Genero utilitário

Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao XXXV Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao Fortaleza, CE 3 a 7/9/2012

1

Por uma outra comunicao pblica - O gnero utilitrio do Jornal

Nacional como gesto da informao para o cidado 1

Mayara Calcio de Sousa COIMBRA

2

Simone Antoniaci TUZZO 3

Universidade Federal de Gois, Goinia, GO.

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo analisar o enquadramento do conceito de comunicao

pblica ao conceito de gnero utilitrio do telejornalismo, na tentativa de familiarizar a

gesto da informao para o cidado da comunicao pblica gesto da informao para o

telespectador. Fazer comunicao pblica adquirir o compromisso com a perspectiva

cidad na comunicao envolvendo, por isso, temas de interesse ou relevncia coletivos. O

trabalho toma por base o principal telejornal do Brasil, Jornal Nacional, da Rede Globo, a

fim de entender at que ponto possvel enxergar o conceito de comunicao pblica nas

notcias utilitrias deste telejornal. Para isso, foram analisadas cinco edies levando em

considerao as subcategorias de classificao de Gnero Utilitrio de Jos Marques de

Melo e as subcategorias de classificao de Comunicao Pblica de Jorge Duarte.

PALAVRAS-CHAVE: Comunicao pblica; Gnero utilitrio; Jornal Nacional; Cidado.

1. INTRODUO

A atuao da Comunicao Pblica (CP) tem sido analisada por estudiosos do

campo da comunicao logo que perceberam uma dicotomia entre o prprio conceito de CP

e como ele est sendo trabalhado. A maior crtica se refere Comunicao Governamental

e Poltica nas quais, com o privilgio de se viver em uma sociedade midiatizada

principalmente pela televiso e internet, polticos escondem seus interesses pessoais e

intenes polticas, muitas vezes corruptas, na aparncia de interesse pblico.

1 Trabalho apresentado no GP Comunicao para Cidadania do XII Encontro dos Grupos de Pesquisa em

Comunicao, evento componente do XXXV Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao, realizado de

3 a 7 de setembro de 2012.

2 Mayara Calcio de Sousa Coimbra jornalista formada pela Faculdade de Comunicao e Biblioteconomia

Facomb da Universidade Federal de Gois UFG, mestranda do Programa de Ps-Graduao da Faculdade de Comunicao e Biblioteconomia FACOMB, da Universidade Federal de Gois UFG. E-mail: [email protected]

3 Simone Antoniaci Tuzzo Doutora em Comunicao pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Professora Efetiva do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da UFG. Coordenadora do Curso de

Especializao em Assessoria de Comunicao e Marketing da Faculdade de Comunicao e Biblioteconomia

Facomb da UFG. [email protected]


2

Ainda a tempo de no perder de vista a essncia do conceito de comunicao

pblica, vale destacar que mesmo com a subdiviso desse conceito em governamental,

poltica, organizacional, cientfica e civil organizada4, o que faz uma comunicao ser

pblica, embora toda comunicao parea como tal, a gesto da informao para o

cidado5, ou seja, o trabalho de construo e divulgao da informao de interesse pblico.

Nessa direo, o gnero utilitrio do telejornalismo brasileiro talvez tambm tenha

essa finalidade. Temer (2009, p. 179) destaca que os gneros podem ser definidos como

categorias de anlise a partir das quais podemos agrupar trabalhos semelhantes, tanto

visando auxiliar a produo e leitura destes trabalhos, quanto para a anlise desse material.

O gnero utilitrio pode ser encontrado em vrios suportes miditicos e de vrias

formas. Seu objetivo proporcionar ao receptor informaes teis para seu cotidiano e

tambm para tomadas de decises futuras.

O crescente uso desse gnero se justifica na prpria sociedade, onde h, atualmente,

muita informao. E atendendo a essa demanda, os meios de comunicao de massa

utilizam-se do jornalismo para prestar servio de utilidade pblica.

