História do Brasil- A CARTA de Caminha

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    A CARTA DE PERO VAZ DE CAMINHA (01 DE MAIO DE 1500)

    Senhor,

    p os to q ue o C ap it o -m or d es ta Vo ss a f ro ta , e a ss im o s o ut ro scapi tes escre vam a Vossa Al teza a not cia do achamento d es ta Vossat e r r a n o v a , q u e s e a g o r a n e s t a n a v e g a o a c h o u , n o d e i x a r e i d etambm dar d i s so minha conta a Vossa Alteza , as s im como eu melhor

    puder, a i nda que para o bem con ta r e fa l a r o s a iba p io r quetodos fazer!Todavia tome Vossa Al teza minha ignorncia por boa vonta de, a qua l

    bem cer to creia q ue, para aformosentar nem afear , aqui no h de pr m ai s d o q u e a q ui lo q u e v i e m e p ar ec eu . D a m ar in ha ge m e d ass in gr ad ur as d o c am in ho n o d ar ei a qu i c on ta a Vo ss a A lt ez a

    porque o no sabere i f azer e os p i lo tos devem ter es te cu idado. Epor tanto, Senhor , do que hei d e falar comeo: E digo qu:

    A part ida de Belm fo i como Vossa Al teza sabe , segunda- fe ira 9d e m a r o . E s b a d o , 1 4 d o d i t o m s , e n t r e a s 8 e 9 h o r a s , n o sa c h a m o s e n t r e a s C a n r i a s , m a i s p e r t o d a G r a n d e C a n r i a . E a l ia n d a m o s t o d o a q u e l e d i a e m c a l m a , v i s t a d e l a s , o b r a d e t r s aq u a t r o l g u a s . E d o m i n g o , 2 2 d o d i t o m s , s d e z h o r a s m a i s o umenos , houvemos v i s t a das i l has de Cabo Ver de , a s abe r da i l ha deSo Nicolau, segundo o di to de Pero E scolar , pi loto.

    Na no i t e s egu in t e s egunda- f e i r a amanheceu , s e pe r deu da f r o t aVasco de Ata de com a sua nau , sem haver t empo for te ou cont rr io

    para poder ser ! Fez o capi to sua s di l igncias para o achar , em umase outras par tes . Mas . . . no apareceu mais !

    E a s s i m s e g u i m o s n o s s o c a m i n h o , p o r e s t e m a r d e l o n g o , a t q u et er a -fe ir a d as O it av as d e P sc oa , q ue f or am 2 1 d ia s d e a br il ,t opamos a lguns s ina i s de t e rr a , e s tando da d i ta I l ha s egundo os

    p i lo tos d iz i am, obr a de 660 ou 670 l guas os qua is e r am muit aquant idade de ervas compr idas , a que os mareantes chamam bote lho ,

    e a s sim mes mo ou t r as a que do o nome de r abo- de - asno . E quart a -fei ra seguinte , pela manh, topamos aves a que chamam furabuchos . Nes t e mes mo d i a , a ho r as de vs pe r a , houvemos v i s t a de t e r r a ! A

    saber , pr imeiramente de um grande monte, mui to al to e redondo; e deou t r as s e r r as ma i s ba ixas ao s u l de l e ; e de t e r r a ch , com gr andesa r v o r e d o s ; a o q u a l m o n t e a l t o o c a p i t o p s o n o m e d e O M o n t ePascoa l e terra A Terra de Vera Cr uz!

    M an do u l a n a r o p ru mo . A c ha ra m v in te e c in c o b ra as . E a o s ol - p o st o u ma s s ei s l gu a s d a t er ra , l a n a mo s n co r as , e m d e ze n ov e

    b ra as a n co r ag e m l i mp a . A li f ic a mo - no s t o d a a q ue la n oi te . Eq u i n t a - f e i r a , p e l a m a n h , f i z e m o s v e l a e s e g u i m o s e m d i r e i t u r a t e rr a , i ndo os nav ios pequenos d i an t e por dezes s et e , dezess e is ,quinze , ca torze , doze , nove braas at meia l gua da t e r ra , onde

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    todos lanamos ancoras , em f rente da boc a de um r io . E chegar amosa es ta ancoragem s dez hora s , pouco mais ou menos .E da l i av i s tamos homens que andavam pela pra ia , uns se te ou o i to ,

    segundo d i s seram os navios pequenos que chegaram pr imei ro . Entolanamos fora os ba t i s e esqui fes . E logo v ieram todos os capi tesd a s n a u s a e s t a n a u d o C a p i t o - m o r . E a l i f a l a r a m . E o C a p i t omandou em t e rr a a N ico l au Coe lho pa r a ve r aque l e r i o . E t anto quee l e comeou a i r - s e pa r a l , acud i r am pe l a p r a i a homens aos do i s eaos t r s , de manei ra que , quando o ba te l chegou boca do r io , j l es tavam dezoi to ou vinte .

    P a r dos , nus , s em co i s a a lguma que l hes cobr i s s e s uas ve r gonhas .Tr az i am a r cos nas mos , e s uas s e t a s . V inham todos r i j amen te emdi reo ao ba te l . E Nicol au Coe lho l hes f ez s i nal que pous ass em osa r c o s . E e l e s o s d e p u s e r a m . M a s n o p d e d e l e s h a v e r f a l a n e mentendimento que aproveitasse , por o mar quebrar na cos ta . Somente

    a r r e m e s s o u - l h e u m b a r r e t e v e r m e l h o e u m a c a r a p u a d e l i n h o q u elevava na cabea , e um sombre i ro pre to . E um deles lhe a r remessouu m s o m b r e i r o d e p e n a s d e a v e , c o m p r i d a s , c o m u m a c o p a z i n h a d e

    p e n a s v e r m e l h a s e p a r d a s , c o m o d e p a p a g a i o . E o u t r o l h e d e u u mr amal g r ande de con t i nhas b r ancas , midas que quer em par ece r dea l jfar , as quai s peas c re io que o Capi to manda a Vossa Al teza . Ecom is to se volveu s naus por ser tarde e no poder haver deles maisfala , por causa d o mar . noi te seguin te ventou t an to sues te com chuvacei ros que fez caar

    a s naus . E es pec i a lmen te a Cap i t n i a . E s ex t a pe l a manh , s o i t oh o r a s , p o u c o m a i s o u m e n o s , p o r c o n s e l h o d o s p i l o t o s , m a n d o u oC a p i t o l e v a n t a r a n c o r a s e f a z e r v e l a . E f o m o s d e l o n g o d a c o s t a ,com os ba t i s e esqui fes amar rados na popa , em di reo nor te , paraver se achvamos a lguma abr igada e bom pouso, onde nsf icssemos, para tomar gua e lenha. No por nos j minguar , mas por nos p r even i r mos aqu i . E quando f i zemos ve l a e s t a r i am j na p r a i aas s en t ados pe r to do r i o ob r a de s es s en t a ou s e t en t a homens que s ehaviam juntado a l i aos poucos . Fomos ao longo, e mandou o Capi to

    aos navios pequenos que fossem mais chegados ter ra e , se achassempouso seguro para as naus , que a mainassem.E ve le jando ns pe la cos ta , na d i s tnc ia de dez l guas do s t io onde

    t n ha m os l ev a nt a do f er ro , a ch a ra m o s d it o s n a vi os p e qu e no s u mreci fe com um por to dent ro , mui to bom e mui to seguro , com uma muilarga en t rada . E meteram-se dent ro e amainaram. E as naus foram-sec h e g a n d o , a t r s d e l e s . E u m p o u c o a n t e s d e s o l - p s t o a m a i n a r a mtambm, ta lvez a uma lgua do reci fe , e ancoraram a onze braas .

