jubim.Dela segue avante.A próxima é a Passagem Grande.

VDeixando a Passagem GrandeEstá perto pra chegar.Tem a praça do mercadoAté chegar ao quebra-mar.É outra praça bonita.É um vento muito legal.

VISalvaterra é uma cidadeDo Estado do Pará.O desenvolvimento delaDá pra se admirar.Hoje é conhecidaComo a Princesa muito legal.

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SABORES MARAJOARAS

Preciso de sua atenção,Com toda realeza.Vamos considerarO que é bom e beleza.Vamos ouvir algoA respeito da natureza.

Olhando para as alturasContemplamos o céu azul.O grande número de estrelasBrilhando com seu fulgor.São estas e outras obrasFeitas pelo criador.

Olhemos para o sol.Fiquemos a contemplarO percurso do dia-a-diaIluminando em todo lugar.Trazendo o bem para os homensE para os animais.

Vamos contemplar a luaQuando vem a clarear,Com o seu brilho tão lindoQue dá pra gente meditar.É uma coisa tão lindaA noite de luar.

Vamos olhar para as campinas,As lindas paisagens que têm,Aonde pastam os pássarosE os animais também.Estas e outras coisasLindas que a natureza tem.

Vamos falar sobre os riosE o oceano também.Meditemos no poderE na força que as águas têm. Quero mencionar o ventoNo movimento que faz.Não se sabe de onde vemNem para onde vai.

Vamos falar sobre as caçasQue têm um sabor muito bom.A paca e o tatu,A cutia e o camaleão,O macaco e a guariba,O jabuti e a capivara.Estou dizendo istoPorque sou marajoara.

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JOVENS DA 3ª IDADE

Vamos mais uma vezDemonstrar nossa ansiedade.Isso pode descobrirA nossa capacidade.Vamos fazer movimentoCom as pessoas da 3ª idade.

Queremos fazer parteDesta realidade.Vamos avançar juntos,Aproveitar a oportunidade.Para sim manifestarA ação da maturidade.

Com as asas da esperançaA gente pode voar.Com ajuda e coragemPodemos caminhar.Não desista da jornadaPra conseguir chegar lá.

É uma oportunidade,Vamos avançar.Essa é a nossa jornada,Vamos sim caminhar.Vamos fazer movimentoAqui em nosso lugar.

Vamos todos mostrarO valor que cada um tem.Vamos participarDos movimentos que vêm.Esse é o meu incentivoEu sou idoso também.

ODE AO PARÁO Pará é muito grande.Nele tem muitas cidades.Tem produtos importantesDe diversas qualidades.Tem quem cria e tem quem plante.Tem também o pescador.Tem o pequeno, tem o médioE tem o grande produtor.

Muito campo e muitas matasQue existem no Pará.Muito campo e muito gadoPara a gente desfrutar.Se você ainda não conheceDê uma voltinha por lá.Veja que coisa bonitaTem o Estado do Pará.Tem campinas muito lindasQue dá pra se admirar.Tem o búfalo e o cavaloQue dá pra gente montar.Tem o peixe e tem a caçaPra gente se alimentar.São estas e outras coisasQue tem no nosso Pará.

O que estou lhe falandoSão novidades reais.Quem ver vai ficar gostandoE vai querer conhecer mais Das belezas do Pará.O Marajó é um dos tais.

Gosto muito do Marajó.Foi onde eu nasci.Tudo que eu souFoi lá que aprendi.Sou poeta, sou músicoE tenho satisfação por mim.

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ABACAXII

Vamos entrar num assuntoQue nos chama atenção.É um assunto importanteQue nos traz satisfação.É o futuro do abacaxiChegando as nossas mãos.

IIEsta é a novidadeNos chamando atenção,Que o futuro do abacaxiEstá chegando em nossas mãos.O abacaxi tem no ParáE em outras regiões.

IIIO abacaxi é um produtoQue tem suas qualidades.Isto é coisa boaE uma realidade.Produzido no interiorE consumido nas cidades.

IVO futuro do abacaxiChegando às nossas mãos.Vamos todos pra frente,Vamos entrar em ação,Fazendo todo esforçoPra melhorar a produção.

VÉ hora de avançarE também prosseguir.Vamos fazer parceriaCom o movimento aqui.Povo paraense,Vamos plantar abacaxi.

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SINDICATO RURALI

Preciso de sua atençãoNeste momento exato,Pra conhecermos mais pertoAquilo que é um fato.Vamos ouvir um poucoA respeito do sindicato.

IIO sindicato é um órgãoQue antes não existia.Ele tem uma forçaQue todo o sócio confia.É nele que a gente encontraO direito de cidadania.

IIISeja um sócio do sindicatoPra poder se prevenir.Aquilo que você não consegueCom ele pode conseguir.Ele é o seu amigoEm Cachoeira do Arari.

IVO sindicato é um órgãoQue cada dia avança.Os tempos estão passandoAumentando a confiança.Com ele a luta é certaPorque pesa na balança.

VQuero parar por aquiSem receio e remorsos.Vamos sentir o perfumeDas mais lindas flores.Vamos parabenizarO Sindicato Rural dos Trabalhadores.

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O BEZERRO DE DUAS CABEÇAS

IVou pedir sua atençãoE também advertir,Se ainda não conheceDê uma voltinha aqui.Venha ver novidadeEm Cachoeira do Arari.

IICachoeira do ArariTem novidade pra nós.São coisas na realidadeQue existem ao nosso redor.O que nos chama atençãoÉ o Museu do Marajó.

IIIÉ um Museu muito bonito.Eu afirmo, com certeza.Tanta cultura que temQue forma uma riqueza.O que me chama atençãoÉ um bezerro de duas cabeças.

IVEste bezerro está lá.É uma coisa espantosa.O que nos chama atençãoÉ uma ação valorosa.Este fato aconteceuNa Fazenda Santa Rosa.

VEste bezerro nasceu.Esses dados consegui.Esta grande novidadeÉ que eu posso transmitir.No ano de 1947Em Santa Cruz do Arari.

VIEste é um fato importanteQue está ao nosso redor.Venha dar uma examinadaPra capacitar melhor.Foi doado pelo proprietárioPara o Museu do Marajó.

VIIEsta é a realidadeQue eu pude transmitir.O Marajó tem tanta belezaQue faz a gente sorrir.Este museu tem grande culturaEm Cachoeira do Arari

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CONHEÇA O MARAJÓ I

IQuero dar umas boas novasE no mesmo lhe informar.Se alguém ainda não conheceMas com certeza já ouviu falar,É sobre o Marajó,Pois eu sou filho de lá.

IIÉ um lugar bonito e bomCom muitas paisagens ao redor.Dê uma volta por lá,Para conhecer melhor.Este lugar que eu me refiroÉ o famoso Marajó.

IIILugar igual a esteNão conheço outro melhor.Existe tanta culturaTudo ao nosso redor.Este lugar de tanta belezaÉ o nosso Marajó.

IVSão grandes as áreas do campoQue o Marajó tem.Nessas áreas tem belezaE muita fartura também.Em toda parte tem transportePra ir e voltar de Belém.

VMuitas gentes que visitamEm busca de um lazer melhor.Pra quem gostaDe tomar banho de solSão essas e outras belezasQue tem o meu Marajó.

VIVou falar nas ribeirinhasQue estão ao nosso redor:O açaí e o camarão Com um sabor melhor.Não há coisa mais saudávelDo que viver no Marajó.

VIIQuero parar por aquiApresentando sempre o melhor.Sou marajoaraCom isso não tem xodó.Por isso que eu apresentoAs belezas do Marajó.

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CONHEÇA O MARAJÓ II

Companheiro cidadãoAlguém já lhe convidou?Venha dar uma voltinha,Conhecer o interior.Dar um passeio a cavaloNo meio da vaquejada,Comer carne de solE tomar uma coalhada.

Lá tem fruta gostosinhaQue é produto natural.O açaí e a abacaba,Cupuaçu e o piquiá,E também o tucumãQue dá um suco de se admirar.Pondo ele pra ferverDá a gostosa canhapira.

Existe outra coisa tão boa,Não tem negro que rejeite:A carne de sol assada,Comida com o pirão de leite.Tem o frito, a lingüiça.São alimentos que têm lá.O espinhaço do boi bemMolhe faz até a gente suar.

Pra onde você quiser irO transporte dá na cara.Tem cavalo, tem bicicleta,Tem o ônibus e pau-de-arara.Eu lhe falo com certezaPorque sou marajoara.

Eu estou lhe convidandoPra você vir passear.Lá tem coisa muito boa.Você vendo, vai gostar.Se eu disser, você duvida.Mas olhando é melhor.É por isso que eu convido:Venha ver o Marajó.

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Vamos ouvir novidadeQue está chegando pra nós,De tudo que está surgindoVamos escolher o melhor.Quero falar a respeitoDo búfalo do Marajó.

O búfalo é um animalDe grande utilidadeÉ produzido no interiorE abastece a cidade.Isto não é uma estória,Mas sim a realidade.

O búfalo tem vantagemEm tudo que vejo.Tanto seja no tamanhoComo também no peso.Tanto a carne como o leiteDo qual se fabrica o queijo.

O búfalo é um animalQue grande produção dá.Coloca numa balança,Veja como ele vai pesar.Olhando esta vantagemO marajoara se interessa pra criar.

O búfalo é valenteQue não conheço igual.Seja rio ou barrancoEle querendo vai lá.É bom pra puxar carroçaE bom pra gente montar.

A carne dele é gostosaQue não existe melhor.É muito sadiaQue não tem colesterol.Por isso, recebe título De riqueza do Marajó.

BúfALO DO MARAJÓPoema vice-campeão no concurso de poesias em Cachoeira do Arari,

Setembro/2006, no Festival de Carne Bufalina e Derivados.

Dilomeno Márcio Maués Vitelli

O mais velho dos quatro filhos de Manoel Pedro Monteiro Vitelli e Ma-ria Lúcia Maués Vitelli é caboclo marajoara nascido no Município de Soure em 16/03/1974, consorte de Maria Estrela Dalva, pai de Gábrio Luigi e Mallena Thais. É Pedagogo formado pela UFPA, radialista da sol FM, funcionário público e poeta. Colaborou na criação do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA), do qual foi presidente por dois mandatos consecutivos. Têm alguns trabalhos premiados, dentre os quais: 1° Lugar com o poema Soure por um fio de poesia, que escreveu com Dalva Lima para o Concurso em homenagem aos 148 anos do Mu-nicípio de Soure, fev/2007; 1° Lugar com a letra de Melodias do Mar, musicado e interpretado por Paulo Cassiano e Gilmara, no IV Festsol, Festival Sol da Música Marajoara, set/2006. Márcio Vitelli cultiva o gosto pelo desenho e pela pesquisa. Hoje têm no prelo as obras: Ilha do Marajó e Outros Poemas de Virgílio Vitelli, Latino Poeta e Lendas e Visagens de Soure.

A Jesus Cristo, caminho, verdade e vida.Às minhas famílias Maués e Vitelli.A Dalva Lima, estrela do amor que ilumina meus dias.Às nossas maiores obras: Gábrio Luigi e Mallena Thais.Aos sócios do CPOEMA, por sonharem comigo este sonho fatível.E a todos os amigos, incentivadores, leitores e críticos.

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MONA LISASó aceitamos a prisão do corpo porque com os olhos

podemos abraçar as belezas do mundo.Leonardo Da Vinci

Universo erguido à partePinceladas de requinteIdéia visível é arteObra do mestre Da Vinci

Genialidade que evadeA tela que o bardo sondaDesmedida liberdadeUni versos à Gioconda

Num cromo em viva aquarelaCo’a pena de GabrielFaz declarações àquela

Musa dos lábios de melCom solar tinta amarelaNo papel azul do céu

ELA É A ONDA

Vendo o solDa paixão raiarNo teu celeste olhar azulSenti as ondas da tua voz no arE as ondulações do teu corpo nuEnsinarem as vagas do marCom um vai

EVemDe

NorteA

Sul

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VOLTA PRA MIMA Dalva Lima, luz de minha inspiração.

O que esperas? Vem agoraFonte eterna de inspiraçãoMarajoara de toda horaCabocla do meu coração

Dia atarefado é Éden pra quem amaAfirmo confiante, excitado e sem temor.Deita, bela fera, na nossa verde cama...Selvagem Marajoara libera id e calor

Noite de luar, é fetiche no pensamento.Alça vôo e pousa aqui, ombro amigo.Sinto tua presença a todo o momento...Mística Marajoara, que magias trazes contigo?

Madrugada sonhando vejo um reino encantado.Nele Morpheu blasfema sua desgraça... Mas por quê?Pesadelo não o alimenta, nem sonho despertado...Entendi o infortúnio, Marajoara! És a Deusa deste ser

Que amanhece com olhos cerrados de saudadeReflexos d’alma contidos pelo sofrerAbri-los! Só diante dos teus... felicidadeMusa Marajoara quero ver, tocar e te ter;

Retorna, Deusa Cabocla, à fértil mãe Ilha.Volta, Musa Selvagem, pra cama de capim...Vem, Feiticeira da agradável armadilha...Cinco numa só, Marajoara: teu segredo revelado, enfim!

Tua luz ilumina a minh’alma, Estrela d’AlvaCheirosa Marajoara dos campos de jasmimAh! Como és bela e tua pele tão macia e alva,Enfeitiçado vim a compor: “Volta pra mim”.

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BÁLSAMO DERRAMADO

A Manoel Pedro, meu paiCom amor, respeito e eterna gratidão

Manifestação de teu venturoso afeto,

as carícias são o bálsamo derramado

num coração ferido que chora inquieto,

orando a Deus que sempre estejas do meu lado

e que o brilho em teu olhar que me afaga e ilumina,

leve paz e carinho à mais distante plaga...

Para que os abatidos por alguma sina,

encontrem a bendita luz que não se apaga;

dádiva a cintilar, ante meu cafuné,

raios fecundos de amor e lumes de alegria,

obras de um santo Pai que a exemplo de José,

Pelo filho adorado a luz vital daria

às trevas, mas de certo que o afago da fé

iria te guardar no manto de Maria.

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SOURE POR UM fIO DE POESIA

Neste fio de poesiaArte que abraça o universoDesfio a Soure minha alegriaCom 28 pernas de versos

A novela de teu adventoTrago a luz da memóriaPuxando neste momento O grosso novelo da História

Dos Maruanazes e MundisAo povoado de Monte-ForteFreguesia de Menino DeusBenção de boa sorte

Neste dia 20, viva a inocênciaDeixe Deus tocar teu coraçãoBrinque na Praça da Independência E mergulhe com o sol no Caldeirão

Pois em cada face brota o sorriso Ao Município que aniversaria– Soure é o nosso paraíso! Brada o povo em sintonia

Vizinho, amigo, turista, parenteVaqueiro, artista, aluno, professor...Todos te ofertam valiosos presentes:Respeito, poesia, carinho e amor

A felicidade reside na essênciaTanto que em nossos parabéns Agradecemos pela tua existência E por sermos teus maiores bens

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Entre nuvens cinzentas E árvores de concreto e aço

A cigarra de casa canta Instantes e sonhos perdidos

Atraída pelo cigarro acesovaga-lume errante

Que pisca memóriasNa fumaça do esquecimento

E me quebra as vidraças da almaEstilhaçocular é navalha

Que abre na face do tempoAnos-luz de janela

E cristaliza minha visãoNa 1ª Torre de Comando da Capital

Que controla o tráfico aéreo

E o vôo cego da pequenaeronave

NoMonte

De mataQue mata

A ave perdidaCaixa-preta encontradaA sete palmos de luto

E sob forte chuva de lágrimasQue não cai do céu nublado

Mas das vítimas deste inferno de tempo

TEMPO NUBLADO

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SEXTA-fEIRA SANTA

Aprendi com o filho de DrummondQue poesiaÉ a descobertaDas coisas que eu nunca viE com o meuDe 5 anosO melhor exemplo:Vi pelos seus olhos Sua mãe iluminar O céu da boca da noite Enquanto a minha orelhaBrincava com as palavras:― Estrela cadenteDevolve o meu dente.Estrela da gente Cadê o meu pente?Do firmamentoO seu sorrisoEncheu de luzA nossa páscoa

PALAVRA É CRUELDADE

Há muito que a procuroNa escuridão da ignorânciaE no espinheiro insanoDa angústia

LáEla me corta a carne

E a minha frenteInerte

O papel se delicia Com o sangue que brota das chagas

AbertasPela palavra

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O DIA A DIA DA POESIA

Hoje descobri que tudoEstá para a poesiaComo a lua pra noiteE o sol pro dia

Poesia é livre-arbítrio Na escola, na rua, na livraria...É livro na fogueira do olhar Com ela me livro de cada fria!

Poesia na deprêÉ a melhor terapiaDela se alimentaE nos enche de alegria

Poesia é viagem fantástica É singrar na capitaniaMares surreaisNorteado pela fantasia

Poesia é arte-manhaFicção, lida, mania...É cultura universal É ânimo que nos recria

Poesia é sem vergonhaQuebra pau com a orgiaPula a cerca da moralUne credo, ciência, magia...

Poesia é da família Como avó, mãe e tiaÉ nossa parente de sangueNa veia corre a poesia

Quer ser correspondido?Proseie com a poesiaNo verso branco do papelNa rima da caligrafia

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MELODIAS DO MAR

Incorporada ao espumoso peito da praia,aonde as ordeiras ondas vêm sonhar,

a marajoara balança a beira da saia, no ritmo das melodias do mar.

Vaga cantiga que engoma e agasalha, A anágua’lagada da bela morena.Rastro na areia, brisa na palha,

Dança o coqueiro a balada serena.Gigante praiano que se inclina galante,

vendo a cabocla reger o coral.A garça anuncia nova vazante.

Maré se despede do manguezal.O sol sonolento dorme na duna.

D’água me vem o “tibum” do açaí.Quanta harmonia tem Caju-Úna!

Onde as aves gorjeiam para dormir.Mas quem pode ser a marajoara

que se branqueia deitada na areia?O coração rebate: É a Iara,

Tanto que seu canto é de sereiaDentro das sombras do caminho

a lua cheia derrama o dia.A praiana transborda de carinho,

E me atrai com sua sonífera melodia.Afagando a terra ela me sonda

Mas foge ao tentar lhe abordar. Corre, nada, desfaz-se em onda.

A musa dorme no leito do marA vaga na areia leva seu nome.

Seu ronco-canção a onda me traz. A triste voz voraz me consome. Desfaleço distante dos braços da paz

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

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A PASSOS ATRÁS

Na floresta fechada Do meu interior

O ar da inspiração É vento que me calça

No pé do ouvido

Do altoMe vejo foiceLíngua afiada

Cortando fundo O feroz capim teimoso

Arame farpado de valoresQue arranha a palavra

Presa na minha gargantaSilêncio escrito nas folhas verdes

Que eu distraído Deixei cair das plantas dos pés

Quando corri no encalçoDa única folha em branco

Que Zéfiro soprou Para longe de mimAgora folha cheia

Desta seca Lembrança

Jorge Domingues Lopes

Nasceu em Belém do Pará. É casado e pai de três filhos. Formou-se em Letras, com habilitações em Português e Francês, e é Mestre em Teoria Literária pela Universidade Federal do Pará e Université des Antilles et de la Guyane. Iniciou o magistério atuando em escolas públicas de Ensino Fundamental e Médio da Rede Estadual de Ensino (SEDUC). Foi professor dos Cursos de Letras da Graduação e da Pós-Graduação na Faculdade Integrada Brasil Amazônia (FIBRA). Atualmente, é professor de Francês e Literatura no Campus Universitário de Soure da UFPA, onde exerceu o cargo de Coordenador do Curso de Letras, coordenou um projeto de pesquisa na área do ensino da literatura e coordena um novo projeto de extensão voltado para produção de textos e inclusão digital para estudantes do município de Soure. Membro da Associação dos Professores de Francês do Pará, onde exerce a função de 1.o Secretário, e membro do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara, ganhou o Concurso de Redação em Língua Francesa da Aliança Francesa de Belém, em 2003, e do V Concurso de Poesia “Maria de Nazaré M. Barbosa”, promovido pelo CPOEMA em 2006.

Dedico estes textos à minha esposa e aos meus filhos.Aos meus pais e irmãos.E aos amigos Manoel Ricardo, Paulo Maués e Clodoaldo Oliveira.

Os que madrugam no ler, convém madrugarem também no pensar.Vulgar é o ler, raro o refletir.

Rui Barbosa (“Oração aos moços”, 1921)

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Jorge Domingues Lopes

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A úLTIMA PALAVRA

Somos feitos da matéria dos sonhos. William Shakespeare (“A tempestade”, 1611)

Nasceste num dia de poesia e chuva depois de um sonho de solidão.

Nasceste de um impulso que vem como o sono do caminhante que, cansado da estafante e poeirenta jornada, foge do tempo e se entrega ao esquecimento. Inspiração e dor te precederam. Quando te escrevi pela primeira vez, não consegui te amar. Tua imperfeição, nascida de minhas mãos trêmulas, foi riscada ao meio pelo fio da espada. Angustiado, sentia-te palpitar em meu peito. Insistente futuro que quer escrever o presente, palavra que, ainda em estado de caos, busca a existência tênue, eterna, sobre o espaço antártico do papel, sobre as linhas azuis do Equador. Antes, porém, já existias silenciosamente em cada olhar: palavra-ideia cujo destino é sempre incerto, carregas em ti o mistério do símbolo no movimento incessante que provocas nos lábios imprecisos que te seguem e crias a ilusão sonora de um adeus, alquimia sublime de um verso.

Enfim, nasceste.Tu, que dialogas com o sonho, brincaste livre na floresta

dos eucaliptos, linearmente, originalmente. Ainda lembro. Vi teus primeiros passos, largos, imprecisos, sobre desertos e campos, sobre rios e cordilheiras. E mesmo quando chegaste à beira da insondável materialidade das metrópolis pré-moldadas, continuei ao teu lado. Juntos, colhemos a música suave dos sorrisos apaixonados esquecidos pelos bancos das praças e desenhamos a tênue luz do luar no céu estrelado de poemas.

Amava as tuas cores, seguia a tua voz e pouco a pouco te via crescer.

O tempo fez o seu papel. Então, de sonho em sonho em uma noite de verão, decidiste partir. Ir por caminhos tortuosos em busca de tuas quimeras quixotescas, à procura do impossível mistério da vida sob a metáfora da tua vontade, escrita e luz do teu corpo.

Logo descobriste o segredo da onipresença.

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Caminhando por entre espelhos de amor e separação, conheceste o ego dos romances. Dos grifos, ouviste antigos contos de virtudes e traições; e, sob o eterno drama, viste o teatro da efemeridade humana.

Sonhaste cada parábola contada nos campos e, sob a ventania de uma tarde de abril, voaste flor semente para além das margens do Norte, sustentada pela magia das asas de uma borboleta serena que coloria o poema do velho poeta da praia.

Ainda eras jovem quando aprendeste o nome das coisas sagradas e profanas, quando a ti confiaram a lembrança de ritos secretos e histórias do não-tempo daquilo que curiosamente chamamos de fé. Aprendiz e mensageira foste. Sorrias ao ver o mundo se desvelar em ti. Sorrias ao ser o vidro e pedra, silêncio que ecoa no querer-ser de cada alteridade ausente. Entretanto, Cronos insistia em te conduzir ao dia em que conhecerias os infindáveis lapsos da nossa existência.

Acusada de subverter a ordem-do-que-deveria-ser-eterno ao construir asas com inquietantes ideias de poesia e cera, foste sentenciada injustamente. Uma parte de mim morreria naquela noite ao saber que o homem de gestos bruscos ordenara que te queimassem em praça pública ao lado de tantas outras. E, sob a metáfora da noite, entraste em um novo labirinto de sombras, enquanto sandeus de todo o reino, em gesto sincronizado, apagavam todas as linhas que marcavam o teu caminho.

De ti muitos homens têm medo, por isso, arrancam-te dos pensamentos e te fecham em torres de marfim. Mas resistes. Resistes mesmo esquecida nas páginas de um velho livro, onde, condenada a anos de solidão, te convertes em mitopalavra.

Tu, que voaste pelos campos elíseos de cada querer, por mármores de sabedoria e inspiração, alcanças um sopro de eternidade.

Fortalecida, de ti nasceram antigas cidades, novas ideias e raros sentimentos. Por ti, o dragão e o basilisco transpuseram a gênese dos rios do esquecimento para encontrar a manhã clara de uma leitura, porque és o toque de dois universos que partilham, no caos, um instante de arte.

Às vezes, basta uma única palavra para provocar o amor ou a revolução.

E tu, a quem amei loucamente sob a tempestade, morreste. Extinguiu-se o sangue do magro instrumento que te alimentava e, assim, perdeste o rumo da linha imaginária. Morreste, minha Fênix.

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AS ÁGUAS

O encontro de duas expansões (...) pode determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida,

porque a supressão de uma é a condição da sobrevivência da outra. Machado de Assis (“Quincas Borba”, 1891)

Todas as manhãs aquela mulher deixava as escuras águas e subia com muita dificuldade as paredes sujas do velho poço; apoiava-se nas pedras da beira e, como se estivesse em uma janela, preparava-se para ver aquele magro menino, desses de baladeira e igarapé.

Foi por acaso que ela o descobriu, justamente quando, chamada pelo Sol, cumpria o seu destino de guardar as águas dos rios, lagos e poços. E, sem saber o porquê, a bela mulher ficou encantada por ele, a quem passou a visitar todos os dias, sempre invisível aos olhos humanos.