Aproveitando o fato de que o conceito de comunicao pblica ainda est em

construo, e por isso, seu uso conflitante com sua prtica, a presente pesquisa teve por

objetivo analisar o enquadramento do conceito de comunicao pblica ao conceito de

gnero utilitrio do telejornalismo, na tentativa de familiarizar a gesto da informao para

o cidado da comunicao pblica gesto da informao para o telespectador.

Esta pesquisa foi realizada com o principal telejornal do Brasil, Jornal Nacional, da

Rede Globo, para entender at que ponto possvel enxergar o conceito de comunicao

pblica nas notcias utilitrias do telejornal que, segundo Temer (2002, p. 123), aparece

com a caracterstica de ser o telejornal que se encontra em todas as partes, dando conta de

quase todas as notcias do dia. Outro fator de escolha importante que o Jornal Nacional

veiculado pela rede de televiso de maior audincia no Brasil.

4 BRANDO, Elizabeth Pazito. Uso e Significados do Conceito de Comunicao Pblica. Trabalho

apresentado no Ncleo de Pesquisa Relaes Pblicas e Comunicao Organizacional do VI Encontro dos

Ncleos de Pesquisa do Intercom, 2006. Disponvel em: < www.intercom.org.br/papers/nacionais/2006/resumos/R1037-1.pdf>. Acesso em: 06 de maio de 2012.

5 Aula ministrada na Faculdade de Comunicao e Biblioteconomia (Facomb) da UFG por Elizabeth Pazito

Brando, Relaes Pblicas, Jornalista, bacharel em Comunicao Social pela UFRJ, Mestre em Sociologia

Poltica pela USFC e Doutora em Cincia da Informao pela UNB. Atualmente coordenadora Geral da ps-

graduao no IESB. Endereo eletrnico: [email protected]


3

Para este trabalho, foi considerada a classificao de Jos Marques de Melo para

enquadrar as notcias dentro do gnero utilitrio, este que se subdivide em mais quatro

categorias, sendo elas o formato indicador (meteorologia, resultados de loterias, telefones

teis, necrologia, programao de TV, trnsito e outros), cotao (dados sobre a variao

dos mercados: monetrio, industriais, agrcolas, tercirios), roteiro (orientao ao consumo

de bens simblicos) e servio (proteo dos interesses dos usurios dos servios pblicos,

bem como dos consumidores dos produtos industriais ou de servios privados).

Classificada como qualitativa, a pesquisadora analisou o contedo de cinco edies

do Jornal Nacional, no perodo de 01 a 05 de maio, estudando apenas as notcias

consideradas dentro do gnero utilitrio.

O critrio de escolha destas cinco edies foi o aleatrio, na justificativa de que o

objetivo da pesquisa mostrar a possibilidade de uma comunicao pblica dentro de

qualquer uma das edies do telejornal trabalhado, ou seja, sem a inteno de uma escolha

que pudesse favorecer a comprovao ou refutao da hiptese.

2. O novo-antigo papel da Comunicao Pblica

Ao longo da existncia dos meios de comunicao de massa, o que percebemos

um conjunto de pessoas que se caracterizam como produtores de informao. Os meios de

comunicao de massa produzem informao, entretenimento, programao midiatizada e

os diversos pblicos e a massa consome tais produtos.

Entretanto, Guareschi (1991, p. 14) coloca a questo da comunicao no somente

como transmisso de informao, mas tambm como processo de construo da realidade:

No seria exagero dizer que a comunicao constri a realidade. Num

mundo todo permeado de comunicao um mundo de sinais num mundo todo teleinformatizado, a nica realidade passa a ser a

representao da realidade um mundo simblico, imaterial. Uma situao existe, ou deixa de existir, medida que comunicada, veiculada.

por isso que a comunicao duplamente poderosa: tanto porque pode

criar realidades, como porque pode deixar que existam pelo fato de serem

silenciadas.

Se os meios de comunicao possuem um papel to significante, de construir ou

desconstruir uma determinada realidade, no seria exagero dizer tambm que a sociedade

no saberia se comportar sabiamente sem os tais.