    E e st an do A fo ns o L op ez , n os so p il ot o, e m u m d aq ue le s n av io s

    pequenos , fo i , por mandado do Capi to , por ser homem vivo e des t ropara i s so , meter -se logo no esqui fe a sondar o por to dent ro . E tomoudois daqueles homens da t e r ra que es tavam numa a lmadia : mancebose de bons corpos . Um deles t r az ia um arco , e se i s ou se te se tas . E na

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    cada um o seu bochecho, mas no beberam; apenas l avaram as bocase lanaram-na fora .

    Viu um de l es umas con t as de r os r io , b r ancas ; f ez s i na l que l hasdes s em, e f o lgou mui to com e l as , e l anou- as ao pes coo ; e depo i st i r o u - a s e m e t e u - a s e m v o l t a d o b r a o , e a c e n a v a p a r a a t e r r a enovamente para as contas e para o co lar do Capi to , como se dar iamouro por aqui lo .I s to tomvamos ns nesse sent ido , por ass im o dese jarmos! Mas se

    e le q ue ri a d iz er q ue l ev ar ia a s c on ta s e m ai s o c ol ar, i st o n oquer amos ns en tender , por que lho no havamos de dar ! E depoistornou as contas a quem lhas dera . E en to es t i r a ram-se de cos tas naa lc at if a, a d or mi r s em p ro cur ar em m an ei ra s d e e nc ob ri r s ua svergonhas , as quai s no eram fanadas ; e as cabele i ras de las es tavam

    bem rapadas e fei tas .O Capi to mandou pr por ba ixo da cabea de cada um seu coxim; e

    o da cabele i ra es forava-se por no a es t ragar. E de i t a ram um mantopor cima deles ; e consent indo, a conchegaram-se e adormecera m.

    Sbado pe la manh mandou o Capi to fazer ve la , fomos demandar aen t r ada , a qua l e r a mui l a r ga e t i nha s e i s a s e t e b r aas de f undo . Eent raram todas as naus dent ro , e ancoraram em c inco ou se i s braas

    a n co ra d ou r o q u e t o g r a nd e e t o f or mo so d e d e nt ro , e t oseguro que podem f icar ne le mais de duzentos navios e naus . E t an toque as naus foram di s t r ibudas e ancoradas, v ieram os capi tes todosa e s t a nau do Cap i t o - mor . E daqu i mandou o Cap i t o que Nico l au

    Coelho e Barto lomeu Dias f oss em em t e rr a e l evas s em aquel es do i shomens , e os de ixas s em i r com s eu a r co e s e t a s , aos qua i s mandoud a r a c a d a u m u m a c a m i s a n o v a e u m a c a r a p u a v e r m e l h a e u mr os r io de con tas b r ancas de os so , que f o r am l evando nos b r aos, eum cascavel e uma campainha . E mandou com e les , para l f i car , umm an ce bo d eg re da do , c ri ad o d e d om J o o Te lo , d e n ome A fo ns oRibei ro , para l andar com e les e saber de seu v iver e manei ras . E amim mandou que fosse com Nicolau Coelho . Fomos ass im de f rechadi re i tos pra ia . Al i acudi ram logo per to de duzentos homens , todos

    nus , com arcos e se tas nas mos . Aqueles que ns l evamos acenaram-lhes que se afas tassem e depusessem os arcos . E eles o s depuseram.M a s n o s e a f a s t a r a m m u i t o . E m a l t i n h a m p o u s a d o s e u s a r c o s

    quando s a r am os que ns l evvamos , e o mancebo degr edado comeles . E sa dos no pararam mais ; nem esperavam um pelo out ro , masantes cor r i am a quem mais cor rer ia . E passaram um r io que a cor re ,d e g u a d o c e , d e m u i t a g u a q u e l h e s d a v a p e l a b r a g a . E m u i t o soutros com eles . E foram ass im correndo para alm do r io ent re umasmoi t as de pa lme i r as onde es t avam ou t r os . E a l i pa r a r am. E naqu i lo

    t i nha i do o degr edado com um homem que , l ogo ao s a i r do ba t e l , oa g a s a l h o u e l e v o u a t l . M a s l o g o o t o r n a r a m a n s . E c o m e l ev i e r am os ou t r os que ns l ev r amos , os qua i s v inham j nus e s emcarapuas .

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    E en t o s e comearam de chegar mui tos; e en tr avam pe la be ir a domar pa r a os ba t i s , a t que ma i s no pod i am. E t r az i am cabaas d 'gua , e tomavam a lguns bar r i s que ns l evvamos e enchiam-nos de g u a e t r a z i a m - n o s a o s b a t i s . N o q u e e l e s d e t o d o c h e g a s s e m a

    b or do d o b ate l. M as j un to a e le , l an a va m- no s d a m o . E n stomvamo-los . E pediam que lhes dessem alguma coisa .

    L e v a v a N i c o l a u C o e l h o c a s c a v i s e m a n i l h a s . E a u n s d a v a u mcascavel , e a out ros uma mani lha, de maneira que com aquela encarnaquase que nos quer iam dar a mo. Davam-nos daqueles a rcos e se tasem t roca de sombre iros e carapuas de l inho , e de qualquer co i sa quea gen t e l hes que r i a da r . Da l i s e pa r t i r am os ou t r os , do i s mancebos ,que no os vimos mais .

    D os q u e a l i a n da v am , m ui to s q u as e a m ai or p a r te t ra z ia maqueles b icos de osso nos be ios . E a lguns, que andavam sem e les ,t r az iam os be ios furados e nos buracos t r az iam uns espe lhos de pau ,

    q ue p ar ec ia m e sp el ho s d e b or ra ch a. E a lg un s d el es t ra zi am t r sdaqueles bicos , a saber um no meio, e o s dois nos cabos .E andavam l out ros , quar te jados de cores , a saber metade de les da

    sua prpr ia cor, e metade de t in tura pre ta , um tan to azulada; e out rosquar tejados d ' escaques . Al i andavam entre eles t rs ou quat ro moas ,

    bem novinhas e gent i s , com cabelos mui to pre tos e compr idos pe lascos tas; e suas vergonhas , t o a l t as e t o cer radinhas e t o l impas dascabelei ra s que, de as ns mui to bem olharmos, no seenvergonhavam.

    Al i por en to no houve mais fa la ou en tendimento com e les , por a barbana de les ser t amanha que se no entendia nem ouvia n ingum.Acenamos- lhes que se fossem. E ass im o f i zeram e passaram-se paraa l m d o r i o . E s a r a m t r s o u q u a t r o h o m e n s n o s s o s d o s b a t i s , ee nc he ra m n o s ei q ua nt os b ar ris d ' gu a q ue n s l ev v amo s. Eto r namo- nos s naus . E quando as s im v nhamos , acenar am- nos quevol tssemos. Vol tamos, e e les mandaram o degredado e no quiseramque f i cass e l com e l es, o qua l l evava uma bac ia pequena e duas out rs carapuas vermelhas para l as dar ao senhor , se o l houvesse .

