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Um novo modelo de gestor: o nosso HABILIDADES DIFERENCIADAS, COMO FLEXIBILIDADE, CRIATIVIDADE E TALENTO PARA EMPREENDER EM CENáRIOS DESFAVORáVEIS, SãO ALGUMAS DAS QUALIDADES DOS GESTORES BRASILEIROS QUE COMEçAM A SER VALORIZADAS NO MERCADO GLOBAL m um dos capítulos finais de As novas realidades, Peter Drucker resume em sete itens os princípios es- senciais da administração. Entre eles o autor desta- ca que a administração tem como meta a integração de pessoas num empreendimento comum e que, por isso, está “incrustada de cultura”. Assim, a forma com que cada povo gerencia suas empresas é algo que merece atenção. O livro, escrito há mais de 20 anos, continua relevante e diz muito sobre a realidade atual do Brasil. Diversos analistas e executivos com experiência internacional têm enxergado no mercado externo uma tendência em reconhe- cer e valorizar o modo brasileiro de gerir. E quais são as características dessa gestão ver- de-amarela? Sem ufanismo, o que há de dife- rente, e especial, no executivo brasileiro? Aparentemente o diferencial mais relevan- te é a própria realidade do Brasil. A história do País está marcada por inúmeros pacotes econômicos, inflação altíssima, trocas de moeda, escassez de re- cursos (capital, humano e tecnológico), grande carga tributária sobre a produção e a crônica falta de infraestrutura energética e de transportes. Ao vivenciar essa realidade adversa, ou conhecê-la por meio do relato de pais e professores, os executivos brasileiros desenvolve- ram habilidades específicas. Luiz Carlos de Queirós Cabrera, sócio- -fundador da Amrop Panelli Motta Cabrera e professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), destaca aquela que considera principal: gerir em condições não totalmente favoráveis. “O brasileiro não pensa apenas no projeto, mas também em como financiá-lo. Para ele é na- tural buscar alternativas para possíveis situações adversas, o que o torna um ótimo viabilizador de ações inovadoras”, avalia. O professor, no entanto, relativiza a ideia de que haja um úni- co estilo de gestão brasileiro. “Não há um perfil definido, não existe generalização. Mas con- cordo que estamos começando a desenhar um estilo de liderança brasileiro.” Segundo Cabrera, o estilo de liderar brasileiro está mais evidente dentro do País, pois a presença de nossos exe- cutivos no exterior ainda é tímida, e é justamen- te o que fazemos por aqui que acaba despertan- do o interesse pelas soluções brasileiras. “O que evidencia o talento do profissional é o resultado que sua empresa alcança. Como as empresas brasileiras estão conquistando bons resultados, eles estão se destacando”, diz. FLEXIBILIDADE NAS RELAÇÕES Um estilo verde-amarelo é reconhecido, especialmente, pela maior ênfase dada às relações do que às transações. “Primeiro pergunta- mos ao interlocutor como ele vai, comentamos alguma amenidade e só depois perguntamos se o relatório está pronto. Um norte-ameri- cano ou indiano formula a questão de primeira, desliga o telefone e pronto”, compara Cabrera. Além do autocontexto, o brasileiro tam- bém é reconhecido pela flexibilidade nas relações e pelo respeito às individualidades, fatores que o diferenciam dos gestores de outros E Treinados na adversidade, os executivos brasileiros aprenderam a inovar A reportagem é de Elizabeth Cardoso, colaboradora de HSM MANAGEMENT. PESSOAS 80 HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011

Gestor Brasileiro

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Um artigo interessante sobre gerenciamento de projetos considerando a visão do gestor brasileiro. Mostra as diferenças entre as visões dos gestores em âmbito global comparado com o gestor brasileiro.