4

Pode parecer, por isso, prepotncia de quem faz comunicao midiatizada, mas

Barreto (2006, p.3) vem justificar que a informao, quando assimilada adequadamente

produz conhecimento, modifica o estoque mental de informao no indivduo e traz

benefcios ao seu desenvolvimento e ao desenvolvimento da sociedade em que vive.

No diferente disso, a expresso Comunicao Pblica nasceu associada ideia de

melhorar a vida das pessoas, embora comumente diminuda em Comunicao

Governamental ou Poltica. Na comunicao pblica, o cidado deve visto como tal e no

como consumidor ou eleitor, usurio ou telespectador. Mas, para Thompson (1998, p.31):

A recepo dos produtos da mdia no um processo sem problemas,

acrticos, tampouco so absorvidos pelos indivduos como uma esponja

absorve gua. A atividade de recepo se constitui em maneiras

complexas pelas quais os produtos da mdia so recebidos pelos

indivduos, interpretados por eles e incorporados em suas vidas.

A genialidade da comunicao est na possibilidade de incorporar seu contedo no

receptor. E a complexidade est na possibilidade de essa recepo no acontecer. Os

indivduos atribuem escalas de importncia diferentes para cada assunto social a partir dos

valores ou interesses que possuem.

Estudos sobre a conscincia do receptor mostram que as mensagens da mdia podem

ser passadas de forma homognea, mas o pblico que as recebe sempre ser heterogneo e

carregado de valores. Por isso, o ndice principal para medir os efeitos no pode ser a

quantidade de consumo e de ateno prestada comunicao de massa: necessrio possuir

alguma medida a respeito do contedo e significado do que se expe (WOLF, 2008, p.

140).

O desencadeamento desse raciocnio se estabelece de forma crucial para repensar a

prtica da comunicao pblica, ao ponto que um dos fatores determinantes para a

eficincia dessa recepo o interesse pela nova informao. E esse interesse, sendo

pblico, facilita todo o processo comunicacional.

Ponderadamente, na tentativa de retomar o conceito de comunicao pblica inserido

no Brasil na dcada de 1980, a presente pesquisa aborda a atuao da comunicao pblica

de acordo com as consideraes de Jorge Duarte (2009, p. 59), que exige dessa prtica:

(a) compromisso em privilegiar o interesse pblico em relao ao interesse

individual ou corporativo; (b) centralizar o processo no cidado; (c) tratar

comunicao como um processo mais amplo do que informao; (d)


5

adaptao dos instrumentos s necessidades, possibilidades e interesses

dos pblicos; (e) assumir a complexidade da comunicao, tratando-a

como um todo uno.

Em outras palavras, a essncia do conceito de comunicao pblica a gesto da

informao para o cidado. Fazer comunicao pblica adquirir o compromisso com a

perspectiva cidad na comunicao envolvendo, por isso, temas de interesse ou relevncia

coletivos.

O esprito pblico exige esse compromisso, o de colocar o interesse da sociedade

antes da convenincia particular. O cidado precisa saber quando pagar impostos, se aquela

vacina se enquadra na faixa etria de seu filho, se aquele novo projeto de Lei modifica o seu

cotidiano ou se, de fato, os hospitais particulares so obrigados a atender qualquer paciente

em estado de emergncia independente de cobertura de plano ou de pagamento pelo

servio.

3. A cidadania do gnero utilitrio

O gnero utilitrio no jornalismo brasileiro surge fortemente no sculo XX em meio a

uma sociedade totalmente imersa na informao. Acostumando-se a receber orientaes

desde mercado financeiro at para decises bem cotidianas, essa sociedade busca at hoje, e

cada dia mais, notcias diretamente teis. Assim, gnero utilitrio vem alargando seu espao

na indstria dos meios de comunicao.