Certo dia outonal, havia acabado de chegar à boca do poço, quando avistou, na direção da amarelada casa de sapê, o menino moreno junto com outras crianças debulhando açaí. Já tinham conseguido encher dois paneiros, logo passados para a velha que iria preparar o gostoso vinho. Pacientemente ela colocou o fruto no alguidar e mandou um dos meninos buscar água no pote. Apressado pra tomar do vinho, o garoto correu até a cozinha e pegou a primeira garrafa de água que encontrou. O açaí ficou pronto e cada um bebia, em suas próprias cuias, aquela deliciosa bebida feita à mão.

Do poço, a bela mulher observava tudo e sorriu com ternura ao ver o menininho com o rosto todo enfiado na cuia preta. Mas, de repente, ficou séria ao perceber que o garoto, com o rosto quase todo coberto de açaí, também a olhava fixamente. Sem saber o que fazer, a mulher, coberta apenas por seus longos cabelos dourados, lançou-se assustada ao poço e desapareceu no espelho das águas.

Daquele momento em diante, a criança adoeceu. Durante vários dias, ficou sem dormir e sem comer, apenas bebendo água, muita água. Tinha febre forte e, em seus delírios, falava de lugares estranhos que ninguém conhecia; também fazia gestos em que tentava a toda hora pegar os peixes que, segundo ele, nadavam ao seu redor.

O médico foi chamado, mas não descobriu a causa da estranha doença. Aconselhou interná-lo no hospital na cidade, mas, a avó do menino não aceitou.

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Desconfiando daquela moléstia, mandou então chamar um velho curandeiro que morava na entrada do paraná Tuíra. Naquele mesmo dia, o velho homem chegou com a preamar. Ao ver a criança, disse umas rezas incompreensíveis e concluiu com voz grave:

— É feitiço forte de mãe-d’água! E ela quer levar esse menino pro fundo do rio, quer encantar, pra ele ficar filho dela. Não deixe ele fazer isso.

Na sexta-feira seguinte, antes do meio-dia, seguindo as orientações do pajé, a velha levou sozinha o garoto para junto do poço, deitou-o em uma esteira de palha e, segurando um terço, começou a desfiar o rosário. Entretanto, ao meio-dia, o tempo escureceu. Uma névoa envolveu a senhora que foi ficando sonolenta e, sem resistir, caiu em profundo sono. Nesse momento, sob o zênite solar, a mulher das águas apareceu no poço. Ao descobrir o corpo quase sem vida do menino que tanto queria bem, pegou-o cuidadosamente em seus braços e decidiu levá-lo, mesmo contrariando a natureza dos seres, para o único lugar onde poderia tentar curá-lo.

Assim, sob as águas barrentas do rio, a mulher tentou livrá-lo daquele estado que o consumia rapidamente. Nada funcionou. Então, ao perceber o fim iminente daquela pequena criatura, resignou-se a invocar a mais antiga força guardada sob o Sol, a do Gênese. Silêncio e luz para transformar a vida.

No sexto dia, ouviu-se na brisa da madrugada um canto melodioso que invadiu todo o vilarejo. Pessoas, plantas e animais acordaram. Todos seguiram aquela música suave que os conduziu à beira do rio, onde encontraram o menino em pé, nu e completamente curado. Perguntaram-lhe o que havia acontecido, onde e com quem estivera todo aquele tempo, mas ele nada respondeu, apenas sorriu um terno e misterioso sorriso de mar.

A fERIDA1

Que abismo que há entre o espírito e o coração. Machado de Assis (“Quincas Borba”, 1891)

Só, Carlos Avaro esperava a morte.

1 Este conto, escrito originalmente em francês e sofreu alterações para esta publicação.

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Seu coração, o médico lhe avisara, estava cansado e um novo infarto do miocárdio seria inevitável e fatal. Impassivelmente o velho moribundo olhava o nada da janela aberta enquanto mil pensamentos o absolviam de um passado inglorioso. Necessário era exercitar sua memória para não perder a consciência. Ele não sabia o que fazer: chorar, gritar, rezar, por quê? para quem? Órfão, conheceu desde o seu nascimento a fome, a fadiga e o frio. Nada de família. Nada de amigos. Nada de amores. Para ele a alegria nunca existiu e a morte não seria mais do que uma maneira de apagar uma vida entediosa. É por isso que decidira viver num sítio, longe das pessoas da cidade, longe dos sentimentos inúteis.

Às seis horas da manhã, ele escutou longe o soar dos sinos da igreja. “É domingo”, ele pensou, “eu vou morrer num domingo, é um bom dia”. Subitamente um vento frio soprou dentro do quarto e ele viu um pequeno pássaro preto e amarelo atravessar a janela, fazer um vôo rápido sobre ele e, em seguida, pousar na mesinha de mogno ao lado de sua cama. Maquinalmente, com seu instinto rude, ele expulsou o pássaro, que saiu do quarto pela porta entreaberta. Entretanto, lá fora, um gato cinzento o espreitava com paciência. Ao percebê-lo, a pequena ave tentou ainda fugir, mas o felino, com um salto preciso, a alcançou e machucou a asa esquerda de sua presa, que caiu imediatamente por terra.

Diante daquele quadro trágico e natural, para o pássaro, o velho Avaro, inexplicavelmente tocado por um estranho sentimento, levantou-se da cama e, fazendo um grande esforço, foi em direção ao almoço do gato. Por um instante, esquecido de suas fronteiras, só pensou na ferida do pequeno animal. Afastou o gato com o pé e, ajoelhado na grama, pegou o pássaro com cuidado. Olhou o sangue que borbotava do machucado e, angustiado face à sua incapacidade diante da morte, chorou. De súbito, começou a mover seus lábios e rezou para tentar salvar a vida daquela criatura. Suas preces não foram respondidas, e o pássaro morreu. “—Toma”, disse ao gato, “pode comê-lo!”.

Aborrecido por ter participado daquela cena patética, Carlos Avaro levantou-se rapidamente, mas uma dor muito forte em seu peito o lançou de volta ao chão. Comprimindo seu coração, procurou algo ao seu redor para se apoiar. Tudo em vão. Caído, ele não via mais do que as nuvens escondendo o céu azul e, ao seu redor, a grama mal-cuidada. “Sou uma urtiga que acaba de ser arrancada”, disse sorrindo. Alguns minutos depois, morreu ao lado do gato que comia o pequeno pássaro preto e amarelo.

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ELEMENTAR I

Ares da Terra

Nasceste nas areias do tempoaprisionada no grão das horasrepetindo a queda e o lamentoeterno retorno por que choras

Palpita em teu seio a vontadeDe um mundo que corre inconstantePara além de toda verdadeEsquecer da noite é o bastante

Porque estavas acima do bemLuz calma que respira o quandoE já não esqueceste ninguém

Nos versos livres do teu cantoEnquanto buscavas alémO teu prazer em qualquer pranto

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ELEMENTAR II

Fogo

Teus olhos de sol cativoAbrigam o horizonte dos meus desejosComo ilhas proibidas e sagradas.

Tuas mãos, desenhadas pelo tempo,Guardam o segredo dos espelhosComo o abismo de um olhar.

Tua boca, pequeno jardim da inocência,Floresce na primavera de um sorrisoComo a orquídea, o amor e a vida.

Teus seios, cálices do sonho,Delineiam as cores do amanhecerComo a natureza viva do paraíso.

Tua pele, doce vinho tinto,Respira os perfumes da terraSob a luz de um entardecer.

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ELEMENTAR III

Água

No lago dividido pelo sonhoSob as águas dos oceanos estreladosBanha teu coração de amante perdida

No rio misterioso de teu corpoSob o medo desejado do desconhecidoBrincam meus dedos, meus dedos fogo

A volúpia de teu adormecerAcalma a tempestade de teus lábiosQue fazem reviver os rituais da lua

Tu amas a doçura das areiasQue vão e vêm em suaves caríciasNa fatiga de uma noite de inverno

Esperando a chuva do destinoEsquece o tempo, esquece a maréPara sempre. Descobre teus oceanos

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AO AMAR2

A Elizabete Raiol Lopes

Meus passos carregam naufrágiosde sonhos

Abandonados na praiados teus desejos

E esquecidos no horizontedo teu olhar

Tornam-se escuros abrigospelas mãos do mar

Tornam-se espumaque se desfaz pelas ondas

de teus cabelos

Caminhoabraçado ao vento que me traz

o teu perfume marinhoe sal

Caminhosobre destroços de um frágil querer

que não resistiu ao tempoe ao mar

Pelas minhas mãosescorre a fina lembrança

dos teus beijos

Enquanto a luz de teu sorrisose perde lentamente no horizonte

É tempo de baixamar

2 Com o pseudônimo Ícaro, este poema ganhou o V Concurso de Poesia do CPOEMA.

José Antônio Monteiro Muribeca

Nasceu na cidade de Cachoeira do Arari, Marajó, no dia 24 de fevereiro de 1971. É poeta e correspondente literário do CPOEMA desde 2002 no município de Cachoeira do Arari. É autor do livro “Nossa Vida: O Sentimento”. Além de ser poeta, é árbitro de futebol e correspondente das Rádios Guarani AM, Sol FM e Clube do Pará.

Agradeço a Deus. À minha mãe que mora no céu, Dona Maria Monteiro Muribeca.Ao apoio do Prefeito Municipal de Cachoeira do Arari, Dr. Jaime Barbosa.Ao amigo Ovídio Gomes Brício Neto – Cachoeira do Arari – Pará.E ao amigo Garibaldi Nicola Parente e Família – Abaetetuba – Pará.

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NO TEMPO DE JOÃO VIANNA

No tempo de João ViannaNosso povo vivia feliz,Cachoeira tinha fama

É isso que minha vó me diz.

O coral de nossa igrejaEra orgulho de cada mocinha;

E assim a nossa cidadeUm dia tornou-se Rainha.

Autor de um lindo HinoQue até hoje é oficial,

Às vezes eu canto sozinhoEm casa ou em outro local.

Compôs Batuque na FazendaBoi Arisco e Mulata Dengosa,

Ah! Saudade me entendaEm verso e também em prosa.

Fundou o Internato RuralUma relíquia para todos nós,Minha homenagem é especial

Porque João Vianna foi a nossa voz.

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BRILHANTE CACHOEIRA

Cachoeira do meu encantoRainha do Rio Arari,

Por você, eu derramo prantoExpressando o meu sentir.

Cachoeira do Lago GuajaráFormoso e misterioso,

Com estórias de arrepiarQue deixa o caboclo medroso.

Cachoeira do Museu do MarajóNosso acervo fenomenal,

Certamente é o maiorTenho estilo bem regional.

Cachoeira de Dalcídio JurandirO pajé de nossas palavras,

Fico eu a ler aquiAs suas obras consagradas.

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LEMBRANDO DALCÍDIO

Dalcídio da sensibilidade,Dalcídio da raridade,

Dalcídio da consciência,Dalcídio da inteligência.

Dalcídio destaque regional,Dalcídio destaque nacional,Dalcidio passado de glória,Dalcídio da nossa história.

Dalcídio da Região Norte,Dalcídio caboclo forte, Dalcídio do sofrimento,Dalcídio do sentimento.

Dalcídio do lindo Marajó,Dalcídio vulto maior,

O Dalcídio citado aquiÉ Dalcídio Jurandir.

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MARAJÓ SUPREMO

Marajó de nobreza e encantoOrgulho dos Marajoaras,Destaque no suave canto

Como uma das belezas raras.

Marajó de magia e purezaPortal da minha inspiração,Retocado com tanta riqueza

Até mesmo em qualquer estação.

Marajó de luz e corParceiro das lindas poesias,

Paraíso do grande amor,Perfeito nos inesquecíveis dias.

Marajó de mistério e formosuraImbatível e incontestável,Possuidor da forte culturaQue hoje é incomparável.

Marajó de ternura e prazerDono da ardente paixão,Fonte do meu doce viverAlicerce da minha razão.

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MEU MARAJÓ

Marajó formoso, rico, misterioso,Fonte da beleza natural,

Especial, fenomenal.

Marajó cenário da minha inspiração,Canção, emoção,

Enraizada em meu ser.

Te amo Marajó, te amo como és:Maravilhoso, majestoso, caloroso,

Em cada hora que se vai me encantas.

Seu clima perfeito surte efeitoNo coração do caboclo, homem disposto,

Te mostro para o mundoEm meu sonho profundo.

Em seu inverno com certeza inundo,Lembro da morena, e respiro fundo.

Meu Marajó, és sim o Paraíso,Retrato, símbolo do meu viver

Em cada amanhecer, em cada anoitecer.

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GE

Tens a beleza plena luzenteRetratada em meu poema,

O sentimento agora está em cenaNas palavras que se fazem presentes.

De um presente bem atraenteVocê parte do meu coração...

Sinceridade é a minha afirmaçãoEntendimento só depende da gente.

Reconhecer, querer, esclarecerÉ ofício de todo Poeta,

Comunicação é a porta abertaPara quem sonha e quer reviver.

Acordei na madrugada,Atravessei o amanhecer;

Penso ainda em te terComo princesa e namorada.

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QUERO

Quero estudar cor por corPara descobrir o mistério do seu amor,

Quero estudar luz por luzPara descobrir porque você me seduz.

Quero estudar parte por partePara descobrir a sua especial arte,

Quero estudar dia por diaPara descobrir sua preferida poesia.

Quero estudar tempo por tempoPara descobrir o seu exclusivo momento,

Quero estudar canção por cançãoPara descobrir o seu aquecer com razão.

Tudo isto farei simCom inspiração sem ter fim,

Porque estudei o romance constante Para tornar-me o seu poeta galante.

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MEU POEMA, SEU POEMA

És sim a flor belaNa estação mais singela,

Fazes parte do meu coraçãoCom carinho e gratidão.

Seu brilho e esplendorSão referências ao amor,

No dia sempre envolventeNa noite sempre ardente.

Olha-me e deseja-me,Toca-me e beija-me,Meu convite é a você

Para realmente acontecer.

Sou o seu poeta e apaixonado,Seu príncipe inspirado,

Sou o cavalheiro galanteador,Sou o jovem, dependendo do seu amor.

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AMOR EM POEMA

De oceano a oceano,De país a país,

Não poderei cometer o enganoDe dizer que não sou feliz ...

De planeta a planeta,De continente a continente,

O papel e a canetaFarão eu vê-la você presente ...

De estação a estação,De momento a momento,

Você será a atraçãoLembrada por mim no tempo...

De flor a flor,De cena a cena,

Dedico o meu amorA você em poema...

És como a rainha das floresA musa dos grandes apaixonados,

Que buscam sim os primoresNos momentos eternizados.

És como o azul do céuA cor preferida dos navegantes,

Amantes da lua de melAté nas noites angustiantes.

És como o rio caudaloso

Formoso no amanhecer,Cenário tão maravilhoso

Que só o poeta sabe descrever.

És como o poema lindoUnindo o frio e o calor,

Na perfeita tarde de domingoReservada somente ao amor.

ÉS

José Lúcio Sarmento Alves

Nasceu no município de Salvaterra, em 17 de setembro de 1966. Filho de Maria José Sarmento e de Lúcio Barbosa Alves. Formado pela UFPA, Campus de Soure, no Curso de Letras e Artes. É professor de Ensino Fundamental e Médio, nas Escolas “Prof. Gasparino” e Edda Gonçalves”. Sempre esteve voltado para as artes. Dirige há mais de 10 anos o Grupo de Teatro Marajoara – GRUTEMA. Desenha, pinta e escreve amparado por um inegável talento natural. É sócio fundador e atual presidente do CPOEMA. Possui vários contos e poemas vencedores de concursos do gênero, como: Menção Honrosa com a obra “O BOTO: Uma versão científica”, no IV Concurso de Contos da Região Norte “11 Contistas da Amazônia”, realizado pela UFPA, em 1996; poemas “Amor eterno” e “Amor que não tive” na Antologia Poética “Escritos feitos de amor”, Ed. Litteres, RJ, 2000; vencedor do Concurso para a escolha do Hino de Soure, promovido pela Prefeitura Municipal de Soure.

A Deus.À minha esposa Cláudia, aos meus filhos Lucas Gabriel e Bárbara Lima Alves e demais familiares.Ao CPOEMA, pela oportunidade apresentada.A todos os amigos.

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O BOTOUma versão científica

Chegamos debaixo de um verdadeiro aguaceiro. Maio era um dos meses mais chuvosos do inverno marajoara. Distingui a escola e a capela no meio do temporal. João vinha logo atrás de mim soltando imprecações. Estávamos ensopados até os ossos. Passamos pela escola e demos de frente para a casa grande. Tia Ana nos viu surgir no canto da escola e sorriu. Assim que pisamos no pátio, ela estava abrindo a porta e recebeu-nos de braços abertos:

— Antônio! João! Que surpresa! Vamos entrando! Olha só como estão molhados.

Nesse instante, os que estavam na cozinha também vieram ao nosso encontro, com os abraços calorosos. João depositou nossas sacolas em cima de um velho baú, que ficava no canto de um dos quartos. Airton me abraçou feliz da vida:

— Até que enfim vocês chegaram pra animar isso aqui!— É, estava louco pra vir logo, mas aconteceram uns

imprevistos. Espichei a cabeça pela janela e reparei que, do outro lado do

jardim, pros lados da casa-do-forno, havia um grande movimento.— Estão na farinhada?— É, estamos terminando a nossa, e já vamos começar a do tio

Sabá. Vamos até lá?— Espere só até eu trocar de roupa!— Como é? Já reparou na maré? Mais logo vamos cair n’água.

Aproveite a bermuda molhada como está.— Tem razão. Eu espero vocês.Só então reparei no igarapé. Estava cheio. As longas raízes dos

mangueiros descreviam uma longa curva no ar e se prendiam no fundo do leito lodoso do igarapé, formando um cenário lúgubre, dantesco. Como se enormes aranhas caminhassem sobre as águas cor de chumbo. Parecia mais terrível com aquela chuva torrencial, que apressava a chegada da noite, tornando as cinco horas da tarde escura e triste. Naquele momento, João, a quem chamávamos Juca, entrou no quarto acompanhado do primo Tonico, o qual me saudou:

— Oi, primo!— Oi, Tonico! Estávamos indo visitar a casa-do-forno. Vocês

vêm com a gente?

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— Vamos, sim. Mas, antes, a tia está chamando pro café.Dirigimo-nos para a cozinha. Nem bem estávamos sentando,

quando o resto da primarada irrompeu no recinto como um bando de araras. Estavam quase todos: Zazá, Rosa, Cacá, Dilermando (Dila), Cláudio, Mauro, Anita... Todos riam e falavam ao mesmo tempo, como numa Torre de Babel. No entanto, fora como se eu tivesse jogado um jato de água na fervura, quando indaguei:

— Cadê a Mariazinha?Houve um silêncio de morte. Perscrutei os rostos de um por um

e percebi que algo estava errado.— Então? Ninguém me responde? Onde está Mariazinha?Todos sabiam dos meus sentimentos pela prima. Por isso

relutavam em me dizer.Zazá foi quem respondeu:— Ela tá muito doente, Tuca. Tuca era como me chamavam. Eu

era um dos cinco primos mais velhos. Os outros me tinham um certo respeito. Era muito bom o namoro entre nós, durante as férias escolares. Eu namorava a Mariazinha há um ano, já.

— O que ela tem? Perguntei.— Não sabemos. O tio Pedro acha que é caso de levar pra Belém.

Disse a Zazá.— Já até trouxeram o pajé pra ver Mariazinha. Quem falou foi

Rosa.— Pajé? Pra quê? Perguntei.— Pra nada! Desta vez quem interrompeu foi tia Ana. – Não

ligue pra esses moleques, Tuca. A Maria está só um pouco adoentada. Talvez seja só uma gripe. Agora voltem pro trabalho, que a farinha tem que ficar pronta ainda hoje.

Eles se despediram e ficamos sós.— Parece que tu tá com azar, hein, mano?— É, Juca. Preciso fazer uma visita para a prima.E terminamos nosso café.Chegamos à casa-do-forno no momento em que a última cuia

de farinha estava sendo despejada na saca. O pessoal ajeitava-se pelos assentos para descansar e prosear. Fomos recebidos calorosamente, e respondemos às perguntas costumeiras. Então, principiou-se a conversa propriamente dita. O Juca pediu licença e foi procurar companhias da sua idade. Eu, pelo contrário, adorava estar no meio daquela gente alegre, espontânea e simples. Adorava sobretudo ouvir suas narrativas.

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Gente crédula, supersticiosa. Eles sabiam que eu não acreditava muito naquelas estórias e, por isso, me tratavam com certa reserva. Para mim o melhor contador de estórias era o meu avô. Embora ali estivessem bons narradores, como tio Manduca, Zé Jibóia, tia Herundina, tia Cota, seu Rogério e tio Sabá. Para mim, vô Miguel era o melhor de todos, o maioral. Homem simples, voz grave, pausada, utilizava recursos próprios para despertar a curiosidade, como enrolar um cigarro no meio de uma narrativa, enquanto aumentava a expectativa da platéia.

Uma das lendas mais interessantes que vô Miguel costumava narrar era a do boto.

— O boto – dizia ele – é o mais feiticeiro dos peixes. E assim iniciava a estória.

Esta lenda surgiu da crença de que o boto é um ente encantado que, nas noites de lua cheia, sai das profundezas dos rios, se transforma num belo homem e encanta as jovens caboclas ainda virgens. Seduzindo-as, o boto-homem as conduz para o fundo do rio, ou engravida-as. O filho que nascer dessa relação, por sua vez, quando adulto, atira-se no mar e transforma-se em boto.

De nada valeu dizer ao meu avô que o boto não passava de um mamífero, um cetáceo como a baleia e o golfinho, e que, por causa dessas crendices, estava com a vida ameaçada. O boto ainda era, para aquela gente, um mistério.

À noite, reuni-me com os outros primos e convidei:— Vamos até a casa da tia Rosa fazer uma visita para

Mariazinha.Ninguém se manifestou favorável.— Afinal, o que está acontecendo? Toda vez que falo na

Mariazinha vocês se espantam. A doença dela é tão grave assim?— Sabe o que é, Tuca, a tia Rosa não quer que ninguém fale

com ela – falou a Zazá.— Mas por quê?— Isso não sabemos. Vamos meninas! E elas se retiraram.Olhei para os rapazes. Todos me olhavam de uma maneira

estranha. Foi Dila quem falou:— Ah! Não esquenta, primo! Isso é coisa de mulher. A velharada

tá estranha. Ninguém fala nada. Ficam cochichando pelos cantos e nos proíbem de visitar a Maria.

— Só que eu não sou vocês. Venha, Juca. Vamos até a casa da titia.

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— Vamos, mano. Também não gosto desse mistério.Chegamos pelos fundos da cozinha. A casa era grande, de

madeira. Entramos de como de costume: gritando sem cerimônias.— Ei, de casa! Cadê o pessoal dessa casa?Titia surgiu na varanda, com uma estranha expressão no rosto.— Oi, rapazes! Soube que já estão de férias.— Oi, titia. Soubemos que a Maria está de cama. O que ela

tem?— Não é nada sério. É só uma dor de cabeça.— Podemos ver ela? – Perguntou o Juca.— Sinto muito, Juca, mas ela está dormindo. Amanhã, quem

sabe...Neste instante, um homem de negro, de barba e cabelos grisalhos,

surgiu atrás de titia. Vinha da direção do quarto de Maria, como pudemos observar.

— Vamo, Dona Rosa. O trabalho vai começá. Disse o velho.— Certo, seu Rouxinol. Boa noite, garotos!Saímos da casa bastante aturdidos. Na hora do jantar na casa do

vovô perguntei:— Quem é aquele homem, na casa da tia Rosa? Fiquei observando

o semblante de cada uma daquelas pessoas. Foi vovô quem respondeu:— Pai Rouxinol está cuidando de Mariazinha.— Por quê? Não é melhor chamar um médico?Ninguém respondeu. Resolvi não insistir.Pela manhã, enquanto todos saiam pra a roça, enveredei pelo

caminho da mata, que dava certo na casa de Maria. Saltei a janela, como de costume, e dirigi-me ao quarto da prima. Abri a porta e deparei com uma cena deprimente. Maria estava sentada na beira da cama, pálida, magra, triste. Tentou sorrir quando me viu, mas apenas sussurrou:

— Tuca!Aproximei-me e segurei sua mão. Ela estava linda, frágil como

uma rosa. Perguntei:— O que está acontecendo, meu amor? Você está bem?— Estou cansada...!Ela deitou e imediatamente adormeceu. Senti, no ar, forte cheiro

de incenso. Levei um grande susto quando me deparei com aquele homem. O tal Rouxinol.

— O que faz aqui dentro? Perguntou mal-humorado.— Quero saber o que está fazendo com ela?

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José Lúcio Sarmento Alves

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— Não é de sua conta!— É da minha conta, sim! E, se não me disser, vou chamar a

polícia!Ele acreditou. Respirou fundo e disse:— Tô tentando livrar ela do mardito.— Do que está falando?— Dele! Do mardito peixe! Quer levar a criança, sabe? Tá

mundiando a menina!— Quer falar mais claro! Não estou entendo nada!— Na próxima lua cheia ele vem, e vai arrastar Maria pro fundo

do rio.— Mas, ele quem?— O boto. Agora, sai daqui!Saí sem dizer uma palavra. E sem acreditar no que havia escutado.