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  • Um novo modelo de gestor:o nosso

    Habilidades diferenciadas, como flexibilidade, criatividade e talento para empreender em cenrios desfavorveis, so algumas das qualidades dos gestores brasileiros que comeam a ser valorizadas no mercado global

    m um dos captulos finais de as novas realidades, peter drucker resume em sete itens os princpios es-senciais da administrao. entre eles o autor desta-ca que a administrao tem como meta a integrao de pessoas num empreendimento comum e que, por isso, est incrustada de cultura. assim, a forma com

    que cada povo gerencia suas empresas algo que merece ateno. o livro, escrito h mais de 20 anos, continua relevante e diz muito sobre a realidade atual do brasil. diversos analistas e executivos com experincia internacional tm enxergado no mercado externo uma tendncia em reconhe-cer e valorizar o modo brasileiro de gerir. e quais so as caractersticas dessa gesto ver-de-amarela? sem ufanismo, o que h de dife-rente, e especial, no executivo brasileiro?

    aparentemente o diferencial mais relevan-te a prpria realidade do brasil. a histria do pas est marcada por inmeros pacotes econmicos, inflao altssima, trocas de moeda, escassez de re-cursos (capital, humano e tecnolgico), grande carga tributria sobre a produo e a crnica falta de infraestrutura energtica e de transportes.

    ao vivenciar essa realidade adversa, ou conhec-la por meio do relato de pais e professores, os executivos brasileiros desenvolve-ram habilidades especficas. luiz carlos de queirs cabrera, scio--fundador da amrop panelli motta cabrera e professor da escola

    de administrao de empresas de so paulo, da fundao getulio vargas (fgv-eaesp), destaca aquela que considera principal: gerir em condies no totalmente favorveis. o brasileiro no pensa apenas no projeto, mas tambm em como financi-lo. para ele na-tural buscar alternativas para possveis situaes adversas, o que o torna um timo viabilizador de aes inovadoras, avalia.

    o professor, no entanto, relativiza a ideia de que haja um ni-co estilo de gesto brasileiro. no h um perfil definido, no existe generalizao. mas con-cordo que estamos comeando a desenhar um estilo de liderana brasileiro. segundo cabrera, o estilo de liderar brasileiro est mais evidente dentro do pas, pois a presena de nossos exe-cutivos no exterior ainda tmida, e justamen-te o que fazemos por aqui que acaba despertan-do o interesse pelas solues brasileiras. o que evidencia o talento do profissional o resultado que sua empresa alcana. como as empresas brasileiras esto conquistando bons resultados,

    eles esto se destacando, diz.

    FLEXIBILIDADE NAS RELAESum estilo verde-amarelo reconhecido, especialmente, pela maior nfase dada s relaes do que s transaes. primeiro pergunta-mos ao interlocutor como ele vai, comentamos alguma amenidade e s depois perguntamos se o relatrio est pronto. um norte-ameri-cano ou indiano formula a questo de primeira, desliga o telefone e pronto, compara cabrera. alm do autocontexto, o brasileiro tam-bm reconhecido pela flexibilidade nas relaes e pelo respeito s individualidades, fatores que o diferenciam dos gestores de outros

    ETreinados na adversidade, os executivos

    brasileiros aprenderam a

    inovar

    a reportagem de Elizabeth Cardoso, colaboradora de Hsm management.

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    80 HSM Management Brasil: Presena na Gesto que D Certo Edio Especial Maro 2011

  • pases em fase de crescimento, como rssia, ndia e china.

    robert Wong, scio-presiden-te da robert Wong participa-es, tambm cuidadoso em afirmar que exista um perfil definido de executivo brasileiro. ele diz no detectar a existncia de algum tipo de preferncia por gestores do brasil no exterior e destaca pontos problemticos em nossos pro-fissionais, como a resistncia em sair do pas. executivo brasileiro trabalhando fora exceo, mas essa presena tende a aumentar. o executivo brasileiro ter de vencer sua resistncia em mudar de pas. se, de um lado, sua adaptao a uma nova cultura rpida, de outro, ele tem dificuldade para sair, avalia.

    apesar de preferir falar em individualidades e evitar as gene-ralizaes, Wong reconhece que h um modus operandi brasileiro. se pensarmos em caractersticas predominantes, podemos falar em coeficiente de inteligncia, coeficiente emocional e coeficiente operacional. nos povos latinos, incluindo a o brasileiro, a nfase no emocional, com muita fora na intuio e na criatividade. J os norte-americanos tendem racionalidade e os asiticos so focados em fazer as coisas acontecer, compara.

    outro diferencial brasileiro, inclusive em comparao com rs-sia, china e ndia, que somos mais preocupados com a coletivi-dade. o modo norte-americano de ver o mundo priorizando o eu (com e maisculo), adotado por vrios pases, no faz parte da maneira com a qual o brasileiro expressa sua competncia. a pala-

    vra competncia est ligada a competio, mas ns competimos pelo grupo, no pelo indivduo. isso natural no brasileiro e muito bem-vindo na cultura corporativa, explica.

    a capacidade de integrao remete a outros aspectos valorizados no estilo brasileiro de lide-rana: a relao de equidade com o diferente e a habilidade para trabalhar em ambientes com di-versidade tnica e religiosa. o brasileiro sempre v antes a pessoa. ele dificilmente parte da cor da pele, da roupa, da crena, ele v e se relaciona

    com o ser humano, acredita Wong.