A amostra do conceito desse gnero pode ser confirmada mais convenientemente

para esta pesquisa por meio da tese de Ana Carolina Temer6 (2003, p. 101), na qual foram

estudadas as notcias de servio nos telejornais da Rede Globo. Diante da anlise, a autora

chegou ao seguinte conceito sobre o gnero utilitrio, chamado por ela de Jornalismo de

Servio:

Jornalismo de Servio aquele que vai alm da simples divulgao da

informao e se preocupa em mostrar/demonstrar fatos e aes que a

curto, mdio ou mesmo longos prazos, vo contribuir para melhores

condies de vida do receptor. Informaes que o tornem mais saudvel,

mais apto a administrar o prprio tempo ou dinheiro. (TEMER, 2003, p.

101)

6 Ana Carolina Rocha Pessoa Temer Doutora em Comunicao pela Universidade Metodista de So Paulo,

Professora Efetiva do Programa de Ps-Graduao em Comunicao PPGCOM, da Universidade Federal de Gois UFG. E-mail: [email protected]


6

O fato de o Jornalismo de Servio estar diretamente ligados aos interesses mais

imediatos e de trazer resposta a tantos questionamentos sociais fica cada vez mais difcil

para os meios de comunicao separar interesse pblico de interesse privado. Mas apesar da

tenuidade entre os tipos de interesses e da sensatez para distingui-los, a informao de

utilidade pblica no deixa de ser explorada.

O consumo cada vez mais gritante do gnero utilitrio , ainda assim, a ponta de um

iceberg chamado por Gentilli (2005) de necessidade social da informao. E em quase

sua totalidade, essas informaes essenciais para o homem em sociedade chegam de forma

mediada, e no direta.

Todo indivduo precisa de informao para convivncia social. A informao traz

luz os direitos fundamentais. A tese de que o direito informao est atrelado aos outros

direitos, e estes, ao conceito de cidadania, faz com que Gentilli (2005) ache at

desnecessrio afirmar a importncia do papel desempenhado pelos meios de comunicao

nestes processos de integraes sociais, sobretudo nas complexas sociedades de massas do

presente.

O cidado pleno segundo Carvalho (2002), aquele que titular dos trs direitos:

civis, polticos e sociais. J o direito informao tratado como direito-meio, ou seja, os

indivduos conhecem seus tantos outros direitos por meio daquele. Por isso comum

associar a cidadania ao direito informao, e no aos direitos sociais, exclusivamente.

[...] cidado aquele que, em uma comunidade poltica, goza no s de

direitos civis (liberdades individuais), nos quais insistem as tradies

liberais, no s de direitos polticos (participao poltica), nos quais

insistem os republicanos, mas tambm de direitos sociais (trabalho,

educao, moradia, sade, benefcios sociais em pocas de particular

vulnerabilidade). (CORTINA, 2005, pg. 52).

No s o gnero utilitrio, mas o jornalismo como um todo, enquadra-se, na rea da

comunicao social como o principal meio de dilogo com os indivduos. E diante desse

cunho social dominante, apenas devemos chamar de jornalista pleno aquele que, segundo

Carrato (1998 apud VICCHIATTI, 2005, p. 51), seja o profissional capaz de trabalhar

vrias mdias e linguagens, atento s exigncias da qualidade, da tica e da cidadania.

Por essa caracterstica cidad, Jos Marques de Melo (2009, p.98) lembra que o

jornalista um mediador social, um agente do interesse pblico. Sua luta deve ser


7

canalizada para criar novos gneros, formas e tipos jornalsticos que elevem o nvel cultural

da sociedade, e para forjar cidados conscientes dos valores da democracia, cidadania,

solidariedade, justia, equidade.

4. Categorias de anlise

O gnero utilitrio, segundo Jos Marques de Melo7, pode ser classificado em mais

quatro categorias, que foram utilizadas durante a pesquisa:

TABELA 1: Categorias do Gnero Utilitrio Jos Marques de Melo

CATEGORIA DEFINIO

1.1. Indicador Dados fundamentais para a tomada de decises cotidianas

(cenrios econmicos, meteorologia, necrologia e outros).

1.2. Cotao Dados sobre a variao dos mercados: monetrios, industriais,

agrcolas, tercirios.