Como poderia ser ele? A lenda. O boto.Agora eu compreendia porque os velhos faziam tanto segredo.Não dormi direito durante dois dias. Estava sempre olhando pro

rio e lembrando o que o pajé havia dito. A lua cheia se aproximava. Os rapazes estranhavam minha ausência nas brincadeiras. Os velhos, o meu silêncio. Aquilo não poderia ser possível. Não poderia ser verdade.

Finalmente era lua cheia. Como se obedecessem a um sinal previamente estabelecido, todos silenciaram. As meninas não se aproximavam do igarapé. Os velhos encerram a farinhada.

Como se adivinhasse o que eles estavam pensando, resolvi que deveria fazer alguma coisa. Se aquele monstro existisse de verdade, eu não deixaria que levasse Mariazinha.

Era já de madrugada quando deslizei sorrateiramente da rede. Apanhei a mochila que havia deixado na noite anterior com o material que poderia precisar. Tendo a lua como testemunha rumei para o porto de baixo, que ficava de frente para a casa de tia Rosa. Se aquele tal boto resolvesse aparecer naquela noite era da água que ele sairia. Encostei-me num velho bacurizeiro e me pus vigilante. Dali, dava para vigiar o porto e a casa da titia. Empunhei a espingarda de caça do meu avô, deixei o facão ao alcance da mão e esperei. A poronga se fez desnecessária, pois a lua iluminava toda a paisagem. Seus raios arrancavam reflexos dourados, e sua claridade produzia arabescos das sombras dos mangueiros. Só ouvia a cantilena noturna. Meus nervos estavam à flor da pele. O vôo de uma coruja assustou-me. Várias horas se passaram e o sono chegou.

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Eram quase cinco horas da manhã. A lua havia se retirado, e eu resolvi me retirar também.

Pela manhã ninguém pareceu ter notado a minha ausência. O resto do dia transcorreu sem incidentes. Passei o dia inteiro observando a casa de Maria. Cheguei a vê-la aparecer na janela, bela como a primavera. Aquela aparição deu-me a coragem que faltava para repetir o feito da noite passada. Quando todos adormeceram, ocupei meu posto de vigilância. Desta vez, havia arranjado um casco e me afastado da margem. As horas se arrastavam lentamente. Comecei a temer que estava perdendo o meu tempo. Já eram quase três da madrugada, e nada de boto. Começava a chover quando resolvi voltar pra rede. Justamente quando peguei no remo um relâmpago riscou o céu, iluminando a noite. Subitamente, as águas foram rompidas, dando passagem para um titã de corpo luzidio. Um boto enorme saltou bem junto do casco. Aqueles foram os instantes mais longos de minha vida. Seu corpo, brilhando pelo clarão do relâmpago, voltou a afundar na água escura. Percebi que ele apontava na direção da margem. Fiquei paralisado, como se uma estranha força impedisse de me mover. Dali de onde estava vi um vulto de um homem alto e elegante, todo de branco, emergir das águas. Subiu agilmente o barranco e foi em direção à casa de tia Rosa. Parou diante da janela do quarto de Maria e esperou. Pude distinguir, no meio da chuva que caía, o vulto de minha prima. Foi aí que saí do meu estupor, remei vigorosamente até a margem, subi a encosta já engatilhando a espingarda. Cheguei no alto do barranco quando eles já ali se encontravam. Maria parecia hipnotizada. Deparei, então, com um homem de olhar frio, sobrenatural. Tentei gritar. Mas não consegui. Eles passaram por mim e não tive forças para mover um músculo sequer. A espingarda deslizou das minhas mãos. Entendi horrorizado que estava impotente diante daquele ser hediondo. Senti o desespero de apossar de mim. Precisava reagir de qualquer maneira. Escutei Maria me chamar. Ela também tentava reagir. Reuni minhas forças e, num ímpeto, consegui me libertar. Saltei o barranco, empunhando o facão. Vi Maria, com as águas até o joelho, estender as mãos para mim. O homem se colocou entre nós. Cortei o ar com um golpe de facão. Tudo inútil. Ele agarrou a minha mão armada com grande facilidade e, com um forte tapa no rosto, prostrou-me na lama. Senti o gosto do sangue na boca. Novamente pus-me de pé. O monstro tentou me acertar de novo. Meti a cabeça nele, ergui-o do solo e bati com ele na lama. Esmurrei-o duas vezes, mas ele nada parecia sentir. Tentou me asfixiar apertando meu pescoço. Com um pisão desvencilhei-me de seu

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aperto mortal e corri até Maria. Apanhei-a pelas mãos e procurei fugir dali. Tudo em vão. O boto-homem surgiu minha frente, acertou um forte golpe na minha cabeça e tudo ficou escuro.

Quando voltei a mim estava deitado num lugar estranho. Ouvia vozes ao meu redor, mas nada compreendia. Então alguém falou:

— Saudações, terrestre! Você apenas ouvirá, mas não poderá falar. Somos uma raça que vive num planeta há milhões de anos-luz daqui. Apesar de nosso poderio tecnológico, nossa raça não conseguiu evitar que uma desgraça se abatesse sobre o nosso planeta. Nossos cientistas perceberam que o uso excessivo de produtos químicos estava causando danos irreparáveis à qualidade de vida na nossa atmosfera. Sobretudo, que havia causado modificações no sistema reprodutor feminino de nossa espécie. Explicando: nossas fêmeas estavam se tornando estéreis. Dentro de mil anos terrestres nossa raça deixaria de se renovar. Então, descobrimos que a fêmea de sua raça apresenta uma estrutura orgânica idêntica à da nossa. No entanto, nunca poderíamos nos mostrar aos governantes de seu povo. Eles reagiriam com violência ao nosso contato. Foi então que percebemos como a sua gente é supersticiosa e resolvemos criar uma lenda. Usamos o boto por ser uma espécie inteligente e curiosa. Assim, raptávamos suas mulheres, estudávamos sua estrutura reprodutiva e não éramos incomodados. Em troca, demos ao boto uma espécie de sonar, que o possibilita orientar-se no fundo do rio. Nunca, porém, havíamos nos deparado com um caso como o seu. O seu sentimento foge de nossa compreensão. Uma estranha força capaz de romper o campo hipnótico a que o submetemos e até ferir-me fisicamente. Ao partirmos levaremos esta informação a respeito de um sentimento terrestre chamado amor. Depois de algum tempo todos os fatos deste encontro serão apagados de suas memórias. Adeus, terrestre!

Aquilo foi como um sonho. As imagens eram vagas, mas a voz era clara. Quando acordei estava deitado na beira do igarapé, junto ao corpo imóvel de Maria. Tomei-a nos braços e voltei para casa. Titia nos recebeu à porta. No outro dia, a conversa girava em torno do sonambulismo de minha prima. E de como evitei que ela se afogasse. Será que foi tudo um sonho? Não sei. Só sei que antes que estas lembranças se evaporem, resolvi escrevê-las. Agora, só me resta aproveitar o resto de minhas férias...

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A GANA HUMANA

A gana humanaMistura água e óleoFumaça e perfumeSol e flashDissolve pedrasEncurta segundosEm uma horaAgoniza e chora Refaz a vidaReclama a pazFaz mutirãoSepara átomosCom estiletesPercorre becosCom canivetesCom cassetetesGrita preçosNas avenidasEm altos bradosAmarela o verdeDepois o cinzaEscurece o azulEndivida o outroE cobra-lhe os jurosDepois chora

Para não pagarÉ lixo. É luxoÉ branco impuroÉ lucro e ouroEm pescoços femininosFurta a maçãDaquela vendaChora a vidaQue nasceu agoraAcompanhada Por um gritoDe dor felizÉ inocência A violência Da indecênciaSe faz sentirDe bar em barEm grandes favelasÀ luz de velasRepousa um serCuja ganaDa natureza humanaTeima e tentaSobreviver

CANÇÃO AO VENTOCanta vento, no caminho!Como é belo teu cantar!Leva, leva o doce hinoEntre a rosa e o espinho,A borboleta e o passarinho,Espalha o hino pelo ar!

Canta um canto de esperança!Como é lindo o teu cantar!Chora, chora a vida!

O hino que te consolaNão fere, não te desola!É o que te leva a amar.

Canta, vento! AcompanhaEste humilde trovador!A canção é minha preceQue não chora, nem entristece!Quem a ouve, logo ofereceA Deus como um louvor.

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ANJO

A luz brilhou nos teus cabelosReluzente querubimComo ouro encaracolado Num rosto de marfimTe vi, anjo silente,Sorridente para mim

Tinha asas, pelo menos,Eu as vi, oh querubim!Carregou-me até o céuPerfumou-me com jasmimTe vi, anjo inocente,Sorridente para mim.

Escutei o som da lira,Quando tu falaste, enfim.Coloriste o arrebolCom o toque do carmimDo teu rosto angelical,Sorridente para mim.

Hoje, creio ver um anjo,Nas noites vagas, sem fim.Nos meus sonhos mais bonitos,Num bosque, em meio aos jasmins,Estendendo mãos tão puras,Sorridente para mim.

Liz Carla Silva Castro

Nasceu em Soure, no dia 08/07/1986. Filha mais velha da Sra. Maria da Conceição Castro é sócia fundadora do CPOEMA e integra a Diretoria Executiva do Clube desde 2005. É professora efetiva da Rede Municipal de Ensino e aluna do Curso de Letras, habilitação em Língua Inglesa, pela UFPA. Liz conquistou importantes premiações em concursos de poesia da região e cultiva o gosto pela escrita e leitura desde criança.

Agradeço aoMeu Senhor e Meu Deus por ter-me concedido a dádiva da mais bela poesia: a vida.À minha família, pelo incentivo.À família CPOEMA, pela acolhida e pelos inúmeros momentos que compartilhamos, sobretudo as conquistas e alegrias.À minha cidade de Soure, que me proporcionou paz e tranqüilidade nos períodos de produção literária.E especialmente a Meu Canto, Meu Encanto, Meu Encontro, fonte eterna de inspiração.

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NAVEGANTE SONHADORA

Sou eu que no céu ou na terraEcoa na explosão do teu olhar.Ponho-me a tremer alucinada Quando lanças palavras ao ar.

Sou eu quem vê luzes remotasNa voragem da saudade, Na escuridão da minha memória Atravessando a eternidade.

Sinto-me no oceanoDe turvos desejos,Quando a noite desce pelo diaNo compasso em trilhas de beijos.

Tua presença é a inspiração maiorFaz lua cheia surgir ao meio diaTorna doce a manhã abstrata e nuaE se chove traz com ela a estrela-guia.

Gaivotas sobrevoam meu mar,Quando visitas as ondas do meu pensamento.Sinto o vento das águas de sargaços.Aquecendo o mar aberto do meu sentimento.

Continuo a navegar nas lavras de espuma.Vez após outra vejo o nascente.Tu não te rendes às ondasE eu navego descrente.

Mergulho, então, no curso das palavras.Entre a noite e a madrugada teu anjo adormece.Uma brisa vadia plange em suave murmúrio Na sonolência da densa paixão que enfraquece.

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O sol me acorda num lance.Pareço ter preguiça de viver.Veleja meu barco fraco e sozinho,Buscando as águas azuis do teu rio para percorrer.

Sou uma navegante contemplando o horizonteÁgua serena e pálida. Sou ela.Tenho esperança nos olhos de dilúvio.Sonho aportar tua caravela.

CONTEMPLAÇÃO MARAJOARA2° Lugar no III Concurso de Poesia do CPOEMA, Edição “Mestre Tomaz Barbosa da Cruz”

Ilha quase selvagemPor atabaques és embalada Retumba o estrondo na paisagemE estremece a passarada

Belezas e mistérios se confundem Ante o tropel de teu carimbóLendas e costumes se infundemNo caboclo de nosso igapó

Rolam rumorosas saias Derrama-se aroma típico no arCantamos aos manguais tuas praiasA grandeza do meu Pará

Na pujança do vaqueiro A vida parece pararO tempo a correr brejeiro Como areias finas no galope do ar

Nos vastos campos cavalgoO meu gado a contemplarQuanto mais estradas, mais algoDe deleite me prende a este lugarEncolhida e sonolenta

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A lua no verdor do invernoAdormece com a chuva violenta Que deita em lágrimas seu brilho eterno

O pescador resvala sua canoaNo colo de borrascosos riosE a natureza intrépida o abençoa Dando-lhe peixes frios

Arbustos frondosos ao longe dançamNuma indescritível seduçãoE a arrastados, abaixo se lançamPela pororoca em ação

Meu Marajó! Deixe-me provar do teu tacacáPõe-me ébria de teu açaíToque-me os versos de teu siriáMas não me deixe daqui sair

Suave perfume de mulher-fantasma criasteFaróis da boiúna acendesteLíngua indígena tu falasteA ser soberano aprendeste

Reinas, reinam teus guarás em quilômetros quadradosDo nascer ao pôr-do-sol Remansos e encantos por todos os ladosRitmo e esplendor no fulgir do arrebol

Marajó, tu és fortaleza a vigiarDo Rio Amazonas as águasChamam-te anteparo do marPor pousarem em ti correntezas alvas

Ilha que endeusa a região amazônicaAqui jaz fortes traços artesanaisNo acorde de tua sílaba tônicaEncontro meus laços culturais

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OLHOS DE INSPIRAÇÃO

Quando pairo em teu olharHomem fascinaçãoLá no fundo o índigo do marVejo inundar meu coração

Quando me olha e nada falaAtroa meu corpo entãoDepois sorrindo a alma dispara E voa em minha direção

Avoantes teus olhos pousam Como duas gotas de escuridãoSobre um lírio branco repousamDando-lhe inspiração

Delicadas crispas se espalham no arE com elas quanta, quanta seduçãoÍgneo às vezes é teu um olharQue inebria-me e furta-me a razão

Encontrá-lo é gravitar no amorPerdê-lo é incutir solidãoAbraça-me a dorLonge de teus vetustos olhos de paixão.

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DENTRO DE MIM

Rolam dentro do meu coração, Irias lembranças daquele amor.Quanto mais se distancia, Maior é meu clamor.

E os tempos mais difíceis de esquecer, Até hoje são lembrados.Que faz tempo já não háMomentos mais sagrados.

São belas as noites que atravesso,Mas sem vida me vejo.É tamanha a tristeza sentidaQue a manhã me encontra no arquejo.

Alegre e triste eu sou,Um pouco medrosa, um pouco destemida.Eu me lembro! Era vazia,Quando entraste em minha vida.

Então, ouvi um canto doce e lindo.Igual à orquestra de querubins. Na verdade, era a canção dos teus olhosSe apossando de mim.

Digo que vi refletido em vocêTodos os sonhos que sonhei.E, no mistério desse cantar,Desde a primeira nota eu te amei.

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ETERNO LAÇO

Meus olhos palpitamCoração atroaNo semblante se agitamNo seio logo ecoaA voz do amor,Feroz senhor.SaudadeTormentaMe invadeLamenta.A distânciaÂnsia me trazPesadelo edaz.Te queroE veneroDe um quererNão perder,De um olharNão tocar,De um falarA me calar.Te esperoE me desespero.As horas amargasAs tristezas largasEu sinto, e minto pra mimE, assim,Sou forte

Sou sorteTenho vocêMe tens no ser.Por tiMe partiSem me ferir.Por nósFui atroz com a vidaMinha esquecida.Fiz do hoje um lugar,Do espaço, teu olharA me cercarImenso mar.Perdem-se as coresEm nossas faces: dores!Tempo perdido,Sonho esquecidoPreso pelo laçoDo teu eterno abraçoQue ficou, que marcouNum instante único me aprisionou.Sou tuaÉs meu/somos pura torturaSomos um amorQue pressenteFundo senteQue será eternamente.

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O MEU AMOR NÃO MORRERÁ

Olhos ao céu procuram a paz da minha fúnebre vida.O milagre divino de minha existência caiu em holocausto.Estou a ver com esforço os espasmos de meu coração doentio.Abala-me profundamente a tua ausência.O movimento do vento que leva e traz brasas,Não deixa aqui uma fagulha que possa me aquecerEm tom seco, constante,Passa com um alarido estonteante para meu suspiro profundo.Morrer. Eis a visão que dança no meu destinoMe convidando a valsar.Espaços minúsculos de tempoRetratam uma eternidade silente e amorosa,Que acentua meu sentimentalismo.Deixando-me pensamentos desordenados,Em laivos de flagelação...Penso em ti a cada oscilação de minhas artérias.Chamo-te com os lábios em melodia enervanteE obtenho apenas sentenças de saudades douradas.Lacrimeja o meu devaneio,Pois gostaria de descansar sua cabecinha no ombro que tanto ama,Mas não pode modificar as raízes recurvas desse amor.Sigo meu caminho cada vez mais anuviado.Cada vez mais alagado de imaculadas dilacerações pungentes.Mas não te perco de vista.Os cupidos adejam o esto que sinto por ti E eu te consagro, agora e sempre, o mais belo estro radioso Fixado no meu universo.

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É SEMPRE ASSIM

Escurece o céu, mas o dia não finda.Surge nova manhã,Mas é noite ainda.No olhar fixo, o vazio da tua vindaE a espera da madrugada vã.

Em passos tardos meu coração avançaCom as chagas tontas de amor por um trizNuma comoção que não cansa,De colecionar esperança.Ao invés de ser feliz

Meu emocional alucinado voa.Amando a ti e o que virá.Por incertos rumos abençoa Os sertões de nossa terra boaE as margaridas de nossa sorte má.

É sempre assim meu eu acordadoAnsiando aqueles momentos reproduzirMas, como o merecimento é demorado,Consumo o passadoAté o inesperado me contrair.

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SAUDADE

Saudade! A melodia fascinante dos teus passosA leveza mansa do teu arDo sonho encantado nos teus traços Acordando somente no meu olhar

Saudade! Tua mão entrelaçando a minhaTeus dedos dominando os meusTua fúria que não mas caminhaNo meu silêncio, meu deus

Saudade! Teu beijo nutrizTeu sabor sem definiçãoO toque meigo de teu lábio petizRompendo segundos eternos de fitação

Saudade! O remanso do teu abraçoA ternura do aconchego teuFelizes momentos do afagoLaço frágil que me desprendeu

Saudade! Tua presença nos meus sentidos Tua ausência constante proclamo Falta-me fazem os ledos ruídosDe você que tanto quero e amo

Luíz José Monteiro Cecim

Brasileiro, paraense de Bragança, casado (3 filhos), funcionário do Banco do Brasil desde 1980. Brangantino de nascimento (20/09/1956), mara-joara por sentimento, faço poesia por inspiração e pelo desejo de poder compartilhar alegrias, tristezas, felicidade e dor, revoltas e esperanças, coisas enfim que são da natureza humana.

Foi através do CPOEMA e dos concursos de poesia em Soure, Ilha de Marajó, onde pude, oficialmente, expor minhas poesias e ver agraciados com premiações alguns desses trabalhos.Agradeço aos primeiros concursos realizados e organizados por Maria Justina e Ângela Benassuli.Mas foi principalmente pela dedicação e pela persistência de Márcio Vitelli e sua equipe (esposa, irmãos e amigos) que podemos ver a realização desta publicação que para muitos, é um sonho.Agradeço, portanto, a todos os que contribuíram para que pudesse ter a oportunidade de ver publicadas algumas de nossas poesias através desta Antologia Literária, que talvez seja a primeira da região do Arari, no Marajó.Dedico este trabalho à minha esposa Eliana (fonte de muitas inspirações) e a meus filhos Rodrigo, Renato e Rodolfo.

“... e enquanto muitos se perdem no emaranhado de seus ódios, na escuridão sinistra de seus desencantos, destruirei meus medos com a melhor canção que puder entoar...”

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ANJO E DEMÔNIO

Quando te encontreiE olhei teu rostoVi um anjo bomA fitar-me, meigoE ao beijar-me os lábiosMostrou-me teu gosto.

Toda tua magiaPenetrou meu serE me entreguei inteiro.Me enfeitiçasteE aos teus encantosFiquei prisioneiro.

Quando o corpo quente O meu envolveuNão pude fugir.E tua belezaRevelada inteiraMeu corpo aqueceu.

Num instante só Eu me renoveiCom tu’energiaE me entregueiComo a realizarUma fantasia.

Foste anjo bomA me dar prazerAmor, alegria,Mas sempre eu fugiaPra não magoar-teTe amar não podia.

Hoje lembro tudoSempre, todo diaDa paz, da amizadeDe tantos abraçosDos beijos ardentesEu sinto saudades...

Fico a meditar:Se foste um anjoQue eu pude terHoje és “demônio”Trazendo as lembrançasPra não te esquecer.

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BOCAS

Da boca que grita a dorTambém sai o canto que anima;

Da boca que xinga e choraTambém sai o riso, a alegria;

A boca que acusa e fereTambém defende, protege;

A boca que morde e sangraTambém socorre, beija;

A boca que se embriagaSacia também outras bocas.

Boca, bocas. Vozes roucas.Boca, bocas. Palavras loucas.

Bocas loucas. Vozerias...Bocas roucas. Palavras frias...

Deixa a boca sorrir ao amorDeixa a boca gritar alegriasDeixa a boca cantar, animar,Deixa a boca... bocejar.Beija boca, sem ferir.Fere boca, o que não servir.Morde boca, a quem reclama,De não ter uma outra que inflama.

Boca. bocas. Simplesmente.Bocas tristes ou sorridentes.

Bocas, bocas que saciam.Bocas ternas, bocas quentes...

CANÇÃO DA ESPERANÇAHá uma nova esperançaPara reavivar os planosPara realizar os sonhosDe liberdade e paz

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E de tantas verdadesDeixadas pra trás.

Haverá muitas mudançasE as velhas andançasVão continuar bem sei.Mas desta vez haverá menos sofrerE certezas de se encontrar no fim da estradaOutros modos de sobreviver.

Já não se verá mais fomeNo povo que faz esta naçãoPensaremos livrementeSem riscos de opressão.Afinal, aprendemos a lição:Temos o poder de decisão.

São os braços fortes dos homensQue darão o que precisamosPara se viver melhor.Foi sempre assim E por muito tempo seráO que nos salvará do pior.Não são paletós nem gravatasQue dão comida e roupa ao povoSão os braços fortes dos homensSão os calos secos das mãos.Não os homens de almas pobres!

Nisto não existe segredo.

São os homens de rostos pálidosÉ o suor de corpos flácidosSão os pobres de alma nobreQue têm o senso de irmãosVamos ser gente de novo.

Que saudades de Tancredo!

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DO fUNDO D’ALMA

Ninguém conhece minha dorOu minha alegria.

Ninguém sabe o gosto das lágrimasQue escorrem no meu rosto.

Ninguém imagina meus sonhosNem meus desgostos.

Ninguém ri meu risoNem chora meu pranto.

Ninguém grita meu desesperoNem entoa meu canto.

Ninguém sabe o que buscoNem andou meus caminhos.

Ninguém navegou comigoNos oceanos de minhas aventurasNem mergulhou nos mares de loucuraDas minhas ilusões.

Ninguém vê o que vejoNem sente o que sinto.Ninguém vê o inverso dos tormentosDe minhas paixões.

Dor e desgosto,Lágrimas e prantos,Alegria e sonho,Riso e canto,Aventura e paixão.Só eu sei o que são...

E cada um sabe o que choraE o que sonha.

Cada um sabe por que riE por que ama.

Mas de mim ninguém sabe,Só imagina.Às vezes... Compartilha...

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VOZES

No princípio era o som...Atuando livre na natureza primitiva,De lugar ignorado ressurgindoTrazendo as energias do espaço infindoDando ao planeta nova alternativa.

E o som se fez voz.Através do sublime despontar das criaturasPrevendo a importância que teria por certoNa paulatina harmonização do universoPara brindar as gerações futuras.

E vozes se perderam.Do sentido maior que lhes atribuíaA divindade que os criara, então Espalhando o caos, o ódio a dissensãoRetardando a nova era que surgia.

Muitas outras, porém, compreenderam,E em cada tempo essas vozes solidáriasInsistiram, ressoando nos desertosTentando saciar a sede de saberQue multidões ignorantes clamavam solitárias.

E as vozes espalharam nos caminhosMensagens de coragem, de fé e de esperançaTentando resgatar o amor perdido― Que outras seqüestraram de homens livres ―Fazendo ver a todos que tenham confiança.

São muitas, hoje, as vozes que ecoam,Trazendo nesta era verdades escondidasPropositadamente por séculos de trevasEm que o terror tragava as almas mais sublimesSepultando verdades que não podem ser vencidas.

Falam-nos essas vozes das formas mais diversas

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Dos evos da existência da qual somos partícipesSurgindo a todo instante e sempre mais presentesNos jovens, nas crianças conforme está escritoFazendo o intercâmbio com as zonas mais distantes.

E assim o som retorna mais livre e desenvoltoJorrando em toda parte mais luz, mais claridadeFazendo o ar vibrar com as vozes do espaçoQue surgem a nossa volta trazendo entendimentoE força a outras vozes que amparam a humanidade

É PRECISOÉ preciso ter na alma um cantoE ter encanto ao sorrirÉ preciso ter um pouco fantasiaSer um tanto poesiaEstar livre da hipocrisiaE se enfeitar todo dia

De amor!

É preciso ser um sol ou uma estrelaUm rouxinol ou uma abelhaPra ter beleza ao cantarE a doçura do mel no falar.É preciso ser o mar ou o infinitoE todo grito conter

De dor!