    DESAFIOS PARA O SUCESSOporm nem tudo vantagem para os brasileiros no mercado globa-lizado, pois h lacunas em sua educao formal. Wong acredita que vrios fatores contribuam para os problemas de formao do profis-sional brasileiro, entre eles destacam-se a m orientao profissional (grande parte dos executivos no atua em sua rea de formao), a desvalorizao da educao formal e o baixo valor dado ao trabalho. o brasileiro, em geral, ainda associa trabalho a algo penoso, enquan-to para outros povos, como os asiticos, o trabalho honrado, nobre, sinal de sade e capacidade. esse trao atua no inconsciente e fica visvel na dificuldade do brasileiro para manter prazos ou chegar no horrio, por exemplo, diz.

    tanto cabrera como Wong afirmam que os lderes brasileiros tm se destacado nas reas de vendas, recursos humanos, mar-keting, gesto e, mais recentemente, finanas. para os interessa-dos em se lanar numa carreira internacional, os especialistas reservam alguns conselhos: investir em qualificao profissional de alto desempenho e em idiomas e ampliar as habilidades de integrao em outras comunidades.

    Para Wong,o executivo brasileiro

    se destaca nas relaes interpessoais

    Cabrera: O sucesso das empresas brasileiras um reflexo da boa atuao de

    seus gestores

    Talento tipo exportao

    Os pontos fortes dos executivos brasileiros:inovaocapacidade de atuar em condies adversasfacilidade nas relaes interpessoaisflexibilidaderespeito s individualidadesconvive bem com diferentes culturasfacilidade de integrao e aprendizado

    E os fracos:formao deficienteidiomasresistncia para sair do pasbaixa valorizao do trabalhoinformalidade excessiva

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    81HSM Management Brasil: Presena na Gesto que D Certo Edio Especial Maro 2011

  • se eu estiver falando rpido demais, voc me avisa, t? mrcio fres fala muito. e bem. a eloquncia a mesma do entusiasmado trainee que entrou na ambev h 19 anos, como engenheiro qumico recm-formado. saber o que ele j fez dentro da empresa consome tempo demais. mais fcil perguntar por quais reas ainda no pas-sou. tirando finanas e marketing, j estive em todos os lugares, conta. em 2010, assumiu a vice-presidncia de gente e gesto, cargo que j havia ocupado pela companhia no canad e que atualmente acumula com o comando do setor industrial para a amrica latina. em um conglomerado conhecido no mundo empresarial como uma fbrica de lderes, a vice-presidncia naturalmente estratgica.

    certa vez, atrado pelo fato de a ambev j ter formado 87 exe-cutivos que hoje atuam no exterior, fres decidiu investigar as cau-sas que levavam seus profissionais a serem to requisitados pelo mercado. toda vez que recebia telefonemas de headhunters dizia no estar interessado. um dia, porm, resolvi almoar com um deles. pedi desculpas por estar lhe tomando o tempo, mas disse que estava l porque queria saber o que a empresa precisava fazer para que nos-sos funcionrios nem quisessem ouvir as pro-postas de concorrentes, lembra, divertindo-se. a resposta foi sucinta: impedi-los de escutar ofertas era impossvel, mas o caminho era traba-lhar com os funcionrios a cultura da companhia, fazer com que eles se sentissem parte do que est acontecendo.

    no por acaso que ele usa a expresso nossa empresa. a histria de trat-la como sua. acreditar que quem trabalha mais e entrega resultados merece mais oportunidades. voc no pode ser promovido pelo simples tempo de casa, resume.