    No t rataram de lhe t i rar coisa algu ma, antes mandaram-no co m tudo.M a s e n t o B a r t o l o m e u D i a s o f e z o u t r a v e z t o r n a r , q u e l h e d e s s eaqui lo . E e le tornou e deu aqui lo , em vi s ta de ns , a aquele que o da

    pr imeira agasalhara. E ento veio-se, e ns levamo-lo.Esse que o agasa lhou era j de idade , e andava por ga lan ter ia , che io

    de pe na s, p ega da s p elo co rpo , q ue p arec ia setea do co mo S oSebas t i o . Out ros t r az iam carapuas de penas amare las ; e out ros , devermelhas ; e out ros de verdes . E uma daquelas moas era toda t ingidad e b a i x o a c i m a , d a q u e l a t i n t u r a e c e r t o e r a t o b e m f e i t a e t o

    redonda , e sua vergonha t o grac iosa que a mui tas mulheres de nossat e r r a , v e n d o - l h e t a i s f e i e s e n v e r g o n h a r a , p o r n o t e r e m a s s u a scomo e l a . Nenhum de l es e r a f anado , mas t odos a s s im como ns . Ecom is to nos tornamos, e e les foram-se.

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    t a r d e s a i u o C a p i t o - m o r e m s e u b a t e l c o m t o d o s n s o u t r o scap i t es das naus em s eus ba t i s a f o lga r pe l a ba a , pe r t o da p r a i a .Mas n ingum s a iu em t e r r a , po r o Cap i t o o no quer e r , apes a r den in g u m e st ar n e la . A pe n as s ai u e le c o m t o do s n s e m u mi lhu g r ande que es t na ba a , o qua l , aquando ba ixamar , f i ca muivazio. Com tudo es t de todas as par tes cercado de gua, de sor te quen ingum l pode i r , a no s e r de ba r co ou a nado . A l i f o lgou e l e , et o d o s n s , b e m u m a h o r a e m e i a . E p e s c a r a m l , a n d a n d o a l g u n smar inhei ros com um chinchor ro ; e mataram peixe mido, no mui to .E depois volvemo-nos s naus , j be m noi te .Ao domingo de Pascoela pe la manh , de terminou o Capi to i r ouvi r

    mi ss a e s e r mo naque l e i l hu. E mandou a t odos os cap it es que s ear ranjassem nos ba t i s e fossem com e le . E ass im fo i f e i to . Mandouarmar um pavi lho naquele i lhu , e dent ro l evantar um a l t a r mui bemar ranjado . E a l i com todos ns out ros fez d izer missa , a qual d i s se o

    padre f r ei Henr ique , em voz en toada , e o f ic i ada com aquel a mesmav o z p e l o s o u t r o s p a d r e s e s a c e r d o t e s q u e t o d o s a s s i s t i r a m , a q u a lmissa, segundo meu parecer , foi ouvida por todos com mui to prazer edevoo . A l i e st ava com o Capi t o a bande i r a de Cri s to , com quesa ra de Belm, a qual es teve sempre bem a l ta , da par te doEvangelho.Acabada a missa , desves t iu- se o padre e subiu a uma cadei ra a l t a ; e

    ns todos l anados por essa a re ia . E pregou uma so lene e provei tosapregao, da h i s tria evangl ica ; e no f im t ra tou da nossa v ida , e do

    a ch a me n to d e st a t er ra , r e fe ri n do - se C ru z, s ob c u ja o be d i n ci aviemos, que veio mui to a propsi to , e fez mui ta devoo.Enquanto ass is t imos missa e ao sermo, es tar ia na praia out ra tanta

    g e n t e , p o u c o m a i s o u m e n o s , c o m o a d e o n t e m , c o m s e u s a r c o s es et as , e a nd av a f ol ga nd o. E o lh an do -n os , s en ta ra m. E d ep oi s d ea ca ba da a mi ss a, q ua nd o n s se nt ad os a te nd a mo s a p re ga o,l evantaram-se mui tos de les e t angeram corno ou buzina e comearama s a lt a r e dana r um pedao . E a lguns de l es s e me ti am em a lmad ias

    duas ou t rs que l t inham as quais no so fei tas como as que

    eu vi ; apenas so t rs t raves , a tadas juntas . E al i se met iam quatro oucinco, ou esses que quer iam, no se afas tando quase nada da ter ra , sat onde podiam tomar p.Acabada a pregao encaminhou-se o Capi to , com todos ns , para

    os ba t i s , com nossa bandei ra a l t a . Embarcamos e fomos indo todosem d i r eo t e r r a pa r a pas s a r mos ao l ongo por onde e l e s e s t avam,indo na d i an t e i r a , po r o r dem do Cap i t o , Bar to lomeu Dias em s eues qu i f e , com um pau de uma a lmad ia que l hes o mar l eva r a , pa r a oentregar a e les . E ns todos t rs dele , a dis tncia de um t i ro de pedra.

    Como vi ram o esqui fe de Bar to lomeu Dias , chegaram-se logo todos gu a , m et en d o- se n el a a t o n de m ai s p o di a m. A c en a ra m- lh e s q u e pousassem os arcos e mui tos deles os iam logo pr em ter ra; e out rosno os punham.

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    Andava l um que fa lava mui to aos out ros , que se a fas tassem. Masno j que a mim me parece sse que lhe t inham respei to ou medo . Es teque os ass im andava afas tando t razia seu arco e setas . Es tava t into det intura vermelha pelos pei tos e cos tas e pelos quadr is , coxas e pernasa t b a i x o , m a s o s v a z i o s c o m a b a r r i g a e e s t m a g o e r a m d e s u a

    p r pr i a co r . E a t i n tu r a e r a t o ve r melha que a gua l ha no comianem des f az i a . An tes , quando s a a da gua , e r a ma i s ve r melho . S a iuum homem do es qu i f e de Bar to lomeu Dias e andava no me io de l es ,s e m i m p l i c a r e m n a d a c o m e l e , e m u i t o m e n o s a i n d a p e n s a v a m e mfazer- lhe mal .Apenas l he davam cabaas d ' gua; e acenavam aos do es qu i f e que

    sa s sem em ter ra . Com i s to se volveu Bar to lomeu Dias ao Capi to . Ev i e m o - n o s s n a u s , a c o m e r , t a n g e n d o t r o m b e t a s e g a i t a s , s e m o smais const r anger. E e l e s t o r nar am- s e a s ent a r na p r ai a , e a s sim por ento f icaram.