Se for difícil no entantoSorrir, cantar, alegrar-se.Ser poeta ou amarSer intenso como o solOu imenso como o marSer suave brisa matinalSer arrebolPelo menos se livre do perigoDe tornar-se um ser irracional.

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OCIOSIDADE INTERIOR

Uma mente vaziaQue vaga no espaço

Vadia...Se entrega.

Não se alimenta,Não come...

Não mastiga,Se castiga,

Se consome,Se arrebenta.

Uma mente vaziaNão aprende,

Não serveE nem é servida.

Se perde,Não sacia,

Se viciaSubmerge.

É uma mente vadiaQue vaga

Sem nadaNada sabe,

Não se animaÉ enfadonha.

Uma mente vadiaNão pensa

E não sonha.Se enxerga

Não sente o que vê.Uma mente vazia

Não ouve nem fala, só cala.E fácil se desespera

Pois tudo o que passa por elaNão fica, esvoaça.

Seperdecomofumaça...

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PROCISSÃO

Quantas cordas lhe atam as mãos calejadasQue precisam de terras e não de promessaDe mãos que carregam charolasCheias de doresCarentes de amores.Quantas flores!Bonitas, de cores,Enfeitam as janelas sem vida, e as padiolas.Mas perderam o perfume e, embora às avessas,Revelam ainda a fé e a esperança, vilipendiadas.

Quantas badaladas anunciam uma onipotênciaSem denunciar a fome e a miséria dos degredadosQue silenciam diante da opressãoDa pressão oculta e do medoGuardados em segredo.Quanto folguedo,Jogo, vício, brinquedo,Mudam o que deveria ser a atração.E os mercadores da fé dos desenganadosVendem os milagres e as bênçãos com negligência.

Dissipam-se os sonhosNos “artifícios dos fogos”,Que queimam os alimentos dos famintosDespidos de sorte, de caridade e amor, Na dolorosa caminhada de redenção e resgate.Com quantos adornos lhe cobrem, quanta arte!E descobrem os menores sem lar, que dor!Quantos lhes beijam os pés por instintoPedindo prodígios espetaculososDiante de tantos atos medonhos.

Mas, salve a oração de quem lutaPelo resgate do homemDa solidão que criou na própria caminhada.Aleluia ao sacrifício da fé no futuro da própria almaQue faz hoje o que convém, mas que colherá o que planta.Salve o ladário que encanta

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Luíz José Monteiro Cecim

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E a ladainha que acalma.Que afinal não seja em vão o sacrifício, a jornadaQue muitos fazem à toa, e onde outros tantos consomem A pouca força que resta, na esperança da busca.

SUSSURROS

É frio, na noite que vai...Ao longe, o canto do galo― Que é tão raro ―Se mistura a música do cabaréQue aos poucos se esvaiCom o barulho dos carrosQue encobriu o som dos grilos, enfimE o coaxar dos saposDo meu jardim.

É frio...E a madrugada que chegaMe trás um arrepio:Um arrepio de medoDos sussurros da madrugadaQue encerram a noite mais cedo.

É frio, é madrugada.E agora me enchem de pavorOs gritos na madrugada.Os gritos das ganguesDas mulheres semi-nuasDas sirenes das ambulânciasDos tiros dos policiaisDo choro dos meninos das ruas.

Mas do frio da madrugadaTambém me vem a calmaDos que buscam a pazCom o silêncio que agora fazPorque tem um momentoEm que a madrugada jaz.É o momento da tréguaPara que os músicos de jazzDescansem para logo mais.

Luiz Tarciso Coelho Bezerra

Nasceu no dia 31.12.1953, na Fazenda Aba da Serra, em Várzea Alegre (CE). Filho e Manoel Sampson Bezerra e Cândida Coelho Braz Bezerra. Em 1956, seu pai deixa o trabalho na agricultura e se transfere para Cedro (CE), onde foi trabalhar numa farmácia como enfermeiro e, algum tempo depois, veio a adquirir tal farmácia, onde Tarciso começou a trabalhar. Em 1970, a família se transfere para Crato (CE), onde Tarciso concluiu o curso Técnico em Contabilidade, já trabalhando em uma fábrica de biscoitos. Em 1974, casou-se com Verônica Maria Moreira Bezerra, advindo da união seus filhos Bruno e Sampson. Em 1976, ingressou no Banco do Brasil. Nesse mesmo período, filiou-se à União Picoense de Escritores, e publicou seu primeiro livro de poesias intitulado LIBERDADE (lançado em Picos, PI, em 2002, é uma coleção de suas poesias e frases, escritas ao longo de sua vida). Em 1992, casou-se com Simoni Socorro Mescouto Rodrigues, advindo da união seus filhos Tarciso e Ariadne. Estudou Ciências Contábeis na Universidade Federal do Ceará, de onde transferiu o curso para Universidade Estadual do Piauí ― Campus de Picos (PI). Cursou MBA em Auditoria na USP/FIPECAFI. Em 2005, ingressou no Banco da Amazônia, onde exerce as funções de Técnico Bancário na Agência de Soure. Durante toda sua vida procurou em suas leituras garimpar textos, frases, provérbios e citações que inspirassem sabedoria e positividade. Estes trabalhos vêm sendo divulgados pela Internet, no local de Trabalho e na Maçonaria.Mantém os seguintes endereços na Internet: www.garimpodesabedoria.cjb.net; http://sites.uol.com.br/garimpo e http://garimpo.blig.ig.com.br. Tem várias poesias inéditas.

Soure (PA), Ilha do Marajó, 17.03.2007.

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

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BANCO DA AMAZÔNIA – 50 ANOS, EM SET/2006

É grande a AmazôniaAqui tudo tem maisMas uma coisa tão boaNão se imita jamaisPor isso nosso BancoÉ o melhor entre os demais

Tem o Banco do BrasilTambém tem o BanparaMas só um da AmazôniaQue é o melhor que háOs outros não são daquiSão do Brasil e do Pará

O Banco da AmazôniaFoi o terceiro a nascerE mesmo entre gigantesSempre teve seu poderDe com crédito de fomentoFazer sua Região crescer

Aqui na bela SoureHoje faz cinqüenta anosDesenvolvendo a IlhaSeguindo todos seus planosServindo a todo seu povoSem lhe causar desenganos

Por aqui muitos passaramOutros muitos hoje estãoTodos deixando um tijoloNesta grande construçãoPois o Banco da AmazôniaÉ orgulho desta Nação

Edmilson seu GerenteEstá bem assessoradoPois ao seu lado tem gente

Que muito tem trabalhadoPara ver Soure crescerE seu povo recompensado

O Frank e a NazaréO Renato e a RosemeireO Eliel e a TaianaO Diogo e a Silvia MeyreFazem que seu trabalhoComo bela rosa cheire

E assim continuandoTem o Marcelo e o OrivaldoUm graúdo e outro gitoMas ambos com respaldoPara compondo com os outrosFazerem crescer o saldo

O João e o AlexandreO Marcelo e o AstérioA Laila e a TamaraTrabalham com esmeroE também a ElianeTem o seu trabalho sério

Obrigado, seu MirandaPor sua honrosa presençaPrestigiando este povoQue labuta nesta AgênciaÉ a certeza que a SedeEm seu pessoal pensa

E o Tarciso poetaVai aqui se despedirCumprindo a sua metaDe com todos aplaudirPor estes cinqüenta anosE por outros que hão de vir.

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BRINCADEIRAS

Peteca, bola, bila e piãoEm dupla ou mesmo sóFaça chuva ou faça solEra grande a animação

Futebol eu não jogavaA bola corria mais que eue quem quedas não sofreuQuando na bola pisava

Baralho nunca jogueiNem que fosse apostadoDe vício único e danadoSó do cigarro peguei(mas já larguei)

Brincando o tempo matavaEra assim meu pensamentoMas quem matava era o tempoEu apenas me enganava

Estudar eu não gostavaMas meu pai era sabidoE dando bronca comigoPra escola me mandavaA vida assim foi passando

Sem querer fui crescendoAs brincadeiras morrendoE eu sem brinquedo ficando

Na vida adulta o trabalhoOs problemas e a famíliaTem sido o que aliviaE da tristeza quebra o galho

E assim vai indo a vidaCaminhando para o fimE o que será de mim?E da saudade sentida?

O melhor é nem saberE a todos ir amandoPois se ela vai chegandoFeliz vou tentar viver

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

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CÂNDIDA

Ao dar-te o nome de CândidaFeliz idéia teve a criaturaAo pressentir-te talvez santaOu mesmo imaculada e pura

Tal qual Maria Mãe de JesusAos filhos amas com ternuraFazendo ao teu nome jusPois és cheia de candura

Com o teu grande saber

Aprendemos muito da vida Para melhor a vida viver

Que Deus vida longa te dêPara que ao longo da vidaTenhamos sempre você

E O QUE É QUE ME fALTA fAZER MAIS?

Eu transportei as pirâmides do EgitoBotei a terra no deserto de SaaraVenci três grandes tigres em BengalaLevei a água pro Rio São FranciscoNas escrituras deixei os meus anaisFui no inferno e bati em SatanásFui quem no Rio criou o carnavalE dei um pulo do Brasil a PortugalE o que é que me falta fazer mais?Se o que fiz até hoje ninguém faz

Eu ensinei Pelé a jogar bolaE o Patativa ensinei a rimarFiz o Roberto aprender a cantarE Paulo Freire mandei para escolaA Vilanova ensinei tocar violaE a Carla Perez ensinei a rebolarA Sílvio Santos ensinei a conversarBeto Carreiro, a domar os animais E o que é que me falta fazer mais?Se o que fiz até hoje ninguém faz

I Antologia Literária do Marajó

100 Biblioteca Virtual do CPOEMA

O CACHORRO

Se você quer um amigoQue mais dá do que lhe pedeE que amigo persevereMesmo quando ofendidoNão procure o bicho homemPara tê-lo como amigo

Se quiser ter um amigoAté mais que um humanoE que não traga desenganoTenha um cachorro consigoEm vez de ter amigo cachorro É melhor ter cachorro amigo

PRAZER CARNAL

No desejo constante do corpo amadoNa ânsia de amar o maior dos amoresFico sonhando mesmo acordadoEm ter de ti agradáveis favores

No teu leito de amor quero deitarNa esperança de ter os teus beijosE nas curvas de teu corpo me deleitarE também suprir teus maiores desejos

Na beleza de teu corpo sem parQuero meu corpo nele juntarE sentir da vida o maior prazer

Linda mulher a quem vivo a amarVamos pra sempre juntos ficarPara melhor nossa vida viver

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

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MINHA APOSENTADORIA

Vou embora pro meu CearáPorque lá tenho um nomeNão sou Luiz com fomeE aqui não posso ficar

Foram vinte e oito anosDe trabalho no BancoAgüentando firme no trancoComo previam meus planos

Não pisei subordinadoNem puxei saco de ChefePois não sou um mequetrefeTenho muito é trabalhado

Hoje estou realizadoCom a missão cumpridaE mais uma vez de idaPara o meu solo prezado

Pode ser seco e duroChover pouco e ser quenteMas a sua boa genteAcredita no futuro

Não estou indo pro escuroLá meu sol é bem mais claroE banho de mar não é raroTenho a praia do futuro

I Antologia Literária do Marajó

102 Biblioteca Virtual do CPOEMA

Esta história teve começoNo Sertão PernambucanoSetenta e seis era o anoAté o dia não esqueço

Foi em trinta de dezembroTomei posse em SalgueiroE não houve desesperoIsso é coisa que não lembro

Depois fui pra Juazeiro,Parnamirim, PiancóE nunca me senti sóEm dezembro ou janeiro

Manicoré me abraçouNa nossa grande AmazôniaPois digo sem parcimôniaQuem passou ali gostou

Retornando ao PernambucoFui a São Vicente FérrerE na volta não há quem erreSe já não estiver caduco

Ali passei quatro anosAté noventa e doisPara AUDIT fui depoisOnde passei nove anos

Conheci todo o BrasilÀ exceção de dois estadosQue fui só aos seus ladosMas suas terras não vi

Picos e Rio BrancoAs duas últimas paradasTalvez melhores estadasDas que tive no meu Banco

Não esqueci WanderleyOnde um dia fui adidoE na Bahia fui queridoDo seu povo que amei

Aos colegas meu abraçoAos clientes agradecimentoPois não há esquecimentoNa lembrança sempre trago

Quem te ama de bom gradoPor tudo que me destesDiz feliz um cabra da pesteBanco do Brasil, muito obrigado!

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

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PATATIVA DO ASSARÉ E ASSARÉ DO PATATIVA(08.07.2003 – Um ano sem Patativa do Assaré)

Nasceu, viveu e cresceuNaquela pequena cidadeCantou o Sertão como seuCom toda simplicidadeAté ganhou belo nomeAinda em pequena idadeDe Patativa do AssaréPoeta de fé e sabedoriaQue com seu canto alegreTornava belo o quanto diziaJá que foi para o CéuEncontrar o Pai CriadorDeixou aqui seu cordelCom alegria e amorE sua pequena cidadeA qual tanto homenageouDe Assaré do PatativaSeu novo nome ganhouPrestigiando de forma afetivaO Poeta que Deus lhe tirou

I Antologia Literária do Marajó

104 Biblioteca Virtual do CPOEMA

PRETO JOVÊNCIO, O VAQUEIRO

Cem longos anosO Preto Jovêncio temMas como ele consegueSer jovem como ninguémÉ verdadeiro mistérioQue descobrir convém

Ele foi menino forteDesde cedo trabalhouE mesmo ainda miúdoSua profissão abraçouE no mais famoso vaqueiroDo Marajó se tornou

Ao longo de sua vidaO medo não lhe rondouGanhou muita corridaNos cavalos que montouE derrubou touro braboQue nos campos campeou

E pelas ruas de SoureEsta tão bela cidadeTem a figura singelaQue lhe trás felicidadePois o vaqueiro mais forteAqui em muita amizadeQuando na rua ele passa

Cumprimenta todos que vêE também é cumprimentadoPor quem quer lhe conhecerPara saber da históriaDe tão longo bem viver

Se o ser humano buscaA sonhada longevidadeNão precisa de mistérioSó de Deus a caridadeE um monte de amigosQue lhe dê felicidade

Passar o dia trabalhandoE toda noite dormindoÉ apenas uma das formasPara se manter meninoMas se quiser coma turuNo seu lanche matutino

E assim vamos vivendoSem com ninguém se zangarNunca guardando ódioE tendo sempre a quem amarPois com o caldo de turuA energia vai lhe sobrar.

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

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QUEM É A MULHER?

É a mais singela figuraDeus a fez bela e frágilMas com muita formosuraPara que ela fosse ágilEm continuar sua CriaturaSendo mãe de homem e mulherPerpetuar a HumanidadeCom saber, amor e féQuer no campo ou na cidadeCom certeza a mulherTem grande capacidadeE para ser mais poderosaNão precisa se esforçarPois traz consigo o domDe a todos sempre amar

SONETO DO AMOR AUSENTE

Com a volúpia própria dos amantesQuero ter o teu amor intensamenteTornando eternos todos os instantesEm que meu corpo sentir o teu presente

Buscarei odores entre teus seiosOnde dormirei um sono inocenteAo acordar darei aos meus anseiosO prazer de dentro do teu ventre

Teus lábios largos e sorridentesAdivinhando o meu maior desejoAnunciarão que isso tu consentes

Se permanecermos sempre persistentesNossos lábios se unirão em longo beijoE nossos corpos se amarão ardentemente.

Marcos Antônio Maués Vitelli

Nasceu no dia 16/06/1979, na cidade de Soure, Arquipélago do Marajó, Pará. Filho de Maria Lúcia e Manoel Pedro Monteiro Vitelli, é formado em Letras pela UFPA. É sócio-fundador do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) e tem vários poemas premiados em concursos do gênero: “Ausência”, na Antologia “Poetas do Brasil”, Arte Bahia (2006), entre outros.

Agradeço à minha família e aos conterrâneos que serão cúmplices de meus singelos versos rebentados na mocidade.

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Marcos Antônio Maués Vitelli

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A MAGIA DO AMOR

O amor puro fere, cura e consolaaquele que se embebe no vermelho,rende-se ao mundo, chora, grita, rola,no otimismo de um dia revivê-lo.

A amada – reconforto do perdido –há de aquecer seu peito tristuroso,reestruturar o riso envelhecido,a carne fervilhar em quente gozo.

O amor é chuva infinda de alegria,nutrindo corações e muitos sonhos,é luz, com sua hipérbole do dia,

que as almas apaixonadas inflama,solta ainda os selváticos demônios,filhos do prazer, na quebrada cama.

I Antologia Literária do Marajó

108 Biblioteca Virtual do CPOEMA

DESENCANTO

De tristezas e restos vive, apenas,um coração que já sorriu, decerto.É sofrível lembrar das mãos serenas– dos pássaros pequenos – que não aperto.

Saudades! Olhar gélido e desnudoem meio à sombra, à luz, à dor, tudo!Esse amor, por mais triste, me derramaum gosto de viver com toda gana!

Sei que jamais hei de tê-la comigo.Assim, me entrego à sina – novo abrigo,para gozar de todo o desencanto,deste meu doloroso e infindo pranto.

E tranco os olhos, miro minha almacaminhante nas sombras da ilusão...Enxergo ainda o meu corpo na palmaenregelada e côncava do chão!

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Marcos Antônio Maués Vitelli

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DISTÂNCIA

É triste viver! É dorido, sim!O desamor constrói a solitude.Nasce no peito a noite vil, sem fim.Do fado arquitetei fugir, não pude.

É vão sorrir! Se a dor vem e não cala,Uma augusta tristeza me debela E todo aquele sonho em tê-la, amá-la,Foi-se perdendo... tão distante dela.

Vejo na escuridão que me vigiaUm fantasma andarilho, luminoso?É a ilusão da amada, de meu dia,Mostrando-me o destino venenoso.

Estou partindo à espera de uma paz,Que possa me servir de um novo abrigo.Não tento estar ao teu lado, jamais!Tornaste o maior, sevo, inimigo.

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ESCOLHA

Tirem a luz que arde em minha cara!Quero o infindo silêncio do desterro.O amor já não preenche, já não sara,O impuro coração, meu antigo erro...

Que venham a loucura e o amargo pranto,Pra acabar com a dor que inda persiste.Quero respirar muito o desencantoE gritar, sem controle: Sou homem triste!

Feneço no calor das ilusões, Ante os olhos sem pálpebras da morte.Vejo-me num invólucro, sob sons;São de demo, mostrando a minha sorte!

Não calcule exibir-me uma saída. Está escrito, com sangue, meu sofrer. Expulsei, consciente, a suja vida,Para residir próximo de Lúcifer.

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Marcos Antônio Maués Vitelli

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MUTISMO

Depois que a mortedivorcia-nos da vida,há um vazio esboçadono dorso da terra,um gesto definitivode silêncio,... vestígio de passos dormidos,empoeiradosna lâmina suja– descolorida –arranhada pelo tempo.Mas fica a lembrançavenerada,à tona,e sua do baú da memória,tão próxima,convertida no presente,na expressão docede um olhar,na singeleza profundade um riso.

I Antologia Literária do Marajó

112 Biblioteca Virtual do CPOEMA

RECORDAÇÕES

Sinto a essência inquieta do passado,que a memória empenhou-se em sustentar.Escuto as maresias segredando,nas transparentes águas de meu mar!

Embala-me a saudade grandiosa,onde as gaivotas dançam, sem parar,na cadência do vento projetista,sobre as trêfegas águas de meu mar!

Transpira uma canção do paraíso,enfeitiçando tudo, sem cessar.A natureza verde se embeleza,fitando-se nas águas de meu mar!

E as pegadas na vasta areia clara,dos passeios antigos, ao luar,o sol as enche de lume e carícia,após beijar as águas de meu mar!

Nas ondas vão meus sonhos navegando...Vão desobedientes a ancorar.A ventura carregam em suas velas,da cor do céu e das águas de meu mar!

Azul é o desejo que me move.É divinal o êxito a brilhar.É soberba a lembrança preservada,das claríssimas águas de meu mar!

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Marcos Antônio Maués Vitelli

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SAUDADE

Meu amor veste-se de ventoe sai vagando na lentidãodo sopro do tempo.

A saudade se comprimeem delírio,hesita ferir-me com o verbo preso na gargantada página vazia.Tenho abismos propondo-me a morte,enquanto me acendeo aço da espera.

Eu era... Sou a incerta grafia da vida deitada em versosde um poema cuspido.Marcho nesse mapa de palavrase entorno a noiteno meu peito fútil.Eu mato o silêncioe recolho-me(tento)em passos atrasadosàquele amorjá não vestido de vento.

I Antologia Literária do Marajó

114 Biblioteca Virtual do CPOEMA

TEMPO

O tempo tem sua bússola no Tempovergando a vida.

Somos nuvens– minúsculos retirantes –na complexidade do arco.

O mundo e seus calos...conseqüências do tempo

respirando as horasoxidadas.

Tanto tédio tem no tempoescravo do Tempo.

É tempo de sorrir.Ainda tem tempo.

O tempo do mundo se curva em cada curva.

Tudo muda com o tempomuda com o tempocom o tempo o tempo tempo.

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Marcos Antônio Maués Vitelli

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VOZES NO POEMA

Cuspo no dorso da páginaas minhas digitais em palavras reprimidase ignoradas pelo tempo.

É sem rosto o meu poema,mas abriga, na essência, a identidade de todos!

No deserto estranho dos verbos– silente como um câncer –o descaso, a força corrompida,a vida latente respirando...talvez, os últimos instantes.

No cerne das palavrasa energia motriz reacendida,gritos encobertos pelo fumo negro das letrasestampadas na superfície brancado cárcere da página negada,que o pensamento estanca.

Maria Jardelina Pinheiro

Sou mais conhecida entre alguns amigos íntimos como “Jady”, pelo fato de eles acharem difícil pronunciar o meu nome. Nasci e me criei em Belém, capital paraense, e resido em Soure, desde 01/03/1990. Amo esta cidade e gosto dela como se fosse minha. Fico feliz por ter sido adotada por ela. Eu, meus filhos Paulo Sérgio Pinheiro e Liliane de Nazaré Pinheiro, além dos meus netos Paulo Augusto Silva Pinheiro e Tayanê Pinheiro Pinho, dádivas de Deus que ganhei residindo em Soure, por isso, amamos viver no Marajó. Faço poesia desde criança, mas não posso apresentá-las pois o caderno que as continha foi destruído pelos cupins. Em Soure já escrevi muitas poesias vencedoras, nelas usei os pseudônimos: Peregrina e Estrangeira: 2° lugar no Concurso de Música Vocacional Evangélica, promovido pela Igreja Católica, com a letra “Eu Preciso de Ti” (A música foi defendida pela minha filha), em 2001; 1° lugar no concurso de poesia em homenagem a Soure, com o título “Natureza”, 2001; 1° lugar no concurso de poesia em homenagem a Soure, com “Talentos do Marajó”, em 2002, onde destaquei os talentos de nossa linda e exuberante cidade.

Primeiramente a Deus e depois à minha mãe Maria Rosilda da Con-ceição Pantoja, à 1ª Dama do Município de Soure, Dra. Carmem Lúcia Lima Gouvêa, e ao meu companheiro Otacílio Lobo dos Santos, que me apóiam, fazendo com que eu participe da I Antologia Literária do Marajó. A toda a minha família e aos integrantes do CPOEMA.

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Maria Jardelina Pinheiro

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HARPA DO POETA

Sou feliz em ser poetaFazendo parte dessa augustaQue só me faz sonharTocando o meu instrumento Com as mãos a dedilharCada dedo é um poetaQue faz a minhaHarpa cantar

QUERO TE AMAR

Saia bordada com pétalas de florO seu sorriso encanta qualquer sofredorTeus lábios carnudos destilam o teu amorUma onda disse à outra: ― quero este corpo banharRevolver-me em teu regaço, até em espumas me tornarEntão entoaram juntas: ― Soure eu quero te amar

I Antologia Literária do Marajó

118 Biblioteca Virtual do CPOEMA

MUSA DOS POETAS

Mãe eu quero te cantarDo teu amor falarPara toda a nação

Falar do teu talentoQue até o pensamentoTransformas em canção

Eu quero te agradecer Poder falar, te dizerToda a minha gratidão

Com três letras:... MÃE!Me deste a vidaMe trazendo ao mundoMe fazendo a preferida

Com quatro letras:... AMOR!Me enches de pazE me tornas capazDe sentimento profundo

Ao terminar este poemaFica sempre o dilemaDe um filho poeta

Que ao procurar uma inspiração Tem sempre no coraçãoSua musa predileta... MÃE!