1.3. Roteiro Dados indispensveis ao consumo de bens simblicos.

1.4. Servio

Informaes destinadas a proteger os interesses dos usurios dos

servios pblicos, bem como dos consumidores de produtos

industriais ou de servios privados.

Comparativamente, tambm foram empregadas as subdivises das informaes da

comunicao pblica, apresentadas por Jorge Duarte8. Todas elas dizem respeito ao tipo de

informao que a comunicao pblica disponibiliza ao cidado, sendo analisadas de

acordo com o emissor ou protagonista desta comunicao, do tipo de instrumento utilizado

para a divulgao e at o tipo de pblico a ser trabalhado.

7 Informaes das aulas da disciplina Gneros Comunicacionais, ministrada pelo professor Marques de Melo,

no curso de Ps-Graduao em Comunicao Social, na Universidade Metodista de So Paulo. In: VAZ,

Tyciane Viana. Gnero Utilitrio: Presena nos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Trabalho

apresentado no GT Jornalismo e Editorao, do Inovcom, evento componente do XIII Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Sudeste, 2008. Disponvel em:<

http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sudeste2008/resumos/R9-0204-1.pdf>. Acesso em: 05 de junho

de 2012

8 DUARTE, Jorge. Comunicao Pblica. Disponvel em: <

http://jforni.jor.br/forni/files/ComP%C3%BAblicaJDuartevf.pdf > Acesso em: 11 de junho de 2012.


8

TABELA 2: Categorias da informao da Comunicao Pblica Jorge Duarte

CATEGORIA DEFINIO

2.1. Institucional

Relativo estrutura, polticas, servios, responsabilidades e

funes dos agentes pblicos, poderes, esferas governamentais,

entes federativos, entidades, alm dos direitos e deveres do

cidado. O que esperar, onde buscar e reclamar.

2.2. Gesto

Ao dos agentes que atuam com o interesse pblico. Discursos,

metas, intenes, motivaes, prioridades e objetivos dos agentes

para esclarecer, orientar e municiar o debate pblico.

2.3. Utilidade

Pblica

Sobre temas relacionados ao dia-a-dia das pessoas, geralmente

servios e orientaes. Imposto de renda, campanhas de

vacinao, sinalizao, causas sociais, informaes sobre servios

disposio.

2.4. Prestao de

contas

Explicao e esclarecimento sobre decises polticas e uso de

recursos pblicos. Viabiliza o conhecimento, avaliao e

fiscalizao da ao de um governo.

2.5. Interesse

privado

As que dizem respeito exclusivamente ao cidado, empresa ou

instituio. Cadastros bancrios, dados do imposto de renda.

2.6.

Mercadolgico

Produtos e servios que participam de concorrncia no mercado.

2.7. Dados

pblicos

De controle do Estado e que dizem respeito ao conjunto da

sociedade e do seu funcionamento. Normas legais, estatsticas

decises judiciais, documentos histricos e legislao.

Nota-se que, em qualquer uma das suas categorias, o gnero utilitrio tem como

mote a apresentao de ferramentas que oriente o cidado em seu dia-a-dia. A informao

da comunicao pblica, como tambm conjecturam suas categorias, ocupa-se, segundo

Duarte9, da viabilizao do direito social coletivo e individual ao dilogo, informao e a

expresso.

9 9 DUARTE, Jorge. Comunicao Pblica. Disponvel em:

. Acesso em 11 de junho de 2012.


9

Analiticamente, pode-se comparar comunicao pblica o gnero utilitrio porque

ambos so motivados pela informao til, de interesse pblico e de respaldo para a

cidadania. Outro fato comprovador que ambos se encontram, entre outras prticas, no

jornalismo que , naturalmente, visto como ferramenta de orientao social.

5. Anlise dos dados: a comunicao pblica do gnero utilitrio

Foram analisadas, qualitativamente, as notcias consideradas dentro das categorias

do gnero utilitrio de cinco edies do Jornal Nacional, da Rede Globo, no perodo de 01 a

05 de maio. O objetivo foi o de ponderar o enquadramento do conceito de comunicao

pblica ao conceito de gnero utilitrio do telejornalismo, na tentativa de familiarizar a

informao para o cidado da comunicao pblica informao para o telespectador.