    Nes te i lhu , onde fomos ouvi r missa e sermo, espra ia mui to a guae d e sc o br e m ui ta a re ia e m ui to c a sc a lh o . E nq u an to l e st v a mo sforam a lguns buscar mar i sco e no no acharam. Mas acharam a lgunscamar es g r os s os e cu r tos , en t r e os qua i s v inha um mui to g r ande emui to grosso; que em nenhum tempo o v i t amanho. Tambm acharamcas cas de be r b iges e de ami joas , mas no t opa r am com nenhuma

    p e a i nt ei ra . E d ep oi s d e t er mo s c omi do v ie ra m l og o t od os o scap it es a e s t a nau , po r o r dem do Cap it o- mor, com os qua is e l e s eapor tou; e eu na companhia . E perguntou a todos se nos parec ia bem

    mandar a nova do achamento des t a t e r r a a Vos s a Al t eza pe lo nav iodos mant imentos , para a melhor mandar descobr i r e saber de la maisdo que ns podamos saber , por i rmos na nossa viagem.E ent re mui tas fa las que sobre o caso se f i zeram fo i d i to , por todos

    ou a maior par te , que ser ia mui to bem. E n i s to concordaram. E logoque a r eso luo fo i tomada, perguntou mais , se ser ia bem tomar aqui

    p o r f o r a u m p a r d e s t e s h o m e n s p a r a o s m a n d a r a V o s s a A l t e z a ,deixando aqui em lugar deles out ros dois des tes degredados .E concordaram em que no era necessr io tomar por fora homens ,

    porque cos tume era dos que ass im fora levavam para alguma par ted izerem que h de tudo quanto lhes perguntam; e que melhor e mui tomelhor i n f o r mao da t e r r a da r i am do i s homens des s es degr edadosq u e a q u i d e i x s s e m o s d o q u e e l e s d a r i a m s e o s l e v a s s e m p o r s e r gente que ningum entende. Ne m eles cedo aprender iam a falar para os ab er em t o b em d iz er q ue m ui to m el ho r e st ou tr os o n o d ig amquando c Vossa Al teza mandar . E que por tan to no cuidssemos deaqui por fora tomar n ingum, nem fazer escndalo ; mas s im, para osd e t o d o a m a n s a r e a p a z i g u a r , u n i c a m e n t e d e d e i x a r a q u i o s d o i s

    degredados quando daqui par t ssemos. E ass im f icou determinado por parecer melho r a todos .Acabado i s t o , d i s se o Cap it o que f ss emos nos ba t is em t e r r a . E

    v er- se -i a b em, q ue ja nd o e ra o r io . M as t am b m p ar a f ol ga rmo s.

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    F omos t odos nos ba t i s em t e r r a , a r mados ; e a bande i r a conos co .E l e s a n d a v a m a l i n a p r a i a , b o c a d o r i o , p a r a o n d e n s a m o s ; e ,antes que chegssemos, pelo ens ino que dantes t inham, puseram todosos arcos , e acenaram que sassemos. Mas , tanto que os batis puseramas proas em ter ra , passaram-se logo todos a lm do r io , o qual no m a i s a n c h o q u e u m j o g o d e m a n c a l . E t a n t o q u e d e s e m b a r c a m o s ,a lguns dos nos s os pas s a r am logo o r i o , e me te r am- s e en t r e e l e s . Ealguns aguardavam; e out ros se a fas tavam. Com tudo, a co i sa e ra demaneira que todos andavam mis turados . Eles davam desses arcos comsuas se tas por sombre i ros e carapuas de l inho , e por qualquer co i saque l hes davam. P as s a r am a l m t an tos dos nos s os e andar am as s immis turados com e les , que e les se esquivavam, e a fas tavam-se ; e i amalguns para c ima, onde out ros es tavam. E ento o Capi to fez que otomassem ao colo doi s homens e passou o r io , e f ez tornar a todos . Agente que a l i es tava no ser ia mais que aquela do cos tume. Mas logo

    que o Capi to chamou todos para t r s, a lguns se chegaram a e le , no p or o r ec on he ce re m p or S en ho r, m as p or qu e a g en te , n os sa , j p a s s a v a p a r a a q u m d o r i o . A l i f a l a v a m e t r a z i a m m u i t o s a r c o s econt inhas , daquelas j d i t as , e r esga tavam-nas por qualquer co i sa , deta l manei ra que os nossos l evavam dal i para as naus mui tos a rcos , es e ta s e con tas . E en t o t or nou- s e o Capi t o pa r a aqum do r i o. Elogo acudiram mui tos bei ra dele .

    Al i ve r e i s ga l an t es , p in t ados de p r e to e ve r melho , e qua r t e j ados ,a s s im pe los co r pos como pe l as pe r nas , que , ce r t o , a s s im pa r ec i am

    bem. Tambm andavam ent re e les quat ro ou c inco mulheres , novas ,que ass im nuas , no parec iam mal . Ent re e las andava uma, com umacoxa , do joe lho a t o quadr i l e a ndega , toda t ing ida daquela t in tura

    preta; e todo o res to da su a cor natural . Outra t razia a mbos os joelhosc o m a s c u r v a s a s s i m t i n t a s , e t a m b m o s c o l o s d o s p s ; e s u a svergonhas to nuas , e com tanta inocncia ass im descober tas , que nohavia nisso desvergonha nenhuma.Tambm andava l out ra mulher , nova , com um menino ou menina ,

    a tado com um pano aos pe i tos , de modo que no se lhe v iam seno as

    perninhas . Mas nas pernas da me, e no re s to, no havia pano algu m.Em seguida o Capi to fo i subindo ao longo do r io , que cor re r en te p r a i a . E a l i e s p e r o u p o r u m v e l h o q u e t r a z i a n a m o u m a p d ea lmad ia . F a lou , enquan to o Cap i t o e s t ava com e l e , na p r es ena detodos ns ; mas n ingum o en t end i a , nem e l e a ns , po r ma i s co i s asque a gente lhe perguntava com respei to a ouro , porque dese jvamossaber se o havia na ter ra .Tr az i a e s t e ve lho o be i o t o f u r ado que l he cab i a pe lo bur aco um

    grosso dedo polegar . E t r az ia met ido no buraco uma pedra verde , de

    nenhum va lo r , que f echava por f o r a aque l e bu r aco . E o Cap i t o l hafez t i r a r . E e le no se i que d iabo fa lava e i a com e la para a boca doCapi to para lha meter . Es t ivemos r indo um pouco e dizendo c halaass o b r e i s s o . E e n t o e n f a d o u - s e o C a p i t o , e d e i x o u - o . E u m d o s

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    n o s s o s d e u - l h e p e l a p e d r a u m s o m b r e i r o v e l h o ; n o p o r e l a v a l e r a lguma coi sa , mas para amos t ra . E depois houve-a o Capi to , c re io ,

    para man dar co m as out ras coisa s a Vossa Al teza.Andamos por a vendo o r ibe i ro , o qual de mui ta gua e mui to boa .