BENDITA ÉS TU ENTRE AS MULHERES

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Maria Jardelina Pinheiro

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O VENTO

O vento leva a minha vidaComo uma folha perdidaVoando no ar

O vento sopra momentos Levando todo o desgostoQue vem para me atormentar

O vento baila no arCom um suave murmurarA minha alma vê acalmar

O vento com a sua voz sonoraManda toda a dor emboraE me ensina a cantar

O vento sussurrado me consolaEmpurra a tristeza, manda foraJá chegar de tanto chorar

O vento é um grande abrigoQue oferece o ombro amigoPara que eu possa respirar

I Antologia Literária do Marajó

120 Biblioteca Virtual do CPOEMA

MADONA

Das ondas do mar fazes tua saiaDas areias do mar fazes tuas sandáliasDa voz do vento, ouço canto de sereia

Com a espuma do mar tua saia é rendadaA tua face rosada me deixa encantadoOs teus olhos verdes me deixam enamorado

Teu corpo delgado me faz sonharTeus lábios cálidos me fazem delirarAh! Se eu pudesse contigo casar

Com linhas marcadas ensinas o teu corpoTeus cabelos dourados fazem inveja para o solTua pele clara, desnuda, faz a lua chorar

Arrastas a tua saia pela areia do marTuas madeixas compridas em forma de véuTraduzem a beleza, transformação do euMadona – Donzela – És descida do céu

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Maria Jardelina Pinheiro

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TRISTE SEPARAÇÃO

Réu eu sou por ter rejeitado o teu amorAmor que tu me dedicavas e que eu não entendiaIa caminhando na grande incertezaMas quando acordei já era tarde demaisUm dia descobri que eras casadoNão resisti às lágrimas, pois perdi o meu amadoDe dia e de noite penso em tiOs nos passaram e nunca te esqueci

Da vida só espero um bom tempoA quem amo venha diminuir meu sofrimento

Como a brisa sopra as árvoresOs seus galhos e frutos molhandoNa calada da noite, no pensamento te vejoComo se fosse uma florE eu um beija-flor te beijandoIndo a caminho eu sonhoCom os meus braços te procuro, te alcançoAmor, palavra que soa como o melOs pássaros bebem sobrevoando o céu

São teus todos os meus pensamentos O tempo que perdi longe de tiUma vez me servem de exemploZangão sem abelha não pode reinarAmor com amor se deve pagar

Às vezes fico pensando: por que não te esqueciRio quando lembro do tempo que perdiAs nuvens no céu me dão alegriaUma vez descobri o amor, não sabia amarJá não agüento mais essa triste separaçãoO mar já me leva para dentro do teu coração

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CABOCLA MORENA

Morena bonitaMenina cheirosa Por mim passas faceiraE toda dengosa

De tranças compridasCabocla brejeira Teus lábios destilam O sabor do fruto da açaizeira

Cabelos cacheadosQuero neles me envolverEnroscar-me nos teus cachos Até o dia amanhecer

Quem dera eu pudesseEm teus braços me enlaçarPoder gritar: te amo!E nunca mais te deixar

Tu és a rainhaDessa imensa regiãoSoure, cidade queridaTu moras no meu coração

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Maria Jardelina Pinheiro

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CIDADE DAS MANGUEIRAS

És conhecida como hospitaleira Criança manga rosaCidade das Mangueiras

Teus frutos adocicados Chegam a ser o meu bocadoDe tua terra fértil E todo o meu legado

Ao desabrochar do diaTeus lábios se abrem em risosCom o frescor da manhãDai-nos a tua brisa

Cidade dos maruanasesCarimbó e bois-bumbásLindas praias: Barra-Velha, ArarunaPesqueiro com suas dunas

Negras, compridas e lindas trançasEnfeitadas com rosas e jasminsO vento leva o teu perfumeE nos traz através do Rio Paracauarí

Até os hotéis imitam a tiHotel Ilha, Asa Branca, SoureAraruna, Marajó e ParacauariSoure, cidade morena, não sei viver sem ti

I Antologia Literária do Marajó

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O NASCIMENTO DA PRINCESINHA DO MARAJÓ

Há alguns anos, chegou aqui no Pará um casal de fidalgos estrangeiros, que, depois de muito tempo, resolveram habitar na terra. Sua esposa concebeu. Não quiseram ir para o seu país, a fim de que ali ela desse a luz.

E, no dia 10 de março de 1962, nasceu uma linda menina de olhos verdes, que se confundiam com os matos, cabelos louros bem compridos chegando até os pés, irradiando o brilho do sol, era tão branca que se comprava com a lua.

Seus pais, quando viram as belezas de seu rebento, ficaram maravilhados, pois nunca tinham visto tamanha beleza, nem mesmo em seu país, então chegaram a um acordo: criá-la em terra paraense.

A menina foi crescendo. Passou feliz pela sua tão bela infância; por sinal não teve do que se queixar. Divertiu-se bastante, tendo sempre o apoio e companheirismo dos pais.

Chegou à adolescência, muito estudiosa e ambiciosa, só pensava no progresso de seu futuro.

Atravessou pela juventude. Era uma jovem bela, formosa, cheia de vida, por que não dizer: exuberante. Sua face rosada igualava-se com o pôr-do-sol, seus lábios eram o puro favo de mel.

Seus pais a observavam em todos os seus gestos: pois ela gostava muito de contemplar o mar e sentir o seu cheiro. Apreciava quando as ondas deitavam-se e deleitavam-se na areia da praia. Adorava contemplar as matas, observando as belas flores que enfeitavam as florestas e exalavam os seus aromas perfumando o ar e ouvir o canto dos pássaros que pareciam cânticos melódicos e apaixonados para ela ouvir.

A jovem fascinou-se tanto pela natureza que desejou fazer da floresta seus vestidos, das flores, adornos para seus cabelos e colar para seu pescoço. Saltitando descalça pela areia da praia, sentia a altivez da realeza em que nascera e fora criada.

Agora adulta, continua sobrepujando do reinado real que ela envolveu-se desde o nascimento até os nossos dias. E o que é muito

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Maria Jardelina Pinheiro

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importante, todos que a vêem e a conhecem, aprendem a amá-la e não tem coragem de abandoná-la.

Parabéns, “Princesa”! Por mais uma pétala de flor colhida no seu jardim natalício cheio de vigor e prosperidade.

Parabéns! Para os seus habitantes, visitantes e dirigentes que têm feito de você o que hoje se vê.

Salvaterra, você merece toda a felicidade do céu.

“Princesinha do Marajó”

Maria José Barros de Almeida

Ou simplesmente JÔ, nasceu no município de Santa Cruz do Arari, onde mora e trabalha, sempre gostou de ler poesias, depois passou a escrevê-las. Em julho de 2001, quando ganhou o concurso de poesias no “XI Festival do Tamuatá”, é que descobriu seu grande desejo de ter seu trabalho publicado.

A Deus, pela realização deste, aos meus filhos Anderson e Bárbara que sempre me passaram confiança.À minha mãe e a toda a minha família, que sempre me incentivou.Aos meus amigos, que elogiam e torcem pelo meu trabalho.À Sra. Laíse Silva, 1ª Dama do Município de Santa Cruz do Arari.Às professoras Raquel Araújo e Maria José Vitelli, pelo incentivo e idéias. Ao Prefeito de Santa Cruz do Arari, Fernando Lobato, pelo patrocínio, boa vontade em colaborar e por querer que todos tenham oportunidade.Ao CPOEMA, pela idéia de dar oportunidade a todos.

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Maria José Barros de Almeida

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MINHA INSPIRAÇÃO

Esta poesia dedicada a Santa Cruz do Arari, foi vencedora no XI Festival do Tamuatá,

realizado nos dias 27 e 28 de julho de 2001.

Minha terra não tem mangueiraIgual às terras de lá

Mas tem coisa mais gostosaO famoso tamuatá

Minha terra não tem cachoeiraNem praia pra bronzearMas tem o Lago Arari

Rico pra se pescar

Esse majestoso lagoÉ de muito valor

É apreciado por todosÉ orgulho do pescador

O povo que aqui moraTem muito orgulho de ti.

De ser marajoaraDe Santa Cruz do Arari

Santa Cruz do ArariTerra de pescador

Do pequeno fazendeiroDe povo trabalhador

Santa Cruz do ArariNão és esquecida nãoÉs uma linda cidade

Fruto de minha inspiração

I Antologia Literária do Marajó

128 Biblioteca Virtual do CPOEMA

TERRA QUERIDA

Santa Cruz não tem garimpoMas tem o que encontrar

Nossa riqueza está no lagoNosso gostoso tamuatá

Santa Cruz terra querida Foi Deus que te fez brilharTodos nós temos orgulho

De sermos deste lugar

Falaremos de tua belezaQue está em todo lugar

Falarei sempre de tiPois sempre irei te amar

O sol nascente nas manhãsQue dá vida para ti

Nesse lindo horizonte Retrata o Lago Arari

A lua é companheira Que chega até encantar

Ilumina Lago Arari E suas águas fazem brilhar

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Maria José Barros de Almeida

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SANTA CRUZLINDA E fACEIRA

Santa Cruz linda e faceiraBerço de muitos amores

És a cidade mais belaCom este lago multicores

Santa Cruz linda e faceiraCheia de amor e unção

És para o poetaMotivo de sedução

As riquezas que teu solo produzÉ o que nos seduz

Quero-te tanto bemMinha querida Santa Cruz

I Antologia Literária do Marajó

130 Biblioteca Virtual do CPOEMA

MINHA TERRA

Jurandir elogiou sua terraE tem toda razão

Santa Cruz é mais bonitaEm minha opinião

Santa Cruz terra queridaRica de natureza

É só prestar atençãoQue você vê a beleza

Santa Cruz do ArariCidade de encantos milMinha querida cidadeNeste imenso Brasil

Santa Cruz eu peço a DeusPara te abençoar

E proteja todas as pessoasAqui deste lugar

Jurandir cantou sua terraPois motivo ele tinha E eu canto Santa Cruz

Porque essa cidade é minha

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Maria José Barros de Almeida

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MINHA MÃE ROSAMEU PORTO SEGURO

Mãe, foi pensando em tiQue me veio a inspiração

Te fiz esta poesiaPela tua dedicação

Hoje quero apenasMostrar o teu valor

Te dizer muito obrigadoPor tudo que me ensinou

Estás sempre presenteEm todo meu caminho

Sempre me apoiasteCom palavras de carinho

Me ensinaste que na vidaÉ preciso humildade

Pois para vencerTem que ter honestidade

Quero pedir a DeusEm minha oração

Que te dê saúde, alegriaE paz no teu coração

I Antologia Literária do Marajó

132 Biblioteca Virtual do CPOEMA

PRA SEMPRE TE AMAR

Antes de te encontrarEu não sabia direitoQual o valor da vida

E se o mundo era perfeito

Quando te encontreiEncontrei também a razão

Descobri que a vidaTem muito mais emoção

Agora ao seu ladoEu sempre quero estarTe dar muito carinho

E para sempre te amar

Portanto quando partiresContinuo te lembrandoQue aqui existe alguémQue está te esperando

Fiz esta poesiaPara você não esquecer

Que morrer perto de ti é mais fácilDo que viver longe de você

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Maria José Barros de Almeida

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PARA ANDERSON E BÁRBARA

Juro que procureiUma palavra para definir

Todo o sentimentoQue eu tenho por ti

Quero pedir a DeusNessa minha homenagemQue lhes dê: saúde, alegria

E muitas felicidades

Nesta minha homenagemTambém quero dizerA grande admiraçãoQue tenho por você

A palavra que eu procuravaSem querer hoje eu acheiMas não foi no dicionário

Foi dentro de mim que encontrei

I Antologia Literária do Marajó

134 Biblioteca Virtual do CPOEMA

SUA fÉ

A distância pode separar dois corposJamais um sentimentoPor isso estás presente

Em todos os meus momentos

Na vida só existeUm grande querer

Faço qualquer coisaPara estar junto a você

Se todos os meus sonhos se realizassemVocê seria um presente

Em minha história de amorVocê estaria para sempre

Você é o agora é o sempreÉ o hoje é o amanhã

Você é a força presenteÉ por isso que sou sua fã

2° DOMINGO DE MAIO

Neste 2° domingo de maioHomenageamos uma mulher

Que pelo seu amorO nosso bem ela quer

Pela sua paciênciaE sua dedicação

Não esquece nem um diaDos filhos em oraçãoSua dedicação é tanta

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Maria José Barros de Almeida

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Que chega até encantarÉ capaz de qualquer coisa

Para os filhos salvar

Ela é muito sábiaÉ uma pessoa importante

Vamos valorizarEssa pessoa brilhante

O que sentimos por elaNão é só gratidãoÉ amor, é carinho

É uma grande paixão

Tens a bravuraDe um grande leãoDefende os filhos

Da ingratidão

Hoje tudo o que somosDevemos tudo a você

És a nossa rainhaÉs o nosso bem querer

Portanto minha rainhaObrigado pela boa criaçãoAceite minha homenagem

Que é de todo coração

Hoje eu peço a DeusQue ilumine teu caminho

Para que tenhas muita saúdeAmor e muito carinho

Mãe, mulher queridaÉ de ti que estamos falando

Pelo teu grande diaEstamos te homenageando

Maria Justina de Farias Sabóia dos Santos

É Bacharel em Turismo pela UFPA e Especialista em Planejamento e Administração do Turismo pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco. Natural de Salinópolis-PA, mãe de Ana Luiza e Yago Lucas, escreve poemas e letras para músicas desde os 17 anos de ida-de, sob o pseudônimo Lara Lhys. Tem como frases prediletas: “Se não posso ajudar, também não atrapalho” e “A liberdade é um olhar”. Gosta de música e literatura, e também de viajar; e tem como primeiro amor Jesus Cristo, depois seus filhos.

Agradeço à minha família, principalmente aoYago, à Ana Luíza e ao Fabinho, que me incentivam a escrever e servem-me de fonte de inspiração.À minha mãe Lauzita, à minha irmã Carmem Lúcia e à minha grande amiga Ilma.

O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.

Salmos, 30;5.

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Maria Justina Sabóia

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OUTRA VEZLara Lhys

Tudo tão novo...tudo tão velho...tudo outra vez...e eu fingindo não perceber seus motivospara ficar junto a mimpor medo da conhecida desilusão preferi a solidão...da almado coraçãoda insolente madrugada insonee me vem esta paixãopra você atos singelospra mim momentos únicos, belosnum encontrar de olhos mil palavrasvoam ao encontro de teu coraçãotão complexo...o despertar de sentimentos adormecidosem minh’alma de mulhertão sem nexo...o querer ter boca vermelho carmimpele de seda e marfimgestos ousadosfalas delicadasencantos de sereiasceias com mesas ao luare orquestras a cantarimagino teu rosto encostado ao meue sinto pétalas de rosascaírem em forma de lágrimas quentes, ardentes...então adormeço docementepara sonhar com você...outra vez

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A fILHA DO SOL

Para Ana Luiza, princesa amada que alegra meu viver.

Nana morena, bela, faceirapedaço do meu amorprazer de te versempre brejeiratua voz macia, como pétala de florsempre a espantar a dorte pressinto meninana minha cançãoque vem do meu coraçãoo porte altivo de filha do solde rosa menina, de meigo aconchegodas lembranças passadasna antiga moradadas luzes que brilham no grande farolte vejo, menina, da fada a belezada árvore altaneira, a graciosa levezado sonho de moça, da garça a graçados olhos risonhosdo encanto festivodos amantes dos sonhosda beira dos riosdos bosques sombriosdas grandes paixõesda lua o mistériodo mar a esperançados mitos a lembrança.

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IMENSO SENTIMENTO

Na imensidão de minha almatem um gato que faz miauum grilo que faz cricrie um luar que me faz lembrar de titem o gosto de teu beijoa saudade de teu desejotem momentos sofridossonhos interrompidose corações partidostem fogueiras ao luarcanções a beira-marfantasias no artem tristezas inexplicáveisamores inconfessáveise certezas imponderáveistem vergonhas a escondermedo de ofenderriscos para se corrertem nariz a ser quebradopudor desmanteladoe segredos escancaradostem razão desconhecidamarcas de outras vidaslembranças queridastem sentimento vagandoamores passandoangústias rondandoe tem o meu amor te chamandomeu sono te sonhandoe meu olhar te procurando.

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ILHA MARAVILHA

Mara bela, mara ilha, maravilha barreira do mar

Arquipélago encantado onde a biodiversidade escolheu morar

Respaldas tuas lendas e mitos na magia de teus antepassados

Aguas, beleza natural, verde imensidão, cria em nós imensa paixão

Jeito de menina-morena, serena na quietude de teu branco leito de areia

Orgulho de ser ilhéu, verdes matas, teus guarás avermelham o céu

Indios, negros, portugueses, legaram a tua raça, orgulho, graça e beleza

Lua cheia de doces aromas ilumina os sonhos da morena de olhos de mel

Habitat dos maguaris, caranguejos e siris, mundo das águas, poente sol, pequeno farol, esplendor paracauary

Amor de imensidão que vem do coração da mulata faceira nos círios da padroeira

Mulher caprichosa quando tuas águas mandam em todos nós

A falta de tecnologia supera-se em alegrias, hospitalidade, charme e melodia

Respeitar costumes e tradições, fomentar tua cultura, entender teus amores, são parte de teus valores

Amante do sol, filha das águas, nas rimas do carimbó, olhos rasos d’água cor do mar, matas verdes, sonhos ao luar

Valente boi-tenente, paciente-displicente, é o búfalo corredor o símbolo do Marajó

Imaginário ser, habitante das águas, é o boto, sinhá, que vem namorar

Lacaio ferrava gado, fazendeiro corria mundo, Preto Juvêncio todo prosa, pés descalços, roubava corações com a chula marajoara

Há aqui tantas estórias, Boaventura, Curupira, mãe-d’água “diz que” linda, pavulagem e caprichosa

Antes de ti, o que era aqui? Terras altas, mapinguaris, piracema, aruãs, maruanazes... orgulho é ser parte de ti

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Maria Justina Sabóia

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MARAJÓ CURUMIM

Para Yago Lucas, o beija-flor que alegra minha vida

No negro de teus olhosmistério, seduçãono encanto de teus olhoso sol, a lua, a paixãoum arco-íris que alegra o céue a chuva caiem gotas de melna ternura de teus olhoso orvalho da manhãe o canto da passaradano negro de teus olhostem o remanso do paracauarytem o cheiro do patchoulliah! esse teu olhar fala por tina ternura de teus olhoso sol, a lua, a paixãoés anjo, és duendemistério, seduçãono encanto de teus olhosa maresia do maro orvalho da manhãe a leveza do armarajó curumimestão em teu olhar.

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MARAJÓ EM CANTO

Dourado sol do Marajóaquece o imenso coração do rio-mare deixa tua saudade perfumando o arNo beija-flor que povoa a naturezameu pensamento atravessa o paracauarye voa livre para perto de tino bailado atrapalhado do tralhotoencontro distração para minha solidãocorre correntezavai buscar quem me amoue leva esta saudade que ficoucintilante espelho d’águasão narcisos dos sorrisos do encantador boto namoradoro redondo vermelho solbeija o pequeno farole some prenhe de minha paixão-solidãosombras azul-lilases do anoitecerdesenham nuvens de papellembrando teus olhos de melnatureza de grande belezaum nó perfeito aperta o peitoe uma lágrima cristalinavem saudar o pôr-do-sole molhar o meu olharnoite-solidão maltrata o coraçãoe vem fechar com calmaas cortinas de minh’alma

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Maria Justina Sabóia

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LÁGRIMAS DE UM RIO

Hoje eu vi um rioum rio que gritava socorroparecia que estava com friochovia mansamente em suas margensessa chuva se confundiacom lágrimas que caiamolhei melhor e vique as lágrimas eram mensagens:por favor, não joguem lixoem meu leitoassim esmagam meu peitoque já respira cansadode tanto ser maltratado

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COTIDIANO

Triste sina dos viajantes solitáriosque buscam companhias até em templos e campanáriosdos que estão distantes de seus amorespois só lhes resta chorar as dorestriste sina dos que não enxergam a situação do povoe só pensam em correr atrás do novodos mal amados com seus destinos mal fadadostriste sina dos infelizes e dos amores das meretrizesdos incapazes com suas falácias mordazesdos meninos de rua, que comem até restos de carne cruados amantes da lua, sempre em busca das fases suastriste sina do proletariado, obrigado a se virar sem eráriodos sem maldade, que não percebem as sutilezas da crueldadedos que esperam, sempre a sonhar chegadas e mistériosdos que choram as dores do povopois sabem que a vida será sempre um recomeçar de novotriste sina dos enamorados, que não sabem viver separadosdos trabalhadores, sem o reconhecimento de seus valoresdos excluídos, que jamais serão ouvidosdos poetas, com suas almas irrequietasde nossas riquezas, arrancadas de nosso solonos deixam maior pobrezatriste sina, dos que não têm seus direitos respeitadose são como objetos descartadosdas fantasias, de quem pensa em melhorar o mundoatravés das poesias

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Maria Justina Sabóia

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AMOR CIGANO

Te vejote sintote penso sozinhote buscote esperote quero carinhote sonhome imponhono teu caminhote deixo lembrançase não te dou esperançasou o teu desatinoe fiz reserva no teu destinote julgo saudadesou tua maldadesou flor, sou amor, sou teu despudorsou anjo caídode um céu de estrelas floridoe te deixo zangadoe te deixo sofrido sou tua chuva finaque cai de mansinhobeijando teu corpo ciganosou tua paz, sou capazde tornar-te eterno

de virar teu infernosou purezasou dorsou ternurasou amorsou espírito aventureiroe te quero maneirosou teu sonho e sou teu pesadeloe sou tua luaquando estou nuasou noite estreladatrocando afagosna madrugadasou teu pranto caladoe teu encanto presentemas não te dou explicaçãopara esta explosãode tanta paixãote deixo confusote faço entrar em parafusoe te quero mundanosó para ter o gostinhode domar o teu amor cigano.

Max Barbosa Gomes

Nasceu em Cachoeira do Arari, Marajó, Pará, no dia 20 de março de l972. Filho de Benedito Gomes, vaqueiro, e de Valéria da Conceição Barbosa, dona de casa. Estudou em escolas públicas do seu município. É Licenciado Pleno em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará. Ocupa as funções de Coordenador Pedagógico das escolas municipais e é Técnico da Rede Estadual de Ensino.

Ao meu Deus, Jeová.Aos meus pais: Benedito Gomes (falecido) e Valéria da Conceição Barbosa. À Prefeitura Municipal de Cachoeira do Arari.(Secretaria de Educação, Cultura, Desporto e Turismo).

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Max Barbosa Gomes

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MARAJÓ

Nos encontros pesqueiros;Nas boiadas vaqueiras;Nas águas trincheiras;Nos campos matreiros.

É madrugada...

No casco o pescadorConserva sua tradiçãoBate o caniço n’águaPara dos peixesChamar atenção.

Ou então...

Tarrafas e redesNos rios a se estender,Nos pontos de peixesConhecidos pelo Seu talento e saber.

É madrugada...

Vacas leiteiras...Leite abundante.Trabalho no campo, No sol chispeante.

Vaqueiro...

Cavalo arreado Com ele montado.Na garupa a corda...Animal estimado.

Chapéu de carnaúba;Muxinga e baeta,Rédeas na mão e, No seu cinturão, Repousa atentoSeu amigo, o facão.

Águas barrentas,Do rio, do lago e do igapó.Preservada flora...Ilha esquecida...Desperta Marajó!

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PEDAÇO DA AMAZÔNIAPedaço da AmazôniaOnde vejoO caboclo nativoSubir num açaizeiro.Pedaço da AmazôniaOnde se assemelhaO seringueiro amazônicoCom o marajoara roceiro.

Onde se deparaO fazendeiro exploradorE o vaqueiro trabalhador Explorado, que alegre e animadoErgue o laço:Dizendo “eia” pro gado.

O pescador conhecedorDos furos e lagos, Em que o cigarro É bom companheiro;O carapanã seu despertador;As estrelas suas guias;A tarrafa, a rede, o anzol, Seus meios de sobrevivência.Onde com alegriaEncara a dor.

Homem marajoara matreiro,Onde os mitos e lendasSão seu folclore,Onde a morena caboclaÉ seu fogo amorosoNas horas prazerosas de gozo.

Onde o artesanato revelaSua herança indígena.Pedaço da Amazônia, onde vejo,A marajoara mãe acalentar o meninoCantando uma cantiga.

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EXALTAÇÃO

Ah! Como é bela minha terra!Tão poucas terras hei de exaltar.Exclamar aos ventos, aos mares,Da terra a qual em seu seioTem-me a guardar.

A menina tímida dos meus olhosQue em seus laços me ampara.A tapuia dos meus sonhosGuardando-me, me protegendo,Nas noites agitadas de farra.

Ah! Como é bela minha terra!Terra da Conceição,Do pau-do-santo, da romaria,Do Glorioso São Sebastião.

Ah! Como a noite é bela em minha terra.Nas noitadas de fim de ano,Nas festanças de junho, No roubo da donzela.E a observar assombras,As poucas vidas noturnas, Atenta, está fofoqueira na janela.

As velas à Senhora das CandeiasQue vão queimando devagar, No bater do vento calmo e lentoIgual a vida pacata que impera,Fazendo-me exaltar com ternura:Ah! Como é bela minha terra!

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MADRUGADA CACHOEIRENSE

Madrugada cachoeirense.Um silêncio que grita,A calmaria.Cortado pelo cantar de um galo,Pelo ronco de um motor.

Madrugada cachoeirense.Um cheque-chequeDe alguém no calçadão,Cachorros sem donosVagando nas ruas.

As poucas luzesRetratam um ar de solidão.O longe progressoRetrata uma vida de prisão.E os meus versos?Ah! Os meus versos!Se pudessem salvar...Dar um colorido todo especialA essa paz sem coloridoDas madrugadas cachoeirenses.

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Max Barbosa Gomes

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LUCIDEZ

A poesia...Que derreteu tantos corações;Que despertou tantas ambições;Que já feriu tantas reputações...

Parece que todo poeta é loucoPelo amor ou pelo ódio,Faz do seu mundo um sonho,Do espaço a eternidade,Às vezes é covardePor não viver a vontade.