A tabela a seguir mostra como as notcias foram encaixadas dentro das

subcategorias de gnero utilitrio e de informaes da comunicao pblica:

TABELA 3: Anlise comparativa entre categorias de Gnero Utilitrio (G.U) e Comunicao Pblica (CP)

por meio das notcias do Jornal Nacional, da Rede Globo.

GNERO

UTILITRIO

COMUNICAO

PBLICA

ASSUNTO/ NOTCIA10

DIA

Servio - 1. Lotao em hospitais pblicos; 1/05

Indicador - 2. Necrologia;

Indicador Utilidade pblica 3. Meteorologia reportagem;

Roteiro - 4. Dia do trabalho (RJ);

Indicador - 5. Crise econmica na Europa;

Roteiro - 6. Exposio de Ayrton Senna (SP);

Servio Utilidade pblica 7. Cincia Alzhiemer;

Roteiro Utilidade pblica 8. Educao apontamentos; 2/05

Servio Gesto 9. Poltica (RN);

Indicador Utilidade pblica 10. Meteorologia;

Indicador - 11. Crise econmica na Europa;

Indicador Mercadolgica 12. Cotao dlar e bolsa de valores;

10

Na tabela, as matrias foram resumidas por assunto. Entretanto, para a anlise, as notcias foram estudadas

por completo, no sendo, porm, anexadas a este artigo, pela extenso do contedo e, consequentemente, por

motivos normativos.


10

Servio Gesto 13. Mudanas na poupana; 3/05

Cotao Mercadolgica 14. Cotao da produo industrial;

Servio Dados pblicos 15. Deciso da Justia;

Indicador - 16. Necrologia;

Servio Gesto 17. Presena de policiais em escolas;

Servio Dados pblicos 18. Legislao cotas em

universidades.

Indicador Interesse privado 19. Dvidas sobre aplicao

financeira;

4/05

Cotao Mercadolgico 20. Cotao dlar e bolsa de valores;

Indicador Utilidade pblica 21. Meteorologia;

Roteiro Utilidade pblica 22. Rodovia (RJ-SP);

Indicador Gesto 23. Eleies na Frana;

Cotao Mercadolgica 24. Agronegcios;

Indicador Utilidade pblica 25. Meteorologia; 5/05

Servio - 26. Coleta seletiva de lixo;

Servio Mercadolgica 27. Feira de Esttica (RJ);

Servio Institucional 28. Ao Global (Rede Globo);

Servio Utilidade pblica 29. Campanha contra Gripe;

Servio Utilidade pblica 30. Regularizao do ttulo de eleitor.

Analisando a tabela, observa-se que, das 30 notcias com informaes enquadradas

dentro do gnero utilitrio, 22 delas tambm foram enquadradas dentro de alguma

subcategoria de informao da comunicao pblica. Isso porque, segundo definio de

Elizabeth Brando (2007), no podemos esquecer que embora a comunicao pblica seja

um processo comunicativo que se instaura entre o Estado, o governo e a sociedade, seu

escopo o de informar para construir a cidadania.

A afinidade entre as informaes do gnero utilitrio do jornalismo e as informaes

da comunicao pbica parece existir porque, como analisado, ambas tm essa

preocupao, a de serem geridas para o cidado.

Vale ento refletir sobre o papel dos comunicadores que, afinal, devem construir

essa mesma prtica:


11

At que ponto o trabalho que desempenhamos como comunicadores lembrem, a comunicao social tem servido de olhos, ouvidos e voz para fazer com que os cidados reflitam a ponto de almejar uma mudana

real e definitiva para as futuras geraes. De novo vale perguntar qual o

nosso papel nesse contexto (SFREDDO, 1997 apud, VICCHIATTI, 2005).