    Ao longo de l e h mui t a s pa lme i r as , no mui to a l t a s ; e mui to bonsp al mi to s. C o lh e mo s e c o me mo s m u it os d e le s. D ep o is t or n ou -s e oCapi to para ba ixo para a boca do r io , onde t nhamos desembarcado.E a lm do r io andavam mui tos de les danando e fo lgando, uns d ian teos out ros , sem se tomarem pelas mos . E faz iam-no bem. Passou-seen to pa ra a ou tr a banda do r i o Diogo Dias , que f o ra a lmoxar if e deSacavm, o qual homem grac ioso e de prazer . E l evou cons igo umgai tei ro nosso com sua gai ta . E meteu-se a d anar com eles , tomando-os pe las mos ; e e les fo lgavam e r i am e andavam com e le mui to bemao s om da ga it a . Depo i s de dana r em f ez a l i mui t as vo lt a s l i ge ir a s,a nd a nd o n o c h o , e s al to r ea l, d e q u e s e e le s e s p a nt av a m e r ia m e

    fo lgavam mui to. E conquanto com aqui lo os segurou e a fagou mui to ,tomavam logo uma esquiveza como de an imais montezes , e foram-se

    para cima.E ento passou o r io o Capi to com todos n s , e fomos pela praia , de

    longo , ao pas so que os ba t i s i am r en t es t e rr a . E chegamos a umag r a n d e l a g o a d e g u a d o c e q u e e s t p e r t o d a p r a i a , p o r q u e t o d aaque l a r i be i r a do mar apau l ada por c ima e s a i a gua por mui tosluga r es . E depo i s de pas s a r mos o r i o , f o r am uns s e t e ou o i t o de l esmeter- se en t re os mar inhei ros que se r ecolh iam aos ba t i s. E l evaram

    d al i u m t ub ar o q ue B ar to lo me u D ia s m at ou . E l ev av am -l ho ; elanou-o na praia .

    B a s t a r q u e a t a q u i , c o m o q u e r q u e s e l h e s e m a l g u m a p a r t ea ma ns as se m, l og o d e u ma m o p ar a o ut ra s e e sq ui va va m, c om o

    parda i s do cevadouro . Ningum no lhes ousa fa la r de r i jo para nos e e s qu ivar em mais . E t udo s e pass a como e l es quer em para os

    bem amansarmos !Ao ve lho com quem o Cap i t o hav i a f a l ado , deu- lhe uma ca r apua

    ver me lha . E co m tod a a co nv ersa que c om e le h ou ve, e c om a

    carapua que lhe deu t an to que se despediu e comeou a passar o r io ,fo i - se logo reca tando. E no qui s mais tornar do r io para aqum. Oso u t r o s d o i s o C a p i t o t e v e n a s n a u s , a o s q u a i s d e u o q u e j f i c o udi to , nunca mais aqui apareceram fatos de que deduzo que gente

    bes t i a l e de pouco saber , e por i s so t o esquiva . Mas apesar de tudoi s s o andam bem cur ados , e mui to l impos . E naqu i lo a inda ma i s meconveno que so como aves , ou a l imr ias montezinhas , as quai s o a r f az me lhor es penas e me lhor cabe lo que s mans as , po r que os s euscorpos so t o l impos e t o gordos e t o formosos que no pode ser

    mais! E is to me faz presumir que no tem casas nem moradias em quese recolham; e o a r em que se c r i am os faz t a i s . Ns pe lo menos novimos at agora nenhumas casas , nem coisa que se parea com elas .

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    Mandou o Capi to aquele degredado, Afonso Ribei ro , que se fosseo u tr a v e z c o m e l e s. E f oi ; e a n do u l u m b o m p e d a o , m a s a t ar der eg r es s ou , que o f i ze r am e l es v i r : e no o qu i s e r am l cons en t i r . Ederam- lhe arcos e se tas ; e no lhe tomaram nada do seu . Antes, d i s see l e, que l he t omar a um de l es umas con t inhas amare l as que l evava ef ug i a com e l as , e e l e s e que ixou e os ou t r os f o r am logo aps e l e , elhas tomaram e tornaram- lhas a dar ; e en to mandaram-no v i r . Disseque no v i ra l en t re e les seno umas choupaninhas de rama verde ede fe te i ras mui to grandes , como as de Ent re Douro e Minho. E ass imnos tornamos s nau s , j quase noi te , a dormir .Segunda-fei ra , depois de co mer , samos todos em ter ra a tomar gua.

    A l i v i e r a m e n t o m u i t o s ; m a s n o t a n t o s c o m o a s o u t r a s v e z e s . Et r az i am j mui to poucos a r cos . E es t i ve r am um pouco a f as t ados dens ; mas depois pouco a pouco mis turaram-se conosco; e abraavam-n o s e f o l g a v a m ; m a s a l g u n s d e l e s s e e s q u i v a v a m l o g o . A l i d a v a m

    alguns a r cos por f o lhas de pape l e po r a lguma ca r apuc inha ve lha epor qualquer co i sa . E de t a l manei ra se passou a co i sa que bem vin teo u t r i n t a p e s s o a s d a s n o s s a s s e f o r a m c o m e l e s p a r a o n d e o u t r o sm u i t o s d e l e s e s t a v a m c o m m o a s e m u l h e r e s . E t r o u x e r a m d e l mu itos arco s e b arre te s de pen as d e av es, un s verde s, out ro samare los , dos quai s c re io que o Capi to h de mandar uma amos t ra aVossa Alteza .

    E s e g u n d o d i z i a m e s s e s q u e l t i n h a m i d o , b r i n c a r a m c o m e l e s . N e s t e d i a o s v i m o s m a i s d e p e r t o e m a i s n o s s a v o n t a d e , p o r

    andarmos quase todos mis turados : uns andavam quar te jados daquelast in turas , ou t ros de metades , ou t ros de t an ta fe io como em pano der a s , e t o d o s c o m o s b e i o s f u r a d o s , m u i t o s c o m o s o s s o s n e l e s , e

    bas tan tes sem ossos . Alguns t r az iam uns our ios verdes , de rvores,que na co r que r i am pa r ece r de cas t anhe i r as , embor a f os s em mui tomais pequenos . E es tavam cheios de uns gros vermelhos , pequeninosq ue , e sm ag an do -s e e nt re o s d ed os , s e d es fa zi am n a t in ta mu it overmelha de que andavam t ingidos . E quanto mais se molhava m, tantom ai s v e rm el h os f ic a va m. To d os a n da m r a pa d os a t p or c i ma d a s

    o r e lhas ; a s s im mes mo de s obr ance lhas e pes t anas . T r azem todos a st e st a s , de f ont e a f ont e , t i n t a s de t i ntu r a p r e t a, que pa r ece uma f i tapreta da la rgura de dois dedos .

    E o C a p i t o m a n d o u a q u e l e d e g r e d a d o A f o n s o R i b e i r o e a o u t r o sdo i s degr edados que f os s em mete r - s e en t r e e l e s ; e a s s im mes mo aD i o g o D i a s , p o r s e r h o m e m a l e g r e , c o m q u e e l e s f o l g a v a m . E a o sdegredados ordenou que f i cassem l es ta noi te . Foram-se l todos ; eandaram entre eles . E segundo depois diziam, foram bem uma lgua em ei a a u ma p o vo a o , e m q u e h a v er ia n o ve o u d e z c a s as , a s q u ai s

    diziam que eram to compridas , cada u ma, como es ta nau capi tnia . Ee r am de made i r a , e das i l ha r gas de t buas , e cober t a s de pa lha , der a z o v e l a l t u r a ; e t o d a s d e u m s e s p a o , s e m r e p a r t i o a l g u m a ,t inham de dent ro mui tos es te ios ; e de es te io a es te io uma rede a tada