A loucura do poeta Nem sempre se interpreta,Seus olhos são sempre alertaE de suas mãos brota,Que nem todos podem ver;Um jogo de cartas abertas.

Ah! A loucura do poeta?É ver na escuridão uma luz,É comunicar no medoO seu segredo, seu pejo,Seu sentimento abafado.Na voraz vida que vive,Viver seu sonho sonhado.

Parece que todo poeta é louco.A loucura do poeta?Ah! A loucura do poeta...Por não viver a vontade,Que nem todos podem ver,Na voraz vida que viveEscreve pra poder ser.

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O LOUCO

O louco está às soltasNas ruas, festas e bares,Nas casas e no Planalto,Na cadeia e no Judiciário.

O louco está às soltasNas escolas, no mar e no ar.Reza, canta e dança,Vota e se faz votar.O louco está às soltas

Roubando, matando e prendendo.Casando e esperando;Rindo e também chorando.

O louco está soltoE também se suicida,Sonha, ama e odeia a vida.Porém ao nascer já estava morto.

EU E MEU

São coisasQue mexem comigo:Caminhos às beiras de cercas,Uma casinha lá foraNuma imensidão de campo...São esses meus encantos.Desencantos para alguns,Mas...

São coisasQue mexem comigoE não vejo nenhum perigoGostar de quintais cheiosDe xerimbabos diversos,Por isso escrevo tais versos...Tão banais para alguns,Contudo...São coisas

Que mexem comigo,Não me importo com isso.Numa casinha de pau-a-piqueÀs vezes quero morarSem do que me preocupar...São coisas que preocupam alguns,No entanto...

São coisasQue mexem comigo.Caipira...Assim dizem outrosPor eu pensar assimSer eu e meuE nunca acanhadoD’eu ser um sonhadorE meu, meu sonho sonhado.

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Max Barbosa Gomes

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PAZ E TRISTEZA

O silêncio,Quebrado apenasPelo barulho Das águas na praia.Uma vida pacataComo se nãoExistissem problemas.

Meninos numa carroçaSem camisas, pés no chão.Vida de caranguejeiro,Vida de pescador,De tristeza e paz,De alegria e dor.

A tarde sombria.O vento o frioFaziam lembrar-meDa minha terrinha.Paz e tristeza,Recordações minhas.

Paz e tristeza,Recordações minhasDo final de SoureNaquela tardinha.

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VINTE DE MARÇO

Na segunda-feiraSem eira nem beira,Cheguei a este mundo.Não tinha cobiça, Egoísmo, preguiça.Na segunda-feira.Sem eira nem beira.

No vinte de marçoDe glória ou fracasso,Não tinha saudade,Ilusão ou paixão.No vinte de março.De glória ou fracasso.

Na madrugadaSem hora marcada,Não tinha compromisso,Nem ponto de chegada.Na madrugada.Sem hora marcada.

Na segunda-feira, No vinte de março.Na madrugadaSem eira nem beira. De glória ou fracasso,Sem hora marcada,Cheguei a este mundo.

Não tinha compromisso,Nem ponto de chegada.Não tinha preguiça,Egoísmo cobiça.Não tinha saudade,Ilusão ou paixão.

Cheguei a este mundo,Na madrugadaSem hora marcada;No vinte de março, De glória ou fracasso;Na segunda-feiraSem eira nem beira.

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Max Barbosa Gomes

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O PROBLEMA

O problemaNão é perceber,É sentir.Não é calar,É falar.Não é ver, É fazer.Não é dormir,É acordar.

O problemaÉ enfrentar, Não fugir.É mostrar,Não guardar.É tentar,Não querer.É realizar,Não sonhar.

O problemaÉ criá-lo sempre;É ficar no dilema;Não satisfazer acena;Não cair na realidade;É ficar só na saudadeDe viver o problema.

Mestre Tomaz

Eu sou Tomaz Barbosa da Cruz nascido em 28 de Janeiro de 1929, filho de Messias Gonçalves da Cruz e Joana Barbosa da Cruz, natural da cidade de Soure – Ilha do Marajó. O meu primeiro trabalho foi a pescaria até os 12 anos. Aos 14 anos trabalhei como ajudante de carpintaria do Mestre Aranha e, aos 18 por tornar-me arrimo da família, voltei a trabalhar na extração do caranguejo e pesca. Cursei somente até a segunda série primária incompleta. Mestre Tomaz poeta e repentista é autodidata procuro sempre resgatar em minhas obras a cultura da minha região, coisa que já estava no esquecimento dos meus conterrâneos. Em outros momentos procuro levar às pessoas o conhecimento das belezas que existe em nossa região marajoara. Hoje tenho quatro livros publicados em minha cidade de origem, sou conhecido internacionalmente devido aos documentários feitos por emissoras de televisões estrangeiras com a minha participação. Obras: Poesia: Verso em Rima de Prosa (1992); Conto: O Valente Viléla – Conto em Versos (1994); Prosa: Marajó e suas histórias (Vol. 1, 1998); Marajó e suas histórias (Vol. 2, 2002).

Agradecimentos especiais: À minha esposa Iraci Brito de CruzAos meus filhos e genros: Dr. Ademir Barbosa da Cruz; Sra. Lucidalva Barbosa da Cruz; Sub-Ten. Alberto Barbosa da Cruz; Sr. Adailton Barbosa da Cruz; Sr. Alfredo Barbosa da Cruz; Sr. Adjalma Barbosa da Cruz; Sra. Lucilene Barbosa da Cruz; Profª Lucideia Barbosa da Cruz; Sr. Moises Trindade; Prof. Antenor Pereira Barbosa.Aos Professores das Escolas Gasparino e Edda e a todos os alunos.E em particular ao meu Amigo Coronel Alacid da Silva Nunes, mãos amigas de Soure. E à Pousada dos Guarás.

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Mestre Tomaz

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HISTÓRIAS E LENDAS_____________________________________________

PRETINHO DA BACABEIRA

Há tempos passados aparecia um menino bem escurinho, que o povo chamava Pretinho da Bacabeira, por haver duas árvores de bacabeira no lugar onde ele aparecia, na Terceira Rua com a Travessa 18. Nas proximidades existiam também uma mangueira e duas seringueiras, local que era o porto dos pescadores.Uma noite passou no local um cidadão de prenome Teodoro, cujo apelido era “dois cano”, vendo o menino no meio da rua, próximos às bacabeiras, disse: moleque não é hora de estar na rua, e o menino responde: – Estou esperando um homem para ajudar a empurrar uma canoa, então Teodoro disse ao menino: – Eu ajudo homem porque eu não posso ajudar um moleque. Quando os dois chegaram à beira do rio, não tinha nenhuma canoa. Foi quando Teodoro se aborreceu e correu para cima do moleque para o agredir. Se deu mal. O moleque aplicou-lhe chutes e tapas e Teodoro chegou a pedir para que o garoto parasse de bater, que inclusive o moleque teve de ajudar o Teodoro a subir do barranco até a rua. Outros também sofreram nas mãos do Pretinho da Bacabeira, mas ele ajudou a muita gente, como, por exemplo, quando a pessoa estava com medo, ele ia junto até as proximidades da residência. Só fazia mal a quem lhe fazia mal.

A CARROCINHA

Na cidade de Soure, ouve-se falar em uma carrocinha de ossos. A população comenta que o aparecido é geralmente por volta da meia-noite, quando se ouve um barulho como se fosse um carregamento de ossos. Quando a carrocinha chegava em um determinado ponto da cidade, parecia desabar e escutava-se a ossada espalhar-se pelo chão.

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O VAQUEIRO BOAVENTURA

Nos Campos do Marajó aparecia um vaqueiro de nome Boaventura, vagando entre as matas e os tesos. Segundo o dito popular, Boaventura era um encantado e conhecido pelo povo dessa região como vaqueiro de “Piratuba”, por ter aparecido no lugar com esta denominação na Fazenda São José.

MÃE DE fOGO

Nos Campos do Marajó existe a “Mãe de Fogo”. É algo que a pessoa vê como se estivesse caindo brasas acesas de cima de uma árvore. A pessoa vai na tentativa de ver a coisa de perto, porém, nunca chega na árvore, apesar de estar vendo a claridade, por sinal, muitas pessoas já se perderam tentando chegar ao local.

Ainda nos Campos do Marajó, como exemplo nas Fazendas Laranjeira e Desterro, e no Retiro Mamão, o sinal no Mamão tem uma ilha conhecida como “Ilha do Meio”, onde existe um bezerro todo mole, parece que acabara de nascer. O bezerro não é perigoso se você passar no seu caminho normalmente, tudo bem; mas, se a pessoa tentar pegar ou fazer qualquer outra coisa, se o vaqueiro tiver montado, fatalmente vai parar no chão, pois o bezerro vira um monstro.

Ainda têm muitas coisas aparecendo nos Campos do Marajó, não é possível contar tudo agora.

A VERDADEIRA HISTÓRIA DO LOBISOMEM

Aqui na cidade de Soure, localizada na nossa grande Ilha do Marajó, apareciam coisas estranhas contadas pelos meus avós, algumas delas eu ainda alcancei, como, por exemplo, o aparecimento do Lobisomem, que, para amedrontar as pessoas e fazer o mal, se transformava em animais como cachorro, porco, cavalo e outros. Eram pessoas que, pela força diabólica, conseguiam tais façanhas, ou seja, eram chamadas de feiticeiras, que, por meio de orações malignas também se transformavam em Matinta-Perera. Por sinal, o poder era tanto, que a

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Matinta-Perera chegava até a voar sobre as pessoas. Confesso que eu não acreditava, mas eu, conversando e lendo, cheguei à conclusão que era verdade. A Matinta-Perera atacava os vaqueiros nos grandes campos das fazendas do Marajó e chegava a ferir alguns, já que os atacava com suas garras e suas grandes asas. A gente, montado ou a pé, sentia quando ela passava por cima de suas cabeças, pois era fácil ouvir o barulho das asas e os seus apitos. Há quem diga que a Matinta-Perera passa por sete cidades em uma noite. Assim como as que não voam, os seus trajes são casacos e saias em preto e branco, cabeça amarrada com um pano e grande cutelo nas mãos, prontas para cometer o mal.

O horário do meu trabalho fazia com que eu saísse a qualquer hora da noite e, por diversas vezes, me deparei com algo semelhante. Se era a Matinta-Perera, eu não sei, só sei que era alguma coisa anormal.

Nas minhas andanças sempre me preparei antes de sair de casa, já que sempre faço e oriento todos a rezarem um Pai-Nosso, pois o Satanás pode até aparecer, mas jamais vai tocar ou fazer o mal a você. Se o Satanás aparecer, por Jesus Cristo, não tentará algo anormal contra nós.

Os feiticeiros existem como os curandeiros. Deus deixou de tudo no mundo e, se ainda faltasse alguma coisa, é evidentemente que o mundo não estaria completo.

Um amigo meu me contou que ele tinha um colega que virava bicho. Um dia disse ao tal colega: — Me ensina a fazer o que fazes, se quiseres, é claro. — O colega de imediato respondeu: — Tudo bem, só é preciso fazer o que eu vou te ensinar: durante três sextas-feiras, quando o relógio apontar zero hora, ou seja, meia-noite, vai até um lugar esmo (mato), e lá verás um cavalo, deite de lado dizendo as palavras encabela-encabela,ou seja, pedir para o seu corpo ficar cheio de cabelo.

Na primeira noite, ele não sentiu e nem viu nada. Voltou ao colega e disse que nada sentiu. Logo o amigo disse: — Não te preocupa, são três vezes. — Na segunda sexta-feira, chegou onde o cavalo rolou, tirou novamente as roupas e deitou-se rolando e dizendo encabela-encabela. Foi quando viu que o corpo apresentou algo diferente, passou a mão na barriga e sentiu a presença de cabelos. E, com medo do que estava acontecendo, correu gritando desencabela-desencabela! Assim de imediato começou a rezar um Pai-Nosso, ofereceu a todos os santos e voltou ao normal.

Não deixou nem amanhecer o dia e foi à casa do amigo, para quem contou tudo o que viu e sentiu. Nunca mais quis falar a palavra encabela.

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Hoje algumas pessoas me perguntam por que essas coisas não aparecem mais e respondo que naquele tempo as únicas ruas que existiam limpas eram a Oitava e algumas travessas até a Vinte. Os bairros Matinha, Pacoval, Umirizal, Macaxeira e o Bairro Novo não existiam. Pra chegar de casa a outra era através de caminho,sendo que cada casa ficava distante uma da outra.Não tinha luz elétrica; a usina funcionava à lenha e a iluminação era até a Quarta Rua, o restante era à base de lamparinas e lampiões a querosene.Hoje com o progresso está tudo claro, como pode aparecer,pois a população cresce e tudo tem o seu tempo.

A história de virar bicho aconteceu com outras pessoas na região do Marajó, contadas por pessoas direitas e honestas, era possível acreditar nelas.

O fANTASMA

Eu trabalhei em uma fazenda que para chegar na casa, tinha que andar aproximadamente uns sessenta metros do leito do rio. Lá também aparecia um fantasma. Como o lugar tinha muita lama, tivemos de construir uma ponte.

Em um belo dia uma moradora da casa da fazenda e seus filhos viram um homem na referida ponte por mim construída. Como não tinha nenhuma embarcação atracada no porto e os trabalhadores da casa estavam no campo, ficou com muito medo. Apesar da casa ser muito grande, ficaram todos só em um quarto, agasalharam-se e não se preocuparam, já que na casa grande tinha equipamentos para currais de peixes e outros. Às vinte e uma horas, começou a festa (barulho), caíam panelas, pote, cadeiras, quebravam pratos e o barulho era forte no assoalho. Junto com as crianças a mulher passou a rezar e, como já era de madrugada o galo cantou três vezes e o barulho parou. Assim passou o medo da família. Quando o dia amanheceu a mulher abriu aporta do quarto, saindo para verificar os danos, e se surpreendeu, pois estava tudo arrumado na casa. Os demais moradores começaram a chegar do campo e ela lhes contou, mas eles não acreditaram.

Em uma outra noite, a canoa que deixava o rancho na fazenda ao atracar na mesma ponte, um dos tripulantes avistou um homem, jogou a corda para que este à amarasse na cabeça do esteio. Para a surpresa

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da tripulação, viram que não estavam atracando; a canoa estava indo na correnteza e, quando estavam bem distantes da ponte, não viram mais ninguém. Ficaram com medo, mas, mesmo assim, com uma vara, empurram a embarcação até encostar na ponte, já que, naquela época, as canoas não tinham motores, pois eram a velas e remos. Quando a tripulação contou para as outras pessoas, alguns acharam que eram bobagem e mentira.

Nos Campos do Marajó ainda hoje existem coisas que só quem viu sabe da real situação.

AS CIDADES DO MARAJÓ E SUAS TRADIÇÕES

Na cidade de Soure, o primeiro cartão postal é o muro de arrimo, além da bela vista, está escrito “Seja bem-vindo a Soure, a Pérola do Marajó”. Soure é banhada pela baía do Marajó e tem belas praias: a praia do Pesqueiro, com tradições pelas belezas ecológicas, já que nas proximidades existem manguezais, igarapés, dunas de areia, etc. Na parte cultural a praia do Pesqueiro, nos meses de junho e julho, tem inúmeras apresentações como: boi-bumbá, dança de carimbó, corrida de crianças em sacos, luta marajoara e ainda desfile de moças bonitas, participando do concurso miss veraneio. Os eventos prosseguem nas praias da Barra Velha, Mata Fome e Garrote.

Também são lindas as praias da cidade de Salvaterra, como a praia Grande e Santa Marta, e, se andarmos nos povoados e vilas de Salvaterra, vamos encontrar diversas coisas lindas, como por exemplo: as praias de Joanes e Jumbim e outras banhadas pela Baía do Marajó.

Marajó, com sua beleza e o poder econômico não tanto explorado, atrae turistas de várias cidades brasileiras como também de muitos países.

As belazas noturnas aliadas à infra-estrutura básica geradas pelas administrações municipais colaboram para receber bem os turistas.

A cidade de Soure dispõe de praças, clubes, espaços culturais, igrejas, galerias de arte, orla fluvial, belas praias, além de aventuras como passeios pela Baía do Marajó e nos rios entre as ilhas...

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REAÇÃO CLUBE

Em 1925, fundou-se o Reação Clube em Soure. Hoje com sua sede social e seu estádio de futebol, mantém sua tradição com seu baile social há quase trinta anos, o baile das debutantes, no qual é obrigatório o traje social. No dia 7 de setembro, é realizado o aniversário do Clube, quando é oferecida uma festa aos seus sócios, diretores e atletas.

Na parte esportiva, o clube foi quem mais conquistou títulos municipais e tem um dos melhores jogadores do Estado do Pará. Trata-se de JANGO, que foi do Reação Clube para o Clube do Remo, onde conquistou alguns títulos. Em seguida, o jogador foi vendido para o Santa Cruz de Recife. Era conhecido como Mestre Jango, por ser o 1° jogador vendido para outro estado. Também o jogador CONEGAS que pertencia ao Reação, defendeu por vários anos o Clube do Remo. Além de outros craques como POEIRA e BERECO, que defenderam a Tuna Luso Brasileira.

Na década de 60 tivemos uma geração vitoriosa no Clube, como: Eduardo, Evane, Ari, Folião, Xavier, Rosemir, Simão, Eurico, Jamico, Moacir, Bidoga, Carlitinho e Baxote.

Agora, por trás de tudo isso, tivemos um dos maiores desportistas do Marajó: CARLOS DE SOUZA GONÇALVES, o conhecido CARLOS BIÁ, já falecido, que deixou muita saudade, tanto na parte esportiva como na parte social.

Hoje o Reação conta com o apoio do Sr, Davi Martins de Paula, que é o grande benemérito do Clube, dando-se o direito de ser o presidente do Clube com maior idade: 92 anos e com mais de 60 anos dedicados ao Reação Clube. O último título que conquistou foi em 2004. De lá pra cá não houve mais campeonato.

Através do apoio do Sr. Davi de Paula e da coordenação do ex-atleta do Clube: CÉLIO PIMENTEL, criou-se a Escolinha de Futebol CARLOS BIÁ, com Estatuto e CNPJ, que participou do Campeonato Paraense Intermunicipal, Categoria Sub-17, conquistando o título inédito para Soure. Os atletas foram: Miguel, Dinamérico, Oberdan, Anilson, Patiara, Renan, Arian, Levi, Anderson, Dione Leal, Marcelo, Dionizinho, Dengo, Cate, Gordo e Willas; técnico: Bigú; coordenador: Célio Pimentel e assistente social: Sueli.

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VERSO EM RIMA DE PROSA_____________________________________________

Soure cidade queridacidade de grande valoraqui o vento sopra bempor isso não sentimos calor

O povo da cidade é maravilhosoé humilde, honesto, alegre e trabalhadorquem vem conhecer a cidadeé recebido com paz, carinho e amor.

O folclore daqui é completoassim dizia minha avóSoure tu foste o inventor da música,dança, dança do carimbo!

Tu és a cidade mais belada grande Ilha do Marajóna Ilha do Marajó tudo tem tatu, marreca e guaráe a belíssima capivara.

Lutasse com o gado bravocom corda e até mesmo com varamais é bonito mostrara cultura Marajoara.

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DIA DAS MÃES

Hoje é o dia mais importante,de todos que pra nós Deus criouentre outros este é maravilhosoporque eu vou dizer o seu valorquem tem sua mãe em seus braçosé abençoado com paz, carinho e amor.

É assim que a gente vê a belezaé a mas pura de todas as realidadese daí que veremos o amor da família,junto com a sua mamãe a nossa tranqüilidade.é assim que Deus nos abençoacom paz, carinho e felicidade.

Você estando junto com sua mamãejamais errará o longo caminho,porque é acompanhado com Deuspor isso nunca estará sozinho.

Seja a estrada limpa ou cerrada,você nunca encontrará espinhoporque sua mãe está lhe cobrindocom alegria, amor e carinho.

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Mestre Tomaz

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O TOCO

Aqui no rio passa um tocona água de lua cheia,a pessoa que vê elelogo se receiafica pensando consigoaí vem coisa feia.

Quando este toco passaque alguma pessoa vêpergunta a si mesmaquem será que vai morrerisso é verdadee pode acontecer

E fica pedindo a todos que tenha muito cuidadofalando e explicando,não pode ficar calado,na certa é que morreuma pessoa afogada.

Isso vem de muito tempo não começou agora,fica na expectativaesperando qualquer hora,passe o que passa e às vezes nem demora.

Quem não sabe veja beme pode prestar atenção,ele passa e nem precisade abalo de trovãoele vem em pé parece que está no chãoEu passei perto dele e calculei

setenta centímetros mais ou menosuns acham que é grandeoutros dizem que é pequeno,mas algumas pessoas dizem este toco é veneno

Mas meus amigos vejamque isso é caso sérionão é pedindo que aconteçanada disso eu queromas que na certa vai um para o cemitério.

Meio metro ele temfora d’agua de grossura é roliço e bem redondonão parece cinturaquando ele passa é na certaé um para a sepultura.

Meus amigos eu não sei como isso aconteceé uma coisa de superstição,mas povo não esquecenem bem a gente pensa o danado do toco aparece.

Otávio da Silva Nascimento Jr.

Popularmente conhecido como NIC Jr., é filho de Otávio Nascimento e Maria Pinheiro. Nasceu em Belém do Pará, no dia 07 de setembro de 1986. Aos cinco dias de nascido veio para Soure, onde cresceu, estuda e vive. Descobriu-se como poeta após a leitura da narrativa “O circo chegou”, texto integrante de um livro de 4ª série do ensino fundamental. Atualmente, cursa Letras – UFPA e Matemática – UEPA. É membro fundador do CPOEMA. Compõe sonetos, odes, baladas e trovas. Uma pessoa que se pauta pelo dinamismo, pela justiça, pela coragem. Companheiro, está sempre sensível às questões sociais (das pessoas), em particular, das pessoas com as quais convive.

Fazer parte desta coletânea é uma benção especial que Deus me privilegia. Sem a presença Divina em minha vida, nada disso estaria acontecendo. Obrigado Divino Pai por ser teu filho. Filho que recebeu educação, amor e carinho de Otávio e Maria Antônia e a convivência fraterna com meus irmãos.A minha instrução foi se estruturando a partir da vivência prazerosa que passei em minhas escolas. Assim, obrigado Santana de Tucumanduba, Instituto Stella Maris, Escola Edda, UFPA e UEPA pelos ensinamentos, de modo particular, aos professores que acreditaram em mim e me incentivaram a escrever. A minha musa inspiradora merece também um obrigado em forma de beijo, sem o apoio de Meiriane talvez o sonho não fosse concretizado. Amigos e leitores, obrigado pela aquisição de nossa Antologia e pela leitura que farão.

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SINTO

Sinto meu peitoatravessado por uma navalhadaquela que nos ferecomo a rede que nos malha

Sinto meu peitocomo uma flor envelhecidacujas pétalas no chãomoribundas nessa vida

Agora vou mais fundonão sinto mais meu peitosinto meu coraçãode um outro jeito

Sinto meu coraçãoquase morrer de vontadecorrendo a tua procurana estrada da Saudade...

Sinto meu coraçãocomo aquele do cupidoARPÃO, DOR, SOLIDÃOno meu peito adormecido

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A GRANDE ILHA DE MARAJÓ

Tudo de bom que tu imaginas tem aquido nascente do sol ao sol poenteda lua ainda minguante à lua crescentedo frito de vaqueiro à cuia de açaí

Já ouviste falar do canto do bem-te-vido famoso boto que vira gentedo toco que aparece de repentepeças lendárias no Rio Paracauari

O caranguejo do buraco oriundono pedaço mais lindo do mundotem a bela dança do carimbó

O caboclo foi privilegiadotemos tudo que por Deus foi deixadofalo da Grande Ilha de Marajó.

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Otávio da Silva Nascimento Jr.

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LEMBRANÇAS DAQUELA CARTA

Lembrei-me das belas e amargas palavrasque ora eram doces como doce é o melOutrora tristes rabiscadas no papelrecordei-me das duras palavras grifadas.

Letras e mais letras, todas entrelaçadasque daria até pra sangrar o céuou delas extrair o aroma de channelsão vogais e consoantes na carta grafadas.

Quem és tu que a dedicou para mime porque citas a mulher que amei quem és tu que chama-me e eu vim.

Com você muitas vezes eu sonheivi preto no fogo em pleno jardimmas quem és tu que ainda não sei.