    at se tornar gestor de pessoas, esse engenheiro qumico pre-cisou passar no teste da versatilidade. a prova de fogo veio em 1994, quando ele foi encarregado de implantar um novo gerencia-mento de rotina na cervejaria, padronizando todas as reas. discu-tamos todo o fluxograma. aprendi demais sobre todos os setores, lembra. nove anos depois, foi transferido definitivamente para o

    que na ambev chamado de rea de gente. em outras palavras, administrao do pessoal. desde o incio de minha carreira, tive o pri-vilgio de perceber que precisava entender as pessoas. sempre fui um questionador nesse as-sunto. a chave de tudo tem de ser a capacidade de liderar os colegas, ensina.

    alm de valorizar os esforos coletivos, fres desenvolveu seu senso prtico ao longo de todos esses anos na companhia. ele jamais aceita observaes baseadas em intuio; va-

    lem apenas os fatos apoiados em nmeros. a gente no acre-dita em coisas fceis ou atalhos. o fundamental nessa cultura trabalhar com fatos e dados. o chamado feeling no funciona com qualquer gestor. a mensagem precisa vir acompanhada de dados, pondera. (Alex Sabino)

    vice-presidente de gente e gesto da ambev, mrcio fres representa o novo perfil estratgico do gestor de recursos Humanos

    Quem trabalha mais e entrega

    resultados merece mais

    oportunidades

    PERFILQuem : mrcio fresO que estudou: engenharia qumica O que faz: vice-presidente de gente e gesto da ambevTrajetria: h 19 anos na empresa, j passou por praticamente todas as reas, com exceo de finanas e marketingFrase: desde o incio de minha carreira, tive o privilgio de perceber que precisava entender as pessoas. a chave de tudo tem de ser a capacidade de liderar os colegas

    O lderlideranada escola de

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  • a maioria dos profissionais sabe que os primeiros passos para cons-truir uma carreira de sucesso so o autoconhecimento e o estabele-cimento de metas. superar essas etapas antes mesmo de sair da fa-culdade, porm, no para qualquer um. foi com essa considervel vantagem que marcelo doll martinelli, 46 anos, brasileiro, casado, pai de dois filhos, maratonista, engenheiro mecnico de formao e presidente da c&a modas no mxico, iniciou sua trajetria.

    enquanto cursava engenharia mecnica na faap, em so paulo, buscou um estgio e, aps dois anos na voith e a perspectiva de uma carreira promissora, decidiu que aquele no era seu caminho e resol-veu mudar. em 1987, quando terminava a faculdade de engenharia, iniciou o ento recm-criado programa de trainee da c&a modas. passou por todos os setores da empresa: operaes de loja, compras, marketing, gerncias, vice-presidncia do banco ibi, diretor de ope-raes na argentina e, agora, no mxico. logo aps a formatura, doll cursou ps-graduao em marketing na espm (sp) e focou seu trabalho na gesto de recursos humanos.

    para o executivo, morar em outros pases nunca foi um problema. eu gosto de intera-gir e de conhecer outras culturas, diz. sobre as vantagens de ser um executivo expatriado, apresenta muitos pontos positivos. a principal motivao a superao de desafios. nunca gostei de ficar fazendo a mesma coisa o tempo todo. gosto de mudar, de implementar coisas novas e de gerir em ambientes diferentes.

    marcelo doll concorda que h caractersticas inerentes aos execu-tivos brasileiros, para o bem e para o mal. de um lado, o brasileiro tem mais facilidade de adaptao, ele mais desprendido, ento

    no sente tanto as mudanas. em geral ele tambm mais tranquilo diante de crises ou situaes difceis e sempre acredita na soluo. no entanto, essas qualidades ainda precisam ser potencializadas. importante aprender outros idiomas e se integrar cada vez mais.

    para ele, outro trao tpico do brasileiro a preponderncia da vontade de fazer, em contraste com o mexicano, que d mais nfase ao planejamento. quando o brasileiro incorporar o planejamento de modo mais efetivo, dar um grande passo, diz.

    o estilo de liderana de doll? segundo ele, pragmatismo e constante motivao da equipe. gosto das coisas prontas sem muita prorroga-o, mas no abro mo de ser democrtico. es-tou mais interessado em transformar o outro em um executor do que em ficar impondo ou mos-trando meu trabalho, afirma. para ele, o lder

    deve ser um transformador de pessoas. seu resultado no depende apenas de seu trabalho, mas sim da ao conjunta de dezenas, cente-nas, milhares de pessoas. o lder tem de sair do espelho, quer dizer, deve deixar o ego de fora e trabalhar para que outros brilhem. a palavra de ordem desprendimento. (Elizabeth Cardoso)

    presidente da c&a no mxico, marcelo doll acredita que o caminHo do sucesso para as empresas integrar as pessoas