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    com cabos em cada es te io , a l t as , em que dormiam. E de ba ixo , paras e a q u e n t a r e m , f a z i a m s e u s f o g o s . E t i n h a c a d a c a s a d u a s p o r t a s

    pequenas , uma nu ma ext remidade, e out ra na oposta .E diziam que em cada casa se recolhiam t r inta ou quarenta pessoas , e

    que ass im os encont raram; e que lhes deram de comer dos a l imentosque t inham, a saber mui to inhame, e out ras sementes que na t e r ra d ,que eles comem. E como se fazia tarde f izeram-nos logo tod os tornar ;e n o q u i s e r a m q u e l f i c a s s e n e n h u m . E a i n d a , s e g u n d o d i z i a m ,quer iam vi r com eles .Resgataram l por cascavi s e out ras co i s inhas de pouco va lor , que

    l ev a va m , p a pa g ai o s v er me l ho s, m u it o g ra n de s e f or mo so s, e d o isverdes pequeninos , e carapuas de penas verdes , e um pano de penasde mui tas cores , espc ie de t ec ido assaz be lo , segundo Vossa Al tezat od as e st as c oi sa s v er , p or qu e o C ap it o v o- la s h d e m an da r,segundo ele disse . E com is to vieram; e ns torna mo-nos s naus .

    Ter a - f e i r a , depo i s de comer , f omos em t e r r a , f aze r l enha , e pa r al ava r r oupa . Es t avam na p r a i a , quando chegamos , uns s es s en t a ousetenta , sem arcos e sem nada. Tanto que chegamos, vieram logo parans , sem se esquivarem. E depois acudi ram mui tos , que ser iam bemduzentos, todos sem arcos . E mis turaram-se todos t an to conosco queuns nos a judavam a acar re tar l enha e met- las nos ba t i s . E lu tavamcom os nossos, e tomavam com prazer. E enquanto faz amos a l enha ,c o n s t r u a m d o i s c a r p i n t e i r o s u m a g r a n d e c r u z d e u m p a u q u e s eo nt em p ar a i ss o c or ta ra . M ui to s d el es v in ha m a li e st ar c om o s

    ca rp in te i ros . E c r eio que o f azi am mai s pa r a ve r em a f e rr amen ta def e r r o com que a f az i am do que pa r a ve r em a c r uz , po r que e l e s notem coi sa que de fer ro se ja , e cor tam sua madei ra e paus com pedrasf e i t a s como cunhas , me t idas em um pau en t r e duas t a l a s , mui bematadas e por t a l manei ra que andam for tes , porque lhas v i ram l . Era

    j a conver s ao de l es conos co t an t a que quas e nos e s to r vavam noque havamos de fazer .E o Capi to mandou a doi s degredados e a Diogo Dias que fossem l

    a lde ia e que de modo a lgum viessem a dormir s naus , a inda que os

    mandas sem embor a . E as s im s e f o r am. Enquan to andvamos nes samata a co r t a r l enha , a t r aves s avam a lguns papaga ios e s s as r vor es ;ve r des uns , e pa r dos , ou t r os , g r andes e pequenos , de s o r t e que me

    parece que haver mui tos nes ta t e r ra . Todavia os que v i no ser iammais que nove ou dez , quando mui to . Out ras aves no v imos ento , ano ser a lgumas pombas-se ixe i ras , e pareceram-me maiores bas tan tedo que as de Por tugal . Vr ios d iz iam que v i ram ro las , mas eu no asv i . T o d a v i a s e g u n d o o s a r v o r e d o s s o m u i m u i t o s e g r a n d e s , e d einf ini tas espcies , no duvido que por esse ser to haja mui tas aves!

    E cerca da noi te ns volve mos para as naus com nossa lenha.Eu c r e io , S enhor , que no de i a i nda con t a aqu i a Vos s a Al t eza dof e i t i o de s eus a r cos e s e t a s . Os a r cos s o p r e tos e compr idos , e a s

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    s e t a s compr idas ; e os f e r r os de l as s o canas apa r adas , conf o r meVossa Al teza ver alguns que creio que o Capi to a Ela h de enviar .Quar ta-fe i ra no fomos em ter ra , porque o Capi to andou todo o d ia

    no navio dos mant imentos a despej- lo e fazer l evar s naus i s so quecada um podia levar . Eles acudiram praia , mui tos , segundo das nausvimos . Ser iam per to de t r ezentos , segundo Sancho de Tovar que paral f oi . D io go D ia s e A fo nso R ib ei ro , o d eg re da do , a os q ua is oCap i t o on t em or denar a que de t oda mane i r a l do r mi s s em, t i nhamvol tado j de noi te , por e les no quererem que l f i cassem. E t r az iam

    p a p a g a i o s v e r d e s ; e o u t r a s a v e s p r e t a s , q u a s e c o m o p e g a s , c o m adi ferena de t e rem o b ico branco e r abos cur tos . E quando Sancho deT o v a r r e c o l h e u n a u , q u e r i a m v i r c o m e l e , a l g u n s ; m a s e l e n oa dm it iu s en o d oi s m an ce bo s, b em d is po st os e h ome ns d e p ro l.M a n d o u p e n s a r e c u r - l o s m u i b e m e s s a n o i t e . E c o m e r a m t o d a ar ao que l hes de r am, e mandou da r - l hes cama de l en i s , s egundo

    ele disse . E dormiram e folgaram aquela noi te . E no houve mais es tedia que para escrever seja .Quinta- fei ra , der radei ro de abr i l , comemos logo, quase pela manh, e

    fomos em ter ra por mais l enha e gua . E em querendoo Capi to sa i r des ta nau, chegou Sancho de Tovar com seus dois h spedes . E por elea i n d a n o t e r c o m i d o , p u s e r a m - l h e t o a l h a s , e v e i o - l h e c o m i d a . Ecomeu. Os hspedes , sen taram-no cada um em sua cadei ra . E de tudoquan to l hes de r am, comer am mui bem, e s pec i a lmen te l aco coz idof r io , e a r roz . No lhes deram vinho por Sancho de Tovar d izer que o

    no bebiam bem.Acabado o comer, me temo-nos t odos no ba t el , e e l e s conosco . Deu

    um gr umete a um de l es uma a r madura g r ande de por co monts , bemr evo l t a . E l ogo que a t omou meteu- a no be i o ; e po r que s e l he noquer ia segurar , deram-lhe uma pouca de cera vermelha. E ele a jei tou-lhe seu adereo da par te de t r s de sor te que segurasse , e meteu-a no

    be i o , a s s im r evo l t a pa r a c ima ; e i a t o con t en t e com e l a , como s et ivesse uma grande jia . E tanto que samos em ter ra , foi -se logo comela. E no tornou a aparecer l .