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AO MEU CONTERRÂNEO

Oh! Centenário Rio Paracauaricomo pro povo e pra mim tu és bondosoés o conhecido rio caudalosooriginário do lendário Tupi-guarani

Agradecido fui eu quando te vitu que dá-me o peixe mais saborosono mundo és conhecido e mui famosoe ovacionado és pelo povo daqui

Da canoa tu és o constante caminhoEm teu corpo dá paixão, dá peixinhotuas ricas margens têm pássaro e ninho

Por muitos já foste então esculpidohoje te encontras um pouco feridomas continuas sendo o meu rio querido

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MAISA

Vi a meninade saia alongadabela e faceirae um pouco queimada

Corpo delicadosorriso perfeitocabelo assanhadoe um peito que deito

Olhos puxados uma pulseira no pébela e faceiraque linda mulher

OLHOS

Tudo está branco e pretosou pobre e ricosou torto e direitosou João, mas também sou Chico

Sou do campo e da cidadeando a cavalo e de carroconheço bondade e maldademoro em prédio ou casa de barro

Luz elétrica e lamparinasou forte e também sofridatudo isso se combinasou a VIDA

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BOTO

Vamos contar agorahistória de pescadorfaz parte da culturafoi o boto sim senhor

Nas festas de salão é um homem encantadorvestido todo de branco seu charme já mundiou

Cuidado meninacuidado com o botoesse cabra é marotoele vai te pegarse te pega o botosabes no que vai dar

Te tira do meio da festae leva pra beira do riofaz o serviço completoJá sumiu e tu não viu

Agora espere o resultadocriança sem paio boto é culpadolevando culpa dos outrosAi meu Deus! Mais que coitado

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ONTEM, HOJE E O AMOR

Ontem escrevi um belo poemahoje nem consigo pensarontem eu tinha vocêe hoje não posso contar

Ontem eu andava na ruasorrindo pra lá e pra cáhoje a vida perde o sentidoe o coração começa a chorar

Quisera eu ontemnão ter te encontradoqueria eu hojeestar ao teu lado colado

Acho que o amoroutrora esquecidoressurge com mais forçae como se fosse cupidodeixando-me loucamente apaixonadodesabrochando o que estava escondido

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VEM

Vem meu amorvem logo sem demoravem que te esperovem que te querovem logo me abraçarmeu corpo necessita do teusinto-me com frioprecisas me esquentarvem meu amorvem logo sem tardançavem pra sua criançavem me namorar

NUNCA

Paro pra pensare chego à conclusãode que nunca acertareie o amor de verdade que procuronunca, eu nunca o encontrarei.

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Otávio da Silva Nascimento Jr.

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UMA LÁGRIMA ESCONDIDA

Uma vez vi um pinheiro chorarLevou corte de machadoE percebi que levementeCaiam gotas do lugar que foi afetado

Aquela árvore sofria demaisPorém despejava sua dorA lágrima recompunha a vidaSofria, mas superava com amor

Hoje sinto-me como a árvoreAquela bonita árvore feridaPorém sofro com algo presoTenho uma lágrima escondida

Reginaldo da Consolação Monteiro

Sourense, nascido em 24/02/1939. É casado, desenhista de profissão. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais (Direito) pela Universidade Federal do Estado do Pará. Diplomou-se pela Escola Superior de Magistratura. Cursou a escola de inglês Centro Cultural Brasil EEUU (CCBEU). Colou grau pela Escola Paulino de Brito em Técnico em Contabilidade. Trabalhou em empresas privadas e também na Prefeitura de Belém como desenhista e projetista. Exerceu o Magistério e a Magistratura, por onde se aposentou por tempo de serviço. É autor da autobiografia “Sonhos, Pesadelos e Triunfos”.

Sorte é o casamento do talento com a oportunidade, ou seja, é a soma dessas oportunidades quando aproveitadas sem nenhum desperdício. A sorte não existe sem o concurso de terceiros e amigos que nos valorizam, sem estes, seremos sempre um anônimo a mais, ou alguém que sempre será ninguém.Ao Clube de Poetas e Escritores da Ilha do Marajó, o meu agradecimento pela sorte em fazer parte dessa grandiosa empreitada literária.

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Reginaldo da Consolação Monteiro

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UM SÍMBOLO DE AMORO Deus do amor tem como símbolo, na mitologia romana, um

anjo alado de olhos vendados, com arco e flecha, chamado Cupido. Quando esse anjo é assassinado, esse crime é covarde, pois, ele sempre é executado quando agasalhado no interior de algum coração.

UMA VELHICE fELIZUma velhice feliz é como se, ao pôr-do-sol de uma belíssima

tarde de primavera, os passarinhos alegremente cantassem, agradecendo as belezas de um lindo dia que lentamente se apaga, nos horizontes da vida.

O POETA É UM SOfREDORO poeta sofre porque enxerga tudo com os olhos da alma,

portanto, ele é bem mais sensível aos embates da vida. Ele tem uma visão diferente das coisas e das causas que o rodeiam. Talvez por isso, ele não apenas sabe sentir resignadamente, mas sabe muito melhor, transmitir o que sente e pensa de seu mundo interior.

O poeta que é solitário é muito solidário, sua bandeira é a fraternidade que o faz embalar dores, que quase sempre não são suas, deste modo, seus olhos estão sempre molhados por lágrimas alheias. Ele só reclina a cabeça aos ombros da poesia. Por ser tímido e simples, não consegue ser egoísta e, se não tem escolaridade, é dono da notável sabedoria de um autodidata, pois, a fonte de suas inspirações vem do belo, que só ele consegue extrair da própria natureza.

O poeta é, verdadeiramente, um solitário, é das profundezas mais íntimas de sua solidão que emergem as ondas sonoras de suas sinfonias de amor, cantadas em repetidas paixões doentias, refletidas liricamente em seus poemas.

O poeta é um sonhador, no horizonte de seus sonhos, desenham-se os coloridos fantasiosos do seu distante mundo de ilusões que ele, por ser um caçador de nuvens, morre contemplando sem que possa alcançá-lo. Por ser um visionário, ele vive de esperanças que jamais se convertem em realidade, e aí vão somando-se em traumas e desencantos que resultam em um mundo místico, fantasioso e triste, que muitas vezes o leva à morte.

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O poeta amarra-se às suas doces lembranças e meditações, seu passado juntando-se ao presente, inibe o futuro. O poeta é por vocação um mensageiro da dor e do amor, é isso que lhe faz inconscientemente, cultivar o sofrimento como o nascedouro fértil de suas ardentes inspirações. Se não sofresse, não seria poeta, talvez que não conseguisse articular uma só frase romântica, se não estivesse sufocado por copioso pranto.

O poeta reside nas paixões, onde costuma colorir o branco e preto de sua vida com matizes chocantes, que transformam o trágico em belo e o drama em comédia. Ele está ligado à máxima de Cristo que diz: “Quem não vier pelo amor, virá pela dor”. O poeta vai pelos dois caminhos, da dor e do amor, pois, entende que esses caminhos acoplam-se a um só, que é o da dor. O sofrimento é o termômetro do amor. Sem sofrimento o amor não subsiste.

Sendo fantasioso, em seus devaneios o poeta levita, nessa flutuação, conseguindo virtualmente voar nas asas do vento, navega sobre as águas de oceanos, mares e rios, buscando o porto seguro de uma felicidade que para ele, jamais existirá, já que ele é poeta.

O poeta faz de sua insônia um alazão fogoso, o qual, entre galopes, vara noites e noites, buscando as madrugadas. Sofre porque muito ama e tem a sensibilidade de um oleiro que, trabalhando, dá ao barro a arte de feitios diferentes. O poeta, também, faz da tristeza e da saudade, principalmente das paixões, a matéria prima para as suas líricas e divinas obras.

Eu sei de tudo isso pelo fato de ser um poeta anônimo.

QUANDO A VI PELA PRIMEIRA VEZUm dia, conheci alguém especial, mas enraizada nos hábitos

e costumes da vida campesina. Ela ainda é uma jovem bonita, clara, esbelta e arredia. Por viver na zona rural, me faz lembrar de algumas rosas silvestres que, embora lindas e coloridas, não têm perfumes.

No nosso primeiro encontro, trocamos sorrisos ligeiros e olhares furtivos. Fomos aproximando-nos levemente e o que era apenas uma brincadeira virou um caso muito sério.

Interessante, nós, eu e ela, embora nascidos do mesmo torrão natal, trilhamos caminhos muito diversos. Advindo disso, nosso modo de vida, quer social, moral, familiar, ético e religioso, era muito diferente. Isso não me impedia de admirar a singular beleza daquela que, na fazenda onde um dia morei, atendia pelo nome de Moema. Nós não nos conhecíamos.

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Eu notava que ela, naquele dia, embora juntinho a mim, me parecia distanciada e calada. Após algumas perguntas, ela confessou-me que, por ser eu um moço da cidade grande, ela nutria por mim uma grande consideração e respeito. Em verdade eu achava mesmo que o que ela tinha era receio de falar; eu então, me contive para não feri-la.

Passei longos minutos, imerso em profundo silêncio, certamente, com receio de avançar o sinal. Assim, enquanto Moema apertava as minhas mãos, ajudado pelo luar daquela belíssima noite, eu me perdia no azul-celeste daqueles olhos miúdos e belos, buscando decifrar os enigmas, agasalhados no mais íntimo daquela pureza de mulher.

Quando nós nos entregamos à solidão daqueles campos prateados de luar; quando a natureza arranjou para nós, a pintura de um céu de variado esplendor; quando sentimos a emoção da sensação e da liberdade de estarmos sós, eu, inebriado de encantamento, me extasiei como se aquilo fosse uma festa de consagração ao belo, louvando o nosso primeiro encontro. Estimulado não só pela magia contagiante daquela noite, mas pela cândida beleza de Moema, sem mais poder agüentar um só minuto, rompendo o silêncio, disse-lhe o seguinte:

– A folha murcha do deserto nunca esquecerá o orvalho de uma noite amiga que lhe fez vivificar. Tu, Moema, és o frescor dessa brisa que trouxe ao meu rosto vincado, o orvalho restaurador, que está me restituindo a vontade de viver. Eu sou essa folha murcha.

Então, navegando nas águas remansosas do meu incontido desvario, me deixei dominar pelas palavras que, fluindo, me fizeram continuar assim:

– Moema! Estou certo que, quando te vi pela primeira vez, os olhos dos céus, ao luar desta noite, através de estrelas curiosas e cintilantes, nos espreitam encantados.

De repente, quando ela se mostrou pensativa, passivamente tímida e emocionada, de chofre, aproveitando falei:

– Isso tudo, Moema, foi o que pensei e senti quando te vi pela primeira vez. E tu, amor... O que na verdade sentiste, quando também me viste pela primeira vez? Fala, por favor! Estou ansioso, por Deus! Não faz suspense.

Envaidecido, desejava saber das coisas românticas que Moema sentia por mim naquele primeiro encontro. Eu queria ouvi-la naquela noite. Ela, sem dúvida, teria coisas belas a me dizer. Enquanto, nervosamente, eu esfregava as mãos, ela olhou-me e graças a Deus, com

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doçura, serenamente começou a falar. Quase desfaleci de emoções ao ouvir as suas palavras me perguntando o seguinte:

– Amor – disse ela languidamente –, estou emocionada, posso falar?

Eu, impaciente, respondi nervoso:– Por Deus! Querida Moema, fala sem demora.E ela finalmente, com muita sinceridade, falou assim:– Sabe, amor! Quando eu te vi pela primeira vez – disse ela – pensei

o seguinte: aquele “negão” com certeza, tem cara de quem pula a cerca.

NA VERDADE, QUEM SOU EU?Sou um homem que aprendeu a ser idoso sem deixar de ser

criança. Que tem o coração provido de emoções, que me fazem rir à toa e chorar com facilidade, admitindo que o sorriso e a lágrima, são as mais sinceras expressões da sensibilidade humana.

Sou um guerreiro anônimo e muito determinado, que nunca se deixou abater por derrotas sucessivas nem se empolgar com vitórias, que tão pouco se repetem. Sou aquele que sempre teve a sua alma albergada por muitos sonhos de gigante, portanto, quem sonha os meus sonhos, inevitavelmente, terá muitos pesadelos, mas despertará aos pés de grandes realizações.

Não sou humilde, porém sou simples e entrego-me fácil ao embalo de sofrimentos alheios. Mesmo pobre de bens materiais, sempre admiti que a doação, é a maior manifestação de amor ao próximo carente. Doar é um ato de despretensiosa grandeza e generosidade, não cabe retorno, nem mesmo o agradecimento deve ser exigido pelo doador, para que o ato de dar não seja convertido em troca.

Não creio em conquista fácil, nem na proteção da sorte, admito que as sementes do triunfo que muitas vezes frondejam na aridez de um solo estéril, o fazem ao impulso de nossa determinação e sudação.

Creio na Lei do Retorno, com a certeza de que o amor é o passaporte para a nossa viagem introspectiva, onde adentraremos os jardins paradisíacos, que cada um de nós traz dentro de si mesmo, pois, é pelo que plantamos e colhemos que tudo que temos, sem erro, é o saldo daquilo que demos e fizemos ao outro. Eu sou um homem de muita fé.

Sempre admiti que os amigos próximos são mais perigosos do que os inimigos distantes, assim, os poucos amigos que considero são aqueles que provaram comigo, o mel e o fel, servidos na taça da felicidade

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e das desventuras. As minhas emoções, a minha coragem e a minha fé me levaram

a entender que a soma de tudo isso, premido pela dureza que a vida me impôs, teve como saldo um encontro marcado com Jesus e eu agradeço. Foi isso que me tornou um cristão feliz para sempre.

Sou maduro de aparência e jovem de espírito, exerci cargos públicos importantes, sem jamais discriminar alguém. Admito que a desigualdade social é o cerne da discriminação, e esta, a seu turno, é a mãe de todos os preconceitos. Se o amor recíproco for impossível entre nós, eu Te peço, meu Deus... Abranda os rancores das diferenças pessoais e sociais.

Sou frágil, sempre adoeço, mas a doença nem sempre é um mal. Há momentos em que é também um remédio eficaz, capaz de cicatrizar feridas incuráveis. Às vezes, me imagino um cidadão perfeito, pelo fato de ter defeitos que todos os outros homens têm e virtudes raras, que nem sempre os outros homens conseguem ter.

Tenho consciência de que sou o resultado do mais belo fenômeno da natureza – a fecundação –, que me deu a vida. Se eu nasci, é porque tenho um compromisso com essa vida. Talvez que seja o de dividir o pão para encontrar a felicidade.

Na verdade, quem sou eu? Meu nome é: Reginaldo da Consolação Monteiro. Sou alguém que nunca foi. Não é, e nem será ninguém.

DIA DAS MÃES SEM VOCÊSer mãe é a mais bela, porém, a mais espinhosa das missões.

Não existem cursos que diplomem essas profissionais. A escola superior delas é a universidade do amor, da afeição e da renúncia. A maternidade é dom legado por Deus.

Muito obrigado, Senhor, por me teres feito racional, com o privilégio de poder entender quão importante tem sido o papel dessa mulher chamada mãe, na vida da humanidade.

Todo dia de minha vida é também o teu dia, mãe, pois, cada um deles, desde a tua partida, é o dia da tristeza, da solidão e da saudade. Na verdade, todo dia é o dia das mães, que desde que te foste, representa para mim a eterna ausência de uma mãe que não voltará jamais.

Todo o ser humano, seja quem for, do coração mais rude ao mais sensível, que um dia perdeu a sua mãe, traz neste dia das mães, nos olhos dependuradas, muitas lágrimas lutando para explodirem, em

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dolorosos prantos. Sim, eu sei! Estou vivendo agora, no dia das mães, neste momento, a quietude de um misterioso clima. Eu sinto a falta de teu calor e de teus afagos, eu preciso chorar e me embrulhar contigo, mesmo que virtualmente, nos mantos cariciosos do teu amor, ouvindo de ti minha mãe, o murmurar de tua voz aos meus ouvidos, dizendo baixinho:

– Meu filho, eu te amo!Por um momento as minhas emoções me fazem regressar no

tempo. Rapidinho eu viro uma criança mesmo que, por tão poucos segundos. Ainda assim, volto a experimentar o quanto é belo estar outra vez em teus braços, agasalhadinho no colo macio de teus carinhos, sentindo o teu calor de mãe. É a repetição de meus sonhos instantâneos que me despertam para os pesadelos de tua ausência.

Tu partiste, mãe, quando eu ainda tanto precisava do teu amor, da tua companhia, nós, crianças sabemos sentir, mas não sabemos entender, nem nos conformar. Hoje, ainda lembro quando em minha frente, cerraste para sempre os teus olhos verdes e profundos como um oceano. Aos meus ouvidos, ainda ecoam os soluços dos parentes e amigos, quebrando o silêncio de nossa alcova e, na tela de minhas lembranças, ficou gravada a tua palidez ao desfaleceres nos braços de meu pai, que também soluçava. Era a tua partida.

Ainda repercute em mim o meu grito de apelo a Deus, repetindo: “Mãe, minha mãezinha! Não te vás. Por Deus mãe! Não te vás...” Ainda assim, tu partiste mãe, de súbito, sem tempo para me dizer adeus. No teu lugar impreenchível, ficou só a saudade.

Minha mãe! Onde quer que estejas o teu coração há de estar sintonizado ao meu, não sou mais menino, assim, receba, neste dia das mães, o afeto de um homem maduro, que só não está bem, porque ainda sente muita falta da luz verde-esmeralda de teus olhos, que, na noite escura daquele triste dia, para sempre se apagou de minha vida.

Mãe, tu não foste apenas uma mãe, mas uma estória de renúncia, de fraternidade, de ternura e paz, enfim, um anjo mensageiro do amor que, só por um momento, esteve entre nós, apenas para cantar as glórias de Deus. Dentro deste vazio repleto de saudades, está plantada a árvore frondosa do amor que viceja em meu coração. Ó minha mãe! A tua ausência que impera em mim neste dia me faz quedar de joelhos, sobre o tapete macio de tuas doces recordações.

Minha mãe, todo o amor que me legaste na inspiração de tua presença, agora me faz, neste dia das mães, chorar, um rio de lágrimas na solidão da tua ausência.

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Muito obrigado pelo companheirismo e pela vida. Mãe! Onde estiveres, recebe neste dia das mães, daquele que foi teu único filho, este presente, em forma de uma linda mensagem, divinizada no amor.

“Que Deus te abençoe.”

O PREÇO DE UMA ALUCINAÇÃO ALCOÓLICAAssumindo interinamente uma comarca do interior, no primeiro

dia de trabalho, quando ainda colocávamos tudo em seus devidos lugares, adentrou ao meu gabinete, um homem precocemente grisalho, nervoso e abatido. Cumprimentando-me, disse chamar-se Fábio Martins.

Aquele homem desculpou-se por ter sido ele, o primeiro atendimento daquele dia e, em seguida, requereu verbalmente o que desejava dizendo:

– Doutor, com respeito, rogo que V.Exa. dê prioridade ao meu processo, que já completou quatro anos sem julgamento. Desculpe-me, doutor, mas não estou mais agüentando.

Sem tomar ciência do fato, mas curioso e bem intencionado, perguntei:

– Por favor, senhor, diga-me: esse caso que lhe preocupa, trata-se de quê?

– É homicídio, doutor – disse ele cabisbaixo –, matei e necessito ser julgado, não suporto mais esperar. Essa liberdade me tortura em demasia.

Sinceramente, estranhei aquilo que jamais tinha visto antes. Ninguém estando em liberdade, deseja ser julgado com brevidade, por isso, voltei a questioná-lo outra vez.

– Por que pressa, não está em liberdade? Essa pressa senhor, pode colocá-lo na cadeia – e pedindo desculpas quis saber –, como aconteceu isso, poderia me dizer?

Ele, suspirando fundo, fez uma longa pausa e continuou:– Sabe, doutor, alucinado pelo álcool, atirei em um jovem, que

apenas começava a viver. Ele era um universitário inteligente, sadio e contava apenas com dezoito aninhos de idade. Em conseqüência, perdi a esposa, minha casa, os filhos, os amigos, a paz e a vontade de viver. Só uma coisa me restou, o desejo de ser condenado.

Após ouvi-lo com respeito e redobrada emoção, aconselhei-o a buscar um novo caminho que o levasse ao encontro de Deus, talvez que o milagre da resignação abrandasse a culpa, o desespero e o remorso.

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Mas ele, coitado! Ao ouvir-me, passou a chorar incontidamente, como se o seu pobre coração tivesse se despedaçando, a cada palavra por mim pronunciada.

Percebendo que o senhor Fábio Martins havia perdido o equilíbrio, levantei-me apressado, segurei-o pelas duas mãos e disse-lhe com desvelo:

– Amigo, tenha fé e confie em Deus, quem sabe sua família pode se recompor outra vez. Ao sair daqui, entre no primeiro templo que estiver de portas abertas, se lance aos pés de Jesus. Faça isso! Mas antes, fale-me de sua família. Onde está sua esposa? Por que perdeu seus filhos e a casa? Confie e desabafe, isso o fará melhorar.

– Minha esposa, doutor – disse ele constrangido –, já tem nova família, nossa casa abandonada foi vendida e meus filhos... – aqui ele baixou a cabeça – tomaram rumo diferente.

Pedindo licença e desculpas, audaciosamente, tornei a indagar:– Agora, senhor Fábio Martins, fale-me da vítima e dos

familiares dela.– Estou sem coragem, doutor, mas vou falar – disse ele entre

soluços –, a vítima, doutor, foi meu filho mais novo, a pessoa humana que mais amei na vida. Por Deus, doutor, me condene, é um ato de amor, V.Exa. pode fazer isso. Matei o meu filho... Ajude-me, eu quero ser condenado.

Outra vez pus-me de pé, para dar-lhe o conforto que tanto necessitava, naquele difícil momento de sua vida. Abraçando-o apertado e olhando de frente para um crucifixo de metal, que decorava uma das paredes de meu gabinete, motivados por desmedida emoção, nós dois choramos juntos.

Vejamos, até onde o álcool, somado a um curto momento de insensatez, é capaz de nos conduzir. Apenas por segundos de irreflexão, aquele pai mergulhou no mais ardente de todos os infernos. Para que julgamento ou cadeia, se ele já estava condenado à prisão perpétua dos remorsos e arrependimentos, que o farão pelo resto da vida, arrastar aquela pesada cruz?

UMA INESQUECÍVEL NOITE DE AMORTomara que as aves noturnas não calem nesta noite, os gorjeios de

trinados e dolentes bemóis que ensaiaram para nos recepcionar. Tomara, meu amor, que saibas bem mais, colocar um tempero novo, no cardápio

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desse nosso manjar de paixões; tomara que este corpo moreno, esbelto e luzente, ache em mim a fonte de suas satisfações, sentindo cada vez mais, muita sede de amar.

Vem, meu amor, vem ao nosso encontro, meu corpo ávido e pronto te espera para alvejar os teus segredos, subir celeremente e escorregar paulatino e cansado, de todos os teus altos montes. Deixa que eu mergulhe fundo nas águas mornas dos desejos e do amor que só tu, nesta noite, me podes proporcionar. Vem mansinha, despida de normas e preconceitos, envolta nos lençóis cariciosos dos instintos e das fantasias amar-me, na longa noite deste lindo dia. Vem sem perda de tempo, fechando portas e janelas, para que a timidez e o pudor se mantenham lá fora, distante de nós.

Agora que estamos sós, aproveita nesta noite, o calor abrazador desta paixão, para te agasalhares em mim até a fundição de nós dois, derretidos em um só prazer de amar.

Vem, antes que a luz audaz do amanhecer domine as sombras, iluminando nossas faces deprimidas pela exaustão que essa noite quase eterna nos faz viver, debaixo das belezas de um céu virtual, estrelado de luxúria, sedução e amor.

Aquela noite, que parecia eterna, na verdade, representa para a eternidade, o que uma gota de água a faz para um oceano, mas se de tudo sempre sobra algumas coisas, de nossa noite não podia ser diferente, sobrou a eternidade das saudades e das imorredouras recordações. As belezas de uma noite de prazer, nem sempre compensam a tortura das lembranças que nos levam às tristezas e nos fazem chorar.

Quanto maior tenha sido a intensidade de uma noite de amor, mais pesada é a cruz de nossas recordações. Isso nos faz crer que, é melhor evitar um comprometedor e efêmero prazer, do que sofrermos para sempre, os pesadelos de suas doces lembranças que, às vezes, nos fazem crer que é mais importante não iniciarmos um relacionamento amoroso, do que termos que interrompê-lo quando tudo ainda está começado. Quem nos dera podermos inverter o tempo, só para que tivéssemos condições de novamente garimpando, vivermos os nossos começos, descobrindo a cada instante as pedras preciosas das jazidas de uma mina, abastecida de amor.

Foi ali, Esmeralda – minha reluzente pedra preciosa –, que no garimpo do amor, te conheci e jamais te esquecerei.

Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador

É belenense de nascença (17/01/1967), mas gerada no Marajó; Arquipé-lago que guarda no coração. Filha caçula de Inês Figueiredo dos Santos e Raimundo Nonato da Silva Santos (em memória), ambos naturais de Soure. Seu gosto pela leitura, escrita e pesquisa começou ainda criança e hoje lhe rende a obra Ilha de Marajó: Terra de Todos Nós a ser publicada brevemente. Também escreve poemas e artigos para a Via Amazônia, revista com mais de cinco anos na área editorial paraense. Rosângela é sobrinha do saudoso músico sourense Capitão Aniceto; casada com Luiz Amador e mãe de Felipe, Cleber e Fernanda, maiores incentivadores de sua labuta literária.

Agradeço a Deus e à minha Mãe pelo Dom da Vida.Ao meu Pai, hábil poeta e compositor, de quem herdei a veia literária.Ao demais membros de minha família e aos meus amigos.Aos membros do CPOEMA, meus irmãos na palavra e em Deus.

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HERÓIS ANÔNIMOS

Ainda hoje, lembro-me da pacata e tranqüila cidade onde morávamos, no tempo da minha infância, onde meus pensamentos voavam através da imaginação cheia de cores e fantasias.

Muitas lembranças se perderam ao longo do tempo, restando apenas as que ficaram gravadas na mente e no coração.