    O brasileiro se destaca pela

    vontade de fazer, afirma o

    executivo

    PERFILQuem : marcelo doll martinelliO que estudou: engenharia mecnica na faap e ps- -graduao em marketing na espmO que faz: presidente da c&a modas no mxicoTrajetria: depois de um estgio em engenharia, construiu uma carreira executiva na c&a, onde comeou como traineeFrase: o lder tem de sair do espelho, quer dizer, deve deixar o ego de fora e trabalhar para que outros brilhem. a palavra de ordem desprendimento

    Vocaotrabalhar

    com o outropara

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  • PERFILQuem : denise soares dos santosO que estudou: engenharia eltrica e mbaO que faz: presidente do Hospital e maternidade so luizTrajetria: trabalhou por 17 anos na siemens, onde comeou como trainee e chegou a ceo da diviso de celulares benq mobile no brasilFrase: Homens e mulheres, de modo geral, tm estilos complementares. uma empresa que consegue misturar esses estilos s tem razes para ganhar

    Substantivofemininos qualidades dos gestores brasileiros, as mulHeres acrescentam uma sensibilidade que gera resultados

    mulher, brasileira e gestora. se j existe um estilo de gesto nacional, marcado pela flexibilidade, criatividade, capacidade de ouvir o outro e trabalhar em equipe, o que dizer da executiva brasileira? segundo recente pesquisa desenvolvida pela caliper, firma de consultoria de gesto de pessoas presente em 39 pases, nossas profissionais do mais ateno aos comandados, ouvem mais os colegas e so mais afetuosas que norte-americanas e britnicas, atitudes que resultam em equipes mais motivadas. as concluses fazem parte do estudo que ouviu mulheres em cargos de presidncia, vice-presidncia e di-retoria em organizaes de diversos setores da economia no brasil, nos estados unidos e no reino unido. no meio dos achados positivos, porm, uma informao desanimadora: a presena feminina em car-gos de comando ainda modesta, com no mais de 12% das empre-sas tendo uma presidncia feminina.

    formalmente no h impedimento para que as mulheres dividam com os homens os cargos de chefia, mas barreiras invisveis, como a cultura, o machismo e o preconceito, ainda dificultam o acesso delas aos postos mais altos das empresas. com nadir moreno, presidente da ups do brasil, as presses vieram de todo o setor. foi um grande passo em minha carreira. quando assumi a presidncia da ups, meu maior desafio era estar frente de uma empresa que atua num mer-cado predominantemente masculino. mas a transio acabou sen-do tranquila, aconteceu de forma estruturada e contou com grande apoio da equipe, lembra.

    formada em letras e direito, ela j soma 18 anos na ups, onde ocupou cargos em diversos departamentos, como atendimento ao cliente, despacho aduaneiro (brokerage), contas a pagar, financeiro, recursos humanos e jurdico. para a executiva, o fato de ser mulher no represen-ta vantagens ou desvantagens. acredito que seja indiferente. todos tm de enfrentar desafios. o que faz a diferena como as pessoas os encaram, afirma. no entanto, a presidente da ups v diferenas entre as gestes masculina e fe-minina. acredito que existam diferenas, pois temos percepes distintas quanto a relacionamentos. as mulheres, mesmo em po-

    sies de liderana, costumam primar por relacionamentos, sendo mais flexveis, enquanto os homens visam mais resultados, so mais pragmticos, considera. alm de ser a primeira brasileira na presidncia da ups do brasil antes apenas estrangeiros ha-viam ocupado o cargo, ela vice-presidente do lidem (grupo de mulheres lderes empresariais), um brao do lide (lderes

    empresariais), e membro do conselho do Wtc, do comit da odgers berndtson e do comit do Jlide (grupo de Jovens lderes empresariais).

    depois de desenvolver um projeto especial em miami, sede da ups amricas, e atuar como gerente dos departamentos de recursos huma-nos e jurdico para o brasil e mercosul, nadir cr que exista, sim, um modo de gesto tipicamente

    brasileiro. com a grande diversidade cultural que temos, somos muito mais receptivos ao novo e temos muita facilidade de adap-tao. por isso, flexibilidade e trabalho em equipe fazem parte do currculo de muitos executivos brasileiros. e, pelas diversas trans-formaes econmicas e crises vividas por ns, acredito que nossa