Parece um tanto quanto bvio que as informaes enquadradas dentro de servio

(gnero utilitrio) e utilidade pblica (comunicao pblica), tenham absoluta concordncia

entre si, como o caso da campanha de vacinao contra gripe, divulgada pelo Jornal

Nacional do dia 05 de maio de 201211

com a seguinte nota:

Comeou hoje a Campanha Nacional de Vacinao Contra a Gripe. O

governo pretende imunizar mais de 24 milhes de pessoas. O alvo?

Crianas de seis meses a dois anos de idade, quem j passou dos 60,

profissionais da sade e a populao indgena. A vacinao vai at o dia

25 de maio.

Essa informao considerada de comunicao pblica, subcategoria utilidade

pblica, porque segundo conceito de Jorge Duarte (2005) uma informao que se

relaciona com o dia a dia das pessoas, servios e orientaes: imposto de renda, campanhas

de vacinao, sinalizao [...]. Ela tambm considerada uma informao do gnero

utilitrio, subcategoria servio, porque segundo conceito de Jos Marques de Melo (2007)

protege os interesses dos usurios dos servios pblicos, bem como dos consumidores de

produtos industriais ou de servios privados.

Nem toda informao do gnero utilitrio comunicao pblica, como mostrou a

legenda (-) da tabela 03. Mas verificou-se que algumas informaes definidas dentro do

gnero utilitrio so tambm uma prtica de comunicao pblica, embora no tenham sido

emolduradas dentro dos conceitos definidos como tal, como o caso da informao12

sobre

os hospitais pblicos lotados:

Pacientes que procuram atendimento nos dois maiores hospitais pblicos

da cidade de Natal encontram corredores superlotados e muita sujeira.

Mdicos e funcionrios esto em greve. (JORNAL NACIONAL, 2012)

Dentro do conceito de comunicao pblica, essa informao no de gesto, j que

ela no mostra a ao e sim a falta de ao - dos agentes que atuam com o interesse

11

Notcia n 29 da tabela 03. 12

Notcia n 1 da tabela 03.


12

pblico, no representa discursos ou metas dos governantes. Tambm no comunicao

pblica dentro da subcategoria de prestao de contas, j que a informao da superlotao

dos hospitais pblicos no explica ou esclarece sobre decises polticas e uso de recursos

pblicos, e contrariamente deixa em dvida a gesto do dinheiro pbico, se no a certeza.

Mas essa informao do gnero utilitrio comunicao pblica porque um

exemplo primoroso de que o jornalismo acabou ocupando um dever constitucional que os

agentes pblicos no cumprem, por ora, que o de publicizar tudo que de interesse

pblico, ou seja, toda e qualquer ao que afeta a sociedade, bem como o uso dos recursos

pblicos. E a compreenso da comunicao como sinnimo de divulgao est previsto na

Constituio de 1988, no Artigo 37.

O dever de publicidade da comunicao pblica entre o Estado, governo e sociedade,

ou seja, da prestao de contas, tem sido feito apenas com informaes sobre o que os

agentes pblicos tm feito - e na maioria delas politicamente -, e no o que esto deixando

de fazer, como esclareceu a informao da superlotao dos hospitais. A esse papel de

comunicao pblica, est cabendo ao gnero utilitrio do jornalismo desempenhar.

Essa deficincia tanto conceitual quanto prtica da comunicao pblica apenas um

reflexo da viso que se impetrou imprensa. Vista pela comunicao pblica apenas como

um instrumento das instituies pblicas e privadas, a imprensa parece, assim, no ser

capaz de fazer seu prprio contedo de interesse pblico e de gesto da informao para o

cidado sendo que, a partir do momento em que ela presta contas do que no est sendo

feito pelos gestores pblicos, ela vem desenvolver um contedo de comunicao pblica.