O mundo era tão diferente do que se vê hoje, mais inocência e pouca violência. As brincadeiras reuniam crianças vindas de todos os lados, estávamos muito distantes das modernidades das grandes cidades. Brinquedos industrializados não faziam falta, inventávamos o que a nossa criatividade permitisse como, por exemplo, as pequenas mangas (fruto regional) caídas da árvore, e que nós as transformávamos em bois, vacas, etc.

No final da tarde em frente à casa simples de madeira, os banquinhos também de madeira eram ocupados por quem gostava de conversar e contar histórias fantásticas. No céu totalmente estrelado, dava para ver as “Três Marias” e o “Cruzeiro do Sul”. A lua cheia parecia sorrir e o vento soprava aos nossos ouvidos dando um ar de suspense àquele momento.

Todas as crianças assentavam-se ao redor dos adultos, a maioria das vezes toda a família se reunia: meus avós, pais, tios, irmãos e primos.

As crianças encostavam-se umas às outras tremendo, principalmente quando o vovô contava as histórias de pescador. Acreditávamos em todas e parecia que nos transportávamos e passávamos a ser personagens das histórias.

Meu avô era um nato pescador, desde cedo aprendeu com o seu avô a arte de despescar curral. Construiu alguns currais nas praias do “Garrote” e “Mata Fome”. Na maioria das vezes, a vazante da maré se dava pela madrugada. Meu avô saía na penumbra da noite; sozinho ou acompanhado por um dos filhos, a lamparina era a fiel companheira. Mata por todos os lados, contudo, uma estradinha de terra as dividia. O medo e o frio se misturavam com o impulso que o encorajava em ir à luta, afinal sua família dependia de seu trabalho, não podia voltar atrás.

Contava que aprendeu a tocar violino quando tinha sete anos de idade; como obra artesanal construiu o seu primeiro violino. Eu admirava muito o meu avô, observava as mãos trêmulas e cansadas, o rosto já meio enrugado, todavia, parecia sonhar ao tocar tão suavemente

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aquele instrumento, como se fossem pétalas de uma rosa, ou um cisne deslizando num lindo lago azul.

Papai era um exímio músico, o cavaquinho era o instrumento predileto. Quando podia, reunia-se com os amigos e formavam o tradicional conjunto pau e corda: banjo, xeque-xeque e cavaquinho.

As cantigas surgiam de acordo com a situação do momento, a solidão e a saudade da família quando estavam no campo trabalhando, os tornavam especialistas na arte da música e poesia. As palavras brotavam do sentimento que estavam ali, dentro do peito. As composições eram feitas sem muito esforço, com a mais preciosa essência. As letras quase sempre retratavam a história do povo marajoara, ou falavam do amor entre homem e mulher, ou então, da dura realidade que enfrentavam nas cheias, no período invernoso, ou no período da seca, quando o chão de tão duro se transformava em terroada.

Todas essas coisas serviam como fonte de inspiração para aqueles artistas, que dividiam suas experiências, criando a própria arte.

Antigamente os homens e mulheres se orgulhavam por ensinar seus filhos oralmente, passavam suas experiências sem precisar de lições escritas no papel.

Nos dias atuais, os pais passam as experiências para os filhos, seus talentos e habilidades, porem, com uma pitada de acréscimo por meio dos livros e das máquinas. Os heróis estão por toda a parte, são personagens que trabalham e fazem a história seguir o seu rumo, sem ser interrompida.

Nem todas as coisas que se aprendem no mundo são tão importantes quanto àquelas que se aprendem com a própria vida.

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SOURE

Carinhosamente conhecida como a Capital deste imenso Arquipélago, indubitavelmente, merece o título de “Pérola do Marajó”.

No passado fora habitada por aldeias de índios maruanazes e mundis, descendentes dos Aruãs.

Após o descobrimento do Brasil, em todo o território do arquipélago marajoara, ocorria o processo de colonização pelos portugueses. Visto que, por volta de 1640, um grupo de imigrantes, também portugueses, vinha de uma pequena e antiga vila de Concília, do distrito de Coimbra, conhecida como “Saurium”, chamada assim pelos romanos por causa dos grandes jacarés que havia lá no sítio de Portugual, os habitantes da vila os chamavam de “saurios”. Ao perceberem que nos rios daqui havia muitos jacarés, definitivamente decidiram mudar o nome da cidade, que antes recebera dois nomes: Monte Forte e Menino Deus, para “Soure”, que é simplesmente uma tradução de “Saurium”.

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BELEZAS NATURAIS

A fauna Amazônica é rica em espécies de animais silvestres e aquáticos, com uma infinidade de pássaros raros, completando a paisagem emoldurada pela biodiversidade dos ecossistemas existentes no Marajó.

A flora é abundante, um verdadeiro celeiro de espécies de plantas medicinais , madeira, sementes oleaginosas, sementes para o artesanato, e uma diversidade de árvores frutíferas que geram recursos para os nativos que vivem basicamente do extrativismo.

Em Soure, os recursos naturais são conservados mediante a sua exploração sustentável, permitindo-se que continuem disponíveis para as gerações futuras.

Existe uma região de campos a perder de vista, com flora peculiar composta por matas de várzea e igapó, rabiscada por lagos e igarapés.

As viagens de barco cruzam os rios numa aventura fantástica e inesquecível.

Beleza majestosa de diversas praias banhadas pelo Oceano Atlântico. São praias impressionantes e selvagens, modificadas a cada ano pela própria natureza. Praias que misturam o mar com o manguezal, as raízes aéreas contorcidas como se fossem esculturas sobre a areia branca.

Antigas vilas de pescadores, onde o progresso tem chegado lentamente: escola, igreja, posto médico. Por outro lado, paisagens de águas claras e areia enfeitada com coqueiros, malocas que mais lembram o estilo dos índios maruanazes, todos englobados num exótico e atraente cartão-postal.

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CULTURA

Incontáveis fazendas ainda guardam o estilo colonial do século XIX. Retiros com casas rústicas suspensas no chão, chamadas de “palafitas”, preparadas especialmente para o inverno, onde o caboclo marajoara tem o costume de pescar na porta da própria casa. O período da cheia favorece isso a ele, pois os lagos transbordam de tanto peixe.

O vaqueiro no verão só anda montado a cavalo; no inverno, sua montaria transforma-se numa pequena canoa a remo, onde pode praticar a pesca do lago, opção favorável de subsistência para quem mora no campo ou nas comunidades ribeirinhas.

A cultura popular do povo de Soure é rica em cores, sons e sabores, recheada de ritmos e danças de origem mestiça.

A culinária é criada com produtos que a terra oferece. São pratos preparados à base de filé de carne de búfalo, peixe, camarão, caranguejo e queijo de leite de búfala.

O artesanato local, expressão de sabedoria do artesão marajoara, destaca-se com a criatividade das esculturas produzidas em argila e outros produtos extraídos da floresta.

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fELIZ CIDADE

Soure, graciosa pela própria natureza. As casas simples e recuadas quebram um pouco a tradicional arquitetura portuguesa. No entanto, ainda guardam o charme das primeiras edificações.

Os jardins floridos enfeitam o espaço urbano, árvores gigantescas e centenárias, coqueiros que mais parecem arranha-céus. O exótico Rio Paracauari, fonte de mistérios e segredos, onde embarcações navegam diariamente.

Ruas largas e avenidas bem enumeradas. Soure foi projetada e desenhada por Arão Reis, todavia, é sua antítese.

A vida em Soure não é um conto de fadas, e sim uma realidade de quem precisa lutar para sobreviver e alcançar os seus sonhos.

Acredito que cada habitante de Soure tem um grande desejo no coração: ver esta terra tranqüila, feliz e próspera, com direitos e deveres sendo respeitados.

Os corações apaixonados cantam e versam o amor pela terra, emanados e respaldados pela benção de Deus.

“O temor do Senhor é a instrução da sabedoria, e diante da honra vai a humildade.” (Pv 15.33)

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OLHOS DE POETA

Meus olhos não se fartam de verOu vir, ou ver?Doces jóias de reisOs búfalos são pérolas negras nos camposNo azul moreno das águasE no verde robusto das matas

Meus olhos não se fartam de verPontinhos brilhantes nos riosPalmeiras bailando ao ventoCom longos cabelos cacheadosCachos roxos, vermelhos, amarelosFlores ímpares, cores, aquarela.

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ILHA DE ESPERANÇA

Brilhante nacarado Das conchas bivalves Do fundo do marDos oceanos folgazes

No deserto da vidaTornaste-te oásis De águas cristalinas De rios infindáveis

Inesgotáveis florestas De bosques gigantesFiéis testemunhas De aves errantes

Bichos selvagensPríncipes das matasO homem, no entanto,Em rei transformaste

O vento cortanteSopra de onde querEm tua face sedentaTanto faz de onde vier

Dominante na terraA alma rendidaÉ lamparina na mesaQue a esperança acende

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No campo geladoO vaqueiro pelejaSonhando acordado A fartura almeja

Voando na solidãoDe um mundo atrozO cavalo é companheiroDaquele que é seu algoz

Na montaria a remoO caboclo se esguiaDebaixo da chuvaA tempestade o guia

Lançando a sua sorteEnfrenta a morteCrendo na farturaQue vem lá do Norte

Suportando as trevasDos meses cinzentos Das noites sem luaSua dor é ungüento

No murmúrio da noiteO sonho se desvanece Como vaso que se quebraDas promessas se esquece

No entanto a esperançaÉ tesouro desejávelReascende a candeiaComo bálsamo suave

Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

Nasceu em 20/01/1990, em Belém, mas desde os primeiros anos de vida, residiu em Caju-Úna, aprazível comunidade litorânea do Município de Soure. É filha de Rosa Maria Sobrinho e Lourival Nascimento. Sócia efetiva do CPOEMA e leitora de Pedro Bandeira e Fernando Pessoa, não tardou para se apaixonar pela literatura, por isso, dedica um tempo especial à poesia.

A Deus, que está me dando força para continuar a expressar os meus sentimentos.Aos meus pais Rosa Maria Sobrinho (em memória) e Lourival Nascimento.Em especial ao professor Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho, que me descobriu poeta.

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A NATUREZA E UM SOfREDOR

Um amor que é relembradoao olhar para o mar.Um coração machucadode momentos tão apagadosinsistindo em lembrar.A brisa da auroratoca minha tristonha face.O chiado do mar... sãoos seus afagos na última hora.E só se encontrando assim...com um sofrimento que não tem fim...apenas contigo em meus pensamentos...E vejo o sol descerpara amanhã retornar...mas agora é noite eeu à beira-marpensando em teu amar.Amargamente choro,e apenas estão para testemunharo mar, as estrelas e a luz do luar.

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CRISTÃO

Me vejo dianteda luzque me conduzao pé da cruz.Agora, entre ferase trevas,meu Cristo, meu rei:orgulhoso comigo.Ó Deus!por ti morrerei.

DÁDIVAS

O amor é uma dádivaTodo sentimentoTodo sentimento é uma dádivaA paixãoA paixão é uma dádivaCom sua esperança e sua alegriaA paixão é uma dádivaO amor é infinitoTambém é finito...O tempo é infinitoO tempo é uma dádivaAs memórias são uma dádivaTudo é dádiva de Deus...Tudo, menos a morteMaldita é a morteQue define o fim de todas as dádivas

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EGOÍSTAS

Todo dia eu encontropessoas de pouca sorte,que não ligam para as doenças,não mais sentem muito receio,receio de Deus, receio do inferno,receio da mortee do fogo eterno.Têm eles consigo Deus.Mas eu sou mal.São estrelas no princípiodo espaço.Mas, eu sei o que eu quero,e sei o que eu faço.Onde estamos?Não nos interessa,vamos sempre avante.Nesse mundo temos pressaE andamos sempre errantes.Mas eu espalho meu grito,pois eu escolho a pazestampada nas ruas,com foto em cartaz.Porém, vocês ficam bravosse o bem um tanto demora,e rezam e choram e imploramuma nova brisa da aurora.Quanto a mimtrago sempre o pão e o vinho.Mas vivo num inferno sem fim.Um mero egoísta sozinho.Não ter tentação.Pois “o maior erro do ser humanoé tentar tirar da cabeçao que não sai do coração”.

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EU SEI...

Sei que o melhor sabor do melé um minuto no céu.e que o defeito do felé o melhor gosto do mel.Vocês comem em “prato pleno”,o que podem ser seus venenos(mas como acreditar sem tentar?)Eu saberei se provar...Então nomeio-te fascista“mista, simplicistae anti-socialista.”Admita:Nós estamos na pista.Somos ego.Eles são “istas”.Todos egoístas.Por que não?Se nesse mundoTodos estão?

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úLTIMAS PALAVRAS

E você?O que me diriam se eu me fosse?Se eu jogasse fora o amor que tu me trouxeste?O que haveria em seu coraçãoSe não, um músculo espedaçadoCheio de ódio e rancorDe uma paixão que foi ilusão?Faltaria, porém, o delírio de uma idéiaA loucura de uma razãoQue transformou nosso namoro sem graçaPra você uma louca e irreversível paixãoSei que tu temes, ó, meu queridoQue eu de você facilmente esqueçaPois sabes que estás no meu peitoE não em minha cabeçaHaja o que houver de mimPra você sei que fui a rainhaQue há algum tempo atrásVocê jurou que nunca amariaAssino com minhas lágrimasEsse poema que te dareiComo se fosse algo importante Que nunca mais escreverei Não deixe delirar sua cabeça apaixonadaPois sou farsante e mascaradaSou farsante que se passou por amadaSou covarde, pois por vocêNunca estive apaixonada

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SINAIS DE REALIDADE

Sinais?Eu já estou cheia de sinais.Que a guerra seja um sinal, está bem.Que a morte seja um sinal, está bem.Que a pobreza seja um sinal, está bem.Mas não permito que finja que nada acontece àquela criança que anda silenciosa nas esquinas, com o semblante cheio de dor e de saudade de seus genitores que a deixaram e partiram para o além, por motivos banais.Sinais?Eu já vi, vejo e verei muitos sinais...Porém, queria ver apenas o sorriso e a alegria desta criança

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

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fERNANDA

Sonhadora e determinada Meu nome rola em desejos vãosGarota linda e agitadaQue facilmente conquista corações

Uma canção de Ana CarolinaLhe faz crer Que confusa coagitaConsigo mesmo em ser

Fernanda,Luz do caminho de não sei quemTenta não sofrer, mas amaAlguém que não sei também

De braços abertosEspera a felicidadeSeus olhos despertosNão conquistam apenas amizade

“Nanda”, Fernanda...Luta, sofre e ama...E tão confusa e insanaNão sabe por onde anda

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O POETA APAIXONADO

O poeta apaixonou-seE suas obras mais vida ganharam O poeta magoou-se E suas idéias se despedaçaramAndava sozinhoSem esperanças de um dia encontrarUm caminhoEm que mais não poderia chorarAndou longe... muito longe....Com o parecer de solitárioMas não se lembra ondeDo amor tornou-se empresário De repente Ao ver o olhar de uma linda musaFicou consciente De que ainda no seu peito o amor atuava

Levou-se pelo embalo do tempoE sentiu a força de uma paixãoAmou a cada momentoCom toda força de seu coração...

... O poeta apaixonou-see suas obras mais vida ganharam o poeta magoou-se e suas idéias se despedaçaram

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

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SABEDORIA

Não é bastante abrir os olhosPara ver as árvores e o marNão é bastante ter visão clara Para contemplar o luarPara ver o amor e as floresNão é preciso ter sabedoria Junto à sabedoria não há naturezaHá apenas ideais de uma natureza melhor Junto à sabedoria há uma porta abertaE todo mundo fora delaEm um vazio que os consomeE que nunca vêem quando ele se fecha

ROSA

Minha querida rosa morenaque tão rápido o tempo levou, teu perfume no vento está,que penetra no meu coraçãoe de você me faz lembrar.

Aí no meio das outras rosas,no mais lindo dos jardins,para mim, tu és a mais formosadas margaridas tulipas e jasmins.

Que saudades dos afagose aconchegos em teus braços.Mas agora como estou sozinha,choro de saudade e remorso,de para ti não ter sido uma boa menina.

Dr. Sinval Lyra

Médico clínico e cirurgião geral, formado em 08 de dezembro de 1975 pela Faculdade de Medicina Federal do Pará, exerce a sua atividade há 31 anos no Marajó. Foi médico-diretor do Hospital Menino Deus, em Soure, foi médico-chefe do Centro de Saúde de Salvaterra e, atualmente, trabalha em sua Clínica e presta assistência médica em Salvaterra e Cachoeira do Arari.

Agradeço o despertar para a poesia aos meus professores de Língua Portuguesa, dos antigos: ginásio e científico – hoje, primeiro e segundo graus (ensino fundamental e médio)À minha esposa e filhas que sempre elogiaram estes humildes rabiscos apelidados de poesias.

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Dr. Sinval Lyra

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ACRÓSTICO

Situada, majestosa,Onde o sol é mais brilhanteUma dádiva de Deus, maravilhosa,Reluzes, qual um lindo diamanteE és nossa querida terra fértil e pressurosa,

A encantar o mais cético viajante.

Possuidora de beleza plenaÉ banhada pelo Rio ParacauaryReina tua gente, serenaO vigor da tua raça, aquiLânguida, a tua brisa amenaA soprar cá e ali.

De manhã, um mágico alvorecerE no crepúsculo, um calmo anoitecer.

Meandros de lagos e igarapésAs praias de doce fascinaçãoRios ricos em piabas e tucunarésAs fazendas que completam a emoção;Jovem ainda ésÓ obra magnífica da Divina criação.

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DEVANEIO

Na madrugada calma, inebriantes,Lustrosas falenas,Serenas,Dançam leves e esvoaçantes.

Cai, suave, uma bruma fria,Onde as aves noturnas, fagueiras,Faceiras,Rodopiam em ruidosa alegria.

Sinto, na magia desta noite,Que a ilusão,Coisa do coração,Feriu que nem açoite,

Embalando minh’alma sofridaDoce melodia,Pura magia,Abrindo profunda ferida.

Mas, as irrequietas falenas,Mimosas,Pressurosas,Com carícias plenas,

Enchem-me de esperança,De desejo,De teu beijo,De tua eterna lembrança.

Oxalá esta noite não findasseE o prazer subalterno,Eterno,Deste sonho não acabasse;

Ainda o orvalho sentir,No meu devaneio,Doce enleio,Nas pétalas das flores cair.

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Dr. Sinval Lyra

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A CHUVA

Menção Honrosa no V Concurso de Poesia do CPOEMA. Edição “Maria de Nazaré Mirian Barbosa”

Leve, intermitente,Cai a chuva, impertinente,

Molhando todo o chão.

Sopra o vento, gelado,Sussurrando belo fado,

Entoando linda canção.

Enlevada pela brisa friaMinh’alma exulta de alegria

Transparecendo felicidade.

E a chuva que cai agoraMinha felicidade ignora

Logo cessará, deixando saudade.

E quando a chuva cessarDeste êxtase irei despertar

Cessará toda a emoção.

E este poema que é feitoDirá você, com efeito,

Que foi a chuva a inspiração.

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EXPERIÊNCIA DE AMAR

Quando o amor, traiçoeiramente,Qual serpente,Enfeitiçou-me a mente,Envenenou-me o coração,

Senti, naquele momento,No meu pensamento,Que atrevimento,Uma arrebatadora paixão.

E agora, pranteando minh’alma,Faltando-me a calma,A serenidade da palma,Já não me iludo mais;

É só tristeza e desgostoQue no meu rosto,Qualquer prazer deposto,Sinais de alegria jamais.

Quem se compraz com o sofrimentoQue pense agora, neste momento,Que qualquer sentimentoDe piedade não convém;

Já que é difícil a vidaPara uns, guarida,Para outros, ferida,Produzida por outro alguém.

É por isto que a tristeza,De qualquer natureza,Com plena certeza,Aquebranta todo e qualquer ser;

Seja rico ou pobre,Plebeu ou nobre,Da têmpera do aço ou do cobre,De amor, algum dia, irá sofrer.

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Dr. Sinval Lyra

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NOVA AURORA

Tristonho, sozinho,Sinto falta de carinho,

Sinto falta de amor.

E colho, entre prantos,Os frutos dos desencantos

Da semente semeada com dor.

Na estrada, a princípio florida,Surgiu espinho, me abriu ferida,

Fazendo-me retroceder.

Mas nesta estrada árida e friaEntre cantos de alegria

Outras flores haverão de nascer.

E o coração, que vaga tristonho,Despertará, construirá novo sonho,

Outro amor irá encontrar.

Então, surgirá nova aurora,Nascerão as alegrias de outrora

No seu novo despertar.

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DOCE ILUSÃO

Como a fogueira crepitanteMorre meu sonho delirante

Enquanto o tempo se esgarça.

E a última esperançaDe um amor pleno de confiança

Esvai-se como a fumaça.

Na brisa que sopra friaJá percebo a nostalgia

De uma triste separação.

E pensar que a felicidadeQue planejei dar-lhe sem igualdade

Não passa de uma mera ilusão.

Como a fogueira que ainda ardeSinto o desejo que me invade

De este lindo amor salvar.

Mas, desta que queima faceira,Igual a toda fogueira

Cinzas, apenas, irão restar.

E do nosso amor tristonhoQue não passa de um belo sonho

Lembranças, simplesmente, haverão de ficar.

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Dr. Sinval Lyra

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CAMINHANDO

Vejo um caminho,Sozinho,Neste caminho,Sigo meditando.

Vou sentindo,No caminho,Meigo carinhoDa brisa passando.

Neste caminho,Cheirosa,Flor mimosaVejo desabrochar.

Se no caminho,Espinho,Ao invés de carinho,Irei retornar.

O LUAR

Tantas vezes, solitário,Passo noites a olharEste céu tão azulado,De estrelas, marejado,Pelo luar, iluminado,Como é belo contemplar.

Não há beleza que possaA esta se compararPois um’alma padecida,

Que vagueia entristecida,Como a lua parecida,Conforta-se no luar.

E assim, noites seguidas,Vou ficando a esperarQue, por trás da verde mata,Surja a lua cor de prata,E, ao luar, uma serenataQual seresteiro entoar.

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214 Biblioteca Virtual do CPOEMA

ENGANOS

Disseram-me que são bonitos os teus olhos;Belo engano, pois são lindos,Mais lindos que o mais claro azul do céu.

Disseram-me que é gostoso o teu beijo;Doce engano, pois é delicioso,Mais delicioso que o mais puro mel.

Disseram-me que é cativante o teu sorriso;Divertido engano, pois é encantador,Mais encantador que o mais inebriante luar.

Disseram-me que é delicada a tua voz;Suave engano, pois é terna,Mais terna que a mais leve brisa do mar.

Só não me disseram, triste certeza,Que era impossível poder te amar.

CONSUMATUM EST

Quando um dia, sem aurora,For chegada a minha hora,

Tranqüilo partirei.

Deste mundo de maldadesLevarei somente saudades

De alguém que muito amei.

Por batalhar em agoniaJá me assoma a nostalgia

Já não quero mais lutar.

É o repouso do guerreiroDas batalhas o altaneiro

Vê o braço fraquejar.

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Dr. Sinval Lyra

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Mas não partirei tristonhoRealizarei todo e qualquer sonho

Antes irei vencer.

Ainda que o corpo fraquejeQue só ao descanso almeje

Continuarei a viver.

Sentindo a vida que findaNão querendo ir, ainda,

Um pouco mais merecer;

Contemplar o céu azuladoOuvir, dos pássaros, o trinado,

Ver um novo amanhecer;

O perfume das flores, que delírio,Do majestoso sol, o ofuscante brilho,

O esplendor do luar;

Ainda sentir a brisa friaDo vento suave, a doce melodia,

E das estrelas o tênue cintilar.

Então, dos meus olhos reluzentes,Brotarão lágrimas ardentes

No meu derradeiro pranto.

E, ao rolarem na minha lívida face,No prenúncio do desenlace,

Já terei entoado o meu canto.

No limiar deste meu penoso viverSentindo o último suspiro anteceder

Aí sim, estarei realizado.

E tal como o Cristo na cruzDirei sob um raio de luz:

“Tudo está consumado!”

TÍTULOI ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ

FORMATO:14,8 x 21cm

EDIÇÃO1

FORMATOE-BOOK

NÚMERO DE PÁGINAS216

DISPONÍVEL EMwww.cpoema.org

fonteVITELLI, Dilomeno Márcio Maués; LOPES, Jorge Domingues (org.). I Antologia Literária do Marajó. 2.ed. Soure: CPOEMA, 2009.

Texto proveniente daBiblioteca Virtual do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara <http://www.cpoema.org>

AtençãoPermite-se a redistribuição livre deste material, desde que ele não seja alterado e as informações acima sejam mantidas.Recomenda-se o uso deste livro e de seu conteúdo apenas para fins educacionais e culturais.

ColaborePara colaborar conosco neste projeto de publicação, envie uma mensagem para <[email protected]>

I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓColetânea textual em prosa e verso,

escrita por vinte destemidos marajoaras de coração e de berço,dos muitos que temos neste torrão.Hábeis autores que confiaram ao

Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA)a árdua, mas gratificante, incumbência de organizar, editar e

conduzir à luz da publicação esta pioneira obra.

Rio P racauari a

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SALVATERRA

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Ilha Camaleão

Retiro Grande

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Rio Camará

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9 7 8 8 5 2 4 7 0 3 8 6 7

I S B N 8 5 2 4 7 0 3 8 6 - 5