    Mulheres na liderana: entre a oportunidade e o preconceito

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  • PERFILQuem : nadir morenoO que estudou: letras e direito O que faz: presidente da ups do brasilTrajetria: h 18 anos na empresa, passou por diversas reas, como atendimento ao cliente, despacho aduaneiro, contas a pagar, financeiro, recursos humanos e jurdicoFrase: acredito que seja indiferente [ser homem ou mulher]. todos tm de enfrentar desafios. o que faz a diferena como as pessoas os encaram

    capacidade de ter uma viso mais ampla de possibilidades futuras mais acentuada, define.

    PRECONCEITO CORPORATIvO denise soares dos santos, presidente do Hospital e maternidade so luiz desde 2009, lamenta a persistncia de preconceito no am-biente corporativo, mas pondera: no posso dizer que o fato de ser mulher limitou meu crescimento, tive oportunidades interes-santes e soube aproveit-las.

    assim como nadir, denise no v vantagens ou desvantagens no fato de ser mulher. acredito que a relevncia de escolha de um

    profissional deva estar nas competncias e no no sexo. no tenho dvida de que esse equilbrio ficar cada vez mais evidente nas or-ganizaes, declara. ela tambm concorda que os estilos so dife-rentes e aponta que a empresa que sabe trabalhar com a diversidade de gneros sai ganhando.

    Homens e mulheres, de modo geral, tm estilos complementa-res. uma empresa que consegue misturar esses estilos s tem razes para ganhar, porque a liderana pode ser aprimorada, com os esti-los sendo incorporados tanto pelos homens como pelas mulheres. de maneira geral, entendo que as habilidades femininas que mais encontramos so: gesto de parceria, sensibilidade, gesto compar-tilhada e capacidade de trabalhar com multitarefas, analisa deni-se, que professora da ps-graduao e do programa de mba na fundao getulio vargas, nas disciplinas de liderana, negociao e planejamento estratgico.

    se h um estilo de gesto com a cara do pas? denise cr que sim. percebo que o executivo brasileiro aprendeu, ao longo de d-cadas, a gerir negcios diante de crises, o que lhe deu no apenas flexibilidade, mas tambm criatividade na gesto. e, no menos im-portante, o brasileiro reconhecido por seu estilo alegre e amigo, que certamente contagia positivamente um ambiente de trabalho. trabalhar em equipe e desenvolver relaes duradouras caracte-rstica nossa, conclui. (Elizabeth Cardoso)

    Dados como os do Global Gender Gap (de 2009) apontam que parte do significativo crescimento e desenvolvimento econmico mundial deve-se ascenso e s habilidades das mulheres no mercado de trabalho e a suas vrias facetas como consumidoras, eleitoras, empregadoras e, principalmente, mo de obra.

    Pesquisa recente do Ministrio do Trabalho brasileiro aponta que atualmente h 16,2 milhes de mulheres inseridas no mer-cado formal, ante 11,4 milhes em 2002, o que representa um crescimento de 40,9%. Em que pese esse aumento incontestvel de sua participao na economia, no entanto, profissionais do sexo feminino continuam a enfrentar grande desigualdade: elas ganham cerca de 30% a menos do que eles e so relativamente poucas em cargos-chave. Em recente pesquisa sobre mulheres executivas, o Hay Group conseguiu determinar que, apesar do bom desempenho das lideranas femininas, 57% das empresas no contam com mulheres em cargos executivos. Nas companhias nacionais, a participao feminina nas posies de alta gerncia de 15%, enquanto nas multinacionais o percentual no passa de 6,7%. A maioria se concentra no terceiro escalo.

    Alm disso, um estudo de Betania Tanure, Antonio Carvalho Neto e Juliana Andrade, ligados PUC Minas, destacou o elevado nvel de sacrifcio pessoal das gestoras, comparando-as a Am-lias corporativas na cultura predominantemente masculina do Brasil. Apenas elas teriam trocado o objeto de seu sacrifcio: em vez do parceiro, a empresa.

    Elas esto chegando, mas ainda ganham menos

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