    Andar iam na praia , quando samos , oi to ou dez deles ; e de a a poucocomearam a v ir. E parece-me que v i r iam es te dia a praiaquat rocentos ou quat rocentos e c inqenta. Alguns deles t raziam arcose se tas ; e deram tudo em t roca de carapuas e por qualquer co i sa quelhes davam. Comiam conos co do que l hes dvamos , e a lguns de l es

    bebiam vinho, ao passo que outros o no podiam beber . Mas quer-me p a r e c e r q u e , s e o s a c o s t u m a r e m , o h o d e b e b e r d e b o a v o n t a d e !Andavam todos t o bem d i s pos tos e t o bem f e i t os e ga l an t es coms ua s p in tu ra s q ue a gr ad av am. A ca rr et av am d es sa l en ha q ua nt a

    podiam, com mi l boas vontades , e l evavam-na aos ba t i s . E es tavamj mais mansos e seguro s ent re ns do que ns es tvamos ent re eles .Foi o Capi to com alguns de ns um pedao por es te arvoredo at um

    r ibe i ro grande , e de mui ta gua , que ao nosso parecer o mesmo que

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    v e m t e r p r ai a, e m q u e n s t o m am os g ua . A l i d es ca n sa mo s u m pedao, bebendo e folgando, ao longo dele , ent re esse arvoredo que tan to e t amanho e t o bas to e de t an ta qual idade de fo lhagem que nose pode ca lcu lar . H l mui tas pa lmei ras , de que co lhemos mui tos e

    bons palmitos.A o sa ir mo s d o b at el , d is se o C ap it o q ue se ri a b om i rmo s e m

    di r e i t u r a c r uz que es t ava encos t ada a uma r vor e , j un to ao r i o , af im de ser co locada amanh , sex ta- fe i ra , e que nos pusssemos todosd e j o e l h o s e a b e i j s s e m o s p a r a e l e s v e r e m o a c a t a m e n t o q u e l h et nhamos . E as s im f i zemos . E a e s s es dez ou doze que l e s t avam,acenaram-lhes que f izessem o mesmo; e logo foram todos bei j- la .

    P a r ece - me gen t e de t a l i nocnc i a que , s e ns en t ends s emos a s uaf a l a e e l e s a n o s s a , s e r i a m l o g o c r i s t o s , v i s t o q u e n o t m n e me n t e n d e m c r e n a a l g u m a , s e g u n d o a s a p a r n c i a s . E p o r t a n t o s e o sd e g r e d a d o s q u e a q u i h o d e f i c a r a p r e n d e r e m b e m a s u a f a l a e o s

    en t ender em, no duv ido que e l e s , s egundo a s an t a t eno de Vos s aAl teza , se fa ro cr i st os e ho de crer na nossa santa f , qual prazaa Nosso Senhor que os t r aga , porque cer tamente es ta gente boa e de

    be la s impl ic idade . E impr imi r - se- fac i lmente ne les qualquer cunhoq u e l h e q u i s e r e m d a r , u m a v e z q u e N o s s o S e n h o r l h e s d e u b o n sc o r p o s e b o n s r o s t o s , c o m o a h o m e n s b o n s . E o E l e n o s p a r a a q u it r aze r c r e io que no f o i s em caus a . E por t an to Vos s a Al t eza , po i stan to dese ja acrescentar a san ta f ca t l i ca , deve cu idar da sa lvaodeles . E prazer a Deus que co m pouco t rabalho seja ass im!

    Eles no l avram nem cr iam. Nem h aqui boi ou vaca , cabra , ovelhaou ga l inha , ou qualquer out ro an imal que es te ja acos tumado ao v iver do homem. E no comem seno de s te inhame, de que aqui h mui to, edessas sementes e f ru tos que a t e r ra e as rvores de s i de i t am. E comis to andam t a i s e t o r i j o s e t o nd ios que o no s omos ns t an to ,com quanto t r igo e legumes comemos. Nesse d ia , enquanto a l i andavam, danaram e ba i l a ram sempre comos nossos , ao som de um tambor i l nosso, como se fossem mais amigosnos s os do que ns s eus . S e l hes a gen t e acenava , s e que r i am v i r s

    naus, aprontavam-se logo para i sso, de modo tal , que se osconvidramos a todos , todos vieram. Porm no levamos es ta noi te snaus seno quat ro ou c inco; a saber, o Capi to-mor, do i s ; e S imo deMiranda , um que j t r az ia por pagem; e Ai res Gomes a out ro , pagemtambm. Os que o Capi to t r az ia , e ra um deles um dos seus hspedesque l he havi am t raz ido a p r ime ir a vez quando aqui chegamos oqual ve io hoje aqui ves t ido na sua camisa , e com e le um seu i rmo; eforam es ta noi te mui bem agasalhados tanto de comida como de cama,de colches e lenis , para o s mais amansar .

    E hoje que sexta- fe i ra , p r imei ro d ia de maio , pe la manh , sa mose m t e r r a c o m n o s s a b a n d e i r a ; e f o m o s d e s e m b a r c a r a c i m a d o r i o ,cont ra o su l onde nos pareceu que ser ia melhor a rvorar a c ruz , paramelhor ser vis ta . E al i marcou o Capi to o s t io onde haviam de fazer

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    a cova para a f incar . E enquanto a i am abr indo, e le com todos nso utr os fo mo s p el a c ru z, r i o a ba ix o o nd e e la e st av a. E c om o srel igiosos e sacerdotes que cantavam, f rente , fo mos t razendo-a dal i ,a m o d o d e p r o c i s s o . E r a m j a q u a n t i d a d e d e l e s , u n s s e t e n t a o uo i t e n t a ; e q u a n d o n o s a s s i m v i r a m c h e g a r , a l g u n s s e f o r a m m e t e r debaixo de la , a judar-nos . Passamos o r io , ao longo da pra ia ; e fomoscoloc- la onde havia de f i car, que ser obra de doi s t i ros de bes ta dor io . A nd a nd o -s e a l i n is to , v ir ia m b e m c e nt o c i nq en t a, o u m a is .Pl an ta da a c ru z, c om a s a rma s e a d iv isa d e Vo ssa A lt ez a, q ue

    p r ime i r o l he hav i am pr egado , a r mar am a l t a r ao p de l a . A l i d i s s emissa o padre f rei Henr ique, a qual foi cantad a e of iciada por esses jd i t os . A l i e s t i ve r am conos co , a e l a , pe r t o de c inqen t a ou s es s en t adeles , as sentados todos de joe lho ass im como ns . E quando se ve ioao Evangelho, que nos erguemo s todos em p, com as moslevantadas , e les se l evantaram conosco , e a laram as mos , es tando

    ass im at se chegar ao f im; e ent o tornaram-se a assentar , como ns .E q u a n d o l e v a n t a r a m a D e u s , q u e n o s p u s e m o s d e j o e l h o s , e l e s s e

    puseram ass im como n s es tvamos, com as mo s levantadas , e e m talmane i r a s oss egados que ce r ti f ico a Vos sa Al t eza que nos f ez mui tadevoo.