Muitas matrias de servio no s oferecem a possibilidade de consumir

como a de consumir melhor, exercendo a funo de orientadora para os receptores que no tiveram acesso informao por meio do sistema de

ensino institucionalizado ou das vias de comunicao pblica. (TEMER,

2001, p.135)

Caberia, aqui, criar uma nova subcategoria dentro da comunicao pblica, com

contedo elaborado pela prpria imprensa, que a Denncia. Quando a imprensa usada

como instrumento de divulgao das aes do governo, a isso Jorge Duarte (2005) vem

categorizar como Prestao de Contas ou dever de Publicidade prevista em

Constituio. J quando a imprensa noticia o que est deixando de ser feito, a isso

titularemos Denncia, ou seja, a imprensa prestando contas populao do que no est

sendo feito com o dinheiro pblico, e mais, a iseno por parte do governo em no oferecer


13

garantias individuais que so de direito, como o funcionamento do Sistema nico de Sade

(SUS).

A notcia da superlotao dos hospitais tambm no pode deixar de ser considerada

como uma comunicao pblica porque se refere apenas situao dos hospitais pblicos

da cidade de Natal, capital de Rio Grande do Norte. Se couber a pergunta - o que a situao

deles tem a ver com a minha, que moro do outro lado do pas? tambm caber a resposta:

Os orelhes telefnicos das ruas de Goinia so pblicos e no vo deixar de ser s porque

esto presos s caladas de Goinia. Em Natal, eles tambm continuam sendo pblicos e em

todas as cidades do pas e do mundo.

6 - Consideraes Finais

O conceito de comunicao pblica rotineiramente associado comunicao

governamental ou poltica, e a sua essncia enquanto prtica, que o de gerir informao

para o cidado, acaba sendo esquecida. Coube a esse artigo explorar a necessidade de

retomar o valor de interesse pblico e de cidadania da comunicao pblica. Para isso,

foram analisadas as notcias consideradas dentro do gnero utilitrio de cinco edies (01 a

05 de maio de 2012) do Jornal Nacional, o telejornal da Rede Globo.

Por meio da anlise qualitativa e comparativa dos dados, foi possvel avaliar as

afinidades conceituais entre informaes de gnero utilitrio e informaes da comunicao

pblica. Como resultado, verificou-se que a subcategoria de servio dentro do gnero

utilitrio e a subcategoria utilidade pblica dentro da comunicao pblica, muito tm a

ver entre si, j que dividem o mesmo objetivo enquanto prtica comunicativa: colabora com

o receptor.

Observou-se, porm, que nem toda notcia do gnero utilitrio tambm notcia de

comunicao pblica. Mas as que so j se fazem suficientes para uma nova reflexo sobre

o conceito de comunicao pblica e seu uso, levando em considerao o alargamento de

seus alcances, at ento estabelecidos entre o Estado, governo e sociedade.

Por outro lado, algumas informaes do gnero utilitrio, embora no tenham se

emoldurado nos conceitos de informao da comunicao pblica, se comportam como tal,

como foi considerado. Isso porque as subcategorias do conceito de comunicao pblica

utilizam-se da imprensa como mero instrumento de divulgao institucional ou poltica, no

sendo ela capaz de produzir seu prprio contedo de interesse pblico.


14

Ao contrrio disso, a imprensa mostra-se cada dia mais apta a preencher a lacuna

esvaziada pelos agentes pblicos, que o de prestar contas sociedade sobre tudo que

pblico e todo e qualquer assunto pblico. Aqui, ficou clara a necessidade de se criar mais

uma subcategoria dentro da informao da comunicao pblica, que a de Denncia.

Quando o governo transmite informaes sobre o que tm sido feito com recursos

pblicos, chama-se Prestao de Contas, em que a imprensa simples aparelho de

divulgao. Quando a imprensa presta contas do que no tem sido feito com o recurso

pblico, a isso chamamos de informaes de comunicao pblica, subcategoria

Denncia, na qual a imprensa a titular pela motivao da notcia, estando hbil a

produzir seu prprio contedo de interesse pblico.

preciso rever o conceito de comunicao pblica, desassociando-o, mesmo que

minimamente, s prticas polticas, organizacionais ou governamentais, j que foi

verificado que inclusive as notcias de servio de um telejornal podem se comportar como

um processo de comunicao pblica.

7 - Referncias Bibliogrficas

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