    E st iv er am a ss im c on os co a t a ca ba da a c om un h o; e d ep oi s d acomunho , comungar am es s es r e l i g ios os e s ace r do t es ; e o Cap i t oc o m a l g u n s d e n s o u t r o s . E a l g u n s d e l e s , p o r o S o l s e r g r a n d e ,l evantaram-se enquanto es tvamos comungando, e out ros es t iveram e

    f icaram. Um deles , homem de cinqenta ou cinqenta e c inco a nos , sec on se rv ou a li c om a qu el es q ue f i ca ra m. E ss e, e nq ua nt o a ss imes t vamos , j un t ava aque l es que a l i t i nham f i cado , e a inda chamavaout ros. E andando ass im ent re e les , f a lando- lhes, acenou com o dedo

    pa ra o a l ta r, e depoi s mos t rou com o dedo pa r a o cu , como s e l hesdissesse alguma coisa de bem; e ns ass im o toma mos!Acabada a missa, t i rou o padre a ve s t imenta de cima, e f icou na alva;

    e ass im se subiu , jun to ao a l t a r , em uma cadei ra ; e a l i nos pregou oEvangelho e dos Apsto los cu jo o d ia , t r a tando no f im da pregao

    d e s s e v o s s o p r o s s e g u i m e n t o t o s a n t o e v i r t u o s o , q u e n o s c a u s o umais devoo.E s s e s q u e e s t i v e r a m s e m p r e p r e g a o e s t a v a m a s s i m c o m o n s

    o lhando pa r a e l e . E aque l e que d igo , chamava a lguns , que v i es s ema l i . A l g u n s v i n h a m e o u t r o s i a m - s e ; e a c a b a d a a p r e g a o , t r a z i a

    N ico l au Coe lho mui t a s c r uzes de e s t anho com c r uc i f i xos , que l hef i ca r am a inda da ou tr a v inda . E houver am por bem que l anass em ac a d a u m s u a a o p e s c o o . P o r e s s a c a u s a s e a s s e n t o u o p a d r e f r e iHenr ique ao p da c r uz; e a l i l anava a s ua a t odos um a um

    ao pescoo , a tada em um f io , f azendo- lha pr imei ro be i j a r e l evantar a s mos . V inham a i s s o mui tos ; e l anavam- nas t odas , que s e r i amobr a de qua ren t a ou c inqen ta . E i s to acabado er a j bem umahora depois do meio d ia viemos s naus a comer, onde o Capi to

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    t rouxe cons igo aquele mesmo que fez aos out ros aquele ges to parao a l t a r e pa r a o cu , ( e um s eu i r mo com e l e ) . A aque l e f ez mui t ah on ra e d eu -l he u ma c am isa mo ur is ca ; e a o o ut ro u ma c ami sades toutras .E segundo o que a mim e a todos pareceu, es ta gente , no lhes falece

    outra coisa para ser toda cr is t , do que entenderem-nos , porque ass imt o m a v a m a q u i l o q u e n o s v i a m f a z e r c o m o n s m e s m o s ; p o r o n d e

    p a r e c e u a t o d o s q u e n e n h u m a i d o l a t r i a n e m a d o r a o t m . E b e mcreio que, se Vossa Al teza aqui mandar quem entre eles mais devagar a n d e , q u e t o d o s s e r o t o r n a d o s e c o n v e r t i d o s a o d e s e j o d e V o s s aAl teza . E por i s so , se a lgum vier, no de ixe logo de v i r c l r igo paraos ba t i za r ; po r que j en t o t e r o ma i s conhec imen tos de nos s a f ,

    p el os d oi s d eg re da do s q ue a qu i e nt re e le s f ic am , o s q ua is h oj etambm comungaram.

    En t r e t odos e s t e s que ho j e v i e r am no ve io ma i s que uma mulhe r ,

    moa , a qua l e s t eve s empr e mi ss a , qua l de r am um pano com quese cobr i s se ; e puseram- lho em vol ta de la . Todavia , ao sentar- se , nos e l e m b r a v a d e o e s t e n d e r m u i t o p a r a s e c o b r i r . A s s i m , S e n h o r , ai nocnci a dest a gen te t a l que a de Ado no se r ia ma ior comrespeito ao pudor. Ora ve ja Vossa Alteza quem em ta l inocncia v ives e s e c o n v e r t e r a , o u n o , s e l h e e n s i n a r e m o q u e p e r t e n c e s u asalv a o. Acab ad o is to , fo mos p era nte ele s be ijar a c ruz. Edespedimo-nos e fomos c omer .

    C re io , S en h or, q u e, c o m e st e s d o is d e gr e da d os q u e a q ui f ic a m,

    f icaro mais doi s grumetes , que es ta noi te se sa ram em ter ra , des tan a u , n o e s q u i f e , f u g i d o s , o s q u a i s n o v i e r a m m a i s . E c r e m o s q u ef icaro aqui porque de manh, prazendo a Deus fazemos nossa par t idadaqui .

    Es t a t e r r a , S enhor , pa r ece - me que , da pon t a que ma i s con t r a o s u lv i m o s , a t o u t r a p o n t a q u e c o n t r a o n o r t e v e m , d e q u e n s d e s t e

    po r to houvemos v i s t a , s e r t amanha que haver ne l a bem v in t e ouv i n t e e c i n c o l g u a s d e c o s t a . T r a z a o l o n g o d o m a r e m a l g u m a s

    par tes grandes bar re i ras , umas vermelhas , e out ras brancas ; e a t e r ra

    d e c i m a t o d a c h e m u i t o c h e i a d e g r a n d e s a r v o r e d o s . D e p o n t a a p o n t a t o d a p r a i a . . . m u i t o c h e m u i t o f o r m o s a . P e l o s e r t o n o s pa r eceu , v i s t a do mar , mui to g r ande ; po r que a e s t ender o lhos , nopodamos ver seno t e rra e a rvoredos ter ra que nos parec ia muitoextensa.At agora no pudemos saber se h ouro ou prata nela , ou outra c oisa

    de meta l , ou fer ro ; nem lha v imos . Contudo a t e r ra em s i de mui to bons a r es f r e s cos e t emper ados como os de En t r e - Dour o- e - Minho , p o r q u e n e s t e t e m p o d ' a g o r a a s s i m o s a c h v a m o s c o m o o s d e l .

    gua s so mui ta s; in fini tas . E m tal ma ne ira gra cio sa qu e,quer endo- a ap r ove i t a r , da r - s e - ne l a t udo ; po r caus a das guas quetem!

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    Contudo, o melhor f ru to que de la se pode t i r a r parece-me que sers a l v a r e s t a g e n t e . E e s t a d e v e s e r a p r i n c i p a l s e m e n t e q u e V o s s aAlteza em ela deve lanar . E que no houvesse mais do que ter VossaAl t eza aqu i e s t a pous ada pa r a e s s a navegao de Ca l i cu t e bas t ava .Quan to ma i s , d i s pos i o pa r a s e ne l a cumpr i r e f aze r o que Vos s aAlteza tanto deseja , a saber , acrescentamento da nossa f!E des ta manei ra dou aqui a Vossa Al teza conta do que nes ta Vossa

    t e rr a v i . E s e a um pouco a longue i , E l a me pe r doe . P or que o des ejoque t i nha de Vos t udo d i ze r , mo f ez pr a s s im pe lo mido . E po i sque , S enhor , ce r t o que t an to nes t e ca r go que l evo como em ou t r aqualquer co i sa que de Vosso serv io for , Vossa Al teza h de ser demim mui to bem servida, a Ela peo que, por me fazer s ingular merc,mande v i r da i l ha de S o Tom a J o rge de Os r io , meu genr o oque d ' Ela receberei em mui ta merc.Bei jo as mos de Vossa Al teza.

    Des te Por to Seguro , da Vossa I lha de Vera Cruz , hoje , sex ta- fe i ra ,pr imeiro dia de maio de 1 500.

    Pero Vaz de Caminha.

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